CFM - uso compassivo

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PROCESSO-CONSULTA CFM nº 10.090/11 – PARECER CFM nº 31/12
INTERESSADO:
Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa
ASSUNTO:
Programa de acesso expandido, uso compassivo e doação
pós-estudo de medicamentos novos
RELATOR:
Cons. Lúcio Flávio Gonzaga Silva
EMENTA: O uso assistencial de fármaco ainda
experimental é possível em situações de extrema
necessidade, visando ao bem individual ou coletivo, e
respeitando-se, obviamente, as prescrições éticas e
legais.
DA CONSULTA
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por intermédio de sua
Gerência de Avaliação de Segurança e Eficácia, encaminha ao presidente do CFM,
dr. Roberto Luiz d’Avila, o Ofício nº 860/2011/GPBEN/GGMED/Anvisa, datado de 14
de outubro de 2011 e assinado pela dra. Laura Gomes Castanheira, nos seguintes
termos:
Em atenção aos assuntos tratados em reunião realizada nesse Conselho no
dia 4/10/11, venho oficializar os questionamentos apresentados a respeito da minuta
(em anexo) referente ao programa de acesso expandido, uso compassivo e doação
pós-estudo clínico de medicamentos novos, em fase de desenvolvimento e sem
registro no país.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), frente a questionamentos
éticos anteriormente apontados aos assuntos referentes à minuta supracitada e que
implicam diretamente no exercício profissional médico, questiona a esse Conselho
os seguintes pontos:
1. Existe
alguma
implicação
ética
para
o
profissional
médico
prescrever
medicamento ainda em fase de desenvolvimento clínico para paciente grave, sem
opção terapêutica disponível?
2. Por se tratar de programa assistencial e não de pesquisa clínica, esse Conselho
julga necessário que haja autorização prévia do comitê de ética ou bioética da
entidade hospitalar vinculada ao profissional médico para o desenvolvimento da
assistência?
3. Caso o Conselho julgue necessária aprovação prévia do comitê de ética ou
bioética para o desenvolvimento da assistência, como ficariam os profissionais
que se encontram vinculados a serviços de assistência à saúde que não dispõem
dos referidos comitês?
4. Em caso de evento adverso grave devido ao uso de medicamento em fase de
desenvolvimento, quem deve garantir a assistência médica ao usuário?
5. Por fim, gostaríamos de saber desse Conselho qual seria o tempo necessário em
que o patrocinador deverá doar a medicação no caso de doação de
medicamentos pós-estudo, programa de acesso expandido e uso compassivo?
Documentos anexos
Minuta da Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) nº XX, de XX de XXXXX de 2011
– que aprova o regulamento para o programa de acesso expandido, uso compassivo
e doação pós-estudo de medicamentos e seus anexos:
I - Documentos que devem compor o dossiê para solicitação do comunicado
especial específico (CEE-AE/CEE-UC) para a condução do programa de acesso
expandido, uso compassivo e ofício de anuência em doação pós-estudo;
II - Formulário de petição em programa de acesso expandido;
III - Formulário de petição em uso compassivo;
IV - Formulário de petição para doação pós-estudo;
V - Formulário de apresentação do paciente no programa de acesso expandido, uso
compassivo ou doação pós-estudo;
VI - Formulário de declaração de responsabilidade e compromisso do patrocinador
do programa de acesso expandido, uso compassivo ou doação pós-estudo;
2
VII - Formulário de declaração de responsabilidade do médico do programa de
acesso expandido, uso compassivo ou doação pós-estudo;
VIII - Formulário de estimativa do quantitativo de produtos a serem importados para
programa de acesso expandido, uso compassivo ou doação pós-estudo;
IX - Termo de informação e adesão do paciente.
