universidade estadual de goiás unidade universitária de

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS EXATAS E
TECNOLÓGICAS
EMIVAL PINHEIRO AGRA JÚNIOR
ATIVIDADE ANTIMICROBIANA DO ÁCIDO GÁLICO
Anápolis - GO
2011
ii
EMIVAL PINHEIRO AGRA JÚNIOR
ATIVIDADE ANTIMICROBIANA DO ÁCIDO GÁLICO
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado ao Curso de Farmácia
da Universidade Estadual de Goiás
como exigência parcial à obtenção do
título de Bacharel em Farmácia.
Orientador: Prof. Dr. Plínio Lázaro Faleiro Naves
Anápolis - GO
2011
iii
Dedico este trabalho a Deus, Pai e
Criador presente em todos os dias de
minha vida, e a família pelo amor
incondicional, pois sem ambos não
seria possível transpassar esta etapa.
iv
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por ter me dado força e coragem, para enfrentar e superar todas
as dificuldades que surgiram no caminho trilhado até aqui. Agradeço ao meu
orientador Prof. Dr. Plínio Lázaro Faleiro Naves, pela orientação e dedicação
concedidos para realização deste trabalho. Agradeço aos companheiros de
laboratório o Prof. Diorgenes Santana e o Técnico Sr. Osvaldo Gomes Pinto, pela
convivência, horas de risadas e, principalmente, pelo conhecimento construído.
v
“Uma mente que se abre a uma nova ideia jamais
voltará ao seu tamanho original”.
Albert Einstein (1879-1955)
"Prefiro ser esta metamorfose ambulante, do que
ter aquela velha opinião formada sobre tudo".
(Raul Seixas)
vi
RESUMO
Os agentes antimicrobianos estão entre as poucas drogas que exercem efeito
curativo sobre a enfermidade do paciente, por agirem diretamente sobre o agente
causador da doença, um micro-organismo patogênico. Os antimicrobianos são uma
das classes de medicamentos mundialmente mais utilizadas, porém muitas vezes de
forma inapropriada. A utilização inadequada do arsenal antimicrobiano disponível
vem contribuindo para a emergência de micro-organismos resistentes a várias
classes destes compostos, além de ser preocupante o decréscimo no número de
novas drogas lançadas pela indústria farmacêutica com mecanismos de ação
inovadores, sendo uma possível estratégia para tentar driblar os mecanismos e
fatores de resistência que os micro-organismos desenvolveram, especialmente, as
bactérias. Neste contexto, o foco de pesquisas para obtenção de novas substâncias
tem se voltado às fontes naturais, principalmente as plantas; as quais são capazes
de sintetizar substâncias complexas que as protegem contra ataques de insetos e
micro-organismos. Dentre estas substâncias, destaca-se a classe dos taninos,
presentes em várias partes da planta e encontrado em abundância no reino vegetal.
Esta classe possui compostos com exímias propriedades, como: antioxidante,
formação de complexos com proteínas e variadas indicações terapêuticas; as quais
foram catalogadas pela etnofarmacologia e etnobotânica, por meio da sabedoria
popular. Os taninos são divididos em hidrolisáveis e condensados, sendo os primeiro
subdivididos em galotaninos e elagitaninos, os quais são formados por unidades do
ácido gálico, um composto sintetizado a partir do ácido chiquímico, apresentando
propriedades semelhantes as dos taninos. Diante do exposto baseando-se na
literatura atual, o objetivo foi reunir informações a respeito das atividades do ácido
gálico,
como
por
exemplo,
a
antimicrobiana;
além
de
ressaltar
outras
empregabilidades deste composto e de seus derivados. Os trabalhos em nível
laboratorial podem contribuir com subsídios suficientes para confirmar uma possível
atividade
antibiótica
deste
composto,
podendo
gerar
as
bases
para
o
desenvolvimento de novos medicamentos.
PALAVRAS-CHAVE: Antimicrobianos. Fatores de Resistência. Taninos. Ácido
gálico.
vii
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1
- Anel azetidinona (β-lactâmico) ·········································································16
FIGURA 2 - Ciprofloxacino, com Flúor na posição 6, e piperazina na posição 7 ·························· 19
FIGURA 3 - Clortetraciclina ····························································································· 20
FIGURA 4 - Conjugação ································································································· 24
FIGURA 5 - Processo de Transdução ················································································ 25
FIGURA 6 - Transformação ····························································································· 26
FIGURA 7 - Estrutura do β- 1,2,3,4,6-pentagaloil-D-glicose ··················································· 34
FIGURA 8 - Ácido tânico, ligações meta-depsídica ······························································ 35
FIGURA 9 - Divisão dos taninos hidrolisáveis ······································································ 35
FIGURA 10 - Taninos condensados ·················································································· 36
FIGURA 11 - Estrutura do ácido gálico ················································································42
FIGURA 12 - Rotas de síntese do ácido gálico ···································································· 43
FIUGRA 13 - Hidrólise do ácido tânico pela tanase, R1 (galoil) R2 (digaloil)································· 44
FIGURA 14 - Tanase estearase e depsidase ········································································44
FIGURA 15 - Obtenção do Propil galato ············································································· 45
viii
LISTA DE ABREVEATURAS E SÍMBOLOS
ATCC - Sigla em inglês do Centro de coleção de células de micro-organismos padronizados dos
Estados Unidos da América (American Type Culture Collection)
CLSI - Sigla em inglês do Instituto de padrões laboratoriais e clínicos (Clinical and Laboratory
Standards Institute)
CMB - Concentração mínima bactericida
CMI - Concentração mínima inibitória
DMSO - Dimetilsufóxido
FDA - Sigla em inglês do órgão de Administração de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos
da América (Food and Drugs Administration)
GA - Sigla em inglês para Ácido Gálico (Gallic acid)
HCl - Ácido clorídrico
HHDP - Ácido hexa-hidroxi-difênico
HPLC - Sigla em inglês para Cromatografia liquida de alta performance (High Performance Liquide
Chromatography)
KDa - Quilodalton
LPCL - Sigla em inglês para Cromatografia líquida de baixa performance (Low Performance Liquide
Chromatography)
OMS - Organização Mundial da Saúde
PGG - (1,2,3,4,6-Penta-O-Galloyl-β-D-Glucopyranos)
PDA - Sigla em inglês para o meio de cultura Ágar dextrose de batata (Potato Dextrose Agar)
pH - potencial hidrogeniônico
°C - Grau Celsius
% - por cento (porcentagem)
g - grama
mm - milímetro
m/v - massa por volume
mg/mL - miligrama por mililitro
µg/mL - micrograma por mililitro
ix
SUMÁRIO
1.
INTRODUÇÃO ··············································································· 11
2.
FONTE DE DADOS ········································································ 13
3.
ANTIMICROBIANOS ····································································· 14
3.1.
CLASSES DE ANTIBIÓTICOS ························································· 15
3.1.1. β-Lactâmicos ················································································ 16
3.1.2. Aminoglicosídeos ·········································································· 17
3.1.3. Polipeptídios ················································································· 18
3.1.4. Glicopeptídios ··············································································· 18
3.1.5. Rifampicina ·················································································· 18
3.1.6. Quinolonas e fluorquinolonas ··························································· 19
3.1.7. Tetraciclinas ················································································· 20
3.1.8. Clorafenicol ··················································································· 20
3.1.9. Macrolídeos ·················································································· 21
3.1.10. Sulfonamidas ················································································ 21
3.2.
NOVOS MECANISMOS DE AÇÃO ANTIMICROBIANA ························ 22
3.3.
MECANISMOS DE RESISTÊNCIA BACTERIANA ······························· 23
3.3.1. Fatores de Resistência ··································································· 26
4.
DESCOBERTA DE NOVOS ANTIBÓTICOS ········································ 28
4.1.
FONTES DE ANTIBIÓTICOS NATURAIS ··········································· 29
4.2.
ATUAÇÃO DA ETNOFARMACOLOGIA ············································· 30
4.3.
AUXÍLIO DA FARMACOGNOSIA ····················································· 31
5.
TANINOS ····················································································· 32
5.1.
CARACTERÍSTICAS QUÍMICAS ······················································ 33
5.1.1. Taninos Hidrolisáveis ····································································· 34
5.1.2. Taninos Condensados ···································································· 36
5.2.
ATIVIDADES BIOLÓGICAS ····························································· 37
5.2.1. Propriedade de Complexação com Proteínas ······································ 39
5.3.
UTILIZAÇÃO INDUSTRIAL ······························································ 40
5.4.
PLANTAS TANÍFERAS COM AÇÃO ANTIMICROBIANA ······················ 41
6.
ÁCIDO GÁLICO ············································································ 42
6.1.
BIOGÊNESE ················································································ 43
x
6.2.
APLICAÇÕES DO ÁCIDO GÁLICO ··················································· 44
6.3.
POSSÍVEIS ATIVIDADES FARMACOLÓGICAS ·································· 46
6.4.
DERIVAÇÃO QUÍMICA DO ÁCIDO GÁLICO ······································ 48
7.
CONCLUSÃO ··············································································· 50
8.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ·················································· 52
11
1. INTRODUÇÃO
A descoberta de substâncias que apresentam atividade antimicrobiana é
considerada uma das maiores contribuições para a terapêutica no século XX. Os
antibióticos representam os poucos fármacos que atuam de forma curativa no
paciente, pois têm a finalidade de combater o verdadeiro motivo da doença, no caso,
micro-organismos patogênicos. Esta classe de medicamentos encontra-se dentre as
classes mais usadas mundialmente, entretanto, está entre as mais utilizadas de
forma incorreta (TRIPATHI, 2003).
O prejuízo desta maneira errônea de se fazer o uso de antibióticos é
constatada pelo aumento progressivo de bactérias resistentes aos mais variados
agentes antimicrobianos. Estes micro-organismos dispõem de diversas maneiras de
adquirirem e, principalmente, sintetizarem mecanismos e fatores de resistência, os
quais lhes conferem proteção contra a ação dos fármacos. Fato preocupante que
instiga
as
indústrias
farmacêuticas
a
desenvolverem
novos
antibióticos,
indubitavelmente com mecanismos de ação inovadores (GUIMARÃES; MOMESSO;
PUPO, 2010; OLIVEIRA JUNIOR, 2011; TRIPATHI, 2003).
Neste contexto, o interesse por antibióticos inovadores se intensificou devido
ao baixo índice de novos agentes antimicrobianos lançados e, sobretudo pelo alto
índice de resistência encontrado nos micro-organismos. As fontes naturais que
podem fornecer novas substâncias bioativas, especialmente, antibióticos têm sido
alvo de inúmeros estudos, sendo os vegetais uma das fontes mais promissoras. Pois
estes organismos são capazes de sintetizar compostos complexos que os protegem
contra micro-organismos patogênicos, como fungos e bactérias (GUIMARÃES;
MOMESSO; PUPO, 2010; MOLINA et al., 2008; RATES, 2011).
