Prisão de Ventre O mal conhecido como intestino preguiçoso, obstipação ou prisão de ventre atinge cerca de um em cada cinco pessoas. O tratamento é bastante simples, mas, na falta dele, a prisão de ventre pode evoluir para quadros mais perigosos como as hemorróidas, apendicite ou até mesmo o cancro. Um universo enorme de pessoas em Portugal e no Brasil conhece bem os desconfortos causados pela falta de regularidade para evacuar: sentem a barriga estufada, ficam mais facilmente irritados, sentem cólicas e dores quando estão no banheiro. O caso é que, por vergonha, a maior parte das pessoas não fala sobre essa dificuldade nem mesmo com o seu médico de confiança. Na maior parte das vezes, tentam resolver com métodos caseiros e até bastante arriscados, (como o uso indiscriminado de laxantes), um problema de saúde sério e que, com acompanhamento médico, pode ser facilmente contornado. Para início de conversa, é fundamental entendermos o que é, de facto, a prisão de ventre. Segundo o gastroenterologista Edmundo Anderi Júnior, professor do Aparelho Digestivo da Faculdade de Medicina do ABC, o problema é caracterizado pela diminuição na frequência das idas à casa-debanho, bem como pela dificuldade de evacuar ou pelo aparecimento de fezes endurecidas. “Dentro do quadro tido como normal, é aceitável que a pessoa evacue pelo menos uma vez a cada dois dias e, no máximo, duas vezes ao dia. As fezes devem ter consistência mais pastosa e, além disso, não podem exigir um esforço exagerado na sua eliminação”, esclarece o especialista. O problema é muito mais comum na população feminina. “As mulheres, em geral, têm mais resistência para ir à casa-de-banho fora de casa”, atesta Anderi Júnior. Segundo o médico, a própria constituição física da mulher a coloca em condição desfavorável. O homem tem uma musculatura mais vigorosa na região abdominal e, como consequência, a pressão que o músculo faz sobre o intestino é maior, o que estimula o órgão a funcionar, facilitando o processo de evacuação. O que Realmente Funciona Aumentar a ingestão de fibras: elas facilitam a formação do bolo fecal, aumentando a velocidade do trânsito intestinal e a frequência das evacuações. “Ainda amolecem as fezes, tornando mais fácil a sua eliminação”, explica a nutricionista Renata Padovani. A quantidade recomendada, num dia, é de 25g para as mulheres e 38g para os homens. Diminuir o consumo de carnes vermelhas: como são alimentos de difícil digestão, elas retardam o funcionamento intestinal. O seu consumo frequente está a ser cada vez mais relacionado com outras doenças do aparelho digestivo, como o próprio cancro. “Se fizer questão de consumir todos os dias, o ideal é restringir a quantidade a 150g indica o Professor. Dividir as refeições: “Quando dividimos a alimentação diária em pelo menos cinco refeições, estamos a facilitar a digestão e, consequentemente, o funcionamento do intestino. Ele forma aos poucos o bolo fecal e aos poucos elimina-o”, explica a nutricionista Viviane Laudelino. Ter uma vida mais ativa: vale saltar do autocarro uma ou duas paragens antes ou subir as escadas em vez do elevador. ” Qualquer exercício que movimenta as pernas e a barriga colabora para o aumento dos músculos abdominais. Esses músculos sustentam as vísceras e, quanto mais fortes, maior será a pressão exercida sobre o intestino. O exercício também massageia o intestino, estimulando-o a funcionar”. Entenda o Problema A prisão de ventre está frequentemente relacionada com hábitos alimentares inadequados e o sedentarismo. Também é muito comum que o problema seja causado pela simples vergonha de frequentar casas-de-banho públicas, o que faz com que muitas pessoas se esforcem para adiar o momento da evacuação. O grande problema é que esse tipo de comportamento traz consequências importantes para a saúde. “Para evacuar, contamos com um delicado mecanismo de contração ritmada. É gerado por reflexo, quando o reto – que é a parte final do intestino – avisa o o cérebro que está na hora de eliminar fezes. Sempre que ignoramos esse sinal, assim como a vontade de libertar gases, contrariamos a ordem do organismo. O que acontece é que, com o passar do tempo, o reto acostumase com a ideia de que não é obedecido e pára de transmitir esses sinais. Ao longo do tempo, a pessoa pode começar a apresentar disfunções nesse processo, o que prejudica ainda mais o funcionamento do intestino”. Além disso, quanto mais tempo as fezes permanecerem no intestino, maior será a perda de água do bolo fecal. O resultado é o endurecimento do material, que será expelido com mais dificuldade algumas horas depois. A prisão de ventre também pode ser resultado de falhas do funcionamento intestinal – ocasionadas por problemas congénitos – ou de outras doenças, como