na Prática Clínica - Federação Brasileira de Gastroenterologia

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Federação Brasileira de Gastroenterologia
A Gastroenterologia
na Prática Clínica
Temas de Atualização do Curso Pré-Congresso
X Semana Brasileira do Aparelho Digestivo
Porto Alegre - RS • 2011
No Tratamento
da Sii
O nosso tratamento para o alívio da dor abdominal do seu paciente
1,2
Reduz em até 93% o principal
sintoma da Sii: a
1
DOR.
3
Diminui a duração da dor de várias
horas para alguns minutos.4
Contraindicações: hipersensibilidade conhecida aos componentes da fórmula. Interações
medicamentosas: os estudos realizados não demonstraram interações medicamentosas com nenhum dos
seguintes tratamentos concomitantemente prescritos: hipoglicemiantes orais, anticoagulantes e digitálicos.
SIILIF* - brometo de pinavério - USO ADULTO - Apresentações e composição: Comprimido revestido de 50 mg em embalagens com 30 unidades. Comprimido revestido de 100 mg
em embalagens com 10, 30 e 60 unidades. Indicações: Tratamento sintomático da dor ou desconforto abdominal, dos distúrbios da frequência ou consistência das evacuações (constipação
ou diarréia) e da distensão abdominal, decorrentes dos transtornos funcionais do intestino (SII). Tratamento sintomático das dores decorrentes dos transtornos funcionais das vias biliares.
Preparação de enemas opacos. Contraindicações: hipersensibilidade conhecida aos componentes da fórmula. Precauções e advertências: É desaconselhável a utilização do brometo de
pinavério durante a gravidez. Além disso, deve-se observar a presença de bromo, cuja administração no final da gravidez pode causar alterações neurológicas no recém-nascido (hipotonia,
sedação). Em função da falta de estudos, recomenda-se não utilizar o brometo de pinavério durante a lactação. Interações medicamentosas: os estudos realizados não demonstraram
interações medicamentosas com nenhum dos seguintes tratamentos concomitantemente prescritos: hipoglicemiantes orais, anticoagulantes e digitálicos. Reações adversas: foram
relatados, raramente, alguns casos de alterações digestivas leves e casos isolados de reações cutâneas, algumas do tipo alérgico. Raramente pode haver agravamento da constipação e
epigastralgia. Em casos de erupção cutânea, é conveniente interromper a administração do medicamento. Posologia: recomenda-se a administração de 1 comprimido de 50 mg, 3 ou 4
vezes ao dia, ou 1 comprimido de 100 mg, 2 vezes ao dia (manhã e noite). Excepcionalmente, a posologia pode ser aumentada para 6 comprimidos de 50 mg ou 3 comprimidos de 100 mg
ao dia. Os comprimidos devem ser deglutidos inteiros, sem mastigar, com um pouco de água, imediatamente antes ou durante as refeições. Na preparação de enemas opacos, a posologia é
de 2 comprimidos diários de 100 mg ou 4 comprimidos diários de 50 mg, nos 3 dias anteriores ao exame. MEDICAMENTO SOB PRESCRIÇÃO. MS - Registro MS – 1.0639.0254.
Referências bibliográficas: 1) Guslandi M. Profilo farmacologico clinico del pinaverio bromuro. Minerva Med. 1994;85:179-85. 2) Siilif*[Bula]. São Paulo: Nycomed Pharma. 3) Cain KC et
al. Abdominal pain impacts quality of life in women with irritable bowel syndrome. Am J Gastroenterol. 2006;101(1):124-32. 4) Awad R, Dibildox M, Ortiz F. Irritable bowel syndrome treatment
using pinaverium bromide as a calcium channel blocker. Acta Gastroenterol Latinoam. 1995;25(3):137-44.
SE PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO.
Material destinado exclusivamente a profissionais habilitados a prescrever e/ou dispensar medicamentos. Nov/2011.
Material exclusivo à classe médica.
Nycomed Pharma Ltda. Rua do Estilo Barroco, 721 - 04709-011 - São Paulo - SP.
Mais informações poderão ser obtidas diretamente com o nosso
Departamento Médico ou por meio de nossos representantes.
* Marca Depositada.
O brometo de pinavério da Nycomed
Editores
Dr. José Galvão-Alves
Dra. Maria do Carmo Friche Passos
Dra. Eponina O. Lemme
Dr. Laércio T. Ribeiro
A Gastroenterologia
na Prática Clínica
São Paulo • 2011
Editores
Dr. José Galvão-Alves
Presidente da FBG
Dra. Maria do Carmo Friche Passos
Coordenadora do FAPEGE
Dra. Eponina O. Lemme
Comissão do FAPEGE
Dr. Laércio T. Ribeiro
Comissão do FAPEGE
Temas de Atualização do Curso Pré-Congresso
X Semana Brasileira do Aparelho Digestivo
Porto Alegre - RS • 2011
Federação Brasileira de Gastroenterologia
A Gatroenterologia na Prática Clínica
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meio ou sistema, sem prévia autorização da FBG.
Impresso no Brasil
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(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Federação Brasileira de Gastroenterologia
7
A Gatroenterologia na Prática Clínica
DIRETORIA DA FBG
Gestão 2010-2012
Dr. José Galvão-Alves (RJ)
Presidente
Dr. José Roberto de Almeida (PE)
Vice-Presidente
Presidente Eleito (2012-2014)
Dr. Sender Jankiel Mizsputen (SP)
Secretário Geral
Dr. Adávio de Oliveira e Silva (SP)
1º Secretário
Dr. Rubens Basile (RJ)
Diretor Financeiro
Dra. Maria do Carmo Friche Passos (MG)
Coordenadora do FAPEGE
Federação Brasileira de Gastroenterologia
9
Diretoria da FBG • Gestão 2010/2012
COMISSÕES PERMANENTES
Título de Especialista
• Dra. Luciana Dias Moretzsohn (MG) – Presidente
• Dr. Mauro Bafutto (GO)
• Dr. Celso Mirra de Paula e Silva (MG)
• Dr. James Ramalho Marinho (AL)
• Dr. José Miguel Luz Parente (AL)
• Dr. Odery Ramos Junior (PR)
FAPEGE
• Dra. Maria do Carmo Friche Passos (MG) – Coordenadora
• Dra. Eponina M. O. Lemme (RJ)
• Dr. Laércio Tenório Ribeiro (AL)
Departamento de Eventos FBG
• Dr. Renato Dani (MG) – Diretor
Ética Médica
• Dr. Carlos Fernando de Magalhães Franciscone (RS) – Presidente
• Dr. Joffre Rezende Filho (GO)
• Dr. Carlos Sandoval Gonçalves (ES)
Defesa Profissional
• Dr. Gaspar de Jesus Lopes Filho (SP)
• Dr. Jece Freitas Brandão (BA)
• Dr. Julio M. Fonseca Chebli (MG)
Conselho Fiscal
• Dr. José Augusto da Silva Messias (RJ)
• Dr. Pedro Ferreira de Souza Filho (PB)
• Dr. Octavio Augusto B. Gomes de Souza Junior (PA)
Suplentes
• Dr. Sergio Pessoa (CE)
• Dr. José Nonato Fernandes Spinelli (PB)
• Dr. Fábio Gomes Teixeira (MA)
Conferencista Nacional X SBAD 2011
• Dr. Jaime Natan Eisig (SP)
Presidente Eleito Gestão 2012-2014
• Dr. José Roberto de Almeida (PE)
10 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Diretoria da FBG • Gestão 2010/2012
COMISSÕES TEMPORÁRIAS E REPRESENTANTES
Relações Governamentais
• Dr. Isac Jorge Filho (SP)
• Dr. Pedro Braz Macedo Filho (PE)
Relações Internacionais
• Dr. Glaciomar Machado Olive (RJ)
• Dr. Flavio Steinwurz (SP)
• Dr. Ângelo Alves de Mattos (RS)
• Dr. Igelmar Barreto Paes (BA)
Comissão de Ensino
• Dr. Farid Butros Iunan Nader (RS)
• Dr. Flair J. Carrilho (SP)
• Dr. Julio M. Fonseca Chebli (MG)
• Dr. Paulo Pimentel de Assumpção (PA)
• Dr. Luiz João Abrahão (RJ)
Comissão Científica do Site
• Dra. Maria do Carmo F. Passos (MG)
• Dr. Marco Antonio Zerôncio (RN)
• Dra. Marta Mitiko Deguti (SP)
• Dr. Mário Reis Álvares-da-Silva (RS)
• Dr. Laércio Tenório Ribeiro (AL)
Comissão Acervo Histórico
• Dr. Ulysses G. Meneghelli (SP)
Representante na AMB
• Dr. Rogério Toledo Junior (SP)
Representante na CNA – Comissão Nacional de Acreditação
• Dra. Dulce Reis Guarita (SP)
Representante na Área Técnica Saúde do Homem no Ministério da Saúde
• Dr. Ulysses G. Meneghelli (SP)
• Dr. Rogério Toledo Junior (SP)
Representante na ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária
• Dr. Sender Jankiel Miszputen (SP)
Federação Brasileira de Gastroenterologia
11
Diretoria da FBG • Gestão 2010/2012
Revista GED
• Dr. José Murilo Robilotta Zeitune (SP) – Editor de Gastroenterologia
Revista Arquivos de Gastroenterologia
• Dr. Flavio Antonio Quilici (SP) – Editor de Gastroenterologia
Jornal da FBG
• Dr. Heitor Rosa
Comissão Jovem Gastroenterologista
• Dr. Odery Ramos Junior (PR)
• Dr. Silvando Barbalho Rodrigues (RJ)
• Dr. Sergio Pessoa (CE)
• Dr. Raul Carlos Wahle (SP)
• Daniela A. Cavalcanti (RJ) - Residente
Comissão do Selo de Certificação da FBG
• Dr. Edson Braga Lameu (RJ)
• Dr. Rubens Basile (RJ)
• Dr. Sender Jankiel Mizsputen (SP)
Comissão de Pesquisa
Básica
• Dra. Raquel Canzi Almada de Souza (PR)
• Dr. André C. Lyra (BA)
Clínica
• Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho (MG)
• Dr. José Alves de Freitas (SP)
Comissão de Acreditação
Comissão Reforma Estatuto e Regimento
• Dr. Laércio Tenório Ribeiro
• Dr. Celso Mirra de Paula e Silva
12 Federação Brasileira de Gastroenterologia
A Gatroenterologia na Prática Clínica
SOCIEDADES
FEDERADAS
(2010-2012)
Presidentes
Sociedade Alagoana de Gastroenterologia
• Dr. Edgar Valente de Lima Neto
Sociedade de Gastroenterologia do Amazonas
• Dr. Agostinho Massulo
Sociedade de Gastroenterologia da Bahia
• Dra. Nelma Pereira de Santana
Sociedade Cearense de Gastroenterologia
• Dr. Cícero Robério Motta
Sociedade de Gastroenterologia do Espírito Santo
• Dra. Maria da Penha Zago Gomes
Sociedade Goiana de Gastroenterologia
• Dr. Américo de Oliveira Silvério
Sociedade de Gastroenterologia de Brasília
• Dra. Adélia Carmen Silva de Jesus
Sociedade Maranhense de Gastroenterologia
• Dra. Licia Maria Rodrigues Fonseca
Sociedade Mato-Grossense de Gastroenterologia e Nutrição
• Dr. Elton Hugo Maia Teixeira
Sociedade Sul-Mato-Grossense de Gastroenterologia
• Dr. Jesus da Cunha Garcia
Federação Brasileira de Gastroenterologia
13
Sociedades Federadas (2010/2012)
Sociedade de Gastroenterologia e Nutrição de Minas Gerais
• Dr. Áureo de Almeida Delgado
Sociedade Paraense de Gastroenterologia
• Dra. Betânia Cavalcante Pinheiro
Sociedade de Gastroenterologia e Nutrição da Paraíba
• Dr. José Eymard M. de Medeiros Filho
Sociedade Paranaense de Gastroenterologia e Nutrição
• Dr. Julio Cesar Pisani
Sociedade Pernambucana de Gastroenterologia
• Dra. Ana Botler Wilheim
Sociedade de Gastroenterologia do Piauí
• Dra. Simone Barbosa da Silva Leal
Sociedade de Gastroenterologia do Rio de Janeiro
• Dr. Edson Jurado da Silva
Sociedade de Gastroenterologia do Rio Grande do Norte
• Dra. Auzelívia Pastora Rego Medeiros
Sociedade Gaúcha de Gastroenterologia
• Dr. Carlos Kupski
Sociedade Catarinense de Gastroenterologia
• Dr. Eduardo Nobuyuki Usuy Jr.
Sociedade de Gastroenterologia de São Paulo
• Dr. Joaquim Prado P. de Moraes Filho
Sociedade de Gastroenterologia de Sergipe
• Dr. Gilvan Pinto Monteiro
14 Federação Brasileira de Gastroenterologia
A Gatroenterologia na Prática Clínica
Autores
Dr. Adávio de Oliveira e Silva
Professor Livre-Docente do Departamento de Gastroenterologia da
Faculdade de Medicina da USP. Diretor Clínico do Centro Terapêutico
Portuguesa de São Paulo. CRM-SP 13.739.
Dra. Ana Flávia Passos Ramos
Médica Assistente do Serviço de Gastroenterologia da Santa Casa de Belo
Horizonte e do Instituto Alfa de Gastroenterologia – HCUFMG. Mestre em
Ciências Aplicadas ao Aparelho Digestivo. CRM-MG 39.458.
Dra. Andrea Benevides Leite
Gastroenterologista do Serviço de Gastroenterologia do Hospital Geral de
Fortaleza - HGF. Mestre em Hepatologia pela UFCSPA. CRM-CE 7.919.
Dr. Angelo Alves de Mattos
Professor Titular da Disciplina de Gastroenterologia e do Curso de
Pós-Graduação em Hepatologia da Universidade Federal de Ciências da
Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). CRM-RS 7.089.
Dr. Antonio de Barros Lopes
GastroLab, Hospital de Clínicas de Porto Alegre & Universidade Federal
do Rio Grande do Sul. CRM-RS 26.045.
Dr. Alexandre Pelosi
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva. Staff
do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Federal de Ipanema,
Rio de Janeiro. Staff do Serviço de Endoscopia Digestiva do INCA I.
CRM-RJ 52.64186-3.
Federação Brasileira de Gastroenterologia
15
Autores
Dr. Carlos Alexandre Antunes de Brito
Professor Adjunto da UFPE. Mestre em Medicina Interna UFPE. Doutor em
Ciência CpqAM/FIOCRUZ. Pós-Doutor em Imunologia FIOCRUZ.
CRM-PE 10.107.
Dr. Decio Chinzon
Doutor em Medicina. Professor do Curso de Pós-Graduação em Gastroenterologia
da Disciplina de Gastroenterologia Clínica FMUSP. CRM-SP 49.552.
Dra. Dulce Reis Guarita
Professora Livre-Docente e Chefe do Grupo de Pâncreas do Serviço de
Gastroenterologia da Divisão de Clínica Médica II do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Membro da American
Gastroenterological Association. CRM-SP 21.137.
Dra. Eponina Maria de Oliveira Lemme
Professora Associada do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de
Medicina da UFRJ. Chefe da Unidade de Esôfago do Serviço de Gastroenterologia
do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, UFRJ. CRM-RJ 52. 12884-6.
Dr. Fernando Magro
Serviço de Gastrenterologia do Hospital de São João. Instituto de Farmacologia e
Terapêutica da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Portugal.
Dr. Guilherme Eduardo Gonçalves Felga
Gastroenterologista, Hepatologista e Membro do Grupo de Pâncreas do Serviço
de Gastroenterologia da Divisão de Clínica Médica II do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. CRM-SP 122.055.
Dr. Jaime Natan Eisig
Médico Assistente Doutor da Disciplina de Gastroenterologia Clínica do
Departamento de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Universidade de
São Paulo. CRM-SP 19.922.
Dr. João Galizzi Filho
Hepatologista e Gastroenterologista. Professor Adjunto da Universidade Federal de
Minas Gerais. CRM-MG 5.739.
16 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Autores
Dr. José Galvão-Alves
Chefe da 18ª Enfermaria do Hospital Geral da Santa Casa de Misericórdia do Rio
de Janeiro. Professor Titular de Clínica Médica da Universidade Gama Filho e
da Faculdade de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques.
Professor de Pós-Graduação em Gastroenterologia da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro. Membro Titular da Academia Nacional de Medicina.
Presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia. Doutor em Medicina
pela Faculdade de Medicina da UFMG. CRM-RJ 52.26254-8.
Dra. Lorete Maria da Silva Kotze
Professora Adjunta Aposentada da Disciplina de Gastroenterologia do Hospital
das Clínicas da Universidade Federal do Paraná. Professora Adjunta do Curso de
Medicina do Setor de Ciências Biológicas e da Saúde da Pontifícia Universidade
Católica (PUC) do Paraná. Professora do Curso de Especialização em
Adolescência da PUC - Paraná. Chefe do Serviço de Gastroenterologia do Hospital
Universitário Cajuru da PUC - Paraná. Membro Internacional do American
College of Gastroenterology. CRM-PR 2.219.
Dra. Lucia Camara Castro Oliveira
Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo. Titular da Sociedade
Brasileira de Coloproctologia e do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Chefe do
Serviço de Fisiologia Anorretal da Policlínica Geral do Rio de Janeiro. Fellow pela
Cleveland Clinic Florida. CRM-RJ 52.51841-6.
Dra. Luciana Dias Moretzsohn
Professora Adjunta Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade
de Medicina da UFMG. CRM-MG 18.575.
Dr. Luiz Edmundo Mazzoleni
Mestre e Doutor em Gastroenterologia. Professor de Gastroenterologia da
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). CRM-RS 10.471.
Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho
Professor Titular do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina
da UFMG. Subchefe do Instituto Alfa de Gastroenterologia do Hospital das
Clínicas da UFMG, Belo Horizonte - MG. CRM-MG 6.666.
Federação Brasileira de Gastroenterologia
17
Autores
Dr. Luiz Leite Luna
Chefe do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital São Vicente de Paulo, Rio de
Janeiro. Fellow em Gastroenterologia Lahey Clinic Boston, EUA. Membro Titular
da Federação Brasileira de Gastroenterologia. Membro Titular Especialista,
Fundador e Honorário da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva SOBED.
CRM-RJ 52.12305-6.
Maria Clara Freitas Coelho
Assistente Voluntária da VI Enfermaria de Mulheres da Santa Casa de
Misericórdia de Belo Horizonte - MG.
Maria do Carmo Friche Passos
Professora Adjunta do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de
Medicina da UFMG e da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais.
Doutora em Gastroenterologia. Coordenadora Científica do Fundo de Pesquisa e
Aperfeiçoamento (FAPEGE) e do site da Federação Brasileira de Gastroenterologia
CRM-MG 18.599.
Dra. Maria Helena Itaqui Lopes
Médica Gastroenterologista, Doutora em Clínica Médica. Professora Titular
do Departamento de Medicina Interna da Faculdade de Medicina da PUCRS.
Coordenadora do Curso de Medicina da PUCRS. CRM-RS 8.668.
Dra. Marianges Zadrozny Gouvea da Costa
Mestre em Medicina pela FMUSP e Membro do Grupo de Pâncreas do Serviço de
Gastroenterologia da Divisão de Clínica Médica II do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. CRM-SP 114.571.
Dra. Martha Regina Arcon Pedroso
Doutora em Medicina pela FMUSP e Membro do Grupo de Pâncreas do Serviço
de Gastroenterologia da Divisão de Clínica Médica II do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. CRM-SP 37.455.
Dr. Matheus Azevedo C. Freitas
Médico Residente da Disciplina de Gastroenterologia Clínica FMUSP.
CRM-SP 131.006.
Dra. Munique Kurtz
Médica Residente da Disciplina de Gastroenterologia Clínica FMUSP.
CRM-SP 146.557.
18 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Autores
Dra. Patrícia Abrantes Luna
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva. Membro Titular
da Federação Brasileira de Gastroenterologia. Staff do Serviço de Endoscopia
Digestiva do Hospital São Vicente de Paulo, Rio de Janeiro. Staff do Serviço de
Endoscopia Digestiva do Hospital Federal de Bonsucesso, Rio de Janeiro. Staff do
Serviço de Endoscopia Digestiva INCA II. CRM-RJ 52.69844-0.
Dr. Renato Abrantes Luna
Membro Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, Staff do Serviço de Cirurgia
Geral II do Hospital Federal dos Servidores do Estado, Rio de Janeiro. Fellow em
Cirurgia Minimamente Invasiva.Oregon Health And acience University.
CRM-RJ 52. 64414-5.
Dr. Sérgio G. S. de Barros
GastroLab, Hospital de Clínicas de Porto Alegre & Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. CRM-RS 5.456.
Federação Brasileira de Gastroenterologia
19
A Gatroenterologia na Prática Clínica
Apresentação
A
Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG)
estará, como habitualmente, realizando o seu conceituado Curso
Pré-Congresso durante a X Semana Brasileira do Aparelho
Digestivo - SBAD, em novembro de 2011, na hospitaleira Porto Alegre - RS.
O FAPEGE - Fundo de Aperfeiçoamento e Pesquisa em Gastroenterologia enquanto Comissão da FBG, composta pelos doutores Maria do Carmo
Friche Passos, Eponina M. O. Lemme e Laércio Tenório Ribeiro, preparou um
programa atual e prático, contendo temas controversos para que professores
habituados aos mesmos nos tragam o que há de mais recente na literatura.
A exemplo do Digestive Disease Week (DDW) e do United European
Gastroenterology Week (UEGW), o curso pré-congresso pretende impor-se
como um ponto de excelência que une ampla revisão de inúmeros temas
e condições que por si sós possam justificar a presença na SBAD.
Agradecemos mais uma vez à Nycomed pela sólida, ética e longa parceria
na viabilização da publicação, sob a forma de livro de nossas conferências.
Aos queridos professores convidados nosso reconhecimento pelo
compromisso com o ensino continuado, com nossos associados e com a FBG.
Um abraço,
Dr. José Galvão-Alves
Presidente
Federação Brasileira de Gastroenterologia
21
A Gatroenterologia na Prática Clínica
Sumário
Halitose Essencial - Existe Tratamento?
Dra. Maria Helena Itaqui Lopes...................................................................... 25
Esôfago de Barrett Longo: Quando Tratar Clinicamente?
Barrett Curto: Quando Operar?
Dra. Eponina Maria de Oliveira Lemme........................................................ 29
Esofagite Eosinofílica: Como Tratar e Prevenir Recidiva?
Dra. Luciana Dias Moretzsohn......................................................................... 37
DRGE: O que Fazer Quando o IBP Falha?
Dr. Sérgio G. S. de Barros • Dr. Antonio B. Lopes....................................... 43
O Uso Prolongado de IBP é Realmente Seguro?
Dr. Jaime Natan Eisig...................................................................................... 49
Dispepsia Funcional e Helicobacter pylori: Sempre
Erradicar a Bactéria?
Dr. Luiz Edmundo Mazzoleni......................................................................... 53
Pólipos Gástricos
Dra. Munique Kurtz • Dr. Matheus Azevedo C. Freitas
Dr. Decio Chinzon . ........................................................................................ 59
Metaplasia e Atrofia Gástrica - Como Conduzir?
Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho • Maria Clara Freitas Coelho........................ 67
Não Tenho Doença Celíaca, Mas Não Tolero o Glúten.
O Que Fazer?
Dra. Lorete Maria da Silva Kotze.................................................................... 79
Federação Brasileira de Gastroenterologia
23
Sumário
Hemorragia Digestiva Obscura do Intestino Médio:
Enteroscopia ou Cápsula Endoscópica Como Primeira Opção?
Dr. Luiz Leite Luna • Dr. Renato Abrantes Luna
Dra. Patrícia Abrantes Luna • Dr. Alexandre Pelosi...................................... 87
Quando Indicar Agentes Biológicos na Doença
Inflamatória do Intestino
Dr. Fernando Magro........................................................................................ 99
Constipação Intestinal Refratária: Qual é a Sequência
Propedêutica?
Dra. Lucia Camara Castro Oliveira.................................................................. 117
Doença de Crohn: Tratar Sempre?
Dr. Carlos Alexandre Antunes de Brito......................................................... 127
Gases Intestinais: Quando Investigar e Como Tratar?
Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. Ana Flávia Passos Ramos........ 137
Insuficiência Exócrina do Pâncreas de Origem Não Pancreática
Dr. José Galvão-Alves...................................................................................... 151
Diagnóstico Precoce da Pancreatite Crônica: É Possível?
Dra. Dulce Reis Guarita • Dr. Guilherme Eduardo
Gonçalves Felga • Dra. Marianges Zadrozny Gouvea da Costa
Dra. Martha Regina Arcon Pedroso.............................................................. 159
Provas de Função Hepática Alteradas. O Que Significam?
Dr. Adávio de Oliveira e Silva...................................................................... 165
O Fibroscan Pode Substituir a Biópsia na Avaliação
da Fibrose Hepática?
Dr. João Galizzi Filho..................................................................................... 175
Como Tratar a Esteato-Hepatite Não Alcoólica?
Dr. Angelo Alves de Mattos • Dra. Andrea Benevides Leite........................ 181
Qual o Melhor Betabloqueador em Cirróticos?
Dr. Mário Reis Álvares-da-Silva......................................................................193
24 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Maria Helena Itaqui Lopes
Capítulo 1
Halitose Essencial Existe Tratamento?
Dra. Maria Helena Itaqui Lopes
O problema em perspectiva
O
termo halitose origina-se do latim halitus (respiração) e osis (condição), tendo a definição de sensação subjetiva de odor desagradável
que emana da boca percebida pelo paciente e/ou circunstantes.(1)
É um sintoma extremamente frequente, que afeta um número significativo
de pessoas, em qualquer faixa etária e ambos os sexos.
Em pesquisa bibliográfica recente, observa-se que a terminologia de halitose
essencial ou verdadeira, antigamente usada para definir a halitose sem nenhuma
causa aparente, está em desuso.
Pode-se fazer uma distinção entre halitose de origem fisiológica, que é
usualmente temporária, reversível, podendo ter origem de substâncias que são
liberadas pelos pulmões a partir da ingestão de alguns alimentos (alho e cebola),
bem como a halitose pós-jejum prolongado ou matutina, onde existe diminuição
do fluxo salivar, aumentado a proliferação bacteriana. Já a halitose patológica
costuma ser persistente e decorre de situações específicas, requerendo também
um tratamento determinado.
Acredita-se hoje, e as evidências mostram, que halitose tem origem estabelecida. Sua etiologia é multifatorial, mas a causa principal deve-se à decomposição
de material orgânico por micro-organismos da cavidade oral.(2) Nesse caso, é
atribuída à eliminação de componentes sulfurados voláteis, tais como sulfito de
hidrogênio, metilmercaptano, dimetilssulfito, etiolmetano e etioletano. Outros
A Gastroenterologia na Prática Clínica
25
Halitose Essencial - Existe Tratamento?
componentes que contribuem para a halitose são os ácidos orgânicos, acetona,
acetaldeído e diaminas, tais como cadaverina e putrescina.(3)
As bactérias identificadas como causadoras de halitose são as seguintes:
Prevotella (Bacteroides) melaninogenica, Treponema denticola, Porphyromonas gingivalis, Porphyromonasendodontalis, Prevotella intermedia, Bacteroides
loescheii, Enterobacteriaceae, Tannerella forsythensis (Bacteroides forsythus),
Centipeda periodontii, Eikenella corrodens, Fusobacterium nucleatum vincentii,
Fusobacterium nucleatum nucleatum, Fusobacterium nucleatum polymorphum
e Fusobacterium periodonticum.(6)
As causas mais comuns de halitose estão localizadas na cavidade oral (90%) (2)
e podem ser decorrentes da higiene inadequada, especialmente do dorso da
língua, xerostomia, problemas gengivais e periodontais, a própria putrefação na
saliva provocada por micro-organismos bucais, lesões benignas ou malignas da
boca. Outras situações também deverão ser investigadas, tais como tonsilites,
faringites, rinites, sinusites, longos períodos de jejum, ingestão de alimentos como
alho e cebola, uso de medicamentos (anticolinérgicos, antidepressivos tricíclicos,
diazepínicos, derivados de iodo, anestésicos, hidrato de cloral, paraldeído e
nitrato de amilo), drogas (tabagismo, etilismo), doenças pulmonares (bronquite, bronquiectasias, pneumonia, abscesso pulmonar, tuberculose, neoplasia de
pulmão), gastrointestinais (regurgitação, carcinoma gástrico, bezoares, acalasia,
existe controvérsia quanto à gastrite associada ao Helicobacter pylori ser causa
de halitose). Em certas doenças metabólicas sabe-se que metilmercaptanos (no
fetor hepaticus), corpos cetônicos (diabetes mellitus descompensado), degradação da ureia à amônia na saliva (uremia) causam halitose característica.(4-7)
O quadro 1 resume os problemas prevalentes como causa de halitose.
Quadro 1. Causas mais frequentes de halitose
Cavidade oral:
Cáries dentárias, doença periodontal
Língua saburrosa, impactação de restos de alimentos
Higiene de próteses inadequada, ulcerações, fístulas, câncer
Problemas otorrinolaringológicos e sistema respiratório:
Faringite, tonsilite, sinusite, corpo estranho no nariz
Bronquite, carcinoma brônquico, bronquiectasia
Sistema digestório:
Regurgitação, acalasia, bezoares, Helicobacter pylori (?),
câncer gástrico
Outras:
Insuficiência renal, diabetes, cirrose, halitofobia
26 Federação Brasileira de Gastroenterologia
90%
8%
1%
1%
Maria Helena Itaqui Lopes
Halitofobia é percepção equivocada pelo paciente de mau hálito, geralmente associada a sintomas psiquiátricos, como ansiedade e depressão, e muitos
dos casos de halitose imaginária, descritos na literatura, lembram a síndrome
psiquiátrica da fobia social.(8)
Diante de mais de 50 causas possíveis isoladamente ou em combinação,
reitera-se a necessidade da realização do diagnóstico etiológico para uma correta
abordagem terapêutica.
Como tratar a halitose
Por vezes, existe relutância dos pacientes em consultar um médico por halitose, por não perceber o problema, não valorizar o sintoma ou por vergonha.
A anamnese e o exame físico são fundamentais para a elaboração diagnóstica.
Um cuidadoso exame, na maioria dos casos, pode determinar a origem do problema do paciente com halitose. Inicialmente a estratégia de tratamento deve
ser focada na causa e na higiene oral.(4,5)
Diversos produtos são indicados para o tratamento da halitose a partir de
manipulações da cavidade bucal, mas todos eles salientam a importância da
associação dos recursos rotineiros de higienização bucal, tais como a aplicação
de sprays antissépticos nas gengivas, língua e paredes bucais, soluções para
gargarejos à base de clorexidina, ou outras soluções à base de cloreto de cetilpiridínio, dioxidoclorina e cloreto de zinco, uso da pasta de dente (contendo
triclosano e cloreto de zinco) e gomas de mascar que contenham zinco, por sua
possível ação em diminuir a concentração de compostos de enxofre voláteis em
não voláteis, na forma de sulfito de zinco.(9) Sabidamente a higiene mecânica
reduz resíduos alimentares e igualmente a microflora da boca.(6) Dessa maneira,
complementos diários, como os citados previamente e limpezas periódicas feitas
por profissionais, garantem melhor controle do hálito saudável. Medidas preventivas adotadas pelos pacientes, como uso frequente de fio dental, ingestão de
água como primeira refeição do dia e a raspagem diária da língua com escova
dental ou uma colher, bem como uma dieta alimentar livre de alho, cebola, café
e outros alimentos odoríferos, é também recomendada. Diversos instrumentos
foram idealizados para permitir uma adequada remoção dos resíduos do dorso
de língua nos processos de higienização bucal, incluindo a escova dental, colheres plásticas e raspadores especificamente idealizados para essa finalidade.
As medidas fundamentais de tratamento são apresentadas no quadro 2, de
acordo com as causas prevalentes de halitose.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
27
Halitose Essencial - Existe Tratamento?
Quadro 2. Tratamento da halitose
• Investigar e manejar possível fonte sistêmica (não oral)
• Melhorar a higiene oral, uso de fio dental
• Limpeza regular da língua (escovação, limpadores especiais)
• Uso regular de pastas dentais e soluções bucais antimicrobianas:
- Gluconato de clorexidina
- Triclosano e cloreto de zinco
- Cloreto de cetilpiridínio
• Revisões dentárias periódicas
Permanece ainda não confirmada a ação de probióticos como efetiva para
o tratamento da halitose, tais como cepas de Weissella cibaria para inibir a
proliferação de compostos sulfurados voláteis produzidos pela Fusobacterium
nucleatum.(10)
Referências
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the production of volatile sulphur compounds. J Clin Periodontol 2006;33(3):226-32.
28 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 2
Esôfago de Barrett
Longo: Quando Tratar
Clinicamente?
Barrett Curto: Quando Operar?
Dra. Eponina Maria de Oliveira Lemme
O
esôfago de Barrett (EB) é definido, de maneira geral, como “a
substituição do epitélio escamoso estratificado do esôfago por epitélio
colunar, observado à endoscopia digestiva alta (EDA) e confirmado por
exame histopatológico, pelo encontro de células intestinalizadas (metaplasia
intestinal). Quanto este epitélio especializado tem menos de 3 cm é chamado de
Barrett curto (EBC) e quando apresenta 3 cm ou mais, de Barrett longo (EBL).(1,2)
O EB tem sido observado em cerca de 10% a 15% dos indivíduos submetidos à EDA que apresentam sintomas crônicos de refluxo. A prevalência do EB
está aumentando no mundo ocidental. Estudos referem aumento significativo
do diagnóstico de EB em indivíduos que realizaram EDA nos últimos anos.(3)
Sabe-se que pacientes com EB têm risco 20-60 vezes maior do que a população em geral de desenvolver adenocarcinoma de esôfago e esta malignização
ocorre após a cascata displasia de baixo grau e displasia de alto grau.(4)
A etiopatogenia do EB é controversa, porém sugere-se que a metaplasia é
consequência do refluxo áci do e biliar combinados de forma prolongada. (5)
Alguns fatores de risco são associados ao EB, tais como sexo masculino,
consumo de álcool, o hábito de fumar e principalmente a obesidade.(4) Alterações motoras e funcionais esofagianas, notadamente a falha mecânica
do esfíncter inferior, são mais prevalentes no EB do que nos portadores de
esofagite não complicada ou sem esofagite,(5) porém são menos intensas no
BC do que no BL.(6)
A Gastroenterologia na Prática Clínica
29
Esôfago de Barrett Longo: Quando Tratar Clinicamente?
