UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FARMÁCIA Luciano Soares O ACESSO AO SERVIÇO DE DISPENSAÇÃO E A MEDICAMENTOS: MODELO TEÓRICO E ELEMENTOS EMPÍRICOS Florianópolis 2013 Luciano Soares O ACESSO AO SERVIÇO DE DISPENSAÇÃO E A MEDICAMENTOS: MODELO TEÓRICO E ELEMENTOS EMPÍRICOS Tese apresentada ao Programa de PósGraduação em Farmácia – Área de Concentração Fármaco-Medicamento da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção de grau de Doutor em Farmácia. Orientadora: Profa. Dra. Mareni Rocha Farias Florianópolis 2013 Luciano Soares O ACESSO AO SERVIÇO DE DISPENSAÇÃO E A MEDICAMENTOS: MODELO TEÓRICO E ELEMENTOS EMPÍRICOS Esta tese foi julgada adequada para obtenção do Título de “Doutor”, e aprovada em sua forma final pelo Programa de PósGraduação em Farmácia da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 27 de fevereiro de 2013. _______________________________________ Profa. Tânia Beatriz Creczynski Pasa, Dra. Coordenadora do Curso _______________________________________ Profa. Mareni Rocha Farias, Dra. Orientadora Universidade Federal de Santa Catarina Banca Examinadora: ________________________________________ Profa. Dra. Silvia Storpirtis Universidade de São Paulo _______________________________________ Prof. Dr. Cassyano Januário Correr Universidade Federal do Paraná ______________________________________ Profa. Dra. Dayani Galato Universidade do Sul de Santa Catarina _______________________________________ Profa. Dra. Miriam de Barcellos Falkenberg Universidade Federal de Santa Catarina ______________________________________ Prof. Dr. Marcos Antonio Segatto Silva Universidade Federal de Santa Catarina À minha família! Minha formação profissional não teria sido possível sem a determinação inabalável de meus pais, Francisco e Carmelucia, que adotaram como sua missão prover a melhor educação a mim e à minha irmã. E muito mais do que isso, nos legaram um sentido inestimável de família, da união de quem se ama, de quem se ajuda, de quem se protege. Aos meus pais e à minha irmã, Amanda, dedico meu esforço e minha gratidão. AGRADECIMENTOS São muitos aqueles que contribuíram, de forma direta ou indireta, para concretizar esta trajetória, marcada por muitos desafios e descobertas, e também por amizade, compreensão e felicidade. Desde apoios institucionais até a demonstração da mais sincera amizade, as pessoas fizeram desta experiência algo único em minha vida; tornaram meu caminhar mais enriquecedor, virtuoso, ameno, inesquecível, incrível! A todas essas pessoas minha gratidão e admiração! Agradeço à minha família. Aos meus pais, Carme e Francisco, e à minha irmã, Amanda, muito obrigado pelo apoio e compreensão. Meu especial agradecimento e o reconhecimento à minha orientadora, Profa. Dra. Mareni Rocha Farias. Obrigado pela coragem diante dos desafios e pela confiança; sinto-me honrado e inspirado a me afastar do trivial. Obrigado por todas as oportunidades; pela amizade, e pelos exemplos de concentração, dedicação, serenidade e método! Obrigado pela ajuda nos momentos difíceis, e pela alegria de compartilhar de seus ideais, conhecimento e valores! Minha homenagem a uma grande farmacêutica, extraordinária professora e a uma pessoa formidável! Agradeço à Profa. Dra. Bianca Ramos Pezzini, Chefe do Departamento de Farmácia da UNIVILLE, pelo apoio institucional, fundamental para viabilizar a realização do doutorado. Obrigado à minha amiga Bianca, pelo apoio profissional, pessoal, emocional! Obrigado pelos quase 20 anos de nossa amizade! Obrigado à Profa. Dra. Silvana Nair Leite, pelos vários debates que fizemos ao entrar ou ao sair na ponte. Por uma das melhores disciplinas que fiz durante o doutorado e pelas contribuições no trabalho. E, especialmente, pela amizade e carinho. Agradeço à Profa. Eliana E. Diehl, por uma disciplina fundamental para minha formação no doutorado (junto com a Profa. Jean), pelas contribuições no trabalho e pela amizade. Agradeço às amigas e aos amigos que tornaram especial esta trajetória. À Rosana pela inspiração em descobrir o significado das palavras. À Carine pelo apoio e pelas risadas. À Clarice, por suas contribuições e, junto com Claudia, por nossos papos sobre clínica e outros temas. À Melissa e Giovana pela amizade. A Luciano Henrique por nossas discussões sobre serviços farmacêuticos e do trabalho empírico. À Januaria pela contribuição no trabalho empírico. A todas e todos, obrigado pela amizade. Agradeço aos farmacêuticos e às farmacêuticas do EAD, pelo trabalho que pudemos compartilhar, uma experiência educacional única. Fernanda (Zaga), Fabíola (Fu), Kaite (Perry), Marcelo (Marcelitinho), Guilherme (Gil), Raphaela (Rapha), Junior (Gilson, Gelson etc), e, agora, Alessandra (Ale). Obrigado, também, à Luciana (Coletora), à Fabíola (Biola) e à Gabi. Obrigado ao Prof. Dr. Alexandre Leopoldo Gonçalves, cuja disciplina, na Engenharia de Conhecimento, foi fundamental para a construção da lógica de pensamento usada na tese. A ele, ao Prof. Dr. Marcos Antonio Segatto Silva e ao Prof. Dr. Sotero Serrate Mengue, meus agradecimentos pelas inestimáveis contribuições para a qualificação de meu trabalho. Agradeço aos alunos de pesquisa e TCC que acompanharam e contribuíram com o trabalho: Layzon, Fernanda, Alan, Bruna, Luiz, Daniele e Elaine. E a todos os alunos que me instigam como professor, com sua curiosidade natural e vontade de apreender. Agradeço à UNIVILLE pelo apoio financeiro, constituído de ajuda de custo para deslocamento, cópias e comutação bibliográfica, o qual foi muito importante durante o doutorado. Meu reconhecimento ao genuíno esforço da instituição em apoiar a formação de seus professores, por meio do Programa de Qualificação Docente. Agradeço ao programa Fundo de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior – Fundes, do Estado de Santa Catarina, pela concessão de bolsa durante um período do doutorado. “O começo de todas as ciências é o espanto de as coisas serem o que são” Aristóteles 384-322 A.C. RESUMO O acesso a medicamentos é um dos pilares dos sistemas de cuidados em saúde, e o constrangimento a esse acesso é um problema a ser superado para se oferecer aos usuários atenção integral à saúde. No Brasil, os custos da aquisição de medicamentos vêm aumentando drasticamente. Contudo, os problemas de efetividade, a frequência de reações adversas e de intoxicações são consequências cada vez mais presentes nas preocupações de gestores do SUS, de profissionais e da população. Essas questões possuem relação com a qualidade dos serviços farmacêuticos, especialmente a dispensação de medicamentos. Assim, o objetivo desta tese é caracterizar a dispensação de medicamento como um serviço de saúde e o acesso à dispensação como um atributo do usuário na atenção à saúde. O desenvolvimento teórico foi realizado por meio de uma pesquisa analítica conceitual, fundamentado na literatura científica. Para analisar o uso do conceito de acesso a medicamentos na literatura, foi realizada uma revisão bibliométrica de estudos publicados até julho de 2011. O modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde, descrito por Andersen e Davidson (2007), foi adotado para a discussão sobre uso ou acesso a medicamentos. Os dados da literatura subsidiaram a proposição de um modelo de serviço de dispensação de medicamento, integrado ao processo de cuidado. Uma investigação empírica qualitativa foi realizada sobre o uso de serviços de saúde e de medicamentos, da perspectiva de pacientes de um serviço de urgência e emergência de um hospital. Na tese, discute-se que, atualmente, a dispensação de medicamento resume-se a uma atividade normativa, cuja função é distribuir medicamentos como resposta à apresentação de uma prescrição. O desafio é transformar o investimento nos medicamentos em incremento do estado de saúde, por meio do acesso a um serviço de dispensação. Como resultado da revisão bibliométrica, observou-se que o acesso a medicamentos específicos, o financiamento e a disponibilidade são os objetos de pesquisa mais frequentes nos artigos incluídos. A maioria dos estudos trata de fenômenos que estão, predominantemente, relacionados à logística, correspondendo a uma fração das dimensões do acesso. Compreender o uso de serviços de cuidados é fundamental para entender o acesso a esses serviços. Nesse contexto, tem-se que os medicamentos são insumos terapêuticos, e a dispensação é um serviço institucionalizado no sistema de saúde. Com base no modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde, este trabalho aponta que o uso de medicamentos, nos níveis contextual e individual, é influenciado por características predisponentes, fatores capacitantes e pelas necessidades em saúde, os quais, ao mesmo tempo em que modulam o comportamento e os desfechos em saúde de um indivíduo, são por eles influenciados. Aspectos políticos, culturais e da organização dos serviços são, por exemplo, características relevantes na análise proposta. Os resultados empíricos sugerem que esses aspectos podem auxiliar na explicação do comportamento de utilização de medicamentos ou nos fenômenos relacionados à demanda e à obtenção do insumo, e à satisfação do usuário com o serviço. Assim, o modelo de serviço de dispensação de medicamentos proposto considera o acesso como um atributo; o acolhimento, vínculo e responsabilização, a gestão e a clínica farmacêutica como seus componentes; e o uso racional dos medicamentos como seu propósito. O uso de serviços de saúde envolvendo medicamentos e os desfechos consequentes do processo de cuidados são fenômenos complexos. Assim, serviços de dispensação, construídos a partir de pressupostos que considerem essa complexidade, têm potencial para contribuir com o desenvolvimento de cuidados em saúde, com integralidade e equidade no acesso. Um novo paradigma teórico será fundamental para se compreender melhor esses fenômenos e avançar em sua explicação, bem como para modificar a realidade do acesso a medicamentos no Brasil. PALAVRAS-CHAVE: serviço de dispensação de medicamentos; acesso a medicamentos; Sistema Único de Saúde; utilização de serviços de saúde; clínica farmacêutica. ABSTRACT Access to medicines is one of the pillars of health care systems and the constraint of access is a problem to be overcome to provide users with comprehensive health care. In Brazil, the drugs acquisition costs have increased dramatically. However, the problems of effectiveness, the frequency of adverse reactions and intoxications are consequences increasingly present in the concerns of SUS managers, professionals and the public. These issues are related to the pharmaceutical services quality, especially drugs dispensation. Thus, the aim of the thesis is to characterize drug dispensation as a health service and the access to dispensation as a user’s attribute of health care. The theoretical development was conducted through a conceptual analytical research, grounded in the scientific literature. To analyze the use of the access to medicines concept in the literature we used a bibliometric review of studies published until July 2011. The Behavioral Model of Health Services Use, described by Andersen and Davidson (2007), was adopted to discuss on medicines use and access. Literature data supported the proposal of a service model for drug dispensation integrated to the care process. A qualitative empirical research has been conducted on health services and medicines use, from the perspective of patients in a hospital emergency service. In thesis we argue that, currently, drug dispensation boils down to a normative activity, whose function is to distribute drugs in response to the presentation of a prescription. The challenge is to make investing in medicines increases the health status through access to a dispensing service. As a result of bibliometric review, it was noted that access to specific drugs, funding and availability are the most frequent objects of research in the included articles. Most studies dealing with phenomena that are predominantly related to logistics, corresponding to a fraction of the access dimensions. Understand the use of care services is essential to understand access to these services. In this context, drugs are therapeutic inputs, and the dispensation is an institutionalized service into the health care system. Based on the Behavioral Model of Health Services Use, this work shows that the drugs use is influenced by predisposing characteristics, enabling factors and the health needs, in the individual and contextual levels, which modulate behavior and health outcomes of a person and are influenced by them. Political, cultural and service organization aspects are, for example, relevant features in the proposed analysis. The empirical results suggest that these aspects may help explain the drugs use behavior or related phenomena to demand and obtain input, and user satisfaction with the service. Thus, the proposed Drugs Dispensing Service model considers access as an attribute; reception, connection and accountability, management and clinical pharmaceutical aspects as components; and the rational use of drugs as the purpose. Health services use involving drugs and consequential outcomes from care process are complex phenomena. Thus, dispensing services, built from assumptions that consider this complexity, have the potential to contribute to the development of health care, with comprehensive and equal access. A new theoretical paradigm is essential to better understand these phenomena and advance in your explanation as well as to modify the reality of access to medicines in Brazil. KEY WORDS: Drugs dispensing service; Access to medicines; Unified Health System; health services utilization; clinical pharmaceutical component. LISTA DE FIGURAS Figura 2-1 – Papel de ponte da teoria de nível intermediário .............. 35 Figura 2-2 – Modelo molecular dos serviços de cuidados de saúde pela adaptação da postulação geral de Shostack29. ..................................... 41 Figura 4-1 – Modelo de acesso a medicamentos da Organização Mundial da Saúde ................................................................................................ 66 Figura 5-1 – Diagrama de fluxo do processo de busca e seleção de artigos para a revisão ........................................................................................ 83 Figura 5-2 – Número de artigos sobre acesso a medicamentos em relação ao ano de publicação no período até agosto de 2011 .......................... 84 Figura 6-1 – Representação gráfica do modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde ........................................................................... 102 Figura 7-1 – Modelo proposto para o serviço de dispensação de medicamentos. .................................................................................... 128 LISTA DE TABELAS E QUADROS Tabelas Tabela 4-1 – Análise da composição do marco teórico presente em trabalhos publicados sobre acesso a medicamentos ............................ 69 Tabela 5-1 – Categorias de focos de investigação e frequência de trabalhos empíricos entre os estudos incluídos na revisão .................. 85 Tabela 5-2 – Categorias de concepções de acesso presentes em pesquisas sobre acesso a medicamentos.............................................. 89 Tabela 8-1 – Características dos sujeitos da amostra do estudo ........ 148 Quadros Quadro 5-1 – Combinações de termos Mesh e palavras-chave empregadas nas buscas às bases de dados........................................... 81 Quadro 6-1 – Definições e exemplos das dimensões de acesso, de acordo com o modelo de Andersen ................................................................ 115 Quadro 8-1 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com as características individuais predisponentes ...... 150 Quadro 8-2 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com os fatores capacitantes ......................................... 154 Quadro 8-3 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com necessidades em saúde ........................................ 156 Quadro 8-4 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com os comportamentos em saúde ............................. 159 Quadro 8-5 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com os resultados em saúde ........................................ 161 SUMÁRIO 1 Apresentação ............................................................................23 2 Introdução ................................................................................27 2.1 Problema de investigação ............................................................. 29 2.2 Justificativa .................................................................................... 31 2.3 Marco teórico-metodológico ........................................................ 33 2.3.1 Desenvolvimento conceitual e modelos teóricos ...................... 34 2.3.2 Caracterização teórica do serviço............................................... 36 2.3.3 Caracterização teórica de sistemas ............................................ 42 2.3.4 Caracterização teórica de tecnologia ......................................... 44 3 Objetivos...................................................................................47 3.1 Objetivo Geral ............................................................................... 49 3.2 Objetivos Específicos ..................................................................... 49 4 Acesso a serviços de saúde e acesso a medicamentos..................51 5 Pesquisas de acesso a medicamentos: revisão da literatura e análise bibliométrica ..................................................................................75 6 O modelo comportamental do uso de serviços de saúde: utilização e acesso a medicamentos ...............................................................95 7 Um modelo de serviço de dispensação de medicamentos baseado no processo de cuidado no sistema de saúde brasileiro .................. 119 8 Utilização de serviços de saúde e de medicamentos sob a perspectiva dos pacientes: estudo qualitativo................................ 139 9 Considerações finais ................................................................ 169 10 Referências bibliográficas ........................................................ 177 11 Apêndices................................................................................ 207 12 Anexo ................................................................................... 217 1 APRESENTAÇÃO 25 A presente Tese de Doutorado foi desenvolvida junto ao Programa de Pós-Graduação em Farmácia (PGFAR) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), na linha de pesquisa Garantia da Qualidade de Insumos, Produtos e Serviços Farmacêuticos. Organizada na forma de capítulos, ela visa contribuir para a construção de um quadro teórico abrangente sobre o acesso à dispensação de medicamentos no contexto da atenção à saúde, com a perspectiva de qualificar os serviços farmacêuticos. A introdução apresenta o tema, delimita o problema e o objeto de estudo, e expõe a justificativa da pesquisa, assim como alguns pressupostos considerados importantes para a construção da tese. Os capítulos seguintes constituem artigos, dentre os quais um foi aceito para publicação, um está submetido, e os outros em fase de finalização para submissão. Os artigos têm variações de forma decorrentes das normas preconizadas pelas revistas escolhidas para submissão. O primeiro artigo apresenta uma reflexão sobre a complexidade do acesso a medicamentos como atributo dos usuários na atenção à saúde. Desde a concepção de saúde adotada até os aspectos relativos ao acesso como tecnologia, a revisão crítica da literatura permite constituir um quadro teórico mais abrangente, e uma análise conceitual do conceito de acesso a medicamentos. O segundo artigo analisa as concepções teóricas subjacentes aos trabalhos que têm como tema o acesso a medicamentos. A revisão busca estabelecer relação entre o acesso a medicamentos e componentes como a disponibilidade, o financiamento e o uso racional de medicamentos. O terceiro artigo apresenta a descrição do modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde de Andersen e colaboradores, e uma reflexão sobre sua aplicação teórica na utilização de medicamentos. A revisão crítica da literatura e a aplicação do modelo permitem construir um 26 quadro teórico mais abrangente e próprio para a análise do uso de medicamentos. O quarto artigo apresenta a discussão de elementos teóricos acerca da dispensação de medicamentos, caracterizada como um serviço no contexto do Sistema Único de Saúde. Essa abordagem teórica assume como premissas a centralidade do usuário no processo de cuidado; a gestão estruturada dos serviços; a interface interdisciplinar a partir dos princípios de acolhimento, vínculo e responsabilização pelo usuário; e, finalmente, a clínica farmacêutica. O manuscrito redigido foi aceito para publicação na Brazilian Journal of Pharmaceutical Sciences. O quinto artigo analisa dados qualitativos provenientes de entrevistas com pacientes admitidos em um serviço de urgência e emergência de um hospital. Os dados são confrontados com o modelo Comportamental de Uso de Serviços de Saúde, e discutidos considerando o modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos. O artigo foi submetido à Revista Pan-americana de Saúde Pública. A tese é encerrada com uma breve seção de considerações finais e perspectivas. Anexos, são encontrados os instrumentos da pesquisa empírica que serviram de guias para as entrevistas, e a seção de um livro didático, baseada no conteúdo do terceiro artigo, e publicada para realização do curso de Gestão da Assistência Farmacêutica: especialização a distância. No desenvolvimento, o trabalho recebeu auxílio do Fundo de Apoio à Pesquisa da Universidade da Região de Joinville – Univille, por meio de ajuda de custo ao doutorando. Contou ainda com a concessão de bolsa, durante seis meses, por meio do Programa FUMDES – Fundo de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior, instituído pela Lei Complementar nº 407, de 25 de janeiro de 2008, no Estado de Santa Catarina. 2 INTRODUÇÃO 29 A dispensação de medicamentos constitui atividade profissional farmacêutica e, apenas recentemente, passou a compor os objetos de investigações científicas no Brasil. O acesso a medicamentos e à dispensação no Sistema Único de Saúde é parte do sistema de cuidados em saúde brasileiro, cuja relevância foi ressaltada nas últimas duas décadas, em decorrência da magnitude do orçamento envolvido e da tensão social em torno da busca por medicamentos. A produção acadêmica na Assistência Farmacêutica pode ser considerada recente frente à tradição de outras subáreas das Ciências Farmacêuticas, ou, ainda, de outras ciências. Nesse contexto, o desenvolvimento de estudos teóricos sobre o acesso a medicamentos e a dispensação pode ser considerado muito recente e raro. 2.1 Problema de investigação Os medicamentos constituem um tipo de insumo essencial na moderna intervenção terapêutica, sendo empregados na cura e no controle de doenças, com grande custo-efetividade quando usados racionalmente, afetando decisivamente os cuidados de saúde1. Apesar do impacto sobre o curso das doenças e dos grandes avanços ocorridos no desenvolvimento, na produção e no controle de qualidade dos medicamentos, ao longo do século XX, parece cada vez mais evidente que o acesso a medicamentos, ou o seu uso, exerce influência significativa sobre os resultados do tratamento, independentemente da eficácia, segurança e qualidade do produto. A utilização de medicamentos difundida na sociedade, e acompanhada da grande frequência de efeitos iatrogênicos consequentes, sugere que a ampliação do acesso a medicamentos pode significar também o aumento da exposição a situações de risco. No Brasil, as políticas que visam ampliar o acesso a medicamentos tornaram-se um marco legal de grande relevância para o sistema de 30 saúde. Desde a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) e, mais intensamente, a partir do advento da Política Nacional de Assistência Farmacêutica, diversas ações focaram a ampliação do acesso da população, o desenvolvimento e a produção locais de insumos e medicamentos para as necessidades brasileiras, a promoção do uso racional e a qualificação dos profissionais de saúde envolvidos com medicamentos2. Contudo, as discussões sobre a qualidade dos serviços farmacêuticos, especialmente aqueles responsáveis pela dispensação de medicamentos, ainda são restritas. Os resultados de estudos sobre utilização de medicamentos apontam uma situação grave no que se refere às consequências do uso inadequado, como: o grande número de intoxicações3,4; adesão pobre à farmacoterapia5; a baixa resolutividade dos tratamentos6; o uso abusivo de medicamentos7; e, ainda, a necessidade de novos tratamentos, geralmente mais complexos8, como consequência dessa lógica, com um aumento nos custos correspondentes. Esses fatos, frequentemente, estão relacionados aos serviços e não aos produtos propriamente ditos. Ainda antes da adoção das políticas atuais, que visam garantir os direitos à saúde e à assistência farmacêutica no Brasil, o modelo de organização do serviço farmacêutico foi afetado, principalmente, pela evolução da indústria farmacêutica desde o século passado. A farmácia foi definida no artigo 4º da Lei nº 5.991, de 17 de dezembro de 1973, como o: estabelecimento de manipulação de fórmulas magistrais e oficinais, de comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, compreendendo o de dispensação e o de atendimento privativo de unidade hospitalar ou de qualquer outra equivalente de assistência médica9. (grifos meus) Essa organização perdura praticamente inalterada em sua essência até os dias atuais. 31 As farmácias públicas estão muito distantes das diretrizes e políticas de promoção da saúde, intervindo de forma isolada e dissonante da organização do SUS. Os serviços de farmácia não recebem prioridade na disputa por recursos no orçamento da saúde, e tampouco se constituem como objeto mobilizador na definição das políticas de saúde, mesmo aquelas especificamente voltadas à assistência farmacêutica10. Considerando a essencialidade da tecnologia física medicamento na assistência e atenção à saúde e que o acesso ou utilização, e os custos envolvidos são componentes ainda pouco discutidos do ponto de vista científico, o desenvolvimento teórico sobre o acesso à dispensação de medicamentos no SUS constitui objeto urgente na pauta da Assistência Farmacêutica. Em perspectiva, permanece a questão relativa à alta difusão da oferta de medicamentos em nossa sociedade e à superexposição ao risco a que estamos sujeitos. 2.2 Justificativa A área farmacêutica tem passado por transformações importantes, mundial e nacionalmente. No entanto, seguimos observando iniquidades importantes, como o acesso deficitário e a acessibilidade irracional de medicamentos, os custos exorbitantes e, muitas vezes, a baixa resolutividade das ações de saúde. O papel dos serviços farmacêuticos, especialmente a dispensação de medicamentos no SUS, permanece obscuro. As abordagens científicas apresentam multiplicidade de resultados, com baixa densidade teórica, evidenciando uma lacuna epistemológica nesse campo de pesquisa. Do ponto de vista político, essa área, no Brasil, tem sido marcada por grandes mudanças, incluindo: a formação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família – NASF, com a possibilidade de incorporar farmacêuticos às equipes de saúde; o Programa de Reorientação da Educação Superior na Área de Saúde – Pró-Saúde, principal iniciativa corrente para a discussão 32 de mudanças na formação profissional em saúde, voltando-a para o SUS; o curso de especialização a distância em Gestão da Assistência Farmacêutica da Universidade Aberta do SUS, desenvolvido pela Universidade Federal de Santa Catarina para farmacêuticos atuantes nos serviços públicos de saúde; os programas de Residência Multiprofissional em Saúde e Residência em Área Profissional da Saúde, que propiciam a formação de farmacêuticos para contribuir com a mudança da configuração tecno-assistencial do SUS; e a discussão do Projeto de Lei Substitutivo, do Deputado Federal Ivan Valente, em tramitação na Câmara dos Deputados, concentrando as demandas por transformar a farmácia em um estabelecimento de prestação de serviços de saúde. Assim, estudos científicos no sentido de contribuir com a discussão contemporânea podem consolidar uma transformação relevante no setor farmacêutico brasileiro. A aquisição de medicamentos representa uma parcela importante dos orçamentos do Ministério da Saúde do Brasil e de secretarias estaduais e municipais. A despeito do incremento considerável, observado na última década, nos gastos com medicamentos, as demandas por acesso judicial têm exibido crescimento exponencial e impactado o planejamento financeiro de diversas instâncias de gestão do SUS. O acesso a medicamentos permanece uma categoria com baixa precisão conceitual e, de certa forma, exógena ao sistema de cuidados em saúde. Estudos demonstram alta disponibilidade de medicamentos ou gastos acentuados em seu financiamento, contudo não conseguem estabelecer relação disso com a melhoria do estado de saúde da população. O conceito de uso racional de medicamentos, pretensamente um qualificador do atributo acesso, registra variabilidade ontológica, pouco significado na prática clínica, e diversidade interpretativa na gestão dos sistemas de saúde. A utilização de serviços de saúde e de medicamentos nesse contexto é, ainda, um campo pouco explorado. Compreender os fenômenos 33 relacionados ao emprego de medicamentos no processo de cuidado tem representado uma demanda cada vez mais crescente às Ciências Farmacêuticas. Situações complexas, como adesão ao tratamento, intoxicações por medicamentos, resultados negativos associados aos medicamentos, necessidades em saúde, são exemplos desses fenômenos. Nesse contexto, o desafio de desenvolver o conhecimento de forma articulada aos valores e às demandas da sociedade é um imperativo de nossos tempos. Considerando as especificidades desse campo de conhecimento, vislumbra-se a evolução da Assistência Farmacêutica para a formação de um campo disciplinar dentro das Ciências Farmacêuticas. Fundamental para essa trajetória, o desenvolvimento científico da área precisa contar com consistência teórica que imprima identidade e diferencial às investigações nesse campo. 