a hipertensão (alta pressão arterial), alterações da tiróide ou a depressão. Isto porque os medicamentos utilizados para tratar tais problemas podem aumentar no paciente a predisposição a sofrer de prisão de ventre. Razões Emocionais Por tudo isso, ao perceber que a prisão de ventre está a começar a atrapalhar o seu dia-a-dia, o primeiro passo é procurar ajuda médica, para uma avaliação clínica. Em alguns casos, um aconselhamento psicológico também pode ajuda. Segundo Maria Matos, psicóloga, a dificuldade de ir à casa-de-banho pode estar relacionada com conflitos de fundo emocional. “É interessante que as pessoas que sofrem com este tipo de problema procurem ajuda especializada. Isto porque a prisão de ventre pode, sim, estar relacionada com a dificuldade de expressar sensações, sentimentos e pensamentos, que a pessoa instintivamente retém. Normalmente, o problema está ligado ao medo das próprias reações e a vontade de controlar absolutamente tudo ao redor, o que é impossível”, esclarece a especialista. No Contra-Ataque Para vencer a prisão de ventre, o primeiro passo é determinar o que a está provocar. Se for desencadeada por uma outra doença, o tratamento será mais complexo, pois envolverá, em primeiro lugar, o controlo do mal que está a afetar o intestino de maneira direta ou indireta. Porém, na maioria dos casos, é a mudança de hábitos no dia a dia a responsável por trazes resultados significativos no controlo da prisão de ventre. Em algumas situações, mais raras, o uso de medicamentos laxantes está indicado, porém, só devem ser administrados sob supervisão médica. “Alguns laxantes, se forem usados de forma indiscriminada frequentemente, podem até agravar a prisão de ventre, pois condicionam o intestino a funcionar só quando está sob a ação do remédio”. Mesmo os ditos medicamentos naturais, como alguns dos chás, exigem atenção. “Alguns laxantes, além de deixar o intestino ainda mais preguiçoso, chegam até a irritar as mucosas intestinais”. Sem Complicações De qualquer forma, é muito importante que a dificuldade de ir à casa-debanho seja investigada clinicamente. “Já está mais do que comprovado que a prisão de ventre está relacionada ao aparecimento de complicações sérias, como as hemorróidas, que é a consequência da dilatação de alguns vasos na região do ânus, que doem e podem sangrar”. Segundo o médico, outra reação do mau funcionamento crónico do intestino é o aparecimento dos divertículos, que são como bolsas que se formam na região intestinal e que podem inflamar, levando ao quadro conhecido como diverticulite. E até mesmo a inflamação de apêndice pode estar relacionada com a dificuldade e a falta de frequência na evacuação. A consequência mais grave da prisão de ventre é o aparecimento do cancro do intestino. O quadro pode evoluir, caso a pessoa desenvolver predisposição a desenvolver a doença. “É mais comum encontrarmos quadros de cancro de intestino em pessoas que sofrem de obstipação intestinal do que nos indivíduos que evacuam normalmente”. Para confirmar o diagnóstico de prisão de ventre, o médico pode pedir exames capazes de medir o tempo que os alimentos levam até se transformarem em fezes e serem eliminados, por meio de uma técnica conhecida como medição de trânsito do cólon. A videodefecografia e a manometria anorretal são outros exames complementares que permitem analisar o mecanismo e os reflexos responsáveis pela evacuação. Mitos e verdades sobre a Prisão de Ventre Verdades Mulheres grávidas estão mais suscetíveis a contrair este problema. Mal é muito comum em mulheres grávidas. E são as hormonas libertadas durante a gravidez os responsáveis por esse efeito colateral. Essas hormonas impedem a contração muscular do útero e também afetam os músculos do intestino grosso. Assim, os movimentos peristálticos, necessários à evacuação, ficam mais lentos, desencadeando, por fim, a prisão de ventre. O mau funcionamento do intestino provoca mau humor. Se o intestino não está equilibrado, a produção de serotinina torna-se insuficiente. ” Alguém que tem problemas de prisão de ventre pode demonstrar mais irritabilidade e mau humor”. Mitos Quem não evacua todos os dias sofre de prisão de ventre. Quando só se vais uma vez a cada dois dias à casa-de-banho ainda é considerado normal. Os problemas começam quando os intervalos entre uma evacuação e outra são maiores, chegando a três dias ou mais. Fezes endurecidas e que provocam dor ou esforço demasiado para serem expelidas também podem sinalizar a prisão de ventre. Homens não sofrem desse mal. Apesar de ser mais comum nas mulheres, cerca de um terço de homens têm problemas relacionados à digestão, incluindo-se aí a prisão de ventre. A prevalência e a gravidade aumentam proporcionalmente ao envelhecimento