As plantas se tornaram um grande campo de pesquisa pelo seu baixo custo,
fácil manuseio, e no quesito da descoberta de substâncias com atividade
terapêutica, há a sabedoria popular como aliada. O conhecimento sobre vegetais
que possuem indicação para o tratamento de alguma moléstia é passado de
geração para geração em determinadas comunidades e regiões por todo o mundo.
Utilizando ferramentas como a etnobotânica, etnofarmacologia e a farmacognosia,
os estudos com plantas medicinais se tornam mais fáceis e orientados, pois se
pesquisará as que supostamente apresentam alguma atividade terapêutica, ao invés
12
de escolhê-las aleatoriamente. (MOLINA et al., 2008; RATES, 2011).
A espinheira-santa, barbatimão, hamamélis, pitangueira são plantas indicadas
para o tratamento de feridas, úlceras, queimaduras, diarréia, hemorróidas,
inflamações bucais, além de apresentar atividade antimalárica, antifúngica,
antibacteriana e antiinflamatória. Essas plantas são ricas em uma classe de
compostos denominada por taninos, os quais representam a segunda maior classe
compostos vegetais e são a quarta substância mais encontrada em diversas partes
das plantas. São divididos em taninos hidrolisáveis e condensados, sendo o primeiro
subdividido em galotaninos e elagitaninos (MELO, 2008; SANTOS; MELLO, 2007).
Estas subclasses de taninos são compostas por oligômeros do ácido gálico
(ácido 3,4,5-tri-hidroxi-bênzóico), sintetizado pelos vegetais através da via
metabólica do ácido chiquímico. Este composto fenólico é empregado na indústria
devido a sua atividade antioxidante e pela propriedade de complexar-se com
proteínas, fato que desperta o interesse de pesquisadores em utilizar o ácido gálico
e seus derivados no desenvolvimento de novas moléculas bioativas (MONTEIRO;
ALBUQUERQUE; ARAÚJO, 2005; SANTOS, 2007).
O objetivo do presente trabalho, baseado na literatura atual, é o de reunir
dados sobre a atividade antimicrobiana do ácido gálico. Abordando as classes de
antibióticos existentes, os mecanismos e fatores de resistência microbianos que
levam às pesquisas por novos antibióticos a partir de fontes naturais, como as
plantas medicinais. Destacar a utilização dos taninos e enfatizar as pesquisas in vitro
com ácido gálico, como possível agente terapêutico e principalmente antimicrobiano.
13
2. FONTE DE DADOS
Buscou-se artigos originais em português, inglês e espanhol que abordassem
o tema utilizando as bases de dados online, SciELO e Pub-Med, livros e o Google
Acadêmico como site de busca. O critério de escolha para inclusão dos artigos
priorizou os trabalhos de revisão bibliográfica, artigos mais recentes, dissertações de
mestrado, todos com busca pelas palavras-chave: Agentes antimicrobianos,
mecanismos de resistência a antibióticos, descoberta de novos antibióticos,
compostos bioativos de fontes naturais, etnofarmacologia, taninos e ácido gálico.
14
3. ANTIMICROBIANOS
Os antimicrobianos podem ser definidos como substâncias que têm a
capacidade de reduzir o crescimento ou até matar micro-organismos, em baixas
concentrações. Tais compostos podem ser sintetizados naturalmente, pelos próprios
micro-organismos que as utilizam como mecanismo de defesa frente a outras
espécies. Há também os semissintéticos, onde os antimicrobianos naturais são
modificados em laboratório para que suas propriedades sejam melhoradas, e os
sintéticos propriamente ditos, ou seja, obtidos por síntese química, como as
sulfonamidas
e
as quinolonas.
Organismos
superiores
também
produzem
substâncias contra os micro-organismos, por exemplo; os anticorpos, e alguns
micróbios utilizam produtos metabólicos, tais como o etanol, o ácido láctico e o
peróxido de hidrogênio, com a função de competir contra os micro-organismos
(SERRA, 2011; TRIPATHI, 2003).
O uso de agentes antimicrobianos foi um grande marco para a terapêutica do
século XX, pois ampliou a visão sobre o efeito das drogas no organismo do paciente
que até então atuavam de forma direta sobre as células e seus mecanismos. Com
os antibióticos, os resultados obtidos foram inovadores, pois constatou-se que eles
atuavam sobre os agentes agressivos que se distinguem das células do indivíduo,
ou seja; sua ação terapêutica é de inibir/matar os micro-organismos infecciosos,
causando mínimas ou nenhuma reação desconfortante e tóxica ao receptor. Devido
a esta propriedade, os antibióticos representam uma das poucas classes de
medicamentos que realmente, possuem um efeito curativo (OLIVEIRA JUNIOR,
2011; TRIPATHI, 2003).
Antes que estes agentes fossem obtidos a partir de organismos vivos, o ser
humano procurou usar de substâncias químicas para curar os males que os
micróbios causavam, como o mercúrio usado por Paracelso no século XVI no
combate a sífilis; os corantes seletivos para micro-organismos usados por Ehrlich no
início do século XX, como o azul de metileno e o vermelho de tripano que em altas
concentrações, se tornavam tóxicos para a célula microbiana. O Prontosil, um
corante sulfonamídico testado por Domagk em 1935, descobriu-se que a substância
ativa não era a que conferia cor, mas a para-aminobenzeno sulfonamida, e em 1938
foi lançada a primeira sulfonamida, a sulfapiridina (SERRA, 2011; TRIPATHI, 2003).
15
Através de Pasteur em 1877, iniciou-se o uso da antibiose ou amensalismo
para o combate aos micro-organismos patogênicos, quando o mesmo inibiu o
crescimento de bacilos do antraz por meio de outras bactérias provenientes do ar.
Mas o grande marco desta nova linha de pesquisa surgiu com Fleming em 1929,
onde Staphylococcus foram destruídos por uma substância produzida pelo fungo
Penicilium, a qual era difusível pelas placas de cultura. Fleming a denominou como
penicilina, sendo isolada e purificada somente em 1939, por Chain e Florey
(TRIPATHI, 2003).
Houve também a descoberta da estreptomicina na década de 40 por
Waksman e colaboradores. Pesquisaram e isolaram esta substância a partir de
actinomicetos, abrindo as portas para a descoberta da eritromicina, tetraciclinas,
clorafenicol, e outros antibióticos extraídos destes micro-organismos que vivem no
solo (SERRA, 2011; TRIPATHI, 2003).
3.1. CLASSES DE ANTIMICROBIANOS
Através de intensos estudos sobre os mecanismos internos e externos das
bactérias, garantiu-se o desenvolvimento de fármacos específicos e direcionados
para sítios-alvos delas. Podem ser divididos em dois grupos, os bactericidas que
provocam a morte dos micro-organismos causadores da infecção, como: os βlactâmicos (penicilinas, cefalosporinas, carbapenéns e monobactâmicos), os
aminoglicosídeos (estreptomicina, gentamicina, neomicina), polipeptídios (polimixina
B, colistina, bacitracina, tirotricina), glicopeptídios (vancomicina, teicoplanina),
rifampicina, quinolonas (ciprofloxacina, ácido nalidíxico, norfloxacina), dentre outros.
(OLIVEIRA JÚNIOR, 2011; TRIPATHI, 2003).
E os bacteriostáticos que inibem o crescimento do micro-organismo ao
interferirem no metabolismo intermediário, ou na síntese de proteínas, como: as
tetraciclinas (oxitetraciclina, doxiciclina), o clorafenicol que é um derivado do
nitrobenzeno, os macrolídeos (azitromicina, eritromicina, roxitromicina) e as
sulfonamidas (sulfadiazina), as sulfonas (dapsona), ácido paraaminossalicílico
(PAS), o etambutol, entre outros (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010;
OLIVEIRA JÚNIOR, 2011; TRIPATHI, 2003).
16
3.1.1. β-Lactâmicos
Talvez seja a classe de antibióticos mais conhecida devido a descoberta da
penicilina, por Alexander Fleming, e pelo fato de ter sido amplamente utilizada
durante a segunda guerra mundial. Os fármacos pertencentes a este grupo podem
ser considerados bacteriostáticos e bactericidas, pois atuam inibindo a síntese da
parede celular bacteriana ao se ligarem à enzima transpeptidase, a qual participa da
ligação cruzada dos peptideoglicanos durante a formação da parede celular
bacteriana, logo após a divisão celular da bactéria; deixando-a suscetível à lise
osmótica (HARDMAN & LIMBIRD, 2005; OLIVEIRA JÚNIOR, 2011).
Todos os fármacos pertencentes a esta classe possuem o mesmo mecanismo
de ação, tendo em sua estrutura o anel azetidinona com quatro membros, também
chamado de anel β-lactâmico (Figura 1), e uma estrutura de cinco (tiazolidínico) ou
seis (di-hidrotiazínico) membros que constitui as penicilinas e as cefalosporinas
respectivamente, além dos carbapenêmicos, e monobactâmeas (GUIMARÃES;
MOMESSO; PUPO, 2010; UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]).
Figura 1 - Anel azetidinona (β-lactâmico) (TRIPATHI, 2003).
Dentro do grupo das penicilinas têm-se cinco subgrupos: das penicilinas
propriamente dita, como a benzilpenicilina, conhecida como penicilina G; as
aminopenicilinas, como a amoxicilina; as carboxipenicilinas, como a ticarcilina; as
isoxazolipenicilinas, como a flucloxacilina; e as acilureidopenicilina, como a
17
piperacilina. Os fármacos que estão no grupo das cefalosporinas são divididos em
primeira, segunda, terceira e quarta gerações, como por exemplo: Cefalotina,
Cefaclor, Ceftriaxona e a Cefepima respectivamente (HARDMAN & LIMBIRD, 2005;
OLIVEIRA JUNIOR, 2011).
No grupo dos Carbapenêmicos, tem-se o Imipenem e Meropenem, usados
apenas em casos excepcionais quando ainda não se conhece o micro-organismo
infeccioso; a fim de evitar resistência ao antibiótico. No grupo das monobactamas,
há o Aztreonam, com espectro direcionado à enterobactérias. Como muitas
bactérias desenvolveram mecanismos de resistência aos fármacos desta classe
através de enzimas como a β-lactamase e a penicilinase, sendo essa específica
para a bezilpenicilina; foram desenvolvidas substâncias que inibem essas enzimas,
sendo adicionadas aos antibióticos β-lactâmicos para protegê-los, como o Ácido
Clavulânico, a Tazobactama e a Sulbactama (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO,
2010; HARDMAN & LIMBIRD, 2005; OLIVEIRA JUNIOR, 2011).