Tratamento do esôfago de Barrett
Os objetivos do tratamento de pacientes com EB são: 1) interromper o refluxo; 2) promover a cicatrização das lesões; 3) induzir a regressão do epitélio
metaplásico de tal forma que a mucosa de alto risco seja eliminada; 4) alterar a
progressão de displasia para câncer.(3) Há três formas principais de tratamento:
1.Tratamento clínico; 2. Tratamento cirúrgico; 3. Tratamento endoscópico.
Esôfago de Barrett longo: quando
tratar clinicamente?
O EBL acomete indivíduos brancos, mais frequentemente do sexo masculino,
na proporção de 2:1 e sua prevalência aumenta com a idade, especialmente
após os 40 anos.(1,3)
Como o EB é uma consequência do refluxo crônico e prolongado, o tratamento clínico segue os mesmos preceitos do empregado na DRGE(1) e deve
ser realizado em todos os pacientes com EBL. Tem como objetivos principais o
alívio dos sintomas, a cicatrização das lesões erosivas que podem acompanhar
a doença e a prevenção de sua recidiva.(3) Baseia-se fundamentalmente nas medidas comportamentais e no tratamento farmacológico. As medidas dietéticas e
comportamentais (elevação da cabeceira da cama, refeições pouco volumosas
e mais frequentes, não deitar imediatamente após as refeições, redução das
condições que intensificam os sintomas de refluxo, redução ou eliminação de
alimentos e medicamentos que provoquem ou intensifiquem o refluxo), devem
ser individualizadas de tal forma que limitem o menos possível a qualidade de
vida do paciente. Fundamental é a redução do peso corporal em obesos, uma
vez que está demonstrada a relação da obesidade no agravamento do refluxo
e surgimento de lesões.(4)
O tratamento farmacológico é baseado na neutralização ou supressão da
acidez intragástrica com o emprego dos inibidores da bomba de prótons (IBP).
Pacientes com EB apresentam maior exposição ácida no esôfago,(7) necessitando de doses maiores de IBP para sua neutralização. As doses padrão destes
medicamentos (40 mg de omeprazol, 30 mg de lanzoprazol, 40 mg de pantoprazol, 20 mg de rabeprazol e 40 mg de esomeprazol) devem ser administradas em duas tomadas, visando maior inibição da secreção, sempre a primeira
30 minutos antes do desjejum e a segunda 30 minutos antes do jantar.(1) Estas
doses devem sem mantidas por 8-12 semanas, sendo aconselhável a repetição
30 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Eponina Maria de Oliveira Lemme
da EDA para avaliar a cicatrização das lesões, uma vez que a maior parte dos
pacientes com EBL, nas fases sintomáticas da doença, apresenta esofagite em
maior ou menor grau, além da presença de hérnia de hiato que contribui para
a manutenção do refluxo.(5)
O controle dos sintomas em portadores do EBL não significa controle da
doença, nem sempre significa cicatrização das lesões ou normalização da acidez
intraesofágica. Muitos pacientes com EBL têm pouco ou nenhum sintoma devido
à alteração da sensibilidade esofágica pela presença do epitélio metaplásico,
vários são idosos, frequentemente menos sintomáticos. A recidiva é frequente
na interrupção do tratamento devido à gravidade das alterações funcionais,(5)
frequentemente nem percebida pelo paciente. Por estas razões, o paciente em
tratamento clínico deve ser mantido com IBP e ter monitorização pHmétrica
da acidez esofágica na vigência de medicação, objetivando preciso controle
do refluxo.
Os próximos objetivos do tratamento clínico seriam eliminar a mucosa intestinalizada e prevenir a progressão para displasia e câncer.(3) Trabalhos têm
demonstrado que o tratamento clínico não causa regressão do epitélio metaplásico no EBL.(8,9) Em relação à prevenção da progressão do EBL para displasia e
câncer, o assunto é controverso. Estudos não controlados sugerem que os IBPs,
embora possam ter efeito protetor, não eliminam o risco de desenvolvimento
de adenocarcinoma.(10) Outro estudo recente retrospectivo observacional em
pacientes com EBL sugere que o uso de IBPs não previne a evolução para
displasia, porém foi associado com diminuição da incidência de displasia de
alto grau ou adenocarcinoma quando comparado a pacientes que não usavam
tal medicação.(11)
Em resumo, o tratamento clínico deve ser realizado em todos os pacientes
com EBL objetivando redução dos sintomas, cicatrização de lesões e prevenção
das recidivas. Na prática clínica, aos pacientes jovens e à maioria dos portadores
de EBL deve ser oferecida a possibilidade de tratamento cirúrgico, pelo menos
por meio das fundoplicaturas (FP). Os resultados do tratamento cirúrgico são
bons na maioria dos pacientes, porém há referências a piores resultados com
as FP no EBL, com taxa de recorrência elevada a longo prazo.(12)
Há pacientes que não querem ser submetidos ao tratamento cirúrgico, por
receio ou porque estão assintomáticos e podem ser controlados com a medicação. E ainda há outros que teriam elevado risco cirúrgico, tais como idosos
com comorbidades. As perguntas seguintes seriam: 1) O paciente com EBL pode
ser mantido em tratamento clínico? 2) Quando devemos preconizar exclusiva-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
31
Esôfago de Barrett Longo: Quando Tratar Clinicamente?
mente o tratamento clínico para um portador de EBL? 3) Quais os cuidados a
serem tomados? 4) Como realizar a vigilância? As respostas envolvem a conscientização do paciente de que o EBL não regride, mas pode ter controle dos
sintomas e da importância do controle pHmétrico para titulação da dose de
IBP que mantém o paciente em refluxo ácido zero ou com % tempo total de
refluxo < 1,6.(13) Admite-se, embora o assunto seja controverso, que o controle
estreito do refluxo possa reduzir a possibilidade de evolução para displasia
de alto grau, porém o paciente deverá ser mantido em programa de vigilância
como é recomendado pelos consensos vigentes.(1,2) É importante assinalar que
o tratamento clínico envolve uso de IBP ad eternum,(1) além de vigilância e
possíveis controles pHmétricos em períodos a serem definidos. Por outro lado,
sabe-se que o uso prolongado de IBP acompanha-se do risco de fraturas em
idosos, risco de candidíase esofagiana, maior número de infecções respiratórias
e gastroenterites.(13) Tudo isto deve ser avaliado criteriosamente. Além de ser
esclarecido a respeito da sua doença, o paciente deve também ser tranquilizado
em relação à verdadeira incidência de evolução para displasia e câncer, que é
baixa, sem se descuidar a vigilância.
Esôfago de Barrett curto (EBC)
Definido como “a substituição do epitélio escamoso estratificado do esôfago
por epitélio colunar, observado à EDA e confirmado por exame histopatológico,
pelo encontro da metaplasia intestinal, de comprimento < 3 cm”,(1,2) o EBC tem
epidemiologia menos conhecida do que a do EBL. É mais frequente no sexo
masculino, em menor proporção do que no EBL, predomina em indivíduos
brancos e em torno de 10% dos pacientes com sintomas de DRGE, sendo encontrado em 9% a 36% das endoscopias.(14,15) Nem todos os pacientes com EBC
apresentam sintomas típicos de DRGE(16) e a relação com displasia e adenocarcinoma de esôfago é menos clara do que a observada no EBL.(14)
Esôfago de Barrett curto: quando operar?
A avaliação clínica nestes pacientes é imprescindível. Um estudo revelou
que clínica típica de refluxo está presente apenas na metade dos pacientes,(17)
sendo esta também nossa experiência pessoal. O restante dos pacientes se
apresenta com queixas dispépticas ou inespecíficas, sendo o EBC um achado
de endoscopias realizadas na investigação destes sintomas. Esofagite erosiva
32 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Eponina Maria de Oliveira Lemme
pode estar presente já ao diagnóstico em 44% dos pacientes(18) e também pode
ocorrer que o EBC seja diagnosticado após a cicatrização endoscópica desta
alteração, quando o epitélio especializado se torna aparente.
Os pacientes com EBC devem ser tratados de acordo com suas queixas. Pacientes com queixa típica de refluxo são submetidos inicialmente a tratamento
clínico, de maneira semelhante aos portadores de doença do refluxo não erosiva
ou doença erosiva leve, com medidas comportamentais e IBP dose única, por
8-12 semanas(1) e a seguir colocados em manutenção com a dose suficiente para
mantê-los assintomáticos, sendo desejável controle pHmétrico para titulação da
dose do medicamento. Caso o paciente seja mantido em tratamento clínico, ele
deverá seguir o programa de vigilância de acordo com os consensos vigentes.(1,2)
Quando se pensa em indicar cirurgia para portadores de EBC? A literatura
é escassa a esse respeito. Em nosso modo de ver, existem duas formas de se
abordar esta questão.
1) Em relação à DRGE: pacientes mais jovens que apresentam sintomas
típicos de difícil controle com o tratamento, o que é menos comum, portadores
de esofagite erosiva, associada com recidivas frequentes após a cicatrização,
pacientes com hérnias hiatais de médio a grande tamanho, que são os de mais
difícil manuseio pela alta taxa de recidiva sintomática e pacientes que apresentam falha mecânica do esfíncter inferior ao estudo manométrico, seriam
potenciais candidatos ao tratamento cirúrgico. Entretanto, como grupo, sabese que pacientes com EBC têm hérnias hiatais de menor tamanho, geralmente
pressão normal do EEI e exposição ácida normal ou minimamente alterada.(16)
Um estudo realizado em nosso Serviço, que envolveu pacientes com queixas
típicas e pHmetria anormal, demonstrou que a intensidade do refluxo ácido
por pHmetria prolongada foi significativamente menor no EBC do que no EBL,
porém não houve diferença em relação à prevalência das alterações motoras,
tanto no EEI como no corpo esofagiano.(19) Havia hipotensão do EEI em 66%
dos pacientes com EBC X 82% dos pacientes com EBL (p=0,18) e hérnia hiatal
em 84% e 96% respectivamente (p=0,2).
2) Em relação à existência do EBC: sabe-se que a chance de evolução
para displasia e malignização do EBC é pequena, mas existe. Assim sendo, os
pacientes com EBC que estejam em tratamento clínico devem ter a dose de
medicamento titulada por pHmetria e serem conscientizados da necessidade de
permanecer em vigilância de acordo com os consensos atuais.(1,2) Deve ser dada
a opção cirúrgica aos que referem por qualquer motivo dificuldade de seguir
um tratamento clínico rigoroso e com necessidade de controles mais estreitos.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
33
Esôfago de Barrett Longo: Quando Tratar Clinicamente?
As fundoplicaturas (FP) por via laparoscópica têm sido empregadas para o
tratamento cirúrgico da DRGE na atualidade e como procedimento, aboliriam
todas as formas de refluxo, incluindo o refluxo biliar que se admite ter importância na patogenia do EB.(5) Entretanto, são descritos piores resultados com as
FP no EBL, com taxa de recorrência elevada.(12) Csendes e col.(20) apresentaram
recentemente seus resultados a longo prazo com o tratamento cirúrgico do
EBC. Foram 125 pacientes submetidos a três tipos de cirurgias em diferentes
períodos, de 1987 a 2009: 1.“switch” duodenal, vagotomia superseletiva e
procedimento antirrefluxo; 2. gastrectomia parcial, vagotomia e gastrojejunostomia em y de Roux; 3. FP de Nissen por via laparoscópica. Foram realizados
estudos manométrico e pHmétrico antes e após as cirurgias. Os resultados em
relação aos procedimentos foram semelhantes, levando à conclusão de que a
FP laparoscópica parece ser a opção cirúrgica indicada para os pacientes com
EBC, uma vez que é menos invasiva, tem menos efeitos adversos e produz
bons resultados a longo prazo.
Há evidências de que pode haver regressão do EBC com o tratamento cirúrgico por FP: em 4 estudos, constatou-se regressão em 35-60% dos EBC (156
pacientes) com o tratamento cirúrgico por FP, porém a regressão do EBL não
foi observada em qualquer paciente (zero de 92).(21) O estudo de Csendes e
col.(20) também demonstrou regressão do epitélio especializado em 60% dos
pacientes em prazo médio de 49 meses.
Quanto à progressão do EB para displasia ou câncer após o tratamento
cirúrgico da DRGE, o assunto também é controverso, pois envolve estudos
retrospectivos, de diferentes metodologias e nem sempre com número grande
de pacientes. Em uma revisão da literatura inglesa de 11 estudos, havia um total de 346 pacientes com EB seguidos em longo prazo após a FP. Em 7 dos 11
havia registro de câncer, 80% dos quais desenvolvidos dentro de 5 anos após
a FP. Os restantes apresentaram a neoplasia 5-10 anos depois e em todos os
casos havia evidências de recorrência do refluxo. Assim, uma FP funcionante
parece dar proteção à progressão do EB para adenocarcinoma em pacientes
cujo processo não se iniciou antes do procedimento cirúrgico.(22)
Em relação à utilidade do tratamento para prevenção da evolução do EB
para adenocarcinoma, até o momento não há provas convincentes de que a
cirurgia antirrefluxo seja mais eficaz do que o tratamento clínico neste particular
e conclui-se que a cirurgia antirrefluxo não deve ser indicada como procedimento para prevenir o câncer.(2)
34 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Eponina Maria de Oliveira Lemme
Conclusão
O tratamento do EB ainda é controverso, com muitas perguntas e respostas. Parece claro que, seja o tratamento clínico ou cirúrgico, é importante que
esteja assegurado um rígido controle do refluxo. Entretanto, em que prazos e
por quanto tempo esta certificação deve ser feita está para ser determinado. A
vigilância endoscópica seguindo os protocolos preconizados é fundamental,
tanto em pacientes tratados clinicamente como submetidos a FP.(1)
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36 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 3
Esofagite Eosinofílica:
Como Tratar e Prevenir
Recidiva?
Dra. Luciana Dias Moretzsohn
A
esofagite eosinofílica (EEo) é uma condição clínico-patológica que vem
sendo cada vez mais reconhecida na população adulta. De acordo com
o primeiro consenso sobre EEo publicado em 2007, para o diagnóstico
dessa afecção seria necessário o encontro de, no mínimo, 15 eosinófilos por
campo de grande aumento na mucosa esofágica, além da exclusão do diagnóstico de doença por refluxo gastroesofágico (DRGE) através de um estudo
de pHmetria esofágica normal e/ou ausência de melhora dos sintomas com
uso de inibidores de bomba protônica (IBP).(1) Hoje sabemos que o número de
eosinófilos na mucosa esofágica é incapaz de discriminar diferentes doenças
esofágicas. Reconhecemos três grupos de pacientes que apresentam infiltração
eosinofílica esofágica. O primeiro é constituído por portadores de DRGE com
maior infiltrado eosinofílico esofágico, que apresentam uma pHmetria esofágica prolongada anormal e respondem de forma satisfatória ao uso de IBP.
O segundo grupo é composto por indivíduos que têm um estudo pHmétrico
esofágico normal mas também respondem ao uso de IBP. Até o momento não
sabemos se esse grupo é constituído por portadores de DRGE com resultados
falsos-negativos de estudos de pHmetria ou se sua resposta terapêutica deve-se
à ação anti-inflamatória dos IBP.(2,3) O terceiro grupo é representado, de acordo
com recente revisão de consenso, pelos portadores de EEo. Esses pacientes
têm sintomas esofágicos, inflamação eosinofílica restrita à mucosa esofágica e
ausência de resposta ao uso de IBP.(4)
A Gastroenterologia na Prática Clínica
37
Esofagite Eosinofílica: Como Tratar e Prevenir Recidiva?
Na prática médica, o diagnóstico da EEo é cogitado em pacientes com sintomas esofágicos e/ou digestivos altos, cuja esofagogastroduodenoscopia evidencia alterações no esôfago sugestivas (estrias longitudinais, anéis concêntricos,
pontilhado branco, dentre outros) e estudo histopatológico da mucosa do órgão
identifica infiltração eosinofílica. Dessa forma, somente após o tratamento com
IBP podemos diagnosticar esses pacientes como portadores de EEo (ausência de
resposta ao uso de IBP) ou de eosinofilia esofágica responsiva ao uso de IBP.(4)
Tratamento da eosinofilia esofágica
Inibidores de bomba protônica
A primeira abordagem nos pacientes com eosinofilia esofágica consiste no
uso de IBP duas vezes ao dia por oito a 12 semanas. Ausência de resposta ao
uso dessas drogas é necessária para o diagnóstico de EEo como descrito anteriormente. Esses antissecretores são úteis no tratamento tanto de portadores
de DRGE com eosinofilia esofágica como também podem auxiliar no alívio
de sintomas relacionados à DRGE secundária a EEo.(5) Em caso de resposta ao
uso de IBP, devemos considerar o uso por tempo prolongado da menor dose
dessas drogas que mantenham o paciente assintomático.
Avaliação alérgica e terapia dietética
Vários estudos mostram que grande número de adultos com EEo apresentam
sensibilização a alérgenos alimentares e/ou ambientais, demonstrados através
de testes cutâneos e/ou avaliação de IgE específica.
A prevalência de adultos portadores de eosinofilia esofágica com alergia
respiratória ou cutânea como asma, rinite e eczema é alta. Variação sazonal
relacionada com surgimento ou recrudescência da doença é também observada, sendo mais comum no verão e outono.(6,7) De acordo com esses dados,
justifica-se uma avaliação de sensibilização a aeroalérgenos nesses pacientes,
o que pode alterar a abordagem clínica nesses casos.(4)
Testes cutâneos e avaliação de IgE específica podem orientar a identificação
de alimentos associados a EEo. Entretanto, um teste positivo é insuficiente para
diagnosticar uma alergia alimentar como causadora da EEo. Até o momento,
um alimento só pode ser relacionado a essa afecção quando há melhora clínica
e histológica com sua eliminação da dieta e recidiva com sua reintrodução.(4)
Em crianças, a terapia dietética mostra-se muito eficaz, levando à remissão
da clínica e histológica da EEo e talvez também da fibrose esofágica. A restrição
38 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Luciana Dias Moretzsohn
alimentar pode ser baseada em testes alérgicos ou na eliminação de antígenos
alimentares mais prováveis. Evidências sugerem que é improvável o desenvolvimento de tolerância a alimentos associados com a EEo. Dessa forma, esses
alimentos, uma vez identificados, devem ser retirados da dieta definitivamente.(8,9)
Em adultos motivados, a terapia dietética pode ser instituída, sendo importante avaliar o estilo de vida do paciente e sua aderência. Nesses casos,
é prudente uma avaliação com nutricionista para evitar carências nutricionais
decorrentes da restrição alimentar. Alimentos que sabidamente predispõem à
EEo em determinado indivíduo devem ser abolidos definitivamente da dieta. Já
aqueles apenas suspeitos podem ser reintroduzidos de forma sistemática, com
monitorização da recidiva da doença.(4)
Corticoides
O uso de corticoides é capaz de melhorar aspectos clínico-patológicos da
maioria dos pacientes com EEo. O uso de corticoides sistêmicos restringe-se a
pacientes com disfagia muito grave, desnutridos ou que necessitem de internação hospitalar. Os efeitos colaterais dessas drogas contraindicam seu uso por
tempo prolongado.(10)
Os corticoides tópicos são efetivos na remissão da EEo na maioria dos casos e
parecem ser seguros, exceto pelo risco de infecção fúngica no esôfago. Entretanto,
é descrita a resistência a essas drogas em alguns indivíduos, caracterizada por
ausência de resposta histológica e de modificação de expressão de gene esofágico
local.(11) A fluticasona (440-880 µg bid) e mais recentemente a budesonida viscosa
(2 mg bid) mostraram-se eficazes no tratamento da EEo. O uso da fluticasona
associa-se com melhora clínica em quatro semanas e resolução histológica ocorre
em 75% dos pacientes. A budesonida, segundo estudo de Straumann et al.,(12)
mostrou-se muito eficiente no tratamento de adultos com EEo, bem como no
controle de marcadores inflamatórios, o que poderia reverter a fibrose esofágica
e prevenir a remodelação do órgão. A duração do tratamento não é bem definida
e depende da gravidade da doença, estilo de vida e aderência do paciente.(4)
Outras drogas
O uso do cromoglicato de sódio não traz nenhum benefício aparente no
tratamento da EEo. Os antagonistas do receptor de leucotrieno, quando usados
em altas doses podem trazer um alívio sintomático, mas sem efeito significativo
sobre a eosinofilia esofágica. Único estudo publicado não mostrou benefício do
uso de drogas antifator de necrose tumoral (anti-TNFα) em pacientes com EEo.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
39
Esofagite Eosinofílica: Como Tratar e Prevenir Recidiva?
Avaliados em pequenos estudos, os antagonistas de interleucina-5 mostraram-se
úteis no controle da infiltração eosinofílica no esôfago e de fatores associados
à remodelação do órgão, porém com resposta clínica variável.
De acordo com recomendações de consenso, cromoglicato de sódio, imunossupressores, como aziotioprina e 6-mercaptopurina, bem como agentes
biológicos não são indicados no tratamento da Eeo.(4)
Acompanhamento da eosinofilia esofágica
A maioria dos estudos que abordam o tratamento da EEo utiliza a melhora
sintomática como critério de boa resposta. Entretanto, está claro que a resposta
clínica não guarda relação com melhora endoscópica e/ou histológica.(13) Esse
achado pode ter várias explicações como a intermitência do sintoma de disfagia e
a limitação endoscópica ao avaliar estenoses fibróticas em esôfagos difusamente
estreitados. A resposta histológica também não é bem definida: deve basear-se
apenas na diminuição do número de eosinófilos da mucosa esofágica, na sua
ausência, na normalização da zona basal do órgão?(14)
Como a persistência do processo inflamatório do esôfago é determinante
no processo de remodelação do órgão, é importante o controle endoscópico e
histológico de pacientes com EEo. Até o momento, não está definido o intervalo
de realização desses exames.
A interrupção do uso de corticoides em portadores de EEo associa-se com
alta taxa de recidiva de sintomas em período de três a 18 meses em média.(1)
Dessa forma, revisão de consenso recente sugere que após indução da remissão da EEo deva ser instituída terapia de manutenção individualizada.(4) Até o
momento, não há definição sobre tratamento de manutenção a longo prazo. O
uso de menor dose de corticoide tópico ou reintrodução da droga obedecendo
variação sazonal da doença são algumas opções. Estudo de Straumann et al.(15)
utilizando budesonida 0,25 mg duas vezes ao dia como terapia de manutenção
mostrou controle da inflamação eosinofílica em 50% dos casos, remissão histológica parcial ou total, discreta melhora do espessamento esofágico e controle
inadequado de marcadores de lesão tissular (citocinas, células apoptóticas e
inflamatórias). A recidiva dos sintomas ocorreu em 125 no grupo tratado e em
95 dias no grupo placebo. O uso de montelucaste (antagonista de receptor de
leucotrieno) foi inefetivo como terapia de manutenção em portadores de EEo
em remissão completa após uso de corticoides.(16) A figura 1 ilustra fluxograma
sugerido na condução de pacientes com eosinofilia esofágica.
40 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Luciana Dias Moretzsohn
Figura 1. Fluxograma sugerido na abordagem da eosinofilia esofágica
Diagnóstico de eosinofilia esofágica
IBP duas vezes ao dia, 8-12 semanas
IBP duas vezes ao dia, 8-12 semanas
Sem melhora = EEo
- Excluir alérgeno evidente
- Corticoide tópico (6-12 semanas)
Titular menor dose eficaz
Melhora clínica e histológica
Tratamento manutenção:
- Menor dose corticoide?
- Reintrodução sazonal?
- Controle endoscópico:
• Intervalo?
Sem melhora
-Antagonista de interleucina 5?
-Dilatação endoscópica?
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42 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 4
DRGE: O que Fazer
Quando o IBP Falha?
Dr. Sérgio G. S. de Barros
Dr. Antonio B. Lopes
Definição de “falha ao IBP”
P
acientes com pirose/ou regurgitação após tratamento com medidas
gerais e IBPs têm melhora sintomática após quatro semanas, mas esta
pode ser parcial ou até ausente. Quando a melhora não é satisfatória,
na prática cínica recomenda-se aumentar a prescrição de IBP para dose dupla,
diária, por um período adicional de quatro semanas.
A insatisfação persistente do paciente após a 8ª semana com IBPs é considerada como “falha terapêutica” pela maioria dos autores e ocorre em até 10
a 40% dos casos.
Conduta
Os seguintes pontos devem ser considerados, antes de prosseguir à investigação diagnóstica complementar:
1. DRGE está presente?
Os sintomas bem estabelecidos para DRGE e preditivos de boa resposta
terapêutica são a pirose, que é “sensação de ardência irradiando-se à base do
pescoço” repetitiva, pelo menos uma vez por semana, durante várias semanas.
Regurgitação de alimentos também é aceita como indicativo de diagnóstico e
tratamento da DRGE. Lembre que sintomas atípicos como tosse, rouquidão,
A Gastroenterologia na Prática Clínica
43
DRGE: O que Fazer Quando o IBP Falha?
broncoespasmo ou sintomas recorrentes como dor de garganta (faringites), rinorreia (rinossinusites) e/ou dor de ouvido (otites médias) não
acompanhados por pirose e/ou regurgitação concomitante não têm indicação
de tratamento com IBPs, exceto quando houver evidência de refluxo gastroesofágico à endoscopia e/ou à pHmetria/impedanciometria.
2. Há aderência (regularidade) e a tomada do IBP em horário correto?
Aderência: É surpreendente, mas a manutenção dos IBPs de forma regular e
diária durante as primeiras quatro semanas, como é recomendável, ocorre em
apenas 50% dos pacientes entrevistados em estudos populacionais com grande
número de indivíduos. As razões apontadas para tal são a variação semanal na
intensidade dos sintomas, quando muitos pacientes suspendem, temporariamente, a medicação e só a reintroduzem quando a pirose retorna. O sabor e
a consistência dos comprimidos, o preço da medicação e os efeitos colaterais
também são apontados pelos pacientes. É comum, também, a descrição de uso
irregular, concomitante ou em substituição aos IBPs, de outras medicações não
prescritas pelos médicos, tais como antiácidos, cimetidina, ranitidina e chás que
podem prejudicar a absorção e efeito dos IBPs.
Horário: O melhor controle do pH intragástrico e do refluxo é alcançado
pela ingestão de IBP antes do desjejum matinal; entretanto, contrariando essa
recomendação, mais de 50% dos pacientes relatam a tomada de IBPs durante
o dia ou à noite, antes de dormir, como relatado em estudos populacionais.
3. Há elevação da cabeceira do leito e modificação na dieta?
A elevação da cabeceira do leito é uma medida simples que contribui ao
controle do refluxo gastroesofágico. As almofadas antirrefluxo (não travesseiros
duplos que deslizam durante a noite) estão amplamente disponíveis no comércio e substituem o uso de tijolos ou outros, para elevação dos pés da cama.
Reforce o fracionamento das refeições, a diminuição das frituras, gorduras, café
e estimule a perda de peso gradual e sustentada.
4. Há sintomas de depressão ou ansiedade presentes?
Considere a prescrição de antidepressivos tricíclicos ou tetracíclicos (trazodona) e/ou avaliação psicológica.
5. Troque o tipo de IBP
Além das medidas acima, troque o tipo de IBP e insista por mais quatro-
44 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Sérgio G. S. de Barros • Dr. Antonio B. Lopes
oito semanas com o tratamento, pois tolerância metabólica seletiva a alguns
IBPs tem sido demonstrada. Medicações genéricas podem ser usadas, pois o
controle farmacêutico tem se tornado mais confiável no país, inclusive para os
IBPs. Entretanto, medicações manipuladas em farmácias não possuem o mesmo
grau de confiabilidade.
Investigação diagnóstica
A persistência de sintomas após observação dos pontos acima descritos leva
à recomendação de investigação diagnóstica complementar para confirmação
ou exclusão de DRGE.
A. Endoscopia digestiva alta
O III Consenso Brasileiro em DRGE recomenda iniciar a investigação com
endoscopia digestiva alta (EDA) pela grande disponibilidade e o relativo baixo
custo desse exame no Brasil. Quando a mucosa é normal à endoscopia, bíópsias devem ser obtidas no esôfago distal, 5 cm acima da linha “Z”. Quando,
além da “falha aos IBPs” houver disfagia e/ou impactação alimentar associada,
esofagite eosinofílica pode estar presente e o seu diagnóstico só será estabelecido através de múltiplas biópsias (> 5) nos terços proximal, médio e distal
do esôfago. Essa entidade é comum em crianças, mas tem sido, crescentemente,
descrita em adultos. A endoscopia contribui ao diagnóstico em menos de 40%
dos pacientes investigados.
B. pHmetria esofágica prolongada
A investigação em pacientes recebendo IBPs em dose dupla com “falha”
após exame endoscópico “normal” deve ser seguida por pHmetria esofágica
prolongada (24 h), pois a persistência de refluxo ácido pode ser demonstrada em até 10 a 15% desses indivíduos após EDA normal. Em indivíduos com
sintomas atípicos (tosse, rouquidão, broncoespasmo ou sintomas recorrentes
como dor de garganta (faringites), rinorreia (rinossinusites) e/ou dor de ouvido ou erosões de esmalte dentário, sem pirose e/ou regurgitação evidentes, a
pHmetria esofágica prolongada deve ser obtida. Esse exame é, crescentemente,
disponível e muito útil para o diagnóstico de DRGE. Para identificar refluxo,
o exame pode ser realizado, preferencialmente, sem IBP e é, particularmente,
útil quando o índice de sintomas é positivo, isto é, correlação de sintomas com
episódios de refluxo em mais de 50%.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
45
DRGE: O que Fazer Quando o IBP Falha?
A hiperacidez gástrica noturna, isto é, o denominado rebote ácido noturno (RAN) pH gástrico < 4 por 1 hora ou mais pode ser detectada pela simples
adição de um sensor gástrico ao exame esofágico convencional. O RAN, teoricamente, pode originar refluxo noturno com dano à mucosa esofágica, pois
à noite há redução da proteção das deglutições e da saliva. A importância na
prática clínica na detecção de RAN tem sido questionada pela baixa correlação
com a pirose diurna ou noturna.
C. Impedancio-pHmetria
Sabemos que a pHmetria convencional permite o diagnóstico laboratorial,
clássico, de refluxo gastroesofágico, quando o pH esofágico permanece < 4 por
períodos prolongados, mas muitos pacientes com “falha ao IBP” têm sintomas
com pH esofágico acima de 4!
A impedancio-pHmetria pode detectar refluxo gastroesofágico “fracamente
ácido” (pH > 4) ou até levemente alcalino (pH > 7) ou, ainda, com refluxo
gasoso. Novamente, como no exame convencional, tem grande valor diagnóstico e terapêutico quando o índice de sintomas é positivo.
A impedancio-pHmetria ainda tem custo elevado, e ainda é restrita a alguns
centros, mas deverá substituir o exame pHmétrico convencional em pacientes
com “falha aos IBPs”, pois tem maior sensibilidade que o exame convencional.
Tratamento
IBPs em doses acima da “dupla dose” não são recomendáveis mesmo
quando há “falha”, pois não há evidência de benefício no controle de sintomas.
O benefício de bloqueadores H2 da histamina do tipo ranitidina é controvertido em dose única noturna, pois há relato de rápida tolerância com perda do
bloqueio do refluxo ácido noturno. Há um estudo que demonstra melhora de
sintomas e também da qualidade do sono.
Baclofeno em doses mais elevadas de até 20 mg repetidas em três doses diárias melhora sintomas de refluxo e diminui episódios de refluxo gastroesofágico,
mas pode induzir efeitos colaterais como sonolência e confusão quando usado.
O baclofeno tem sido adicionado, empiricamente, aos IBPs, em doses crescentes
até o controle da pirose ou indução de efeitos colaterais. É droga disponível no
mercado com baixo custo e, largamente, utilizada pelos neurologistas por sua
ação em receptores gabaérgicos do sistema nervoso. O efeito dessa classe de
fármacos é promissor, com a sua ação na DRGE ocorrendo na diminuição dos
46 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Sérgio G. S. de Barros • Dr. Antonio B. Lopes
relaxamentos transitórios do esfíncter esofágico inferior (ReTEEI). Há pesquisa
e desenvolvimento de novos fármacos com ação seletiva no ReTTEI, mas sem
os efeitos colaterais do baclofeno.
O efeito modulador na sensibilidade visceral (além do efeito no humor) dos
antidepressivos tricíclicos (ex.:amitriptilina) e tetracíclicos (ex.: trazodona)
e inibidores da recaptação da serotonina tem sido utilizado, empiricamente,
Figura 1. Algoritmo de manejo de pacientes com falha a inibidores
de bombas de prótons (IBP) 1x/dia.