2.3 Marco teórico-metodológico A organização do serviço farmacêutico para prover medicamentos como estratégia terapêutica é um fator capacitante à utilização do serviço, influenciando o acesso e os desfechos em saúde. De acordo com Andersen e Newman11, o fator capacitante é um dos componentes do modelo de uso de serviços de saúde e expressa os recursos que precisam estar disponíveis para que um indivíduo use um serviço de saúde. Segundo Travassos e Martins12, a ideia de acesso remete a uma dimensão de desempenho do sistema de saúde na oferta de serviços. Ou seja, o acesso é um atributo dos usuários dos serviços de saúde e, para discuti-lo, é necessário caracterizar o sistema de serviços de cuidados em saúde. 34 2.3.1 Desenvolvimento conceitual e modelos teóricos Teoria, conforme Sutherland (1975) citado por Weick, é uma dimensão constituída por Um conjunto de afirmações ordenadas sobre um comportamento genérico ou estrutura assumida, para sustentar uma gama significativamente ampla de instâncias específicas13. (p. 517) Uma teoria compõe-se da definição de termos ou variáveis, de um domínio no qual a teoria se aplica, e de um conjunto de relações das variáveis e predições específicas14. O uso de modelos conceituais ou construtos análogos é um procedimento geral da ciência15. Abstrações permitem identificar unidade em um cenário de diversidade e “medir” o mundo; realizar comparações e explicar fenômenos com base em outros melhor compreendidos16. Embora a abstração em si não seja o fenômeno, ela cria linguagem que pode ser comunicada e compartilhada. A concepção de ciência como o desenvolvimento de um corpo de conhecimentos para registrar classes de fenômenos observáveis, envolvendo quadros conceituais, modelos e teorias, e visando a investigação empírica ou sua aplicação para o benefício da sociedade17, parece adequada ao desenvolvimento de teoria que contribua para explicar os fenômenos envolvidos no emprego de medicamentos no processo de cuidado, e o papel da dispensação de medicamentos no sistema de serviços de saúde. O desenvolvimento de teorias e paradigmas é fundamental para a constituição de uma ciência “madura”, de acordo com a concepção Kuhniana. São características de uma boa teoria: ser baseada em dados e observações; ter conceitos que difiram, substancialmente, daqueles existentes; integrar conceitos e resolver supostas contradições; 35 identificar relações entre entidades; ser aberta a extensões e a reaplicações; ser generalizável; e ser passível de abstração14,18. No desenvolvimento de um campo disciplinar, a construção teórica pode levar a um nível de abstração que dificulte a investigação empírica dessa teoria. Assim, construir o arcabouço teórico tendo como ponte, entre as premissas fundamentais e os achados empíricos, um nível teórico intermediário, provisório por acepção, viabiliza a gestão da construção científica19. A Figura 2-1 ilustra o fluxo da descoberta científica nessa perspectiva. Contexto de descoberta Formular & interpretar Formular & fundamentar Formatar & verificar Verificar & consolidar Contexto de justificação Figura 2-1 – Papel de ponte da teoria de nível intermediário Fonte: adaptado de Brodie, Saren e Pels19 As investigações empíricas incluem métodos quantitativos, pesquisa interpretativa e abordagens multimetodológicas19. Assim, o resultado do trabalho desenvolvido nesta tese tem por pretensão compor um corpo teórico intermediário, que faça uma ponte entre teorias gerais interdisciplinares e a investigação empírica necessária à validação e à verificação das teorias propostas. A abordagem metodológica principal, empregada no desenvolvimento deste trabalho, é a ‘pesquisa analítica conceitual’, conforme definida por Wacker14. O propósito desse tipo de pesquisa é contribuir com nova 36 compreensão para problemas tradicionais, por meio da construção de relações lógicas entre conceitos cuidadosamente definidos. Entre as subcategorias desse tipo de pesquisa, a pesquisa introspectiva emprega a experiência do pesquisador para descrever e explicar relações, visando a construção de conceitos e de teorias. Na modelagem conceitual, a dedução de um modelo mental das relações deve ser avaliada usando um quadro conceitual que evidencie a essência dos sistemas investigados. No processo de teorização e deduções das relações lógicas, um percurso metodológico possível é a imaginação disciplinada, no qual se desenvolve processo evolutivo, constituído pela variação, seleção e retenção. Então, variações de possibilidades teóricas são pensadas, selecionam-se as possibilidades que oferecem um percurso com menos obstáculos, e retêm-se, seletivamente, as rotas que evitam os obstáculos. Esse processo evolucionário é guiado pela representação da realidade; as variações teóricas substituem os movimentos próprios da realidade; a seleção escolhe, teoricamente, o percurso mais adequado; e a retenção seletiva substitui a impossibilidade de contorno real desses obstáculos13. A avaliação de programas, serviços e sistemas constitui uma das abordagens de investigação dos sistemas de cuidados em saúde no mundo. No campo da avaliação, os modelos teóricos ajudam pesquisadores a conduzir e a interpretar os resultados, devendo estar articulados aos conhecimentos pragmáticos dos avaliadores20. As assunções feitas pela adoção de uma teoria sobre o objeto ou sobre a forma de realizar uma avaliação podem enriquecer as decisões tomadas pelos avaliadores, baseadas em seu conhecimento pragmático. 2.3.2 Caracterização teórica do serviço Os serviços de cuidados de saúde são entidades amplamente difundidas nos sistemas de saúde em todo o mundo. Na literatura especializada do 37 campo da saúde, há pouca reflexão sobre o significado do conceito “serviço” e suas implicações sobre a gestão e sobre o processo de trabalho, especialmente dos serviços farmacêuticos. A produção disponível, normalmente, tem como objeto os serviços de cuidados em saúde privados, cujo escopo e natureza diferem, significativamente, do Sistema Único de Saúde brasileiro. Entre os estudos de contribuição relevante, Conill e colaboradores21 chamam a atenção para a necessidade de repensar o papel dos serviços no “processo de recuperação do indivíduo e de resgate da autonomia”, com vistas a apontar novos caminhos para o sistema de saúde brasileiro. Hortale, Conill e Pedroza22 discutem a organização dos serviços de saúde e, considerando a saúde como um estado dinâmico, postulam que “os serviços devem ter como função principal alterar o processo natural de evolução da doença”. As autoras consideram o serviço de saúde um fenômeno complexo e o relacionam ao acesso, fundamentadas no marco teórico de Aday e Andersen23. No setor farmacêutico, a lacuna epistemológica exacerba-se, provavelmente, devido à dominância dos “medicamentos” como elementos tangíveis (com inúmeras faces intangíveis) no processo de cuidado, com implicações sobre as diversas categorias atuantes nos serviços de saúde. O fato corrente é que os medicamentos são considerados bens de produção e consumo, e a dispensação está dissociada da lógica dominante do serviço. Um serviço pode ser definido “como o processo de fazer algo para e com a outra parte”, criando-se valor a partir da colaboração16. Os conhecimentos e as competências, aplicados por provedores e integrados por beneficiários, representam a fonte de criação de valor de um serviço16,17. Existem serviços quando há realização de trabalho, independentemente dos insumos e dos meios utilizados, e dos produtos resultantes (se de 38 natureza tangível ou intangível). Serviço é o trabalho em processo, o que o distingue do produto, que é o resultado desse processo. O uso intensivo de recursos humanos em atividades de natureza relacional e o uso intensivo de informação são características úteis na delimitação mais precisa das atividades; porém, o processo de trabalho como uma atividade econômica autônoma é o que, de fato, realiza o potencial que todo trabalho tem para ser um serviço24. Os serviços pertencem a uma categoria lógica distinta dos bens, sendo intangíveis, perecíveis, inestocáveis e não transportáveis. Sua produção é heterogênea e, geralmente, inseparável de seu consumo25-28. O estado de intangibilidade é uma dimensão crítica para a distinção entre serviços e bens de consumo, porém, insuficiente26,29,30. As interações entre o provedor do serviço e o consumidor modulam a frequente customização, e consequente heterogeneidade dos serviços28,30, além de serem determinantes na criação de valor17. Nas ciências de serviço, um sistema de serviço é a unidade analítica fundamental, correspondendo a uma pessoa, organização, agência governamental, entre outros17. São essas entidades que interagem para a concriação de valor. Muitas dessas características sobre serviço, aqui apontadas, foram discutidas por Corbin, Kelley e Schwartz31 para confrontar com os serviços de cuidados de saúde. Postulam-se dois aspectos a partir da análise deste trabalho: a subconsideração, por parte de provedores, da existência do princípio de concriação de valores na interação entre provedores e usuários dos serviços; e a centralidade da análise na prática médica, com pouca discussão sobre o cuidado integral nos sistemas de serviço, e tampouco a inclusão dos serviços farmacêuticos, especialmente, a dispensação de medicamentos. Ao empregar o paradigma da ciência dos serviços para caracterizar os serviços de cuidados em saúde, propõe-se ter como foco os resultados em saúde. Embora a tipologia de serviços aplicada aos serviços de cuidados possa 39 permitir avanços na gestão, é preciso considerar a natureza sanitária desses serviços no desenvolvimento teórico e nas investigações empíricas, e ter os desfechos clínicos como meta, independentemente do modelo de atenção à saúde. A interface usuário-produtor ilustra como a estrutura institucional de produção e a relação entre usuário e produtor são centrais na definição de serviços28. Para alguns serviços, as interações exigem proximidade relacional ou espacial, influenciando o acesso. Os serviços são prestados pelo provedor e experenciados pelo usuário, e ambos (provedor e usuário) compartilham a criação de valor no processo, em um sentido fenomenológico29,30,32. Embora os serviços requeiram a mobilização de recursos de infraestrutura, em última instância, eles são realizados por meio da interface usuário-provedor. Essa interface, de natureza material, chamada de evidência tangível do serviço, apresenta uma certa heterogeneidade e materializa a relação entre provedores e usuários29,33. No caso específico de serviços de saúde, o serviço está presente independentemente do desfecho, este influenciado por muitos outros fatores alheios ao escopo do serviço. Assim, a mudança no estado de saúde do usuário, decorrente do serviço, corresponde às alterações na condição do paciente, sejam os resultados favoráveis ou não25. Focando os serviços farmacêuticos, ao tomarmos o medicamento como fenômeno social e o fato de que um dos papéis sociais dos medicamentos é o de ser a interface entre pacientes e médicos34, podese inferir que, nos serviços de cuidados que usam medicamentos como insumos, as interações entre provedores e usuários são também moduladas por sua presença e função. A experiência de uso do medicamento está relacionada ao comportamento do paciente e pode influenciar as necessidades pelo insumo35. Os serviços classificados como solicitação por assistência ou intervenção envolvem acesso a capacidades sociotécnicas, que servem 40 de meio “para realizar o diagnóstico, manutenção e reparo, visando produzir o efeito desejado sobre um objeto pertencente ao usuário do serviço”28. Os serviços não podem ser definidos independentemente do seu uso e são, com frequência, providos em combinação com bens ou produtos. Serviços podem ser comercializados quando suas propriedades são definidas, delimitadas e objetificadas, ou seja, quando o serviço é transformado em algo tangível, uma “coisa”28. De acordo com o postulado por Shostack29, as entidades de mercado são “combinações de elementos discretos”, reunidos em um todo, concebendo um modelo molecular para a natureza das atividades produtivas. Assim, adaptando-se o modelo proposto por esse autor para os serviços de saúde, é possível postular sobre sua múltipla constituição, a dominância de um núcleo intangível, seus componentes tangíveis, e a concorrência das tecnologias em saúde com a natureza intangível dos serviços, enriquecendo o conhecimento sobre as prioridades e abordagens requeridas da gestão (Figura 2-2). Os serviços de saúde seriam, portanto, constituídos, majoritariamente, por componentes intangíveis. 41 Figura 2-2 – Modelo molecular dos serviços de cuidados de saúde pela adaptação da postulação geral de Shostack29. Legend Elemento Elemento a tangível intangível Fonte: Elaborada pelo autor, adaptada de Shostack29. Ainda que o modelo apresente limites e algumas características exibam oscilações de suas propriedades, essa é uma possibilidade de aprofundar a reflexão sobre a natureza dos serviços de saúde, e analisar sua conformação e interfaces no contexto do mercado e da sociedade. Os elementos tangíveis constituem as evidências que fomentam o julgamento de um usuário. Este argumento leva à dedução de que existe 42 uma influência desses elementos sobre o uso do serviço, com reflexos sobre a gestão de sua organização e finalidade. Por exemplo, a manipulação do ambiente (pintura da parede, cartazes etc) representa uma variável passível de ser controlada pelo gestor, com impacto sobre a realidade do serviço ou de como o usuário enxerga o serviço (evidência tangível)29. Embora existam elementos teóricos que relacionem a saúde a serviços sustentados por uma lógica dominante de serviço, os serviços de saúde são classificados, na literatura, pela lógica dominante dos bens, uma vez que, na medicina ocidental, o paciente é alguém passivo, para quem se presta um serviço de cuidado36. Quanto à distribuição, Ferrario e Guarino37 propõem uma distinção terminológica na qual afirmam que o que se distribui é o conteúdo de um serviço, e não propriamente o serviço. O serviço tem o compromisso de produzir esse conteúdo. Os autores propõem que o acesso está relacionado à troca de valores, frutos do serviço, adequadamente ligados a uma noção de disponibilidade espaçotemporal e a uma ontologia social e das organizações37. A disponibilidade e o financiamento podem ser considerados propriedades não funcionais de um serviço38. 2.3.3 Caracterização teórica de sistemas Os sistemas são definidos como um conjunto de componentes e suas interconexões para atingir determinado propósito15. As relações entre os componentes e deles com o ambiente são fundamentais para caracterizá-lo (o sistema), ou seja, a soma das partes não representa o sistema. Um histórico analítico do seu desenvolvimento na teoria geral dos sistemas pode ser encontrado em Von Bertalanffy15, cujo aporte teórico pode ser usado para a compreensão dos sistemas de saúde. A natureza axiomática da afirmação de que a teoria geral dos sistemas é um modelo de certos aspectos gerais da realidade enfatiza o fato da necessidade de 43 considerar seu desenvolvimento em um paradigma distinto da ciência convencional. A teorização sobre sistemas, conforme desenvolvida por Walby39, que parte do paradigma da complexidade e do ponto de vista da sociologia, apresenta semelhança com as concepções discutidas nas ciências de serviços. Os sistemas de serviço tomados como sistemas que interagem com outros sistemas para concriar valor17 coincidem com a profundidade ontológica defendida na sociologia, segundo a qual domínios institucionalizados e relações sociais são considerados sistemas eles próprios, e não apenas partes constitutivas de um sistema39. A teoria da complexidade coloca como possibilidade a noção das relações entre entidades serem não lineares, distinguindo-se da teoria de sistemas convencional que classifica essas relações como de causa e efeito39. Outros aspectos relevantes na teoria dos sistemas, desenvolvidos, nesse mesmo trabalho, referem-se às noções de coevolução e feedback, admitindo-se, então, sistemas que tendem ao equilíbrio e aqueles que dele se afastam. Nesse contexto, pequenas mudanças sucessivas podem derivar efeitos de grande magnitude, exibindo, muitas vezes, um comportamento não linear. Os sistemas de serviços são sistemas abertos capazes de melhorar o estado de outro sistema e o seu próprio, por meio da aplicação de recursos. São sistemas dinâmicos que mantêm a estabilidade de sua forma por longos períodos16. É um tipo de sistema sociotecnológico, cujos componentes podem ser categorizados em pessoas, tecnologias, outras organizações e em compartilhamento de informações40,41. A dinâmica de concriação de valores de uma configuração de recursos pode ser entendida como um sistema de serviços, que apresenta uma identidade própria e constitui uma instância de um tipo ou classe de sistema de serviços16. É pertinente salientar o papel das interações entre 44 serviços e bens tangíveis como uma relação dialógica, nos diferentes momentos dos ciclos de vida de entidades econômicas, como, por exemplo, o medicamento. 2.3.4 Caracterização teórica de tecnologia No contexto das ciências dos serviços, as tecnologias são categorizadas em recursos como propriedades e como entidades físicas42. Importa conhecer como a competência tecnológica e as competências individual e organizacional interagem para criar valor em um sistema de serviço. O fenômeno da tecnologia guarda complexidade semântica em seu desenvolvimento e tem seu conceito influenciado pelos componentes do modelo estruturacional. Assim, podemos destacar as noções de tecnologias como um produto ou meio da ação humana e como as condições ou consequências da interação humana com a tecnologia. A tecnologia possui uma natureza dual, definida com uma realidade objetiva e um produto construído socialmente43. As tecnologias são distinguidas por Nelson e Sampat44 em tecnologias físicas ou duras (significado próximo ao sentido em que a palavra é comumente empregada) e tecnologias sociais (que envolvem a coordenação das ações humanas)45. É necessário compreender os medicamentos como uma tecnologia em seu contexto sócio-histórico. Como uma realidade objetiva, pode-se compreender seu uso e seu desempenho como de uma função determinística. Como uma realidade construída socialmente, pode-se compreender como os medicamentos são desenvolvidos e interpretados, e como essa construção reflete interesses e motivações sociais. Nesse contexto, a investigação das interações entre a tecnologia e as instituições pode ser útil para compreender os sistemas de serviço de saúde. A associação do termo “instituição” (formas organizativas gerais) 45 refere-se às “tecnologias sociais que um grupo social relevante considera padrão em um contexto particular”. Tecnologias sociais institucionalizadas definem ou induzem formas específicas de como organizar a atividade produtiva44,46. Rotinas são elementos essenciais das tecnologias e podem ser definidas como padrões recorrentes de interação (incluindo procedimentos e rotinas técnicas) que descrevem o comportamento da organização e geram resultados previsíveis e específicos. Embora haja variações, os procedimentos essenciais são muito similares e podem estar associados a descrições codificadas, teorias explicativas e argumentos normativos que justifiquem seu emprego. Um atributo essencial das rotinas é estas serem conhecidas e empregadas por aqueles que possuem competência específica na arte (profissionais de uma corporação), embora se assuma que abrangem também os elementos estocásticos na determinação de decisões e seus resultados, que, fundamentalmente, são de natureza não rotineira. Seu valor não reside apenas na compreensão da natureza econômica dos sistemas de serviços, mas também no caráter analítico a subsidiar as investigações empíricas e a descrição de seus níveis ontológicos44,47-49. Os processos envolvendo tecnologias duras não são capazes de adaptarse à alta-variabilidade da entrada do usuário no serviço quanto é o trabalho humano. O uso intensivo de tecnologias pode levar danos à satisfação do usuário18. Ao analisar-se o acesso a medicamentos no contexto da atenção à saúde, é imperativo empregar um marco teórico mais abrangente à compreensão das tecnologias, visando incorporar aos estudos científicos seu caráter social e político. 3 OBJETIVOS 49 3.1 Objetivo Geral O objetivo geral desta tese é caracterizar a dispensação de medicamentos como um serviço de saúde e o acesso à dispensação como atributo dos usuários na atenção à saúde. 3.2 Objetivos Específicos Identificar o significado do acesso a medicamentos desenvolvido na literatura científica; Analisar os processos de cuidados envolvendo medicamentos, considerando o modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde; Elaborar um modelo teórico de acesso à dispensação de medicamentos; Analisar as relações empíricas entre o uso de serviços de saúde e de medicamentos, a partir do modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde, considerando o modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos. 4 ACESSO A SERVIÇOS DE SAÚDE E ACESSO A MEDICAMENTOS 53 O primeiro artigo apresenta uma reflexão sobre a complexidade do acesso a medicamentos como atributo dos usuários na atenção à saúde. Desde a concepção de saúde adotada até os aspectos relativos ao acesso como tecnologia, a revisão crítica da literatura permite construir um quadro teórico mais abrangente, e uma análise conceitual do conceito de acesso a medicamentos. Acesso a serviços de saúde e acesso a medicamentos Resumo Mesmo nos sistemas de saúde bem desenvolvidos observam-se iniquidades quanto à utilização e ao acesso a serviços, frequentemente expressas pelos problemas de disponibilidade. A organização dos serviços de saúde e o como a cultura modula sua construção e uso são aspectos negligenciados na literatura. Assim, este artigo tem por objetivo levantar alguns pressupostos que fundamentem a discussão sobre o acesso a medicamentos e identificar questões para construir problemas de investigação relevantes no contexto do sistema de saúde brasileiro. As concepções de saúde e doença são ligadas ao seu contexto cultural. A experiência dos pacientes com uma doença é mais ampla que sua face biológica. Os serviços de saúde representam o centro dos sistemas de saúde ocidentais, tanto na organização do sistema quanto como categoria de análise. Fatores como o acesso ao cuidado, o perfil de referência de médicos, características dos usuários e severidade da doença influenciam o uso de serviços de saúde. O acesso envolve demandas diferenciadas por tipo de oferta com modulação cultural do uso de serviços e da ação profissional. Os medicamentos constituem um componente tecnológico essencial nos sistemas de saúde biomédicos. O desafio fundamental é transformar o investimento nos medicamentos em incremento à saúde, na perspectiva do Sistema Único de Saúde. 54 Palavras-chave: acesso a medicamentos; utilização de serviços de saúde; cultura; tecnologia. Access to health service and access to medicines Abstract Even in the health systems with a good development there are inequities in the use and access to services, often expressed by availability problems. The organization of health services, and how the culture modulates their construction and use are neglected aspects in literature. The aim was to raise some assumptions underlying the discussion on access and identify some issues to building relevant research problems in the context of the Brazilian health system. The concepts of health and disease are connected to their cultural contexts. The experience of patients with a disease is broader than its biological side. Health services represent the core of Western health systems, both in organizing the system and as a category of analysis. Factors such as access to health care, reference profile of physician, characteristics of users and severity of illness influence the use of health services. Access involves demands differentiated by type of offer, with cultural modulation of the service use and of the professional action. Medicines are an essential technological component in biomedical health systems. The underlying challenge is to transform the investment made in medicines in good health outcomes, from the perspective of Unified Health System. Keywords: access to medicines; use of health services; culture; technology. Introdução Uma vez que a constituição de 1988 universalizou o direito à saúde no Brasil, a organização do sistema de saúde constituiu-se um grande 55 desafio, de forma a contemplar as necessidades por cuidados, em consonância com a situação de saúde e as demandas das comunidades50. A organização do sistema de saúde, sustentada nas necessidades, acrescenta à questão do acesso a equidade51, princípio que foi incorporado ao processo de construção do Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro. Embora o SUS tenha seus princípios definidos por lei, o sistema é, ainda, arena para disputas entre modelos diversos52. Segundo alguns autores, a universalização da atenção à saúde traduziu-se em um sistema segmentado e desarticulado, no serviço público e no sistema como um todo50. Mesmo em populações cujo sistema de cuidados em saúde seja bem desenvolvido, com acesso considerado ágil e com boa cobertura de serviços, observam-se iniquidades que merecem monitoramento e ações de correção, destacando-se marcadas diferenças sociogeográficas na utilização e cobertura de serviços e na condição de saúde53. A prestação de serviços de saúde, individual ou coletivo, é apenas uma das formas para melhorar a saúde da população52. De acordo com Akerman e Nadanovsky54, os serviços diretos de atendimento à saúde apresentam impacto restrito sobre o processo saúde-doença, embora tenham relevância social, dado o contingente de profissionais e tecnologias envolvidos, os custos assumidos no seu financiamento, as intervenções médicas com relativa efetividade e o significado político de sua disponibilidade. Os serviços seriam os responsáveis pela gerência eficiente dos recursos empregados pela sociedade na garantia da saúde22. As dificuldades de acesso são, frequentemente, expressas em termos de barreiras e de problemas de disponibilidade de serviços (integrados por instituições, profissionais, bens de saúde e rotinas), que parecem ter relação com a burocracia institucional e as marcadas diferenças entre os que necessitam e aqueles que provêm cuidados de saúde. Os modelos 56 teóricos e estudos de avaliação focam apenas alguns dos aspectos envolvidos no acesso a cuidados de saúde, e questões relevantes permanecem não respondidas. Entre essas questões, a organização dos serviços de saúde e como a cultura modula a sua construção e o seu uso são aspectos particularmente negligenciados na literatura científica, e têm o potencial para contribuir, de forma relevante, para um conhecimento mais integral do uso dos serviços de saúde. Analisar o perfil de utilização dos serviços de saúde, a natureza das interações envolvidas, e confrontar com os resultados obtidos para o sistema e para a população pode auxiliar na organização do sistema e na redução das iniquidades observadas, em um contexto de recursos limitados para alocação. O objetivo deste ensaio é levantar alguns pressupostos que fundamentem a discussão sobre o acesso, em uma visão mais ampliada, e identificar questões para a construção de problemas de investigação relevantes, a partir do contexto brasileiro, que possam subsidiar discussões em diferentes realidades. Concepção de saúde As concepções de saúde e doença são ligadas ao contexto cultural no qual se encontram. A doença é também uma construção sociocultural e subjetiva; e o sistema de saúde, um sistema cultural55,56. O processo terapêutico constitui-se por uma sequência de decisões e negociações entre várias pessoas e grupos, com interpretações potencialmente divergentes a respeito da identificação da doença e da escolha da terapia adequada57. Kleinman, Eisenberg e Good58 reconhecem três domínios estruturais dos cuidados de saúde na sociedade: profissional, popular e tradicional. Cada um deles possui modelos explicativos, regras sociais, conjuntos de 57 interações e instituições próprios. Em um episódio particular de doença (sickness), esses domínios podem fornecer modelos explicativos diferentes para reconhecer o que está errado e o que precisa ser feito. É por meio desses modelos que os provedores de cuidado negociam com os pacientes as realidades que se tornarão objeto dos cuidados e tratamentos, constituindo-se na construção cultural da realidade nos serviços de saúde. Na língua inglesa, o fenômeno da doença (sickness) pode ser designado pelas palavras disease (a face biológica da doença) e illness (a forma como os pacientes vivem as experiências de uma doença), que expressam os modelos explanatórios utilizados em sua compreensão. A illness é modulada pela cultura e está imersa “em um complexo nexo familiar, social e cultural”58. Profissionais de saúde tendem a fundamentar sua atuação no conceito de disease e tratar, inadequadamente, a illness do paciente58,59. O escopo dos cuidados deveria abranger mais do que a disease, uma vez que as diferenças no estado de saúde exibem correlação mais consistente com o grau de mudança econômica do que com a estrutura e organização de serviços22. A congruência dessas perspectivas se coaduna com a construção social das necessidades de cuidado e da organização dos sistemas de saúde. O médico é investido de poder social para o controle no sistema de funções da doença, reforçando a meta social do bem estar coletivo59,60 e reificando a provisão do bem-estar como obrigação61. O poder assimétrico, observado no exercício dessa função social, parece ser perturbado pela agência do paciente e por algumas características sociais contemporâneas. A redução na diferença de poder de pacientes e provedores de saúde tem mudado essa relação e forçado o sistema de saúde a renegociar suas regras e funções, reconstruindo a interação a partir de novos procedimentos59. Os sistemas e serviços de saúde 58 Os serviços de saúde representam o centro dos sistemas de saúde ocidentais, tanto na organização do sistema quanto como categoria de análise12,62,63. O acesso a esses serviços, ou o uso deles, pode não refletir as necessidades por cuidados, e sim os perfis de disponibilidade de serviços, de capacidade de utilização e de uso propriamente dito62,64,65. Muitos fatores influenciam o uso de serviços de saúde, tais como o perfil de referência de médicos, as características dos usuários e a severidade da doença. Porém, o perfil do uso dos serviços, por vezes, contraria as expectativas em relação às necessidades. A alocação dos recursos acaba sendo determinada pelo consumo histórico, pela distribuição dos aparelhos provedores de serviço (oferta), pela densidade geográfica de profissionais de saúde, por fatores sociais, entre outros de mesma natureza51,62,66. Os serviços de cuidados de saúde não podem ser um fim em si mesmo, mas um meio para proteger, promover ou restaurar a saúde. Assim, o acesso a serviços não implica meramente disponibilizá-lo em resposta à demanda pelo serviço, mas concretizar a expectativa de que seu uso melhore o status de saúde51. A organização social e a cultura política, nas quais as estratégias de cuidados de saúde estão inseridas, afetam não somente como essas estratégias operam, mas também interferem nos processos que mediam os desfechos pretendidos67. O sistema de saúde pode ser definido como o “conjunto de relações entre instituições, grupos sociais e indivíduos, orientados para a manutenção e melhora do nível de saúde de uma população humana determinada” (Miguel, 1978 apud22 p. 85). O “complexo médico-industrial” compõe o modelo ocidental moderno de sistema de saúde68,69. Os serviços de saúde apresentam, cada vez mais, densidade tecnológica física elevada, aumentando a exigência de garantia de acesso aos serviços que incluam essa tecnologia, no momento apropriado e como responsabilidade intransferível do sistema de saúde68. 