3.1.2. Aminoglicosídeos
Esta classe de antimicrobianos esta envolvida com a inibição da síntese
proteica bacteriana, pois o mecanismo de ação consiste na ligação à subunidade
50S dos ribossomos o que impede que esta traduza o mRNA, por isso são
considerados antimicrobianos bactericidas. Estes antibióticos são constituídos por
um grupo amino básico e uma unidade de açúcar, e possuem ótimo sinergismo com
os β-lactâmicos, pois os aminoglicosídeos precisam de transporte ativo para
adentrarem no citoplasma bacteriano. Pertencem a esta classe antibióticos como: a
Amicacina, Tobramicina, Gentamicina, Netilmicina e a Estreptomicina, sendo esta a
primeira representante da classe, isolada do Streptomyces griseus em 1944
(BARROS, 2001; OLIVEIRA JUNIOR, 2011).
18
3.1.3. Polipeptídios
Os polipeptídios são considerados agentes bactericidas de ação rápida, pois
tem a capacidade de se ligarem aos fosfolipídios presentes na membrana celular
bacteriana, provocando uma desorganização da mesma ou a formação de
pseudoporos; ocasionando o extravasamento de íons, aminoácidos e etc. São
comumente usados em formas farmacêutica tópicas, devido a sua toxicidade por
uso oral e principalmente sistêmico. Pertencem a esta classe antibióticos como a
Polimixina B, Colistina, Bacitracina e Tirotricina. (HARDMAN & LIMBIRD, 2005;
TRIPATHI, 2003).
3.1.4. Glicopeptídios
Os representantes desta classe são a vancomicina e a teicoplanina, usados
como última escolha frente a cepas resistentes a vários antibióticos. Atuam
destruindo a parede celular bacteriana, pois se ligam ao resíduo polipeptídico
terminal D-Ala-D-Ala, inibindo o processo de transpeptidação feito pela enzima
transpeptidase; interrompendo assim a biossíntese da membrana celular da
bactéria. Por serem incapazes de penetrar na membrana celular de bactérias Gramnegativas, estes antimicrobianos são utilizados contra as Gram-positivas resistentes
e também em algumas espécies de Enterococcus (GUIMARÃES; MOMESSO;
PUPO, 2010; OLIVEIRA JUNIOR, 2011; TRIPATHI, 2003).
3.1.5. Rifampicina
O Streptomyces mediterranei produz uma substância chamada de rifamicina
B, a qual serve para obtenção de um derivado semi-sintético denominado
Rifampicina. Este antibiótico bactericida se liga à RNA polimerase bacteriana,
especificamente no gene repoB; sendo esta uma possível explicação para o fato
19
que ela não se liga à RNA polimerase dos mamíferos. É considerado o único
fármaco que inibe a transcrição bacteriana. É muito utilizado em sinergismo com
outros fármacos no tratamento da tuberculose, visto que a resistência à rifampicina
desenvolvida pelos bacilos causadores desta doença é muito baixa (GUIMARÃES;
MOMESSO; PUPO, 2010; TRIPATHI, 2003).
3.1.6. Quinolonas e fluorquinolonas
São fármacos bactericidas considerados inibidores das topoisomerases. O
ácido nalidíxico surgiu em 1962 por meio da síntese da cloroquina, muito utilizada
contra patógenos urinários. Devido a concentração da droga no plasma e nos
tecidos não ser terapêutica contra infecções sistêmicas, houve a necessidade de se
desenvolver novos compostos a partir da quinolona que sofreu fluoração na posição
6 e uma substituição de piperazina na posição 7 (FIGURA 2); abrindo caminho para
o descobrimento de novos compostos, em sua maioria fluorados: ciprofloxacino,
levofloxacino e norfloxacino. O mecanismo de ação dos compostos desta classe
esta no fato de inibirem a DNA-girase que é responsável pela abertura das fitas de
DNA da bactéria, preparando-a para a replicação ou transcrição. A ação bactericida
certamente ocorre devido à digestão do material genético por exonucleases, cuja
produção é sinalizada quando ocorre algum defeito no DNA (HARDMAN & LIMBIRD,
2005; OLIVEIRA JUNIOR, 2011; TRIPATHI, 2003).
FIGURA 2 - Ciprofloxacino, com Flúor na posição 6, e piperazina na posição 7 (GUIMARÃES;
MOMESSO; PUPO, 2010).
20
3.1.7. Tetraciclinas
Constituem uma classe de antibióticos caracterizados por um núcleo de
quatro anéis cíclicos. São obtidas de actinomicetos que vivem no solo. A
clortetraciclina (Figura 3) foi isolada em 1948 a partir do S. aureofaciens, ganhando
destaque frente à penicilina e a estreptomicina na época por ser ativa via oral e de
amplo espectro. Seu mecanismo se baseia na complexação com a subunidade 30S
ribossomal, evitando a ligação do aminoacetil-t-RNA ao complexo mRNA-ribossomo;
bloqueando a adição de novos peptídeos à cadeia protéica, e consequentemente a
liberação de proteínas é inibida. Outros exemplos desta classe são: a tetraciclina,
oxitetraciclina,
demeclociclina,
metaciclina,
doxiciclina
e
minociclina
(UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]; TRIPATHI, 2003).
Figura 3 - Clortetraciclina (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010).
3.1.8. Clorafenicol
O clorafenicol é obtido do Streptomyces venezuela, e atualmente é sintetizado
e apenas o isômero R,R possui atividade. Este antibiótico bactericida se liga na
subunidade 30S do ribossomo bacteriano, impedindo o movimento do mesmo sobre
o mRNA. Por atuar no mesmo sítio de ação que a lincosamida e os macrolídeos,
este medicamento não deve ser administrado concomitantemente a eles
(GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010; HARDMAN & LIMBIRD, 2005).
21
3.1.9. Macrolídeos
Os macrolídeos possuem ação bacteriostática e bactericida em baixas e altas
concentrações
respectivamente.
Interrompem
a
biossíntese
de
proteínas
bacterianas, pois se ligam ao sítio P da subunidade 50S do ribossomo da bactéria,
inibindo o processo de translocação. Com o sítio P "ocupado", o ribossomo não
consegue se mover sobre o mRNA para expor o próximo códon e dar sequência à
formação da cadeia peptídica. O grande representante desta classe é a eritromicina,
isolada em 1952 a partir do Streptomyces erythreus. Por apresentar uma
instabilidade em meio ácido, diversos efeitos colaterais, e fraca biodisponibilidade,
foram desenvolvidos fármacos com melhor características físico-químicas e
farmacocinéticas, maior espectro de ação e com reações adversas mais tênues que
a eritromicina, a qual foi substituída gradualmente pelos macrolídeos de segunda
geração como a claritromicina, a roxitromicina e a azitromicina (OLIVEIRA JUNIOR,
2011; TRIPATHI, 2003).
3.1.10. Sulfonamidas
Esta classe de antibiótico é derivada da sulfanilamida (p-aminobenzeno
sulfonamida), e seus principais integrantes são: a sulfadiazina que possui ação curta
de 4 a 8 horas; o sulfametoxazol e sulfametopirazina com ação intermediária;
sulfacetamida sódica, sulfassalazina, mafenida, sulfadiazina de prata, sendo essas
para fins especiais, como a última que é usada para tratamento de queimaduras. O
mecanismo de ação destes compostos se dá pela sua semelhança estrutural ao
PABA (ácido p-aminobenzóico), um constituinte do meio utilizado pelas bactérias
para obtenção de ácido fólico. Com isso as sulfonamidas inibem a folato sintetase
bacteriana, impedindo a formação do ácido fólico e prejudicando várias reações
metabólicas essenciais. Impede também a ligação do PABA ao radical da pteridina
para formar o ácido diidropteróico, o qual se conjuga com o ácido glutâmico; a fim de
produzir o ácido diidrofólico. Outra forma de atuação das sulfonamidas está no fato
de serem incorporadas pela bactéria, devido a sua semelhança com o PABA,
levando à formação de um folato alterado metabolicamente que é bastante lesivo à
22
célula (HARDMAN & LIMBIRD, 2005; TRIPATHI, 2003).
O antibiótico sulfametoxazol pode ser combinado com a trimetoprima,
formando o cotrimoxazol. Trata-se de uma associação entre uma sulfonamida de
ação intermediária e da trimetoprima, uma diaminopirimidina relacionada com a
pirimetamina, um agente malárico inibidor seletivo da enzima bacteriana diidrofolato
redutase. As duas substâncias separadas apresentam ação bacteriostática, porém
sua combinação desenvolve uma ação bactericida devido à inibição das enzimas
folato sintetase e diirdrofolato redutase durante o metabolismo do ácido fólico
bacteriano. Ambas possuem meia vida de aproximadamente 10 horas, e tem
espectro de ação contra vários micro-organismos como: Salmonella typhi, Serratia,
Klebsiella e até cepas resistentes às sulfonamidas, por exemplo: E. coli, S. aureus,
S. pyogenes, dentre outros (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010; TRIPATHI,
2003).
3.2. NOVOS MECANISMOS DE AÇÃO ANTIMICROBIANA
Ainda não há um grande número de substâncias que possuam diferentes
mecanismos de ação, para serem usados no tratamento às doenças infecciosas. A
busca por estes compostos inovadores é a esperança de se obter vantagens no
combate aos micro-organismos resistentes e aos novos patógenos que possam
surgir. Dentre as novas substâncias que atuam de forma diferenciada em relação às
classes já existentes, pode se destacar os lipodepsipeptídeos daptomicina e
friulimicina B e a oxazolidinona linezolida (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010;
MILLS, 2006).
O mecanismo de ação da daptomicina, consiste na desorganização de
múltiplas funções da membrana celular bacteriana que é invadida pelo composto, o
qual possui várias cadeias alquílicas em sua estrutura. Mesmo pertencendo a
mesma classe dos lipodepsipeptídeos, a friulimicina B apresenta um mecanismo
diferenciado sendo capaz de inibir a formação do lipídeo I; um precursor na síntese
de peptideoglicanos da parede celular (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010).
Na
classe
das
oxazolidinonas,
destaca-se
a
linezolida
com
ação
bacteriostática de amplo espectro, principalmente contra bactérias que possuem
23
resistência ao inibidores da síntese de proteínas como as Gram-positivas. O
mecanismo da linezolida consiste em se ligar à subunidade ribossomal 50S,
evitando desta maneira a união com a subunidade 30S o que prejudica a formação
do ribossomo 70S, interferindo na síntese protéica da bactéria (GUIMARÃES;
MOMESSO; PUPO, 2010; UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]).
3.3. MECANISMOS DE RESISTÊNCIA BACTERIANA
Um dos problemas de maior importância clínica é a resistência dos microorganismos aos agentes antibacterianos, onde se percebe uma espécie de
"tolerância" a eles semelhante a observada em organismos superiores. A resistência
bacteriana pode ocorrer de forma natural, no caso em que bactéria sempre foi
resistente ao mecanismo de ação do antibiótico, por não possuir o processo
metabólico ou o sítio-alvo aonde o mesmo atuará; como por exemplo, o B. subitilis
que produz a bacitracina e o Streptomyces que sintetiza a estreptomicina, logo serão
naturalmente insensíveis a estes antibióticos respectivamente (OLIVEIRA JÚNIOR,
2011; TRIPATHI, 2003).