DOS CONCEITOS
A Resolução nº 251, de 7 de agosto de 1997, do Conselho Nacional de Saúde
(CNS), contempla em seu item II os termos de definições sobre pesquisa com novos
fármacos, vacinas ou testes diagnósticos em seres humanos, que achamos
oportuno citar neste parecer:
Fase pré-clínica: estudo em animais de experimentação para definir o perfil
toxicológico do novo fármaco. A partir do ano 2000 foram criados os chamados
estudos de fase zero, com o mesmo propósito toxicológico, agora envolvendo um
pequeno número de pacientes utilizando microdoses da molécula teste, em níveis
subterapêuticos, por um pequeno período de tempo (sete dias ou menos), antes que
os testes padrões em animais tenham terminado, apenas para agregar dados sobre
toxicidades e eventuais atividades bioquímica ou fisiológica 1.
Fase I (primeiro estudo em seres humanos): é o primeiro estudo
universalmente aceito em seres humanos, embora em pequeno grupo de voluntários
sadios. Objetiva estabelecer uma avaliação preliminar da segurança e do perfil
farmacocinético do novo fármaco 2.
Fase II (estudo terapêutico piloto): estudo realizado com número limitado
(pequeno) de pacientes (pessoas afetadas pela doença). Objetiva demonstrar a
atividade farmacodinâmica e estabelecer, a curto prazo, a segurança do princípio
ativo e também estabelecer as relações dose-resposta, com o objetivo de obter
dados sólidos para consubstanciar os estudos posteriores 2.
Fase III (estudo terapêutico ampliado): estudo realizado com grandes e
variados grupos de pacientes. Objetiva determinar o risco-benefício a curto e longo
prazo das formulações do princípio ativo e seu valor terapêutico relativo, além de
3
explorar o perfil das reações adversas e características especiais: interações
farmacológicas, biodisponibilidades 2.
Fase IV (estudo pós-comercialização): estudo realizado com base nas
características que autorizaram o novo medicamento. Objetiva fazer uma vigilância
pós-comercialização, para estabelecer o valor terapêutico, o surgimento de novas
reações adversas, suas frequências e as estratégias de tratamento 2.
Na própria minuta de resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa que aprova
o regulamento para o programa de acesso expandido, uso compassivo e doação
pós-estudo de medicamentos, há definições necessárias ao corpo deste parecer:
Programa
de
acesso
expandido:
programa
de
disponibilização
de
medicamento novo, promissor, ainda sem registro na Anvisa, que esteja em estudo
de fase III em desenvolvimento ou concluído, destinado a um grupo de pacientes
portadores de doenças debilitantes graves e/ou que ameacem a vida e sem
alternativa terapêutica satisfatória com produtos registrados no país 3.
Uso compassivo: disponibilização de medicamento novo promissor, para uso
pessoal de paciente e não participante de programa de acesso expandido ou de
pesquisa clínica, ainda sem registro na Anvisa, que esteja em processo de
desenvolvimento clínico, destinado a pacientes portadores de doenças debilitantes
graves e/ou que ameacem a vida, sem alternativa satisfatória com produto
registrado no país 3.
Doação após término do estudo clínico: disponibilização de medicamento aos
sujeitos de pesquisa que se beneficiaram de seu uso durante o estudo, sem custo
para ele ou para o sistema de saúde, aplicável nos casos em que o estudo se
encerrou e não está prevista a sua extensão 3.
INTRODUÇÃO
Os órgãos responsáveis pela análise dos pedidos de utilização de novos
fármacos e pela fiscalização de seus usos específicos, dentro de suas indicações,
são: no Brasil, a Anvisa; nos Estados Unidos, o Food and Drug Administration (FDA);
4
no Canadá, o Food and Drug Regulation (FDR) e na Europa, o European Medicines
Agency (EMA) 4.
Sob a regulamentação desses órgãos só há duas formas de utilização de
fármacos em seres humanos: como parte integrante de projetos de pesquisa,
devidamente avaliados e aprovados por comitês de ética, ou assistencial, quando a
indicação estiver aprovada pelos órgãos responsáveis. Quanto à última, a
assistencial, obviamente, quando avaliados pelos estudos toxicológicos e de fase I,
II, III e IV, necessários à comprovação de sua segurança e eficácia 4.