59 Entendendo a saúde como um estado dinâmico, espera-se dos serviços, principalmente, a alteração no processo natural de evolução da doença22. No entanto, ocorre uma seleção social pela relação estabelecida entre os preços dos serviços e a capacidade do usuário em custeá-los, limitando o quanto e o que se pode consumir50. Acesso a serviços de saúde: complexidade conceitual A multiplicidade de conceitos e abordagens é marcante no campo analítico do acesso a serviços de saúde. Duas revisões da literatura abordam extensivamente o assunto: Travassos e Martins12, em 2004, e Sanchez e Ciconelli70, em 2012. Têm em comum a conclusão, isto é, a despeito da busca por uma definição consensual e de modelos explicativos consistentes, ao longo do tempo, o conceito acesso tornouse mais complexo, com variáveis de mensuração mais difícil12,70. Acesso foi definido por Donabedian71 e, posteriormente, reconhecido, por diversos autores23,72-75, como o uso de um serviço de saúde por um indivíduo em necessidade, com o propósito de modificar seu estado de saúde. Acesso a serviços de saúde é, portanto, o uso desses serviços. Se assumirmos que o uso de um serviço de saúde é um comportamento pessoal em saúde, como descrito por Andersen e Davidson76, em última instância, o acesso também pode ser compreendido como um comportamento ou uma propriedade de um indivíduo74. De forma semelhante, Frenk apud Hall e colaboradores77 define acesso como o processo de buscar e receber cuidados. Um exemplo de medida de acesso é o índice dos “problemas em obter cuidado de saúde necessário no ano anterior”, o qual, em um estudo, apresentou diferenças entre cidadãos imigrantes e descendentes latinos na Califórnia (USA), sendo que imigrantes ilegais apresentaram problemas mais frequentemente78. Já a acessibilidade refere-se à capacidade de um sistema de saúde produzir serviços que influenciam seu acesso ou uso23,79. Uma das 60 primeiras definições de acessibilidade foi, no campo do planejamento, a medida de oportunidades potenciais para interação80 (interações são elementos essenciais de um serviço). Donabedian distingue os aspectos geográficos (relativos à distância e tempo) e sociorganizacionais (aspectos financeiros, organização do serviço e disponibilidade) da acessibilidade79. Os aspectos geográficos têm sido muito enfatizados nos estudos, e considera-se que desempenhem influência sobre a acessibilidade e sobre o acesso. Um estudo com mulheres na Índia demonstrou a relação das distâncias, meios de transporte, condições das vias e coberturas de serviços com o uso dos serviços de saúde; mulheres vivendo em uma localidade menos acessível tinham dificuldades maiores para usar os serviços81. Em outro exemplo, um estudo observou que o percentual de horas noturnas e de finais de semanas dos provedores é maior entre pediatras em relação a profissionais da atenção primária77, evidenciando um aspecto de temporalidade da provisão do serviço ligado à acessibilidade. As medidas de acessibilidade estão amplamente ancoradas em modelos desenvolvidos no campo da Geografia, e remontam a princípios epistemológicos do segundo quarto do século XX. Os conceitos e medidas convencionais são úteis para o estudo de fenômenos sociais dentro de um quadro teórico baseado em área. Com o aumento da complexidade das relações entre forma urbana, mobilidade e acessibilidade individual, essas concepções se mostram inadequadas para suportar as análises contemporâneas. Para o desenvolvimento teórico da acessibilidade, coerente com comportamentos espaciais humanos individuais cada vez mais complexos, é necessário considerar o contexto das experiências vividas dos indivíduos e as limitações dos quadros teóricos espaço-temporais tradicionais82. Os fenômenos do campo da saúde, agregados aos aspectos geográficos da acessibilidade e aos serviços, incrementam a complexidade do conceito, com reflexos, 61 também, sobre a acessibilidade urbana, devido à ubiquidade do sistema de saúde e suas instalações. Cada serviço pode ter atributos associados a ele, que desempenham a função de parâmetros formais83, qualificando os serviços. Pode-se argumentar que acessibilidade corresponde a um atributo dos serviços de saúde. No campo de serviços, a acessibilidade é considerada um determinante de qualidade84. As condições que os usuários precisam satisfazer para poder acessar os serviços são referidas como regras de acessibilidade83. Todos os serviços deveriam ser adequadamente acessíveis74. Penchansky e Thomas85 definiram acesso como o nível de “ajuste” entre o usuário (características de suas necessidades) e o sistema de saúde. Embora usem o termo acesso, como assinala Starfield74, os autores consideram os componentes de acessibilidade do serviço como as dimensões do acesso: Disponibilidade: relação entre volume e tipo de serviços disponíveis e volume e tipo de necessidades do usuário. Acessibilidade: expressa a relação entre a localização dos suprimentos de serviços de saúde e a localização do usuário. Adequação: relação entre a forma que os recursos são organizados para acolher os usuários (ex: sistemas de agendamento, protocolos) e a capacidade do usuário em se adequar a esses fatores, e a percepção sobre serem apropriados. Capacidade de pagamento: refere-se à relação entre os custos dos serviços e a capacidade do usuário de pagar pelo serviço ou a garantia de provisão. Aceitabilidade: relação das atitudes dos usuários sobre as características pessoais e práticas dos provedores de serviços, e a atitude dos provedores quanto às características pessoais aceitáveis dos usuários. 62 Para Hortale, Conill e Pedroza22, acesso corresponde a serviços disponíveis no tempo e espaço em que o paciente necessita, apresentando clareza na forma de entrada. Não pode ser visto somente sob os aspectos geográfico e econômico, mas também organizacional e sociocultural, caracterizando uma interação que ocorre em um processo de produção de serviços22,68. Essa concepção também está restrita aos aspectos da acessibilidade, conforme definida neste artigo. Gulzar86 p17propõe o acesso a cuidados de saúde como o “ajuste entre os fatores pessoal, sociocultural, econômico e aqueles relacionados ao sistema, que disponibiliza aos indivíduos, famílias e comunidades, ter serviços de saúde oportunos, demandados, necessários, contínuos e satisfatórios”. A discussão sobre acesso precisa envolver a compreensão, em um contexto local, das experiências e dos desejos, manifestados ou subjacentes, presentes na comunidade, a partir das visões de mundo dos seus membros e de sua cultura. O autor propõe, ainda, o “ajuste” entre o uso (e fatores relacionados) e a acessibilidade dos serviços (e respectivas dimensões). Juarbe87 e Norris e Aiken88 diferenciam acesso do uso dos serviços de saúde. A argumentação principal desses autores compreende a proposição de que ter acesso não, necessariamente, implica em utilizar o serviço, e que, o uso, seria influenciado por outros fatores; isso tornaria acesso diferente do uso. A sentença inversa, ou seja, “a utilização de um serviço, necessariamente, implica que houve acesso a esse serviço”, é facilmente assuntível como verdadeira. O pressuposto é de que só há uso se houver acesso. Nesse sentido, identifica-se a existência de uma relação causal entre acesso e a utilização dos serviços de saúde, ao mesmo tempo em que se reconhecem diversas concausas relacionadas a esse fenômeno, sem as quais o uso de serviços não ocorreria (ex: percepção da necessidade, condições financeiras etc). Ou seja, acesso seria uma característica, dentre muitas, que contribuiria para o uso real de um serviço de cuidados frente a necessidades de saúde. A centralidade do construto acesso, na literatura do campo da 63 saúde e nas práticas profissionais, parece ser incoerente com essa assunção. Os fatores a que se atribui efeito sobre o uso de serviços podem, igualmente, ser relacionados ao acesso a esses serviços (ex: distância geográfica interfere sobre o uso ou sobre o acesso). Ambos, uso e acesso, são propriedades atribuíveis a pessoas (isto é, o usuário acessa ou usa serviços). A origem etimológica da palavra acesso compreende ações de “aproximação”, “entrada” e “conquista”. O significado do verbo acessar remete ao comportamento e ao poder de alcançar algo. Enquanto o uso apresenta significados como “servir-se de”, “empregar” e “ter relação com algo”. A existência do acesso pode ser relacionada a esses significados, que unem o seu sentido aos do termo uso. Assim, pode-se concluir que existe uma sinonímia léxica entre o acesso e o uso de serviços de saúde, expressa pela relação entre dois itens com identidade de significação. De acordo com Clark89, o “uso real é prova da presença do acesso”. No contexto apresentado, a acessibilidade dos serviços aos usuários (dimensionado em termos das características estruturais dos serviços) e o acesso dos usuários aos serviços (dimensionado em termos das características comportamentais individuais no uso dos serviços) apresentam maior precisão linguística, clareza conceitual, e estrutura analítica mais operacional. No Brasil, esses construtos, e os fenômenos a eles relacionados, são objetos da Assistência Farmacêutica, um campo científico emergente. Muitas políticas que pretendem garantir acesso focam na tarefa de disponibilizar serviços, ou seja, construir unidades de saúde e hospitais, comprar medicamentos e aumentar a capacidade de ofertar exames para diagnóstico. Em outras palavras, no plano político, a redução do acesso refere-se a uma menor disponibilidade, ou ao aumento do financiamento de serviços ou de bens de consumo. A supervalorização dessas dimensões pode estar relacionada às evidências que 64 demonstram serem essas barreiras significativas ao acesso a cuidados de saúde. Porém, os recursos e sua disponibilidade não implicam, necessariamente, em seu uso77. A relação entre usuários e organizações provedoras é um modulador chave da estrutura e do funcionamento dos sistemas de saúde. No contexto da prestação de serviços, parece haver um aumento da burocratização e a erosão de serviços. As expectativas envolvidas na relação do prestador com o paciente afetam a percepção sobre o sucesso em prover os cuidados demandados. Um exemplo é a expectativa disseminada de que a consulta médica gere uma prescrição de medicamentos como resultado, conforme evidenciado por um estudo desenvolvido em 195760,90, e confirmada em estudos posteriores91,92. Como uma das características relevantes na esfera organizacional, alguns autores propuseram que, em face de se autopreservar, a burocracia tende a negligenciar aqueles com maior necessidade de seus serviços, mesmo que sejam aqueles para os quais ela foi criada, ou aqueles com maiores dificuldades90. O acesso equânime define quem deve ou não ter acesso, a que custo, e para quais serviços. Essa questão coloca o foco da discussão dos cuidados de saúde no patamar da avaliação econômica e da dimensão ética86. No Brasil, país marcado por profundas desigualdades sociais, as medidas de saúde e sociais tendem a expressar mais as barreiras contra o acesso do que as reais necessidades de saúde da população66. Nesse sentido, acesso é, frequentemente, referido quanto às necessidades médicas não satisfeitas, como a demora experienciada em conseguir cuidados médicos, a existência de uma fonte comum de cuidado ou o número de visitas ao médico. É, ainda, caracterizado como o grau de hospitalizações evitáveis, ou condições sensíveis ao cuidado ambulatorial. É necessário medir outros aspectos, na perspectiva de dimensionar o tipo e a organização dos serviços, viabilizando a avaliação de aspectos mais ampliados da propriedade acesso77. 65 Acesso a medicamentos Uma definição de acesso a medicamentos foi proposta por Bermudez e colaboradores (1999 apud Oliveira e colaboradores93), como a “relação entre a necessidade de medicamentos e a oferta dos mesmos, na qual essa necessidade é satisfeita, no momento e lugar requeridos pelo paciente (consumidor), com a garantia de qualidade e a informação suficiente para o uso adequado”. A Figura 4-1 representa a concepção da OMS sobre acesso a medicamentos. Entre os fatores que influenciam o acesso a medicamentos essenciais, a OMS destaca que a seleção de medicamentos deve ser racional, os preços devem corresponder à capacidade de pagamento de provedores e usuários, o financiamento deve ser sustentável e os sistemas de suprimento e de saúde, confiáveis94. Incluindo o uso racional de medicamentos, as dimensões correspondem à acessibilidade de medicamentos. 66 Figura 4-1 – Modelo de acesso a medicamentos da Organização Mundial da Saúde Fonte: World Health Organization94 Em estudos mais recentes, podem-se observar medidas de acesso a medicamentos baseadas na conceituação de acesso como uso, e de acessibilidade como atributo do serviço. As medidas, definidas por Wagner e colaboradores95, em estudo sobre acesso a cuidados e a medicamentos, a partir de dados de levantamento em 70 países, exemplificam essa abordagem: “adulto informante ou uma criança que necessitou de cuidado para uma condição que usualmente requer tratamento com medicamentos e que reportou receber cuidado”; “adulto informante com no mínimo uma doença crônica, tratado ou que reportou tomar medicamentos para a condição nas duas semanas anteriores”; e “adulto informante ou uma criança que necessitou cuidado para uma condição que, usualmente, requer tratamento com medicamentos, recebendo todos ou a maioria dos medicamentos necessários”. Medidas adicionais distintas foram empregadas para expressar acessibilidade. A prescrição e a dispensação influenciam o uso de medicamentos, na concepção de Kloos e colaboradores96, agregando aos aspectos de 67 acessibilidade de medicamentos as questões da utilização. Seus resultados incluíram a classificação da acessibilidade de diversos serviços farmacêuticos, e os aspectos relacionados ao uso de medicamentos, em Addis Ababa, na Etiópia. Miralles e Kimberlin97 distinguem o uso de medicamentos do uso de serviços de cuidados de saúde, argumentando que medicamentos são bens (em vez de serviços) que estão disponíveis para o público, de forma, relativamente, não controlada pelas instituições profissionais. Em seu estudo, empregam o modelo de Utilização de Serviço de Saúde11 na investigação de aspectos da acessibilidade de serviços de saúde e serviços farmacêuticos, e do uso de medicamentos em áreas do Rio de Janeiro, no Brasil. Assim, a definição de acesso a medicamentos precisa ser ampliada para explicar o uso de medicamentos por meio de uma prescrição de um profissional de saúde, e por automedicação98. Frost e Reich99 apresentam um quadro teórico de acesso a medicamentos, que incorpora os aspectos de disponibilidade e acessibilidade financeira (affordability), e introduz o conceito de adoção, que parece ser baseado no de aceitabilidade de Penchansky e Thomas85. De acordo com Bigdeli e colaboradores100, adoção refere-se à demanda pelo insumo, em todos os níveis. Embora considerem que a forma “como as pessoas realmente usam a tecnologia desempenha um papel importante sobre os efeitos finais produzidos”, o uso de medicamentos corresponde a um aspecto na subdimensão “adoção”. A acessibilidade a medicamentos implica o funcionamento de um sistema de gestão farmacêutica, que inclui os serviços farmacêuticos, e os medicamentos propriamente ditos101. Os serviços farmacêuticos aqui referidos têm um sentido semelhante ao que se denomina, no Brasil, Assistência Farmacêutica2. Oscanoa101 critica os estudos de utilização e acessibilidade de medicamentos baseados nos indicadores da OMS, justificando que os resultados avaliam o acesso a medicamentos de forma muito específica, “em seu estado puro”. O autor exemplifica o argumento, citando os serviços de cuidados de pacientes com doenças 68 crônicas, em que a prescrição de medicamentos apresenta validade prolongada, requerendo o acesso mais ágil a medicamentos do que a serviços de assistência médica. Bigdeli e colaboradores100 propuseram uma perspectiva do sistema de saúde sobre o acesso a medicamentos. Em sua visão holística, os autores argumentam que colocam a população no centro e categorizam as barreiras ao acesso por níveis do sistema de saúde, incluindo como barreiras: (1) indivíduos, famílias e comunidades; (2) distribuição de serviços de saúde; (3) setor saúde; e (4) acima do setor saúde, os contextos nacional e internacional. A articulação proposta organiza, de forma não linear e, realmente, mais dinâmica, os aspectos da acessibilidade. Embora os fatores afetando o uso tangenciem as dimensões do modelo, os usos de serviços e de medicamentos, propriamente ditos, não aparecem. Ao se comparar as principais dimensões que compõem os quadros teóricos sobre acesso a medicamentos na literatura (Tabela 4-1), três aspectos chamam atenção: (1) a dominância dos fatores relacionados à acessibilidade nos quadros teóricos adotados; (2) a presença das dimensões disponibilidade e acessibilidade financeira em todos os modelos e conceitos analisados; e (3) a existência de poucos marcos teórico-conceituais, que considerem o uso de medicamentos e de serviços, e o uso racional de medicamentos em seu arcabouço conceitual. Nessa comparação, os trabalhos foram selecionados pela importância histórica, institucional ou pela discussão inovadora apresentada. Tabela 4-1 – Análise da composição do marco teórico presente em trabalhos publicados sobre acesso a medicamentos Trabalho analisado Dimensões A B C D E F G H Ano 1986 1998 1999 2003 2004* 2008† 2012§ 2012 Disponibilidade Acessibilidade geográfica Adequação Acessibilidade financeira†† Aceitabilidade Uso racional de medicamentos Uso de medicamentos Uso de serviços farmacêuticos Qualidade Legenda: A – Kloos e cols. 96; B – Miralles e Kimberlin97, C – Bermudez apud Oliveira e cols.93; D – OMS98; E – OMS94; F – Frost e Reich99; G – Oscanoa101; H – Bigdeli e cols.100. (*) Embora descreva indicadores de uso de medicamentos sob o título de uso racional de medicamentos, as variáveis correspondem à acessibilidade de medicamentos; (†) Introduzem conceito denominado “adoção” que parece incorporar a concepção de adequação referente à demanda em todos os níveis; (§) Propõe reunião dos parâmetros de acessibilidade sob a denominação “usabilidade”; (††) Alguns trabalhos distinguem a capacidade de pagamento do financiamento de medicamentos. Fonte: Elaborada pelo autor 69 70 Acesso como processo tecnológico em saúde A tecnologia em um sentido mais abrangente é entendida como “constituída pelo saber e por seus desdobramentos materiais e não materiais na produção dos serviços de saúde”102. Esta ótica vai ao encontro da premissa de que os serviços de saúde constituem modelos tecnológicos que podem ser caracterizados, conforme o grau de incorporação tecnológica, em atenção básica, secundária e terciária e, ainda, quanto ao tipo de propriedade, em privada, estatal e outros. O modelo tecnológico ou modalidade assistencial pode ser definido como “um modo como são produzidas as ações de saúde e a maneira como serviços de saúde e o Estado se organizam para produzi-las e distribuílas”68,103. As unidades de saúde seriam, portanto, “uma forma tecnologicamente específica de atenção, que envolvem síntese de saberes e complexa integração de ações individuais e coletivas, com finalidades curativas e preventivas, assistenciais e educativas”104 p.742, e constituem uma importante “porta de entrada” da atenção à saúde em nosso país105. Os medicamentos constituem um componente tecnológico essencial nos sistemas de saúde biomédicos. Araújo e colaboradores propõem que seu gerenciamento no sistema dê-se pelas chamadas tecnologia de gestão (estratégias e procedimentos para o abastecimento e acesso a medicamentos) e tecnologia de uso de medicamentos (estratégias e procedimentos para o uso racional e efetivo dos medicamentos)103,105. A prática, no sistema de saúde brasileiro, tem circunscrito os medicamentos às atividades de aquisição e distribuição, ou seja, a garantia de acesso, entendido como disponibilidade, aos medicamentos sem compromisso com a racionalidade da prescrição e do uso15,103. A tecnologia de uso dos medicamentos, mais especificamente, o processo de atendimento, é representada pela relação direta do profissional com o usuário do medicamento, a qual ainda é incipiente 71 nos setores público e privado103,105. No entanto, o uso de medicamentos é cada vez mais onipresente, e as consequências negativas desse uso, cada vez mais comuns. Os medicamentos têm sido a principal causa das intoxicações registradas no país. As crianças de zero a quatro anos foram as mais atingidas por intoxicações medicamentosas4. Entre 1993 e 1996, observou-se um incremento de 17% das intoxicações por medicamentos, que correspondem a mais de um quarto das intoxicações ocorrendo no Brasil, conforme análise de dados produzidos pelo Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas – SINITOX. A maioria dos casos de intoxicação é acidental e, em tese, prevenível3. Também se observa, como consequência das iniquidades no acesso ou, ainda, irracionalidades no uso106, o incremento na prevalência de resistência microbiana no nível hospitalar. O Brasil está entre os maiores consumidores mundiais de medicamentos e, mesmo assim, a iniquidade no acesso é considerada ainda muito relevante no país107. Dados da Organização Mundial da Saúde estimam que até 30% da população mundial, ou entre 1,3-2,1 bilhões de pessoas não têm acesso aos medicamentos de que necessitam; e ainda, que a iniquidade no acesso mostra uma clara correlação com o nível econômico dos países. Holdford e Smith108 relataram a superestimação do impacto do serviço farmacêutico sobre os desfechos em saúde em face das evidências empíricas disponíveis. A influência dos serviços farmacêuticos no manejo de farmacoterapias permanece obscura nos estudos empíricos mais recentes109-111. De acordo com Paterson e colaboradores112, a interpretação de desfechos (outcomes) “que pode ser apropriada para ensaios clínicos e produtos farmacêuticos, é problemática quando usada em avaliações de intervenções complexas”. As mudanças do estado de saúde seriam o resultado da interação de determinada intervenção com o processo e o contexto na qual ela ocorre, ao longo do tempo. 72 Entre os principais fatores considerados influenciar o acesso a medicamentos estão o uso racional, o financiamento justo e sustentável, os preços acessíveis e os sistemas de abastecimento e de saúde confiáveis94,113,114. A gestão de medicamentos, como uma tecnologia de serviço de saúde, sugere que a busca por tecnologias adequadas na promoção do uso racional dos medicamentos, no sistema de saúde brasileiro, deve passar, antes, pela avaliação do estágio atual de sua organização, como parte indissociável do modelo de atenção à saúde. O desafio fundamental é transformar o investimento nos medicamentos em incremento à saúde, na perspectiva do SUS103,105. As questões centrais subjacentes a esse desafio são: Que características um serviço com essa finalidade deve possuir? Essas características estão presentes nos serviços farmacêuticos? Considerações finais A característica polissêmica do construto acesso tem causado confusão para o desenho e interpretação de estudos de acesso a serviços de saúde e a medicamentos. Dar maior precisão conceitual a esses atributos pode aprimorar as discussões em torno dessa questão. Assim, neste trabalho assume-se que acesso a medicamentos é um atributo comportamental do usuário e pode ser definido como o uso de medicamentos em processos de cuidados, estabelecidos em face de necessidades de saúde deste indivíduo. Esse acesso é influenciado por diversos fatores. Destacam-se as dimensões de acessibilidade, cuja influência sobre o acesso, provavelmente, é a questão mais prevalecente na literatura. Define-se acessibilidade como as características estruturais, organizacionais e financeiras de serviços, incluindo as questões relativas ao insumo medicamento, que os tornam disponíveis, e viabilizam e facilitam o acesso (uso) das pessoas. Um corpo específico de conhecimentos e a atuação profissional correspondente são necessários para contribuir para a qualificação do 73 acesso a medicamentos, coerente com as necessidades de saúde da população, acessíveis nos diferentes níveis de atenção à saúde, efetivo no alcance dos desfechos pretendidos, e viável financeiramente. Historicamente, essas metas e as políticas respectivas estão relacionadas aos serviços farmacêuticos. Para avançar, é necessário definir, tecnologicamente, os serviços farmacêuticos como um elemento de acessibilidade e modulador do acesso a medicamentos. 5 PESQUISAS DE ACESSO A MEDICAMENTOS: REVISÃO DA LITERATURA E ANÁLISE BIBLIOMÉTRICA 77 Este artigo analisa as concepções teóricas subjacentes aos trabalhos que têm como tema o acesso a medicamentos. A revisão busca estabelecer relação entre o acesso a medicamentos e componentes como a disponibilidade, o financiamento e o uso racional de medicamentos. Pesquisas de acesso a medicamentos: revisão da literatura e análise bibliométrica Resumo O objetivo deste artigo é analisar as concepções teóricas subjacentes aos trabalhos sobre acesso a medicamentos. Uma revisão da literatura foi conduzida buscando estudos relativos ao acesso a medicamentos publicados em inglês, espanhol ou português, sem restrição da data de publicação. Os estudos deveriam focar trabalhos que têm o acesso como atributo principal do objeto de investigação, usando as seguintes bases de dados: PubMed/Medline, LILACS e SciElo. As buscas resultaram em 112 artigos incluídos, publicados entre os anos de 1996 e 2011. A revisão permitiu evidenciar a pouca explicitação das concepções teóricas nos trabalhos de pesquisa sobre o acesso a medicamentos. Os estudos focam no acesso a medicamentos específicos, seguido do financiamento para aquisição de medicamentos, que é também a concepção mais frequente nos trabalhos. A análise denota a proeminência do produto medicamento nas pesquisas teóricas e empíricas. Nos estudos, o uso racional de medicamentos aparece com baixa frequência, e a relação entre o acesso a medicamentos e o uso de serviços de saúde é também pouco explorada. Enquanto em outros campos profissionais, a referência ao acesso é sempre associada a um serviço assistencial, no campo farmacêutico, o acesso está, quase que exclusivamente, ligado ao medicamento. Apoio/Financiamento: PGFAR/UFSC; Fundo de Apoio à Pesquisa/UNIVILLE. 