Há também a chamada resistência adquirida, onde o micro-organismo
desenvolve uma proteção contra o efeito terapêutico do antibiótico após entrar em
contato, ou não com este; por um certo período de tempo. Isto varia de espécie para
espécie, pois os estafilococos e coliformes conseguem desenvolver resistência
rapidamente enquanto o Streptococcus pyogenes e espiroquetas, ainda não
alcançaram resistência significativa à penicilina que é usada a mais de 40 anos
(TRIPATHI, 2003).
A resistência adquirida pode surgir por meio de mutação ou transferência
gênica. Sendo que a mutação consiste em processos espontâneos e aleatórios, pois
trata-se de uma alteração genética estável e hereditária que se dá entre os microorganismos; mesmo que estes não entrem em contato com o antibiótico. Isto causa
o surgimento de células mutantes que consequentemente, irão necessitar de uma
concentração maior do antimicrobiano para serem inibidas. Desta maneira surgem
as cepas resistentes que logo substituirão as sensíveis, conferindo àquela espécie o
fator de resistência (UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]; TRIPATHI, 2003).
24
O processo de mutação e surgimento do fator resistente pode ocorrer por
etapa única, onde surge um elevado grau de resistência vinculado à apenas uma
alteração gênica que ocorre rapidamente, como por exemplo, a resistência da E. coli
e Staphylococcus à rifampicina (TRIPATHI, 2003). Ou através de etapas múltiplas,
onde estão envolvidas diversas alterações gênicas com as quais a sensibilidade ao
antibiótico, é reduzida gradualmente por etapas. Embora o processo de mutação
auxilie as bactérias a desenvolverem esses fatores de resistência, elas acabam por
reduzirem a suas características de virulência, por exemplo; gonococos com
resistência à penicilina e estafilococos resistentes à rifampicina, já apresentam
redução dos seus fatores de virulência (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010;
TRIPATHI, 2003).
Já a resistência fomentada pela transferência gênica, ocorre de um microorganismo para outro por intermédio da conjugação, transdução ou transformação;
sendo a primeira a de maior importância para a disseminação do fator de resistência
(UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]; TRIPATHI, 2003).
A conjugação (Figura 4) envolve a transferência de DNA cromossômico ou
extracromossômico, no caso de plasmídio; de uma bactéria doadora para uma
receptora através de uma ponte ou pilus sexual, formando um tubo de proteínas que
conectam os citoplasmas das bactérias, geralmente bacilos Gram-negativos. A
bactéria doadora carrega o gene de resistência e passa-o para a receptora que o
incorporará em seu material genético, se tornando assim capaz de sintetizar o fator
que lhe conferirá a resistência (UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]; TRIPATHI,
2003).
FIGURA 4 – Conjugação (UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]).
25
Isto pode ocorrer até mesmo entre micro-organismos não patogênicos e
patogênicos, principalmente por intermédio dos que constituem a microbiota normal
do indivíduo. Eles se tornam resistentes devido a exposição a algum antibiótico, e
transportam o fator de resistência para os micro-organismos patogênicos que estão
habitando o meio, principalmente por contaminação de água e/ou alimentos
ingeridos. Outro fato que pode se desenvolver sendo o mais preocupante, é a
aquisição concomitante de resistência a múltiplos fármacos, onde ocorre a troca de
fatores de resistência entre as bactérias (TRIPATHI, 2003).
A transdução consiste na transferência do gene provedor da resistência por
meio de um bacteriófago que certamente, obteve tal fator de uma bactéria infectada
por ele anteriormente; desta forma ele poderá transmiti-lo a outra a ser infectada
(FIGURA 5). Os bacteriófagos são apontados como responsáveis por casos de
resistência
a
antibióticos
como
clorafenicol,
penicilina
e
eritromicina
(UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]; TRIPATHI, 2003).
FIGURA 5 – Processo de Transdução (UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]).
A transformação ocorre quando uma bactéria resistente morta ou decomposta
acaba por liberar no meio, moléculas ou fragmentos de seu DNA, os quais poderão
ser absorvidos por outras bactérias; salvo que o DNA capturado apenas será
incorporado ao cromossomo bacteriano se o mesmo for semelhante ao da bactéria
receptora, tornando-as capazes de reproduzirem o mesmo fator de resistência da
doadora (FIGURA 6) (UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]). Este processo não
desperta tanta preocupação do ponto de vista clínico, por ocorrer em casos isolados
26
como a resistência à penicilina G por pneumococos que sofreram alteração da
proteína de ligação da penicilina (TRIPATHI, 2003).
FIGURA 6 - Transformação (UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]).
Ainda pode ocorrer a chamada resistência cruzada, onde um micro-organismo
desenvolve resistência simultânea a vários antibióticos, mesmo contra os quais ele
não foi exposto. Tal fato acontece com antimicrobianos de um mesmo grupo ou que
sejam quimicamente similares, por exemplo; uma resistência à determinada
sulfonamida implicará insensibilidade a todas as outras, esta é a denominada
resistência cruzada homóloga. Porém há os casos de resistência cruzada
heteróloga, a qual acomete antibióticos que possuam mecanismos de ação
semelhantes ou partilhem do mesmo sistema de transporte, por exemplo, entre a
tetraciclina e o clorafenicol. (OLIVEIRA JUNIOR, 2011; HARDMAN & LIMBIRD,
2005; TRIPATHI, 2003).
A resistência cruzada pode ser bidirecional ou recíproca, onde a resistência
de um micro-organismo pode cruzar com a de outro e vice-versa, como a entre a
eritromicina e a clindamicina; ou unidirecional, onde a resistência passa de uma
bactéria a outra (OLIVEIRA JUNIOR, 2011; HARDMAN & LIMBIRD, 2005).
3.3.1. Fatores de Resistência
A forma de se obter a resistência varia de espécie para espécie de patógeno,
resultando no surgimento de vários fatores de resistência, como a tolerância à
droga, a capacidade de destruir o fármaco e a impermeabilidade ao antimicrobiano
(GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010; TRIPATHI, 2003).
27
A tolerância à droga está ligada com a perda de afinidade do sítio-alvo dos
micro-organismos pela molécula ativa do agente antimicrobiano, caso que ocorre
com cepas de pneumococos que desenvolvem proteínas alteradas de ligação à
penicilina, tornando-se resistente a ela; ou S. aureus que sintetizam uma RNA
polimerase que não se liga à rifampicina e até a aquisição de vias metabólicas
alternativas; vista em bactérias insensíveis às sulfonamidas que passam a uitlizar o
ácido fólico pré-formado, ao invés de sintetizá-lo por meio do PABA encontrado no
meio (TRIPATHI, 2003).
O fator de resistência de destruição do fármaco consiste basicamente na
elaboração de uma enzima por parte do micro-organismo que inativará a droga,
assim, por exemplo: a clorafenicol acetil transferase que é vista em E. coli, S. typhi e
H. influenzae; e gonococos, estafilococos e Haemophilus capazes de sintetizarem a
β-lactamase que inativa a penicilina G. Há relatos sobre coliformes capazes de
acetilar, fosforilar e/ou adenilar antibióticos da classe dos aminoglicosídeos
(BARROS, 2001; UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]; TRIPATHI, 2003).
A impermeabilidade a muitos antibióticos está intimamente ligada aos
mecanismos de transporte específico, como no caso dos hidrofílicos, os quais
necessitam adentrar na célula bacteriana através das "porinas", que são proteínas
formadoras de canais na membrana bacteriana responsáveis pela passagem do
agente antimicrobiano para dentro da célula. A resistência surge quando estes
mecanismos são perdidos pela cepa, resultando em alterações na bomba de efluxo
e permeabilidade externa da membrana. Isto promove a redução da concentração
do antibiótico sem sua modificação química, devido a existência de proteínas
dependentes de energia e, dirigidas por plasmídios na membrana celular; as quais
bombeiam antibióticos como a tetraciclina para fora da célula (GUIMARÃES;
MOMESSO; PUPO, 2010; UNIVERSIDADE DE LISBOA, [200-?]; TRIPATHI, 2003).
Esses mecanismos já foram detectados para eritromicina e fluorquinolonas, e
também em cepas de gonococos que são menos permeáveis à penicilina G, e o P.
falciparum resistente à cloroquina por acumular uma menor quantidade do fármaco
dentro da célula (TRIPATHI, 2003).
Com todo este contexto de resistência aos agentes antimicrobianos, é de
extrema importância à adoção de medidas para se prevenir e minimizar a
insensibilidade de micro-organismos aos fármacos, através de incentivos a
prevenção de infecções bacterianas com o uso de vacinas, a não utilização de
28
antibióticos de modo inadequado e nem por um período prolongado de tempo, a
preferência ao uso de antimicrobianos que possuam ação rápida e de espectro
estreito, tratamento intenso nas infecções por patógenos que apresentam facilidade
em desenvolver resistência como o S. aures, Proteus, M. tuberculosis e E. coli,
controle e prevenção da disseminação de micro-organismos resistentes, e a
descoberta e desenvolvimento de novos antibióticos (ALLGINTON; RIVEY, 2001;
GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010; TRIPATHI, 2003).
4. DESCOBERTA DE NOVOS ANTIBIÓTICOS
O anseio das pesquisas por substâncias com possível potencial antibiótico,
está relacionado à fatores como: as altas taxas de resistência que vêm aumentando
principalmente em ambientes hospitalares, a necessidade de substâncias que atuem
de maneira diferente e inovadora, o baixo índice de novos agentes antimicrobianos
aprovados pelo FDA e o uso irracional de fármacos industrializados; provocando a
seleção de micro-organismos cada vez mais insensíveis a estes compostos,
justificando a urgência na descoberta de novos medicamentos efetivos contra os
agentes infecciosos (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010; MOLINA et al., 2008)
.
Devido a estes fatores, nos últimos anos o foco das pesquisas mudou
drasticamente, pois anteriormente as buscas se concentravam em novos
organismos produtores de antibióticos, como os fungos e bactérias; e também no
desenvolvimento de derivados semi-sintéticos a partir de antimicrobianos mais
antigos, com a finalidade de aumentar suas propriedades mais desejáveis ou até
modificar os espectros de atividade. Porém nos último 10 anos a atenção se voltou
para as fontes naturais ainda não pesquisadas, principalmente as plantas, fato que o
uso de fitoterápicos tem ganhado intensa utilização em vários países, principalmente
no Brasil que possui uma grande diversidade de espécies vegetais (GUIMARÃES;
MOMESSO; PUPO, 2010; MOLINA et al., 2008; TRIPATHI, 2003).