Algoritmo de tratamento
Sintomas de
alarme
IBP 1x/dia por
4 semanas
Endoscopia
digestiva alta
Sintomas
Sintomas
Troque de IBP
(1x/dia por 4 semanas)
Falha*
Tratar lesões
mucosas
Revise aderência, dose de
IBP e horário de uso
Sintomas
IBP 2x/dia (manhã e noite)
por mais 4 semanas
Locais sem acesso à impedanciopHmetria
Falha*
Impedancio-pHmetria
Tratamento empírico
RGE fracamente
ácido
Negativa
Sintoma
predominante
Regurgitação
Pirose
RGE ácido
Amitriptilina
REVISE
Aderência, dose de
IBP, horário de uso
antirrefluxo
Negativo
Baclofeno, amitriptilina
cirurgia antirrefluxo
Bloqueador H2
noturno
Falha*
Amitriptilina
Bloqueador H2 noturno
Cirurgia antirrefluxo
* parcial ou completa.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
47
DRGE: O que Fazer Quando o IBP Falha?
em pacientes com “falha aos IBPs”. Quando há a presença de dor torácica não
cardíaca associada com DRGE os resultados têm sido satisfatórios com baixas
doses. O mais usado em nosso meio é a amitriptilina, que é bem tolerada,
em baixas doses (25 mg/dia), mas pode induzir boca seca e constipação, especialmente em pacientes idosos. A modulação na sensibilidade visceral tem
sido demonstrada também com acupuntura recentemente em pacientes com
“falha ao IBP” com resposta satisfatória nos sintomas.
A cirurgia antirrefluxo do tipo fundoplicatura é satisfatória quando há
regurgitação associada à pirose, presença de hérnia hiatal deslizante com ou
sem hipotonia do esfíncter esofágico inferior e boa resposta aos IBPs e medidas
gerais. Entretanto, em pacientes com essas características e “falha aos IBPs”, os
relatos recentes de resultados satisfatórios nos sintomas não foram obtidos em
estudos controlados. A indicação de cirurgia deve ser criteriosa, que mesmo
descartando pirose “funcional”, alterações emocionais psiquiátricas são comuns
nestes indivíduos.
A maioria (> 50%) dos pacientes com pirose após investigação diagnóstica
não apresenta qualquer tipo de refluxo e o esôfago é normal à endoscopia com
biópsias. Esses indivíduos são denominados como portando “pirose funcional”
e constituem um grande desafio na prática clínica (figura 1).
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48 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Jaime Natan Eisig
Capítulo 5
O Uso Prolongado de IBP
é Realmente Seguro?
Dr. Jaime Natan Eisig
O
s inibidores de bomba de prótons (IBPs) estão entre os medicamentos mais prescritos no mundo, por serem seguros e efetivos, porém
como qualquer outra droga podem ocasionar eventos adversos.(1,2) São
várias as dúvidas sobre o potencial das complicações do uso crônico dessas
drogas, particularmente no que diz respeito aos possíveis efeitos danosos da
hipocloridria prolongada decorrente do bloqueio intenso e sustentado da acidez,
da hipergastrinemia, com consequente hiperplasia das células enterocromafins
símile e risco de carcinoide e das possíveis interações medicamentosas.(3)
A hipocloridria persistente decorrente da gastrite atrófica ou da supressão
ácida, em indivíduos não infectados pelo Helicobacter pylori poderia aumentar
o risco de maior colonização bacteriana do estômago e do delgado, com consequente aumento de nitrosaminas e radicais livres no conteúdo gástrico, favorecendo eventualmente um risco maior do desenvolvimento de câncer gástrico.
Em indivíduos infectados pelo Helicobacter pylori, a migração da bactéria do
antro para o corpo provoca um processo inflamatório ativo, e com o decorrer
dos anos leva a uma gastrite atrófica multifocal, metaplasia intestinal, displasia
e câncer do estômago.
A interação medicamentosa do IBP com outras drogas cujo metabolismo
segue a cadeia do citocromo P450 pode, na realidade, ocorrer. O omeprazol
pode interagir com diazepam, fenitoína e varfarina, ao passo que o rabeprazol
e o pantoprazol não interagem com essas drogas. Devemos lembrar que todos
os IBPs interferem em medicamentos cuja absorção é dependente do pH, como
nos casos dos cetoconazóis e digoxina.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
49
O Uso Prolongado de IBP é Realmente Seguro?
Outros riscos do uso do IBP a longo prazo que são motivo de discussão
devem ser mencionados.
Infecções entéricas
Embora vários estudos tenham sugerido que uma maior supressão de ácido
estaria associada a um risco maior de infecções intestinais, elas ainda são inconsistentes. Uma meta-análise mostrou que o uso de IBP estaria relacionado
com um aumento 2-3 vezes maior de uma infecção intestinal pelo Clostridium
difficile(4); entretanto, o papel do IBP na patogênese dessa doença é controverso
e os mecanismos pelos quais a supressão do ácido poderia promover a infecção
pelo Clostridium difficile não estão esclarecidos.
Osteoporose
A supressão ácida pode reduzir a absorção de cálcio e vitamina B12.(5-9)
Diversos estudos epidemiológicos têm associado o uso prolongado de IBP com
risco de fraturas ósseas, inclusive, demonstrando que quanto maior o tempo
de uso, maior o risco.(10) Porém, outros trabalhos não mostraram os mesmos
resultados, quando outros fatores de risco para osteoporose eram controlados.
Nefrite intersticial aguda
Desde 1992, quando foi relatada pela primeira vez a nefrite intersticial aguda
induzida por omeprazol, vários trabalhos de meta-análise têm sido publicados,
indicando o uso dessa classe de medicamentos como uma das causas mais
comuns de nefrite intersticial aguda,(11,12) porém chamando a atenção de que
novos estudos controlados devem ser realizados para confirmar essa associação.
Pneumonia
Embora vários trabalhos relacionem o uso prolongado de IBP como fator de
risco para pneumonia adquirida pela comunidade, outros estudos não mostram
esse resultado. De modo geral, evidências epidemiológicas em relação à associação do uso de IBP e pneumonia são extremamente controversas.
Magnésio
Nos últimos anos, vários casos de hipomagnesemia associados com uso
prolongado de IBP, quando comparados com indivíduos sem uso ou que estão
em uso há pouco tempo, têm sido relatados,(13) sugerindo-se a monitorização
desses pacientes. O mecanismo dessa ocorrência ainda é pouco compreendido.
50 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Jaime Natan Eisig
Clopidogrel
O uso concomitante de clopidogrel e IBP é bastante comum na clínica. A
preocupação que existe é a respeito da competição entre essas drogas, para
a mesma via metabólica (P450), seja para o metabolismo e degradação, bem
como para ativação da biotransformação necessária à ação antiplaquetária do
clopidogrel.(14,15) Estudos clínicos controlados, prospectivos, longitudinais, são
ainda necessários para confirmar a relevância da interação medicamentosa entre
essas duas classes de medicamentos.
Conclusão
A descoberta dos IBPs revolucionou o tratamento e o prognóstico das doenças
ácido-pépticas, proporcionando ótimos resultados em pacientes com doença do
refluxo gastroesofágico, úlcera péptica e gastropatias por anti-inflamatórios não
esteroidais. Embora essas drogas estejam associadas a vários efeitos adversos,
quase todos os estudos apresentados são observacionais, suscetíveis a viés.
É importante lembrar que todas as drogas podem acarretar riscos, e os IBPs
não devem ser consideradas como nocivas ao paciente.
Vários trabalhos da literatura, em que pacientes foram acompanhados por
tempo prolongado, inclusive crianças, confirmam que os IBPs são drogas extremamente seguras, podendo ser mantidas naqueles pacientes que necessitam
dessa indicação e que certamente se beneficiarão do uso dessa droga.
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52 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 6
Dispepsia Funcional e
Helicobacter pylori:
Sempre Erradicar a
Bactéria?
Dr. Luiz Edmundo Mazzoleni
S
intomas dispépticos de dor ou desconforto na região epigástrica afetam
de 15 a 40% da população adulta dos países ocidentais e são responsáveis
por até 8% das consultas em nível de assistência primária de saúde. Os
custos da dispepsia para a sociedade são substanciais. A maioria dos pacientes
dispépticos não apresenta anormalidades anatômicas ou bioquímicas que justifiquem os sintomas e são classificados como portadores de dispepsia funcional (DF) ou dispepsia não ulcerosa. A fisiopatologia da dispepsia funcional é
complexa e envolve alterações na motilidade gastroduodenal, na sensibilidade
visceral, na suscetibilidade genética, em fatores psicossociais e potencialmente nas alterações gástricas causadas pela infecção pelo Helicobacter pylori
(H. pylori). A descoberta dessa bactéria rendeu o Prêmio Nobel de Medicina de
2005 para os dois médicos australianos que a identificaram. Pelo menos 50% da
população mundial é portadora dessa infecção. A bactéria está inequivocamente
associada com úlceras pépticas e tem participação definida no desenvolvimento
do câncer gástrico. Entretanto, persistem dúvidas sobre o papel do H. pylori
como causa dos sintomas da dispepsia funcional.
Dispepsia não investigada e dispepsia funcional
Estudo de base populacional avaliou a prevalência de dispepsia não investigada no Brasil (quadro 1).(1) A prevalência de sintomas dispépticos, segundo
os critérios Roma III, foi de 40,9%.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
53
Dispepsia Funcional e Helicobacter pylori: Sempre Erradicar a Bactéria?
Quadro 1. Prevalência da dispepsia no Brasil
Dispepsia Não Investigada:
Estudo Epidemiológico Brasileiro
- Estudo de base populacional em 223 cidades brasileiras
- 51% população (16 e 65 anos) = 83,5 milhões pessoas
- Entrevista telefônica: questionário Roma III para dispepsia
RESULTADOS:
- Entrevistadas 1.510 pessoas
- Idade média 37,6 anos
- Prevalência da dispepsia: 40,9%
Fonte: Sander, G.B, Francesconi, C.F, Mazzoleni, L.E, Lopes, M.H.I. Gut 2007; 56 (Suppl III) A195.
Estudos de pacientes dispépticos têm demonstrado que apenas cerca de
30% apresentam anormalidades orgânicas definidas que possam explicar os
sintomas.(2) Pesquisa do Rio Grande do Sul(3) realizou endoscopia digestiva alta
em 842 pacientes adultos dispépticos da comunidade, sem sintomas ou sinais
“de alarme” sugestivos de doenças orgânicas e sem sintomas sugestivos de
doença do refluxo gastroesofágico. Os achados endoscópicos nos 842 pacientes dispépticos estão apresentados na tabela 1. Resultados semelhantes foram
encontrados em estudo realizado no Canadá.(4) O quadro 2 mostra a relevância
da dispepsia funcional H. pylori positiva.
Dispepsia funcional e Helicobacter pylori
Fisiopatologia da dispepsia funcional em portadores do H. Pylori
Embora vários potenciais mecanismos patogênicos possam ligar a infecção
pelo H. pylori com a dispepsia funcional, ainda não foi estabelecida uma clara
Tabela 1. Achados endoscópicos em 842 dispépticos
Úlcera péptica:
39 (4,6%)
Neoplasia gástrica:
5 (0,6%)
Esofagite péptica:
150 (18%)
Outros:
6 (0,7%)
Dispepsia funcional (DF):
642 (76%)
H. pylori positivos (com DF):
424 (66%)
Fonte: Mazzoleni LE e cols. Archives of Internal Medicine (no prelo).
54 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Luiz Edmundo Mazzoleni
Quadro 2. Importância da dispepsia funcional H. pylori positiva
Dispepsia funcional H. pylori positiva
Importância no Brasil
Dispepsia Não Investigada: 40,9%


Dispepsia Funcional: 76% de 40,9% = 31%
Dispepsia Funcional H. pylori +: 66% de 31%
= 20% da população
relação entre as alterações gástricas causadas pela bactéria e a presença de
sintomas dispépticos. O primeiro mecanismo potencialmente envolvido seria
o processo inflamatório provocado pela infecção, mas não está provado que
gastrite seja causa dos sintomas na dispepsia funcional. O segundo mecanismo
seria por disfunção da atividade muscular do estômago, mas estudos não têm
demonstrado associação consistente entre o H. pylori e anormalidades motoras
gástricas. Outro mecanismo seria através da diminuição do limiar da sensibilidade gástrica pela infecção. Entretanto, não têm sido encontradas diferenças na
sensibilidade gástrica em dispépticos H. pylori positivos e negativos. Portanto,
permanece controversa a participação de mecanismos patogênicos relacionados
com a infecção pelo H. pylori, na etiologia dos sintomas da dispepsia funcional.
Relação entre dispepsia funcional e o H. pylori
Para avaliar o papel da bactéria na DF podem ser utilizados estudos de prevalência ou ensaios clínicos randomizados que tenham avaliado os efeitos
da erradicação do H. pylori nos sintomas da dispepsia funcional.
Estudos de prevalência
Holtmann e colaboradores demonstraram maior prevalência do H. pylori
entre pacientes com DF do que entre controles.(5) Bazzoli e colaboradores
demonstraram, em 1.533 indivíduos, prevalência do H. pylori em 72% dos dispépticos e em 64% de controles assintomáticos (p<0,005), mas faltaram informações endoscópicas dessa população.(6) Entretanto, esses resultados têm sido
refutados por estudos bem desenhados metodologicamente. Pesquisa no Japão
evidenciou DF em 14,1% dos indivíduos estudados, não tendo sido constatada
A Gastroenterologia na Prática Clínica
55
Dispepsia Funcional e Helicobacter pylori: Sempre Erradicar a Bactéria?
nenhuma relação entre H. pylori e sintomas dispépticos funcionais.(7) Portanto,
os estudos de prevalência não conseguiram definir se a infecção pelo H. pylori
está associada com maior probabilidade de desenvolvimento de DF.
Ensaios clínicos, meta-análises, consensos
Persistem dúvidas sobre os efeitos da erradicação da infecção pelo H. pylori
nos sintomas da DF. Falhas metodológicas nos estudos que avaliaram essa questão têm sido apontadas como a principal causa das dúvidas. Quatro grandes
estudos tiveram resultados divergentes.(8-11) Seus dados, com apenas uma exceção,(10) sugeriram ausência de benefício com a erradicação do H. pylori na DF.
Outro ensaio clínico com 800 pacientes demonstrou que a resolução dos
sintomas foi maior nos pacientes que erradicaram o H. pylori (44% vs. 35%;
p=0,036).(12) Portanto, grandes estudos sobre esse tema apresentaram resultados
contraditórios.
Os principais Consensos de Especialistas também não têm fornecido indicações definidas para os clínicos. E a última Cochrane Review(13) sobre a erradicação do H. pylori na dispepsia funcional incluiu 21 ensaios clínicos para a
revisão sistemática, sendo que um desses foi realizado no Brasil.(14) Essa revisão
observou redução do risco relativo de 10% no grupo que recebeu antibióticos
(95% IC = 5% a 14%), e o NNT (número de pacientes que deve ser tratado para
um ter benefício) foi de 14 (95% IC = 10% a 25%).
Estudo brasileiro com mais de 400 pacientes dispépticos funcionais H. pylori
positivos que receberam o esquema tríplice (omeprazol + amoxicilina + claritromicina; Omepramix® Aché Laboratórios Farmacêuticos SA) ou omeprazol + placebos
dos antibióticos(3) demonstrou benefício sintomático estatisticamente significativo
(p=0,014) no grupo que usou antibióticos, com NNT de 8. Os resultados desse
estudo vêm reforçar a indicação de erradicar a bactéria na dispepsia funcional.
Conclusões e recomendações
Não existem definições absolutas sobre a melhor conduta no tratamento de
pacientes dispépticos funcionais H. pylori positivos. A dispepsia funcional é uma
doença com múltiplos mecanismos fisiopatogenéticos envolvidos e, certamente,
a erradicação do H. pylori não será a solução para os sintomas em todos os
pacientes. Se algum benefício pode ser obtido com a erradicação, ele deve ser
restrito a um subgrupo de dispépticos funcionais.
56 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Luiz Edmundo Mazzoleni
Apesar de todas essas controvérsias, muitos autores têm indicado a erradicação do H. pylori na dispepsia funcional acreditando que, mesmo que os
benefícios sejam discretos, seriam suficientes para justificar a erradicação. Essa
opinião, com a qual o autor dessa revisão concorda, estaria justificada tendo
em vista que tratamentos anti-H. pylori são de curta duração, com custos relativamente baixos e com potencial de reduzir o risco de úlceras pépticas e câncer
gástrico. E o desenvolvimento da doença do refluxo gastroesofágico, que seria
o principal risco associado com a erradicação, parece ser pouco importante no
nosso meio.(15) Por outro lado, os medicamentos para o tratamento da dispepsia
funcional são paliativos, indicados para uso a longo prazo, onerosos e com
apenas discretos benefícios no alívio sintomático. Por exemplo, o maior estudo
que avaliou o benefício dos IBPs na dispepsia funcional encontrou benefício em
38% dos pacientes que usaram IBPs vs. 28% nos que usaram placebo,(16) com
benefícios apenas no subgrupo “tipo dor epigástrica” (SDE) e não no subgrupo
“tipo desconforto pós-prandial” (SDPP). Portanto, o tratamento com IBP mostrou
benefício semelhante (ou inferior) ao que pode ser obtido com tratamento de
curto prazo (7 a 10 dias) com a erradicação do H. pylori. Finalizando, embora
com limitada eficácia, a erradicação do H. pylori pode ser uma boa opção terapêutica para essa doença sem tratamentos definitivos.
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A Gastroenterologia na Prática Clínica
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58 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 7
Pólipos Gástricos
Dra. Munique Kurtz
Dr. Matheus Azevedo C. Freitas
Dr. Decio Chinzon
P
ólipos gástricos são lesões que se originam no epitélio ou submucosa, sésseis ou pediculadas e projetam-se para o lúmen do estômago.
Em geral, são detectados em cerca de 2% dos exames endoscópicos.
A endoscopia digestiva alta (EDA) é o principal método diagnóstico, que
na grande maioria dos pacientes (> 90%) são achados incidentais ao exame.(2)
A definição histopatológica não é possível ao exame macroscópico (apesar da
aparência endoscópica sugerir um subtipo específico), necessitando-se do auxílio
do patologista, uma vez que o resultado da biópsia influenciará a conduta a ser
adotada. Portanto, todos os pólipos gástricos devem biopsiados.
Classificação
Sob o ponto de vista histológico, os pólipos gástricos podem ser classificados
em epiteliais e não epiteliais (tabela 1).
Alguns pólipos são expressão de uma doença genética e podem também
indicar um aumento do risco de malignidade gastrointestinal ou mesmo extraintestinal.
Quando sintomáticos podem apresentar: plenitude pós-prandial, saciedade
precoce, sangramento digestivo, anemia, dor abdominal e obstrução gástrica
(lesões volumosas). Quando encontramos vários pólipos gástricos em um mesmo
exame, estes são geralmente do mesmo tipo histológico.
A frequência de pólipos gástricos e os tipos mais comumente encontrados
A Gastroenterologia na Prática Clínica
59
Pólipos Gástricos
Tabela 1. Classificação dos pólipos gástricos
Pólipos epiteliais
• Pólipos de glândulas fúndicas
• Pólipos hiperplásicos
• Pólipos adenomatosos
• Pólipos hamartomatosos
Pólipo juvenil
• Síndrome de Peutz-Jegher
• Síndrome de Cowden
• Síndromes Polipoides
Polipose Juvenil
• Síndrome Adenomatosa Familiar
Pólipos não epiteliais
• Tumores estromais
• Leiomioma
• Pólipo inflamatório fibroide
• Fibroma e fibroadenoma
• Lipoma
• Pâncreas ectópico
• Tumores neuroendócrinos
• Tumores neurogênicos e vasculares
variam conforme a população estudada e suas características (prevalência de
Helicobacter pylori (H. pylori), uso crônico de inibidores de bomba de prótons,
etc.). Em um estudo brasileiro foram encontrados pólipos gástricos em 0,6% de
26.000 endoscopias, e destes, cerca de 70% eram hiperplásicos, 16% pólipos de
glândulas fúndicas e 12% adenomas.(3)
Alguns pólipos podem estar associados a síndromes neoplásicas hereditárias,
como por exemplo, pólipos de glândulas fúndicas são encontrados em pacientes
com Polipose Adenomatosa Familiar e pólipos hamartomatosos em pacientes
com Síndrome de Peutz-Jeghers.
Pólipos hiperplásicos
Os pólipos hiperplásicos geralmente são associados a condições inflamatórias
e correspondem à grande maioria dos pólipos gástricos em áreas onde a prevalência do H. pylori é alta. Apresentam-se como pólipos sésseis ou pediculados,
geralmente menores do que 2 cm de diâmetro, únicos ou múltiplos, localizados
60 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Munique Kurtz • Dr. Matheus Azevedo C. Freitas • Dr. Decio Chinzon
Figura 1. Pólipo hiperplásico.
Fonte: CDG HCFMUSP.
no antro ou distribuídos pelo corpo gástrico (figura 1).(1) Microscopicamente,
observa-se um epitélio foveolar hiperplásico, distorcido, com edema e inflamação crônica da lâmina própria que pode conter glândulas pilóricas, células
parietais e células principais. Desenvolvem-se, caracteristicamente, como uma
resposta epitelial “hiper-regenerativa” a um estímulo inflamatório crônico, sendo
associados a gastrite atrófica, anemia perniciosa, áreas adjacentes a erosões ou
úlceras e gastrostomias.(4) Podem aumentar, estabilizar ou mesmo diminuir em
tamanho, frequentemente regredindo com a erradicação do H. pylori.
Pólipos hiperplásicos raramente apresentam malignização, mas estão associados a um risco aumentado de neoplasia sincrônica em outras regiões da mucosa
gástrica. A incidência de adenocarcinoma varia de 0,6%-2,1% e desenvolve-se
através da sequência displasia/carcinoma, associada a mutações no gene p53,
aberrações cromossômicas e instabilidade de microssatélite.(1,5) Há maior risco
de neoplasia em pólipos maiores que 2 cm.(5)
Existem opiniões discordantes quanto à necessidade do pólipo hiperplásico ser rotineiramente ressecado ou quando apenas deva ser biopsiado para
acompanhamento. Alguns autores recomendam realizar polipectomia de todos
os pólipos pequenos e biópsias seriadas quando são muito grandes (maior dificuldade de ressecção). Outros recomendam que, devido ao risco aumentado de
neoplasia, apenas os pólipos maiores de 2 cm devam ser retirados, considerando
que o seguimento endoscópico das lesões menores seria mais seguro do que
a realização de múltiplas polipectomias. Não existem estudos randomizados
satisfatórios que assegurem uma ou outra recomendação. Uma revisão publicada
A Gastroenterologia na Prática Clínica
61
Pólipos Gástricos
Figura 2. Pólipos de glândulas
fúndicas.
Fonte: CDG HCFMUSP.
em 2010 recomenda realização de biópsia dos pólipos, avaliação cuidadosa de
toda a mucosa gástrica com biópsias dirigidas para áreas de alterações suspeitas
e erradicação do H. pylori quando presente.
Pólipos de glândulas fúndicas
Os pólipos de glândulas fúndicas são lesões geralmente pequenas (1-5 mm),
de superfície lisa e circunscrita, que ocorrem exclusivamente no fundo e corpo
gástrico. Morfologicamente caracterizam-se pela transformação cística das glândulas oxínticas, revestidas por células parietais e principais (figura 2).(4) parecem
em dois cenários clínicos distintos: como pólipos esporádicos (grande maioria
dos casos) ou como pólipos associados à Síndrome da Polipose Adenomatosa
Familiar (PAF).
Os pólipos esporádicos são mais frequentemente encontrados em mulheres
de meia-idade e pacientes em terapia prolongada com inibidores de bomba de
prótons.(6) Um estudo argentino recente, que avaliou 1.780 endoscopias, destacou entre estes fatores de risco o uso de IBP como o mais fortemente associado
ao desenvolvimento de pólipos de glândulas fúndicas.(7) Cabe ressaltar que a
interrupção do IBP geralmente implica regressão destes pólipos, em aproximadamente 3 meses.(2) Raramente o número de pólipos esporádicos ultrapassa dez
e displasia está presente em menos do que 1% destes, sendo inclusive discutido
sobre o real potencial de transformação maligna destes.(2) Em pacientes com
pólipos de glândulas fúndicas praticamente inexiste a infecção pelo H. pylori,
não havendo explicação fisiopatológica definida para esse fato.
Pólipos de glândulas fúndicas ocorrem em 12,2% a 84% dos pacientes com
62 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Munique Kurtz • Dr. Matheus Azevedo C. Freitas • Dr. Decio Chinzon
Figura 3. Tumor carcinoide
gástrico.
Fonte: CDG HCFMUSP.
PAF,(6) sendo a frequência semelhante em homens e mulheres e em idade mais
precoce quando comparados aos pólipos esporádicos. Neste contexto, os pólipos
geralmente são múltiplos (centenas) e displasia pode estar presente em até 40%
deles. Não há maneira de diferenciar se o pólipo é esporádico ou associado à
PAF apenas à macroscopia durante o exame endoscópico.
Nos pacientes em uso crônico de IBP, com pólipos típicos, menores do que
5 mm, deve ser feita apenas uma biópsia para confirmação diagnóstica, sem
indicação de descontinuação da terapia antiácida. Pólipos maiores do que 10
mm devem ser completamente retirados e, no caso de serem múltiplos, o IBP
suspenso. Devido ao baixo potencial de malignização não há indicação de
repetir o exame endoscópico, exceção aos pacientes com PAF ou com pólipos
que apresentem displasia, em que novo exame deve ser realizado periodicamente a cada 1-3 anos.(6)
Tumores carcinoides gástricos
Os tumores carcinoides compreendem cerca de 0,5% a 2% das lesões polipoides gástricas.(2,4) São tumores derivados de células enterocromafins-like
(ECL), que podem ser reconhecidos histopatologicamente por marcadores
imuno-histoquímicos como cromogranina A e sinaptofisina (figura 3).
Os carcinoides gástricos são divididos em três subtipos:
• Tipo 1: Representam 65% a 80% da lesões, são usualmente pólipos sésseis,
associados a gastrite atrófica (autoimune), anemia perniciosa, acloridria e
hipergastrinemia (produzida pelas células G antrais).
A Gastroenterologia na Prática Clínica
63
Pólipos Gástricos
• Tipo 2: Correspondem a cerca de 5% das lesões e ocorrem em pacientes
com Síndrome de Zollinger-Ellison, frequentemente no cenário de uma
Neoplasia Endócrina Múltipla tipo 1. Associados a gastrinomas, hipergastrinemia e hiperacidez gástrica.
• Tipo 3: Aproximam-se a 15% das lesões, são esporádicos e não estão associados a hipergastrinemia. Possuem o pior prognóstico entre os subtipos.
Os carcinoides associados a hipergastrinemia (tipos 1 e 2) frequentemente
são múltiplos, amarelados, com base ampla e localizam-se no corpo e fundo
gástricos, raramente medindo mais do que 2 cm. As lesões esporádicas (tipo 3)
usualmente são únicas, de localização pré-pilórica e maiores do que 2 cm5
(tabela 2).
O tratamento dos tumores carcinoides vai basear-se principalmente nas características da neoplasia. Para os tipos 1 e 2, menores do que 1 cm, a ressecção
endoscópica é a terapia de escolha. Caso as lesões do tipo 1 sejam múltiplas,
uma alternativa de tratamento é a antrectomia, com a ressecção das células G.
O tipo 3 deve ser tratado com gastrectomia parcial ou total, acompanhado de
ressecção linfonodal local.
Pólipos adenomatosos
São lesões precursoras do câncer gástrico, ou seja, apresentam alto poder de
malignização. São histologicamente classificados em: tubulares, tubulovilosos
e vilosos.
Tabela 2. Tumores carcinoides gástricos
Característica
Tipo 1
Tipo2
Tipo 3
Patologias
associadas
Gastrite atrófica,
anemia perniciosa
Sind. Zollinger-Ellison,
NEM1
Nenhuma
Proporção
80%
5%
15%
Localização
Fundo
Fundo/Antro
Antro/Fundo
Número
Múltiplos
Múltiplos
Único
Tamanho
< 1 cm
< 1 cm
2-5 cm
Nível de gastrina
Elevado
Elevado
Normal
Acidez gástrica
Reduzida
Elevada
Normal
Prognóstico
Bom
Bom na maioria dos casos Ruim
64 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Munique Kurtz • Dr. Matheus Azevedo C. Freitas • Dr. Decio Chinzon
A prevalência varia amplamente, sendo estimada em 0,5-3,75% nos países
do Ocidente, enquanto pode chegar a valores entre 9-27% em áreas com maior
incidência do carcinoma gástrico, como China e Japão.(5)
Endoscopicamente têm uma aparência aveludada, lobulada, geralmente são
solitários (82%), localizados principalmente no antro e menores que 2,0 cm de
diâmetro.(5) Frequentemente surgem sobre um fundo de gastrite atrófica e/ou
metaplasia intestinal, mas não há associação comprovada com a infecção pelo
H. pylori. Progressão neoplásica é maior nos pólipos maiores que 2,0 cm e ocorre
em cerca de 28,5 a 40% dos adenomas vilosos e 5% dos adenomas tubulares.(2)
Há também uma forte associação entre adenoma e adenocarcinoma gástrico
sincrônico ou metacrônico; dessa forma, um exame minucioso do estômago
deve ser realizado para pesquisa de anormalidades e irregularidades da mucosa,
e qualquer anormalidade deve ser biopsiada.
A polipectomia endoscópica é o tratamento de escolha se todo o pólipo for
removido e não houver evidência de adenocarcinoma invasivo no espécime.
Vigilância endoscópica é necessária após ressecção dos pólipos adenomatosos.
A endoscopia deve ser repetida em seis meses para os pólipos parcialmente
ressecados ou com displasia de alto grau, enquanto a EDA poderá ser repetida
após um ano para todos os outros pólipos.(2)
Pólipos inflamatórios fibroides
Pólipos inflamatórios fibroides são lesões raras que representam de 0,1-3,0%
de todos os pólipos gástricos. Embora estes pólipos possam se formar ao longo
de todo o trato gastrointestinal, 80% surgem na região antropilórica.(5)
Histologicamente essas lesões consistem de uma proliferação de células fusiformes e pequenos vasos na submucosa, e um marcante infiltrado inflamatório,
em que os eosinófilos predominam. Ocorrem em pacientes de todas as idades,
mais comumente na quinta a sexta décadas de vida, e mais frequentemente em
mulheres.(2) Os pólipos são firmes, solitários, sésseis ou pediculados e muitas
vezes estão associados com gastrite atrófica crônica.
Os pólipos tendem a apresentar de 1 a 5 cm de diâmetro e as lesões maiores,
muitas vezes, caracterizam-se por uma depressão ou ulceração central. Geralmente
as lesões permanecem inalteradas e assintomáticas por muito tempo, entretanto
têm propensão para crescer e causar sangramento ou obstrução gástrica.(2)
Como os pólipos inflamatórios fibroides são encontrados acidentalmente e
não recidivam após a excisão, nenhum tratamento específico ou vigilância é
recomendado, além da excisão local.(5)
A Gastroenterologia na Prática Clínica
65
Pólipos Gástricos
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66 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 8
Metaplasia e
Atrofia Gástrica –
Como Conduzir?
Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho
Maria Clara Freitas Coelho
E
m 1992, Pelayo Correa demonstrou que o desenvolvimento do câncer
gástrico do tipo intestinal se seguia a uma cascata de eventos em que a
inflamação crônica da mucosa gástrica progrediria, através de condições
pré-malignas como gastrite atrófica, metaplasia intestinal e, eventualmente,
displasia, para o adenocarcinoma gástrico.(1) Desde então, vários estudos têm
mostrado a existência de risco aumentado de câncer gástrico em pacientes
com lesões pré-malignas.(2-4) Recentemente, uma extensa coorte realizada na
Holanda em portadores de lesões pré-malignas estimou os seguintes riscos para
desenvolvimento de câncer gástrico, dentro de um período de dez anos após
o diagnóstico inicial:
1. 0,8% para portadores de gastrite atrófica
2. 1,8% para portadores de metaplasia intestinal
3. 3,9% para portadores de displasia leve a moderada
4. 32,7% para aqueles portadores de displasia intensa.(5)
Tais achados sugerem que programas de rastreamento de câncer gástrico
podem reduzir a mortalidade e que o seguimento endoscópico poderia estar
indicado em pacientes com lesões pré-malignas intensas. É objetivo deste capítulo rever as características histológicas principais da metaplasia intestinal e da
gastrite atrófica e discutir as principais condutas hoje recomendadas na prática
clínica para o seguimento de pacientes portadores de lesões pré-malignas do
estômago.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
67
Metaplasia e Atrofia Gástrica – Como Conduzir?
Metaplasia intestinal
Metaplasia intestinal no estômago se refere à reposição progressiva do epitélio gástrico pelo epitélio tipo intestinal, ou seja, por um epitélio neoformado
que apresenta características bioquímicas e morfológicas (tanto à microscopia
óptica como eletrônica) do epitélio intestinal, seja do delgado ou do cólon.
Assim sendo, o epitélio metaplásico pode ser constituído por diferentes linhagens de células próprias da mucosa intestinal, como células caliciformes, células
absortivas, células de Paneth e células endócrinas.(6) A metaplasia intestinal
classifica-se em geral em completa (tipo I) e incompleta (tipo II).
Na metaplasia tipo I, ou completa, o epitélio intestinal metaplásico reproduz
muito de perto, morfológica e bioquimicamente, o epitélio do intestino delgado,
inclusive com o desenvolvimento de vilosidades e criptas nos estágios mais
avançados. Na metaplasia tipo II, ou incompleta, as células absortivas, com
borda em escova, estão ausentes, persistindo células mucosas com aspecto
semelhante àquelas das fovéolas gástricas. Na metaplasia completa (tipo I) a
sialomucina constitui o tipo predominante de glicoproteína, podendo ocorrer
pequenas quantidades de mucinas neutras e mesmo sulfomucinas, estas últimas
características da mucosa do cólon. Na metaplasia incompleta pode haver predomínio secretório de mucinas neutras ou de sulfomucinas. Dependendo deste
comportamento funcional, estas células mucossecretoras podem ser identificadas
histoquimicamente com facilidade, e com base nesta característica tintorial a
metaplasia incompleta costuma ser subdividida em tipos IIA (predomínio de
mucinas neutras) e tipo IIB ou III (predomínio de sulfomucinas). A presença de
glândulas ou de epitélio tipo intestinal na mucosa gástrica pode ser reconhecida
com facilidade na maioria das vezes através do exame histopatológico rotineiro
corado pela hematoxilina e eosina.