78 Palavras-chave: Estudo de utilização de medicamentos; avaliação, acesso e qualidade nos cuidados de saúde; serviços farmacêuticos; acesso a medicamentos. Abstract The objective of this paper is to analyze the theoretical concepts underlying the work on access to medicines. We conduct a literature review to seek studies relating to access to medicines published in English, Spanish or Portuguese, with no restriction on publication date. Studies should focus works that has the access as the main attribute of the research object, using the following databases: PubMed / Medline, LILACS and SciELO. The searches resulted in 112 included papers, published between the years 1996 and 2011. The review has highlighted the lack of explanation of the theoretical concepts in research papers about access to medicines. The studies focuses in access to specific drugs, followed by funding to purchase drugs, which is also the most common design in the works. The analysis demonstrates the prominence of the drug product in theoretical and empirical researches. In the studies, the rational use of drugs appears with low frequency, and the relationship between access to medicines and the use of health services is also little explored. While in other professional fields, the reference to access is always associated with a health care service, in the pharmaceutical field, access is almost exclusively linked to medicines. Support: PGFAR/UFSC; Fundo de Apoio à Pesquisa/UNIVILLE. Keywords: Drug Utilization Studies; Evaluation; Access and Health Care Quality; Pharmaceutical Services; Access to Medications. Introdução 79 O estabelecimento do conceito de medicamentos essenciais pela Organização Mundial de Saúde e de uma lista a ser adaptada por seus países membros, a partir da década de 1970, pode ser considerado um marco importante na discussão sobre o acesso a medicamentos nas ações de saúde no mundo115. Embora o acesso a medicamentos tenha se tornado uma preocupação onipresente de governos, instituições provedoras de cuidados, profissionais de saúde e usuários de serviços, pouca reflexão teórica foi desenvolvida sobre o tema nas últimas quatro décadas. Travassos e Martins12 e, mais recentemente, De Jesus e Assis116 revisaram a literatura para discutir o conceito de acesso a serviços de saúde. O acesso a serviços de cuidados de saúde é um “fenômeno multidimensional relativamente complexo”76. Aday e Andersen23 relataram o pouco desenvolvimento das definições de acesso, conceitual ou empírica. No contexto dos serviços de saúde, houve uma evolução no sentido de estabelecer o acesso a serviços de saúde como um atributo, a partir de modelos teóricos que contribuíram para explicar suas múltiplas dimensões e influências. O desenvolvimento conceitual do acesso a medicamentos constitui um imperativo científico desafiador e fundamental para permitir relacionar a efetividade das ações ao acesso, com implicações sobre a gestão e a alocação dos recursos do setor saúde. Para propor um caminho inicial a esse desenvolvimento, realizou-se a revisão da literatura e a análise bibliométrica, buscando responder a dois questionamentos principais: que concepções de acesso a medicamentos estão presentes na literatura? e como essas concepções se relacionam com os pressupostos explicativos do uso de serviços de saúde? Tomando-se como referência as proposições teóricas elaboradas por Andersen e Davidson76 para o acesso a serviços de saúde, o presente estudo tem como objetivo analisar as concepções teóricas subjacentes aos trabalhos sobre acesso a medicamentos. 80 Métodos Fonte de dados e estratégias de busca A revisão bibliométrica da literatura buscou estudos publicados em inglês, espanhol ou português, sem restrição quanto à data de publicação, usando as seguintes bases de dados: PubMed/Medline (U.S. National Library of Medicine/National Institutes of Health database), LILACS (Latin America and Caribbean Health Science) e SciElo (Scientific Electronic Library Online). As bibliografias dos artigos selecionados foram buscadas para referências não detectadas por meio eletrônico. O período de publicação definido para busca foi até agosto de 2011. A busca por artigos relevantes seguiu três passos: 1) definição e busca dos termos Mesh e palavras-chave nas bases de dados; 2) avaliação prévia dos artigos retornados; e 3) recuperação do texto integral e revisão crítica. Cada artigo foi avaliado por um pesquisador treinado, analisando o objeto de estudo descrito no título, resumo ou no texto, visando sua seleção. Critérios de inclusão e exclusão: foram incluídos artigos que tinham o acesso ou aspectos relacionados (ex: disponibilidade, financiamento, acessibilidade e suas variações) como atributo do objeto de estudo medicamentos. Excluíram-se artigos não publicados em periódicos com revisão por pares, editoriais, relatos e apresentações em congressos, comentários, pontos de vista, notícias, cartas ao editor, livros no todo ou suas partes, entrevistas, e relatórios não científicos. Artigos tendo o uso de medicamentos ou de serviços de saúde como foco de estudo, embora apresentassem íntima relação com acesso, foram excluídos. Artigos que respeitavam o critério de inclusão, mas que tratassem de plantas medicinais e derivados, medicamentos derivados de plasma, ou estudos que envolvessem o ambiente hospitalar, exclusivamente, também 81 foram excluídos. Os estudos deveriam satisfazer a todos os critérios de seleção. Os termos Mesh empregados foram combinados com palavras-chave específicas, conforme o Quadro 5-1. Quadro 5-1 – Combinações de termos Mesh e palavras-chave empregadas nas buscas às bases de dados Termo Mesh Palavra-chave combinada “Drug Utilization Review”; “Pharmaceutical “Access” services”; “Community pharmacy”; “Pharmacoepidemiology”; “Medication Adherence”; “Medication Systems”; “Medication Errors”; “Medication Therapy Management”; “Self Medication”; “Economics, Pharmaceutical”. “Health Care Quality, Access, and Evaluation”; “Medication “Health Services Accessibility” access”; “Pharmaceutical access”. “Drug access”. Fonte: Elaborado pelo autor. Extração de dados, análise bibliométrica e de conteúdo Constituem os parâmetros analisados sistematicamente: ano do estudo (ANO); tipo (TIP) e a natureza (NAT) do estudo; o foco (FOC) e a população (POP) da pesquisa. E explicitam-se a concepção de acesso a medicamentos (explícita ou subjacente – EXP); as concepções de acesso como o número de pessoas recebendo medicamento (A), acesso ao serviço de saúde com uso de medicamentos (B), disponibilidade de produto (C), acesso financeiro (D) e uso racional de medicamentos (E); a indicação de estratégias para ampliar o acesso (AMP) como a 82 identificação de barreiras (BAR), provisão de medicamentos (PRO), exemplos de abordagem de ampliação (EXE), desenvolvimento de política (POL), ampliação de financiamento (AFI) e a discussão de patentes (PAT); e a menção aos termos disponibilidade (DIP), acessibilidade (ACB), necessidade (NEC), financiamento (FIN) e uso racional de medicamentos (URM) ou suas variações relacionadas. A matriz teórica encontra-se no apêndice do trabalho, transcrita na íntegra. A análise bibliométrica foi conduzida com todos os estudos incluídos. Todas as entradas foram classificadas por ano de publicação, autor e referência completa. O Endnote X5® software (Berkeley, Calif: Thomson Scientific) para indexar as referências, e Microsoft Excel® para tabular os indicadores e elaborar a estatística descritiva. Análise com a estatística R2 foi empregada para verificar o grau de ajuste da linha de tendência de tempo. Resultados Busca na literatura A estratégia de busca retornou 112 artigos. A Figura 5-1 apresenta fluxo de informações na seleção dos artigos identificados no processo de busca. 83 Figura 5-1 – Diagrama de fluxo do processo de busca e seleção de artigos para a revisão Fonte: Elaborada pelo autor Descrição e qualidade dos estudos incluídos Do total de artigos, mais de 75% foram publicados após o ano de 2003, sendo que cerca de 50% são posteriores a 2007. A Figura 5-2, a seguir, apresenta a evolução no número de publicação ao longo dos anos. O valor de R-quadrado de 0,81 sugere um crescimento significativo das publicações sobre acesso a medicamentos nos últimos 16 anos, mais acentuado a partir de 2004. 84 32 35 n de artigos 30 25 22 21 20 15 7 10 5 11 12 2002 2004 R² = 0,8106 5 2 0 1996 1998 2000 2006 2008 2010 Ano de publicação do artigo Figura 5-2 – Número de artigos sobre acesso a medicamentos em relação ao ano de publicação no período até agosto de 2011 Fonte: Elaborada pelo autor Os objetos dos artigos foram classificados em cinco categorias para agregá-los de acordo com os principais temas discutidos. A maioria dos estudos investigou o acesso a medicamentos específicos (n=43) e o financiamento de medicamentos que, até 2005, era o segundo tema investigado, perdeu a posição para a categoria “outros temas”. A categoria “outros temas” inclui a combinação de dois ou mais temas das categorias relacionadas117-121, o acesso judicial a medicamentos122-124, acesso e uso de medicamentos97,125,126, o acesso como direito humano127,128, o acesso e as patentes de medicamentos129,130, entre outros. Apenas três estudos de natureza teórica descreveram de alguma forma o percurso metodológico131-133 e 73 estudos utilizaram metodologia empírica. As frequências dos estudos incluídos nas categorias e dos classificados como investigações empíricas são descritas na Tabela 5-1. 85 Tabela 5-1 – Categorias de focos de investigação e frequência de trabalhos empíricos entre os estudos incluídos na revisão Foco do estudo Barreiras de acesso a medicamentos Disponibilidade de medicamentos Financiamento para aquisição de medicamentos Acesso a medicamentos específicos Outros focos de pesquisa Total de estudos incluídos Fonte: Elaborada pelo autor Estudos n. (%) 11 (9,8) 13 (11,6) 22 (19,6) n. de estudos empíricos 8 13 12 43 (38,4 23 (20,5) 112 23 17 73 Os estudos com foco sobre as barreiras de acesso a medicamentos em diversos contextos incluíram, principalmente, o financiamento e a disponibilidade como barreiras ao acesso, mas também as relacionaram à prescrição, à produção, à seleção e à acessibilidade134,135. Cohen e colaboradores136 adotaram uma concepção de maior amplitude, envolvendo subdimensões e medidas de aprovação e velocidade de aprovação de medicamentos para o mercado, custo e pagamento, condições de reembolso, e regularidade da disponibilidade de medicamentos para a população, entre outros. Bigdeli e Annear131 estudaram as barreiras físicas, financeiras, qualidade do cuidado, conhecimento dos usuários e fatores socioculturais como categorias de barreiras para o acesso. Sterckx137, discutindo questões éticas quanto às patentes e o acesso a medicamentos em países em desenvolvimento, aponta que as regras sobre patentes de medicamentos não deveriam impedir a adoção de políticas nacionais para promover o acesso a medicamentos. Os estudos cujo foco é a disponibilidade de medicamentos são trabalhos empíricos. A disponibilidade de um medicamento individual é dada pelo número de estabelecimentos que tem o medicamento específico. Estudando o manejo da malária em Gana, Buabeng e colaboradores138 86 concluíram que a disponibilidade pobre de medicamentos chaves tem implicações para o tratamento da população. No entanto, Nunan e Duke139 identificaram que o aumento da disponibilidade de medicamentos, desacompanhada da equidade no acesso, não trazia os benefícios esperados. Os artigos classificados na categoria financiamento para aquisição de medicamentos tratam do preço, da capacidade de pagar por medicamentos e da aquisição destes, dos impostos incidindo sobre os produtos, das patentes, do licenciamento compulsório e da necessidade de inovação em novos fármacos. Iniquidades sociais e nos serviços de saúde, e requisitos regulatórios para medicamentos são assuntos recorrentes em estudos com foco sobre o financiamento. Mercurio140 advoga que, por si só, o regime TRIPS para proteção patentária não explica o acesso precário a medicamentos essenciais. O preço dos medicamentos constitui uma das maiores barreiras ao acesso141, com a economia livre de mercado podendo ser um obstáculo relevante142. O custo mais elevado por paciente pode reduzir o uso do serviço de cuidado, com consequências negativas sobre os desfechos em pessoas com baixa renda. Medicamentos genéricos são discutidos como um elemento importante para reduzir os preços de medicamentos143. O termo acessibilidade apresenta mais de um sentido nos artigos pesquisados. A acessibilidade financeira, às vezes chamada de capacidade de pagamento, corresponde ao termo em inglês “affordability”. Por outro lado, o termo acessibilidade pode se referir às distâncias geográficas ou ao tempo de espera por um recurso ou serviço, correspondendo ao termo “accessibility”. A acessibilidade financeira pode ser expressa como o número de dias de trabalho necessários para pagar um período de tratamento144,145. Medicamentos prescritos e dispensados deveriam ser racionais, acessíveis e custeáveis (“affordable”) pela população em geral144. O contingenciamento de recursos, que comprometa a disponibilidade de medicamentos nos serviços, pode provocar o aumento global dos custos de provisão dos 87 serviços de saúde, superando a economia obtida no custeio dos medicamentos132. O foco no acesso a medicamentos específicos incluiu uma grande faixa de possibilidades, entre as quais medicamentos essenciais146-149, antirretrovirais para HIV/AIDS150,151, medicamentos psicoativos152,153, contracepção de emergência154, anti-hipertensivos155,156, entre outros. O acesso a medicamentos essenciais como tema foi muito recorrente nesse grupo, e essa importância pode estar relacionada à assunção de que o conceito de medicamentos essenciais é uma estratégia chave para melhorar o acesso146. Dezessete estudos tinham pacientes vivendo com HIV/AIDS como a população da pesquisa, desses, 6 eram estudos empíricos. A maioria dos estudos abordava o financiamento como concepção de acesso (n=8). O acesso a medicamentos antirretrovirais constituiu o objeto de pesquisa em 12 trabalhos; um trabalho discutiu financiamento157; um analisou as barreiras de acesso a esses medicamentos158; outro discutiu a relação entre uso dos medicamentos e o acesso126; e dois estudos discutiram a questão da propriedade intelectual129,130. Na categoria de outros estudos, o uso de medicamentos, acesso judicial e uma combinação mais complexa das outras categorias formaram o objeto de pesquisa. Um estudo concluiu que o preditor de acesso mais relevante foi o tipo de provedor de serviço de cuidado; por exemplo, a taxa de prescrição de medicamentos foi mais elevada entre os provedores privados159. Krusi e colaboradores160 discutem as evidências das interações entre fatores ambientais, sociais e estruturais na mediação de desfechos do acesso e da adesão de usuários de medicamentos injetáveis antirretrovirais altamente ativos. Outro estudo postula que “as metas da política são tornar disponíveis todo o tempo, à população nigeriana, suprimentos adequados de medicamentos, que sejam efetivos, acessíveis financeiramente, seguros e de boa qualidade, para garantir uso racional de tais medicamentos e estimular o aumento 88 local da produção de medicamentos essenciais”161. Esses exemplos permitem deduzir que se tratam de estudos com quadros teóricos mais complexos. Distribuição das concepções sobre acesso a medicamentos Embora os estudos incluídos nesta revisão tenham em comum o acesso a medicamentos como objeto de pesquisa, ainda que em contextos diversos, entre os 112 trabalhos analisados, em apenas 34 encontrou-se a explicitação da concepção de acesso a medicamentos. Consideramos que o estudo apresentava a concepção quando, por meio da análise descritiva de conteúdo, os pressupostos relacionados ao acesso a medicamentos eram descritos no decorrer do trabalho. Mesmo sem uma descrição formal da concepção na maioria dos trabalhos, foram analisadas a presença e a frequência de fatores como necessidade, acessibilidade, disponibilidade, financiamento, uso racional de medicamentos, cobertura, e os aspectos relacionados a esses fatores para inferir os pressupostos teóricos que sustentam a concepção de acesso em cada estudo. A Tabela 5-2 relaciona as categorias estabelecidas, uma breve descrição e os estudos que nelas se enquadram. A inclusão em mais de uma categoria era admitida, assumindo que os estudos podiam incorporar mais de um aspecto como pressuposto do acesso a medicamentos. A concepção predominante foi o financiamento de medicamentos, ao qual se atribuiu a frequência de 77 estudos, seguida da disponibilidade com 43 estudos. Tabela 5-2 – Categorias de concepções de acesso presentes em pesquisas sobre acesso a medicamentos Ctg A B C D Descritor Descrição Referências Acesso à cobertura Número de pessoas que recebem ou são tratadas com determinado medicamento ou um conjunto deles. Ampliar o acesso significa aumentar o número de pessoas recebendo medicamento. 117,120,122,124,127,133,134,136,140,147,15 Acesso ao tratamento Considera o acesso de forma mais ampliada, não o limitando apenas à disponibilidade do tratamento. Aqui pode ser considerada a existência de pessoal treinado para prover o tratamento, aspectos culturais de usuários e provedores, uso de medicamentos, modelos teóricos mais complexos, entre outros. 97,123,125,126,128,133- Considera a disponibilidade do medicamento como a principal dimensão do acesso. Garantir que os medicamentos estejam constantemente disponíveis e em condições de qualidade adequada constitui a principal meta. 97,118,119,121,125,132,136,138,139,143,145 Refere-se ao financiamento público, cobertura de seguro ou pagamento direto por medicamentos. Refere-se também à capacidade de pagamento, ao nível de gastos com medicamentos e aos aspectos de precificação de medicamentos em um país. 97,117-122,124,125,129-131,135-138,140- Disponibilidade Financiamento 0,152,157,162-179 136,138,140,150,155,160,162,163,165,167,17 1,178,180-190 ,146,150,153,154,156,158,161,165,167169,176,180,181,183,190-206 149,151-153,156159,161,164,165,167,168,170,175,178180,182,184,190,192-194,196-200,203,206227 E Uso Racional de Medicamentos O acesso a medicamentos é relacionado à racionalidade da prescrição e ao uso adequado dos produtos pelos usuários, incluindo aspectos de adesão ao tratamento. 123,124,138,155,160,167,189,190,192,197,20 0,205,206,211 Legenda: Ctg: categorias. Fonte: Elaborada pelo autor. 89 90 Discussão Poucos estudos explicitam a concepção de acesso a medicamentos. A opção por pressupostos teóricos, que ajudem a delimitar o objeto e, no caso do acesso a medicamentos, qualificá-lo como atributo do usuário, permite maior objetividade de análise, e precisão na verificação. Enunciar o significado do acesso a medicamentos, considerado em cada contexto específico, é fundamental no desenvolvimento do trabalho e na interpretação dos resultados228. A utilização de termos sem uma definição formal e a investigação empírica sem um quadro teórico claramente definido a sustentá-la levam ao emprego irrefletido de pressupostos teóricos e empíricos, com reflexos sobre a compreensão dos fenômenos. Mesmo quando não compunha a concepção de acesso adotada no estudo, o termo financiamento ou relacionados (acessibilidade financeira, custo, preço, gasto, capacidade de pagamento) foi mencionado em todos os trabalhos. Os aspectos de gastos com medicamentos, a disponibilidade de financiamento, os custos dos produtos e a formação de preços são discutidos em muitos estudos. Um sentido relevante para o aspecto financeiro no contexto do acesso a medicamentos é sua caracterização como barreira de acesso, como feito por Casey163, por Cohen136 e respectivos colaboradores. Vários estudos ressaltam os limites de recursos existentes para garantir o acesso a medicamentos. O financiamento do acesso a medicamentos mostra grande variabilidade quanto a sua organização e natureza (financiamento público, seguro com cobertura de medicamentos, copagamento, pagamento direto). Em comum, pode-se elencar a escassez de recursos, o foco no financiamento do produto e o aumento de despesas e custos relacionados a medicamentos. Embora qualquer concepção teórica sobre acesso a medicamentos precise incluir o financiamento como um componente relevante, o 91 acesso não pode ser reduzido a ele. Outro limite que pode ser inferido dos trabalhos analisados é a grande preocupação em garantir o financiamento do produto e a quase ausência da discussão sobre a estruturação financeira de serviços, visando garantir a provisão e o uso adequado dos insumos. Embora seja legítimo garantir a aquisição do produto em um contexto de escassez de recursos, para a efetividade pretendida, cada vez mais são prementes investigações sobre a suficiência da disponibilidade do medicamento dissociada de um serviço de dispensação. O financiamento influencia o acesso a medicamentos tanto com relação ao indivíduo, quanto no nível contextual. Incapacidade de pagamento163, complexidade de custos e gastos relacionados a medicamentos132, cobertura de serviços e seguro207 e a questão de precificação, relacionada inclusive com a produção nacional de medicamentos135,136,180, são fatores potencialmente limitantes do acesso. Sua avaliação nos diversos contextos de organização dos sistemas nacionais de saúde permite aprofundar a dinâmica e magnitude dessa influência, e aprimorar a elaboração de políticas e operacionalização de intervenções no sentido de ampliar o acesso. Para isso, é necessário localizar teoricamente o financiamento no contexto do acesso a medicamentos, de forma a explicitar as relações com as outras dimensões e posicionar a interpretação dos resultados dentro dos limites apropriados. Andersen e Davidson76 distinguem o acesso potencial, que se refere aos recursos disponibilizados nos níveis contextual e individual, e constitui meio para utilização, do acesso realizado, que corresponde ao uso efetivo do serviço. Analogamente, pode-se caracterizar que alguns aspectos do acesso a medicamentos podem ser tipificados como acesso potencial. Aqui, pode-se incluir a maioria dos aspectos financeiros relacionados ao acesso, a disponibilidade de medicamentos, assim como a 92 disponibilidade de serviços e outros recursos indispensáveis para receber os medicamentos. Desde o estabelecimento da política de medicamentos essenciais da OMS, pode-se constatar grande ênfase sobre o acesso potencial, tanto no âmbito das intervenções, quanto no campo da investigação científica. Garantir a disponibilidade do produto medicamento e dos recursos financeiros para sua aquisição de forma sustentável tem sido uma das principais metas estabelecidas nas políticas nacionais dos países membros da OMS. Em outros campos profissionais, observa-se uma preocupação com a garantia do acesso ao processo assistencial ou às ações de prevenção, de acordo com as necessidades em saúde. O acesso no campo farmacêutico é quase que absolutamente referido como “acesso a medicamento”. Promove-se aí a dissociação do vínculo natural entre insumo e serviço, dando novo significado e importância ao primeiro. Esse fato, já consolidado mundialmente, mas pouco debatido sob as perspectivas dos direitos humanos fundamentais, sociológica e antropológica sustenta um paradigma singular para o medicamento no campo da saúde. Será que o princípio do acesso ao ‘produto’ medicamento, que guia as investigações nesse campo, admite o princípio concorrente da centralidade do sujeito no processo de cuidado? Nos estudos de acesso a medicamentos, o uso racional de medicamentos aparece com baixa frequência. Seja como parte do objeto, como qualificador do acesso, ou como dimensão da metodologia, o uso racional é, ainda, pouco considerado. Embora sua instituição pela OMS seja quase tão antiga quanto o advento dos medicamentos essenciais, e sua relação com o acesso evidente quando consideramos o conceito de acesso efetivo – enunciado por Andersen e Davidson76 – ainda são poucos os trabalhos capazes de relacionar o acesso a medicamentos e o uso racional. 93 Na perspectiva do medicamento empregado como insumo em um processo assistencial e de serviços de saúde organizados na lógica do cuidado integral, o uso racional de medicamentos pode ser compreendido como desfecho plausível de um serviço de dispensação229. Sua exploração nas investigações é vital para incrementar a compreensão de seu significado no processo de cuidado. O presente estudo apresenta algumas limitações que devem ser observadas em sua interpretação. Os artigos analisados apresentam grande amplitude metodológica, diferentes populações, objetos de estudo muito distintos, e desenhos de qualidade heterogênea. Além disso, nos estudos, incluem-se reflexões teóricas sem desenhos metodológicos explicitados. Essas características da seleção podem limitar a generalização de nossos achados. O limite da língua e a consideração, exclusivamente, de trabalhos publicados em periódicos indexados podem resultar na perda de referências relevantes ao escopo do trabalho, especialmente as publicações da chamada literatura “cinza” e em diversos idiomas. A definição dos parâmetros para formar a matriz de dados é arbitrária e a coleta de dados foi manual. 6 O MODELO COMPORTAMENTAL DO USO DE SERVIÇOS DE SAÚDE: UTILIZAÇÃO E ACESSO A MEDICAMENTOS 97 Este artigo apresenta a descrição do modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde de Andersen e colaboradores, e uma reflexão de sua aplicação teórica na utilização de medicamentos. A revisão crítica da literatura e a aplicação do modelo permitem construir um quadro teórico mais abrangente e próprio para a análise do uso de medicamentos. O modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde: utilização e acesso a medicamentos Resumo O trabalho descreve a aplicação teórica do modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde, proposto por Andersen e colaboradores, à análise da utilização de medicamentos. As características predisponentes, os fatores capacitantes e as necessidades afetam os comportamentos em saúde e o estado geral do indivíduo ou os resultados em saúde, e são afetados por esses domínios. Fatores demográficos, sociais e as crenças predispõem indivíduos a usarem medicamentos, evidenciando-se condições nas quais medicamentos são mais necessários, desejados ou demandados. As condições que facilitam ou impedem o uso constituem os fatores capacitantes, incluindo políticas de financiamento público, organização e distribuição de serviços com disponibilidade de medicamentos, e redução do preço de medicamentos. As necessidades percebidas e avaliadas exprimem as demandas individuais por medicamentos e a respectiva avaliação profissional, envolvendo aspectos relacionados à seleção de medicamentos, à prescrição e ao uso racional. Comportamentos em saúde envolvem automedicação e adesão ao tratamento, comportamento médico na prescrição, e utilização dos serviços de cuidados que empregam medicamentos. As relações do estado de saúde e da satisfação do paciente com o uso de medicamentos são abordadas 98 como resultados de saúde. Nesse contexto, o acesso potencial (acessibilidade) está relacionado à oferta de medicamentos ou a maior capacidade de obtê-los; o acesso realizado refere-se à obtenção real de medicamentos por pacientes; o acesso equitativo/inequitativo foca a capacidade de obter medicamentos, independente das condições socioeconômicas; o acesso efetivo relaciona-se ao uso de medicamentos que produzem resultados clínicos desejados; e o acesso eficiente, à obtenção desses resultados, ao menor custo possível. Os medicamentos como insumos nos cuidados de saúde parecem requerer um serviço que garanta o acesso e seu uso racional, e incremente os desfechos pretendidos. Palavras-chave: uso de medicamentos; acesso; serviços de saúde. The Behavior Model of the Health Services Use: Utilization and Access to Medicines Abstract The paper describes the theoretical application of the Behavioral model of Health Services Use to the analysis of drug use. The predisposing characteristics, enabling factors and needs affect health behaviors and general condition of the individual or health outcomes, and are affected by these fields. Demographic and social factors as well beliefs predispose individuals to use drugs, demonstrating conditions under which drugs are most needed, desired or demanded. The conditions that facilitate or impede the use constitute the enabling factors, including policies for public financing, organization and delivery of services with drug availability, and reduce the price of medicines. The perceived and assessed needs express the individual demands by drugs and their professional assessment, involving aspects related to drug selection, prescription and rational use. Health behaviors involve self-medication and treatment adherence, physician prescribing behavior and use of 99 care services that employ drugs. The relationship of health status and patient satisfaction with medication use are addressed as health outcomes. In this context, potential access (accessibility) is related to the supply of drugs or the greatest ability to obtain them. Realized access relates to the real way to get drugs by patients. Equitable/inequitable access focuses on the ability to obtain medications, regardless the socioeconomic conditions. Effective access relates to the use of drugs that produce desired clinical results. In addition, efficient access, to obtain these results at the lowest possible cost. Medications as inputs in health care seem to require a service that ensures access and rational use, and increase the desired outcomes. Keywords: drug use; access; health service Introdução O acesso aos serviços de cuidados de saúde é um fenômeno multidimensional complexo76 e uma medida de políticas de saúde230, sendo definido como o “uso real de serviços de saúde pessoais e tudo o que favorece ou impede o seu uso”76. Ao se comparar as diferentes definições de acesso a serviços de saúde com a definição de acesso a medicamentos da OMS, um aspecto é imediatamente ressaltado: a definição da OMS foca no produto e no sistema logístico para sua distribuição, enquanto, em outras áreas da atenção à saúde, o acesso refere-se à provisão do serviço, com suas rotinas específicas e insumos próprios. Bermudez apud Oliveira e colaboradores93 aponta elementos, em sua definição, que ampliam a concepção, para incluir ao produto rotinas que contemplem a provisão de informações sobre medicamentos ao paciente. Existem diversos modelos explicativos para a utilização de serviços de saúde. Travassos e Martins12 elaboraram uma revisão sobre os conceitos de acesso e utilização de serviços de saúde, que abordou alguns modelos 100 existentes e um sumário de suas características, e considerou-os construtos de natureza multidimensional e de complexidade analítica elevada. Resultados de estudos têm demonstrado haver relação entre o uso de serviços de saúde e o acesso77. A avaliação do acesso, medindo a real utilização dos serviços de saúde, permitiria analisar a validade do sistema de saúde em organizar e prover serviços que atendam às necessidades de uma população em risco23. Na realidade brasileira, a dispensação de medicamentos não inclui rotinas clínicas, que poderiam contribuir com os resultados em saúde de pacientes usando medicamentos. A partir do pressuposto que os medicamentos são insumos empregados na provisão de serviços de cuidados de saúde, pode-se refletir que existe uma lógica complexa para o uso de medicamentos também. Portanto, a construção da concepção de acesso a medicamentos faz mais sentido quando realizada tendo-se como quadro teórico analítico o uso de serviços de saúde. O modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde é o precursor entre os modelos explicativos para uso de serviços de saúde e está entre os mais populares nas investigações e análises dos sistemas de saúde12,77. Esse modelo traz elementos que traduzem a complexidade do uso de serviços de saúde e sua relação com o acesso. Nesse sentido, o objetivo deste artigo é descrever teoricamente a aplicação do modelo Comportamental de Uso de Serviços de Saúde para a análise do acesso a medicamentos. O modelo de Andersen O modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde desenvolvido desde a década de 1960 por Ronald Max Andersen e colaboradores76 foca os efeitos dos determinantes contextuais e dos individuais sobre a utilização de serviços. Neste artigo, na Figura 6-1, na sequência, é 101 reproduzida a representação gráfica do modelo. Nas seções seguintes descreveremos, brevemente, as dimensões e os fatores considerados no modelo e apresentaremos uma análise de sua relação teórica com o acesso a medicamentos, apoiados em dados da literatura que ilustrem a lógica desta relação. As características predisponentes, os fatores capacitantes e as necessidades afetam os comportamentos em saúde e o estado geral do indivíduo ou os resultados em saúde, e são afetados por esses domínios. Em relação ao uso dos serviços de saúde e aos desfechos obtidos, os fatores contextuais indicam a importância da comunidade, da estrutura e dos processos de provisão de cuidado; e as características individuais indicam as realidades pessoais de um ambiente de cuidados de saúde76. 