29
4.1. FONTES DE ANTIBIÓTICOS NATURAIS
A necessidade por novos agentes antimicrobianos, tem levado os
pesquisadores a explorarem ecossistemas ricos em seres pouco estudados,
principalmente em habitats que possuem mudanças drásticas de pH, temperatura,
luminosidade e umidade; pois além de serem ambientes propícios a novas
descobertas, sabe-se que os antibióticos naturais, ou seja, aqueles produzidos por
outros organismos vivos, possuem estruturas químicas por demais complexas; fato
que é de extrema importância pois tal complexidade pode ter interações específicas,
com receptores ou alvos situados nos micro-organismos patogênicos (GUIMARÃES;
MOMESSO; PUPO, 2010).
Um ambiente que desperta grande interesse é o marinho, onde são
encontradas as actinobactérias, as quais são capazes de sintetizar compostos que
demonstraram certa atividade antibacteriana e antitumoral, por exemplo, a policíclico
abissomicina que inibe a síntese do ácido p-aminobenzóico e é extraída de uma
actinobactéria marinha do gênero Verrucosispora. Outra fonte são as bactérias do
solo que a história dos antibióticos demonstra ser uma área promissora para
descoberta novas moléculas antimicrobianas. Há também o estudo com microorganismos simbiontes que habitam insetos, e com os chamados endofíticos que
não possuem caráter patogênico e vivem no interior das plantas; porém muitos
desses micro-organismos não são cultiváveis por meio das técnicas utilizadas em
laboratórios de microbiologia (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010).
As plantas se tornaram uma fonte de estudo sobre moléculas quimicamente
ativas por serem capazes de biossintetizar seus próprios compostos, inclusive
antimicrobianos, os quais as protegem de ataques por micróbios patogênicos. E o
que viabiliza o estudo sobre tais plantas que possuem esse potencial, é o fato de
serem utilizadas há muito tempo pelo homem nas mais diversas regiões em todo o
planeta.
Essas
espécies
popularmente como
vegetais
com
ação
terapêutica
são
conhecidas
"plantas medicinais", as quais são de fácil manuseio e
apresentam baixo custo para o cultivo (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010;
MOLINA et al., 2008).
30
Outro fatores contribuem para a crescente procura por drogas vegetais, como
por exemplo: os efeitos indesejáveis provenientes dos medicamentos sintéticos, as
vezes pelo uso incorreto e/ou abusivo dos mesmos; a decepção com a medicina
convencional frente a impossibilidade de cura, principalmente com as infecções
resistentes; e o triste fato de que muitas camadas da população mundial se quer tem
acesso aos medicamentos (RATES, 2001).
4.2. ATUAÇÃO DA ETNOFARMACOLOGIA
A descoberta de substâncias bioativas provenientes de fontes naturais como
as plantas têm se tornado mais frequentes, e este aumento deve-se ao estudos
realizados principalmente em comunidades tradicionais em várias localidades no
mundo e em diversas regiões do Brasil. As pessoas que habitam essas áreas
desenvolveram a habilidade de utilizar os vegetais de seu habitat para fins
terapêuticos, como o tratamento de doenças que geralmente acometem aquela
comunidade, ou a cura de enfermidades causadas por agentes sobrenaturais,
medidas preventivas, dietas e manutenção do bem-estar (ELISABETSKY; SOUZA,
2007).
Com isto a etnobotânica e a etnofarmacologia atuam como interlocutoras
entre o conhecimento adquirido de forma empírica, e preservado na cultura popular,
com o desenvolvimento tecnológico para uso comercial; pois estas disciplinas tem a
finalidade de levantar dados sobre plantas usadas como "remédios", resgatando e
organizando as informações que advêm da sabedoria do povo; pois desta maneira
as pesquisas para a obtenção de novos fármacos não se desenvolverão a partir de
plantas coletadas ao acaso; mas através de uma quimiotaxonomia orientada e
fundamentada na medicina popular (ELISABETSKY; SOUZA, 2007).
E cabe à etnofarmacologia especificamente utilizar de suas ferramentas com
o propósito de desenvolver estudos químico/farmacológicos sobre a flora medicinal,
permitindo avaliar hipoteticamente a atividade farmacológica e principalmente as
substância ativas existentes, as quais conferem o efeito terapêutico atribuído e
relatado pela população que faz uso de determinada planta ou até associações entre
duas ou mais. Um exemplo desta habilidade de curar enfermidades através das
31
plantas medicinais está no tratamento do mal-de-guta, uma doença que ocorre entre
os caboclos atribuída a Mãe-d'água que os fazia espumar pela boca e seus
membros tremerem ritmicamente. Por meio da etnofarmacologia diagnosticou-se
possíveis casos de epilepsia, e o remédio usado para seu tratamento é constituído
pela associação dos sumos extraídos de Cissus sicyoides L., Ruta graveolens L.,
Aeolanthus suaveolens G., conhecidas como cipó-pucá, arruda e catinga-de-mulata
respectivamente, e uma colher de sementes de gergelim; a
mistura então é
administrada oralmente após ser filtrada em um pedaço de pano. Os estudos sobre
os fitoconstituintes ativos da planta apresentaram para ambas a presença de
lactonas com ação anticonvulsivante, o que torna plausível o uso popular
(ELISABETSKY; SOUZA, 2007).
4.3 AUXÍLIO DA FARMACOGNOSIA
Ciência destinada ao estudo de substâncias e compostos ativos obtidos a
partir de fontes naturais como as plantas, os animais e micro-organismos. Seguindo
a risca os termos etimológicos da palavra gnose (conhecimento) e pharmacon
(fármaco ou veneno), trata-se de uma aliada de exímia importância para a
etnofarmacologia na descoberta de possíveis fármacos extraídos principalmente dos
vegetais, pois através da farmacognosia podem-se desenvolver estudos sobre a
origem, rota biossintética, composição e estrutura química, propriedades físicoquímicas, farmacológicas e toxicológicas das substâncias ativas; sendo este último
fator de grande relevância, pois muitos compostos contidos nos vegetais são tóxicos
até em pequenas concentrações, consolidando esta ciência como uma ferramenta
indispensável na busca incessante por novos insumos farmacológicos seguros e
eficazes (RATES, 2001).
Os dados estatísticos afirmam de forma concisa o quão é importante fazer
uso dos conhecimentos farmacognósticos, pois cerca de 121 substâncias
provenientes de vegetais são utilizadas na terapêutica, 25% dos medicamentos
prescritos no mundo tem origem vegetal, e dentre os 252 fármacos ditos essenciais
ou básicos pela OMS (Organização Mundial da Saúde) 11% advêm de plantas, e
uma grande parcela dos medicamentos sintéticos são obtidos através de fontes
32
naturais. Vários fármacos ilustres compõe a lista de produtos naturais aplicados em
diversos âmbitos terapêuticos, como a atropina e a escopolamina, obtidas da Atropa
belladona; a morfina e a codeína extraídas da Papaver somniferum; a quinidina e a
quinina, ambas encontradas em espécies de Cinchona; o paclitaxel produzido a
partir de espécies de Taxus; a digoxina presente em espécies de Digitalis, e
também, a vinblastina e a vincristina, sintetizadas pela Catharantus roseus (RATES,
2001).
A farmacognosia procura organizar todas as moléculas estudadas e isoladas
em diferentes classes de metabólitos secundários, de acordo com a via metabólica
que são sintetizadas, componentes químicos estruturais, propriedades físicoquímicas, dentre outras. As principais classes existentes destes compostos são: a
dos flavonóides, cumarinas, alcalóides, cromonas, quinonas, xantonas, lignanas,
metilxantinas, terpenos, heterosídeos cardioativos, saponinas e taninos; sendo esta
última classe de destaque por representar o quarto constituinte mais abundante nos
vegetais, depois da celulose, hemicelulose e lignina (MELO, 2008; SANTOS;
MELLO, 2007).
5. TANINOS
Tanino é um termo amplamente usado para caracterizar a segunda maior
classe de compostos fenólicos, que assim como os demais possui a função
primordial e essencial de proteger os tecidos do vegetal contra o ataque de insetos,
fungos ou de bactérias. Os taninos possuem alto peso molecular de 500 a 3000
Dalton, caracterizam reações comuns aos fenóis e combina-se com celulose e
pectina, além de precipitarem alcalóides, gelatina e proteínas (LOGUERCIO et al.,
2005; SANTOS; MELLO, 2007).
São
encontrados em diversas partes da planta como raiz, casca, caule,
folhas e frutos, principalmente os "verdes", ou seja; não maduros, onde se encontra
uma das principais características atribuídas aos compostos desta classe, a
propriedade de conferir adstringência para proteger o vegetal e seus frutos contra os
herbívoros. Esta sensação ocorre devido à precipitação de glucoproteínas salivares,
provocando assim a perda do poder lubrificante (MONTEIRO; ALBUQUERQUE;
33
ARAÚJO, 2005).
A proteção notória encontrada em plantas que tem grande quantidade de
taninos, é que elas apresentam uma maior resistência à ataques de insetos e micro-organismos como bactérias e fungos do que as demais. Esses compostos são
encontrados em abundância no reino vegetal e foram separados em dois grupos:
taninos hidrolisáveis e taninos condensados, devido a algumas diferenças em suas
estruturas químicas. (MELO, 2008 ; SANTOS; MELLO, 2007).
5.1. CARACTERÍSTICAS QUÍMICAS
Assim como a maioria dos compostos fenólicos os taninos não são
encontrados de forma livre na natureza, mas na forma de ésteres ou heterosídeos, o
que lhes permitem serem solúveis em água e solventes orgânicos polares,
consequentemente insolúveis em acetato de etila e solventes orgânicos apolares.
Os taninos possuem uma reatividade química tremenda, principalmente pela
presença de várias quantidades de grupos hidroxilas, permitindo a formação de
ligações de hidrogênio, intra e intermoleculares. Um dado que comprova tal
característica extremamente reativa é a possibilidade de se ligar um mol de taninos
a doze moles de proteínas; fato que justifica o uso da precipitação de gelatina na
confirmação da existência de taninos em determinada amostra (MONTEIRO;
ALBUQUERQUE; ARAÚJO, 2005).
São substâncias facilmente oxidáveis, seja por enzimas vegetais como a
tanase, ou até por influência de metais; como o cloreto férrico, responsável por
indicar a presença de taninos e também de demais compostos fenólicos ao
escurecer a solução que os contém, podendo apresentar coloração azul na
presença de taninos hidrolisáveis e cor esverdeada se houver taninos condensados,
sendo que esses ainda precipitam sob tratamento de formaldeído e HCL à quente
(SANTOS; MELLO, 2007).