Entretanto, como a estrutura morfológica das células metaplásicas não mostra
diferenças detectáveis entre um tipo e outro, e como já salientamos antes, são
necessários métodos especiais de coloração para demonstrar, com bom grau
de especificidade, os diferentes tipos de metaplasia intestinal, anteriormente
descritos.
A abordagem mais inicial consiste na utilização do método Alcian blue em
pH 2,5 e da reação do ácido periódico e do reagente de Schiff (PAS), abreviadamente designados PAS/Alcian blue. Como o muco tipo intestinal é constituído
predominantemente por mucinas ácidas (inclusive as sulfomucinas que são
fortemente acídicas), em pH 2,5 a coloração pelo PAS/Alcian blue vai fornecer
68 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho • Maria Clara Freitas Coelho
boa individualização do muco intestinal (predominantemente ácido, Alcian
blue positivo = azul), o que não ocorre com o muco neutro do estômago, que
se mostrará PAS positivo = vermelho. Outros métodos são necessários para
diferenciar os tipos II e III. A coloração pelo Alcian blue em pH 0,5 revela as
células produtoras das sulfomucinas, fortemente acídicas, diferenciando daquelas
produtoras principalmente de sialomucinas. Outra técnica tintorial utilizada com
essa finalidade é a da diamina férrica, que revela com muita precisão células
secretoras de sulfomucinas.
Como já dito, a metaplasia intestinal representa um estágio dentro de um
processo prolongado que pode chegar ao câncer gástrico. Infecção por H.
pylori, ingestão elevada de sal na dieta, tabagismo, consumo de álcool e refluxo
biliar crônico constituem fatores de risco para o desenvolvimento de metaplasia
intestinal.(7-11) Habitualmente, o foco metaplásico surge inicialmente na junção
antro-corpo na altura da incisura angular. Com o avanço do processo, os focos
aumentam e tendem a coalescer, acometendo a mucosa subjacente do antro e
do corpo. Focos de displasia podem ocorrer em áreas de metaplasia intestinal:
por serem diminutos, são dificilmente identificáveis. A intensidade e o tempo
de progressão de todas as etapas da cascata de lesões pré-malignas podem
ser influenciados pela virulência da cepa infectante de H. pylori, por fatores
genéticos do hospedeiro ou por fatores ambientais.(12)
Gastrite atrófica
Gastrite atrófica, atrofia gástrica e metaplasia intestinal constituem sequelas
frequentes de gastrite crônica secundária à infecção por H. pylori. Um grande
estudo multicêntrico japonês relatou a presença de gastrite atrófica em 89,2%
dos indivíduos infectados e em apenas 9,8% naqueles não infectados. Da mesma
forma, metaplasia intestinal foi detectada em 43,1% dos indivíduos H. pylori
positivos, ao passo que somente 6,2% daqueles não infectados apresentavam
tal anormalidade.(7)
A atrofia glandular da mucosa gástrica, quando discreta, pode trazer dificuldades diagnósticas, principalmente na mucosa antral, que normalmente apresenta
o conjuntivo da lâmina própria mais desenvolvido do que na mucosa do corpo
gástrico; por isso, o reconhecimento histopatológico de atrofia glandular, discreta
ou moderada, da mucosa do corpo guarda menor grau de subjetividade do
que aquela do antro. A presença de infiltrado inflamatório denso de permeio
às glândulas gástricas pode levar à conclusão errônea de atrofia e, em conse-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
69
Metaplasia e Atrofia Gástrica – Como Conduzir?
quência, à interpretação equivocada de regressão da atrofia após erradicação
do H. pylori e resolução do infiltrado inflamatório.
Recentemente, biomarcadores sorológicos, como pepsinogênios séricos,
gastrina-17 e anticorpos anti-H. pylori, entre outros, têm sido usados, isolados
ou em conjunto, para predizer a presença ou não de gastrite atrófica intensa e
auxiliando no manuseio desses pacientes (figura 1).
Os pepsinogênios, pró-enzimas da pepsina, são classificados de acordo com
suas propriedades bioquímicas e imunológicas em dois tipos: pepsinogênio I
(PGI) e pepsinogênio II (PGII). Ambos são produzidos pela mucosa gástrica,
porém em locais diferentes. Enquanto o PGI é produzido exclusivamente pelas
células principais e mucosas do corpo gástrico, o PGII é produzido por essas
células, mas também pelas células mucosas da região cárdica, glândulas pilóricas
e glândulas de Brunner na mucosa duodenal. Ambos pró-enzimas são excretados
principalmente para a luz gástrica, porém uma porção mínima (em torno de
1%) se difunde para a corrente sanguínea e pode ser mensurada. Sabe-se hoje
que os níveis séricos de PGI reletem a morfologia e função da mucosa oxíntica
bem como a presença de processo inflamatório.(13,14)
Figura 1. Local de secreção dos biomarcadores sorológicos
PGI: pepsinogênio I; PGII: pepsinogênio II; G-17: gastrina-17
CORPO
ANTRO
PGI e PGII
PGII e G-17
Adaptado de Di Mario & Cavallaro.
70 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho • Maria Clara Freitas Coelho
Figura 2. Biomarcadores sorológicos e gastrite crônica
PGI: pepsinogênio I; PGII: pepsinogênio II; N: normal
PGI 
PGII 
Relação PGI/PGII 
Gastrina-17 N ou 
PGI 
PGII 
Relação PGI/PGII 
Gastrina-17 N 
Gastrite crônica e não-atrófica
PGI 
PGII 
Relação PGI/PGII 
Gastrina-17 
Gastrite atrófica do corpo
Gastrite atrófica multifocal
Adaptado de Di Mario & Cavallaro.
A gastrina-17 pertence a um subgrupo da gastrina composto de 17 aminoácidos, sendo produzida exclusivamente pelas células G do antro gástrico
e considerada um indicador da função antral. Seus níveis estão intimamente
relacionados com o pH intraluminal do estômago, ou seja, acham-se reduzidos em meio ácido e anormalmente elevados em caso de hipo ou acloridria.
Sipponen et al., na Finlândia, estudaram 100 pacientes dispépticos, com e sem
atrofia antral, e observaram relação concordante entre o declínio dos níveis de
gastrina-17 e a intensidade da atrofia antral.(15)
O emprego conjunto da determinação sérica de pepsinogênios I e II e da
relação PGI/PGII associados à dosagem da gastrina sérica e presença ou não de
infecção por H. pylori detectada através da pesquisa sorológica de anticorpos
anti-H. pylori (Gastro Panel) constiui ferramenta promissora para avaliação e
manuseio das gastrites atróficas (figura 2).
Como conduzir?
A simples inclusão da presença do termo metaplasia intestinal no laudo
histopatológico de uma biópsia gástrica é sempre acompanhada por senti-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
71
Metaplasia e Atrofia Gástrica – Como Conduzir?
mento de incerteza pelo gastroenterologista, quanto à conduta a ser tomada e
de preocupação, ou mesmo pânico, pelo paciente. Vale lembrar que, embora
aumentado, o risco de câncer gástrico em portadores de metaplasia intestinal
é baixo e considerado semelhante, ou mesmo inferior, ao risco de desenvolvimento de adenocarcinoma em portadores de esôfago de Barrett.(5,16)
Infecção por H. pylori
Como visto anteriormente, a infecção por H. pylori constitui a principal causa de condições pré-malignas, sendo a erradicação da bactéria recomendada
em pacientes infectados. Embora exista ainda alguma controvérsia sobre os
benefícios da erradicação da bactéria na prevenção do câncer gástrico quando
a metaplasia intestinal acha-se já instalada,(17-19) outras evidências sugerem que
a cura da infecção atenua o processo pré-maligno.(20-23) Em relação ao diagnóstico da presença de H. pylori, vale lembrar que a bactéria não coloniza o
epitélio com metaplasia intestinal completa, podendo, entretanto, estar presente
no epitélio não metaplásico adjacente e em nas áreas de metaplasia intestinal
incompleta. (24) Assim, muitas vezes, outros métodos diagnósticos (urease, teste
respiratório com 13C-ureia, pesquisa antígeno fecal ou sorologia) podem ser
necessários para o correto diagnóstico da presença de infecção por H. pylori.
Além do tratamento da infecção por H. pylori, outras recomendações para
os portadores de metaplasia intestinal incluem o consumo adequado de frutas
e vegetais (fontes de micronutrientes antioxidantes), além da supressão do
tabagismo e do consumo excessivo de sal.
Metaplasia intestinal
Para uma melhor definição da conduta a ser tomada em pacientes com metaplasia intestinal é recomendado que o patologista a classifique, no mínimo,
como completa ou incompleta e também avalie sua extensão. Sua classificação
pode, quase sempre, ser obtida apenas pelo emprego da coloração de hematoxicilina-eosina. Para definição de sua extensão é sugerido que se considere
como metaplasia extensa aquela acometendo, no mínimo, duas localizações
no estômago ou, sendo moderada ou intensa, em mais que um fragmento de
biópsia.(10) Tais recomendações implicam a necessidade de exame endoscópico
com adequado mapeamento gástrico, com realização de biópsias no antro, corpo, incisura angular e quaisquer outras lesões visíveis ao exame endoscópico.
Na avaliação do tipo de metaplasia intestinal encontrada (tipo I ou completa, tipo Iia, incompleta e tipos IIb ou III, incompleta, persistem dúvidas se
72 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho • Maria Clara Freitas Coelho
elas representam uma evolução cronológica do processo metaplásico.(25-27) A
experiência acumulada em espécimes humanos sugere que as mucinas neutras
(metaplasia completa), presentes na mucosa normal, decrescem gradualmente
com o desenvolvimento inicial da metaplasia intestinal, dando lugar ao surgimento das sialomucinas que passam a predominar (metaplasia incompleta IIB).
Nos estágios mais avançados de metaplasia intestinal surgem as sulfomucinas
(metaplasia incompleta IIB ou III), tornando-se as mucinas predominantes. (2,12,28)
Como regra, o achado de metaplasia completa não constitui indicação para
seguimento e monitoração endoscópica prolongada, enquanto vários estudos
sugerem uma relação significativa entre metaplasia incompleta e câncer gástrico.(2,12,29-31) Da mesma forma, diferentes estudos também demonstram que
a extensão da metaplasia constitui fator de risco para o desenvolvimento do
câncer gástrico.(20,32,33)
Atrofia
Para avaliação histológica da presença e intensidade da atrofia foi recentemente proposto,(34) e já validado,(35) um sistema que integra um escore de
intensidade da atrofia com a topografia da mesma, denominado Sistema OLGA
de estadiamento das gastrites (tabela 1). O emprego desse estadiamento, comTabela 1. Sistema OLGA para estadiamento das gastrites(34)
Corpo
Antro
Escore de atrofia
Sem atrofia
(Escore 0)
Atrofia leve Atrofia moderada Atrofia intensa
(Escore 1)
(Escore 2)
(Escore 3)
Sem atrofia (Escore 0)
(incluindo incisura angular)
Estágio 0
Estágio I
Estágio I
Estágio II
Atrofia leve (Escore 1)
(incluindo incisura angular)
Estágio I
Estágio I
Estágio II
Estágio III
Atrofia moderada (Escore 2)
(incluindo incisura angular)
Estágio II
Estágio II
Estágio III
Estágio IV
Atrofia intensa (Escore 3)
(incluindo incisura angular)
Estágio III
Estágio III
Estágio IV
Estágio IV
OLGA: Operative Link on Gastritis Assessment.
Atrofia: perda de glândulas apropriadas (com ou sem metaplasia). Atrofia é graduada em dois diferentes
compartimentos gástricos: mucosa antral e mucosa oxíntica (corpo e fundo gástricos) em escala de 0 a 3,
de acordo com a escala visual analógica do Sistema Sydney de Classificação das Gastrites, atualizado
em Houston.(36) O estadiamento resulta da combinação de alterações atróficas encontradas em ambos os
compartimentos.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
73
Metaplasia e Atrofia Gástrica – Como Conduzir?
binado com a pesquisa de infecção por H. pylori, é capaz de fornecer informações relevantes para o correto manuseio dos pacientes portadores de lesões
pré-malignas do estômago.
Conquanto já propagada em vários países, principalmente no Japão, a utilização
dos níveis séricos de PGI e PGII e da relação PGI/PGII associados à determinação
dos níveis de gastrina-17 e presença de H. pylori, para avaliar a extensão das
alterações atróficas, e, consequentemente, do risco de câncer gástrico, é ainda
pouco comum entre nós.(14,37-41) A introdução de novas e fáceis metodologias
(ELISA no lugar de radioimunoensaio) para avaliação dos pepsinogênios, assim
como a possibilidade de realização simultânea de diversos biomarcadores deverão
favorecer a disseminação de seu emprego em futuro próximo.
A figura 3 exibe um algoritmo proposto por Pelayo Correa para seguimento
de pacientes com lesões pré-neoplásicas.(12)
Figura 3. Algoritmo proposto por Pelayo Correa para seguimento
de pacientes com metaplasia intestinal(12)
Laudo histopatológico com descrição de metaplasia
intestinal em biópsia gástrica
Investigue presença de H. pylori (se necessário por outros métodos) e trate se positivo
Caracterize o tipo de metaplasia encontrada e sua extensão
Metaplasia do tipo incompleta e/ou extensa*
Sim ou ignorado
Endoscopia com biópsias múltiplas ou
determinação dos níveis de pepsinogênios
séricos em um ano
Endoscopia com biópsias múltiplas a
cada três anos caso persistam metaplasia
incompleta e/ou metaplasia extensa ou
atrofia intensa**
74 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Não
Seguimento não necessário
* Metaplasia extensa: aquela que acomete, no
mínimo, duas localizações no estômago ou é
moderada ou intensa em mais de um fragmento de
biópsia.
** Atrofia extensa: nível sérico de pepsinogênio I
(PGI) < 70 μg/l e relação PGI/PGII < 3.
Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho • Maria Clara Freitas Coelho
O achado de metaplasia intestinal completa não é, por si só, indicação de
seguimento endoscópico prolongado, a não ser que existam outros indicadores
de risco para desenvolvimento de câncer gástrico (história familiar de câncer
gástrico, por exemplo). A presença ou não de infecção por H. pylori deve ser
adequadamente investigada, empregando-se, quando necessário, outros métodos diagnósticos que não a histologia e teste da urease. Todos os pacientes
infectados pela bactéria devem ser tratados e sua erradicação confirmada após
o tratamento. Pacientes portadores de metaplasia intestinal do tipo incompleto
devem ser submetidos à endoscopia digestiva com biópsias de antro, corpo e
incisura angular para avaliação de sua extensão e eventual presença de lesões
mais avançadas, como displasia ou adenocarcinoma precoce. A avaliação da
extensão da atrofia pode ser determinada pela histologia (Sistema OLGA) e/ou
pelos níveis séricos de pepsinogênio I e II. Portadores de metaplasia intestinal
incompleta e portadores de metaplasia intestinal ou atrofia extensas deverão
ser acompanhados com endoscopia digestiva com biópsias múltiplas a cada
três anos.
Concluindo, apesar de frequentemente encontradas na prática diária, não
se tem ainda na literatura guidelines, com evidências científicas sólidas, para
orientação adequada aos portadores de atrofia e metaplasia intestinal. Novos
estudos são necessários para avaliar a contribuição de novas tecnologias endoscópicas (cromoscopia digital, endoscopia confocal, etc.) na otimização do
diagnóstico dessas lesões, bem como o papel dos biomarcadores sorológicos
na seleção daqueles pacientes, entre a imensa massa de portadores de lesões
pré-neoplásicas, que, realmente, irão necessitar de seguimento clínico rigoroso
para o diagnóstico precoce de neoplasia gástrica.
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A Gastroenterologia na Prática Clínica
77
78 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 9
Não Tenho Doença
Celíaca, Mas Não
Tolero o Glúten.
O Que Fazer?*
Dra. Lorete Maria da Silva Kotze
Glúten – função e efeitos
O
glúten advém de proteínas contidas no trigo, centeio e cevada,
e em vários outros cereais que pertencem à família gramineae. O
grupo de proteínas (gliadinas e gluteninas) que constituem o glúten
são conhecidas como prolaminas. As prolaminas contêm aminoácidos (prolina
e glutamina), que fazem o glúten ter digestão difícil, levando conteúdo com
alta quantidade de oligopeptídeos chegar ao intestino delgado. A ingestão de
alimentos contendo glúten faz com que o organismo detecte a presença de
elementos estranhos e deflagra séries de atividades que, nos casos mais graves
(doença celíaca - DC) podem destruir a mucosa intestinal; ou em casos menos
graves (sensibilidade ao glúten - SG) deem lugar a sintomas gastrointestinais
(GI). Em ambos os casos, os sintomas usualmente desaparecem com a adoção
de dieta isenta de glúten (DIG) (tabela 1).
DC, alergia ao trigo e sensibilidade ao glúten são três patologias que podem
ser classificadas sob a simples denominação de doenças glúten-relacionadas.
Experts caracterizaram as diferenças existentes entre estas doenças tanto em
nível molecular como na resposta imune, para distinguir duas das condições
deflagradas pela ingestão de glúten - a DC e a SG – como segue: Enquanto a
DC deriva de mecanismo deflagrado pela resposta adaptativa do sistema imune,
*Este texto baseia-se no “The First Consensus Conference on Gluten Sensitivity”,
realizado em Londres, 11 e 12 de fevereiro de 2011.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
79
Não Tenho Doença Celíaca, Mas Não Tolero o Glúten. O Que Fazer?
Tabela 1. Doenças glúten-relacionadas
Patogênese
Autoimune
Alérgica
Não autoimune Não alérgica (INATA)
Doença celíaca
Sintomática
Silenciosa
Potencial
Alergia ao trigo
Alergia respiratória
Alergia alimentar
Urticária de contato
WDEIA*
Sensibilidade ao glúten
Dermatite herpetiforme
Ataxia pelo glúten
* WDEIA = Wheat Dependent Exercise Induced Anaphylaxis/ Anafilaxia ao trigo dependente de exercícios.
a SG parece estar mais conectada com a ação do sistema imune inato e parece
não envolver a função da barreira intestinal.
Sensibilidade ao glúten (SG)
A SG é uma condição que só recentemente foi clinicamente definida, mas
tem sido observada com mais frequência por especialistas no Reino Unido:
seguidamente os pacientes se queixam de sintomas intestinais e desconforto,
e previamente receberam o diagnóstico de doença funcional ou síndrome do
intestino irritável.
Sintomatologia da SG
• Sintomas gastrointestinais – dor abdominal, sensação de queimação epigástrica, náusea e vômito, borborigmos, distensão do estômago, constipação
ou diarreia.
• Articulações, ossos e músculos – fadiga, amortecimento nas pernas e
braços, câimbras musculares e dores articulares.
• Esfera neurológica – cefaleias, discreta sensação de tontura e enjôo e
momentos de colapso (desmaio).
• Pele/Mucosas – eczema e aparecimento de pequenas manchas vermelhas.
A mucosa da língua também pode se tornar inflamada e edemaciada,
levando a possível dor ao mastigar e ao falar e, se o problema se tornar
crônico, pode causar surgimento de fissuras, úlceras e manchas brancas.
• Sangue – os testes sanguíneos podem indicar anemia.
O algoritmo diagnóstico é resultante da concordância do consenso referido
80 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Lorete Maria da Silva Kotze
Quadro 1. Algoritmo diagnóstico
Alergia ao
trigo
DC ou
SG
Prick test
IgE específica
Desafio com
glúten
tTG, EmA, IgA
AGA deamidada
AGA
Teste +
Desafio +
tTG e/ou dAGA +
SIM
NÃO
SG
SIM
Alergia
confirmada
EDA com biópsias
Desafio com
glúten
Biópsia +
NÃO
DC
potencial
SIM
DC
confirmada
SIM
SG
confirmada
Não
Outros
diagnósticos
e foi desenhado para distinguir as doenças relacionados ao glúten: DC, alergia
ao trigo e SG (quadro 1).
Para o diagnóstico de SG, os médicos devem antes excluir DC e alergia ao
glúten. A sequência dos procedimentos diagnósticos para determinar a SG é
a que segue.
Excluir alergia ao glúten
Primeiro é necessário excluir se o paciente tem alergia ao glúten, que inclui alergias respiratórias (mais frequentes no adulto) tais como asma e rinite,
alergias alimentares (mais encontradas em crianças) com sintomas GI, urticária
e angioedema, obstrução brônquica, condição pior da dermatite atópica ou
urticária de contato.
Excluir DC
Para excluir DC, o indivíduo deve realizar testes sorológicos marcadores
A Gastroenterologia na Prática Clínica
81
Não Tenho Doença Celíaca, Mas Não Tolero o Glúten. O Que Fazer?
específicos que caracterizam esta afecção: anti-tTG, EmA e deficiência de IgA.
A presença de HLA DQ2/8 não é necessária para a SG. Entretanto, é útil para
descartar estrutura genética. A ausência de heterodímeros DQ2/8 praticamente
descarta DC. Ressalva-se que a presença de DQ2 ou DQ8 nem sempre significa
DC. Para diferenciar se o paciente sofre de DC ou SG é necessário fazer biópsia
da mucosa intestinal.
Biópsia intestinal
Uma pessoa com SG, diferente da DC, não manifestará atrofia vilositária,
portanto a mucosa apresentará arquitetura normal. Devem ter contagem de
linfócitos intraepiteliais (LIE) normal ou pouco elevada (Marsh 0-1).
Anticorpos antigliadina de primeira geração (AGA)
Anticorpos IgA estão presentes principalmente na saliva, lágrimas e muco
e defendem o organismo contra agentes externos. Anticorpos IgG atacam e
eliminam agente de fora (estranho). Ambos IgA e IgG perdem a especificidade para outras espécies de anticorpos. Por exemplo, elevados níveis destas
imunoglobulinas podem ser encontrados em indivíduos com DC, mas também
podem estar presentes na SG.
Pacientes que preenchem os critérios diagnósticos mencionados acima para
SG podem aliviar seus sintomas praticando DIG, mesmo de modo temporário
e sintomas reincidindo após reiniciar após o início de uma dieta que seja livre
de glúten.
Diferenciando DC de SG
DC é uma intolerância permanente ao glúten. Indivíduos sensíveis ao glúten,
contudo, são intolerantes ao glúten, porém esta intolerância pode ser eliminada
por meio de uma DIG temporária. Enquanto os intestinos de um indivíduo com
DC contêm lesões que morfologicamente alteram a mucosa do intestino delgado,
estudos cuidadosos têm mostrado que na SG os indivíduos não mostram atrofia
vilositária e a estrutura da mucosa pode ser considerada normal.
Tratamento
Em resumo, se a história médica do paciente, associada com testes clínicos,
descarta alergia ao glúten e DC, a SG pode ser considerada como um diagnóstico. Antes que isto ocorra são necessários os seguintes critérios:
82 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Lorete Maria da Silva Kotze
• Alergia ao glúten excluída (anti-IgE negativo)
• DC excluída (anti-tTg/EmA/dAGA negativos, sem deficiência de IgA)
• Sem restrição de HLA: ausência de heterodímeros DQ2/8 praticamente
descarta DC; contudo, é importante salientar que a presença de DQ2 ou
DQ8 nem sempre significa DC
• Biópsia intestinal sem mostrar atrofia vilositária
• Possível presença de anticorpos AGA IgA DIG
Encontrando-se tais critérios, o paciente pode ser declarado como sensível
ao glúten e tratado com DIG por certo período de tempo. Usualmente a suspensão do glúten da dieta acarreta o desaparecimento dos sinais e sintomas.
Se o paciente é alérgico ao trigo, tem DC ou SG, deve-se notar que o tratamento é o mesmo: a remoção do glúten da dieta.
Uma recente publicação apresenta as principais considerações acerca do
assunto.(6)
A doença celíaca atualmente é considerada muito mais que uma enteropatia
por sensibilidade ao glúten, mas uma doença sistêmica, imune-mediada, desencadeada pelo glúten e prolaminas relacionadas, em indivíduos geneticamente
suscetíveis. O denominador comum para todos os pacientes com DC é a presença de combinação variável de manifestações clínicas glúten-dependentes,
autoanticorpos específicos (EmA e anti-tTG), a presença de haplotipos HLA
DQ2 e/ou DQ8 e diferentes graus de enteropatia, variando desde infiltração
linfocitária no epitélio até completa atrofia de vilosidades.
Contudo, o glúten pode induzir outras condições patológicas, tais como
alergia ao trigo – doença mediada por imunoglobulina IgE – muito bem caracterizada do ponto de vista imunonológico e clínico, mas completamente sem
relação com a DC.
Mais recentemente tem-se dado atenção para outra entidade, Sensibilidade
ao Glúten (SG), cuja interface com a DC ainda não está bem definida.
Atualmente, um número de doenças morfológicas, funcionais e imunológicas
tem sido consideradas sobre o “guarda-chuva” de Sensibilidade ao Glúten, onde
faltam uma ou mais chaves para os critérios de DC (enteropatia, haplotipos HLA
e presença de anticorpos anti-TG2), mas que respondem à exclusão do glúten.
Sensibilidade ao glúten sem autoanticorpos antitransglutaminase
e sem enteropatia
São entidades que perfazem um grande espectro de doenças que podem
ter mecanismos básicos diferentes, mas que têm em comum a regressão dos
A Gastroenterologia na Prática Clínica
83
Não Tenho Doença Celíaca, Mas Não Tolero o Glúten. O Que Fazer?
sintomas com dieta isenta de glúten (DIG) na ausência de anticorpos anti-tTG e
enteropatia histológica. Em muitas falta o esclarecimento de seu/s mecanismo/s.
Discute-se se estariam ligadas à resposta imunológica adaptativa ao glúten ou
a uma resposta inata ao estresse ao glúten.
Síndrome do intestino irritável (SII) relacionada à sensibilidade ao
glúten (SG)
• SII e DC: ambas entidades cursam com sintomas que se sobrepõem;
• Pacientes com SII com diarreia devem ser triados para DC;
• DC predispõe à SII: talvez a inflamação mucosa induzida pela gliadina
possa predispor à SII;
• Pacientes com a SII, que não podem ser classificados como celíacos, podem apresentar resposta imune disfuncional e resposta sintomática à DIG
(AGA IgA e IgM positivos, sem enteropatia).
Na SII-SG, imunidade inata e não adaptativa antiglúten tem papel importante
e as células epiteliais seriam os alvos (IL15).
Sensibilidade ao glúten extraintestinal
• Psoríase: 16% dos casos com altos níveis de AGA IgA e AGA IgG; melhora
com DIG
• Ulcerações orais: 85% dos pacientes com altos níveis de AGA respondem
à DIG
Anti-tTG negativos: enzima não ativada?
• Diabetes tipo 1 e SG
Associação DM 1 e DC: grupo sem anti-tTG ou EmA no soro
Em resposta à assertiva “Não tenho doença celíaca, mas não tolero o glúten”,
fica o esclarecimento de que o paciente não tem anticorpos específicos positivos
(anti-tTG ou antiendomísio) e que sua biópsia intestinal é normal (sem atrofia
e sem aumento de LIE), na presença de sintomas GI e gerais, os mais variados.
Em resposta à pergunta “O que fazer?”, o tratamento é a dieta isenta de
glúten (DIG) como teste: se os sintomas desaparecerem, fica confirmado o
diagnóstico de sensibilidade ao glúten. O que ainda não se sabe é por quanto
tempo a DIG deve ser obedecida, pois o transtorno é considerado temporário,
e não permanente como na DC.
84 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Lorete Maria da Silva Kotze
Bibliografia recomendada
1. Kotze LMS, Brambila-Rodrigues AP, Kotze LR, Nisihara RM. A Brazilian experience of the
self transglutaminase-based test for celiac disease finding and diet monitoring. World J Gastroenterol 2009;15:4423-8.
2. Kotze LMS & Utiyama SRR. Doença celíaca e outros distúrbios na absorção de nutrientes.
In: Gastroenterologia Essencial. Dani R. 4a. ed. Guanabara-Koogan, Rio de Janeiro, 2011.
pp. 294-330.
3. Niveloni S, Sugai E, Cabanne A et al. Antibodies against synthetic deamidates gliadin peptides
as predictors of celiac disease: Prospective assessment in an adult population with high risk
pretest probability of disease. Clin Chem 2007;53:2186-92.
4. Tack GJ, Verbeek WHM, Schreurs MWJ et al. The spectrum of celiac disease: epidemiology,
clinical aspects and treatment. Nat Rev Gastroenterol Hepatol 2010;7:204-13.
5. The First Consensus Conference on Gluten Sensitivity, London, 11/12 February 2011.
6. Troncone R & Jabri B. Coeliac disease and gluten sensitivity. J Int Med 2011;269:582-90.
7. WGO-OMGE Practice Guideline. World Gastroenterology News 2005;(Supp)1-8.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
85
86 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 10
Hemorragia Digestiva
Obscura do Intestino
Médio: Enteroscopia ou
Cápsula Endoscópica
Como Primeira Opção?
Dr. Luiz Leite Luna
Dr. Renato Abrantes Luna
Dra. Patrícia Abrantes Luna
Dr. Alexandre Pelosi
A
pesar dos fantásticos progressos atingidos com a enteroscopia
com cápsula (VCE), a enteroscopia assistida com balões (BAE) e a
enteroscopia espiral (SE), que permitem uma visualização adequada
do delgado, estes métodos ainda não atingiram a eficiência da endoscopia
digestiva alta e da colonoscopia, tanto nos seus aspectos diagnósticos quanto
terapêuticos. Os grandes obstáculos continuam sendo a longa extensão, tortuosidade e mobilidade do delgado. Até recentemente estas barreiras limitavam
a visualização direta do delgado, exceto às suas porções proximal (com a
endoscopia digestiva alta) e distal (com a colonoscopia). A enteroscopia total
só era possível através da enteroscopia intraoperatória (IOE), com todas as
suas dificuldades e complicações. A VCE, BAE e SE têm nos dias atuais uma
participação central na avaliação de pacientes com suspeita de patologias do
delgado, principalmente sangramento digestivo de origem obscura, doença de
Crohn, tumores e doença celíaca. Por outro lado, os pacientes com cirurgias
que excluem parte do trato digestivo (Y de Roux, Fobi Capela, etc.) passaram
a ter estes segmentos examinados com os videoenteroscópios, permitindo além
de diagnósticos procedimentos terapêuticos tais como dilatações de estenoses,
CPER e litotomias, polipectomias, entre outras.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
87
Hemorragia Digestiva Obscura do Intestino Médio:
Enteroscopia ou Cápsula Endoscópica Como Primeira Opção?
Hemorragia digestiva de origem obscura (HDOO)
Denomina-se HDOO os sangramentos digestivos não diagnosticados pela
Endoscopia Digestiva Alta (EDA) ou pela Colonoscopia (C). Nestes pacientes,
em 20% das vezes uma outra EDA ou C cuidadosas evidenciam a etiologia do
sangramento nos segmentos atingidos por estes exames, tornando a repetição
destes mandatória. Estas HDOO podem ser do tipo aparente, quando existe
exteriorização do sangramento em forma de perda sanguínea visível, ou oculta, quando o sangramento só se traduz por anemia hipocrômica microcítica.
Aproximadamente, portanto, 80% das HDOO originam-se no delgado, segmento este de difícil exame. O surgimento da VCE e das enteroscopias assistidas
por instrumentos (DAE), enteroscopia com duplo balão (DBE), enteroscopia
com balão único (SBE) e enteroscopia espiral (SE) mudaram este panorama.
Entretanto, por serem exames com peculiaridades próprias e de alto custo, a
prioridade para a realização entre os métodos é importante.
Enteroscopia com cápsula (VCE)
É um método não invasivo que permite a visualização do delgado através de
imagens transmitidas por uma cápsula deglutida pelo paciente e que, propelida
aleatoriamente pela peristalse, percorre todo o delgado, emitindo imagens para
um digitalizador externo. Posteriormente estas imagens são baixadas e analisadas
em um computador. Em 20% dos exames de VCE a duração da bateria de 8
horas não permite visualização de todo o delgado. Em um trabalho prospectivo
randomizado, o uso de eritromicina não mostrou vantagens neste aspecto. O
autor sugere o uso do medicamento somente nos pacientes com conhecida
gastroparesia.(1) Atualmente há quatro modelos de cápsulas (quadro 1).
A literatura recente mostra que o diagnóstico fornecido com a VCE varia
de 38%-83% e até 91% se a VCE for realizada em até duas semanas do sangramento.(2)
Estudos têm mostrado resultados comparáveis com as várias cápsulas.(3)
Estudo multicêntrico prospectivo e randomizado comparou a cápsula Given
PillCam SB2 com a MiroCam. As duas cápsulas foram deglutidas pelos mesmos
pacientes no mesmo dia, com um intervalo de 1 hora. Ambas proporcionaram
excelentes imagens, com diagnóstico de 55,2% com a MiroCam e 44,7% com a
PillCam SB2, existindo concordância entre elas de k=0,74. Houve mais problemas técnicos com a MiroCam (9 x 2).(4)
88 Federação Brasileira de Gastroenterologia
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Quadro 1. Modelos de cápsulas
Especificação
Origem
MiroCam
PillCam SB2
EndoCapsule
OMOM
Coreia
Israel
Japão
China
11 x 23,6
11 x 26
11 x 26
13 x 27.9
Peso gr
3.4
3.45
3.7
6.0
Pixels
320 x 320
256 x 256
256 x 256
256 x 256
3
2
2
2
Tamanho mm
Fotos/seg
Duração bateria h
11
8
8
8
129.000
57.600
57.600
57.600
Human body
Comunication
rádio
frequência
rádio
frequência
rádio
frequência
Campo visual
150
140
145
140
Real time
sim
sim
sim
sim
Número fotos
Sist Transm
Têm-se relatado falsos-negativos em 11% para todas as lesões do delgado
e até 19% para massas isoladas, inclusive tumores.(5) Outro problema com VCE
é sua retenção em divertículos e nos pacientes com disperistalse ou estenoses.
