Afasia expressiva e afasia receptiva

Propaganda
Afasia expressiva e afasia receptiva
As afasias são causadas por lesões cerebrais decorrentes de acidentes vasculares
cerebrais (AVCs), traumatismos ou tumores
que comprometam as áreas de Broca e/ou
de Wernicke. A afasia relacionada com a
área de Broca (afasia expressiva) caracteriza-se por uma dificuldade de iniciar frases,
e de formular e compreender estruturas
gramaticais complexas, e pela perda de
fluência na língua. Um paciente que apresenta afasia expressiva em geral compreende o que lhe é perguntado, ao contrário
do que ocorre com um paciente com afasia
receptiva, que responde a perguntas com
frases aleatórias e sem sentido.
Esse segundo tipo de afasia foi descrito
pelo neuropatologista Carl Wernicke poucos
anos após a descoberta de Broca. As lesões
identificadas por Wernicke ocorriam em
uma região do cérebro diferente daquela que Broca descreveu. A afasia receptiva se caracteriza por uma fala fluente, gramaticalmente correta, com entonação normal, porém com grande quantidade de palavras trocadas ou inventadas,
a ponto de produzir um discurso com passagens sem sentido. Em resumo, a afasia
expressiva está relacionada com perda das
faculdades linguísticas produtivas (fala,
escrita), enquanto a receptiva envolve per­
da das faculdades receptivas (compreensão oral, leitura).
dição foi chamada de afasia de Broca, para diferenciá-la
de uma condição semelhante, denominada afasia de Wernicke, identificada pelo neuropatologista alemão Carl
Wernicke (1848-1905). Hoje, no entanto, os pesquisadores
têm usado os termos afasia expressiva e afasia receptiva
para denominar, respectivamente, os quadros apontados
por Broca e Wernicke (ver ‘Afasia expressiva e afasia
receptiva’).
A afasia de Broca, que corresponde à modalidade expressiva, se caracteriza pela perda das habilidades produtivas relacionadas com a linguagem (falar e escrever).
Essa perda não é causada pela privação da capacidade
de mover os músculos da língua e da garganta (condição
chamada de disartria). Pacientes com afasia expressiva,
em geral, não têm dificuldade para entender o que lhes
é perguntado, mas as respostas que produzem são hesitantes e baseadas quase exclusivamente em substantivos. Esses pacientes também parecem ter dificuldade
de usar conectivos gramaticais (palavras como ‘e’, ‘ou’,
‘mas’) de modo a formar frases mais complexas. Mas o
desejo de se comunicar é evidente.
LOCALIZACIONISTAS X DISTRIBUCIONISTAS A descoberta
de Broca pareceu fornecer evidências definitivas de que
a faculdade da fala teria uma localização cerebral precisa.
A ideia de que certas capacidades mentais ocupam posições específicas e relativamente invariáveis no cérebro é
conhecida como localizacionismo, e tem sido questionada
ultimamente por alguns neurocientistas, entre eles o
brasileiro Miguel Nicolelis, da Universidade Duke, nos
Estados Unidos, e do Instituto Internacional de Neurociências de Natal (RN). Os opositores do localizacionismo, que se denominam distribucionistas, propõem que
Áreas do cérebro identificadas pelos médicos
e anatomistas Paul Broca (em verde)
e Carl Wernicke (em vermelho).
Ambas estão envolvidas na produção e
compreensão da linguagem
várias regiões do cérebro participam simultaneamente
na realização de cada tarefa, em um processo que Nicolelis compara com um sistema de votação.
A explicação distribucionista para afasias como as de
Broca e Wernicke é que os acidentes vasculares cerebrais causam a destruição não só da massa cinzenta, mas
também da chamada substância branca, que contém fibras nervosas responsáveis pela conexão de diversas regiões cerebrais com o lobo frontal. Assim, para os distribucionistas, a afasia não é causada por uma lesão de contornos
bem definidos que ocorre apenas na região mais superficial do cérebro; para eles, há uma perda irreparável de
importantes vias de comunicação cerebrais. Se os distribucionistas estiverem certos, então não é possível apontar
uma região do cérebro como responsável pela fala.
MUITO ALÉM DA NEUROANATOMIA Paul Broca entrou para
a história da medicina em razão de sua notável descoberta de uma região cerebral relacionada com a produção da
fala. Mas, além disso, prestou importantes contribuições
à arqueologia, à antropologia e à anatomia comparada
do crânio de primatas. Em 1867, o arqueólogo amador
norte-americano Ephraim Squier (1821-1888) apresentou a Broca um crânio encontrado em um cemitério
inca no Peru (datado como pertencendo à época pré-colombiana) com diversos cortes em forma de hachura.
Após estudar a peça, concluiu que estava diante de uma
evidência de que cirurgias cranianas complexas (trepanação) eram realizadas em pessoas vivas na América pré-colombiana. Broca também foi simpático às ideias evolucionistas, em particular às do naturalista britânico Charles
Darwin (1809-1882), o que lhe rendeu desentendimentos com a igreja e autoridades da época.
288 | DEZEMBRO 2011 | CIÊNCIAHOJE | 81
Download