A partir do início dos anos 1980, com o surgimento da epidemia da aids
[primeiros casos em 1978 (USA, Haiti e África Central; no Brasil, em 1980)], uma
doença, à época, altamente letal, inicialmente rotulada de 5Hs [(hemofílicos,
homossexuais, haitianos, heroinômanos e hookers (profissionais do sexo)], adveio
nova demanda pelo uso assistencial de novos fármacos, ainda em testes
experimentais, ou seja, ainda não devidamente aprovados 4.
Surgiram, desde então, novas possibilidades do uso de drogas ainda em
investigação: extensão do uso (os sujeitos de uma pesquisa continuam a ter acesso
ao fármaco após o término do estudo clínico), uso compassivo (paciente específico
em risco de vida) e acesso expandido (uso por grande número de pacientes, de
droga ainda não aprovada, mas com processo de liberação já encaminhado)
5-7
.
Para o uso compassivo, quando individual, exige-se apenas dados
de
estudos pré-clínicos e de fase I. Em caso de uso compassivo para pequenos grupos
de pessoas, amplia-se a exigência para dados de estudos de fase II. Os programas
de acesso expandido dependerão, por seu turno, de dados de estudos de fase III 4.
As duas últimas possibilidades, o uso compassivo e o acesso expandido,
ampliam a utilização assistencial de fármacos ainda experimentais para pacientes
não sujeitos de projetos de pesquisa.
A regulamentação existente no Brasil sobre o acesso assistencial de
fármacos ainda experimentais é definida pela Resolução de Diretoria Colegiada
(RDC) nº 26, de 17 de dezembro de 1999, da Anvisa, que foca apenas o acesso
expandido (não contempla o uso compassivo). Outros países da Europa, e ainda o
Canadá e os Estados Unidos, têm suas regulações próprias.
5
O FDA, desde a década de 80, tem criado mecanismos e definido critérios
para permitir a paciente gravemente enfermo o acesso a fármacos ainda não
aprovados para uso assistencial. Esses critérios, atualizados a partir da última
década, estabelecem que: haja uma demonstração inequívoca da necessidade, não
exista outro tratamento eficaz, os benefícios potenciais justifiquem os riscos e o
acesso permitido não interfira na realização de pesquisa clínica em curso ou
planejada 6.
É princípio que todo acesso de modo assistencial a fármacos ainda
experimentais seja estritamente monitorado e que os eventos adversos observados
sejam imediatamente comunicados 8.
Aspectos técnicos e éticos dos programas específicos
Programa de acesso expandido
A RDC nº 26/99, da Anvisa, regulamenta o acesso expandido no Brasil e o
restringe a fármacos em estudo de fase III desenvolvido em nosso país. Outra
possibilidade seria para os produtos em fase III ou com registro, ou ainda em
programa semelhante, no seu país de origem 7.
O programa de acesso expandido não deve ser confundido com projeto de
extensão de uso de fármaco. É uma proposta que extrapola o âmbito da pesquisa
para permitir que outros pacientes com necessidades assistenciais tenham acesso à
droga de uso ainda restrito 4.
Esses programas de acesso expandido são algumas vezes considerados
como humanitários. São propostas por patrocinadores com o objetivo primeiro de
possibilitar o acesso a uma nova droga, ainda que experimental, porém com boas
possibilidades de ser autorizada para comercialização, por grande número de
pessoas portadoras de uma enfermidade grave, ou em risco de morte, e que não
disponha de alternativa terapêutica outra 4. Os patrocinadores, obviamente, esperam
com isso também agregar informações, sobretudo quanto à segurança do novo
fármaco.
6
São exigências éticas dos programas de acesso expandido
4, 7
:
1. Destinados somente para pacientes portadores de doenças debilitantes graves
e/ou que ameacem a vida e sem alternativa terapêutica satisfatória com produtos
registrados no país.
2. Só podem ocorrer quando estudos metodologicamente bem conduzidos estiverem
em conclusão ou conclusos.
3. O fármaco deve ser efetivo para pacientes com doença semelhante a dos que
terão acesso pelo programa.
4. A proporção risco-benefício deve ser favorável.
5. Só podem ser incluídos pacientes não elegíveis para os ensaios clínicos em
andamento, para evitar vieses de seleção.