Uma cápsula de patência foi desenvolvida pela Given, que permite a avaliação
prévia de estenoses que contraindiquem a VCE.
Trabalhos experimentais em animais usando campos magnéticos externos
para controlar cápsulas endoscópicas apareceram recentemente.(6-9)
Uma videocápsula com quatro ópticas, orientadas para as quatro faces externas, está em estudo pela Capso Vision, Saratoga, California, USA. Teoricamente
este desenho permitirá observação circunferencial do delgado, melhorando a
visibilidade. Outro desenvolvimento em estudo é a integração da PillCam com
o sistema FICE da Fujinon, permitindo cromoenteroscopia virtual.
Enteroscopia assistida com instrumentos: Device
Assisted Enteroscopy – DAE (balloon assisted enteroscopy:
DBE Double Balloon Enteroscopy, SBE Single Balloon
e Spiral Enteroscopy SE)
A DAE (enteroscopia assistida com instrumento – DBE, SBE, SE) também
tem conseguido bons resultados nos pacientes com HDOO.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
89
Hemorragia Digestiva Obscura do Intestino Médio:
Enteroscopia ou Cápsula Endoscópica Como Primeira Opção?
Estas formas de enteroscopia permitem uma penetração mais profunda no
delgado do que a push enteroscopy (PE) e a ileocolonoscopia.(IC). Existem dois
enteroscópios assistidos com balões, o fabricado pela Fujinon-Japão, com dois
balões de látex: um na extremidade do enteroscópio e o outro na do overtube
(DBE) e o produzido pela Olympus – Japão, com um único balão de silicone
na extremidade do overtube (SBE). Detalhes técnicos dos vários enteroscópios
e overtubes são mostrados no quadro 2.
A técnica de introdução dos enteroscópios assistidos por balões foi detalhada
em Temas de Atualização em Gastroenterologias 2008.(10)
Um terceiro tipo de enteroscopia assistida é a enteroscopia espiral, que
usa um overtube dedicado de 118 cm, que possui uma espiral de 22 cm de
Quadro 2. Detalhes técnicos dos videoscópios
Enteroscópio de duplo balão – Fujinon
Tipo de visão
Especificações do enteroscópio de balão único
EM-450P5
EM-450TS
Campo de visão
140
Frontal
Frontal
Prof. de campo
3 a 100 mm
Prof. de campo
5-100 mm
4-100 mm
Direção da visão
Frontal
Ângulo visão
120
140
Diâmetro
9,2 mm
Diâm. ponta
8,5 mm
9,4 mm
Angulação cima e baixo
180
Flexão cima/baixo
dir. e esq.
180/180
180/180
160/160
160/160
Comprimento de Inserção
2000 mm
dir. e esq.
160
Comprimento trab.
2000 mm
2000 mm
Comprimento total
2345 mm
Overtube
TS-12140
TS-13140
Canal de instrumentação
2,8 mm
Diâm. Int
10 mm
10,8 mm
Overtube (ST-SB1) Comprim. total
1400 mm
Diâm. Ext.
12,2 mm
13,2 mm
Comprim. trabalho
1320 mm
Diâm. Balão
40 mm
40 mm
Diâmetro externo
13,2 mm
Comprimento
1450 mm
1450 mm
Diâmetro interno
11 mm
 Enteroscópio de balão único da Olympus
 Enteroscópios de duplo balão da Fujinon
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Figura 1. Overtube para enteroscopia
espiral
comprimento na sua extremidade, permitindo com movimentos de rotação a
penetração no delgado à semelhança de um parafuso e que pode ser usado
com qualquer videoendoscópio de até 9,4 mm de diâmetro, longo (figura 1).
Sua introdução é por via oral, embora já exista um overtube (Endo-ease
Vista Retrograde - Spirus Medical) que pode ser usado por via anal para uma
ileoscopia, como também para colonoscopias difíceis. Um estudo preliminar
com a SE mostrou resultados positivos em 33% e uma penetração de 176 cm
além do ângulo de Treitz.(11) Outro estudo(12) relata uma profundidade de inserção média de 262+/-5 cm e um tempo de procedimento de 33,6 +/- 8 minutos.
Complicações severas ocorreram em 0,3% (0,27% de perfuração de delgado).(13)
Um estudo prospectivo comparou DBE e SE(14) envolvendo 35 pacientes (SE =
18, DBE = 17). Os pacientes eram comparáveis nas indicações e demografia. Não
foi encontrada diferença significativa quanto a duração de exame, profundidade
de penetração, analgesia necessária e achados patológicos. Entretanto, do ponto de vista clínico o ganho diagnóstico foi maior na DBE (47,1% x 33,4% n.s).
Desta maneira, o diagnóstico da hemorragia digestiva intermediária em muito
avançou com VCE e a DAE e seu tratamento com a DAE. Entretanto, entre as
duas técnicas, qual delas devemos priorizar? Esta escolha não é simples por várias
razões, tais como diferenças fundamentais entre as duas tecnologias, diferenças dos pacientes (alto/baixo risco), a forma de apresentação do sangramento
(sangramento agudo severo, etc.), facilidades locais, curva de aprendizado com
os métodos, entre outras.
Vantagens óbvias da VCE, entre outras, incluem sua pouca invasividade,
realização ambulatorial, bom índice de diagnóstico, alto valor preditivo negativo, ótima tolerância e poucas complicações quando bem indicada. Entretanto,
a VCE não indica com precisão o local do sangramento, a qualidade de suas
fotografias é inferior às da DBE, sua progressão no trato digestivo é aleatória
A Gastroenterologia na Prática Clínica
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Hemorragia Digestiva Obscura do Intestino Médio:
Enteroscopia ou Cápsula Endoscópica Como Primeira Opção?
e sem controle, pode ocasionar falsos-negativos, principalmente nos segmentos proximais do delgado, está contraindicada nos pacientes com estenose e,
sobretudo não permite a realização de lavagens, aspiração, biópsias ou procedimentos hemostáticos.
Por outro lado, a DBE só consegue examinar todo o delgado pelas vias alta
(oral) e baixa (anal) entre 16%-86% das vezes. Pessoalmente, somente em 1
paciente conseguimos examinar todo o delgado com introdução do instrumento
por uma via somente (no caso via oral).
Vários estudos têm demonstrado diagnóstico com esta técnica na faixa de
43%-81% e sucesso terapêutico entre 43%-84%. Não existem dúvidas, portanto,
de que as DBE são eficazes também no diagnóstico e na terapêutica dos sangramentos digestivos intermediários, tornando desnecessárias técnicas diagnósticas
e terapêuticas mais complicadas, arriscadas e dispendiosas. Entretanto, ela é
muito mais invasiva que a VCE, necessita sedação/anestesia, é sempre realizada
em ambiente hospitalar preferencialmente por dois endoscopistas bem treinados
no método, é laboriosa e tem complicações mais frequentes (entre 0,8%-4%).
A sua curva de aprendizado é maior que a da VCE. Estes fatos levam a maioria
dos endoscopistas a preferir a VCE como método de screening e a DBE orientada pela VCE (facilitando inclusive a escolha da via oral/anal) quando torna-se
necessária a realização de biópsias ou procedimentos terapêuticos. Entretanto,
quase sempre é difícil prever estas condições.
Estudos comparativos entre os dois métodos, inclusive meta-análises,
são raros e de n pequeno na sua maioria. Thesima et al.,(15) em meta-análise
específica para HDOO, comparam os achados entre a VCE e a DBE e concluem que ambos fornecem resultados equivalentes. Essa meta-análise de
10 publicações comparando VCE com DBE em HDOO envolveu 651 exames
com cápsula e 642 com duplo balão. A análise final mostrou um diagnóstico
de 62% com VCE e 56% com DBE. O odds ratio (OR) para um diagnóstico
positivo com VCE comparado com DBE foi 1,39 (95% IC 0.88-2.20; p=0,16).
Os achados da DBE depois de uma VCE positiva mostraram 75% de diagnóstico. Estes números comprovam que os dois métodos são complementares
e não competitivos. Arakawa et al.(16) relatam resultados semelhantes entre
DBE (64%) e VCE (54%) em HDOO, sem diferença estatística significante,
sugerindo que na maioria dos casos VCE deva ser o primeiro exame a ser
realizado, seguida de DBE, se for necessário, biópsias ou terapêutica endoscópica. Tendo em vista a sua não invasividade, boa tolerância e maior
possibilidade de visualização de todo o delgado, a VCE deve preceder a DBE,
92 Federação Brasileira de Gastroenterologia
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Dra. Patrícia Abrantes Luna • Dr. Alexandre Pelosi
na maioria das vezes. Sua realização prévia à DBE também indica a melhor
via (via oral ou anal) da DBE.
Outra meta-análise(17) de 11 trabalhos comparou VCE com DBE mostrando
resultados comparáveis: (60% x 57%) para todos os achados (lesões vasculares,
inflamatórias e neoplásicas. Mais uma meta-análise(18) com 8 estudos entre VCE
e DBE mostrou resultados similares (OR 1.21; 95% IC 0.64-2.29). Entretanto, em
pacientes com HDIOO, a VCE foi mais efetiva que a DBE somente a via oral
(OR 1.61; 95% IC 1.07-2.43), mas inferior a esta quando as duas vias oral e anal
foram utilizadas (OR 0.12; 95% IC 0.03-0.52 p<0,05). Um trabalho retrospectivo
envolvendo 56 pacientes com sangramento obscuro evidente(19) durante o uso de
anticoagulantes mostrou em análise com regressão logística que a continuação
do anticoagulante foi o único fator preditor da positividade da VCE, com um
diagnóstico de 71% contra somente 28,6% nos que pararam o anticoagulante.
Infelizmente não foram fornecidos detalhes sobre as patologias diagnosticadas,
mas os autores sugerem não só continuar o anticoagulante durante a VCE ou
até mesmo reintroduzi-lo na tentativa de aumentar a positividade no exame.
Certamente esta conduta merece mais estudos.
Classicamente tem-se afirmado que um resultado negativo com a VCE em
pacientes com HDOO pressupõe um ressangramento baixo na ordem de 6%11%,(20) sugerindo que nesta eventualidade poder-se-ia assumir uma conduta
expectante. Entretanto dois estudos recentes(21,22) mostraram ressangramento em
36% em follow-up de 32 meses e 23% em 16 meses, respectivamente.
Lai et al.(23) estudaram 103 pacientes por 50 meses procurando fatores de risco
para ressangramento e morte; 35 pacientes tiveram VCE negativas com menor
ressangramento (69,1% x 28,6%) e mortalidade (30,9% x 5,7%) que os com VCE
positivos. Fatores de risco positivos para ambos, ressangramento e mortalidade,
foram VCE positivas, idade maior de 65 anos, sendo que hemoglobina menor
de 8 gr% na apresentação foi fator de risco somente para ressangramento.
Pacientes com VCE negativas, menores de 65 anos e com hemoglobina acima
de 8 gr% não tiveram ressangramento ou mortalidade durante o seguimento,
enquanto 64,8% com VCE positivos ressangraram e 27,3% morreram. Os autores advertem que embora uma VCE falso-negativa não deva ser subestimada,
pois esta conduta pode retardar o diagnóstico e piorar o prognóstico, parece
existir um subgrupo de pacientes com SGIOO com baixo risco e uma conduta
expectante poderia ser empregada.
Os tumores primários do delgado são raros, correspondendo a aproximadamente 5% das neoplasias primárias gastrointestinais.(24) Costumam ser de
A Gastroenterologia na Prática Clínica
93
Hemorragia Digestiva Obscura do Intestino Médio:
Enteroscopia ou Cápsula Endoscópica Como Primeira Opção?
diagnóstico difícil. A VCE realizada para SGIOO diagnostica tumores em 6-12%.
Aproximadamente 60% destes tumores são malignos. A VCE tem sido comparada
com raio X contrastado do delgado e com push enteroscopia (PE) com melhores
resultados, especialmente nas lesões além do alcance da PE.
As evidências do uso emergencial de BAE em pacientes com HDIOO são
escassas. Em um estudo retrospectivo em pacientes com HDIOO evidente e em
curso(25) em 41 pacientes observados por 2 anos nos quais foram realizadas 47
BAE de emergência (36 via oral e 11 anal), a fonte do sangramento foi identificada em 25 dos 41 pacientes (61%). A maioria tinha lesões vasculares (só 2 com
sangramento ativo) e 2 tinham tumores de delgado. Embora todos os pacientes
tenham realizado endoscopia digestiva alta e colonoscopia prévias, 20% das
lesões vistas à enteroscopia tinham as lesões em níveis passíveis de serem vistas
pelas endoscopias altas ou colonoscopias; 90% das lesões diagnosticadas foram
tratadas endoscopicamente e não ocorreram complicações.
Um estudo incluindo 56 pacientes com HDIOO(26) com enteroscopia visualizando todo o delgado, em 24 (42,8%) a fonte do sangramento foi identificada
no delgado, em 10 (17,9%) em outros segmentos e não identificada em 22
(39,3%). Dos 24 pacientes com achados, 18 foram submetidos a intervenções
endoscópicas. 45 pacientes (80%) foram acompanhados por mais de 1 ano (33,4
+/- 12,9 meses). Somente 4 pacientes (8,9%) tiveram recorrência do sangramento
e não houve diferença significativa nos pacientes com esteroscopia total nos
quais foram encontradas e tratadas lesões (12,5%) daqueles em que não foram
diagnosticadas patologias (4,8%).
Gerson et al.(27) compararam PE, DBE, DBE guiada por VCE angiografia e enteroscopia peroperatória em HDIOO evidente e concluíram que a DBE foi o mais
custo-efetivo e também o que teve mais sucesso em controlar o sangramento.
Monkemuller, bem conhecido dos endoscopistas brasileiros,(28) em um pequeno estudo retrospectivo sugere que a DBE em caráter de urgência, nos pacientes com sangramento maciço originado do delgado, é tecnicamente factível
e facilita o diagnóstico e manuseio destes pacientes, dispensando a VCE prévia.
Vários trabalhos têm comparado o uso do SBE com DBE. Assim uma RCT de
um único centro comparou 88 enteroscopias feitas em 79 pacientes, 51 com DBE
e 37 com SBE.(29) O tempo para preparação dos enteroscópios foi menor com
o SBE (3 x 12 minutos), mas o tempo total de exame foi similar (90 minutos)
para ambas as técnicas e não houve diferença significativa na profundidade de
inserção (SBE = 205 cm DBE = 250 cm via oral e 100 cm via anal em ambas as
técnicas). Tampouco houve diferença significante nas patologias encontradas
94 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Luiz Leite Luna • Dr. Renato Abrantes Luna
Dra. Patrícia Abrantes Luna • Dr. Alexandre Pelosi
(SBE = 65%, DBE = 49%). Não foram relatadas complicações. Nanako et al.(30)
interromperam trabalho prospectivo controlado comparando a DBE e SBE tendo
em vista as evidentes vantagens da DBE.
Com as novas modalidades de enteroscopia, a avaliação das patologias
do delgado tem progredido enormemente. Nossa habilidade de diagnosticar
e tratar pacientes com HDOO, DC e tumores do delgado e outras patologias
deste segmento do trato digestivo obteve um grande desenvolvimento. Comparando com o século passado, graças aos significantes e rápidos progressos
das enteroscopias, é incontestável que atualmente temos testes acurados para
o diagnóstico e tratamento das enteropatias. Entretanto, o impacto real destas
novas tecnologias nos resultados clínicos dos pacientes tem que aguardar trabalhos prospectivos com grandes N e longos seguimentos.
Em conclusão, qual é o melhor procedimento para indicarmos em pacientes
com HDOO?
Evidentemente várias circunstâncias pesam para esta decisão, tais como
recursos locais, tipo e estado do paciente, características do sangramento,
etc. Baseados nas características da VCE e do DBE e nos trabalhos existentes,
achamos que na maioria das vezes a VCE deva preceder a DBE, inclusive
Patologias frequentemente observadas em enteroscopias nos pacientes com HDOO
Adenocarcinoma de jejuno
Divertículo de Meckel
Angioectasia do delgado - VCE
Angioectasias de
delgado - DBE
A Gastroenterologia na Prática Clínica
95
Hemorragia Digestiva Obscura do Intestino Médio:
Enteroscopia ou Cápsula Endoscópica Como Primeira Opção?
orientando a via de acesso (oral-anal). Nos casos em que existe evidência de
uma localização do ponto de sangramento, podemos indicar de início a DBE
e naqueles pacientes com HDOO severa, a DBE inicial salvaria preciosas horas normalmente requeridas para a realização da VCE. Estas ideias certamente
devem ser corroboradas por estudos futuros.
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97
98 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Fernando Magro
Capítulo 11
Quando Indicar
Agentes Biológicos na
Doença Inflamatória
do Intestino
Dr. Fernando Magro
Evolução conceptual da doença inflamatória intestinal
A
doença de Crohn (DC) é de natureza transmural, com um curso
clínico agressivo. No estudo efectuado em Portugal de 1.692 doentes
com DC (com cinco ou mais anos de doença) aos 20 anos de evolução
menos de 10% permaneceram sem efectuar pelo menos um curso de corticosteroides, imunossupressores ou cirurgia. Vinte e sete por cento dos doentes
ficaram corticodependentes, 49% necessitaram de imunossupressores, 22%
foram submetidos a cirurgia nos primeiros 5 anos de doença e 66% efectuaram
cirurgia se considerarmos os que tinham mais de 25 anos de evolução.(1) J.
Cosnes et al. demonstraram em 2002 que o curso da doença é evolutivo, com
maior número de acontecimentos penetrantes e estenosantes ao longo do tempo
(aos 20 anos 12, 18 e 70% de doença inflamatória, estenosante e penetrante,
respectivamente).(2,3) No ensaio clínico de Geert D’Haens et al., em que a introdução precoce de imunossupressores e terapêutica biológica foi comparada
com a abordagem tradicional (dois ciclos de corticosteroides, imunossupressão
e terapêutica biológica nos doentes refractários), 60% dos doentes necessitaram
de imunossupressores no primeiro ano.(4)
Seguindo as normas da European Crohn and Colitis Organization (ECCO),
dever-se-á efectuar a introdução de imunomoduladores após agudização grave,
dois cursos de corticosteroides (primeiro ano de doença), recaída com corticosteroides em doses superiores a 15 mg/dia, recaída nos primeiros 3 meses
A Gastroenterologia na Prática Clínica
99
Quando Indicar Agentes Biológicos na Doença Inflamatória do Intestino
após corticosteroides, duração de corticosteroides por períodos superiores a 3
meses ou na profilaxia do pós-operatório.(5) A azatioprina tem sido o pilar da
imunossupressão na doença inflamatória do intestino (DII), contudo aos 15
meses de terapêutica 58% dos doentes recidivam.(6,7) A este facto acresce que
numa recente revisão da Cohrane foi evidenciado que o número de doentes
necessários tratar com azatioprina para observar um efeito adverso é de 14.(8) E
é relativamente consensual que existe um aumento de linfomas em doentes com
DII tratados com purinas. Kandiel et al.(9) demonstraram um risco relativo de 4
e no estudo CESAME a incidência de doença linfoproliferativa foi de 0,90 por
1.000 (95% IC 0.50-1.49) doentes-ano para os que estavam a efectuar tiopurinas,
0,20/1.000 (0.02-0.72) doentes-ano para os que descontinuaram o fármaco e de
0,26/1.000 (0.10-0.57) doentes-ano para os que nunca efectuaram o fármaco.
Em análise multivariada evidenciou-se que o risco de doença proliferativa para
os que recebem tiopurinas foi de 5,28 (2,01-13,9, p=0,0007).(10)
Existem dúvidas se a azatioprina altera a história natural da doença inflamatória, uma vez que não diminui o número de cirurgias no estudo de J. Cosnes et
al.,(11) embora só 9% dos doentes tenham efectuado azatioprina antes de cirurgia,
e Gisbert et al.(12) constataram uma diminuição de hospitalizações e cirurgias após
a introdução deste fármaco, contudo com um número reduzido de doentes. Pelo
exposto, parece claro que a azatioprina actua na doença corticodependente, associada a um número não desprezível de efeitos adversos, embora não seja um
bom fármaco na manutenção da remissão induzida pelos biológicos.(13)
Os paradigmas de tratamento da DII estão em mudança. Os nossos conceitos
limitados à indução da remissão são cada vez mais questionáveis e pretendemos
remissões sem corticosteroides e a remissão endoscópica é um objectivo perseguido. A terapêutica biológica diminui o número de hospitalizações e é promissora como estratégia a longo prazo na diminuição do número de cirurgias.(14,15)
Os estudos mais importantes na DII foram efectuados com doentes submetidos a múltiplas terapêuticas e o tempo de doença do ACENT I(16) foi de 8
anos, isto é, doentes com longa evolução da doença e com algumas alterações
estruturais do intestino induzidas por doença prolongada, contudo a introdução
precoce de agentes biológicos poderá ter um efeito modificador das alterações
temporais induzidas pela inflamação persistente. O estudo Sonic,(17) recentemente publicado, comparou a azatioprina com o infliximab em monoterapia
e em terapêutica combinda (azatioprina + infliximab) em doentes nunca submetidos a terapêutica com imunomoduladores e com tempo médio de doença
de 2 anos. Foram incluídos doentes corticodependentes, doentes refractários à
100 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Fernando Magro
5-asa ou ao budenosido com actividade moderada a grave. Foi demonstrado
que o infliximab foi superior à azatioprina quando foi avaliada a remissão livre
de corticosteroides. Em doentes com elevação da PCR e com lesão da mucosa
a estratégia com biológico foi superior. Este ensaio consubstanciou que: 1) A
terapêutica biológica foi superior à azatioprina em doentes com lesão endoscópica e com marcadores biológicos de inflamação e 2) foi o melhor indutor
de remissão endoscópica.
Factores preditivos
É possível, quando do diagnóstico, identificar marcadores de um
curso agressivo, justificando a introdução precoce de terapêutica
imunossupressora/biológica?
Na última década, a experiência terapêutica com biológicos tem mostrado
que a intervenção precoce com estes fármacos pode modificar a progressão
inflamação-destruição/fibrose, alterando a história natural da doença. Globalmente, a terapêutica da DC dicotomizou-se em duas estratégias: «step-up»,
o tratamento sequencial tradicional versus «top-down», que se traduz no uso
precoce de imunossupressores e/ou biológicos. No entanto, o curso da DC é
muito variável e não está definido o ponto temporal exacto de introdução dos
imunossupressores e/ou biológicos. A evolução para doença complicada torna
imperativo identificar factores de risco (clínicos, bioquímicos, endoscópicos,
serológicos, genéticos) que permitam, no momento do diagnóstico, a estratificação em grupos de baixo e elevado risco, possibilitando desta forma estimar
a probabilidade, doente a doente, de progressão para doença complicada e
consequentemente optimizar planos terapêuticos que impeçam o desenvolvimento de lesões intestinais irreversíveis e resseções intestinais.
Nos quadros 1, 2 e 3 podemos observar os factores clínicos preditivos de
Quadro 1. Factores clínicos preditivos de alteração do
comportamento da doença (B1 para B2/B3)
- Doença ileal(18-22)
- Doença ileo-cólica(18)
- Doença perianal(19,22)
- Doença do tubo digestivo superior(22)
- Tabagismo(18,19,23)
- Uso de corticosteroides(19)
- Diagnóstico da doença antes dos 40 anos(21)
A Gastroenterologia na Prática Clínica
101
Quando Indicar Agentes Biológicos na Doença Inflamatória do Intestino
Quadro 2. Factores clínicos preditivos de cirurgia
- Diagnóstico da doença antes dos 40 anos(21)
- Doença ileal(21,24)
- Doença do tubo digestivo superior(24)
- Comportamento estenosante(21,24)
- Comportamento penetrante(21)
- Tabagismo(25)
Quadro 3. Factores clínicos preditivos de doença incapacitante
- Idade do diagnóstico < 40 anos
- Doença ileo-cólica(26)
- Doença perianal(27)
- Necessidade de corticoides na primeira agudização(26)
alteração do comportamento, de cirurgia e de doença incapacitante. Num estudo prospetivo de base populacional, o nível de PCR, quando do diagnóstico,
associou-se a maior risco de cirurgia em doentes com doença de Crohn do
íleon terminal, e a associação manteve-se após análise multivariada, contudo o
número de doentes neste subgrupo foi muito reduzido.(27) A evidência científica
sobre o valor preditivo da endoscopia, quando do diagnóstico, na avaliação de
evolução para doença complicada é escassa, existindo apenas um estudo na
literatura(28) que evidenciou que a ulceração intestinal extensa e profunda, na
ileocolonoscopia, é um factor preditivo de cirurgia.(28)
A noção de que na DC a resposta imune a determinados antigénios microbianos se relaciona com determinados fenótipos, foi introduzida em 2000
por Vasiliauskas et al.,(29) demonstrando-se que títulos elevados de ASCA se
associavam a um fenótipo estenosante e penetrante e a uma maior necessidade
de cirurgia do intestino delgado. Desde então, novos marcadores serológicos
foram identificados e, como tem sido sugerido por vários estudos coorte,
poderão ser úteis na estratificação do risco de complicações, como marcadores preditivos de um curso agressivo. Além dos ASCA, novos anticorpos da
família antiglicanos (polissacarídeos componentes da parede bacteriana) foram
identificados, verificando-se associação dos ASCA, ALCA, AMCA, ACCA, anti-C
e anti-L com uma mais rápida progressão para doença complicada (fenótipo
estenosante ou penetrante), maior risco de cirurgia e manifestação da doença
em idade mais jovem.(30-33) A positividade para os anticorpos anti-ompC (anti-
102 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Fernando Magro
porina C da membrana da E. coli) correlaciona-se com fenótipo penetrante e
a presença de anticorpos anti-I2 (proteína da Pseudomonas fluorescens) com
fenótipo estenosante, ambos associados a um maior risco de cirurgia. Neste
estudo observou-se que não só a reatividade (presença dos anticorpos), mas
também a magnitude de resposta (títulos dos anticorpos) se correlacionaram
com o risco de estenoses, doença penetrante e cirurgia.(34) Targan et al.(35)
verificaram que a presença de anticorpos antiflagelina CBir1, não só é um
marcador de DC, como se associa independentemente com doença do intestino delgado e com fenótipo estenosante ou penetrante. No entanto, a maioria
destes estudos são retrospectivos, em que a determinação dos anticorpos foi
feita após a ocorrência das complicações, não sendo dessa forma avaliado
o potencial destes marcadores serológicos para prever a sua ocorrência e o
intervalo de tempo.
Mais recentemente avaliaram-se, de forma prospectiva, coortes de doentes
pediátricos com DC, doseando-se os anticorpos (ASCA, anti-ompC, anti-CBir1,
anti-I2) aquando do diagnóstico. O seguimento destes doentes mostrou que a
presença e a magnitude das respostas imunes se associavam de forma significativa com a progressão mais rápida para doença complicada (fenótipo estenosante ou penetrante, necessidade de cirurgia), sugerindo o potencial destes
marcadores para prever um curso mais agressivo da doença.(36-39)
Apesar de determinados marcadores serológicos (anticorpos contra antigénios
microbianos), presentes desde o diagnóstico, se associarem significativamente
com fenótipos complicados (estenosante e penetrante) e com risco aumentado
de cirurgia, ainda não é possível, com base em evidência, recomendar a sua utilização para decidir sobre a introdução precoce de terapêutica imunossupressora.
As vantagens dos marcadores genéticos como marcadores prognósticos
são: (a) a sua estabilidade ao longo do tempo, (b) o não serem alterados pela
atividade da doença, (c) o estarem presentes antes do desenvolvimento da
doença, e (d) antes dos factores ambientais intervirem, o serem testes não
invasivos e objectivos.(40-34) Na DC, a maioria dos genes e alelos de risco têm
uma penetrância incompleta, uma frequência baixa a moderada e isoladamente
não explicam ou predizem a evolução da doença, pois representam apenas
uma fração do conjunto de factores de risco que contribuem para o desenvolvimento e modulação da doença. Mesmo um painel de marcadores genéticos
pode não ser adequado para ser usado como marcador de curso agressivo da
DC e provavelmente tem que ser integrado com outros factores moleculares,
clínicos, endoscópicos e ambientais.(40,42)
A Gastroenterologia na Prática Clínica
103
Quando Indicar Agentes Biológicos na Doença Inflamatória do Intestino
Existem vários estudos que estabelecem uma correlação genótipo-fenótipo na
DC. No entanto, muitos destes resultados não foram ainda replicados e alguns
são controversos, com outros estudos a apresentarem resultados díspares. As
mutações mais consistentemente associadas a características da doença com
possíveis implicações prognósticas são:
1) Mutações NOD 2/CARD15 (já foram descritas pelo menos 27 mutações
neste gene, mas a maioria da susceptibilidade foi atribuída às mutações
R702W, G908R e 1007fs):
a) Localização ileal (OR 2,8; 95% IC: 1,6-5,2; p=0,001);(43) (OR 2,53; 95%
IC: 2,01-3,16);(44) (OR 1,83; IC: 1,37-2,41; p<0,001);(45) (p=0,0001);(46)
b) Comportamento estenosante (OR 1,94; 95% IC: 1,61-2,34);(44) (OR 9,44;
IC: 3,21-27,77; p=0,00028);(47) (OR 2,277; IC: 1,064-4,871; p<0,001);(48)
(OR 1,38; IC: 1,04-1,83; p=0,027);(43) (p=0,01);(46)
c) Comportamento penetrante (OR 1,47; 95% IC: 1,01-2,15; p=0,004);(41)
outros estudos apresentam resultados diferentes;(33)
d) Cirurgia intestinal (OR 1,69; IC: 1,28-2,23; p<0,001);(45) (OR 3,58; 95%
IC: 1,21-10,5), com recorrência pos-operatória mais frequente (OR 3,29;
95% IC: 1,13-9,56);(50) (p=0,0001);(36) noutros estudos não se confirmaram
estes resultados;(41,51)
e) Dupla mutação NOD2: idade mais jovem de diagnóstico (16,9 anos vs.
19,8 anos; p=0,01), comportamento estenosante (OR 2,92; p=0,00003),
envolvimento cólico menos frequente (OR 0,44; p=0,003;);(52)
f) Na idade pediátrica, verificou-se um risco aumentado de doença ileal
(p=0,003), comportamento estenosante (p<0,0001), maior risco de cirurgia intestinal;(51)
g) Ausência de variantes NOD2: desenvolvimento de fístula perianal (OR
0,56; 95% IC: 0,38-0,83; p=0,004), principalmente em doentes com
envolvimento cólico e tabagismo activo.(41)
2) Haplotipo 5q31 (IBD 5): doença perianal penetrante (RR 1,7; p=0,0005;
indivíduos homozigóticos (RR 3,0; p=0,0005);(53) comportamento penetrante
(OR 1,474, IC: 1,028-2,114; p=0,035).(52)
3) Homozigotia do alelo G no AK097548 rs1363670: comportamento estenosante (OR 5,48; 95% IC: 1,60-18,83; p=0,007), menor tempo de evolução
para doença estenosante (p=0,01), principalmente nos doentes com envolvimento ileal (p=0,0002).(41)
4) Alelo T no U7 rs12704036: comportamento penetrante (OR 1,74; 95%IC:
1,20-2,54; p=0,004); doentes do sexo masculino apresentaram um tempo
mais curto de evolução para fístula não-perianal (p<0,0001).(41)
104 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Fernando Magro
5) Alelo C no CDKAL1 rs6908425: desenvolvimento de fístula perianal
(OR 8,86; 95%IC: 1,13-69,78; p=0,04), principalmente em doentes com
envolvimento cólico e tabagismo activo.(41)
6) Alelo G no IRGM rs4958847: comportamento penetrante (OR 9,22; 95%
IC: 1,17-72,94; p=0,004).(45)
7) Alelo G no ATG16L1 rs2241880: comportamento estenosante (OR 1,27;
IC: 1,07-1,50; p=0,005) e doença perianal (OR 1,19; IC: 1,01-1,40; p=0,035).(45)
8) Variante DLG5 R30Q: doença corticorresistente (OR 2,4; 95% IC: 1,3-4,5;
p=0,013).(39)
Observou-se que os doentes com maior número de alelos de risco nas
variantes genéticas NOD2, IBD5, DLG5, ATG16L1 e IL23R apresentavam uma
idade de diagnóstico mais jovem (p=0,048), comportamento estenosante ou
penetrante (p=0,001) e maior necessidade de intervenções cirúrgicas (p=0,03).