102 Figura 6-1 – Representação gráfica do modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde Fonte: Andersen e Davidson76 (tradução do autor) 103 Características predisponentes Existem condições que predispõem os indivíduos a usar ou não os serviços de saúde, embora essas condições não influenciem diretamente o uso desses serviços76. Os fatores demográficos, os sociais e as crenças influenciam os fatores capacitantes. Babitsch, Gohl e von Lengerke231 citam que associações significativas foram atribuídas entre idade, etnicidade, estado conjugal, gênero e a utilização de serviços de saúde231. Estudos sobre a utilização de medicamentos também têm apontado correlações com esses fatores. Um estudo realizado em Minas Gerais apontou que mulheres idosas usam medicamentos mais frequentemente e em maior quantidade que homens, e que esse consumo aumenta com a idade232; perfis semelhantes foram encontrados em Pelotas (RS)233, Ponta Grossa (PR)234 e Campinas (SP)235. Na dimensão contextual, essas variáveis evidenciam as relações do perfil demográfico de uma comunidade com o uso de medicamentos, enquanto na dimensão individual representam, de forma geral, imperativos biológicos determinantes da probabilidade da ocorrência de doenças76, como, por exemplo, o aumento da prevalência de fatores de risco para doenças cardiovasculares entre idosos236, o que leva à necessidade do consumo de medicamentos. Outro exemplo vem de um estudo que demonstrou diferenças nos resultados do uso de estatinas entre pessoas brancas e não brancas237. A estrutura social é caracterizada por fatores como o status de uma pessoa na comunidade, sua habilidade para lidar com problemas de saúde e gerenciar os recursos para isso e qual a condição sanitária do ambiente físico76. Em estudos aplicando o modelo, encontraram-se relações entre a escolaridade, atividade ocupacional, renda familiar mensal per capita e outros, e a predisposição ao uso de serviços231. Essa característica está relacionada ao desenvolvimento social da comunidade e ao desenvolvimento humano de seus cidadãos. De forma 104 equivalente à demografia, também observamos variação no consumo de medicamentos em função desses fatores. O uso de medicamentos foi menor em grupos com nível intermediário de escolaridade em relação a grupos com até 3 anos de estudo, enquanto grupos com maior nível de renda apresentaram maior prevalência no consumo de medicamentos232,233,235,238. Além das diferenças biológicas citadas nas características demográficas, a etnicidade, enquanto indicador socioeconômico, evidenciou maior consumo de medicamentos entre grupos de brancos em relação a não brancos233,235,238. As crenças referem-se a valores comunitários ou organizacionais, normas culturais, e às perspectivas políticas prevalecentes, que influenciam as formas de organizar, financiar e garantir acesso à população a serviços de saúde76,230. Valores, percepções sobre o próprio estado de saúde, a experiência sobre os sintomas de uma doença e como o sofrimento se manifesta, a percepção sobre a importância e magnitude de um problema para determinar a busca de ajuda profissional são indicadores da agência do indivíduo sobre a decisão final de uso de um serviço de cuidados em saúde230. Os aspectos culturais apresentam influências na comunidade e para o indivíduo, modulando, diretamente, sua capacidade de usar um serviço e, indiretamente, as necessidades percebidas e seus comportamentos. Esse é um fator mais complexo e difícil de mensurar. Um exemplo é a associação entre a percepção de ameaça que pacientes têm sobre a severidade de sua doença, que foi associada a maior nível de adesão239. Outro aspecto é o consenso nacional que dá origem política a um sistema de saúde de caráter universalista como o SUS. Andersen e colaboradores230 consideram as crenças em saúde (health beliefs, termo em inglês) de forma mais ampla e integrada à estrutura social. No entanto, há uma lacuna no tratamento analítico desse fator no modelo comportamental. Uma alternativa que pode promover avanços mais profundos na compreensão desse tema seria a abordagem da perspectiva 105 antropológica. Por exemplo, em um estudo com os índios Guarani (etnia indígena sul-americana), observou-se que a decisão de usar medicamentos parte do diagnóstico, feito pelo Karai (xamã ou pajé), que o indivíduo foi acometido por ‘doença de branco’. Nesse estudo, uma informante relata “Eu nunca dou assim até o final, porque pra nós estraga muito dar muito remédio. A gente dá até que melhora aí já para”240. Fatores capacitantes Correspondem às condições que facilitam ou impedem o uso de serviços de saúde ou, ainda, a recursos que são necessários para o uso desses serviços. Os fatores capacitantes tornam os recursos de serviços de saúde disponíveis ao indivíduo11,76. “Variações geográficas, status socioeconômico, conhecimento sobre a saúde e atitudes da população podem influenciar a demanda por cuidados de saúde, enquanto guias médicos e a efetividade de intervenções podem afetar a provisão e disponibilidade desses cuidados. Idealmente, a provisão de serviços de cuidados em saúde deveria atender à maioria das necessidades da população”241. As políticas de saúde podem ser consideradas processos decisórios, nos quais se definem prioridades e estratégias, relacionando os meios aos fins propostos242. Um exemplo é a política de medicamentos genéricos, cuja implantação teve a intenção de reduzir os custos de medicamentos e aumentar o acesso à farmacoterapia243. Essa estratégia tem desdobramentos claros sobre o componente de financiamento no modelo, tanto em termos contextuais (as compras do Ministério da Saúde, por exemplo), quanto em termos individuais (na aquisição por pagamento direto). Outro exemplo é o programa Farmácia Popular do Brasil (FPB), do Ministério da Saúde, com a composição de uma rede de farmácias onde a aquisição individual de medicamentos é realizada por 106 copagamento (usuário/governo). O programa constituiu uma ação política destinada a atender àqueles que não obtêm seus medicamentos em unidades públicas de saúde, para beneficiar a quem a aquisição de medicamentos compromete, significativamente, o orçamento doméstico244. O subprograma Saúde Não Tem Preço instituiu a gratuidade de medicamentos anti-hipertensivos, para diabetes e asma245,246, modificando a influência sobre a aquisição e o uso desses medicamentos na população atendida. O financiamento descreve os recursos potencialmente disponíveis para pagar por serviços de saúde e refere-se a fontes de recursos, por meio das quais a sociedade fomenta os gastos em saúde76,247. Apresenta relação com as políticas de saúde na dimensão contextual e influencia a organização dos serviços em ambas dimensões, contextual e individual. A distribuição equitativa de recursos deve levar em conta as necessidades e a densidade de recursos já disponíveis, que são desiguais11. Diversos estudos verificaram a associação entre a situação do financiamento, a renda e a disponibilidade de cobertura de serviços de saúde, e o uso de serviços. Ser segurado pode aumentar a probabilidade de uso ou reduzir o atraso no cuidado em saúde231. O financiamento insuficiente pode estar associado à distribuição geográfica irregular dos recursos, criando barreiras financeiras ao acesso a medicamentos163. Alguns estudos demonstram variação na capacidade de pagamento dos medicamentos248; a subutilização de medicamentos por pessoas com menor renda, exibindo interação com fatores sociais como etnicidade e escolaridade249; e que o desabastecimento associado ao preço elevado pode comprometer a capacidade dos indivíduos de adquirir medicamentos250. 107 No plano contextual podemos considerar a alocação de recursos do Ministério da Saúde para aquisição de medicamentos, os quais, em 2012, foram na ordem de R$ 1,162 bilhões para a atenção básica, de R$ 788 milhões para o tratamento de pessoas vivendo com HIV/AIDS e de DST, e de R$ 4 bilhões para o Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF)251. No nível individual, um estudo, com amostra nacional representativa, nos Estados Unidos da América252, mediu a restrição de uso relacionada ao custo dos medicamentos prescritos. O grupo de uso restrito foi caracterizado pelo menor tempo de estudo, pela renda e cobertura de medicamentos, maior proporção de não brancos, de estado de saúde relatado como razoável ou ruim e de comorbidades, e maior média de doenças crônicas, em relação àqueles que não apresentaram restrição de utilização nos últimos dois anos, em função do custo dos medicamentos. Os desfechos do grupo com restrição foram inferiores no que se refere ao estado geral de saúde, diabetes e doenças e eventos cardiovasculares. Outro estudo demonstrou que o número de dias trabalhados, requeridos para a aquisição do tratamento com a combinação dos medicamentos antihipertensivos hidroclorotiazida e captopril, saltam de 0,28 dias na Farmácia Popular do Brasil para 3,22 dias no setor privado253. No sul do Brasil, um estudo aponta que a maioria dos entrevistados relatou não ter utilizado o medicamento por não ter dinheiro para comprá-lo254. A organização, no nível contextual, envolve a quantidade e distribuição de serviços de saúde e profissionais, e como estão estruturados para a provisão de serviços76. Serviços e profissionais de saúde devem estar disponíveis onde as pessoas vivem e trabalham, para que seja possível usar os serviços230. A existência de uma fonte usual de cuidados, a adequação do diagnóstico e a disponibilidade de informação foram associadas ao uso de serviços de saúde231. A disponibilidade foi associada ao uso de medicamentos e à opção pela aquisição por pagamento direto255. O tempo de espera em filas para exames diagnósticos pode configurar uma barreira ao uso de 108 medicamento256. Um estudo demonstrou que as farmácias administradas pelo governo no programa FPB apresentavam maiores níveis de disponibilidade de medicamentos em relação ao setor privado253. Outro trabalho relacionou a indisponibilidade dos medicamentos anlodipino e atenolol à necessidade de pacientes, que receberam prescrições com esses medicamentos, de trabalhar de 1 a 5 dias por mês, exclusivamente, para pagar o tratamento mensal em uma farmácia privada248. Necessidades em saúde Características de necessidade ambiental relacionam-se ao ambiente físico, incluindo condições de moradia, qualidade da água e do ar. Boas medidas que expressam essa necessidade são as doenças ocupacionais e as taxas de morte por violência, por homicídios ou acidentes de trânsito76. Os índices de saúde da população podem estar relacionados às necessidades contextuais. Bons exemplos incluem taxas de mortalidade infantil ou mortalidade por ataque cardíaco; morbidades como a prevalência de câncer ou hipertensão. O modelo diferencia a necessidade percebida da necessidade avaliada no nível das características individuais. A necessidade percebida é um fenômeno social e a doença (biológica) não pode ser considerada desprovida desse contexto230. Por outro lado, o imperativo biológico é muito relevante na busca por ajuda e no consumo de serviços de saúde, e é mais bem representado pela necessidade avaliada, que congrega o julgamento profissional acerca do estado de saúde das pessoas e da necessidade de prover cuidados76,230. A necessidade de uma pessoa por serviço de saúde deveria ser definida em relação à utilidade do serviço/bem disponível para alcançar o 109 desfecho definido e aos recursos disponíveis para provê-lo. Ou seja, efetividade e custo do cuidado em saúde deveriam ser incluídos na consideração de necessidade257. Muitos estudos associam o estado de saúde autorrelatado e o avaliado à utilização de serviços de saúde231. Na área econômica, a necessidade pode ainda ser definida a partir da perspectiva da existência de um serviço ou bem, do qual o sujeito possa se beneficiar, ressaltando a importância da efetividade e dos desfechos na definição de necessidade, na perspectiva de realmente alterar o prognóstico da doença a um custo razoável diante da escassez de recursos241,258. Esses princípios, presentes na literatura sobre serviços de cuidados em saúde, parecem convergir com a definição da Organização Mundial da Saúde (OMS) para Uso Racional de Medicamentos (URM)259, que se traduz na avaliação profissional da necessidade de um paciente utilizar medicamentos, considerando-se os aspectos econômicos envolvidos. Os aspectos farmacêuticos da necessidade parecem ter sido desvinculados do contexto de um serviço, tendo como consequência sua circunscrição ao domínio do produto, prescindindo de um serviço farmacêutico de dispensação. A necessidade por medicamentos pode ser exemplificada pelas demandas judiciais por cetuximabe para tratamento de câncer colorretal, apuradas em um estudo em São Paulo, no qual os autores ressaltam o fato de o medicamento não ter sido aprovado para esta indicação no Brasil260. Em um estudo realizado em Santa Catarina, medicamentos demandados, judicialmente, por pacientes apresentaram equivalentes terapêuticos padronizados em listas do SUS261. Outro trabalho assinala que a ausência de, aproximadamente, 24% de medicamentos prescritos das listas de medicamentos padronizados em municípios de três estados brasileiros pode resultar da não adesão de prescritores aos padrões de seleção, empregados na elaboração dessas listas, ou do desconhecimento da lista de medicamentos essenciais, disponíveis no município262. O comportamento profissional do provedor do serviço de cuidado foi 110 associado à prescrição médica considerada irracional263, em outras palavras, cujas necessidades não atenderam às especificações técnicocientíficas definidas como padrão. Comportamentos em saúde As características da população influenciam os comportamentos em saúde, e a utilização dos serviços de saúde deve levar em conta a combinação de determinantes sociais e individuais11. Como determinante individual, as práticas pessoais em saúde interagem com o processo de cuidados e com o uso dos serviços, modulando os desfechos230. Os fatores relacionados às respostas individuais (biológicas e comportamentais) interagem com o fator doença, influenciadas pelo patrimônio genético do indivíduo, o ambiente físico e o ambiente social264,265. Outras faces das práticas pessoais em saúde mostram que, o autocuidado e a adesão ao tratamento são influenciados pelas crenças do usuário (representações pessoais da doença entre outros aspectos) na interação com o sistema formal de cuidados230,266. “O meio no qual uma sociedade gerencia a questão de segurança farmacológica não depende somente de dados de Farmacovigilância, mas também das lógicas simbólicas e representações culturais, mesmo se isto escapar à racionalidade médica”267. “A não adesão a medicamentos pode incluir o início tardio ou a não iniciação do tratamento prescrito, execução subótima do regime posológico, descontinuação prematura do tratamento, ou uma combinação daqueles três elementos”8. Estão centrados nos pacientes “os fatores que interferem na adesão à terapêutica, refletindo o contexto individual, familiar e social268. Um estudo demonstra que o 111 índice de adesão à farmacoterapia anti-hipertensiva fica abaixo da expectativa nos diversos países pesquisados, e relaciona a não adesão à terapia à falta de controle da pressão arterial, ocorrendo em mais de dois terços dos indivíduos com hipertensão5 A automedicação é um componente do comportamento de autocuidado do paciente269. Os discursos referentes à automedicação, predominantemente, estão associados ao risco elevado desse comportamento267. A experiência anterior com a prescrição médica figura como um motivo importante para justificar a automedicação270. O gênero feminino e a cobertura de plano de saúde privado estão, positivamente, associados à prática da automedicação271. O processo de cuidado de saúde refere-se a comportamentos de provedores, interagindo com pacientes na distribuição de serviços de cuidados76,266. As crenças e os aspectos culturais dos provedores também são considerados. A pressão feita pelo paciente e percebida pelo médico é um forte preditor dos comportamentos médicos, incluindo a prescrição de medicamentos272. Um estudo aponta a atitude do médico como influenciadora da prescrição de antibiótico, incluindo o desacordo com protocolos institucionais ou a expectativa da ineficácia no desfecho. O conhecimento, expresso, por exemplo, pela falta de familiaridade em prescrever antibióticos, também foi levantado como um fator associado ao comportamento de prescrição273. O uso dos serviços pode variar de acordo com o tipo de serviço, como hospitais, ambulatórios, farmácias. Os principais determinantes sociais de utilização de serviços de saúde são as tecnologias e as normas11. As tecnologias seriam um conjunto de princípios e técnicas úteis para atingir as finalidades desejadas, enquanto as normas correspondem a mecanismos de controle social para garantir a adesão dos membros (Taylor, 1971 apud11). 112 “A utilização de serviços de saúde pode ser vista como um tipo de comportamento individual”11 e está relacionada a medidas de processo, sendo adequada para mensurar o acesso a serviços de cuidados274. E pode, ainda, ser caracterizada pelo tipo, propósito e pela unidade de análise. O tipo identifica as características do serviço a ser prestado. A utilização de cada tipo de serviço tem um propósito e os fatores que determinam o uso de cada tipo de serviço podem variar substancialmente. A unidade de análise é uma característica que define o aspecto da utilização dos serviços de saúde que se deseja ter em foco11,274. A dispensação de medicamentos corresponde a um tipo de serviço, cujo propósito pode variar, como, por exemplo, a farmacoterapia desenvolvida nos níveis primário ou secundário de atenção à saúde. Há diferenças relevantes se a unidade de análise refere-se ao primeiro contato com o serviço de dispensação durante um dado período de tempo ou ao número de atendimentos recebidos pelo paciente na dispensação por unidade de tempo. A Organização Mundial de Saúde define a “utilização de medicamentos como a comercialização, distribuição, prescrição, dispensação e uso de medicamentos na sociedade”. Os estudos de utilização de medicamentos são definidos como a análise do uso de medicamentos aplicados no cuidado à saúde275. A concepção de utilização apresenta um caráter logístico-regulatório marcante, que exerce influências sobre o quadro teórico dos estudos de utilização de medicamentos. Analogamente, a utilização de medicamentos corresponde a um comportamento em saúde e se dá no contexto do sistema de cuidados. Resultados em saúde 113 Correspondem a desfechos em saúde, sendo eles o estado de saúde percebido pelos usuários, o estado de saúde avaliado pelos profissionais e a satisfação dos usuários com o serviço recebido. Os desfechos podem influenciar o comportamento em saúde, características individuais e contextuais76. O estado de saúde percebido pelo paciente indica o quanto uma pessoa pode viver de forma funcional, confortável, e livre de dor. Este resultado é influenciado por muitos dos fatores discutidos anteriormente. Já o estado de saúde avaliado decorre do julgamento de um profissional de saúde, com base nos padrões clínicos estabelecidos e no estado da arte da prática profissional. O uso de medicamentos foi associado à percepção negativa da saúde em mulheres276, e o uso de 5 ou mais medicamentos à autoavaliação ruim do estado de saúde em idosos277. A satisfação refere-se a como o sujeito se sente sobre o serviço de cuidados em saúde que recebeu. Ela tem influência sobre o comportamento de pacientes na adesão ao tratamento e no seguimento, pelo paciente, de aconselhamento profissional278. Aumentar a satisfação do usuário constitui uma meta para a gestão dos serviços279. Segundo Linder-Pelz280, a crença que um objeto possua determinados atributos (noção cognitiva acerca de um objeto, que liga um atributo a esse objeto) e as avaliações que o indivíduo realiza sobre esses atributos são determinantes da atitude ‘satisfação/ descontentamento’ do usuário com um serviço (um componente afetivo). A expectativa é um fator importante na avaliação da qualidade do serviço e, portanto, na formação da satisfação do usuário. Ela é influenciada por experiências vividas pelo paciente com o serviço e por outras fontes de informação, pelas percepções do paciente sobre sua doença e por informações provenientes do provedor (especialmente o médico)281. 114 Um estudo determinou que os aspectos tangíveis de serviços farmacêuticos (tempo de espera, por exemplo) seriam avaliados pelos pacientes, com base na comparação com suas experiências prévias. Aspectos menos tangíveis (serviços cognitivos) são avaliados com base em referentes ideais, ou o “como deveria ser”282. Outro estudo, realizado na Nigéria identificou que usuários cujo propósito da visita à farmácia foi procurar aconselhamento com o farmacêutico, expressaram um nível de satisfação significativamente maior que aqueles que foram procurar medicamentos283. O acesso a serviços de saúde e o acesso a medicamentos Para Andersen e Davidson76, o acesso a serviços de cuidados em saúde “é um fenômeno multidimensional relativamente complexo”. O Quadro 6-1 sumariza as dimensões do acesso com base no modelo de Andersen e a partir de uma análise de sua relação com medicamentos, por meio de exemplos que ilustram a associação. A classificação de acesso, descrita por Andersen e Davidson76, mostra relação com aspectos observados na investigação do acesso a medicamentos. O uso racional de medicamentos e a avaliação do custo-efetividade para incorporação de medicamentos a serviços de saúde são exemplos dessa congruência, que pode ser deduzida da análise das dimensões de acesso a serviços de saúde. Quadro 6-1 – Definições e exemplos das dimensões de acesso, de acordo com o modelo de Andersen Dimensão Acesso potencial Definição 76 Existência de fatores capacitantes, nos níveis contextual e individual, refletidos na disponibilidade de recursos para o cuidado em saúde, o que pode aumentar ou reduzir o uso dos serviços, a depender da natureza e organização desses recursos. Acesso Uso real de serviços de saúde, no qual o realizado aumento na taxa de utilização é um indicador da melhoria do acesso. Políticas visando aumentar o uso de serviços podem ou não alterar, de forma relevante, o estado de saúde de uma população e, em geral, aumentam os custos. Acesso Definido de acordo com “quais equitativo determinantes (idade, etnicidade, status de cobertura, sintomas) do acesso realizado são dominantes em predizer a utilização”. Em sistemas equitativos, as variáveis demográficas e necessidades em saúde, como componentes do modelo, contam mais para explicar as variações na utilização dos serviços. Exemplo relacionado a medicamentos O CEAF é uma fonte de financiamento que capacita indivíduos a obter medicamentos de custo elevado. Contudo, os protocolos clínicos que normatizam o acesso podem dificultar ou até impedir o seu uso. Pacientes com plano de saúde, maior nível de renda e informação, por exemplo, tenderiam a usar serviços e obter medicamentos mais facilmente. A quantidade de pessoas atendidas no FPB ou o crescimento do número de pacientes do CEAF indica a utilização real dos serviços e a obtenção, pelos pacientes, dos medicamentos prescritos. As ofertas do programa ou do componente de financiamento incrementam sua utilização, porém, não necessariamente, levam à melhora do estado de saúde dos pacientes e aumentam os custos expressivamente. No SUS, obter medicamentos depende da realização de consulta médica, da apresentação de prescrição e, eventualmente, da realização de exames diagnósticos, que constituem fatores capacitantes para o uso de medicamentos. O acesso equitativo pressupõe o atendimento a indivíduos em necessidade (ou o maior nível de necessidade) e a escolha racional de medicamentos (custoefetividade), mesmo para pessoas vivendo em condições socioeconômicas precárias. 115 116 Quadro 6-1 - continuação Acesso Ocorre quando as características sociais e os inequitativo recursos capacitantes determinam quem consegue cuidados de saúde. Barreiras sociais ou relacionadas aos serviços atingem as populações de menor status socioeconômico. Acesso efetivo Acesso eficiente Paciente que resida longe de centros urbanos, onde a maioria dos serviços de saúde se concentra, pode ter dificuldades no acesso a medicamentos anti-hipertensivos. O tratamento com antirretrovirais tem custos proibitivos para a maioria da população. Para obter medicamentos para Hepatite C, o paciente precisa submeter-se à ultrassonografia abdominal, o que pessoas com nível renda muito baixa só conseguirão permanecendo nas filas para realização desse exame no SUS. Uso de serviços que melhoram o estado de O tratamento da hipertensão com medicamentos deve reduzir o risco saúde e aumentam a satisfação de de doença cardiovascular no paciente e manter essa condição estável. pacientes. Ligado às necessidades e a fatores Os estudos de efetividade relativa, que exploram elementos sociais, e avaliado por profissionais. Medida contextuais da ação dos medicamentos na prática clínica284, são complexa, pois os desfechos em saúde são pouco realizados no Brasil. Sem esses estudos, a correlação do multideterminados. resultado da farmacoterapia com o acesso efetivo fica comprometida. O URM representa uma condição para a conquista do acesso efetivo285. Promoção de resultados em saúde Relacionado ao URM. Entre medicamentos eficazes e seguros para concomitante a minimização de recursos uma dada situação clínica, seleciona-se o de custo inferior. Outro requeridos. Eficiência corresponde às exemplo são as políticas que resultem na redução dos preços dos medidas de custo-efetividade ou custo medicamentos em um país (ex. medicamentos genéricos). Melhoria benefício de serviços de saúde para do estado de saúde ou aumento da satisfação pelo tratamento com determinar o perfil de alocação dos recursos medicamentos, com menor custo de financiamento. Novamente, a finitos. carência de estudos de efetividade relativa de medicamentos compromete a avaliação do acesso eficiente. Fonte: Elaborado pelo autor 117 Considerações finais No contexto do uso de serviços de saúde, a utilização de medicamentos apresenta-se como um fenômeno complexo, e o modelo de Andersen parece contribuir, teoricamente, para explicar as associações e as relações observadas em estudos empíricos. Os desenhos dos estudos de utilização de medicamentos, se elaborados assumindo o medicamento como um insumo na provisão de serviços de cuidados de saúde, podem incrementar nossa compreensão sobre a dinâmica de sua utilização. Muitas investigações e práticas profissionais, no âmbito farmacêutico, apresentam elementos que, uma vez analisados a partir da maior consistência teórica e integração explanatória, proporcionadas pelo modelo de Andersen, podem ser resignificados, especialmente pela consideração do contexto dos serviços de cuidado. Ampliar a compreensão desses fenômenos, aprofundando o poder explicativo das investigações, parece ser um passo fundamental para a construção de um serviço de dispensação que possa ser incorporado ao sistema de cuidados de saúde. Subjacente à análise, emerge a constatação que o construto acesso a medicamentos é insuficiente para caracterizar os fenômenos relacionados aos medicamentos como insumos no processo de cuidados. Sobrevém a desconexão do atributo (acesso a medicamentos) com as práticas de atenção à saúde (profissionais e políticas); e do construto analítico (acesso a medicamentos) com os paradigmas teóricos prevalecentes no campo das ciências da saúde. Os resultados em saúde são produtos da utilização de serviços que, eventualmente, empregam insumos em sua provisão. A ubiquidade dos medicamentos como insumos nos cuidados de saúde parece demandar um serviço que garanta o acesso e seu uso racional, e incremente os desfechos pretendidos. 