34
5.1.1. Taninos Hidrolisáveis
Recebem esta denominação os taninos que podem ser hidrolisados por
enzimas como a tanase, por ácidos ou bases dando origem a álcoois, açúcares e
ácidos carboxílicos fenólicos. Porém a principal característica desta classe de
taninos está intimamente ligada ao fato de que seus compostos são formados por
um poliol central, frequentemente uma β-D-glicose, a qual possui os grupos
funcionais hidroxilas esterificadas por moléculas do ácido gálico, observado na
(FIGURA 7) onde é demonstrado o composto β-1,2,3,4,6-pentagaloil-D-glicose,
considerado como o precursor de ambas as classes do taninos hidrolisáveis
(galotaninos e elagitaninos), por representar o grau máximo de substituição possível
na molécula de glicose esterificada pelo radical galoil (BATTESTIN; MATSUDA;
MACEDO, 2004; MELO, 2008; SANTOS; MELLO, 2007).
FIGURA 7 - Estrutura do β- 1,2,3,4,6-pentagaloil-D-glicose (SANTOS; MELLO, 2007).
Para ser considerado um tanino, a molécula de glicose deve conter no mínimo
três hidroxilas esterificadas para permitir que a ligação e precipitação de proteínas
ocorram. Há uma grande variedade de taninos hidrolisáveis, uns formados pela
oxidação de unidades de ácidos gálicos vizinhos e, outros, pela oxidação do anel
aromático presente na estrutura. Dentre os taninos hidrolisáveis existem duas
35
subclasses: o galotaninos e os elagitaninos que diferem estruturalmente (MELO,
2008; SANTOS; MELLO, 2007).
Os galotaninos surgem a partir da esterificação da glicose por grupos
fenólicos formados por ácido gálico, ou digálico, pois ocorrem ligações metadipsídicas entre duas moléculas do radical galoil (FIGURA 8); desta maneira é
possível observar o maior grau de substituição da glicose, constituído por 10 a 12
resíduos de ácido gálico (MELO, 2008; SANTOS; MELLO, 2007).
Os elagitaninos são formados por moléculas do ácido hexa-hidroxi-difenoil-Dglicose (HHDP), o qual pode se desidratar a partir de uma hidrólise ácida das
ligações ésteres formadas entre dois radicais galoil adjacentes, liberando o ácido
difênico que ao se rearranjar dará origem a lactona estável dos elagitaninos
(FIGURA 9), denominada de ácido elágico (MELO, 2008; SANTOS; MELLO, 2007).
FIGURA 8 - Ácido tânico, ligações meta-depsídica (SANTOS; MELLO, 2007).
36
FIGURA 9 - Divisão dos taninos hidrolisáveis (MELO, 2008).
5.1.2. Taninos Condensados
Conhecidos como proantocianidinas que através de tratamento com ácido
mineral à quente, produzem pigmentos de cor avermelhada como a delfinidina e
cianidina, pertencentes à classe das antocianidinas. Os taninos condensados são
polímeros e oligômeros constituídos pela condensação de unidades de flavonóides,
como a leucoantocianidinas (flavan-3,4-diol) e catequinas (flavan-3-ol) por meio de
ligações carbono-carbono (FIGURA 10). Não sofrem hidrólise por não possuírem
ligações do tipo éster e meta-depsídica, nem resíduos de carboidratos como os
taninos hidrolisáveis. Apresentam alo peso molecular, alguns com até 20 KDa
devido a presença de 2 a 50 unidades de flavonóides em suas estruturas químicas
(MELO, 2008; SANTOS; MELLO, 2007; MONTEIRO; ALBUQUERQUE; ARAÚJO,
2005).
37
Catequina (flavan-3-ol)
Leucoantocianidina (flavan-3,4-diol)
FIGURA 10 - Taninos condensados (MELO, 2008; SANTOS; MELLO, 2007).
Os taninos condensados possuem uma enorme diversidade estrutural devido
a localização das ligações interflavanas, e em menor proporção, as possíveis
derivações como O-metilalação ou O-glicosilações. A estereoquímica conferida pela
presença de três centros quirais no anel B e a grande quantidade de grupos
hidroxilas, desperta interesse na área médica e nutricional, pois estes compostos
apresentam potencial antioxidativo que pode trazer benefícios à saúde humana.
(SANTOS; MELLO, 2007; MONTEIRO; ALBUQUERQUE; ARAÚJO, 2005).
5.2. ATIVIDADES BIOLÓGICAS
A medicina popular faz uso de espécies vegetais ricas em tanino para o
tratamento de moléstias como queimaduras, hemorragias, problemas renais,
diarréia, reumatismo, hipertensão arterial, feridas, problemas estomacais (náuseas,
gastrite, azia, úlcera), problemas do sistema urinário, infecções nos olhos e
garganta, como antiinflamatório e alguns testes in vitro apontam diversas atividades
antimicrobianas,
contra
fungos
e
bactérias
ARAÚJO, 2005; SANTOS; MELLO, 2007).
(MONTEIRO;
ALBUQUERQUE;
38
Essas inúmeras atividades farmacológicas supostamente estão ligadas as
características gerais da classe, independente se são hidrolisáveis ou condensados;
como a capacidade de sequestrar radicais livres e atuar como antioxidante;
complexar-se com íons metálicos, pro exemplo, o manganês, o ferro, o vanádio, o
alumínio, o cobre, o cálcio, dentre outros; e também com macromoléculas como
polissacarídeos
e
principalmente
proteínas.
(MONTEIRO;
ALBUQUERQUE;
ARAÚJO, 2005; SANTOS; MELLO, 2007).
O emprego terapêutico para curar queimaduras, feridas e inflamações está na
capacidade dos taninos formarem uma espécie de camada protetora, através da
complexação do tanino com proteínas e/ou polissacarídeos que recobrem os tecidos
epiteliais lesionados, promovendo proteção a eles contra a exposição ao meio
externo, e provavelmente possível contaminações bacterianas; colaborando para
que os tecidos se regenerem naturalmente. Estima-se que a eficácia do tratamento
para úlcera gástrica, ocorra da mesma maneira ao proteger a mucosa do estômago
(SANTOS; MELLO, 2007).
A atividade anti-inflamatória também está relacionada ao potencial de
complexação do tanino, testes feitos em ratos demonstraram que esses compostos
se ligam a enzimas mediadoras da resposta inflamatória, bloqueando, por exemplo,
a hialuronidase ativada e evitando a degranulação de mastócitos (SANTOS; MELLO,
2007). Há também indícios que o tanino possa se complexar com a enzima
transcriptase reversa, dificultando a replicação do vírus do HIV (MONTEIRO;
ALBUQUERQUE; ARAÚJO, 2005). Outra atividade anti-viral seria o fato destes
compostos se ligarem às proteínas constituintes do capsídeo do vírus, ou até nos
receptores da membrana da célula do hospedeiro, bloqueando a adsorção e invasão
do vírus nas células (SANTOS; MELLO, 2007).
Devido à capacidade antioxidativa contra o oxigênio do ar, e sequestrante de
radicais livres encontrados geralmente no meio intracelular, os taninos podem
apresentar um inestimável potencial na inibição de problemas degenerativos como
câncer, esclerose múltipla, aterosclerose e também sobre o processo de
envelhecimento; pois ao se complexarem com estas espécies oxigenadas reativas,
eles podem interceptar o oxigênio ativo de tal forma que o impossibilite de causar
futuros danos; pois serão formados apenas radicais estáveis. (SANTOS; MELLO,
2007).
39
Os mecanismos de ação antimicrobiana dos taninos podem ser explicados a
partir de três hipóteses. A primeira pressupõe que os taninos atuem inibindo
enzimas bacterianas e fúngicas e/ou formando complexos com os substratos das
mesmas; a segunda hipótese destaca a ação dos taninos sobre as funções da
membrana celular dos micro-organismos, modificando seu metabolismo; e a terceira
fundamenta-se na complexação dos taninos com íons metálicos, diminuindo a
quantidade de íons essenciais para o metabolismo microbianos, disponível no meio
(LOGUERCIO et al., 2005). Várias bactérias são sensíveis aos taninos, por exemplo,
Bacillus anthracis, Streptococcus pneumonia, Shigella dysenteriae e Staphylococcus
aureus, frente a concentrações mínimas de apenas 0,5 g/L (MONTEIRO;
ALBUQUERQUE; ARAÚJO, 2005).
5.2.1. Propriedade de Complexação com Proteínas
A capacidade de se ligarem às proteínas formando complexos que precipitam
em soluções, como o que ocorre com as gelatinas usadas para identificar taninos
em amostras, é a propriedade que caracteriza muito bem esta classe de metabólitos
secundários. Esta propriedade é atribuída a enorme quantidade de hidroxilas
presente na estrutura química dos taninos, sendo estas as responsáveis por
formarem as ligações estáveis com as proteínas. Tal capacidade está intimamente
ligada a flexibilidade e ao peso molecular do tanino, pois quanto maior a quantidade
de grupos galoil-ésteres presentes na estrutura, maior será a afinidade deste
compostos para com as proteínas (LOGUERCIO et al., 2005; SANTOS; MELLO,
2007).
Porém vale ressaltar que os taninos podem formar complexos reversíveis ou
irreversíveis, dependendo do estado de oxidação dos mesmos. As complexações
reversíveis se formam a partir das ligações de hidrogênio que ocorrem entre a
hidroxila presente nos taninos com a amida das proteínas, e também por meio de
interações hidrofóbicas onde a porção aromática dos taninos interage com as
cadeias laterais alifáticas ou aromáticas dos aminoácidos, salvo que isto ocorre
apenas com taninos não oxidados (SANTOS; MELLO, 2007).
Geralmente a complexação do tipo irreversível acontece quando os tecidos da
planta são de alguma maneira lesionados, o que abre espaço para oxidação por
40
meio de catálise enzimática ou auto-oxidação. Ao serem oxidados, os fenóis dos
taninos são convertidos em quinonas que se ligam aos grupos nucleofílicos da
proteína, como o amino da lisina e os sulfidrilos da cisteína; dando origem desta
maneira às ligações covalentes (MELO, 2008). Os complexos reversíveis podem ser
convertidos em irreversíveis se os mesmos forem mantidos em solução de pH alto
ou expostos ao ar, o que promoverá o acontecimento da mesma reação supracitada
para os complexos irreversíveis (SANTOS; MELLO, 2007).
5.3. UTILIZAÇÃO INDUSTRIAL
Os taninos são amplamente usados no âmbito industrial e até antes de surgir
o termo indústria, pois os curtumes que curtiam a pele animal para transformá-la em
couro a muitos milênios atrás, usavam de extratos obtidos de plantas taníferas para
tal feito. Hoje se sabe que os taninos contribuíam para a obtenção de um material
resistente a abrasivos, ao calor e impermeável a água como o couro, por meio da
complexação dos taninos com as fibras de colágenos presentes na pele do animal; e
além de conferir-lhe resistência e proteção contra a decomposição por microorganismos. O extrato tânico para ser usado nos curtumes era proveniente de
árvores ricas em taninos, como a acácia (Acacia mearnsii) e o quebracho (espécies
de Schinopsis); mas espécies do gênero Tsuga, Castanea, Quercus e Terminalia,
também forneciam tal extrato (MELO, 2008; MELLO; SANTOS; SIMÕES 2007).