No entanto, esta associação tornou-se não significativa após 10 anos de evolução de doença, reflectindo que outros factores (nomeadamente ambientais,
terapêuticos) contribuem para a evolução a longo prazo da doença.(45)
Outros estudos mostraram ainda uma correlação entre alterações genéticas e marcadores serológicos na DC. Das variantes de NOD2/CARD15 com a
presença de ASCA.(46,56,57) AMCA(56) e ALCA,(57) verificando-se que a positividade
destes anticorpos antiglicanos se torna mais frequente à medida que o número
de mutações do gene NOD2/CARD15 aumenta.(56,57) Das mutações do NOD1/
CARD4 com uma maior prevalência de ASCA.(57) Por outro lado, verificou-se
uma relação inversa e com efeito número de mutações/prevalência reduzida
de anticorpos, entre as mutações TLR4 e ACCA e as mutações TLR2 e OmpC. (57)
Assim, as alterações genéticas parecem modular a sero-reatividade aos antigénios
microbianos, podendo ter um papel primordial na patogénese e prognóstico
da DC.(42,57)
Os polimorfismos genéticos associados à DC têm um potencial papel na
progressão da doença e podem vir a ter utilidade na estratificação de risco dos
doentes.(41,45) No entanto, ainda não estão definidos quais os marcadores genéticos associados a um curso agressivo de doença, e nenhuma das variantes
genéticas demonstrou sensibilidade e especificidade suficientes para serem
implementadas na clínica, não sendo possível elaborar uma classificação genética prognóstica.(40,42)
Existe alguma evidencia de actuação terapêutica em doentes com alteração
dos marcadores inflamatórios e assintomáticos?
A Gastroenterologia na Prática Clínica
105
Quando Indicar Agentes Biológicos na Doença Inflamatória do Intestino
Marcadores bioquímicos
Os doentes com marcadores bioquímicos de atividade (nomeadamente a
PCR e a calprotectina) têm maior probabilidade de recidiva. O contributo dos
marcadores biológicos (serológicos e fecais, sobretudo) tem a vantagem e o
atractivo de serem supostamente de fácil execução, não invasivos e permitirem
uma aferição mais correcta da atividade da doença, sobretudo no contexto de
remissão clínica e, eventualmente ajudar a prever o curso da doença.
Vários marcadores têm sido avaliados e propostos, com maior ou menor
utilidade e evidência variável, nomeadamente a PCR, velocidade de sedimentação (VS), albumina, leucograma, contagem plaquetas, orosomucoide, calprotectina fecal e outros. De todos os marcadores bioquímicos estudados, têm
especial destaque a PCR e a calprotectina fecal. A PCR é uma proteína de fase
aguda que em circunstâncias normais é produzida em pequenas quantidades
(< 1 mg/l) no hepatócito. Encontra-se ligeiramente elevada (10-40 mg/l) em
situações inflamatórias ligeiras e infecções víricas. Encontra-se mais elevada
(50-200 mg/l) em inflamações graves e infecções bacterianas e significativamente
elevada (> 200 mg/l) em situações inflamatórias muito graves e queimaduras
extensas. Tem uma semi-vida curta pelo que se eleva rapidamente no início
da situação inflamatória mas também reduz rapidamente após a resolução da
mesma. Apesar desta relação com as situações inflamatórias, é um marcador
com resposta muito heterogénea especialmente no que diz respeito à DC e à
CU.(58) É, no entanto, entre todos os marcadores laboratoriais estudados na DII,
o que mostra melhor desempenho e correlação com atividade da DII, sobretudo
da DC. A PCR tem importante papel na avaliação da resposta à terapêutica. A
terapêutica com anti-TNF foi mais eficaz em doentes com PCR > 5 mg/l quando
comparado com doentes com PCR < 5 mg/l, num estudo belga que incluiu 153
doentes tratados com infliximab.(59)
Os marcadores fecais de inflamação têm a vantagem de serem facilmente
acessíveis através de análise às fezes e de não estarem elevados em condições
inflamatórias extraintestinais, ao contrário dos marcadores serológicos. Traduzem, com elevada acuidade, inflamação da mucosa intestinal, o que pode evitar
alguns exames endoscópicos no seguimento dos doentes com DII. A calprotectina fecal representa 6% das proteínas citosólicas dos granulócitos. A presença
de calprotectina nas fezes é, portanto, directamente proporcional à migração
dos neutrófilos para o tracto digestivo. É o marcador fecal mais estudado e
com melhores resultados na DII. É um marcador sensível, mas não específico
106 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Fernando Magro
para inflamação intestinal, podendo estar também aumentado nas neoplasias
e infecções intestinais e pode também encontrar-se aumentada após toma de
AINEs e em doentes com idade avançada.
Um estudo de Fagan et al.(60) mostrou uma melhor correlação dos marcadores bioquímicos (nomeadamente a PCR) com a atividade da doença, mais na
DC que na CU. Solem et al.(61) estabeleceram uma importante correlação entre
PCR e atividades endoscópica e histológica, embora de forma mais significativa
na doença de Crohn que na colite ulcerosa. Num estudo prospetivo, Boirivant
et al.(62) constataram que num período de 2 anos o risco de recaída na DC
é maior em doentes com PCR elevada que nos doentes com PCR normal. O
grupo GETAID, através do trabalho de Consigny et al.,(63) em 2006 sugeriram
um score biológico baseado em parâmetros clínicos para prever possibilidade
de recidiva precoce em doentes com DC em remissão induzida por corticoterapia. Para isso, estudaram 71 doentes com medições de PCR e VS, de 6/6
semanas. Consideraram score positivo ou negativo, conforme positividade ou
negatividade dos 2 marcadores (PCR > 20 mg/l e VS > 15 mm). Da análise
multivariada destes factores, concluem que o risco relativo de recidiva precoce
em doentes com score positivo, comparada com os que têm score negativo é
de 8,0, com sensibilidade de 89% e especificidade de 43%. Brignola et al.(64)
propuseram também um índice para prever recidiva em doentes assintomáticos
com DC, em 1986. Analisaram 41 doentes com DC clinicamente inactiva através
de avaliação bioquímica de um painel de marcadores inflamatórios (VS, PCR,
albumina, alfa1-antitripsina…). Baseados nestes marcadores, estabeleceram
um índice de prognóstico que quando elevado previa maior probabilidade
de recidiva em 1-2 anos. Num estudo de base populacional, verificaram que
nos doentes com DC do íleon terminal, um valor de PCR > 53 mg/l é um
factor associado a um maior risco de cirurgia. Num trabalho de 2000, Tibble
et al.(65) avaliaram a permeabilidade intestinal e a inflamação como preditores
de recidiva de DII. Estudaram 43 doentes com DC e 37 com CU, em remissão
clínica e fizeram uma avaliação da calprotectina fecal em todos e, além desta
avaliação, nos doentes com DC fizeram também um teste de permeabilidade
intestinal. 58% dos doentes com DC e 51% com CU tiveram recidiva nos 12
meses seguintes. Os níveis médios de calprotectina no grupo com recidiva
diferiram significativamente do grupo sem recidiva (p<0,0001). Neste grupo
de doentes a sensibilidade e especificidade da calprotectina para prever recidiva foi de 90 e 83%, respectivamente (para todos os doentes com DII). Os
autores concluem que a calprotectina é útil para prever recidiva em doentes
A Gastroenterologia na Prática Clínica
107
Quando Indicar Agentes Biológicos na Doença Inflamatória do Intestino
com DII e sugerem que poderá ser um indicador para iniciar tratamento mais
precocemente em doentes assintomáticos.
Tibble et al.(65) demonstraram que para a calprotectina fecal um cut off de
30ug/g tem uma sensibilidade de 100% para distinguir entre DC activa e síndrome
do cólon irritável. Fagerberg et al.(66) verificaram que em doentes pediátricos com
suspeita de inflamação do cólon a calprotectina pode ser um marcador muito
útil e, na presença de um teste positivo, deve orientar para endoscopia. Roseth
et al.(67) mostraram que a CF tem uma boa correlação com a atividade endoscópica e histológica em doentes com CU e com DC e que os valores elevados
daquela normalizam rapidamente após a resolução da inflamação. Gerasimidis
et al.(68) avaliaram as diferenças na determinação seriada (4 amostras durante o
tratamento) de calprotectina fecal em 15 crianças com DC tratadas com nutrição
entérica exclusiva. Neste estudo piloto, a calprotectina diminui em doentes que
alcançam remissão clínica e pode ser útil para prever resposta ao tratamento.
Parece que o valor da calprotectina fecal é maior para prever recidiva clínica
na CU que na DC, segundo conclusão de um estudo de Costa et al.(69) em que
foram avaliados 79 doentes com DII em remissão clínica, sendo 38 com DC e
41 com CU. Concluíram que valores de 150 ug/g ou superiores eram preditivos
de recaída a um ano. A sensibilidade foi elevada quer na DC (87%) quer na CU
(89%) mas a especificidade foi muito mais baixa na DC (43%) que na UC (82%).
Vários trabalhos corroboram esta evidência de que os níveis de calprotectina fecal
elevados significam inflamação activa e que em doentes assintomáticos ajudam
a distinguir entre aqueles que têm maior ou menor probabilidade de recidiva.
Marcadores endoscópicos
Os doentes com atividade endoscópica ou com lesões mais graves, têm
pior prognóstico, designadamente, menor probabilidade de remissão mantida
e maior risco de cirurgia. Em 2002 Allez et al.(70) concretizaram um trabalho
cujo objectivo foi verificar se a existência de lesões endoscópicas graves (LEG),
definidas pela existência de úlceras extensas e profundas em mais de 10%
de pelo menos um segmento colo-rectal, tinha valor preditivo relativamente
ao risco de desenvolver complicações penetrantes (abcessos e/ou fístulas) e
à necessidade de colectomia. Dos 102 doentes incluídos, 53 tinham LEG na
colonoscopia índex e, durante um follow-up médio de 52 meses, 6 doentes
desenvolveram complicações penetrantes e 37 foram alvo de colectomia. A
análise cruzada destes dados revelou que o risco de colectomia e de desenvol-
108 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Fernando Magro
ver complicações penetrantes foi significativamente superior nos doentes que
tinham LEG na colonoscopia índex. Pormenorizando, a incidência cumulativa
de colectomia foi de 31% vs. 6% após 1 ano, 42% vs. 8% após 3 anos e de 62%
vs. 18% aos 8 anos, nos doentes com e sem LEG, respectivamente. Relativamente aos 6 doentes que desenvolveram complicações penetrantes, todos tinham
LEG na colonoscopia índex. No subestudo endoscópico do ACCENT I(71) foi
analisada a proporção de doentes que apresentavam cicatrização da mucosa
às semanas 10 e 54 e qual a sua influência no curso clínico, nomeadamente no
número de hospitalizações. Apesar dos doentes com cicatrização da mucosa
em ambas as observações terem uma taxa de hospitalizações (0,0%) inferior
à dos que apresentavam cicatrização apenas numa das visitas (18,8%), a qual,
por sua vez, foi inferior à dos doentes que apresentavam lesões em ambas as
ocasiões (28,0%), os resultados não atingiram significado estatístico. Numa série
de base populacional o impacto da cicatrização da mucosa ao fim do primeiro
ano foi correlacionado com o percurso clínico nos quatro anos seguintes. Os
doentes com cicatrização da mucosa apresentaram menor atividade inflamatória
(endoscopia) e menor necessidade de corticosteroides a longo prazo. Apesar
de ter sido objectivada uma tendência para menor necessidade de cirurgia e
menos complicações locais os valores não alcançaram significado estatístico.(72)
Num estudo proveniente de um único centro(73) o impacto da cicatrização da
mucosa foi avaliado através da realização de uma segunda colonoscopia após
terem iniciado infliximab. A cicatrização (total ou parcial) foi observada em 68%
dos doentes que responderam à terapêutica e verificou-se que estes doentes
apresentaram uma taxa de cirurgia abdominal (14,1%) significativamente inferior à dos doentes sem cicatrização da mucosa (38,4%). Uma análise post-hoc
do estudo EXTEND(74) permitiu verificar que os doentes com cicatrização da
mucosa à semana 12 tinham, em comparação com os doentes sem cicatrização
da mucosa, uma diminuição do CDAI à semana 52 significativamente superior
(46 pontos) e uma melhoria no índice de qualidade de vida às semanas 28
e 52 (p<0,05). Além disso, os doentes com SES-CD (Simple Endoscopic Score
for Crohn’s Disease) elevado tinham associada uma menor probabilidade de
remissão clínica à semana 52 (OR 0,6; p<0,05).
Finalmente, num outro estudo(75) no qual se compararam duas estratégias
terapêuticas (step-up versus top-down) verificou-se que os doentes que apresentaram cicatrização da mucosa aos 2 anos (SES-CD de 0) mantiveram remissão
clínica nos 2 anos seguintes em 70% dos casos contra 22% nos que mantinham
alterações endoscópicas.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
109
Quando Indicar Agentes Biológicos na Doença Inflamatória do Intestino
Embora haja evidência suficiente de que a presença de marcadores laboratoriais alterados ou a existência de lesões endoscópicas, em doentes
assintomáticos, esteja relacionada com uma evolução clínica negativa, não
existem estudos que suportem a necessidade de uma alteração (escalada)
terapêutica nestes doentes.
Existem, de facto, muito poucos estudos que se dirijam a esta questão
específica. Lennard-Jones et al.(76) avaliaram a eficácia da sulfassalazina em
evitar a recorrência clínica em doentes com DC assintomática mas com lesões endoscópicas. Foi um estudo pequeno (43 doentes) e que envolveu
quer doentes submetidos a ressecção cirúrgica, quer doentes não operados.
Num período de um ano verificou-se, em ambos os grupos, que a incidência
de recidiva clínica nos doentes a tomar sulfassalazina foi semelhante à dos
doentes expostos ao placebo. O único estudo que testou, com um número
satisfatório de doentes e com um desenho apropriado, o eventual benefício
da intensificação do tratamento em doentes com remissão medicamente induzida mas com manutenção de atividade endoscópica, foi conduzido por
Landi et al.,(77) publicado em 1992. Neste estudo multicêntrico do GETAID, 147
doentes foram inicialmente tratados com prednisolona. Dos 136 que entraram
em remissão 96 apresentavam ainda alterações endoscópicas. Esses doentes
foram aleatorizados em dois grupos, um em que a redução progressiva da
corticoterapia foi imediatamente iniciada e outro, no qual o tratamento foi
mantido por 5 semanas adicionais. Verificou-se que o curso clínico a curto e
a médio prazo (18 meses) foi sobreponível nos dois grupos e semelhante ao
dos doentes sem lesões endoscópicas no final do tratamento inicial. Existem
algumas evidências indirectas de que uma alteração/ escalada terapêutica
neste tipo de doentes possa ser benéfica. Na prevenção da recorrência póscirurgia, a azatioprina parece ser eficaz na redução da recorrência clínica na
presença de lesões endoscópicas.(77,78)
Conclusões
É importante a introdução mais precoce e atempada da imunossupressão
e da terapêutica biológica na DII. Para o efeitos devemos identificar grupos
de pior prognóstico ou reconhecer marcadores biológicos de actividade que
possam identificar os grupos adequados de atuação intensiva.
110 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Fernando Magro
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Agradecimentos: Parte deste texto foi elaborada com base num consenso português (DC 2)
sobre terapêutica na doença de Crohn realizado em abril de 2011 e patrocinado pela Merck. O
texto integral será publicado no Jornal Português de Gastrenterologia.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
115
116 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 12
Constipação Intestinal
Refratária: Qual
é a Sequência
Propedêutica?
Dra. Lucia Camara Castro Oliveira
A
constipação intestinal é um sintoma comum, com uma prevalência estimada em torno de 15% da população, sendo causa frequente de
consultas médicas nos ambulatórios e consultórios de gastroenterologia
e coloproctologia.(1)
Felizmente, raramente associa-se a condições que podem levar ao óbito,
sendo importante diferenciarmos a constipação decorrente de uma doença orgânica, como o câncer colorretal, da constipação funcional, identificando-se assim
indivíduos nos quais uma avaliação diagnóstica especializada será necessária,
porém evitando-se exames desnecessários.
As recomendações para a investigação de pacientes constipados devem levar
em consideração o custo-benefício da propedêutica utilizada, proporcionando
também melhorias na qualidade de vida destes pacientes.
A definição de constipação refratária permanece pouco esclarecida na literatura, mas se levarmos em consideração alguns aspectos descritos nos critérios
de Roma III,(2) poderíamos dizer que um paciente tratado entre três meses e um
ano sem uma melhora clínica baseada no aumento do número de evacuações
semanais poderia apresentar uma constipação refratária. A dificuldade conceitual
que o profissional pode enfrentar nestes casos reside no fato de alguns pacientes
não apresentarem melhora com as medidas iniciais devido a uma intolerância
ao tratamento instituído, principalmente intolerância à introdução de fibras que
causam flatulência, por não responderem realmente ao tratamento ou por não
terem acesso ao mesmo.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
117
Constipação Intestinal Refratária: Qual é a Sequência Propedêutica?
Quadro 1. Métodos de investigação funcional
Tempo de trânsito colônico com marcadores
Cintigrafia
Manometria anorretal
Teste de expulsão do balão
Cinedefecografia
Ultrassonografia endoanal dinâmica ou ecodefecografia
Ressonância magnética dinâmica ou defecorressonância
Eletromiografia anal
Teste do hidrogênio expirado
Quadro 2. Causas de constipação refratária
Inércia colônica (IC) ou constipação de trânsito lento com megaintestino
Inércia colônica (IC) ou constipação de trânsito lento sem megaintestino
Inércia colônica (IC) ou constipação de trânsito lento como parte de uma síndrome de
dismotilidade generalizada do intestino (dismotilidade pan-entérica)
Disfunção do Assoalho Pélvico (DAP) com anormalidades anatômicas: doença de Hirschsprung,
queda do períneo, retocele, sigmoidocele, intussuscepção ou invaginação retal.
Disfunção do Assoalho Pélvico (DAP) sem anormalidades anatômicas: contração paradoxal do
puborretal, espasmo do elevador
Constipação de trânsito lento associada a disfunção do assoalho pélvico
Afastadas as causas orgânicas e corrigidos os erros alimentares, iniciamos a
investigação da constipação refratária solicitando exames que visam à investigação de um distúrbio de motilidade (quadro 1), principalmente objetivando-se
o diagnóstico de condições como a inércia colônica e a síndrome de obstrução
de saída, representada pelas diferentes situações que causam um obstáculo à
evacuação (quadros 2 e 3).
Em geral, os primeiros exames solicitados são o tempo de trânsito colônico
e a manometria anorretal.
Existem diferentes métodos de avaliação do trânsito colônico, sendo o mais
utilizado o método de marcadores radiopacos, representando o de menor custo
e maior simplicidade.(3) Uma cápsula com 24 marcadores é ingerida (Sitzmark’s)
e o tempo de chegada ao reto é determinado através de radiografias abdominais
realizadas no quinto e sétimo dia. Em indivíduos normais, 80% dos marcadores
passam até o 5º dia após a ingestão e a totalidade deles já foi eliminada até
o 7º dia. Este teste simples permite identificar três situações básicas: aqueles
118 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Lucia Camara Castro Oliveira
Quadro 3. Algoritmo de investigação da constipação refratária
Constipação refratária
Tempo de trânsito colônico
(marcadores ou cintigrafia)
Normal
Marcadores
distribuidos pelo cólon:
inércia colônica
Avaliação do tubo digestivo alto:
trânsito delgado, esvaziamento
gástrico, teste hidrogênio expirado
Manometria gastrica
Patológico
Distúrbio da motilidade
pan-entérica
Normal
Marcadores na região
retossigmoide
Síndrome obstrução
saída
Manometria anorretal
Teste expulsão balão
Cinedefecografia
Eletromiografia
Ecodefecografia
Defecorressonância
Funcional
Anismo
Proctologia
Anatômico
Retocele
Sigmoidocele
Enterocele
pacientes com tempo de trânsito normal, os que têm uma retenção em todo o
cólon (figura 1) e os que têm uma obstrução de saída (figura 2).
A cintigrafia também vem sendo utilizada com este propósito, sendo entretanto associada a um maior custo. Esta técnica envolve, basicamente, a marcação
de um composto com um radionuclídeo que emite radiações gama, permitindo,
assim, o seu acompanhamento exterior através do uso de uma gamacâmara.(4)
A manometria anorretal tem importância na constipação para a avaliação
A Gastroenterologia na Prática Clínica
119
Constipação Intestinal Refratária: Qual é a Sequência Propedêutica?
 Figura 1. Tempo de trânsito colônico na inércia.
 Figura 2. Tempo de trânsito colônico na
defecação obstruída.
da presença do reflexo inibitório retoanal, do tônus da musculatura lisa involuntária, da capacidade, complacência e limiar de sensação retal.(5) Pode ser
utilizada também como o primeiro método funcional na suspeita de anismo, ou
dissinergia do assoalho pélvico. É ainda um exame importante nos pacientes
com suspeita de megacólon congênito ou doença de Hirschsprung: a avaliação
do reflexo retoanal é simples e de fácil obtenção. Nestes pacientes, não observamos o relaxamento do esfíncter interno normal, em resposta à distensão
retal, o que indica a presença da aganglionose. Por outro lado, a presença do
reflexo praticamente exclui o diagnóstico.
A displasia neuronal intestinal (DNI) é caracterizada por uma redução da
motilidade do intestino grosso devido a anormalidades do sistema nervoso entérico e pode ser diagnosticada logo após o nascimento ou simular a doença
de Hirschsprung. Portanto, em casos selecionados, a manometria poderia ser
importante na diferenciação destes casos.
Caso a avaliação inicial do trânsito colônico demonstre uma retenção dos
marcadores em todo o cólon, a hipótese de um distúrbio de motilidade do tipo
inércia colônica é o principal diagnóstico (quadro 4).
Nestes casos, a investigação de um distúrbio motor de todo o tubo digestivo
deve ser realizada, através do teste de hidrogênio expirado e outros métodos
de motilidade do tubo digestivo, como o trânsito de delgado, a manometria
gastroduodenal e a avaliação do esvaziamento gástrico.
120 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Lucia Camara Castro Oliveira
O teste do hidrogênio expirado possui limitações, sendo porém de simples
realização, permitindo a avaliação do tempo de trânsito orocecal e auxiliando
na diferenciação da inércia colônica isolada, da hipomotilidade intestinal generalizada. O paciente é orientado a ingerir 10 a 20 gramas de lactulose, que,
ao ser metabolizada pelas bactérias intestinais, produz ácidos graxos e gás
hidrogênio.(6) O hidrogênio, por tratar-se de um gás de fácil difusão, pode ser
coletado e analisado através de um aparelho próprio. São colhidas amostras
de ar expirado pelo paciente a cada 10 minutos em um intervalo de 2 horas.
O indivíduo é considerado produtor quando a concentração de hidrogênio
expirado exceder 2 ppm (partes por milhão) em qualquer fase do teste. Cinco
Quadro 4. Algoritmo de investigação e tratamento da inércia colônica
Constipação refratária
Tempo de trânsito colônico
(marcadores ou cintigrafia)
Retenção em todo o cólon
(1) INÉRCIA COLÔNICA
Laxante osmótico
Melhora
inalterado
repetir TTC
Retenção dos marcadores
Teste hidrogênio expirado
Manometria gastroesofagiana
(afastar distúrbio de motilidade de todo o TGI)
considerar procinéticos
probióticos
inalterado
melhora
neuromodulação
ou cirurgia
manter
A Gastroenterologia na Prática Clínica
121
Constipação Intestinal Refratária: Qual é a Sequência Propedêutica?
a 20% dos indivíduos considerados normais apresentam uma deficiência de
bactérias metabolizadoras de hidrogênio, inviabilizando o exame.
A retenção dos marcadores na região do retossigmoide ou ampola retal após
o quinto dia sugere um distúrbio da defecação e neste caso associamos também
algum método de imagem para a avaliação dinâmica da defecação, tais como a
cinedefecografia, a ecodefecografia ou a defecorressonância (quadro 5).
Todos estes métodos de imagem são complementares e podem diagnosticar
retoceles, invaginação ou prolapso interno do reto, sigmoidoceles e contração paradoxal do puborretal. Neste último caso, a contração paradoxal do
puborretal ou anismo pode ter sido suspeitado durante a manometria e cinedefecografia, mas deve ser confirmado através da eletromiografia anal, único
exame que permite a demonstração fidedigna do não relaxamento muscular
nas tentativas de expulsão através do aumento dos potenciais de ação. Na
Quadro 5. Algoritmo de Investigação e tratamento da síndrome de obstrução de saída
Constipação refratária
Tempo de trânsito colônico
(marcadores ou cintigrafia)
retenção na ampola retal
Manometria anorretal e teste expulsão balão
não relaxamento do puborretal
Hipertonia anal e não eliminação do balão
SÍNDROME DE OBSTRUÇÃO DE SAÍDA
Cinedefecografia
Ecodefecografia
Defecorressonância
Retocele > 4 cm
sintomática
retocele
anismo
Biofeedback/Toxina botulínica
sigmoidocele, enterocele
Enterocele/Sigmoidocele Grau III
Tratamento cirúrgico
122 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Lucia Camara Castro Oliveira
prática clínica, entretanto, a eletromiografia é um método pouco acessível e
de baixa tolerância pelos pacientes. Assim, em nosso meio é pouco realizado,
sendo substituído pelos métodos disponíveis menos complexos.Entre eles,
citamos o teste de expulsão do balão, que por representar um método simples,
torna-se muito útil em clínicas ou hospitais de recursos escassos. Este teste é
realizado através do próprio cateter de manometria anorretal, acoplando-se
um balão de látex na sua extremidade. O balão é posicionado na região da
ampola retal, sendo então preenchido com 50 ml de água destilada. Neste
momento, é solicitado ao paciente que realize movimentos evacuatórios na
tentativa de expelir o balão. Sua principal aplicação encontra-se no diagnóstico
das chamadas obstruções de saída, as quais inviabilizam a perfeita expulsão
do balão.(7)
A cinedefecografia foi o primeiro método radiográfico capaz de avaliar a
dinâmica da evacuação, fornecendo dados importantes como o grau de abertura do canal anal, descida perineal durante a fase de expulsão e esvaziamento
retal.(8) Permite ainda o diagnóstico de alterações anatomofuncionais, como a
contração paradoxal do músculo puborretal ou anismo, retoceles, sigmoidoceles,
prolapso retal e intussuscepção ou invaginação retal. O exame é realizado com
o paciente sentado em uma cômoda especialmente desenhada para simular um
assento sanitário, integrada a um aparelho de radioscopia. Após a introdução
de bário líquido e de uma pasta baritada na ampola retal, o paciente é solicitado a evacuar o meio de contraste enquanto se observa a dinâmica de sua
evacuação. Realiza-se a gravação de toda a sequência da evacuação, bem como
radiografias com o paciente nas posições de repouso, contração, expulsão e
após evacuação. A necessidade da utilização da radioscopia vem trazendo limitações ao método e recentemente novas abordagens da dinâmica da defecação
vêm sendo propostas, principalmente através da ressonância magnética e da
ultrassonografia tridimensional.
A defecorressonância (DRM) magnética é uma nova modalidade de imagem
dos órgãos da pelve, que possibilita a avaliação de todo o assoalho pélvico e
os compartimentos da pelve, tanto em repouso como de forma dinâmica, fornecendo assim informações essenciais para o planejamento cirúrgico e escolha
do melhor método de tratamento para os diferentes distúrbios que afetam o
mecanismo da defecação.(9) A avaliação dinâmica da defecação é claramente
demonstrada nas três modalidades, mesmo quando a avaliação é realizada na
posição de decúbito. A DRM pode avaliar a abertura do canal anal e do ângulo
anorretal durante a contração esfincteriana e o esforço evacuatório, e a elimi-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
123
Constipação Intestinal Refratária: Qual é a Sequência Propedêutica?
nação do gel de ultrassom utilizado como contraste pode ser quantificada. A
parede retal também pode ser avaliada, e alterações tais como retocele, enteroceles e intussuscepção podem ser claramente identificadas.
A introdução dos transdutores tridimensionais vem permitindo a utilização
da ultrassonografia endoanal para a avaliação dos distúrbios da defecação.(10)
Assim, a demonstração de retoceles, cistoceles, invaginações internas, enteroceles e até pacientes com anismo culminou na denominação de ecodefecografia
para este tipo de avaliação. Os pacientes são avaliados na mesma posição de
decúbito lateral esquerdo e o exame permite avaliar todo o complexo esfincteriano e a relação dinâmica do reto com a vagina e bexiga após introdução de gel
de ultrassom na ampola retal. As vantagens da ecodefecografia são a ausência
de radiação, a possibilidade de demonstração dos distúrbios do assoalho pélvico e da musculatura esfincteriana. Retoceles podem ser bem demonstradas e
classificadas de acordo com o seu tamanho, sendo este critério utilizado para
a recomendação cirúrgica: retoceles maiores do que 3 cm em pacientes com
sintomas de evacuação obstruída e necessidade de manobras digitais em geral
se beneficiam do tratamento cirúrgico.(11)
A avaliação funcional nos pacientes com constipação refratária tem como
objetivo principal identificar as condições citadas na tabela 2, possibilitando
assim oferecer um tratamento individualizado para cada um destes distúrbios
funcionais. O tratamento conservador através de medidas clínicas e biofeedback
anal deve ser realizado por pelo menos seis meses. O tratamento cirúrgico,
quando necessário, deve ser indicado baseando-se primeiramente no quadro
clínico do paciente, evitando-se tratar um exame e não o doente. O tratamento
cirúrgico deve ser reservado para uma minoria dos pacientes. A colectomia
subtotal com anastomose ileo-retal é a opção mais indicada nos casos de inércia
colônica.(12) A ressecção segmentar do cólon pode ser uma boa opção para o
megassigmoide isolado, sigmoidocele ou volvo sigmoidiano recorrente. Pacientes
com dismotilidade pan-entérica não são bons candidatos cirúrgicos, bem como
aqueles que apresentam algum distúrbio psiquiátrico obsessivo-compulsivo. Para
aqueles que receberam alguma indicação cirúrgica, é fundamental informar-lhes
que alguns sintomas pré-operatórios, principalmente dor ou distensão abdominal poderão persistir, mesmo que a cirurgia normalize a frequência intestinal.
Pacientes com problemas clínicos associados podem ser melhor tratados através
da derivação intestinal, sem a ressecção do cólon, quer para uma tentativa de
diagnóstico quer como uma manobra terapêutica.
Novas drogas procinéticas, como o lubiprostone e o prucalopride poderão
124 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Lucia Camara Castro Oliveira
contribuir para o manejo conservador dos casos mais refratários. O lubiprostone é um ácido graxo oral bicíclico que, seletivamente, ativa os canais de cloro
tipo 2 na membrana apical do epitélio gastrointestinal, resultando em aumento
da secreção de fluidos.(13) O prucalopride é um agonista dos receptores 5-hidroxitriptamina, aumentando assim a motilidade intestinal.(14)
O uso de probióticos na constipação tem demonstrado resultados satisfatórios em algumas situações, como nos pacientes com doença de Parkinson,
não havendo entretanto evidências suficientes para que sejam recomendados
rotineiramente.
A neuromodulação ou estimulação sacral é uma nova modalidade de tratamento minimamente invasiva, que embora ainda de alto custo e com mecanismo
pouco esclarecido, vem demonstrando resultados promissores para o tratamento
da constipação refratária.(15)
Embora estudos prospectivos e randomizados sejam necessários para o estabelecimento dos protocolos utilizando estas recentes aquisições, felizmente,
na maioria dos casos, a constipação pode ser tratada com sucesso através de
terapias convencionais.
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126 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 13
Doença de Crohn:
Tratar Sempre?
Dr. Carlos Alexandre Antunes de Brito
A
doença de Crohn (DC) faz parte do Grupo das Doenças Inflamatórias Intestinais (DII) e difere da Retocolite Ulcerativa Idiopática (RCUI)
por ter localização anatômica ampla, podendo acometer todo o trato
gastrointestinal. Não há cura e o arsenal terapêutico disponível apresenta respostas variáveis e está associado a efeitos adversos.
Nos EUA, a prevalência de RCUI e de DC é 11 por 100.000 e 7 por 100.000
habitantes, respectivamente. Os estudos na Ásia e América são limitados, porém
classicamente aceitos como regiões de baixa prevalência, com prevalência de
0,5 e 0,08 para RCUI e DC, respectivamente. Porém, estes resultados podem
estar subestimados, em virtude do limitado número de trabalhos publicados
nestas regiões. Mas recentemente publicações nestas regiões vêm registrando
um aumento de casos, com prevalências variáveis que vão de 7,5/100.000 habitantes em Cingapura a valores tão altos quanto 44,3/100.000 habitantes na
Índia para RCUI.(1,2)
No Brasil não há estudos de prevalência publicados em revistas indexadas,
porém observa-se crescente aumento do número de casos e de unidades ambulatoriais para atendimento específico destas patologias, bem como padronização
de medicamentos especiais pelas Secretarias de Saúde fornecida gratuitamente.(3)
A doença de Crohn está associada a importante morbidade, caracterizada
pela sua cronicidade, com frequentes recidivas, necessidade de uso prolongado
de medicamentos, frequentemente associados a efeitos adversos, que incluem
sintomas gástricos, imunossupressão e até desenvolvimento de neoplasias. Com-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
127
Doença de Crohn: Tratar Sempre?
plicações graves como hemorragias, obstrução intestinal, perfuração, neoplasias
e necessidade de múltiplas cirurgias como ocorre na DC reforçam ainda mais
o impacto da doença. Há ainda os custos com a DII, estimados nos EUA em
cerca de $ 500 milhões, com 250.000 consultas, 20.000 hospitalizações, com
um custo adicional de $ 1 milhão considerando os dias não trabalhados, por
atingir uma faixa etária economicamente ativa. Novas drogas surgiram para o
tratamento da doença, como anti-TNF, indicado inicialmente para a doença de
Crohn fistulosa, doença grave, não responsiva à terapia usual. Em virtude do
aumento da demanda de pacientes com indicação da utilização desta droga no
Brasil, centro de infusões em hospitais públicos têm sido criados em todo o
país para administração da mesma. O custo por paciente com esta nova terapia
no primeiro ano é em média de 250.000 reais.