118 A análise da aplicação do modelo de Andersen para o uso de medicamentos foi, parcialmente, utilizada na construção de um capítulo de um livro didático do curso Gestão da Assistência Farmacêutica: Especialização a distância286. 7 UM MODELO DE SERVIÇO DE DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS BASEADO NO PROCESSO DE CUIDADO NO SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO 121 O artigo apresenta a discussão de elementos teóricos acerca da dispensação de medicamentos, caracterizada como um serviço no contexto do Sistema Único de Saúde. Essa abordagem teórica assume como premissas a centralidade do usuário no processo de cuidado; a gestão estruturada dos serviços; a interface interdisciplinar a partir dos princípios de acolhimento, vínculo e responsabilização pelo usuário; e, finalmente, a clínica farmacêutica. O manuscrito redigido foi publicado no volume 49, número 1 do periódico Brazilian Journal of Pharmaceutical Sciences. Um modelo de serviço de dispensação de medicamentos baseado no processo de cuidado no sistema de saúde brasileiro Abstract Access to medication emphasizes the availability of the product at the expense of providing a service. The goal of this paper is to propose a theoretical model for a drug dispensing service, beginning with a reflection on the current realities of the Unified Health System and drug dispensation in Brazil. A conceptual analytical research made by a methodological course called disciplined imagination was the mainly approach applied to develop the model. The drug dispensing service is part of the care process, which considers access as an attribute; reception, connection and accountability, management and clinical pharmaceutical aspects as components; and the rational use of drugs as the purpose. The proposed model addresses access to the dispensing service and demands a reorientation of routines, instruments and practices. Uniterms: Drug dispensing practice. Pharmaceutical service. Unified health system. Access to health services. Clinical Pharmaceutical. 122 Resumo O acesso a medicamentos enfatiza a disponibilidade do produto em detrimento da provisão de um serviço. O objetivo deste trabalho é propor um modelo teórico para um serviço de dispensação de medicamentos, iniciando com uma reflexão sobre a realidade atual do Sistema Único de Saúde e a dispensação de medicamentos no Brasil. Uma pesquisa analítica conceitual realizada por meio de um percurso metodológico chamado de imaginação disciplinada constituiu a estratégia principal para o desenvolvimento do modelo. O serviço de dispensação é parte do processo de cuidado, o qual considera o acesso como um atributo; os aspectos acolhimento, vínculo e responsabilização, gestão e clínica farmacêutica como componentes; e o uso racional de medicamentos como o propósito. O modelo proposto direciona o acesso para o serviço de dispensação e demanda a reorientação de rotinas, instrumentos e práticas. Unitermos: Prática de dispensação de medicamentos. Assistência farmacêutica. Sistema único de saúde. Acesso aos serviços de saúde. Clínica Farmacêutica. Introdução O uso de medicamentos é cada vez mais intensivo287 e representa um fenômeno socioeconômico complexo no que se refere à garantia da acessibilidade, ao seu uso racional e à resolutividade dos problemas de saúde288. Mundialmente, os sistemas de acesso a medicamentos são caracterizados pelo emprego exacerbado e pouco cuidadoso, por desvios de finalidade, superestimativa dos benefícios e prevalência elevada de problemas relacionados a medicamentos287,288. O papel dos serviços farmacêuticos tem sido discutido pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que salienta sua importância na atenção à saúde, bem 123 como as dificuldades em sua estruturação nos países em desenvolvimento288,289. Empregando as categorias analíticas do modelo de uso de serviços de saúde desenvolvido por Andersen e Davidson76, pode-se reconhecer a organização da dispensação como um fator capacitante ao uso do serviço, influenciando o acesso e os desfechos em saúde. No Brasil, o financiamento de medicamentos pode ocorrer por meio de provimento pelos serviços públicos de saúde, de co-pagamento com subsídio governamental ou de pagamento privado. Legalmente, as farmácias são consideradas estabelecimentos comerciais sob licenciamento sanitário, ou inserem-se dentro de unidades de assistência à saúde9. A Constituição brasileira de 1988 garantiu o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde290. Estes são princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), a mais expressiva política social brasileira. O SUS291 provê assistência farmacêutica, a qual inclui a dispensação de medicamentos. Porém, no processo de construção do SUS, a farmácia manteve-se isolada e desarticulada de outros serviços de saúde, tornando-se anacrônica ao modelo assistencial e fiel ao marco regulatório da década de 1970, que a caracterizou como um comércio de medicamentos9. Em que pese esta situação, a compra direta de medicamentos pelo governo brasileiro, em 2008, superou 2,3 bilhões de reais (ou mais de 1 bilhão de dólares norte-americanos de acordo com a cotação em 30 de dezembro de 2011)292. Uma revisão contextual sobre o sistema de saúde brasileiro pode ser encontrada em Paim e colaboradores293. Embora o marco legal sobre dispensação de medicamentos tenha evoluído, o produto ainda prepondera sobre o processo, e o papel dos medicamentos como insumos essenciais ao processo assistencial está deslocado para tornar-se a finalidade do cuidado em si. Como um componente do sistema de saúde, a dispensação tornou-se uma 124 atividade meramente administrativa, com uma ênfase no aviamento de prescrições e na entrega de medicamentos294. Estudos brasileiros analisaram as iniquidades existentes no processo de dispensação295,296. Embora alguns estudos elejam objetos relevantes, os pesquisadores raramente têm considerado os fundamentos da construção do sistema de saúde, o movimento de reforma nas profissões de saúde e os efeitos de um sistema econômico dirigido pelo mercado sobre a dispensação297-300. Tais estudos refletem uma prática de dispensação desenvolvida sem reflexão expressiva sobre sua concepção teórica, sem suporte baseado em evidências e sem considerar a construção do conhecimento corporativo farmacêutico. Nesse contexto, algumas questões permanecem abertas: (1) a dispensação de medicamentos está desenhada para ser um serviço no sistema de saúde? (2) como a dispensação deveria ser organizada para incorporar os princípios do SUS de integralidade, universalidade e equidade? De acordo com este contexto, há uma lacuna no marco teórico do conjunto da pesquisa sobre serviços farmacêuticos. Portanto, há necessidade de desenvolver conhecimento teórico sobre a dispensação de medicamentos para orientar a construção do processo de cuidado na Farmácia, e permitir a reflexão sobre as práticas assistenciais do farmacêutico no contexto dos serviços públicos de saúde. O objetivo do artigo é propor um modelo teórico para o serviço de dispensação de medicamentos, a partir da reflexão sobre a realidade do SUS e da dispensação no Brasil. O presente trabalho busca caracterizar teoricamente a dispensação de medicamentos como um serviço, no qual estabelece-se, pela primeira vez, o acesso e o uso racional de medicamentos conectados ao serviço farmacêutico no contexto do SUS. Metodologia 125 A abordagem aplicada ao desenvolvimento deste trabalho foi a pesquisa analítica conceitual como definida por Wacker14. Nos processos de teorização e dedução sobre as relações lógicas do objeto, o curso metodológico chamado de imaginação disciplinada compreende um processo evolutivo guiado pela representação da realidade. Variações teóricas das conjecturas substituem os próprios movimentos da realidade, a seleção escolhe, teoricamente, a direção mais adequada, a qual é, seletivamente, retida para evitar obstáculos teóricos13. O desenvolvimento de teoria pode ser baseado na síntese de ideias obtidas da literatura301. Os dados de literatura para suportar o processo de construção do modelo foram coletados pela busca no Scientific Electronic Library Online (SciELO), PubMed, Elsevier Science Publishing House e Google Scholar. A abordagem envolveu a construção e análise de componentes chaves para refletir sobre a dispensação no SUS. Os pressupostos que nortearam a proposição desses componentes e sua articulação com o seu ambiente e contexto foram explanados, e a clareza conceitual e congruência lógica na argumentação foram procuradas de acordo com os critérios de Fawcett302. Resultados e discussão O conceito de dispensação de medicamentos na literatura Alguns autores295,303-305 têm proposto padrões e procedimentos técnicos para a gestão ou política relacionadas à dispensação e ao manejo de tratamentos com medicamentos. Estas propostas podem ser sumarizadas como (1) normas legais que visam racionalizar a prescrição, o controle do uso de substâncias psicoativas e o controle de custos; (2) procedimentos técnico-administrativos relacionados à organização da unidade ou à burocracia do sistema de saúde; e (3) procedimentos 126 relacionados aos padrões profissionais, aos conhecimentos técnicocientíficos ou à cultura corporativa. Angonesi296 revisou a literatura científica e a legislação do Brasil e de alguns países, e ponderou que existe pouca reflexão teórica sobre o tema, e que as discussões de aspectos regulatórios predominam. A interface comercial da dispensação tem contribuído para o seu incipiente desenvolvimento científico e técnico-profissional. Muitos trabalhos não explicitam a concepção que assumem ou optam pela abordagem regulatória306-308. As assunções tácitas que orientam as pesquisas parecem confinar a atividade de dispensar a conferir a prescrição, a distribuir medicamentos e às instruções para o paciente em relação à conservação, administração e precauções com os medicamentos. Classicamente, a farmácia concentra-se em atender às expectativas de usuários e profissionais de saúde relacionadas à disponibilidade e à distribuição de medicamentos. Nos serviços de saúde públicos brasileiros, farmácias, geralmente, consistem de espaços pequenos para o armazenamento e distribuição de medicamentos, a qual é realizada por meio de uma janela e até de grades. Esse ambiente reforça a associação da farmácia com o modelo regulatório do acesso e com uma abordagem curativa, médico-centrada, baseada em demandas aparentes de pacientes103,105,309. A presença de um farmacêutico está, normalmente, ligada à dispensação de medicamentos psicoativos310. A dispensação de medicamentos no Brasil é considerada como a uma atividade regulatória, que consiste de receber o usuário; checar a prescrição; separar e distribuir os medicamentos; e aconselhar o usuário311. A realidade é caracterizada por um grande número de pacientes atendidos diariamente, enquanto poucos pacientes têm sido tratados por farmacêuticos; sua organização é centrada em torno de 127 procedimentos prescritos em protocolos e em resoluções administrativas, com os aspectos legais tomando precedência ante os aspectos clínicos; a preocupação com o acesso é focada na disponibilidade dos medicamentos; e os aspectos clínicos são limitados à segurança no manejo dos medicamentos295,305,308,312. Serviço é um processo que aplica recursos e competências profissionais essenciais (conhecimento e habilidades) para o benefício de outro44,313. Levando isso em conta e considerando a situação descrita acima, nós defendemos que a dispensação de medicamentos atual não apresenta tais características, as quais são essenciais para classificá-la no domínio serviço. Para esse propósito, a tecnologia social (como definido adiante), relacionada a um serviço de dispensação, deve ser estabelecida e as competências profissionais especializadas devem ser sistematizadas. Essas tarefas deveriam considerar o conhecimento e as habilidades já incorporadas na prática farmacêutica no contexto do sistema de saúde. Modelo de dispensação de medicamentos proposto para o SUS brasileiro O serviço de dispensação de medicamentos deveria ser integrado ao processo de cuidado no SUS, considerando o acesso como um atributo; o acolhimento, vínculo e responsabilização, a gestão e os aspectos clínico-farmacêuticos como seus componentes; e o uso racional dos medicamentos como propósito. A figura 1 sumariza o modelo proposto. 128 Figura 7-1 – Modelo proposto para o serviço de dispensação de medicamentos. Fonte: Os autores O modelo proposto foi fundamentado no campo dos sistemas de serviços a fim de definir o papel a ser cumprido pelos farmacêuticos e a contribuição da dispensação de medicamentos no sistema de cuidados de saúde. O acesso a serviços de saúde e a medicamentos: um atributo do usuário do serviço de dispensação Serviços de dispensação de medicamentos, integrados ao processo de cuidados no SUS, deveriam ser responsáveis não somente por dispensar os medicamentos, mas também por aumentar o acesso do usuário aos serviços em todos os níveis de atenção, identificando suas necessidades e demandas. A organização dos serviços públicos de saúde, 129 frequentemente, condiciona o aviamento mensal da prescrição, enquanto a consulta médica ocorre a períodos maiores (a cada três ou seis meses). Considerando as tecnologias sociais como a coordenação das ações humanas que requerem interações entre partes diferentes pelo uso de rotinas, com vistas a alcançar resultados previsíveis e especificáveis, como proposto por Nelson e Sampat44, e a autonomia característica de um serviço, o acesso ao serviço de dispensação diferencia-se do acesso ao medicamento. O acesso ao serviço de dispensação inclui a habilidade para modificar as relações institucionais (por meio de novas tecnologias sociais) na rede de serviços. Nesse contexto, a garantia do acesso deve considerar a acessibilidade, a qual envolve elementos como a localização dos serviços, as condições para entrada do paciente no sistema e o papel das regras burocráticas85. Esses aspectos constrangem oportunidades, modulam as decisões individuais e coletivas acerca do tratamento, e mobilizam as críticas dos usuários314,315. Assumindo que o acesso à dispensação é afetado pela acessibilidade aos serviços de saúde, independente da legitimidade da forma de organização desses serviços, a farmácia deveria contribuir para a superação das iniquidades prevalecentes, mesmo quando isso requer mudanças nas rotinas técnicas e nos aspectos regulatórios estabelecidos. A análise da relação entre as necessidades percebidas dos pacientes (o que pacientes individuais percebem como necessidades em saúde) e as necessidades avaliadas (a avaliação profissional sobre o estado de saúde de cada paciente), e o processo de cuidado em saúde (as interações entre os comportamentos de provedores e pacientes na produção de cuidado)76 permite inferir que a oferta dos medicamentos afeta o comportamento em saúde. O uso tende a mudar de acordo com o que é disponibilizado: se medicamentos (tecnologia física desarticulada do processo de cuidado) ou um serviço de dispensação. 130 No modelo proposto no presente trabalho, a organização do serviço de dispensação sustenta e qualifica o atributo acesso. Respeitando o princípio da centralidade do usuário na organização do sistema de saúde316, assume-se a premissa de que a garantia do acesso deveria fundamentar o modelo de prática e deveria representar o ponto de partida para o processo de cuidado. O acesso à dispensação como um serviço (com rotinas específicas, relativamente previsíveis, de domínio técnico próprio) constitui um componente tecnológico primordial à efetividade dos medicamentos (uma nova tecnologia social), ao aumento da segurança de pacientes e à redução dos custos de tratamentos. Acolhimento, vínculo e responsabilização professional: componentes da dispensação Uma mudança na dispensação implica a reorientação das rotinas e tecnologias sociais. Adotar a premissa que os processos de cuidado em saúde deveriam ser centrado no sujeito, baseado nas interações entre iguais e em relações de escuta e responsabilização pelas necessidades dos pacientes, é admitir a necessidade de seguir as diretrizes de acolhimento, da vinculação dos sujeitos que necessitam de cuidado e de sua comunidade, e da responsabilização profissional sobre esse cuidado, na lógica da integralidade316. O acolhimento deveria nortear a organização e os processos de intervenção do serviço de saúde como um todo317. A dispensação de medicamentos, em particular, deveria ser integrada ao processo assistencial, contribuindo para aprimorar e consolidar as práticas já desenvolvidas. O farmacêutico deve "acolher, escutar e dar uma resposta positiva”317, incorporando as demandas por medicamentos como parte das necessidades de pacientes, contribuindo para resolver os problemas de saúde. Para garantir a integralidade, esse acolhimento não pode ser um processo unilateral e deveria incorporar valores 131 sustentados na comunidade, como forma de atenuar as tensões subjacentes ao uso de medicamentos, e de qualificar a relação farmacêutico-usuário, as quais deveriam ser fundadas em princípios éticos e de cidadania. Essa reorientação pressupõe organizar a farmácia para a escuta dos usuários e o estímulo à autonomia. As características e consequências da utilização de medicamentos, seja por automedicação ou como resultado de uma prescrição, modulam necessidades cujos desfechos extrapolam os limites institucionais. Para obter resultados consistentes, os sistemas de saúde precisam articular as resposta das diversas instituições provedoras de cuidado, nos diferentes níveis de atenção à saúde. A atenção primária à saúde (APS) é considerada uma estratégia essencial nessa articulação318, e muitos sistemas a têm adotado na organização dos processos de cuidado. É relevante ao serviço de saúde que a dispensação na APS acompanhe e articule um projeto farmacoterapêutico do qual o paciente é sujeito, monitore as necessidades emergentes, e reoriente as rotinas pertinentes. Esta perspectiva assume que o itinerário terapêutico pode apresentar variações não previstas em protocolos; exige a articulação de profissionais e instituições; e a gestão eficaz da informação58,319. Assim, a dispensação não se limita ao espaço físico da farmácia, e o foco do serviço são as necessidades do usuário e o compromisso com a saúde da comunidade, refletindo as mudanças necessárias para estabelecer a dispensação de medicamentos como um serviço nos sistemas de saúde. Nesse sentido, incorporar o acolhimento como componente tecnológico requer assumir uma atuação multiprofissional e interdisciplinar. O componente gestão do serviços de dispensação de medicamentos Assumindo a capacidade de gestão “como sendo a faculdade de uma organização em decidir com autonomia, flexibilidade e transparência, mobilizando recursos e construindo a sustentabilidade dos resultados de gestão”320, três dimensões no processo de gestão deveriam ser 132 enfatizadas: organizacional, operacional e sustentabilidade. Barreto e Guimarães321 descreveram características como o entendimento dos atores envolvidos, autonomia decisória, existência de recursos, participação, articulação e construção de parcerias como fatores condicionantes da gestão da assistência farmacêutica322. Essas dimensões e os condicionantes correspondem com características que delimitam a provisão de um serviço42,323. A capacidade de gestão, definida pela OMS como uma habilidade fundamental do farmacêutico na atenção à saúde289, é um instrumento cardinal para planejar e articular as ações envolvidas na organização de serviços e no processo de cuidado. O papel da gestão deveria ser reconhecido na realização do “trabalho em ato”324 de prover um serviço de dispensação de medicamentos. Os seguintes domínios da gestão deveriam ser aplicados ao serviço de dispensação: a organização do serviço e a mobilização de recursos na dimensão operacional; as condições de trabalho, capacitação de pessoal e a articulação com a equipe de saúde na dimensão organizacional; e o processo de trabalho, a busca de alianças e a avaliação dos resultados e satisfação na dimensão de sustentabilidade320. Os aspectos de avaliação e politicidade estão ligados à dimensão sustentabilidade e são, particularmente, relevantes para o desenvolvimento da dispensação de medicamentos. No que se refere à avaliação, a gestão baseada em evidências tem ganhado importância na tomada de decisão de como organizar, estruturar, distribuir ou financiar serviços de saúde325. No Brasil, essa prática toma forma por meio do campo das avaliações de programas e serviços, que busca aumentar a coerência da gestão do sistema público de saúde326. Nesse sentido, a avaliação da dispensação precisa convergir em um modelo de serviço, no qual as atividades gerenciais interfaciem as atividades clínicas. A habilidade política é uma parte fundamental para construção das parcerias na gestão da dispensação. Farmacêuticos deveriam estar 133 cientes da influência sobre o modelo de atenção à saúde, decorrente da “ação política de sujeitos individuais e coletivos que disputam a orientação do sistema de saúde”327. Nesse contexto, busca-se a efetivação de um sistema de saúde democrático, no qual a gestão da política e do trabalho em saúde seja um tema público328, e a politicidade seja uma habilidade desvelada no estabelecimento do cuidado emancipatório, o que inclui a dispensação de medicamentos como um serviço. A gestão provê um eixo estruturante do cuidado no serviço de dispensação por meio da relação entre os componentes acolhimento, vínculo e responsabilização e o componente clínica farmacêutica. O componente clínica farmacêutica do serviço de dispensação de medicamentos Estudos sobre morbidade e mortalidade relacionados a medicamentos refletem problemas crescentes com a segurança de pacientes, efetividade reduzida de medicamentos e custos elevados de tratamentos329-331. No Brasil, medicamentos são a principal causa registrada de intoxicações332, e existem poucas informações consistentes sobre a efetividade de farmacoterapias, evidenciando a urgência por melhorias nas tecnologias sociais da clínica. Nós consideramos que o serviço de clínica farmacêutica é uma parte essencial do fazer profissional do farmacêutico e deveria ser desenvolvida na sua dimensão teórica e na cultura ocupacional farmacêutica. A clínica pode ser entendida como “um conjunto de crenças, posturas, habilidades e atitudes dirigidas a reduzir o sofrimento, a dor, a doença e evitar a morte”333 (p71). Em um sistema de saúde que tem a integralidade como princípio, as “dimensões não-biomédicas do adoecer passam a compor o projeto de ação da prática clínica”333 (p71). Como um componente da dispensação, a clínica farmacêutica envolve rotinas específicas para otimizar o uso de medicamentos em projetos 134 terapêuticos. Para as situações clínicas complexas preconiza-se a realização de seguimento farmacoterapêutico, desenvolvido a partir de um modelo adaptável à realidade do serviço. Entre as ferramentas da prática clínica, os protocolos organizam e padronizam o processo terapêutico334. Contudo, é necessário refletir sobre sua natureza, uma vez que suas regras, por vezes, ignoram as necessidades de pacientes e podem ser reducionistas ao desconsiderar a complexidade dos problemas de saúde, limitando a disponibilidade de opções clínicas e a atuação profissional crítica319. A responsabilidade pelo manejo adequado do tratamento ambulatorial é compartilhada entre o prescritor, o dispensador e o usuário. O medicamento a ser dispensado deve possuir todas as características definidas na prescrição avaliada como correta, objetivando o uso adequado e efetivo quanto ao desfecho proposto. A corresponsabilidade do usuário merece especial atenção no manejo do tratamento. O processo de trabalho na dispensação deve levar em consideração as experiências prévias, conhecimentos e crenças dos sujeitos, a complexidade do tratamento, o tipo de doença, a percepção individual sobre o próprio estado de saúde e a compreensão sobre o problema. Esses fatores estão associados com a adesão e, frequentemente, modulam a decisão pessoal de como manejar o cuidado268,335. Fornecer informações sobre o tratamento, bem como, sobre os insumos usados para prover terapias, e a correspondente busca de obter a adesão de pacientes são as atividades da dispensação mais reconhecidas. No entanto, a correlação entre a provisão de informação e os desfechos em saúde não é clara336-338. Uma clínica inovadora demanda a seleção criteriosa das informações, considerando as habilidades cognitivas de pacientes, seus interesses e necessidades, a doença que o acomete, a necessidade de promover uma educação autonomizante e de compartilhar o poder e responsabilidade sobre o 135 cuidado. Shrank e Avorn339 analisaram a utilização de meios escritos para veicular informações sobre a farmacoterapia e sugerem uma nova abordagem de apresentação, legível e hierárquica, para aumentar a qualidade da comunicação. Uma rotina constituída pela monitoração de sinais apresentados pelos pacientes, e estabelecer sua correlação com os tratamentos farmacológicos adequados, é estratégica para a dispensação. A avaliação clínica da farmacoterapia deveria identificar grupos vulneráveis de usuários. A equipe da unidade de saúde deve compartilhar essas responsabilidades e pactuar o registro, sistemático e multiprofissional, dos dados, visando orientar a gestão do tratamento farmacológico. Nesse sentido, a relação com o acolhimento, vínculo e responsabilização estrutura uma atuação interdisciplinar e pode contribuir para melhorar os resultados em saúde. Uso racional de medicamentos: o propósito do serviço de dispensação de medicamentos A promoção do uso racional dos medicamentos (URM), um pilar comum às políticas de medicamentos e de assistência farmacêutica no Brasil2,340, baseada em diretrizes da OMS, mostra-se um desafio crescente para um acesso equitativo. A OMS definiu que o uso racional de medicamentos “demanda que o medicamento apropriado seja prescrito, que ele esteja disponível no momento certo a um preço que as pessoas possam pagar, que ele seja dispensado corretamente, e que ele seja administrado na dose certa, nos intervalos certos e pelo período certo de tempo”259. Essa racionalidade articula o papel dos conhecimentos clínicos e epidemiológicos na interpretação semiológica da doença341, que ao compartimentar o sujeito, o nega socialmente e o distancia de seu sofrimento342. 136 Embora o termo ‘uso’ possa conotar uma ação do usuário, o conceito de URM expressa ações extrínsecas ao sujeito, tais como prescrever medicamento apropriado. Além disso, essas ações configuram tecnologias sociais que são relacionadas aos desfechos de efetividade dos medicamentos e cura das doenças, que são fenômenos multideterminados. Estas reflexões revelam a lacuna epistemológica na raiz do conceito de URM e suas implicações para as práticas farmacêuticas. O conceito de URM pode mudar de acordo com o contexto do sistema de saúde no qual se aplica343. Para avaliar a racionalidade do uso, o regime farmacoterapêutico deveria ser considerado no contexto do projeto terapêutico do sujeito, com as devidas interações entre os níveis de atenção à saúde. Essas observações indicam que o uso racional é um comportamento dos provedores dos serviços, expresso no processo de cuidado, como um fenômeno social no interior do sistema de saúde. O aprimoramento da dispensação de medicamentos pode auxiliar no estabelecimento de uma concepção de racionalidade mais consistente com a realidade de sistemas de saúde que tenham por princípio a equidade e a integralidade, como no Brasil. O URM preconiza reduzir o emprego indiscriminado de medicamentos pelos pacientes e pelos prescritores, prevenindo as consequências da elevada prevalência de iatrogenias, interações medicamentosas cada vez mais complexas e efeitos adversos de severidade crescente331. Nesse contexto, o serviço de dispensação deve promover o URM, tendo a autonomia do sujeito do cuidado como a diretriz central de sua ação, e legitimar, junto à equipe, o reconhecimento desse sujeito como ator ativo no projeto terapêutico. O uso racional como resultado do serviço de dispensação proposto no modelo não remete a uma determinação de um por outro. Reconhecese a utilização dos medicamentos como um fenômeno complexo e sua adequação como um desafio para o serviço de dispensação. O URM é uma condição importante para alcançar os resultados desejados em um 137 tratamento, mas não deveria ser encarado como finalidade do cuidado em si. Racionalizar o uso de medicamentos é a consequência de organizar o acesso ao serviço de dispensação, e não apenas de garantir o acesso a medicamentos. Conclusão O papel do serviço farmacêutico está vinculado à capacidade dos farmacêuticos de refletir sobre sua prática profissional e descobrir a contribuição devida ao sistema de saúde. A utilização de medicamentos como tecnologia assistencial deveria ser estudada e aprimorada, visando ampliar os benefícios aos usuários e garantir o acesso a serviços qualificados. O serviço de dispensação, constituído pelo fazer profissional e manifestado pelo processo de trabalho vivo, carece da organização e sustentação teórica necessárias para contribuir com o propósito do sistema de saúde. O modelo teórico do serviço de dispensação de medicamentos proposto partiu do pressuposto que, ao menos em parte, os medicamentos são responsáveis pelos resultados observados na terapêutica, e que apenas sua disponibilidade e distribuição são insuficientes para atender as necessidades dos pacientes. O modelo tem o acesso como atributo e o uso racional de medicamentos como seu propósito. Nele o serviço de dispensação é idealizado como a integração da gestão, do acolhimento, vínculo e responsabilização, e da clínica farmacêutica, visando qualificar o cuidado envolvendo medicamentos. A clínica farmacêutica é uma inovação porque nós a desenhamos como parte da dispensação de medicamentos, e ela deveria ser provida a todos os pacientes. Como qualquer modelo, o proposto aqui é intencionalmente simplificador em favor da compreensão. Reconhece-se a importância de discutir o processo de trabalho na orientação do modelo de serviço de dispensação de medicamentos. Porém, considerando a complexidade 138 do tema, esse aspecto não compôs o modelo e, portanto, não foi tratado neste trabalho. Estudos empíricos empregando o modelo poderiam ampliar sua sustentação teórica. A proposição de um modelo de serviço de dispensação de medicamentos no SUS abre a discussão sobre o acesso a esse serviço, sua constituição teórica e na cultura ocupacional. A complexidade do tema exige um amplo debate nas ciências farmacêuticas, visando seu aprimoramento e ampliando seus desdobramentos. O modelo proposto, embora tenha utilizado o contexto brasileiro em sua constituição, exibe potencial para ser adaptado a outros países. O contexto do sistema de saúde é determinante na organização dos serviços, porém, alguns princípios aqui postulados podem ser úteis e válidos quando aplicados em outras realidades. Agradecimentos Os autores são gratos ao Programa de Pós-Graduação em Farmácia, PGFAR, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil e ao Fundo de Apoio à Pesquisa, Universidade da Região de Joinville, Joinville, SC, Brasil. 