A sensação adstringente presente em sucos de frutas, bebidas, chás e vinhos
revelam ao paladar a presença de taninos, os quais são usados na indústria
alimentícia como antioxidantes para seus produtos (MELO, 2008), e no caso do
vinho tinto,
eles auxiliam no processo de envelhecimento, além de conferirem
aparência e sabor distintos ao vinho (SANTOS; MELLO, 2007).
Há também o emprego de taninos como base para agentes floculantes e
coagulantes utilizados no tratamento de água (MELO, 2008), formação de polímeros
aglutinantes a partir da reação entre taninos condensados e formaldeído, os quais
desempenham a função de reduzir o fluxo de água nas barragens. Outra utilização
está na produção de borracha, de corantes para a indústria têxtil, na estabilização do
solo em fundações de construções e na complexação com metais pesados solúveis
41
na água, como o cobre que é usado para preservar a madeira, o ferro utilizado em
plantações deficientes do mesmo e ao se ligar o chumbo, contribui para controlar a
poluição nas estradas (MELO, 2008; SANTOS; MELLO, 2007).
5.4. PLANTAS TANÍFERAS COM AÇÃO ANTIMICROBIANA
Os taninos são metabólitos secundários encontrados em praticamente todas
as plantas, pois constituem uma linha de defesa química contra predadores devido a
sua adstringência que torna as folhas e frutos impalatáveis aos animais fitófagos.
Alguns vegetais que possuem taninos dentre seus constituintes fitoquímicos têm
apresentado diversas ações terapêuticas, principalmente antibacterianas; como a
espinheira-santa, barbatimão, pitangueira, hamamélis, dentre outras (MONTEIRO;
ALBUQUERQUE; ARAÚJO, 2005).
LOGUERCIO et al (2005) Testaram o extrato hidroalcólico a 10% (m/v) de
folhas de jambolão sobre 17 bactérias Gram-postivas e Gram-negativas,
patogênicas ao ser humano e a animais. O jambolão (Syzygium cumini (L.) membro
da família Mirtaceae, oriunda da Índia oriental possui a casca, sementes e folhas
ricas em taninos e saponinas. O suco dos frutos é utilizado como adstringente,
diurético, antidiabético, estomáquico, contra diarréias crônicas, disenteria e
menorragia. A decocção da casca é também utilizada como enxaguante bucal para
o tratamento de doenças das vias orais como estomatites, aftas, afecções da
garganta, dentre outras. Observou-se pela média dos diâmetros do halo de inibição
(em mm), medidos através do método de difusão em ágar que o extrato alcoólico de
jambolão apresentou atividade antimicrobiana sobre as 17 cepas testadas, com
halos apresentando de 12 a 26,67mm de diâmetro.
LIN et al (2011) Extraíram e purificaram 680g do 1,2,3,4,6-Penta-O-Galloyl-βD-Glucopyranose
a partir da Eustigma oblongifolium , pertencente a família botânica
Hamamelidecae. Testou-se o composto para avaliar a inibição de crescimento e
formação de biofilme por Staphylococcus aureus, o qual foi inoculado em 96 poços
em placa microtiter de poliestireno. Os resultados obtidos comprovaram que em
baixa concentração a substância não é capaz de impedir o crescimento bacteriano
desta cepa, entretanto consegue inibir a formação do biofilme sobre superfícies de
poliestireno, policarbonato e borracha de silicone, sendo que este último material
despertou grande interesse por ser amplamente utilizado no revestimento de
42
cateteres. Concluiu-se que o PGG (1,2,3,4,6-Penta-O-Galloyl-β-D-Glucopyranos) é
potencialmente útil para estes dispositivos médicos que ao serem revestidos por
substâncias e componentes que o contenham, principalmente a borracha de
silicone, poderão evitar a formação de biofilme.
Engels et al (2009) Conseguiram obter da manga ( Mangifera indica L.),
alguns galotaninos que foram separados por cromatografia líquida de baixa pressão
(LPCL), depois submetidos a testes em (HPLC) que resultaram em três extratos
puros de taninos hidrolisáveis: o penta-, hexa- e hepta-O-galloylglucose, os quais
foram usados em testes de diluição em ágar para se avaliar seu potencial
antibacteriano. As bactérias ácido-láticas não foram inibidas, entretanto constatou-se
diminuição na proliferação de bactérias Gram-positivas, e bactérias Gram-negativas
como a Escherichia coli tiveram crescimento reduzido. Conclui-se que o crescimento
bacteriano poderia ser restaurado caso fosse adicionado ferro ao meio de cultura;
atribuiu-se o potencial inibitório dos taninos hidrolisáveis à sua propriedade de
complexarem com metais, dentre eles o ferro.
6. ÁCIDO GÁLICO
O Ácido Gálico é um composto encontrado nos vegetais, trata-se de um
metabólito secundário derivado do ácido chiquímico, este que por sua vez
desencadeia uma via metabólica importante para as plantas, pois é formado pela
condensação de dois metabólitos da glicose, o fosfoenolpiruvato e a eritrose-4fosfato. Quimicamente denominado como ácido 3,4,5-tri-hidróxi-benzóico, o ácido
gálico é o principal composto que dá origem aos galotaninos e elagitaninos, os quais
são subclasses dos taninos hidrolisáveis, sendo formados pelas reações de
esterificação da glicose pelo ácido gálico ou por ligações meta-dipsídicas formadas
entre moléculas do mesmo. Sua forma molecular é dada por C6H2(OH)3COOH.(H2O)
(FIGURA 11); apresenta-se como pó cristalino de coloração branca ou pálida. É
solúvel em acetona, acetato de etila e DMSO, apresenta baixa solubilidade em água
fria, e não é solúvel em clorofórmio e benzeno (POLEWSKI; KNIAT; SLAWINSKA,
2002; SANTOS, 2007).
43
FIGURA 11 - Estrutura do ácido gálico (SANTOS; MELLO, 2007).
6.1. BIOGÊNESE
Ainda não foi definido como o ácido gálico é sintetizado no vegetal, existem
suposições para três possíveis rotas metabólicas que tentam explicar o mecanismo
mais provável para tal acontecimento (FIGURA 12). Uma das rotas propõe que a
reação se inicie com a L-fenilalanina, a qual é convertida em ácido caféico,
posteriormente em ácido 3,4,5-tri-hidroxi-cinâmico e por fim ao ácido gálico; o motivo
pelo qual esta rota ainda é questionada, se dá ao fato de nunca ter sido encontrado
na natureza um dos precursores que participam desta via, o ácido 3,4,5-tri-hirdroxicinâmico (MELLO; SANTOS, 2007).
Outra via sugere que a degradação da cadeia lateral apenas ocorra após uma
outra etapa, onde posteriormente ao ácido caféico tem-se a formação do ácido
protocatéquico e consequentemente a formação do galato, sendo esta a forma
ionizada do ácido gálico (MELLO; SANTOS, 2007).
Uma terceira rota foi proposta após testes com vegetais e fungos do tipo
Phycomyces. Como os taninos são sintetizados pela via do ácido chiquímico, supõese que ocorra uma aromatização direta do 3-des-hidrochiquimato, reação que
poderia levar à formação do ácido gálico (MELLO; SANTOS, 2007).
44
FIGURA 12 - Rotas de síntese do ácido gálico (SANTOS; MELLO, 2007).
6.2. APLICAÇÕES DO ÁCIDO GÁLICO
O ácido gálico pode ser obtido de forma industrial a partir de um processo
enzimático no qual se utiliza a tanino-acil-hidrolase (E.C.3.1.1.20), comumente
chamada de tanase. Esta enzima que pode ser encontrada naturalmente em
algumas espécies de fungos e no estômago de ruminantes, é responsável pela
hidrólise das ligações meta-depsídicas e ésteres presentes na estrutura química dos
taninos hidrolisáveis, como por exemplo; a do ácido tânico que é muito usado para
esta finalidade (FIGURA 13). Por realizar estes dois processos de clivagem, a
tanase pode ser classificada em tanase estearase e tanase depsidase (FIGURA 14)
(BATTESTIN; MATSUDA; MACEDO, 2004; POLEWSKI; KNIAT; SLAWINSKA,
2002).
45
FIGURA 13 - Hidrólise do ácido tânico pela tanase, R1 (galoil) R2 (digaloil) (BATTESTIN; MATSUDA;
MACEDO, 2004).
FIGURA 14 - Tanase estearase e depsidase (BATTESTIN; MATSUDA; MACEDO, 2004).
Uma vez isolado, o ácido gálico ou (GA) abreviação do termo gallic acid; pode
ser empregado em indústrias químicas e farmacêutica, como por exemplo, na
síntese de ésteres antioxidantes como o pirogalol que é usado na indústria
alimentícia e o chamado propil galato (FIGURA 15); utilizado para proteger óleos e
produtos ricos em lipídeos contra a oxidação. O GA é aplicado na produção de
resinas semicondutoras e trimetropim, um importante antibiótico anti-malárico;
possuindo ainda a capacidade de retirar resíduos do ácido hipocloroso, reduzir a
peroxidação dos fosfolipídeos presentes no cérebro bovino e quelar metais
46
formando complexos bastante estáveis, por exemplo, com o ferro (III) (BATTESTIN;
MATSUDA; MACEDO, 2004; POLEWSKI; KNIAT; SLAWINSKA, 2002).
FIGURA 15 - Obtenção do Propil galato (BATTESTIN; MATSUDA; MACEDO, 2004).
6.3 POSSÍVEIS ATIVIDADES FARMACOLÓGICAS
Substâncias fenólicas são reconhecidamente detentoras de exímia atividade
antioxidante contra o oxigênio do ar, e por atuarem como sequestradores de radicais
livres endógenos, despertando o interesse pela possível utilização contra patologias
degenerativas, contra o envelhecimento prematuro, processos inflamatórios,
cicatrização, dentre outros. Devido ao seu potencial antioxidante, o ácido gálico tem
a propriedade de atuar como um ótimo inibidor do oxigênio ativo nos radicais livres
que são associados como etiologia e patogenia de diversas doenças, por exemplo: o
câncer, a diabetes, problemas cardiovasculares e o processo de envelhecimento
(POLEWSKI; KNIAT; SLAWINSKA, 2002; STIEVEN; MOREIRA; SILVA, 2009).
Alguns estudos demonstraram que o ácido gálico possui atividade antifúngica
contra Fusarium
semitectum,
Fusarium
fusiformis
e Alternaria
altternata
(POLEWSKI; KNIAT; SLAWINSKA, 2002). WU et al (2009) Realizaram testes com
Fusarium oxysporum f. sp.niveum em meio de cultura PDA (Potato Dextrose Agar),
ao qual foi adicionado artificialmente ácido gálico durante o seu preparo. Esse fungo
causa distúrbios vasculares em espécies vegetais como melancia, tomate, feijão,
47
algodão e etc. Avaliou-se o crescimento das colônias em placas, a produção de
micotoxinas e enzimas patogênicas. Embora a quantidade de enzimas como
pectinase, celulase, amilase e proteinase tenham aumentado na presença do ácido
gálico; ele reduziu a virulência do fungo por ter restringido a produção de micotoxina.