Na DC o sítio da doença influencia a manifestação clínica. Até 50% dos pacientes podem apresentar acometimento de íleo e cólon, principalmente íleo
terminal e ceco. Cerca de um terço apresentam envolvimento limitado ao delgado, principalmente íleo terminal, podendo também envolver áreas salteadas
do jejuno, enquanto aproximadamente 20 a 25% terão apenas acometimento
do cólon. DC de esôfago, estômago ou duodeno é rara e geralmente associa-se
a acometimento de íleo e/ou cólon.(4)
Doença perianal é outra manifestação comum da DC, podendo preceder
em anos os sintomas intestinais. Os achados podem ser caracterizados como
lesões cutâneas ou do canal anal e fístulas perianais, com formação de fissuras,
abscessos e estenose do canal anal. A manifestação perianal é mais comum
quando há envolvimento colônico.
O escore mais utilizado para determinação da gravidade do acometimento
e da atividade inflamatória da DC é o CDAI (Crohn’s Disease Activity Index),
que é utilizado principalmente em trabalhos científicos para definição de remissão clínica (CDAI < 150) e para acompanhamento de resposta ao tratamento.
Classifica a doença de acordo com a pontuação em leve (150-220), moderada
(220-450) e intensa (> 450)(tabela 1).
Doença de Crohn: tratar sempre?
Apesar do espectro amplo de apresentação clínica da doença, podendo estar associado a morbidade e complicações graves, uma parte significativa dos
pacientes apresenta uma doença localizada e de leve intensidade, surgindo por
parte dos especialistas um questionamento se para todo paciente com doença
128 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Carlos Alexandre Antunes de Brito
Tabela 1. Grau de atividade de doença em DC
Leve
Moderada
Intensa
CDAI de 150-220,
Ambulatorial, comendo
e bebendo, < 10% de
perda de peso. Sem
clínica de obstrução, febre,
desidratação, massa
abdominal, ou dor. PCR
usualmente aumentado
acima do limite superior da
normalidade
CDAI de 220-450
Vômito intermitente, ou perda
de peso > 10%. Tratamento
para doença leve inefetivo,
ou massa dolorosa. Sem
obstrução. PCR usualmente
aumentado acima do limite
superior da normalidade
CDAI > 450
Caquexia (IMC < 18 kg m2),
ou evidência de obstrução
ou abscesso. Persistente
sintomas apesar de
tratamento agressivo.
PCR elevado.
Obs.: sintomas de obstrução nem sempre estão relacionados à atividade inflamatória e podem ser
investigados com adicional método de imagem.
de Crohn deve ser iniciada terapia para indução de remissão e prescritas drogas para manutenção. O Consenso Europeu (ECCO, 2010) sugere como opção
não instituir nenhum tratamento para doença ativa em pacientes com doença
ileocecal com sintomas leves e o mesmo para manutenção após a primeira
apresentação de doença localizada, em casos que não necessitaram de corticoide. É importante ressaltar que o grupo considerou esta recomendação com
nível de evidência científica baixa e baseado na opinião dos especialistas (EL5,
RG D, Oxford Center MBE).(5)
Na prática clínica, os especialistas não se sentem seguros em deixar o paciente sem medicamentos, baseados no argumento que podem evoluir para
uma forma agressiva da doença ou apresentarem complicações graves.
Para nortear a tomada de decisão diante desta discussão é necessário analisar alguns aspectos da doença de Crohn, respondendo a outros importantes
questionamentos:
1. Qual a história natural da doença? Definir a frequência de doença leve na
primeira apresentação não é suficiente, mas é preciso traçar o perfil de
progressão desta doença;
2. Há marcadores clínicos, epidemiológicos e laboratoriais que permitam
definir pacientes de risco para doença progressiva norteando a decisão
terapêutica? A cicatrização da mucosa pode influenciar a história natural
da doença?
3. Apenas as manifestações clínicas e marcadores de atividade inflamatória
são suficientes para monitorizar estes pacientes sem terapia?
A Gastroenterologia na Prática Clínica
129
Doença de Crohn: Tratar Sempre?
4. Há uniformidade na conduta de apenas observar pacientes com doença
leve? O que recomendam os consensos?
Qual a história natural da doença?
A argumentação de que apenas uma parte dos pacientes com doença de
Crohn evolui para formas intensas respalda os que defendem não introduzir
terapia medicamentosa para todos os pacientes. Um estudo dinamarquês, com
seguimento de mais de 20 anos, observou que após o primeiro ano de doença,
55% dos pacientes tinham doença em remissão e outros 15% doença com baixa
atividade inflamatória.(6) Um outro estudo, em uma coorte de base populacional,
mostrou que 65% do tempo de seguimento de 174 pacientes era caracterizado
por doença em remissão.(7)
Porém, os resultados de outros estudos mostram uma realidade diferente,
com padrão de evolução diferente dos trabalhos iniciais. No estudo de Cosnes,(8)
envolvendo 2002 pacientes seguidos por até 20 anos, demonstrou-se que em 5
e 20 anos a presença de apenas doença inflamatória era de 50% e 12%, respectivamente, porém o risco de doença penetrante foi de 40 e 70% e de doença
estenosante de 12 e 18%, respectivamente. Nesse estudo observa-se baixo
percentual de utilização de terapia mais agressiva como imunossupressores.
Um estudo de base populacional na Dinamarca analisou pacientes em três
coortes de 1962 a 2004, com média de seguimento de 17 (1962-1987), 10 (19911993) e 1 (2003-2004) anos para as três coortes, respectivamente.(9) Em seu curso
a doença nos primeiros cinco anos era considerada moderada e intensa em
55,7% e 24,5%, respectivamente, na coorte 1 e de 57% e 24,5% na coorte 2, com
apenas 19,8% e 18,4% de doença indolente nas duas cortes, respectivamente.
Apenas no segundo período do estudo há utilização de imunossupressor e em
apenas 28% dos pacientes, podendo tal evolução estar relacionada a uma terapia
menos agressiva nos pacientes, com a terapia limitada ao uso de corticoide e
sulfassalazina.
No estudo de Loly C, 37,4% de 361 pacientes evoluíram para doença intensa em 5 anos e 57,9% apresentaram doença incapacitante, definida como
a presença de pelo menos 1 dos seguintes critérios: mais que dois cursos de
corticoide; corticodependência; necessidade de hospitalização; sintomas crônicos incapacitantes; necessidade de imunossupressor; ressecção intestinal ou
cirurgia perianal.(10)
Mais recentemente o estudo de Pigneur B avaliou pacientes com doença
de início na infância e na fase adulta com duração média de 15 anos, subme-
130 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Carlos Alexandre Antunes de Brito
tidos a diferentes terapias; a atividade de doença declinou ao longo dos anos
de doença, com atividade presente em 37% do grupo de início na infância e
em apenas 31% dos pacientes com doença de início na fase adulta.(11) Com
dez anos de doença o percentual livre de doença estenosante e penetrante
era superior a 75%. Neste estudo, o uso de imunossupressor (azatioprina) era
prevalente, sendo prescrito para 71% dos pacientes jovens e em 61% dos com
início na fase adulta.
Apesar de diferenças de resultados entre estudos, muitos trabalhos apontam
para um padrão de doença agressiva em um grupo significativo de portadores
da DC, e trabalhos como os de Pigneur B reforçam que a instituição de terapia
após o diagnóstico, incluindo utilização de imunossupressor, pode mudar a
história natural da doença e evitar suas complicações, justificando-se instituir
terapia para todos os doentes.(11)
Há marcadores clínicos, epidemiológicos e laboratoriais que
permitam definir pacientes de risco para doença progressiva
norteando a decisão terapêutica? A cicatrização da mucosa
pode influenciar a história natural da doença?
Por se tratar de doença crônica e recidivante, com evolução variável, uma
alternativa seria identificar marcadores capazes de predizer quais os pacientes
de risco para desenvolver a forma grave da doença e consequentemente na
ausência destes não instituir terapêutica medicamentosa no momento do diagnóstico. Diferentes estudos têm analisado pacientes que evoluíram no curso
de sua doença com uma forma agressiva e incapacitante, identificando como
preditores de desfecho desfavorável doença iniciada antes dos 40 anos, necessidade de uso de corticoide para controle de atividade no primeiro episódio de
atividade, doença perineal, doença acometendo o delgado.
Um estudo francês analisou a evolução de 1.526 pacientes e considerou
como doença grave, incapacitante, os pacientes que ao longo da observação
de 5 anos apresentavam pelo menos um dos seguintes critérios: mais que
dois cursos de corticoide; corticodependência; necessidade de hospitalização;
sintomas crônicos incapacitantes; necessidade de imunossupressor; ressecção
intestinal ou cirurgia perianal.(12) O estudo concluiu que os fatores associados a
uma doença agressiva foram: Uso de corticoide (OR 3.1); idade < 40 anos (OR
2.1); presença de doença perianal (OR 1.8); doença restrita ao delgado e que a
presença de 2 e 3 fatores de risco apresentava um valor preditivo positivo de
0,91 e 0,93 para doença intensa.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
131
Doença de Crohn: Tratar Sempre?
Em um outro estudo envolvendo 361 pacientes, acompanhados por 5 anos,
a partir do diagnóstico da doença, formas incapacitantes da doença estavam
associadas a necessidade de uso de corticoide para controlar o primeiro episódio de atividade de doença e início da doença abaixo de 40 anos não esteve
associado a risco, mostrando que nem sempre há uniformidade entre os estudos
na identificação de marcadores clínicos.(10)
Além dos marcadores clínicos-epidemiológicos, há estudos correlacionando
marcadores genéticos e sorológicos com prognóstico de doença, entre os candidados estão: mutações do gene NOD2/CARD5; anticorpos contra S. cerevisiae
(ASCA), pANCA, anti-OmpC, anti-I2, antiglycan.(13-15)
Apesar da identificação de marcadores associados às formas graves da
doença, ainda não existe uniformidade de resultados, nem evidências científicas
que demonstrem que na ausência dos mesmos o paciente não irá evoluir para
uma forma grave.
No momento, a presença destes marcadores está associada a um valor preditivo positivo mais alto para doença progressiva, ou seja, na presença do mesmo
o risco de evoluir para a forma grave pode ser alto, justificando instituir terapia
mais agressiva como imunossupressores e terapia biológica.
Porém, o tema em discussão diz respeito a predizer os pacientes que não
irão evoluir para doença intensa e permitir ao clínico não introduzir terapia
medicamentosa, e neste caso não há estudos que sinalizam um padrão de evolução para uma doença estável e em remissão na ausência destes marcadores.
Apenas as manifestações clínicas e marcadores de atividade
inflamatória são suficientes para monitorizar estes pacientes
sem terapia?
Um dos argumentos para não tratar pacientes com a forma leve da doença
é que os mesmos podem ser monitorizados e na presença de sintomas ou evidências de atividade (laboratorial e exames complementares) instituir a terapia.
Porém, diferente da RCUI, em que habitualmente a reativação da doença está
associada a diarreia com muco e sangue, na doença de Crohn, apesar de diarreia, dor abdominal e sintomas sistêmicos estarem frequentemente presentes,
a apresentação é heterogênea, podendo a reativação surgir apenas com dor
abdominal, ou mesmo com quadro de obstrução ou perfuração.
Na prática clínica não é infrequente pacientes com aparente remissão clínica
apresentarem atividade inflamatória de mucosa e evoluírem com estenose detectada por método endoscópico ou de imagem. A possibilidade de não ter o
132 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Carlos Alexandre Antunes de Brito
controle seguro da presença de atividade inflamatória e progressão de doença
para formas complicadas como estenose leva alguns especialistas a decidir por
tratar todos os pacientes diagnosticados.
A utilização de marcadores de atividade inflamatória como calprotectina
e lactoferrina fecal, proteína C-reativa (PCR) e VSH pode ser feita para a
monitorização destes pacientes. Na prática clínica, o PCR e VSH pelo baixo
custo estão acessíveis para o acompanhamento destes pacientes, porém os
níveis séricos são variáveis em diferentes pacientes. Métodos de imagem como
tomografia e ressonância podem detectar a presença de atividade inflamatória, diferenciando inclusive estenose de doença em atividade na doença de
delgado, porém o custo elevado limita a sua utilização no rastreamento de
atividade de doença.
Mais recentemente vem surgindo o conceito de que não é suficiente apenas
remissão clínica, mais também obter cicatrização da mucosa. Estudos mostram que comparados a pacientes com atividade macroscópica, aqueles com
cicatrização da mucosa teriam um menor risco de hospitalizações, de realizar
procedimentos cirúrgicos e ter remissão clínica sustentada.(16-19)
Estes dados reforçam ainda mais a necessidade de instituir terapia em todos
os pacientes com o objetivo de modificar a história natural da doença.
Há uniformidade na conduta de apenas observar paciente com
doença leve? O que recomendam os consensos?
A indicação de não instituir terapia nas formas leves e localizadas da doença
para alguns pacientes com sintomas leves, tanto para indução de remissão e
na manutenção é descrita pelo Consenso Europeu (ECCO, 2010), apesar de
não ser recomendação baseada em evidências científicas e classificada como
evidência (El 5, RG D, Oxford),(5) onde a indicação foi baseada em opinião
de especialistas, na ausência de estudos científicos conclusivos. É importante
ressaltar que para os casos com doença ileocecal leve, porém sintomáticos, o
consenso orientou iniciar terapia medicamentosa.
O Consenso Brasileiro (2010) considerou que pacientes com doença ileocecal leve podem permanecer sem terapia medicamentosa de manutenção após
entrar em remissão.(20)
No Consenso Britânico publicado em 2011 considerou-se que apenas para
pacientes diagnosticados incidentalmente ao realizar screening para câncer, a
terapia poderia não ser instituída.(21)
Os demais consensos recomendam tratamento de todos os pacientes diag-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
133
Doença de Crohn: Tratar Sempre?
nosticados, sem referência a conduzir algum subgrupo de doentes sem terapia
medicamentosa.(22-24) (tabela 2).
Conclusões
A doença de Crohn tem um padrão de doença com comportamento bastante
variável, porém são frequentes os casos que evoluem para a forma grave da
doença, com complicações como estenose e fístulas.
No momento não dispomos de marcadores de gravidade seguros, capazes
de predizer quais os pacientes que irão evoluir em remissão prolongada e consequentemente optar por não introduzir terapia medicamentosa.
A falta de correlação entre remissão clínica e inflamação de mucosa, e no
seguimento ambulatorial destes pacientes, com a possibilidade de progressão da
doença nestes casos, os estudos que demonstram que a terapia medicamentosa
pode mudar a história natural da doença e a possibilidade que a cicatrização da
mucosa melhore a evolução dos doentes, reforçam a necessidade de instituir
a terapia para todos os casos, devendo o médico orientar sua terapia baseado
nos consensos, estando atento aos efeitos adversos das drogas e realizando a
monitorização recomendada.
Apesar da maioria dos consensos recomendar tratamento para os pacientes
tanto na fase de indução, como na manutenção, aqueles que optarem por não
Tabela 2. Recomendação dos consensos para tratamento
medicamentoso da doença ileocecal de leve intensidade
Consensos e
protocolos
Indução de remissão
Terapia: Sim ou Não
Manutenção Terapia:
Sim ou Não
Ásia-Pacífico (2006)
SIM
NÃO (apenas para casos leves
ou lesões limitadas em completa
remissão após primeiro ataque)
China (2007)
SIM
SIM
Americano – AGA (2009)
SIM
SIM
World Gastroenterology
Organization (2010)
SIM
SIM
Europeu - ECCO (2010)
NÃO (subgrupo dos casos
ileocecal de leve intensidade
com sintomas leves)
NÃO (pacientes que não
necessitaram de corticoide na
indução)
Brasileiro (2010)
SIM
NÃO
134 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Carlos Alexandre Antunes de Brito
instituir terapia, baseados na recomendação da opinião de alguns especialistas,
devem limitar esta conduta a casos de doença ileocecal de leve intensidade,
para pacientes que neste grupo apresentem sintomas leves, definindo a monitorização que será realizada para estes casos.
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136 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 14
Gases Intestinais:
Quando Investigar e
Como Tratar?
Dra. Maria do Carmo Friche Passos
Dra. Ana Flávia Passos Ramos
E
m condições normais, ingerimos e produzimos diariamente vários
litros de gases que chegam ao intestino, devendo-se ressaltar que os alimentos são uma das mais importantes fontes do gás intestinal. Para não
ultrapassar o volume de 100 a 200 ml de gás, presentes em condições basais,
o intestino dispõe de uma motilidade altamente eficaz, que permite eliminar o
excesso de gás pelo reto praticamente na mesma velocidade com que se produz, evitando-se a retenção gasosa e consequentemente os sintomas clínicos.
Os distúrbios gastrointestinais associados (verdadeira ou presumivelmente) à
presença excessiva de gases no tubo digestivo são muito frequentes; contudo,
estabelecer este diagnóstico de forma precisa constitui um dos grandes desafios
da prática médica, uma vez que o volume e a taxa de eliminação do gás intestinal
não são facilmente medidos. Na verdade, a maioria dos pesquisadores acredita
que os sintomas de eructação, flatulência e distensão abdominal decorrem
muito mais de alterações motoras e da hipersensibilidade visceral à presença
dos gases do que propriamente a um volume aumentado dos mesmos. Temse observado que os pacientes com sensação de apresentar maior produção
de gases intestinais, mas com sensibilidade e motilidade digestivas normais,
apresentam aumento da eliminação retal de gás com discreta sintomatologia
de dor e desconforto abdominal. Portanto, o grande acúmulo de gás no tubo
digestivo é evitado pela eliminação retal aumentada.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
137
Gases Intestinais: Quando Investigar e Como Tratar?
Faremos inicialmente uma breve revisão sobre a fisiologia e fisiopatologia dos
gases intestinais, para posteriormente discutirmos sobre o diagnóstico e tratamento das síndromes clínicas relacionadas à presença de gás no tubo digestivo.
Volume, composição e eliminação dos gases intestinais
O volume do gás presente no interior do intestino delgado e cólon, medido
através da pletismografia corporal ou da infusão rápida de argônio no intestino,
é inferior a 200 ml. Acredita-se que aproximadamente 100 a 200 ml de gases
estejam presentes nas pessoas saudáveis, tanto em jejum como após as refeições.
Volumes semelhantes têm sido obtidos nos pacientes que referem sensação de
excesso de gás no intestino e distensão abdominal.
O conteúdo gasoso presente na luz intestinal é constituído basicamente de
cinco gases: nitrogênio (N2), oxigênio (O2), gás carbônico (CO2), hidrogênio
(H2) e metano (CH4), que representam 99% do volume eliminado pelo reto. A
concentração desses cinco gases no intestino não é constante, variando especialmente em função da dieta, sendo assim estimada: N2: 11 a 92%; O2: 0 a 11%;
H2: 0 a 86%; CO2: 3 a 54% e CH4: 0 a 56%. Todos eles são incolores e inodoros,
sugerindo que outros gases (aminas, ácidos orgânicos voláteis, mercaptanas e
indol), presentes em concentrações mínimas, sejam os responsáveis pelo odor
característico dos flatos.
A eliminação do gás intestinal se processa por quatro mecanismos principais: eructação, absorção, consumo bacteriano e eliminação retal. A eructação
é produzida como resposta ao acúmulo de gás a nível gástrico e por meio
deste mecanismo são expulsos fundamentalmente gases atmosféricos (N2 e O2).
Por outro lado, H2, CO2 e CH4 são eliminados do intestino através da absorção
sanguínea. As bactérias do cólon, de maneira especial as aeróbicas, utilizam o
gás, sobretudo O2, para manutenção de seu metabolismo.
A taxa de eliminação diária dos gases pelo reto é muito variável, estimandose que, em condições normais o ser humano excreta de 476 a 1.491 ml por
dia, em média 700 ml/dia. O número de passagens de ar pelo reto (flatos) é
também muito variável. De acordo com vários estudos realizados em voluntários
assintomáticos, este número é de 13,6 + 6, sendo estes valores influenciados
pela dieta, deglutição de ar e por condições que determinam alterações da flora
bacteriana, como nas deficiências enzimáticas específicas e má absorção intestinal. A ingestão de alguns alimentos que contêm alto teor de polissacarídeos não
digeríveis (feijão, fava, brócolis, repolho) pode provocar aumento na formação
de gases intestinais. Foi demonstrado aumento significativo na eliminação dos
138 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. Ana Flávia Passos Ramos
gases após a introdução de 10 g de lactulose na dieta. Considera-se que a expulsão de mais de 20 flatos/dia associa-se a anormalidades na produção e/ou
eliminação dos gases.
Origem
O gás intestinal provém basicamente de três fontes: deglutição do ar, produção intraluminal e difusão entre o lúmen e o sangue.
A deglutição de ar é a maior, se não a única, fonte de gás do estômago. Em
condições normais, quando ingerimos alimentos também ingerimos grandes
quantidades de gás. A composição do gás ingerido é a mesma do gás atmosférico, contendo N2 e O2. Considerando que a eliminação diária de N2 nos flatos
é, em média, de 400 ml e a absorção intestinal deste gás é mínima, é lógico
concluir que a maior parte do ar deglutido é realmente eructado (regurgitado).
Acredita-se que algumas pessoas reajam à ansiedade, medo, mágoa ou tensão
emocional com aumento da ingestão de ar. A aerofagia exagerada também
se associa a ingestão de bebidas carbonatadas como a cerveja e ao hábito de
deglutir o ar durante a fala.
A produção de gases no intestino ocorre basicamente em consequência da
proliferação da flora bacteriana normal, presença anormal da flora anaeróbica
e aumento da quantidade de substratos que alcançam o íleo distal e cólon. Três
gases (CO2, H2 e CH4) são produzidos em grande quantidade na luz intestinal.
O H2 provém da ação bacteriana sobre carboidratos que chegam ao intestino
grosso como o amido, a lactose e a celulose, sendo utilizado pelas próprias
bactérias ou absorvido e exalado pelos pulmões. A constatação da presença
de flatos com altas concentrações de H2 sugere a possibilidade de má absorção
de carboidratos. Os testes respiratórios com H2 têm sido muito úteis na determinação da má absorção dos hidratos de carbono. O CO2 é produzido pela
reação do ácido clorídrico com o bicarbonato no duodeno, sendo absorvido não
participando da composição dos gases do intestino grosso. Já o metano (CH4)
é produzido exclusivamente pela flora bacteriana anaeróbica e apenas cerca
de um terço dos adultos albergam no cólon bactérias capazes de produzi-lo.
Trânsito e expulsão
Para que o gás intestinal seja eliminado por via retal é necessário que ele seja
transportado em direção orocaudal ao longo de todo o trato gastrointestinal. Em
condições normais, o tubo digestivo está preparado para transportar e eliminar
grandes quantidades de gás com rapidez e eficiência, evitando, dessa forma, a
A Gastroenterologia na Prática Clínica
139
Gases Intestinais: Quando Investigar e Como Tratar?
sua retenção e os sintomas abdominais. A expulsão do gás pelo ânus ocorre de
maneira voluntária mediante uma combinação de manobras semelhantes àquela
observada na defecação, onde participam ondas fásicas retossigmoidianas, uma
leve compreensão abdominal e um relaxamento do esfíncter anal.
A figura 1 nos ajuda a compreender o processo de difusão dos gases entre
a luz intestinal e o sangue, representando esquematicamente a fisiologia de
produção dos gases intestinais e da sua eliminação do trato gastrointestinal.
Figura 1. Fisiologia da produção dos gases e da remoção dos
mesmos do trato gastrointestinal.
Deglute-se o ar e logo eructa-se uma
fração considerável. O O2 do ar deglutido
difunde até o sangue. A reação de ácido
e bicarbonato no duodeno produz CO2,
que rapidamente difunde para o sangue,
enquanto o N2 difunde para o duodeno
pelo gradiente estabelecido na produção
de CO2. No cólon o material ingerido mal
absorvido e o muco são fermentados
por bactérias que liberam H2, CO2, CH4
e outros gases em quantidades ínfimas.
Uma pequena parcela destes gases é
absorvida pelo sangue que irriga o cólon.
O O2 e o N2 difundem-se do sangue para
a luz do cólon por um gradiente criado
pela produção dos gases pelas bactérias. O resultado final deste processo
determina a composição e a taxa de
eliminação de gás pelo reto.
140 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. Ana Flávia Passos Ramos
Existem vários fatores capazes de modular as variações motoras secundárias
à presença do gás intestinal, como por exemplo a distensão retal ou duodenal,
que produz respostas reflexas facilitando o trânsito e a expulsão dos gases. Por
outro lado, a chegada de lípides ao duodeno retarda o movimento intestinal e
favorece a retenção de gás. As respostas sensoriais (sintomas) à presença do gás
não dependem unicamente do seu volume, mas também da atividade motora
gastrointestinal e da distribuição dos gases ao longo do intestino. Nesse sentido,
é importante ressaltar que os pacientes com transtornos funcionais digestivos
apresentam alterações motoras e sensoriais que podem facilitar o aparecimento
dos sintomas. Pacientes com Síndrome do Intestino Irritável (SII) e Distensão
Abdominal Funcional, por exemplo, apresentam hipersensibilidade intestinal à
distensão e alteração no trânsito colônico, favorecendo assim o acúmulo do gás.
Problemas clínicos relacionados à presença de gás
Frequentemente os pacientes atribuem uma série de sintomas gastrointestinais
à presença de um excesso de gás no tubo digestivo. Nestes casos, é fundamental
que o médico realize uma minuciosa anamnese para que possa definir se o
quadro clínico é compatível com o diagnóstico de 1) eructações recorrentes; 2)
eliminação excessiva de flatos (flatulência); 3) eliminação de gases fétidos; 4)
dificuldade na eliminação do gás; ou 5) plenitude e distensão abdominal. Esta
abordagem classificando os pacientes de acordo com a sintomatologia predominante se justifica pela diversidade da fisiopatologia, a abordagem propedêutica
e terapêutica será bastante diversa.
Eructações repetitivas
Alguns pacientes apresentam como sintoma principal eructações repetitivas e
recorrentes, mais frequentes após alimentação e associadas a deglutições secas.
Estes pacientes, de maneira semiconsciente, adquirem o hábito de ingerir compulsiva e repetidamente o ar para dentro do esôfago para, imediatamente depois,
regurgitá-lo. Por motivo ainda não definido, estes pacientes relatam que a eructação alivia a distensão e o desconforto abdominal e, sem se darem conta de que
estão engolindo ar, se convencem de que sofrem de uma anormalidade digestiva
grave. Estas eructações são, portanto, resultantes do ar que entra no esôfago,
sendo que a maior parte é expelida ruidosamente e nunca alcança o estômago.
O Consenso de Roma III classifica as eructações repetitivas dentre os distúrbios gastrointestinais funcionais e sugere que para o diagnóstico de aerofagia
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141
Gases Intestinais: Quando Investigar e Como Tratar?
devem ser cumpridos os seguintes requisitos: (a) presença de sintomas durante
os últimos três meses e estes devem ter se iniciado, no mínimo, seis meses antes
do diagnóstico; (b) constatação evidente e objetiva da deglutição de ar; e (c) presença de eructações frequentes e repetidas, no mínimo várias vezes por semana.
Exames endoscópicos ou de imagem não estão indicados rotineiramente,
devendo estar reservados para pacientes com real suspeita de patologia torácica
ou abdominal.
Tratamento: Para esses pacientes uma explicação detalhada dos prováveis
mecanismos das eructações repetidas geralmente desfaz o círculo vicioso e alivia
os sintomas. Modificações posturais e dietéticas visando reduzir a formação dos
gases podem ser benéficas, mas ainda não foram definitivamente estabelecidas.
Obviamente, devemos respeitar as intolerâncias específicas de cada paciente
sem deixar de explicar que o gás eructado geralmente não provém do estômago
ou intestino, e sim do ar deglutido. Beber líquidos em pequenos goles após as
refeições pode ajudar a reduzir a deglutição de ar que ocorre neste período.
Os pacientes devem ser orientados a mastigar bem os alimentos, evitar mascar
chicletes, chupar balas, fumar, falar enquanto come e ingerir saliva em excesso.
Flatulência ou eliminação excessiva de flatos
A flatulência excessiva quase sempre resulta de uma flora proficiente na produção de gás (provavelmente pela redução no consumo do gás), especialmente
quando associada a uma ingestão rica de resíduos fermentáveis. A maioria dos
pacientes com esta queixa não apresenta doença orgânica intestinal e os estudos
demonstram que o volume do gás eliminado geralmente está dentro dos valores
normais (expulsão entre 13 a 19 flatos/dia). Em uma parcela pequena de pacientes, a passagem de ar pelo reto, de fato, ocorre em demasia (superior a 20 flatos
eliminados por dia) e, nesses casos, deve-se investigar a presença de má absorção,
fundamentalmente de açúcares (intolerância à lactose, doença celíaca). Se existe
queixa de flatulência associada a eructações frequentes e volume aumentado de
gás no estômago, o problema deve ser a ingestão de ar. Em geral, a flatulência se
associa não somente com fatores dietéticos, mas também com fatores psíquicos,
aumentando nos períodos de estresse, ansiedade e depressão.
Através da cromatografia gasosa pode se determinar especificamente qual gás
está sendo eliminado em maior concentração, sendo possível, desta maneira,
determinar se a flatulência é devida a um excesso do ar atmosférico deglutido
ou a um aumento da produção intraluminal. Esse exame, contudo, não é realizado rotineiramente, estando ainda restrito aos laboratórios de investigação.
142 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. Ana Flávia Passos Ramos
Tratamento: A flatulência constitui, quase sempre, situação constrangedora
para os pacientes e, nestes casos, é sempre necessário esclarecer sobre os possíveis fatores fisiopatológicos envolvidos. Embora seja muito difícil determinar
o padrão de normalidade na eliminação dos gases, contudo considera-se que
mais de 20 flatos eliminados ao dia associam-se a anormalidades na produção
e/ou eliminação dos gases. Nesses casos está indicado iniciar a propedêutica
para uma possível má absorção de carboidratos, especialmente intolerância à
lactose e ao glúten. Se confirmado o diagnóstico, o tratamento dietético dessas
doenças reduz significativamente a flatulência.
A produção do gás pode ser reduzida através da introdução de uma dieta
contendo alimentos que forneçam o mínimo de substratos para as bactérias
colônicas, incluindo proteínas (carne vermelha, frango, peixe e ovos), alguns
carboidratos (pães sem glúten e arroz), além de algumas verduras, legumes e
frutas (alface, tomate, cerejas e uvas). Os alimentos contendo carboidratos não
absorvíveis e que teoricamente são capazes de aumentar a produção do gás
intestinal devem ser evitados, como feijão, soja, brócolis, cebola, aipo, repolho,
couve-flor, ervilhas, pepino, rabanete, cenoura, passas, bananas, fibras fermentáveis e amidos complexos como o trigo e batata. Muitos pacientes notam uma
grande redução na eliminação dos gases logo após o início dessa dieta, porém
a sua aderência a longo prazo é muito difícil.
Os fatores emocionais devem ser abordados através de uma conversa franca
e aberta, tentando esclarecer ao paciente inclusive a provável associação de
seus sintomas com distúrbios emocionais. Muitas vezes está indicada a psicoterapia ou outras técnicas que objetivem a redução do stress e, em alguns casos,
observa-se uma excelente resposta clínica.
Os preparados comerciais contendo β-galactosidase (Beano) parecem capazes
de digerir carboidratos complexos, normalmente não digeríveis pelas enzimas
humanas (feijão, soja e alguns legumes). Ainda é questionável o real benefício
dessa medicação, mas a sua eficácia tem sido demonstrada por alguns autores,
especialmente quando utilizados na forma líquida. A grande vantagem é possibilitar a ingestão dos carboidratos, antes excluídos da dieta. Este medicamento
ainda não está disponível no Brasil.
Outra opção terapêutica para estes pacientes seria o carvão ativado, que
possui um importante poder de absorção e parece capaz de reduzir os flatos
após refeições contendo feijão ou lactose, contudo não parece reduzir o timpanismo e o desconforto abdominal.
Para os pacientes com exagerada fermentação colônica e que se acom-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
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Gases Intestinais: Quando Investigar e Como Tratar?
panha comumente de supercrescimento bacteriano do intestino delgado, os
antibióticos, especialmente quinolonas, metronidazol e tetraciclina podem ser
extremamente eficazes. Estes medicamentos reduzem a formação dos gases pela
eliminação das bactérias capazes de produzi-los. Estudos recentes demonstram
maior eficácia com o emprego de rifaximina (droga ainda não disponível no
Brasil), um agente antimicrobiano não absorvível, que parece capaz de reduzir a produção e a eliminação dos gases intestinais, sendo superior ao carvão
ativado. Os possíveis efeitos adversos com o uso de antibióticos por período
prolongado devem ser sempre lembrados e a prescrição dos mesmos deve ser
feita de modo bastante criterioso.
Eliminação excessiva de flatos fétidos
Como já descrito, os gases N2, O2, H2, CO2 e CH4 representam 99% da composição dos gases intestinais e são inodoros, o que sugere que outros gases,
especialmente aqueles que contêm enxofre (aminas, ácidos orgânicos voláteis,
mercaptanas e indol) que estão presentes em concentrações mínimas (traços),
sejam os responsáveis pelo odor característico dos flatos. O odor desagradável
dos flatos está quase sempre associado ao aumento na concentração desses
gases, o que pode ocorrer com a ingestão habitual e em maior quantidade de
feijão, vegetais crucíferos como couve-flor, repolho, agrião, brócolis, couve e
também carne vermelha. Muito raramente a eliminação de flatos fétidos pode
se associar à presença de infecção e/ou inflamação intestinal e câncer de cólon esquerdo. Obviamente, nestes casos, o paciente apresenta outros sintomas
associados que vão nos indicar a presença de uma doença orgânica associada.