6. Os eventos adversos devem ter monitorização estrita pelo patrocinador.
7. O patrocinador deve fornecer o fármaco por período não inferior a um ano
(doença crônica) ou até completar o tratamento (doença de terapêutica com
tempo definido).
8. O fornecimento do medicamento não deve gerar ônus para o paciente.
Diferentemente da estrita obrigatoriedade da não cobrança pelo uso dos
fármacos nos projetos de pesquisa, nos programas de acesso expandido há a
possibilidade de isso vir a acontecer, no futuro.
Uso compassivo
O uso compassivo de um fármaco ainda experimental, como a própria
definição o caracteriza, compreende situação de extrema necessidade para o
paciente com iminente risco de vida, sem alternativa terapêutica consagrada e
anúncio de morte bem próxima se essa forma de tratamento compassivo não ocorrer
rapidamente 7.
Ele pode ser destinado a um único paciente (uso compassivo individual) ou
para pequenos grupos de pacientes (uso compassivo por pequenos grupos). O uso
compassivo sempre deve ser considerado prática assistencial e não uma atividade
de pesquisa.
7
No Brasil, o uso compassivo individual está regulamentado pela Resolução
CNS nº 251/97, que prescreve em seu item VI.2.c: nos casos de pesquisa
envolvendo situações para as quais não há tratamento consagrado (“uso
humanitário” ou “por compaixão”) poderá vir a ser autorizada a liberação do produto,
em caráter de emergência, desde que tenha havido aprovação pelo CEP, ratificada
pela Conep e pela SVS/MS (Anvisa) 2.
São exigências éticas do uso compassivo individual 4:
1. Destinado a situações de extrema necessidade para o paciente com iminente
risco de vida, com prenúncio de morte e sem alternativa terapêutica consagrada.
2. Deve haver um médico assistente responsável pelo uso da droga experimental
nessas circunstâncias.
3. É uma situação de excepcionalidade terapêutica e, por isso, deve ser
adequadamente justificada e, sobretudo, autorizada pelo CEP, Conep e Anvisa.
4. O médico assistente é responsável pelo monitoramento do uso compassivo do
fármaco experimental e deve prover todas as informações acerca do tratamento,
incluindo os eventos adversos.
5. O consentimento informado do paciente é extremamente necessário. Caso haja a
incapacidade (crianças, comatoso, incapaz), deve-se buscar o responsável legal.
O uso compassivo para pequenos grupos de pacientes pode ocorrer quando
várias solicitações de acesso individual para um mesmo fármaco cheguem aos
comitês de ética ou agências reguladoras. Esses ou essas podem solicitar que os
patrocinadores façam uma proposta de programa de acesso a pequenos grupos.
São situações também excepcionais e que têm em comum – com os programas de
acesso individual – os mesmos princípios.
Doação pós-estudo de medicamentos novos
Essa forma de doação disponibiliza ao sujeito da pesquisa o fármaco em
estudo, sem lhe ocasionar custos, o que de certa forma o beneficiou durante o
ensaio clínico. No entanto, somente é aplicável nos casos em que o experimento se
encerrou e não está prevista a sua extensão 9.
8
A Declaração de Helsinque da Associação Médica Mundial, o principal
regramento internacional de ética em pesquisa, assegura em seu enunciado original
nº 30 o compromisso de que no final do estudo, todos os sujeitos da pesquisa têm
assegurado o acesso aos melhores métodos comprovados profiláticos, diagnósticos
e terapêuticos identificados pelo estudo 10.
A Resolução CNS nº 251/97, em seu item IV.1.m, estabelece que ao sujeito
da pesquisa está assegurado o acesso ao medicamento em teste, caso se
comprove sua superioridade em relação ao tratamento convencional 2.
Acerca desse tema, doação de medicamento após o término do estudo
clínico, a Coordenadoria de Pesquisa e Ensaios Clínicos da Anvisa já recomendava
ao patrocinador da pesquisa proceder a doação do fármaco, com as necessárias
providências: a) estimativa anual do quantitativo necessário, ou outro prazo, sob
justificativa; b) relatório médico com as razões da continuação do uso do
medicamento e compromisso da continuação da assistência ao paciente; c)
compromisso do patrocinador com o fornecimento do fármaco (importação,
armazenamento, distribuição) e avaliação continuada de sua segurança 9.