Nas placas onde foi cultivado, observou-se que o crescimento miceliano tornou-se
menor, diminuindo o diâmetro das colônias em relação ao controle, concluindo que o
GA possui certa atividade frente ao Fusarium oxysporum f. sp.niveum.
JIM et al (2011) Estudaram a ação biológica do ácido gálico como um
possível inibidor do fator nuclear (NF)-ĸB acetiltransferase, o qual atua sobre as
células da micróglia através da neurotoxina β-amilóide, provocando a disfunção
cognitiva. Constatou-se que o GA produziu um efeito protetor sobre as células
neuronais por reduzir a granulação e, consequentemente expressão de citocinas,
além de inibir o fator kappa B. Concluiu-se que o ácido gálico apresentou uma
possível aplicação terapêutica contra a progressão inflamatória da doença de
Alzheimer.
Estudos
utilizaram
ácido
gálico
em
formulações
cosméticas,
assim
MANOSROI et al (2011) Pesquisaram sobre a utilização de Terminalia chebula Retz,
uma planta pertencente à família Combretaceae, muito difundida na cultura
tailandesa por promover a longevidade. Desenvolveu-se um gel que contém em sua
formulação uma fração semi-purificada do ácido gálico extraído a partir da T.
chebula. Avaliou-se a irritação da fórmula na pele de coelhos, e voluntários
humanos. Foi verificada o nível da elasticidade e aspereza da pele, após a aplicação
do gel e comprovou-se que a fórmula testada sem o ácido gálico causou irritação na
pele dos coelhos, enquanto as formulações que o continham ajudou a reduzir os
valores de rugosidade na pele humana. Conclui-se que a adição do GA proferiu
maior
estabilidade
química
à
formulação
e
apresentou
certa
atividade
antienvelhecimento.
Em relação à ação antibacteriana, (RÚA et al., 2010) Investigaram esta
possível atividade com a combinação de metabólitos secundários, para avaliar o
efeito destes sinergismos sobre Escherichia coli ATCC 35128. Testou-se
associações entre ácido gálico e o ácido protocatéquico; ácido gálico e ácido caféico
e quercetina associada a rutina, ambos diluídos em meio nutriente. Aplicou-se estas
associações em um sistema modelo de carne, onde obtiveram diminuição do
crescimento bacteriano sem morte celular por ambas as combinações a 20 graus C°.
48
Porém as associações mais eficazes foram do ácido gálico com ácido caféico e da
quercetina com rutina, pois a 4 graus C°, não detectaram células viáveis após 14 ou
21 dias de incubação, salvo que a combinação quercetina-rutina, demonstrou menor
tempo de redução decimal em relação ao ácido gálico com ácido caféico. Os
resultados
obtidos
comprovaram
o
efeito
sinérgico
entre
os
metabólitos,
principalmente por serem utilizados em baixas concentrações.
VAQUERO RODRÍGUEZ et al (2011) testaram seis compostos fenólicos
puros (hidroquinona, timol, carvacrol, hidroxianisol butilado, ácido gálico e galato de
octila) a fim de determinar a CMI (Concentração Mínima Inibitória) e a CMB
(Concentração Mínima Bactericida) contra várias cepas de Staphylococcus aureus
provenientes de carne, produtos lácteos, infecções humanas, surtos de intoxicação e
estirpes de referência ATCC (American Type Culture Colection). O galato de octila e
a hidroquinona apontaram melhores valores para CMI, 20,89 e 103,05 mg/mL,
respectivamente. Para CMB encontraram 40,84; 194,37; 417,46 e 581,90 mg/mL
para galato de octila, hidroquinona, carvacrol e timol sequencialmente nesta ordem;
salvo que os isolados a partir da carne foram mais resistentes que os advindos dos
produtos lácteos. Concluiu-se que cada um dos compostos fenólicos testados
apresentaram mecanismos de ação contra S. aureus, sendo o galato de octila o
agente antimicrobiano que apresentou maior atividade antioxidante. De acordo com
DERITA et al (2009) este derivado do ácido gálico é de interesse industrial, pois
pode ser adicionado como antioxidante de produtos alimentícios, assim como outras
moléculas derivadas do GA.
6.4. DERIVAÇÃO QUÍMICA DO ÁCIDO GÁLICO
Sabe-se que a síntese de análogos a partir de princípios ativos isolados
naturalmente tem contribuído para a obtenção de novos agentes terapêuticos. Este
fato tem sido evidenciado para o ácido gálico que por ter em sua estrutura três
hidroxilas e a função carboxila no carbono 1, permitindo variadas reações de síntese
orgânica como metilação, acetilação e esterificação. Os derivados do ácido gálico
são amplamente utilizados na indústria alimentícia como antioxidante e também na
indústria de cosméticos e farmacêutica. Alguns estudos tem demonstrado que estas
49
substâncias
apresentam
potencialidade
terapêutica,
principalmente
como
anticarcinogênica, antimicrobiana, antiviral, além de atuarem como seqüestradores
de espécies reativas de oxigênio (DERITA et al., 2009; ALVES, 2010).
Alterações químicas na molécula do ácido gálico podem modificar e até
melhorar suas propriedades biológicas. Pesquisas comprovam que a ação
fungistática do ácido gálico só ocorre acima de 3.200µg/mL, e alguns derivados
como o galato de nonila e o galato de octila apresentam CMI em torno de 25 e
40µg/mL, respectivamente. Outros testes frente ao S. cereviseae observaram uma
CMI de 6,25 µg/mL para o galato de nonila e 12,5 µg/mL para o galato de decila.
(DERITA et al., 2009; KUBO, 2002).
Frente a esses dados DERITA et al (2009) Realizaram testes com 15 galatos
(ésteres de metila até octodecila) e outros seis análogos, dentre eles, o pirogalol, o
ácido 3,4,5-acetil-benzóico e o ácido gálico, frente a leveduras como C. albicans,
fungos dermatófitos como o Microsporum gypseum e fungos hialohifomicetos como
Aspergilius flavus e niger. Avaliou-se a importância do comprimento da cadeia
carbônica dos compostos, a hidrofobicidade, as hidroxilas livres e os tipos de fungos
testados. A CMI de cada composto foi determinada através da técnica de
microdiluição em caldo de cultura padronizada pela CLSI (Clinical and Laboratory
Standards Institute). Os resultados demonstraram que a série dos 15 galatos de
alquila obteve CMI menor que 250µg/mL, os fungos dermatófitos foram os mais
sensíveis com CMI na faixa de 8 a 250 µg/mL, as três hidroxilas livres não são
suficientes para gerar ação inibitória e a lipofilicidade apontou divergências, não
correlacionando os valores da curva com as CMI. O composto que apresentou
melhor atividade foi o galato de nonila, e o mecanismo de ação para este e os
demais está provavelmente relacionado com a síntese do ergosterol.
A partir dos resultados obtidos nos trabalhos, sugerem-se novos estudos mais
aprofundados e específicos com a finalidade de descobrir e conhecer melhor as
atividades biológicas do ácido gálico e de seus derivados, com a finalidade de se
encontrar a melhor maneira de desenvolver um novo fármaco, especialmente
antimicrobiano. (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010.)
50
7. CONCLUSÃO
A presente revisão bibliográfica abordou a possível atividade antimicrobiana
do ácido gálico. Um composto fenólico denominado quimicamente por ácido 3,4,5tri-hidroxi-bênzóico, sintetizado pelos vegetais através da via metabólica do ácido
chiquímico. O ácido gálico pode ser obtido através de processos industriais
envolvendo reações enzimáticas a partir da tanase, uma enzima encontrada
naturalmente no estômago de ruminantes e também em fungos, capaz de quebrar
as ligações meta-dipsídicas entre as moléculas deste ácido que ao estarem
interligadas dão origem aos galotaninos e elagitaninos, os quais são subclasses dos
taninos hidrolisáveis, ou seja, taninos passíveis de hidrólises por reações ácidas e
ação enzimática como da tanase.
Os taninos são divididos em hidrolisáveis e condensados, constituem a
segunda maior classe de compostos fenólicos encontrados nas plantas, conferindo
sabor adstringente e as protegendo contra animais fitófagos, insetos e ataques
microbianos por bactérias e fungos. As plantas taníferas, ou seja, produtoras de
significante quantidade de taninos são utilizadas a milênios nos curtumes para
transformar a pele animal em couro, devido a propriedade destes compostos de
formarem complexos com as proteínas. Esses vegetais são utilizados pela medicina
popular para o tratamento de feridas, úlceras, queimaduras, diarréia, hemorróidas,
inflamações bucais, além de apresentar atividade antimalárica, antifúngica,
antibacteriana e antiinflamatória.
Plantas como espinheira-santa, barbatimão, hamamélis, pitangueira, entre
outras, fazem parte da cultura as popular, e seu uso é difundido a várias gerações.
Estes dados foram obtidos através de ferramentas importantes como a
etnofarmacologia e etnobotânica que investigam as plantas utilizadas para fins
terapêuticos em determinadas culturas, regiões e comunidades. Aliada a estas
temos a ciência da farmacognosia, a qual estuda as plantas medicinais, extraindo e
identificando os componentes fitoquímicos quanto sua estrutura e propriedades
químicas, separando-os em classes, como a dos taninos, o que permite o
desenvolvimento
de
estudos
que
corroborem
a
utilização
terapêutica
de
determinadas plantas.
Com certeza os vegetais são fonte de descoberta de novas substâncias
bioativas, principalmente de possíveis antibióticos, visto que são capazes de
51
sintetizar substâncias que os protegem contra micro-organismos patogênicos. A
pesquisa por antibióticos inovadores se intensificou devido ao baixo índice de novos
agentes antimicrobianos lançados e principalmente pelo alto índice de resistência
encontrado nos micro-organismos, especialmente nas bactérias, frente a grande
variedade de agentes antimicrobianos existentes.
O lançamento de novos fármacos tem se tornado desafiador para as
indústrias farmacêuticas nos últimos tempos, e a situação dos antibióticos é
alarmante. O ácido gálico surge como um possível candidato ao desenvolvimento de
algum novo fármaco, inclusive como agente antimicrobiano. Estudos in vitro têm
demonstrado seu amplo potencial terapêutico e, até o presente momento, as
pesquisas com ácido gálico e seus derivados apresentam resultados parciais. É
necessário realizar mais testes laboratoriais que avaliem a eficácia do ácido gálico
tanto in vitro quanto in vivo, reunindo dados que possibilitem futuramente a síntese
de novos medicamentos com ação antimicrobiana.
52
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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