8 UTILIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE SAÚDE E DE MEDICAMENTOS SOB A PERSPECTIVA DOS PACIENTES: ESTUDO QUALITATIVO 141 Este artigo analisa dados qualitativos provenientes de entrevistas de pacientes admitidos em um serviço de urgência e emergência de um hospital. Os dados são confrontados com o modelo de Comportamental de Uso de Serviços de Saúde e discutidos, considerando o modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos. O artigo foi submetido à Revista Pan-americana de Saúde Pública. Utilização de serviços de saúde e de medicamentos sob a perspectiva dos pacientes: estudo qualitativo Resumo Objetivo: Analisar as relações entre o uso de serviços de saúde e de medicamentos, a partir do modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde, considerando o modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos. Métodos: Estudo qualitativo a partir de entrevistas com pacientes de um serviço de urgência e emergência no Brasil, entre janeiro e maio de 2012, sobre a experiência de uso de serviços de saúde e o uso de medicamentos. Os dados envolveram questões relacionadas a fatores predisponentes, capacitantes, necessidade, comportamentos e desfechos em saúde. Resultados: O financiamento e a organização dos serviços emergiram como fatores percebidos como determinantes sobre o acesso a serviços de saúde e a medicamentos. A formação de necessidades é evidenciada pela valorização do medicamento atribuída ao médico e assumida pelo participante. Nas declarações, o uso de medicamentos também foi relacionado aos aspectos de comportamento (como a adesão e a automedicação), do processo de cuidado (relacionado à atuação do provedor); e aos desfechos (associado à satisfação). 142 Conclusões: A percepção dos pacientes denota uma intrincada e complexa associação entre o uso de serviços de saúde e de medicamentos, cuja lógica predominante parece ser a do medicamento como um insumo em serviços de cuidados de saúde, em acordo com as teorias mais gerais sobre serviços, caracterizados como processos intensivos em interações. Um serviço de dispensação de medicamentos reúne as condições de disponibilidade, acessibilidade e eficiência para articular os fenômenos decorrentes da farmacoterapia às necessidades de pacientes e à equipe provedora de cuidados. Descritores: Uso de Medicamentos; Acesso aos Serviços de Saúde; Serviços Farmacêuticos. Introdução O acesso a medicamentos é um atributo dos usuários de serviços de saúde e mobiliza recursos, esforços e estratégias para sua disponibilização. Os medicamentos ganharam importância singular nos sistemas de saúde por todo o mundo, tanto como ferramentas fundamentais para mitigar o sofrimento humano268, quanto pela influência que sua disponibilidade exerce sobre como os profissionais de saúde e pacientes lidam com o processo saúde-doença60. Os estudos de utilização de medicamentos “focam sobre os fatores relacionados à prescrição, dispensação, administração e uso de medicamentos e seus eventos associados, cobrindo os determinantes médicos e não médicos, os efeitos da utilização, bem como, estudos de como a utilização de medicamentos relaciona-se aos efeitos”344. Os trabalhos sobre acesso focam a disponibilidade de medicamentos125,136, o acesso financeiro170,193, a frequência de pessoas recebendo medicamentos120,134, entre outros aspectos. Por outro lado, Aday e Andersen23, analisando o acesso a serviços de saúde, identificam que no 143 “conteúdo implícito do conceito de acesso está o fato de que certas categorias de pessoas têm ‘mais’ ou ‘menos’ acesso”. A utilização adequada dos serviços de cuidados representa a diretriz de funcionamento de todos os sistemas de saúde. Considerando uso como “todo contato direto – consultas médicas, hospitalizações – ou indireto – realização de exames preventivos e diagnósticos – com os serviços de saúde”, a utilização de serviços resulta da interação e do comportamento do paciente usuário com o profissional provedor12. O uso de serviços de cuidados de saúde e o acesso a medicamentos são fenômenos complexos e multidimensionais. Compreender seus elementos e relações constitui um grande desafio analítico. O modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde, descrito por Andersen e Davidson76, foi adotado como modelo teórico na concepção e na análise da dinâmica de utilização dos serviços de saúde deste estudo; e o modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos, proposto por Soares e colaboradores229, foi considerado na discussão da utilização de medicamentos. O modelo de Andersen expressa as influências e relações observadas no uso de serviços de saúde, destacando as dimensões contextuais e individuais das características predisponentes, dos fatores capacitantes e da necessidade em saúde, dos comportamentos e dos resultados em saúde. O uso pode ser caracterizado em termos de seus tipos (quem é o provedor); local (onde o cuidado pode ser obtido); propósito (objetivo do cuidado); e o intervalo de tempo envolvido (considera contato, volume e continuidade do cuidado)23. O modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos inclui o acesso como um atributo e o uso racional de medicamentos como o seu propósito, integrando a gestão, o acolhimento, vínculo e responsabilização, e a clínica farmacêutica (como parte da dispensação a ser provida a todos os pacientes) como meios para prover tratamento farmacológico qualificado. O objetivo deste trabalho é analisar as relações entre o uso de serviços de saúde e de 144 medicamentos a partir do modelo de Andersen, considerando o modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos. Para esta análise realizouse um estudo qualitativo da perspectiva de pacientes de um serviço de urgência e emergência hospitalar. Métodos O protocolo de estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do hospital. Adotaram-se todas as medidas para preservar a integridade dos sujeitos da pesquisa no decorrer do trabalho. O estudo foi empreendido em um Serviço de Urgência e Emergência Tipo III (SUE) de um Hospital Geral da administração direta da saúde de abrangência regional345, com 249 leitos, em um município de médio porte no Brasil, com 515 288 habitantes, em 2010346, entre janeiro e maio de 2012. Desenho e recrutamento Estudo qualitativo exploratório. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas para captar a percepção e experiência dos participantes sobre o uso de serviços de saúde e o uso de medicamentos em itinerários terapêuticos recentes. Na primeira fase, os pacientes que aguardavam atendimento no SUE foram convidados a participar, apresentando o objetivo do estudo e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para assinatura. Os critérios de elegibilidade incluíam pacientes com idade acima de doze anos, capazes de se comunicar ou que estivessem acompanhados por cuidador (acompanhante que demonstrasse conhecimento da história médica do paciente, medicamentos utilizados e aspectos relacionados à doença e ao tratamento). Os critérios de exclusão abrangiam: a) pacientes que não concordaram em assinar o TCLE ou responder às 145 questões realizadas na entrevista; b) pacientes atendidos no SUE em decorrência de causas externas de morbidade e mortalidade e de lesões, envenenamentos, entre outras, com exceção dos códigos T36 a T50 (intoxicação por drogas, medicamentos e substâncias biológicas) da Classificação Internacional de Doenças (CID-10); e c) gestantes. Ao finalizar, o paciente era convidado a participar de uma nova entrevista. Na segunda fase, foram incluídos todos os sujeitos entrevistados na primeira fase e que aceitaram agendar nova entrevista. O agendamento foi realizado via telefonema, em até cinco tentativas em dias e turnos diferentes, com fim determinado pela resposta ou pelo status de ‘não encontrado’. Dezessete pessoas recusaram o agendamento, 11 não puderam ser encontradas, 9 residiam em outro município, 1 havia falecido e 1 encontrava-se internada no período de recrutamento. A amostra foi dimensionada por conveniência, considerando aspectos como a dinâmica da frequência no SUE; a abrangência de diferentes turnos de recrutamento; e o monitoramento do limiar, após o qual não se observou a emergência de novos dados que levassem a entendimentos adicionais, indicando que a saturação teórica tinha sido atingida347. Coleta de dados Na primeira fase, a entrevista seguiu um guia, elaborado com base nos instrumentos desenvolvidos por Dall’Agnol e colaboradores348, e testado previamente. As entrevistas foram realizadas por entrevistadores treinados e, com autorização do participante, gravadas em equipamento digital. Na segunda fase, no domicílio do participante ou em local definido por ele, a entrevista semiestruturada permitiu uma comunicação focada, com ordenamento das questões abordadas, mas assegurando uma progressão natural da conversação e oferecendo flexibilidade na 146 elaboração das questões e no levantamento de novos tópicos de discussão. A participação do cuidador em conjunto com o paciente na entrevista foi permitida, quando ocorreu. As informações foram registradas pelo entrevistador em gabaritos próprios e pela gravação da entrevista, desde que autorizado previamente pelo participante. Os questionários que guiaram a entrevista foram desenvolvidos e testados previamente em uma fase piloto. As questões abordavam dados sociodemográficos (raça, sexo, idade, estado civil, etc); o histórico clínico, envolvendo doenças agudas e crônicas e sintomas; a busca por cuidado médico; a fonte de cuidado; e o histórico farmacoterapêutico, envolvendo dados sobre o uso de medicamentos nas respectivas situações clínicas, medicamentos sem prescrição e aspectos relacionados. As questões, embora focadas, eram abertas; após manifestação espontânea, o informante era estimulado a detalhar algumas informações de sua resposta ou abordar novos aspectos sobre o tópico, visando explorar sua experiência (ou a experiência familiar), na busca de cuidado e uso dos serviços de saúde em situações envolvendo ou não medicamentos. Os pacientes foram estimulados, ainda, a apresentarem sua visão retrospectiva sobre as doenças que o afligiam, sua trajetória terapêutica e a influência e perspectiva sobre sua vida. O registro fotográfico da(s) prescrição(ões) do(s) medicamento(s) atuais e embalagem(ns) foi realizado, quando disponível(is) e autorizado. Análise dos dados O modelo de Andersen foi utilizado, principalmente no que se refere às dimensões das características individuais, comportamento em saúde e resultados. As características predisponentes (aspectos demográficos, sociais e crenças), os fatores capacitantes (financiamento e organização), a necessidade (percebida e avaliada), os comportamentos em saúde (práticas pessoais e processo de cuidado) e os desfechos 147 (estado de saúde e satisfação) foram empregados como códigos prédefinidos para a análise. Uma reflexão crítica foi realizada com relação às características específicas que emergem dos dados e dão personalidade analítica distinta ao produto da codificação. Os dados provenientes dos registros obtidos nas entrevistas e dos registros de áudio foram transcritos, textualmente, em arquivos independentes de editor de texto. Cada transcrito foi lido para o entendimento global de cada relato, e, então, a análise de conteúdo dos dados foi conduzida. Na codificação do corpus discursivo usou-se o software de gerenciamento de dados qualitativos Atlas.ti (versão 6.2.28, Atlas.ti GmbH, Berlin), no qual as sentenças e frases contidas nos textos transcritos das entrevistas, que apresentavam significado no contexto do modelo de Andersen, foram isoladas como citação e rotuladas com o código adequado. Procurou-se, quando pertinente, evidenciar como o fenômeno do uso de medicamentos articula-se à carga semântica do conteúdo codificado. Resultados Entre os 77 participantes da primeira fase, a média de idade foi de 48,8 ± 17 anos e mais de um quarto dos participantes tinham mais de 60 anos. A maioria eram mulheres, brancos e com ensino fundamental incompleto. Metade dos entrevistados já havia procurado um serviço de urgência em período inferior a 30 dias. Uma proporção superior a três quartos dos informantes declararam usar medicamentos em situações clínicas crônicas e medicamentos para outras condições nos últimos 10 dias. Na segunda fase, 17 pessoas foram entrevistadas. O perfil desse subconjunto foi semelhante ao encontrado nas características dos entrevistados da primeira etapa. Adicionalmente, a maioria era casada (70,6%), alguns empregados (35,3%) e com renda per capita média 148 inferior a R$ 915,00 (1,5 salários mínimos em 2012). Os dados estão apresentados na Tabela 8-1. Tabela 8-1 – Características dos sujeitos da amostra do estudo N. (%) Indicador 1ª Etapa 2ª Etapa Características N. 77 17 Idade (± desvio padrão), média 48,8 (17,0) 47,8 (17,7) Mulheres 46 (59,7) 14 (47,1) Tabagismo atual 13 (16,9) NA Cor / Raça Branco 67 (87,0) 14 (82,4) Preto 09 (11,7) 03 (17,6) Pardo 01 (1,3) NA Escolaridade Fundamental Incompleto 43 (55,8) 09 (52,9) Fundamental Completo 10 (13,0) 02 (11,8) Médio Incompleto 05 (6,5) 01 (5,9) Médio Completo 14 (18,2) 04 (23,5) Superior Incompleto 03 (3,9) 01 (5,9) Superior Completo 02 (2,6) NA Tempo decorrido de busca anterior por serviço de urgência a < 10 dias 26 (35,1) 05 (31,2) 11 e 30 dias 11 (14,9) 03 (18,8) 30 e 365 dias 16 (21,6) 03 (18,8) > 366 dias 21 (28,4) 05 (31,2) Uso de medicamentos Situações crônicas b 14 (18,2) 04 (23,5) Outras situações nos últimos 10 dias b 15 (19,5) 02 (11,8) Nas duas situações 45 (58,4) 11 (64,7) Em nenhuma das situações 03 (3,9) NA a. n=74 na primeira etapa; n=16 na segunda etapa. b. Uso exclusivo do medicamento na situação indicada. NA: não aplicável. Fonte: Elaborada pelo autor 149 Na análise do conteúdo das entrevistas, as relações encontradas não foram exclusivas e mostraram complexidade com associações multidimensionais, com diversidade de sentidos, envolvendo contradições, certezas, apropriações de discursos, reproduções, busca por legitimação e busca de compreensão sobre a doença e a necessidade. Características individuais Características predisponentes Existem condições que predispõem, ainda que indiretamente, as pessoas a utilizar serviços de saúde76. Algumas declarações relacionaram fatores demográficos, sociais e de crenças com o uso de serviços de saúde e o uso de medicamentos. Esses elementos não apareceram isoladamente, e, muitas vezes, observou-se sobreposição das influências e dos desdobramentos dos efeitos. Os resultados são descritos e ilustrados com citações no Quadro 8-1. 150 Quadro 8-1 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com as características individuais predisponentes Fator Descrição dos resultados Exemplos de citações Demografia Observou-se a percepção dos usuários de que a idade determina um acesso diferenciado a serviços, bem como está relacionada a certas doenças. O estado civil é identificado como um fator que influencia na utilização dos medicamentos, associado ao auxílio no seu uso ou na busca por serviços de cuidados. A região de residência também foi identificada como moduladora da obtenção de cuidado. Sociais Na fala dos usuários, observou-se que a renda é percebida como um determinante da forma como os medicamentos são obtidos. O trabalho é mencionado como limitador da busca e manutenção do cuidado, e as doenças e a busca de cuidado como que prejudicando o emprego. “Pra eles eu acho fácil, pra mim eu não acho... pra mim eu acho bem difícil... pra adultos, pra idosos...”. [referência à diferença na obtenção de cuidado nos serviços de saúde no município entre crianças (“eles”), adultos e idosos] “Ele falou pra mim o seguinte: por eu ter essa minha idade que eu to agora... eu tenho direito nessa cirurgia... eu não tenho nada que pagar para um particular... que eu tenho direito... por causa da minha idade...” [Informante relata a convicção sobre o direito à cirurgia no maxilar, que refere aguardar há 5 anos] “A minha esposa tá sempre do meu lado... essa máquina aí, ela ficou... uns 30 dias em treinamento, ela e meu filho... já peguei até o jeito... ela fala – tomou aquele remédio? Eu - tomei!...” [Informante de 63 anos que relaciona a utilização de um equipamento domiciliar de diálise e de medicamentos ao cuidado da esposa]. “Não, não tenho condições... se fosse pra pagar... assim essa hora taria esperando ainda, porque não, não tem condições” “Ah menino... é... [o medicamento] não pode faltar, né... tem que ter um dinheirinho, porque senão a gente. Hoje eu digo por que o meu pai morreu cedo... falta de recurso... ele trabalha na roça e tinha a mesma enfermidade que eu tenho... hoje eu vejo porque o meu faleceu... falta de recurso...” [Refere a necessidade de renda para prover medicamentos] Quadro 8-1 – Continuação Crenças Os pacientes associam em suas falas opiniões, convicções pessoais, atitudes com o uso de medicamentos ou serviços. Os relatos envolvem mudanças de dose, início de tratamento com medicamentos, interrupção, manutenção, descontinuação, ou atitudes relacionadas, justificadas por percepções e convicções pessoais, ou por discurso de interpretação das instruções médicas. “Uma que ele não toma é essa vacina... porque um vizinho tomou... e deu uma reação muito forte... e como ele é cheio de problema... ele não tomou daí... ele tem medo...” “é, é isso mesmo... se a pressão tiver muito alta, daí ele tem que tomar mais que um, né...” [cuidadora com referência à farmacoterapia anti-hipertensiva do pai] “Esses remédios do SUS, muitos deles não faz efeito nenhum... ele disse, de repente já que o meu problema é um pouco mais grave então... ele não trabalha nem com o genérico também...”. “Aí ele disse que, então eu não pegasse mais... que eu comprasse... por causa que eu tomava e a pressão não baixava, né...”. “Eu usei esse [Levonorgestrel 0,15mg/ Etinilestradiol 0,03 mg] aqui, daí... começou a me dar umas cólicas também, daí ele não deixou mais eu tomar... ele receitou um mais fraquinho...daí não tomei, porque a sobrinha dele [marido] falou pra mim que não era pra tomar... porque era muito fácil de engravidar...daí não tomei...”. 151 152 Fatores capacitantes A combinação de fontes de financiamento esteve presente no relato da maioria dos participantes. Muitos entrevistados referiram ter realizado pagamento direto para aquisição de alguns serviços de saúde (exames, consultas e procedimentos de maior complexidade como cirurgias) e todos referiram o pagamento direto para aquisição de alguns medicamentos. Um informante relatou que, para suprir a falta recorrente de medicamento obtido via judicial, ele costuma fazer estoque domiciliar do produto, administrando, diariamente, apenas um dos dois comprimidos prescritos, economizando metade do produto obtido para suprir o período de desabastecimento. Justificou que o preço elevado do medicamento e sua renda inviabilizariam a aquisição por pagamento direto. As unidades básicas de saúde (UBS) foram citadas como uma fonte de natureza pública importante, mas nunca constituíram a única fonte para a obtenção de medicamentos. Entre as razões identificadas pelos pacientes estavam: 1) alguns medicamentos prescritos não são ofertados pelo SUS; 2) desabastecimento eventual ou recorrente de alguns medicamentos (padronizados pelo SUS no município); 3) necessidade de obter nova prescrição para receber os medicamentos quando o agendamento da consulta médica não foi coincidente; 4) conselho médico para não utilizar medicamentos do SUS em função de uma pressuposta qualidade inferior; 5) medicamentos usados sem prescrição médica. Em alguns casos, os pacientes declararam procurar periodicamente a UBS para verificar o status da disponibilidade dos medicamentos; em outros assumiram que determinado medicamento sempre está em falta e procuraram uma alternativa permanente. Em um dos casos, o paciente assumiu a aquisição de medicamentos pelo sistema de copagamento no 153 programa Aqui tem Farmácia Popular como a fonte principal de obtenção de medicamentos, abrangendo o tratamento da dislipidemia e hipertensão, justificando que alguns são “de graça” e outros “porque são baratos”. A negativa de um processo administrativo para obtenção de medicamentos do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica foi encarada, por uma informante, como evidência da “impossibilidade” de obtenção do medicamento no serviço, passando a adquiri-lo por pagamento direto. O Quadro 8-2, a seguir, sumariza os resultados. Necessidades em saúde De forma geral, todos os pacientes expressaram o que se pode considerar necessidade em saúde, da perspectiva de quem sofre ou do sujeito do cuidado (Quadro 8-3). A necessidade avaliada foi expressa, pelos participantes, com a descrição do comportamento médico diante do quadro apresentado pelo paciente, a partir da definição de realizar procedimentos (diagnóstico ou intervenção) no processo assistencial e com relação à prescrição de medicamentos. 154 Quadro 8-2 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com os fatores capacitantes Fator Financiamento Descrição dos resultados Exemplos de citações Os preços de produtos e a relação renda familiar/custo final de aquisição foram, em geral, considerados muito elevados. Alguns participantes relataram que não poderiam financiar os cuidados que obtiveram no SUS se tivessem que dispor de recursos próprios. A aquisição de medicamentos por pagamento direto foi associada, na visão dos informantes, ao abastecimento intermitente de alguns medicamentos, à indisponibilidade de medicamentos prescritos nas listas do município, à conveniência do paciente e à crença sobre a qualidade inferior dos medicamentos disponíveis no SUS. Em alguns casos, o pagamento direto como alternativa à indisponibilidade pública, ocorreu mesmo sob a condição de comprometimento financeiro pessoal. Atitudes atribuídas a provedores apareceram como elementos indutores da aquisição por pagamento direto. O financiamento foi relacionado ao adiamento ou desistência da busca por cuidados, à permanência nas filas de espera, à busca de alternativas para viabilizar o cuidado ou à resignação. “Esse eles dão no postinho... mas a minha mãe fez o cadastro na popular... essa sinvastatina 40 custa R$ 13,50, duas caixinhas... se for comprar por aí é 35 e pouco cada caixa...” [Sinvastatina, 40 mg, 60 comprimidos; relata aquisição do medicamento no programa Aqui tem Farmácia Popular pela irregularidade no abastecimento da UBS] “... esse pega lá na Farmácia... [farmácia do SUS que dispensa medicamentos sob acesso judicial]... quando tem... três meses faltou... e é caro pra caramba... três meses tive que comprar...”. [Diosmina/Espiridina 450 mg/50 mg; 2 comprimidos/dia; custo declarado R$ 200,00/mês/60 comprimidos; medicamento não padronizado nas listas do SUS, de aquisição por mandado judicial extensivo ao portador de prescrição] “É caro porque é um remédio que tu tem que tá tomando todo mês...”. “Tem mês que dá em torno de R$ 100,00...”. “A minha esposa tem problema de... tireoide... ela também toma... daí tem mais o dela...”. “Eu faço particular, né... já cheguei adiar por causa de dinheiro mesmo, né... porque é muito caro as consultas, os exames são caros... quando tem condições eu vou, né... tem que ir...”. [Adquire serviços de fontes privadas, pois em sua avaliação, os serviços do SUS apresentam qualidade ruim e tempo de espera muito prolongado] 8-2 – Continuação Organização Declarações de participantes caracterizaram o hospital como referência de cuidado especializado ambulatorial. Os discursos indicam vínculo frágil entre sujeitos e unidades básicas de saúde, em muitos casos, usada apenas para agendar consultas ou para obter medicamentos. Exames diagnósticos e consultas especializadas foram citados como barreiras ao uso de outros serviços ou à continuidade do tratamento. As filas e o tempo de espera para realizar procedimentos, e a indisponibilidade de serviços/ medicamentos foram citados recorrentemente. As declarações sobre o desabastecimento de medicamentos nas unidades provedoras foram comuns. Observou-se a percepção de que as UBS só dispõem de medicamentos “mais simples” e de menor custo. “A maioria é lá no Hospital [A]... no ambulatório... no postinho ele não vai em nenhum...ele nunca foi no postinho... só pra pegar o remédio... daí agora tem o Neuro que é no... no Hospital [B]... e o reumatologista que ele pagou particular, né... daí quando precisa ir assim... R$ 220,00 a consulta...social, né...”. “Só que lá também, pra ser pessoa idosa... a minha mãe... ela foi lá pegar o clopidogrel... eles deram uma folha... aí escreveram atrás... Neurologista ou Médico Vascular preencher... fui lá no hospital... um dia de manhã... esperei lá como se fosse uma consulta... pra eles preencher aquela folha... aí a mãe foi lá no postinho com a folha... ah, não... que o médico não botou não sei o que... aqui tem que ir o cardiologista... não forneceram...” [Referência a medicamento prescrito para seu pai; embora tivessem cumprido os requisitos solicitados pelo serviço, declara que o medicamento não foi dispensado] 155 156 Quadro 8-3 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com necessidades em saúde Fator Percebida Descrição dos resultados Exemplos de citações A percepção de necessidade incluiu condições complexas apresentadas por idosos, pessoas com múltiplas doenças e com doenças graves ou em situação de dor crônica, envolvendo o desejo de descobrir o diagnóstico, da cura ou do controle da doença, de sentir-se bem, ou, ainda, de “simplesmente” reduzir a dor. As necessidades também foram expressas com o que se desejava como cuidado, sem, necessariamente, relacionar ao resultado do uso do serviço ou do insumo. Na maioria das entrevistas, os medicamentos foram valorizados como fundamentais para alcançar o estado de saúde desejado, sendo que essa valorização foi relacionada, frequentemente, à representação do discurso médico. Observamos nas declarações a presença de valores culturais e aspectos sociais influenciando a formação e expressão das necessidades e suas consequências. “Tornou-se até acho que um vício, né... tu sente que tu vai ficar resfriada... daí tu já... toma... eu acho que é mais um vício...porque a gripe fica o que, resfriado fica sete dias...no teu corpo, né...então tu acha que tá melhorando...mas na verdade é que ela já tá indo embora, né... mas mesmo assim, tu tem que tomar...” [Segundo a informante o produto associação de Dipirona sódica 250 mg; Maleato de clorfeniramina 2 mg não pode faltar em casa para o uso dela e da família] “A colchicina [0,5 mg] eu uso quando dá a crise da Gota, né...mas como faz mais de um ano que não me dá...porque eu to procurando controlar a alimentação...então os níveis de ácido úrico, né...então não chega dá a cristalização nas articulação... não dá crise...mas porque eu cuido...então a colchicina, faz um ano que eu não uso...agora o alopurinol [100 mg, 3 comprimidos/dia], não... esse tem que tomar direto, né...porque esse aqui é que controla os níveis de ácido úrico”. A codeína “...começou a me fazer mal também, dava tontura... muita sonolência, atacava o estômago... meio um mal estar assim, daí cortei. Só quando tinha muita dor mesmo... que eu tomava. Mas tomei uns 4 dias só... aí fiquei mais no diclofenaco”. [Valorização pelo paciente do medicamento para aliviar a dor apesar das reações adversas] 8-3 – Continuação Avaliada As declarações incluíram a descrição e análise de comportamentos médicos relacionados a diagnóstico, a procedimentos, prescrição de medicamentos e avaliação dos resultados. As falas expressavam a visão do participante sobre a necessidade avaliada, relacionando-a ao nível de satisfação com o provedor do serviço. A necessidade avaliada também aparece em comparação ao que o participante desejava contra aquilo que o provedor estava disposto a fornecer. Muitos participantes justificaram a necessidade de medicamentos por terem sido prescritos por médicos. A necessidade era questionada quando o resultado não era o esperado ou se haviam efeitos adversos. “Uns dois meses fiquei com aquela dorzinha... aí a gente pensa que... já vai passar..., já vai passar e não passava, daí até que eu fui na médica e a médica só no toque ali ela já falou - É hérnia, vamos comprovar fazendo ultrassom”. “Agora fui no médico do coração... ele disse tu toma esse aqui ó...que a tua pressão nunca mais vai subir...é pra voltar dentro de 4 meses... vou voltar quinta-feira agora...eu tomei dois comprimidos...pode abrir a caixa aí, ó... dois comprimidos...me atacou o coração e as veias...me entupia todo...ele foi lá pro Estados Unidos... ele diz que é batata... a pressão não levanta mais... a pressão quase me matou... a dor no peito... no coração... me afogou todo... me deixou de cama rapaz”. [Referência à Telmisartana 80 mg, 28 comprimidos] “... Tomava né, quando o médico receita tem que tomar, né, certinho, senão não faz todo o efeito”. 