Diversas tentativas de organismos internacionais (e.g: United States of Health
and Human Services e a British Medical Association) vêm sendo propostas ao longo
do tempo, tentando flexibilizar os postulados da Declaração de Helsinque em vários
aspectos, incluindo a doação de medicamentos pós-estudo clínico. A última
modificação que ocorreu em Seul em 2008, por ocasião da Assembleia Médica
Mundial, reduziu a proteção dos sujeitos da pesquisa e maximizou os interesses das
grandes indústrias farmacêuticas 10.
Essas últimas modificações (o Brasil votou contra) trazem em relação ao tema
aqui estudado o seguinte: “O protocolo deve descrever acordos para os sujeitos de
investigação terem acesso pós-estudo às intervenções identificadas como benéficas
ou acesso a outro cuidado ou benefício apropriado”. É óbvio que substitui para pior,
a inegociável exigência anterior do direito aos benefícios gerados pelo experimento
para os sujeitos de pesquisa. Essa nova descrição de acordos que agora podem
incluir também benefícios secundários não diretamente relacionados aos resultados
9
obtidos é, sem dúvida, do ponto vista da ética do indivíduo e das coletividades,
inaceitável
10
.
São exigências éticas da doação pós-estudo de medicamentos novos:
1. Garantia ao sujeito da pesquisa do acesso, pós-estudo, aos benefícios obtidos em
seu experimento, sem custo algum.
2. Compromisso do patrocinador com o provimento do benefício ao sujeito da
pesquisa.
3. Monitoramento estrito dos eventos adversos que possam ocorrer no pós-estudo.
4. Compromisso do médico responsável pela continuação da assistência ao sujeito
da pesquisa, mesmo terminados os experimentos.
DA CONCLUSÃO
Concluo com as palavras extraídas de Goldim JR: “Apesar dos desafios
éticos, legais e operacionais, o uso assistencial de drogas ainda experimentais tem
um importante papel no atendimento de demandas de saúde da sociedade e das
pessoas individualmente. O importante é preservar a sua adequação através de
justificativas que visem ao bem individual e coletivo” 4.
RESPOSTAS AOS QUESTIONAMENTOS
1. Existe
alguma
implicação
ética
para
o
profissional
médico
prescrever
medicamento ainda em fase de desenvolvimento clínico para paciente grave, sem
opção terapêutica disponível?
Resposta: No campo assistencial, medicamentos experimentais ainda não
autorizados para uso no país podem ser utilizados em caráter compassivo para
pacientes graves (não recrutados para estudos clínicos) desde que haja um
médico responsável prescritor e, sobretudo, que esse profissional justifique a sua
prescrição, com fundamentos na extrema necessidade, dado o grave estado do
paciente, sem outra opção terapêutica disponível, e que supervisione os cuidados
10
necessários para tratar os possíveis eventos adversos, contando, ainda, com a
anuência do produtor do produto. Considerando a excepcionalidade do tratamento
e a necessidade de respeitar a autonomia do paciente expressa por ele ou seu
representante legal, o termo de consentimento livre e esclarecido exigido para a
realização dos estudos clínicos também deve ser aplicado no âmbito da
assistência médica, conforme previsto no art. 102 do Código de Ética Médica.
2. Por se tratar de programa assistencial e não de pesquisa clínica, esse Conselho
julga necessário que haja autorização prévia do comitê de ética ou bioética de
entidade hospitalar vinculada ao profissional médico para o desenvolvimento da
assistência?
Resposta: É uma situação de excepcionalidade terapêutica e, por isso, deve
ser adequadamente justificada e, sobretudo, autorizada pelo CEP/Conep e
Anvisa. No caso do uso compassivo, dada à rapidez com que deve ser
instaurado, é aceitável que a decisão dos comitês seja tomada ad referendum,
devido ao caráter excepcional e a máxima urgência requerida.