157 158 Comportamentos e desfechos em Saúde Observou-se grande diversidade de comportamentos relacionados à doença relatada, à busca de cuidado, à adesão ao tratamento e ao acesso. Por outro lado, as interpretações e abordagens dos informantes variaram quanto ao processo de cuidado. Alguns relatos aparecem como decorrência do comportamento médico, outros buscam expressar a reação do paciente a comportamentos julgados inadequados. A partir de informações e avaliações atribuídas aos médicos, de informações de outras fontes e de convicções pessoais os informantes expressam sua avaliação sobre o próprio estado de saúde. A percepção do estado de saúde envolveu aspectos relacionados à vida como um todo, sendo raramente restritos ao problema de saúde. A satisfação apresentou grande variação e estava associada a muitos aspectos diferentes dos cuidados em saúde, envolvendo, de forma recorrente, a disponibilidade de medicamentos e os resultados obtidos na farmacoterapia. Os resultados e as citações foram sumarizados nos Quadro 8-4 e Quadro 8-5. Quadro 8-4 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com os comportamentos em saúde Fator Descrição dos resultados Citação de exemplo Práticas pessoais em saúde Os pacientes expressaram convicções e comportamentos que afetaram a formação da necessidade, o modo de encarar a doença, o processo de cuidado e a satisfação com o serviço, incluindo: comportamentos relativos à atividade física, dieta, adesão ao processo de cuidado e à farmacoterapia, e a automedicação. As decisões no itinerário terapêutico exibiram relações múltiplas. A autonomia apareceu como um componente dessas práticas, expressa, recorrentemente, no uso de medicamentos, refletida no manejo da posologia, decisão sobre continuar o tratamento e sobre manter ou trocar medicamentos. A maioria demonstrou, em suas falas, determinação para assegurar a obtenção de cuidado, mesmo em circunstâncias de escassez de vagas ou de recursos, ou com um tempo de espera elevado. “A única coisa que eu tomo quando tô com gripe é água gelada” “Aí você vê como o exercício... olha é uma benção o exercício... eu ando de esteira todo dia... aí você vê... o exercício é o melhor remédio pra gente...” “Eu comprei por minha conta própria... porque como deu febre, tudo, eu comprei um anti-inflamatório... uma amoxicilina... que eu tava... muito congestionada”. [Antibiótico adquirido em outro município por não ter a exigência de prescrição]. “o antibiótico tem que ser tomado na hora certa, né... porque senão não faz efeito né?...ele é um remédio contínuo... sete dias contínuos”. “Pra dor de cabeça, né?... o dia que me incomodo muito... Quase toda semana tomo pelo menos um comprimido”. [associação de Mucato de Isometepteno/Dipirona Sódica/Cafeína Anidra 30/300/30 mg] “... outro dia eu não tinha tomado, eu tava lá no meu filho... daí começou a girar minha cabeça... eu digo - ah meu Deus... daí eu disse assim pro meu sobrinho, porque eu não queria que o meu filho escutasse senão ela já me levava no hospital, né... eu disse – eu to assim com a minha cabeça... parece que tá girando tudo... – A tia toma remédio de pressão? –A pressão da tia é alta? – Então a tia vai lá, faz uma água de açúcar bem forte e toma... passou na hora...”. “Eu passo até 3 dias sem tomar... eu não sinto nada, aí eu não tomo”. 161 160 8-4 – Continuação Processo de cuidados em saúde Diversas declarações evidenciaram as relações dos provedores de serviços e pacientes, e como o cuidado foi afetado na visão do paciente. Nessa categoria, aparecem questões sobre o serviço de cuidado provido, incluindo a prescrição de medicamentos, relacionados aos resultados percebidos e à satisfação com o serviço. Os questionamentos específicos sobre medicamentos foram, de forma geral, associados, pelos participantes, ao ato de prescrição do médico, e, então, ligados à efetividade e à segurança do produto. Muitos relatos expressam a influência do comportamento profissional sobre as práticas pessoais, sobre a formação da necessidade, sobre o financiamento, sobre o estado de saúde e sobre a satisfação com o serviço. Entre esses efeitos destaca-se o acesso a exames diagnósticos e à aquisição de medicamentos. “Eu levei 3 vezes no hospital [SUE], eles davam remédio e mandavam ela embora... aí, em janeiro, eu fui de novo lá com ela, aí eu pedi que... se fosse possível uma internação pra ela...que ela tava me incomodando muito em casa...não podia mais com ela, né... naquele dia mesmo eles internaram ela...”. [Referência a um surto psicótico apresentado pela filha] “Antes de eu ir lá para o [SUE] eu tive... acho que uns 3 dias antes... na quarta, quinta-feira eu tava com a mesma dor... eu fui no [serviço de urgência municipal - SUM] aqui do [bairro de residência]... e o médico mandou eu tomar diclofenaco... não mandou fazer exame nenhum...a dor continuou, eu voltei a trabalhar... domingo começou a doer demais, aí começou a me dar falta de ar... foi quando eu disse não, vou lá para o [SUE], nem adianta ir lá no [SUM]. “O que que o cardiologista me falou: - o por que que eles me mandaram tomar esse remédio... né? Se eles não tinham feito nada? Eles não fizeram um exame detalhado. [para confirmar Angina pectoris] “...o cardiologista me questionou por que eu tava tomando, se eu ainda sentia dor, eu – quando eu faço força dói. – Pô, mas então aí pode ser uma tendinite... – Tá bom, eu vou ser bem sincero contigo, se tu quiser tomar o remédio tu pode tomar, agora se você quiser parar até o teste ergométrico, pra nós ter certeza... aí fica a teu critério”. Quadro 8-5 – Descrição dos resultados e exemplos de declarações convergentes com os resultados em saúde Fator Estado percebido de saúde Descrição dos resultados Citação de exemplo Os pacientes relacionaram o problema ou o tratamento às limitações que enfrentam cotidianamente. Os medicamentos são citados, em alguns casos, como um fator de limitação. Os estados de saúde avaliados como ruins são frequentemente relacionados à falha ou à demora do tratamento. ”Não tomei porque me trancou a urina de uma vez... eu já tava ruim pra urinar, de dia, né...de dia eu não urino... mas de noite eu urino uma porção...”. [Referência ao medicamento oxibutinina 5mg, 60 comprimidos, justificado pela percepção ruim sobre seu estado de saúde] “nesse dia ... é porque eu não tomei a medicação e a crise ficou muito forte... não tomei, porque eu não tinha em casa, né... aí passei muito mal, comecei a vomitar... a dor foi muito forte...”. [Ligação entre o estado percebido e a não utilização do analgésico diclofenaco sódico injetável, indisponível em casa] “Hoje a minha pressão tá mais controlada... eu fiquei muito tempo fazendo tratamento e o médico não conseguiu baixar minha pressão... era muito difícil controlar... ela disparava assim na moita... quando eu ia ver ela tava lá em cima... mesmo tomando remédio... e agora não... de um tempo pra cá, dificilmente ela sai fora dos padrões...”. 161 162 8-5 – Continuação Satisfação do usuário As declarações envolveram dificuldades encontradas para o acesso ao cuidado, sofrimento e incertezas causados pela doença, sucesso terapêutico e angústia por tratamentos ainda pendentes. Encontramos elementos relacionados a expectativas, a experiências anteriores, a avaliações comparativas e à qualidade do serviço percebida; relações entre a formação da satisfação e os demais fatores individuais e comportamentais; expectativas com as práticas dos provedores, incluindo a prescrição de medicamentos que “resolvessem o problema”, e a comparação de serviços e de tratamentos farmacológicos. “é rápido lá, quando eu vou com dor. É rápido!”. “Agora nessa época que não tinha urologista lá dentro, daí... ficava lá... cheguei a ficar dois dias lá embaixo”. [Referência ao tempo de espera na SUE do hospital] “Eu vou direto no Regional...Diabetes...tudo é do Regional... lá eles acompanham do começo, né... dá tudo os remédios...tô tomando tudo certinho...Eu já tô com cinco anos aqui, direto no Regional... a cada 3 meses eu tô indo lá...” “A doutora muito boa...ela fez tudo...oh.. você vê... essas caixas aqui, isso é tudo lá da hemodiálise...veio a máquina novinha... ela mandou novinha...médica muito boa...aí eu chego lá, ta cheio de médico, lá...dá a receita da alimentação... tudinho eu faço...” “Uma que ele não toma é essa vacina... ah porque um vizinho tomou e a vizinha lá e deu uma reação muito forte... e como ele é cheio de problema... ele não tomou daí... ele tem medo...” “Não procurei porque eu mesmo me mediquei... cansado de ir pro hospital e... porque o atendimento é sempre o mesmo... a gente já sabe o remédio que eles vão dá, né... eu mesmo compro o [Diclofenaco sódico] injetável e eu mesmo me aplico...” [Referência à expectativa que o atendimento não será diferente de suas experiência anteriores; expressa insatisfação porque o serviço não resolve o problema, o que o faz concluir que não há valor ir até o hospital apenas para aplicar o medicamento] 163 Discussão Os dados obtidos a partir da perspectiva de pacientes de um SUE hospitalar sobre o uso de serviços de saúde e sua relação com a utilização de medicamentos, organizados, empregando-se o quadro teórico fornecido por Andersen e Davidson76, podem ser discutidos considerando-se o modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos, proposto por nosso grupo de pesquisa em trabalho anterior229. Alguns estudos realizados no Brasil ressaltam a importância do uso de medicamentos nos cuidados em saúde, refletida na frequência de utilização233,234,349, particularmente, em idosos350. O uso de medicamentos mostra uma intrincada e complexa associação com o uso de serviços de saúde, cuja lógica predominante parece ser a do medicamento como um insumo em serviços de cuidados de saúde, em acordo com as teorias mais gerais sobre serviços, caracterizados como processos intensivos em interações351. Nossa análise, a partir da aplicação do modelo de Andersen, evidencia a influência dos aspectos comportamentais, tanto de profissionais, quanto de pacientes sobre o fenômeno da utilização de medicamentos, e suas interações qualitativas com aspectos de natureza social, antropológica, psicológica e biológica. Uma vez que se trata de um estudo qualitativo e que nossa amostra final foi composta por 17 sujeitos, não é possível explorar estatisticamente as relações entre os fatores e efeitos medidos, nem sequer se pretendeu fazer generalizações na análise de dados. Entretanto, nossos achados têm implicações sobre a gestão dos serviços de saúde. Embora se possa identificar que os medicamentos sejam recursos no contexto de serviços, seu custo-efetividade, sua carga simbólica, a magnitude dos custos financeiros envolvidos, além de sua ubiquidade na medicina352 o destacam como um produto diferenciado. A despeito de ser um recurso com tal relevância, não se observa sua associação a serviços específicos, que façam a gestão e o manejo clínico de seu emprego. Os dados indicam que o uso de medicamentos amplia as opções reais de escolha 164 para os pacientes, dando relevo ao exercício da autonomia353 no manejo pessoal dos medicamentos. As doenças não afetam igualmente as pessoas354. A carga de doença e as condições de vida da pessoa doente são fatores que influenciam a forma de o indivíduo lidar com a doença, modulam a busca por cuidado e afetam sua predisposição para usar serviços de saúde355. O conteúdo das declarações, contendo características sociodemográficas e crenças pessoais, aludem essas relações. A iniquidade no acesso a medicamentos está associada a esses fatores, que afetam negativamente a capacidade de obter cuidado, incluindo medicamentos. A oferta de um serviço de dispensação, que tenha como atributo fundamental o acesso, poderia identificar fatores críticos para a iniquidade na farmacoterapia de modo a concretizar o acesso a esses recursos. O acesso a medicamentos apareceu no conteúdo das declarações em questões relacionadas à aquisição, à utilização e às consequências dos medicamentos no tratamento e na vida dos informantes. Muitas declarações caracterizaram barreiras de acesso a medicamentos, tanto relacionadas a aspectos de financiamento, quanto de organização. O financiamento, na visão dos participantes, foi uma barreira relevante, sendo que a restrição do acesso relacionada aos custos é associada, na literatura, ao risco aumentado de percepções negativas sobre o estado de saúde em populações vulneráveis252. Diversos fatores motivaram a percepção que o SUS falhava em ser uma fonte regular de cuidado com medicamentos. Na atenção primária à saúde, a dispensação, se organizada adequadamente, pode constituir um fator capacitante ao uso de serviços de saúde, coordenando a gestão do uso de medicamentos e organizando o uso de serviços subjacentes, que capacitem o sujeito a ter acesso aos medicamentos de que necessitam229. Nesse sentido, a identificação de barreiras para remediar as situações de acesso inequitativo76, por meio da interação entre as ações de acolhimento e gestão229, aumentam a probabilidade do sujeito 165 do cuidado a um acesso efetivo a medicamentos. O serviço de dispensação deve ser uma fonte regular de cuidado ao indivíduo, articulando o acesso a medicamentos e o seu uso racional. As necessidades percebida e avaliada resultam de julgamentos realizados por pacientes e médicos, pelas quais determinados meios são valorizados para que o desfecho pretendido seja alcançado76,356,357. Os fatores influentes sobre a demanda e seus aspectos econômicos permeiam o conflito natural entre essas dimensões da necessidade, no sentido de produzir “estoques de saúde”358. As especificidades dos medicamentos levam à definição de necessidades incongruentes com relação às definições técnico-políticas vigentes. O serviço farmacêutico pode contribuir para concretizar o que Donabedian79 conceitua como ‘serviço equivalente à necessidade’, ou seja, compatibilizar as visões de mundo envolvidas nas demandas individuais e coletivas por medicamentos, e nas políticas de provisão universal, integral e sustentável desses insumos. A clínica farmacêutica constitui uma dimensão do serviço de dispensação capaz de modular a adesão ao tratamento farmacológico; contribuir para o desenvolvimento da prescrição como uma tecnologia social integrada ao projeto terapêutico do indivíduo; e qualificar o uso dos serviços de saúde, de forma a aperfeiçoar a farmacoterapia e maximizar os desfechos. De acordo com o princípio da autonomia, os pacientes ajustam a quantidade, variam os produtos e as fontes de aquisição, de forma a atender às necessidades que percebem. Tradicionalmente, essas situações são assumidas como falhas terapêuticas, uma vez que o pressuposto dominante é que o desejo ou a necessidade sentida não é uma necessidade real359 e que a necessidade válida deve ser definida, exclusivamente, pelo conhecimento técnico-profissional. No entanto, cada vez mais se atribui a esse fenômeno uma determinada racionalidade, cujas decisões são tomadas pelos indivíduos, que conhecem, de forma única, sua situação de saúde360. Ocorre que a população pode conceber suas necessidades 166 de forma distinta da de um profissional, conforme os resultados observados, confirmados com dados da literatura356. O fenômeno da automedicação corresponde a um comportamento relacionado ao autocuidado, incluído nas práticas pessoais em saúde. Os dados demonstram que os motivos alegados são variáveis, e um discurso de autocensura emergiu em muitos casos. Existem múltiplas influências afetando o uso de medicamentos sem prescrição271. Princípios como a probabilidade de realizar a própria vontade em uma ação, mesmo contra a resistência de outros que participam da ação361, evidenciam a necessidade de compreender a automedicação em outras bases teóricas, incluindo os modelos de autonomia dos indivíduos, contra o caráter maniqueísta do paradigma atual. A adesão à farmacoterapia apareceu, de formas múltiplas e complexas, ao longo das declarações, e evidenciou uma relação entre a adesão, as necessidades, os processos de cuidados e os desfechos. O modelo de Trocas Dinâmicas de Níveis de Adesão à Medicação e Comparação de Resultados proposto por Rickles362 explica como pacientes podem relacionar os resultados e o uso de medicamentos para decidir sobre o uso futuro, baseados em expectativas e alternativas. Para adesão, em alguns casos, há a necessidade de o paciente abdicar de sua autonomia, ou seja, reduzir o locus interno de controle para convergir ao tratamento provido. Pacientes completamente aderentes experienciam um nível considerável de frustração e desapontamento quando o desfecho obtido é negativo. A relação entre os resultados e a adesão à medicação é um processo dinâmico, individualizado, energizado por realimentação contínua e pela reavaliação do paciente362. Compreender esse fenômeno e traduzi-lo em rotinas coerentes podem aumentar a utilidade da dispensação de medicamentos como um serviço de saúde. Os participantes relacionaram o estado percebido de saúde à satisfação com o serviço, e esses fatores parecem afetar o uso de medicamentos. A ‘satisfação/descontentamento do usuário’ é considerada um 167 construto complexo e multidimensional de avaliação363,364. A crença de que um objeto possua determinados atributos e as avaliações que o indivíduo realiza sobre esses atributos são determinantes da ‘satisfação/descontentamento’ com um serviço, fundamentando o modelo de Valor-Expectativa280, relevante na explicação do fenômeno. O monitoramento do estado de saúde do indivíduo e de sua satisfação relacionados a medicamentos constituem instrumentos no contexto do acolhimento, vínculo e responsabilização e da gestão229, visando ampliar os resultados positivos do uso de medicamentos. O serviço de dispensação de medicamentos reúne as condições de disponibilidade, acessibilidade e eficiência para articular os fenômenos decorrentes da farmacoterapia à realidade dos serviços de saúde. Estudos adicionais são necessários para ajustar as explicações fornecidas pelo modelo de Andersen aos fenômenos observados, e para testar o modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos, aperfeiçoando seu desenvolvimento. A precisão das declarações foi uma preocupação na coleta de dados. Embora a abordagem tenha conferido encorajamento aos entrevistados para manifestarem-se livremente sobre os temas tratados, eventualmente, pode ter havido condicionantes nas falas, modificando a expressão pretendida originalmente. A seleção da amostra teve a intenção de representar o contexto, e seu limite se deu pela observação da saturação dos principais temas tratados nas entrevistas. Agradecimentos Os autores gostariam de expressar gratidão à Profa. Januária Ramos Pereira Wiese pela contribuição no teste piloto, e ao Prof. Luciano Henrique Pinto pela contribuição na discussão da abordagem de análise. Aos alunos Layzon Antonio Lemos da Silva e Fernanda Volles pela contribuição na coleta de dados da primeira fase. 168 9 CONSIDERAÇÕES FINAIS 171 O presente estudo focou sobre a caracterização da dispensação de medicamentos como um serviço e o acesso à dispensação como um atributo de indivíduos que usam medicamentos. O acesso a medicamentos é uma categoria com baixa precisão conceitual, concentrada na disponibilização do produto, e desconectada do sistema de serviços de cuidados em saúde. O significado dos estudos, que demonstram disponibilidade elevada de medicamentos ou gastos acentuados em seu financiamento, fornece um retrato parcial da realidade, restrito aos aspectos da acessibilidade; e, assim, aprofundar a compreensão desse fenômeno e das associações de variáveis independentes relacionadas não tem sido possível a partir do quadro teórico atual. Uma característica importante do acesso é que ele é um atributo do indivíduo usuário de serviços de saúde. À exceção da área farmacêutica, as pesquisas elegem, como objeto de investigação nesse campo, o acesso do usuário a serviços assistenciais, a acessibilidade de serviços de saúde e os fenômenos relacionados. Assim, é adequado afirmar que a literatura, que trata sobre acesso, analisa características do comportamento de uso dos serviços de saúde ou as características de oferta desses serviços. Serviços são entidades econômicas, dotadas de características ontológicas específicas, que influenciam sua organização e provisão, e modulam o comportamento dos usuários, em um processo dinâmico de concriação de valores. No caso dos serviços de saúde, esses valores correspondem ao conteúdo de cuidados de saúde, e seus resultados decorrem da interação entre profissionais e pacientes. Os medicamentos são insumos considerados essenciais na provisão de serviços de saúde, e sua utilização é cada vez mais frequente e extremamente valorizada nesse contexto. Mais do que qualquer outro insumo, os medicamentos tornaram-se um elemento central na prática clínica ocidental contemporânea, ao ponto de ser o único insumo a ter políticas específicas para garantir o acesso ao usuário, ainda que 172 dissociado dos serviços de cuidados. Os medicamentos podem ser considerados fenômenos sociais que fornecem evidências tangíveis aos usuários nas experiências de uso dos serviços de saúde. Embora a importância dos medicamentos seja evidente, não existe um serviço específico, amplamente distribuído no sistema de saúde, que associe a dispensação de medicamentos à gestão de sua utilização e aos cuidados clínicos pertinentes. A utilização de medicamentos desenvolveu-se vinculada à prescrição resultante dos serviços médicos-assistenciais ou associada a processos de autocuidado. O acesso a medicamentos ganhou destaque nas políticas e práticas de gestão administrativa dos sistemas de saúde. Ambos, utilização e acesso a medicamentos, transformaram-se em construtos analíticos e foram investigados em consonância com o cenário descrito. A utilização de medicamentos é refletida nos dados de literatura a partir de um conjunto de indicadores, que representam frequências associadas ao uso e a suas consequências. O acesso a medicamentos é representado por dimensões como a disponibilidade, as questões relacionadas ao financiamento, a proporção da população recebendo medicamentos, entre outros aspectos de natureza estrutural. O financiamento é, talvez, a dimensão do acesso a medicamentos mais profundamente investigada. O número de estudos abordando o tema e o desenvolvimento teórico subjacente ressaltam sua importância. Isso, provavelmente, decorre da magnitude dos recursos envolvidos na garantia do acesso a medicamentos, e no desafio em que se transformou o custeio desses insumos para todos os sistemas de saúde. O acesso a medicamento como direito fundamental implicou no compromisso de assegurar acesso, pelo menos aos medicamentos essenciais, a todos que deles necessitem. A inimaginável expansão do uso de medicamentos na terapêutica e a escalada de preços desses insumos ocasionaram a paradoxal missão dos sistemas de saúde por todo o mundo: organização logística para ampliação da oferta de medicamentos concomitante à restrição clínica e econômica de sua utilização. 173 Na tentativa de compreender melhor a utilização de medicamentos e fomentar a construção de um modelo de serviço de dispensação de medicamentos, empregou-se, neste trabalho, o modelo Comportamental do Uso de Serviços de Saúde. Amplamente utilizado nas investigações de acesso a serviços de saúde, o modelo contribui com uma concepção sistêmica para um problema de complexidade ímpar. A investigação empírica, a partir do modelo, permitiu analisar o fenômeno da utilização de medicamentos e do acesso, sob uma ótica que extrapola a tradicional abordagem logístico-financeira predominante, dando centralidade aos sujeitos do cuidado, como advogam os princípios do Sistema Único de Saúde. As concepções de saúde dos profissionais e dos gestores e as necessidades corporativas dos diferentes profissionais que compõem a equipe de saúde apresentam um grande potencial para influenciar a organização dos serviços, bem como a seleção de quais serviços serão ofertados e quais bens tecnológicos serão incorporados ao serviço e disponibilizados aos usuários. As concepções adotadas nas investigações científicas determinarão nossa capacidade de olhar para essa realidade e enxergar apenas o medicamento, ou olhar e enxergar o acesso a um serviço de dispensação, provido a um paciente que dele se beneficie. A dispensação de medicamentos como um serviço estruturado a partir de rotinas e recursos sociotécnicos validados corporativamente, integrado ao sistema de serviços de saúde nacional, o SUS, tendo os pacientes como sujeitos de um cuidado integral, com a meta central de aperfeiçoar o uso de medicamentos nos projetos terapêuticos, pode contribuir, de forma relevante, para compor os cuidados em saúde, disponíveis aos cidadãos brasileiros. A clínica farmacêutica constitui uma nova forma de conceber o cuidado a ser provido pelo farmacêutico, e os conhecimentos necessários ao seu desenvolvimento vão além dos aspectos biológicos, químicos, médicos e farmacêuticos sobre medicamentos, convencionalmente considerados. É necessário incorporar conhecimentos de natureza antropológica, social e 174 psicológica sobre os medicamentos, e do emprego destes em serviços de saúde, a partir de concepções teóricas consistentes sobre sistemas, serviços e tecnologias. O uso racional de medicamentos surge como desfecho do serviço de dispensação e como um elemento que deve ser adequado à realidade e às necessidades brasileiras, e aos princípios avançados de constituição do SUS. Compreender o uso de medicamentos em um quadro teórico de complexidade mais coerente com a realidade permite aprofundar o conhecimento sobre o acesso a esses insumos. O acesso a medicamentos requer a discussão de sua utilização e, consequentemente, sobre os serviços de dispensação de medicamentos, que se propõem ser a interface entre pacientes e provedores dos cuidados que empregam medicamentos como insumos, a bem de uma racionalidade que contribua para melhorar o estado de saúde da população e para a satisfação dos usuários com os serviços de cuidados de saúde. Perspectivas O modelo de Serviço de Dispensação de Medicamentos representa um primeiro passo na formulação de um quadro teórico mais consistente para o acesso a medicamentos. A discussão do modelo, seu aprimoramento, testes empíricos e a construção coletiva desse arcabouço teórico representam um desafio para a categoria farmacêutica, seja no âmbito profissional ou acadêmico. O desenvolvimento epistemológico do acolhimento, vínculo e responsabilização, da gestão e da clínica farmacêutica são imperativos para aprofundar nosso conhecimento acerca dos fenômenos de acesso a medicamentos e da acessibilidade destes. A universidade tem as melhores condições para estruturar serviços modelados teoricamente, testá-los e analisá-los com rigor científico, e incorporá-los na formação 175 profissional do farmacêutico, visando o desenvolvimento de uma cultura ocupacional que inclua um serviço de dispensação de medicamentos. A caracterização dos serviços farmacêuticos, a partir do quadro teórico desenvolvido na ciência em ascensão de Sistemas de Serviços, parece ser um percurso promissor para compreender características influentes sobre fenômenos, tipicamente, investigados nas Ciências Farmacêuticas. O modelo de Andersen apresenta um quadro teórico valoroso para estudar o comportamento da utilização de medicamentos nos processos de cuidados de saúde, no contexto da Assistência Farmacêutica como uma disciplina emergente. A Assistência Farmacêutica como uma ciência pode fomentar melhorias significativas para o SUS. Não obstante, nós estamos apenas iniciando esse esforço. Nesse sentido, entender os serviços de dispensação e a utilização de medicamentos, e aplicar esse conhecimento para aprimorar nossas habilidades em desenvolver, melhorar e incorporar esses serviços ao SUS, tendo como propósitos o desenvolvimento humano e social do Brasil, são objetivos que se impõem atingir. Para tanto, a Assistência Farmacêutica apresenta-se como um desafio de integrar múltiplas disciplinas, seus conhecimentos e métodos nessa empreitada. Os serviços farmacêuticos, analogamente a outras categorias profissionais, correspondem a um corpo de conhecimentos técnicocientíficos, rotinas profissionais e cultura corporativa, que conferem especificidade e valor a esses serviços. Tal qual a característica de qualquer serviço, como entidade socioeconômica, os conhecimentos, capacidades, habilidades, rotinas e cultura envolvidas nos serviços farmacêuticos são próprias, e específicas, da categoria farmacêutica. Conceitualmente, o serviço farmacêutico só existe se houver interação entre um usuário desse serviço e o farmacêutico. A definição de quais conhecimentos, provenientes da formação do farmacêutico, e que rotinas, próprias da atuação desses profissionais, constituem o serviço 176 farmacêutico, emergem como desafios acadêmico e corporativo. No panorama, a questão: o que são os serviços farmacêuticos? Por fim, a constatação: nada está pronto, há muito trabalho a fazer! 10 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 179 1. Leite SN, Vieira M, Veber AP. Estudos de utilização de medicamentos: uma síntese de artigos publicados no Brasil e América Latina. Ciência & Saúde Coletiva. 2008;13(Sup.):793-802. 2. Brasil. Resolução CNS n. 338, de 6 de maio de 2004. Política Nacional de Assistência Farmacêutica. Diário Oficial da União, 20/05/2004. Sect. 1 (2004). 3. Bortoletto MÉ, Bochner R. Impacto dos medicamentos nas intoxicações humanas no Brasil. Cadernos de Saúde Pública. 1999;15(4):859-69. 4. Matos GC, Rozenfeld S, Bortoletto ME. Intoxicações medicamentosas em crianças menores de cinco anos. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil. 2002;2(2):167-76. 5. Barbosa RGB, da Costa Lima NK. Índices de adesão ao tratamento antihipertensivo no Brasil e mundo. Revista Brasileira de Hipertensão. 2006;13(1):35-8. 6. 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