3. Caso o Conselho julgue necessária aprovação prévia do comitê de ética ou
bioética para o desenvolvimento da assistência, como ficariam os profissionais
que se encontram vinculados a serviços de assistência à saúde que não dispõem
dos referidos comitês?
Resposta: Quando o uso desses fármacos na assistência está vinculado à
pesquisa em instituição que não dispõe de comitê de ética, a aprovação para o
desenvolvimento da assistência deverá ser feita pelo comitê de ética situado
geograficamente mais próximo. Caso o projeto de pesquisa esteja no formato
digital na Plataforma Brasil (CEP/Conep), essa indicará automaticamente o comitê
que deverá prover a aprovação.
4. Em caso de evento adverso grave devido ao uso de medicamento em fase de
desenvolvimento, quem deve garantir a assistência ao usuário?
11
Resposta: A instituição que sediou o estudo deve prover a assistência integral
ao
paciente,
incluindo
internamentos,
assistência
em
UTIs,
exames
complementares necessários e tudo o que for necessário para o enfrentamento
do agravo. Ao patrocinador, a obrigação do provimento dos benefícios dos
seguros pelos danos ocorridos. Isto se aplica, também, no uso compassivo.
5. Por fim, gostaríamos de saber desse Conselho qual seria o tempo necessário em
que o patrocinador deverá doar a medicação no caso de doação de
medicamentos pós-estudo clínico, programa de acesso expandido e uso
compassivo?
Resposta: No caso de doação de medicamento pós-estudo clínico e de
programa de acesso expandido não deve ocorrer interrupção do tratamento,
devendo, portanto, o uso ser previsto e o medicamento estar disponível
imediatamente ao final da participação do sujeito da pesquisa no estudo clínico.
Quanto ao uso compassivo, pela própria urgência das medidas heroicas que essa
situação implica, o fornecimento da medicação deverá ser o mais rápido possível,
consideradas as demoras próprias do sistema de transporte e, no caso de
medicamentos vindos do exterior, dos procedimentos de importação. O
patrocinador deve fornecer o fármaco enquanto houver benefício ao paciente, a
critério médico, inclusive na doença crônica.
Este é o parecer, SMJ
Brasília, 10 de agosto de 2012
LÚCIO FLÁVIO GONZAGA SILVA
Conselheiro relator
12
CITAÇÃO BIBLIOGRÁFICA
1. Drive for drugs leads to baby clinical trials. Nature 2000; 440(7083):406-7.
2. Resolução nº 251 (7/8/97) do Conselho Nacional de Saúde.
3. Minuta da Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) nº XX, de XX de XXXXX de
2011 – que aprova o regulamento para o programa de acesso expandido, uso
compassivo e doação pós-estudo de medicamentos.
4. Goldim JR. O uso de drogas ainda experimentais em assistência: extensão de
pesquisa, uso compassivo e acesso expandido. Ver Panam Salud Publica 2008;
23(3): 198-206.
5. Mello NK et al. Buprenorphine treatment of opiate and cocaine abuse: clinical
and preclinical studies. Harv Rev Psychiatry 1993; 1(3):168-83.
6. Food and Drug Administration. Expanded access to investigational drugs for
treatment use. Fed Reg, Final Rule. 2009; 74(155): 40900-45.
7. Resolução RDC nº 26 Anvisa, de 17 de dezembro de 1999.
8. Leyland-Jones B, Davies BR, Clagett-Car K et al. Patient treatment on a
compassive basis documentation of high adverse drug reation rate. Ann Oncol
1992; 3(1)59-62.
9. Garrafa V, Lorenzo C. Helsinque 2008: redução de proteção e maximização de
interesses privados. Rev. Assoc. Med. Bras 2009; 55(5): 514-18.
10. Schlemper Jr BR. Acesso às drogas na pesquisa clínica. Revista Bioética 2007;
15(2): 248-66.
Obs: Para as respostas aos questionamentos o parecerista contou com a valiosa
contribuição do Professor Aníbal Gil Lopes.
13
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