Tratamento: Recomenda-se ao paciente reduzir radicalmente de sua dieta os
alimentos que contêm enxofre (feijão, vegetais crucíferos e carne), embora os
resultados sejam bastante controversos. Alguns autores sugerem também que
sejam evitados os alimentos que sabidamente aumentam a produção dos gases,
como as frutas ou vegetais que contenham carboidratos não absorvíveis, como
feijão, soja, brócolis, cebola, repolho, couve-flor, ervilhas, pepino, rabanete,
entre muitos outros, além da restrição de alimentos contendo lactose em pacientes lactase-deficientes. Existem relatos isolados na literatura de que o carvão
ativado melhora o odor dos flatos, mas os resultados são bastante discutíveis.
Dificuldade na eliminação do gás
Ao contrário daqueles que se queixam da eliminação excessiva de gás, alguns pacientes apresentam dificuldade para expulsar gases, com consequente
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Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. Ana Flávia Passos Ramos
retenção dos mesmos. Normalmente a evacuação do gás resulta de um leve
aumento da pressão intra-abdominal associado a um relaxamento da musculatura anal. A falta de coordenação neste processo ocasiona uma obstrução de
saída que pode se associar à sensação de dificuldade na expulsão do gás e
também das fezes, ocasionando constipação intestinal quase sempre refratária
ao tratamento convencional. A retenção dos gases prolonga a fermentação no
cólon, ocasionando aumento da sua produção.
Tratamento: Nesses casos, as técnicas de biofeedback estão indicadas, pois
auxiliam tanto na evacuação dos gases como das fezes, com melhora da sensação da retenção gasosa e da constipação intestinal, quase sempre presente. A
retenção gasosa e a consequente fermentação pode ser abrandada com a redução
de carboidratos não absorvíveis da dieta (como enfatizado nos itens anteriores).
Outra opção terapêutica para estes pacientes seria o carvão ativado, que
possui um importante poder de absorção e parece capaz de reduzir os flatos
após refeições contendo feijão ou lactose, contudo não parece reduzir o timpanismo e o desconforto abdominal.
Plenitude e distensão abdominal
A sensação de plenitude e distensão abdominal, acompanhada quase sempre
de desconforto e dor, atribuíveis ao excesso de gases intestinais, constituem
queixas muito comuns em pacientes portadores de distúrbios funcionais gastrointestinais. Ao contrário do que ocorre na aerofagia e na flatulência, a distensão e a dor abdominal parecem secundárias à retenção dos gases intestinais
consequente a uma deficiente eliminação dos mesmos.
Por falta de métodos objetivos que determinem o volume gasoso do intestino,
os médicos quase sempre aceitam a convicção dos pacientes de que os seus
sintomas são, de fato, causados por excesso de gases. No entanto, os estudos
não têm demonstrado diferenças significativas entre o volume e a composição
do gás intestinal nos dois grupos. Por outro lado, a infusão de gás no intestino
provoca mais desconforto e dor nos pacientes do que nos controles, sugerindo
desta forma que a dor e a distensão abdominal sejam, provavelmente, secundárias à presença de distúrbios da sensibilidade visceral e/ou dos reflexos motores
intestinais que interferem com a passagem do gás e não exatamente devido ao
excesso dos mesmos. Recentemente foi demonstrado que pacientes com a SII
apresentam um trânsito de gás mais lento e uma tendência a acumular este gás
e desenvolver sintomas.
O consenso de Roma III considera entre os distúrbios funcionais digestivos
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145
Gases Intestinais: Quando Investigar e Como Tratar?
algumas síndromes que se associam diretamente à alteração na dinâmica (produção e eliminação) dos gases, como a síndrome de distensão abdominal e a
dor abdominal funcional, como descrito a seguir.
A síndrome de distensão abdominal funcional é caracterizada por distensão e
plenitude que geralmente estão ausentes pela manhã e aparecem com o correr do
dia. Os sintomas podem ser intermitentes e relacionados à ingestão de determinados
alimentos. De acordo com os critérios de Roma III, o diagnóstico desta síndrome
é definido pela (a) presença de sensação de plenitude, e/ou distensão abdominal
visível, no mínimo três vezes por mês nos últimos três meses; (b) ausência de
critérios para o diagnóstico da SII e de outros distúrbios funcionais intestinais.
A dor abdominal funcional pode ser recorrente ou contínua e, em geral, tem
pouca relação com a alimentação ou defecação, sendo mais frequente em mulheres. Algumas vezes a dor abdominal se acompanha de alterações do hábito
intestinal, constipação ou diarreia, e o diagnóstico provavelmente será de SII;
outras vezes se apresenta como sintoma isolado, configurando um transtorno
independente. Pacientes com dor funcional geralmente relatam concomitantemente flatulência, eructação e distensão abdominal.
O gás acumulado junto à flexura hepática pode causar dor no quadrante
superior direito do abdome, simulando, por vezes, doença de vias biliares.
Quando o acúmulo de gases se faz na flexura esplênica, pode provocar sintomas conhecidos como síndrome do ângulo esplênico. A maioria dos pacientes
apresenta dor ou opressão na borda costal ou hipocôndrio esquerdo, além da
sensação de distensão e plenitude abdominal. A dor pode se irradiar para a
região precordial, pescoço e braço esquerdo, simulando insuficiência coronariana aguda, embora ocorra sua melhora com a eliminação de flatos ou fezes.
Diagnóstico
a) Clínico: Deve ser realizada cuidadosa e detalhada anamnese, uma vez
que o diagnóstico é fundamentalmente clínico. É preciso estar atento para a
possibilidade de intolerância aos carboidratos ou a outros alimentos, exigindo também minuciosa anamnese alimentar. Deve-se pesquisar a presença de
doenças sistêmicas associadas, como por exemplo diabetes e hipotireoidismo.
Relato de emagrecimento, alteração recente do hábito intestinal, diarreia,
anorexia, enterorragia ou anemia (sinais de alarme) implicam imediata investigação clínica, com extensa propedêutica. Em pacientes jovens com sintomas
funcionais e sem evidências de doenças graves pode-se tentar uma abordagem
terapêutica por curto período, antes de se iniciar os exames complementares.
146 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. Ana Flávia Passos Ramos
No exame físico devemos ficar atentos para a presença de cicatrizes cirúrgicas abdominais, ascite, peristaltismo de luta e sinais de peritonite. É importante
também lembrar que os pacientes com queixas crônicas, de longa duração, não
estão imunes a intercorrências agudas.
b) Exames complementares: A radiografia simples do abdome pode demonstrar excesso de gás intestinal, porém nem sempre há correlação entre a sua
presença excessiva e a sintomatologia intestinal. Os testes de rastreamento da
má absorção somente estão indicados quando existe a suspeita clínica e, nestes casos, devem ser realizadas a pesquisa de substâncias redutoras nas fezes,
a determinação do pH fecal e a dosagem dos ácidos de fermentação (ácido
lático) na matéria fecal. Também são muito utilizados os testes de sobrecarga
com diversos açúcares, que apesar de serem métodos indiretos são valiosos na
determinação da intolerância e/ou má absorção aos carboidratos.
O melhor método para estudar a fermentação intestinal consiste na determinação da concentração de H2 no ar expirado antes e depois (várias medidas
em intervalos fixos) da ingestão de determinados alimentos hidrocarbonatos
ou carboidrato de origem alimentar, como a lactose, lactulose, glicose, xilose,
frutose, entre outros. Quando se ingere um carboidrato, restos do mesmo que
não são digeridos e absorvidos no intestino delgado chegam ao cólon, onde
são fermentados pelas bactérias locais, produzindo, desta forma, H2, que se
difunde rápida e facilmente através da mucosa colônica, passando à circulação
e posteriormente ao ar expirado. A concentração do H2 no ar expirado reflete
a quantidade do carboidrato que chegou ao cólon e que sofreu a fermentação
e o seu aumento indica uma absorção incompleta. Estes testes têm a grande
vantagem de serem baratos, de fácil realização e não invasivos.
Existem vários outros métodos diagnósticos para a determinação do volume, da frequência de eliminação do gás intestinal e de sensibilidade visceral,
contudo são ainda restritos a investigação clínica, não estando disponíveis para
utilização na rotina médica diária.
Tratamento: O tratamento tem como objetivos diminuir a produção do gás
intestinal e/ou atuar na função motora ou sensorial, facilitando o trânsito e a
expulsão de gás ou aumentando a tolerância ao mesmo.
Medidas não farmacológicas
Devemos explicar aos pacientes os prováveis mecanismos de alteração da
motilidade e da sensibilidade visceral, que em parte justificam os sintomas,
A Gastroenterologia na Prática Clínica
147
Gases Intestinais: Quando Investigar e Como Tratar?
esclarecendo-os quanto à sua moléstia e tranquilizando-os quanto à presença de doenças graves subjacentes. Não há evidências convincentes de que
o incremento de fibras na dieta possa melhorar os sintomas de distensão ou
de dor abdominal. Ao contrário, alguns estudos sugerem que as fibras aumentam a produção do gás intestinal e devem ser indicadas apenas quando
os pacientes apresentarem constipação intestinal associada. Recomenda-se
também a dieta pobre em carboidratos não absorvíveis, como feijão, soja,
brócolis, cebola, repolho, couve-flor, ervilhas, pepino, rabanete, entre muitos
outros (ver itens anteriores). Devemos sempre abordar com os pacientes uma
possível participação de fatores emocionais na gênese dos sintomas. O tratamento psicoterápico apresenta excelente resposta em alguns casos. Alguns
estudos demonstraram também que os exercícios físicos aceleraram o trânsito
e a eliminação dos gases intestinais e por isto devem ser recomendados rotineiramente a estes pacientes.
Tratamento farmacológico
Os medicamentos teoricamente capazes de reduzir o volume do gás intestinal como a simeticona têm sido amplamente prescritos, porém não existem na
literatura estudos que demonstrem de fato o seu real benefício. Este fármaco
tem propriedades antiespumantes e repelentes na água, sendo capaz de modificar a tensão superficial dos gases, favorecendo a coalescência das bolhas
gasosas e a sua eliminação. Alguns estudos demonstram que a simeticona alivia
a distensão gasosa, tanto funcional como no pós-operatório, mas os resultados
são controvertidos. É uma droga segura com pouquíssimos efeitos colaterais,
em geral leves e transitórios.
O carvão ativado, como descrito antes, tem se mostrado capaz de reduzir
os flatos após refeições contendo feijão ou lactose, contudo não se demonstra
eficaz em reduzir o timpanismo e o desconforto abdominal.
Para alívio da dor estão indicados as drogas antiespasmódicas e os relaxantes da musculatura lisa, como antimuscarínicos, hioscina, brometo de otilônio,
brometo de pinavério, trimebutina e mebeverina. Em várias meta-análises e
na revisão Cochrane (16 estudos) tem sido confirmada a eficácia clínica dos
antiespasmódicos, tanto em relação à melhora global como em relação ao
alívio da dor e distensão abdominal. A justificativa para o emprego desses
medicamentos é a observação, em modelos experimentais, de que a redução
da atividade motora intestinal aumenta a tolerância ao gás. Estes fármacos, no
148 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. Ana Flávia Passos Ramos
entanto, não são capazes de melhorar o trânsito e a evacuação dos gases e, por
isto, sua indicação é para alívio da dor e do desconforto, ou seja, um tratamento
meramente sintomático.
Estudos recentes demonstraram melhora da dor abdominal, plenitude e
distensão abdominal com a utilização da Mentha piperita. Tem sido descrito
que o óleo de menta apresenta ação relaxante na musculatura lisa mediada via
bloqueio do canal de cálcio e poderia ter uma eficiente ação antiespasmódica e
antifisética interessante. Novos estudos devem ser realizados para comprovar a
real eficácia desse medicamento no alívio da flatulência e distensão abdominal.
Outra opção terapêutica seriam os procinéticos, com o objetivo de estimular
a motilidade digestiva, teoricamente evitando-se a retenção dos gases e seus
sintomas. Foi demonstrado que a administração endovenosa de uma substância
procinética potente como a neostigmina produz uma aceleração do trânsito e
favorece a eliminação do gás em pacientes com distensão abdominal, ao mesmo
tempo em que alivia os sintomas.
Para os pacientes com exagerada fermentação colônica e supercrescimento
bacteriano, os antibióticos, especialmente metronidazol, quinolonas e tetraciclina, podem ser úteis. Estes medicamentos reduzem a formação dos gases pela
eliminação das bactérias capazes de produzi-los. Estudos recentes demonstram
a eficácia da rifaximina, um agente antimicrobiano não absorvível, que parece
capaz de reduzir a produção e a eliminação dos gases intestinais, sendo superior ao carvão ativado. O supercrescimento bacteriano tem sido observado
em parcela significativa de pacientes com SII, especialmente no subgrupo que
apresenta distensão abdominal e flatulência excessiva.
As enzimas pancreáticas parecem úteis nos casos de má absorção (doença celíaca) ou má digestão secundária (pancreatites, câncer ou pancreatectomia), onde
comumente ocorre um acúmulo dos gases intestinais. Como já comentamos, um
preparado enzimático, a β-galactosidase parece capaz de digerir carboidratos
complexos, normalmente não digeríveis pelas enzimas humanas, possibilitando
a ingestão de alguns carboidratos, antes excluídos da dieta. Ainda não existem
comprovações do real beneficio desta droga (não disponível no Brasil).
Alguns antidepressivos que atuam na inibição da captação de serotonina
dos neurotransmissores, como a fluoxetina e a amitriptilina, apresentam efeitos benéficos sobre a sensibilidade visceral e parecem capazes de bloquear a
transmissão da dor do trato digestivo para o cérebro. Estes fármacos têm sido
recomendados para o tratamento de pacientes com distúrbios funcionais mesmo
nos casos onde a depressão não seja evidente, devendo ser usados em doses
A Gastroenterologia na Prática Clínica
149
Gases Intestinais: Quando Investigar e Como Tratar?
baixas e os resultados são animadores. Agentes hipnóticos parecem ser de ajuda
para alguns pacientes, porém o seu uso rotineiro não é recomendado.
Vários estudos atuais avaliam o efeito dos probióticos na distensão abdominal
e flatulência e os resultados iniciais têm sido muito promissores. Um estudo
controlado com placebo demonstrou redução consistente da plenitude e distensão abdominal após 21 dias de tratamento no grupo que recebeu Lactobacillus.
Outros trabalhos, no entanto, não encontraram os mesmos resultados e novos
estudos bem elaborados do ponto de vista metodológico se fazem necessários
para esclarecer o real valor dos probióticos no tratamento da síndrome da distensão e dor abdominal funcional.
Bibliografia recomendada
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2. Agrawal A, Whorwell P. Treatment of bloating and distension - role of probiotics. Aliment
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de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, 2004.
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bowel syndrome: are there any predictors? BMC Gastroenterol 2010;10:23-29.
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patients with bloating. Am J Gastroenterol 2006;101:2552-7.
150 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 15
Insuficiência Exócrina
do Pâncreas de Origem
Não Pancreática
Dr. José Galvão-Alves
A
digestão e a absorção dos nutrientes requerem uma complexa
interação entre as funções motora e secretora do trato gastrointestinal.
A digestão dos macronutrientes é pré-requisito fundamental para uma
boa absorção e depende essencialmente da hidrólise das enzimas pancreáticas
e da integridade da mucosa intestinal.
Neste contexto, as enzimas pancreáticas, em particular lipase, amilase, tripsina
e quimiotripsina, têm um papel fundamental no processo da digestão. A importância da secreção exócrina do pâncreas na digestão fica clara nos quadros de
má absorção, caracterizados principalmente por emagrecimento e esteatorreia
(> 7 g de gordura fecal/24 h) e observados quando existe uma insuficiência
exócrina da glândula devido a inúmeras condições.(1) Destaca-se a importância
nestes casos de se administrar preparados de enzimas pancreáticas, mesmo
com algumas desvantagens em relação à secreção enzimática fisiológica. Em
particular a absorção de lipídeos que não é completamente normal em muitos
pacientes que necessitam dessa reposição exógena, porém fundamental para
preservação nutricional.
Fisiologia da secreção pancreática(2)
O pâncreas é responsável pela secreção de insulina, enzimas digestivas
e bicarbonato de sódio. A regulação de secreção exócrina do pâncreas é
feita através da acetilcolina, colecistocinina e secretina. As duas primeiras
A Gastroenterologia na Prática Clínica
151
Insuficiência Exócrina do Pâncreas de Origem Não Pancreática
têm ação na produção das enzimas digestivas, enquanto a secretina é a
principal responsável pela secreção de grandes quantidades de bicarbonato
de sódio e água.
A secreção pancreática é dividida em três fases. Nas fases cefálica e gástrica, ocorre a liberação de acetilcolina pelas terminações nervosas vagais no
pâncreas, o que provoca a secreção de pequena quantidade de enzimas nos
ácinos e ductos pancreáticos (cerca de 20% da secreção total na fase cefálica
e 5% a 10% na fase gástrica). A fase intestinal começa quando o quimo ácido proveniente do estômago penetra no intestino delgado. Nesse momento
a secretina estimula a secreção abundante de bicarbonato de sódio, que é
responsável pela transformação do meio ácido (pH inferior a 4,5-5,0) em
básico (pH 8 em média), tornando possível a ação das enzimas pancreáticas
e neutralizando a ação digestiva do suco ácido gástrico no intestino delgado.
Simultaneamente, ocorre a liberação de um segundo hormônio, a colecistocinina, que é a responsável pela secreção de grandes quantidades de enzimas
digestivas pelas células acinares.
A atividade das enzimas pancreáticas é diferenciada de acordo com o nível
anatômico do tubo digestivo. A amilase e a tripsina mantêm suas atividades
em todo o intestino delgado;já a lípase tem sua ação máxima a nível duodenal,
tornando-se praticamente inativa no jejuno e íleo.
Testes de função pancreática
São utilizados para avaliação da função pancreática e podem ser divididos
em direto e indireto. O teste direto é considerado o padrão ouro e consiste na
utilização de secretina e colecistocinina para estimulação da função do pâncreas
e avaliação de sua resposta.(3)
Na tabela 1 encontram-se os testes mais comumente utilizados na literatura
atual.
Tabela 1
Testes de função exócrina
Sensibilidade
Especificidade
Secretina / CCK
90%
94%
Elastase Fecal
70%
85%
Pancreolauril
82%
90%
Adaptada de Domínguez-Muñoz, 2005.
152 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. José Galvão-Alves
Os indiretos, como o próprio nome diz, avaliam a função pancreática indiretamente. São eles:
• Dosagem da gordura fecal
• Dosagem da elastase fecal
• Avaliação do consumo de aminoácidos
• Teste respiratório do ¹³C
• NBT - PABA
Na prática, em nosso meio, estes testes (direto e indireto) têm sido pouco
utilizados por sua baixa disponibilidade.
Poderíamos afirmar que o teste Secretina/Colecistocinina não é disponível
e a mensuração da Elastase Fecal, embora disponível, é realizada por poucos
laboratórios e muito dispendiosa, o que também a inviabiliza.
Doenças que interferem na produção
de enzimas pancreáticas
A crucial importância da função exócrina do pâncreas fica evidente quando ocorrem sinais clínicos como emagrecimento e má absorção presentes em
algumas doenças listadas a seguir.
Pancreatite crônica
É a causa mais comum de insuficiência exócrina do pâncreas. Na pancreatite
crônica, o parênquima pancreático se encontra com várias alterações morfológicas irreversíveis, que causam a diminuição da sua função. A insuficiência
exócrina do pâncreas sem que haja alterações morfológicas é rara (menos que
5%), porém é possível.(1,4)
A esteatorreia é a mais significativa manifestação de disfunção exócrina do
pâncreas e associa-se à carência de absorção das vitaminas lipossolúveis como A,
D, E e K. Essas alterações ocorrem principalmente devido a uma diminuição da
síntese e secreção da lipase, e a secreção inapropriada de bicarbonato de sódio,
consequentemente, a inativação da lipase no duodeno devido ao baixo pH.
Pancreatite aguda
O conhecimento da capacidade secretora do pâncreas durante a fase aguda
da pancreatite aguda ainda é limitado. Durante a fase subaguda parece ocorrer
uma alteração na função pancreática exócrina em uma considerável porcentagem
de pacientes com doença necrosante. Dependendo da gravidade da pancreatite
A Gastroenterologia na Prática Clínica
153
Insuficiência Exócrina do Pâncreas de Origem Não Pancreática
aguda e do grau de necrose, as alterações podem ser permanentes, embora
isto seja incomum.
Tumores pancreáticos
Devido ao prognóstico sombrio, ainda é limitado o número de estudos que
avaliam a secreção exócrina do pâncreas nessas doenças. Evidências indicam
que a disfunção exócrina e a má absorção – (presentes em 80% a 90% dos pacientes) estão associadas a uma secreção diminuída de enzimas, e a obstruções
dos ductos que carreiam o suco pancreático ao duodeno.(2)
Fibrose cística
É uma doença hereditária que afeta as funções secretora e motora no trato
gastrointestinal e causa alterações morfológicas no pâncreas. Com isso, ocorrem
mudanças do pH, da motilidade e do trânsito. Estudos recentes mostram que
ocorre insuficiência exócrina em mais de 80% dos portadores desta doença,
principalmente em crianças.
Cirurgias gastrointestinais
Ressecções pancreáticas naturalmente causam uma diminuição na capacidade
secretora do pâncreas, porém isso depende muito da doença que originou o
procedimento cirúrgico, e também do tipo e extensão da ressecção realizada.
Em pacientes com função pancreática previamente normal, ressecções de 90%
a 95% do pâncreas geralmente são bem toleradas sem que os pacientes apresentem alterações clínicas de insuficiência exócrina importante (tabela 2).(2)
Ressecções gástricas parciais e totais, e a síndrome da alça curta, também
estão associadas à carência de enzimas pancreáticas; isto por que ocorre uma
falta de sincronia entre a chegada do alimento e a liberação de enzimas pancreáticas no duodeno.
Tabela 2. Esteatorreia nas cirurgias pancreáticas
Cirurgia
Pré-cirurgia
Pós-cirurgia
Duodenopancreatectomia
5%
55%
Duodenopancreatectomia preservando piloro
4%
64%
Ressecção distal (40-80%)
3%
19%
Ressecção distal (80-95%)
9%
38%
Pancreatojejunostomia
19%
33%
Adaptada de Julio Iglesias Garcia, 2005 - Santiago de Compostela.
154 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. José Galvão-Alves
Em pacientes operados devido a tumores malignos, uma extensa desenervação do pâncreas, incluindo a vagotomia, também contribui para disfunções
pancreáticas.
Doença celíaca
Aproximadamente 40% dos pacientes com doença celíaca apresentam uma
insuficiência exócrina de leve a moderada, sendo que geralmente esta disfunção
não está diretamente ligada ao pâncreas, e sim a alterações da mucosa intestinal.
Estas alterações provocam a diminuição dos mediadores estimulatórios causando
redução na secreção de enzimas e bicarbonato de sódio, e ainda, assincronia
entre as funções secretora e motora do tubo digestivo.(1,2)
Diabetes mellitus
O diabetes mellitus é uma doença ligada principalmente à função endócrina
do pâncreas, porém não é raro pacientes diabéticos também apresentarem certo
grau de insuficiência exócrina pancreática (tabela 3). Isto ocorre devido a vários
fatores, como a atrofia glandular que ocorre pela diminuição na produção de
insulina e pela isquemia causada pelas arteriopatias, a alteração de hormônios
produzidos nas ilhotas que atuam na regulação da função exócrina, e a neuropatia diabética que causa uma diminuição do reflexo enteropancreático.(2,5)
Doença de Crohn
Alguns sinais de patologia pancreática frequentemente estão presentes na
doença de Crohn. Uma diminuição da função exócrina do pâncreas é observada
em cerca de 5% a 15% dos portadores dessa doença. Esses pacientes apresentam
fatores de risco para desenvolvimento de doença pancreática, como aumento da
incidência de litíase biliar, envolvimento da papila duodenal, e reações adversas
a drogas (sulfassalazina, azatioprina). Em geral, o distúrbio na regulação da secreção pancreática e o distúrbio entre a interação da secreção gastrointestinal e
a função motora explicam a diminuição na secreção de enzimas e bicarbonato.(1)
Tabela 3. Insuficiência exócrina do pâncreas no diabetes mellitus (1.015 pacientes)
Função exócrina
Elastase fecal
N
%
Normal
> 200 μg/g
602
59,3%
Insuficiência leve
100-200 μg/g
181
17,8%
Insuficiência grave
< 100 µg/g
232
22,9%
Adaptada de Hardt PD. Pancreatology 2003;3:395-402.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
155
Insuficiência Exócrina do Pâncreas de Origem Não Pancreática
Síndrome de Zollinger-Ellison
É uma causa rara de insuficiência exócrina do pâncreas. Está associada à
produção de gastrina por tumores (gastrinomas), estimulando a hipersecreção
ácida e biliopancreática, causando uma incapacidade absortiva intestinal. A lipase, por exemplo, acaba não exercendo sua função lipolítica, já que sua ação
ocorre na porção proximal do delgado (duodeno) e essa região se encontra
com um pH muito baixo, o que a inativa.(1)
Aids
A esteatorreia é um sintoma muito comum nos pacientes com Aids, estando
presente em aproximadamente 26% das crianças e 71% dos adultos. Isto ocorre
devido a alterações intestinais (atrofia das vilosidades, hipertrofia de criptas e
coinfecções por organismos oportunistas e não oportunistas), alterações pancreáticas (estando a insuficiência exócrina presente em 30% desses pacientes)
devido aos medicamentos utilizados para o tratamento da própria doença (DDI,
DDC) e das infecções decorrentes dela (citomegalovírus, Cryptosporidium).(2)
Reposição enzimática(1,6,7)
A reposição enzimática está indicada em todos os casos em que os pacientes
apresentem sinais clínicos de disfunção exócrina do pâncreas, ou nos casos
em que os preparados enzimáticos possam ser benéficos para pacientes com
doença pancreática em curso – na pancreatite aguda, por exemplo.
Em uma pessoa saudável, apenas 5% a 10% da função exócrina do pâncreas
já seriam o suficiente para evitar-se complicações como esteatorreia, já que o
débito enzimático excede em 10 vezes a quantidade necessária para uma boa
digestão. O débito médio de lipase no adulto saudável é de 194.522UI nas 2
horas que se seguem a uma refeição. Com isso, calculando 10% do total da
secreção enzimática do pâncreas, teríamos em torno de 20.000UI por refeição,
que teoricamente seria a quantidade necessária para uma boa digestão em condições ideais. Porém, como já foi discutido anteriormente, muitos são os fatores
que interferem na atividade enzimática, como o pH e a motilidade digestiva.
A reposição enzimática deve ser iniciada com doses pequenas que devem
ser aumentadas progressivamente levando em conta a melhora dos sintomas
clínicos, como ganho ponderal e melhora da esteatorreia. Preconiza-se o início
do tratamento com 25.000UI de preparado enzimático, que podem ser aumentados progressivamente até 50.000UI, administrados durante cada refeição. Pre-
156 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. José Galvão-Alves
parações modernas são protegidas da acidez gástrica e misturam-se facilmente
aos alimentos, atingindo o duodeno intactas, e com o meio alcalino ideal não
apresentam interferências na sua ação.
Caso não haja uma resposta ideal, deve-se associar um inibidor da secreção
ácida com o objetivo de evitar a inativação enzimática no estômago e duodeno
devido ao pH ácido. De preferência, devemos utilizar um inibidor da bomba
de prótons uma vez ao dia, já que essa classe de droga apresenta resultados
mais efetivos que os bloqueadores H2 de histaminas.
A não adesão ao tratamento é uma causa importante de falha terapêutica.
Deve-se também ser descartada a presença de parasitoses como giardíase e/
ou estrongiloidíase, comuns no nosso meio. As doenças intestinais, como as
doenças inflamatórias intestinais, infecções bacterianas e doença celíaca também
podem influenciar na resposta terapêutica.
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A Gastroenterologia na Prática Clínica
157
158 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 16
Diagnóstico Precoce
da Pancreatite Crônica:
É Possível?
Dra. Dulce Reis Guarita
Dr. Guilherme Eduardo Gonçalves Felga
Dra. Marianges Zadrozny Gouvea da Costa
Dra. Martha Regina Arcon Pedroso
O
diagnóstico das pancreatites crônicas depende de um contexto
clínico apropriado (ex.: paciente do sexo masculino jovem, com intenso e prolongado consumo alcoólico e dor abdominal típica, perda
ponderal, insuficiência exócrina e/ou endócrina), associado a exames que reflitam a perda da função pancreática e a presença de anormalidades anatômicas
compatíveis (tabela 1).(5)
O diagnóstico precoce da doença é difícil, por envolver tanto testes funcionais quanto detalhes de exames de imagem, nem sempre observados com
facilidade.(3,4,8)
No sangue, a dosagem das enzimas pancreáticas, em particular da amilase
e da lipase, pode estar alterada nas crises de agudização da doença, especialmente nas fases iniciais da mesma, quando o parênquima pancreático ainda se
encontra relativamente preservado. Nas fases finais da afecção, é relativamente
comum o encontro de níveis normais destas enzimas, o que se justifica pela
escassez da produção enzimática, secundária à extensa substituição do parênquima pancreático por fibrose.
Quando houver colestase, a fosfatase alcalina e a gama-glutamiltransferase,
além das bilirrubinas séricas, também podem se elevar.
Excepcionalmente, a hipertrigliceridemia ou a hipercalcemia, esta última
associada ao hiperparatireoidismo, podem sugerir o fator etiológico para um
quadro de pancreatite crônica.
Nos derrames cavitários (abdominal, pleural ou pericárdico), a quantifica-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
159
Diagnóstico Precoce da Pacreatite Crônica: É Possível?
Tabela 1. Exames complementares para o diagnóstico da pancreatite crônica
Funcionais
Estruturais
Glicemia
Ultrassonografia de abdômen
Pesquisa qualitativa de gordura fecal
Radiografia simples de abdômen
Balanço de gordura fecal
Tomografia computadorizada de abdômen
Elastase fecal
Ressonância magnética de abdômen com
pancreato-colangiorressonância
Teste da secretina-colecistocinina
Ecoendoscopia
Colangiopancreatografia retrógrada endoscópica
Adaptada de Gupta & Toskes, 2005.
ção da amilase e da proteína total no líquido obtido por punção possibilita a
caracterização da origem pancreática do derrame, já que ambos os parâmetros
estão elevados, em especial a proteína.
No suco duodenal ou no suco pancreático puro, obtidos respectivamente pela
tubagem duodenal ou por cateterismo transpapilar, a determinação quantitativa
dos componentes do suco pancreático (secreções hidreletrolítica e enzimática),
após estímulo hormonal com secretina e colecistocinina (ou ceruleína) é, até
o presente momento, o melhor método de avaliação da função exócrina do
pâncreas. No entanto, este exame não é passível de realização habitual entre
nós, face o alto custo para importação dos hormônios.(3,4,8)
Nas fezes, a pesquisa qualitativa de gordura pode sugerir a síndrome de
má absorção relacionada à insuficiência pancreática. A dosagem de gordura,
após dieta padronizada (balanço de gordura fecal), é útil para o diagnóstico do
grau de envolvimento do pâncreas, mas tanto a pesquisa qualitativa, quanto a
quantitativa, só se alteram quando a fibrose acomete mais de 75% da glândula
pancreática. Outro teste mencionado pela literatura é a dosagem fecal da elastase pancreática por técnica de ELISA. Tal exame reflete a reserva funcional do
pâncreas exócrino por quantificar nas fezes esta enzima pancreática que sofre
pouca degradação durante o trânsito intestinal. No entanto, é pouco sensível
por não identificar pacientes com função pancreática minimamente reduzida.
Quanto menores são os níveis de elastase fecal, mais grave é a insuficiência
exócrina apresentada pelo paciente.(7,9)
Após a introdução da ultrassonografia, da tomografia computadorizada e da
ressonância magnética abdominais, os exames contrastados do tubo digestivo,
a colangiografia venosa, a esplenoportografia e a arteriografia seletiva do tronco celíaco e da artéria mesentérica superior são realizados excepcionalmente.
160 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Dulce Reis Guarita • Dr. Guilherme Eduardo Gonçalves Felga
Dra. Marianges Zadrozny Gouvea da Costa • Dra. Martha Regina Arcon Pedroso
O exame radiológico simples do abdômen, sem preparação, pela facilidade
de realização e pelas informações que traz, revelando a presença da calcificação pancreática em cerca de 50% dos pacientes com PC, deverá ser o ponto
de partida, juntamente com a ultrassonografia abdominal, para a investigação
diagnóstica, sobretudo nos pacientes com história clínica sugestiva de comprometimento pancreático há mais de cinco anos. A ausência de calcificação
pancreática ao exame radiológico simples do abdômen não afasta o diagnóstico
de comprometimento crônico da glândula, pois os cálculos surgem, em média,
cinco a dez anos após o início das manifestações clínicas.(3,4,8)
A ultrassonografia abdominal, método não invasivo e que pode ser repetido
várias vezes, tem elevada especificidade diagnóstica e detecta eventuais complicações, sendo a textura heterogênea do parênquima, a presença de calcificações e a dilatação e tortuosidade do ducto pancreático principal as principais
alterações ecográficas observadas. No entanto, não é um bom método para
diagnóstico precoce da doença pancreática crônica.
A tomografia computadorizada abdominal, sobretudo a helicoidal, é útil
no diagnóstico das afecções pancreáticas, possibilitando o acesso ao retroperitônio, com observação direta da glândula pancreática e dos tecidos adjacentes,
sendo os principais achados tomográficos os cálculos intraductais, a dilatação
do ducto pancreático principal e as alterações do parênquima glandular por
edema, fibrose ou necrose e atrofia do mesmo. Possibilita também, como a
ultrassonografia, diagnosticar e acompanhar determinadas complicações das
pancreatites crônicas, em particular os cistos intra ou extraglandulares, a ascite,
a necrose, infectada ou não, as fístulas, os abscessos, as coleções líquidas, além
de dilatações das vias biliares intra ou extra-hepáticas.
A pancreatocolangiorressonância magnética é útil para a observação de alterações do ducto pancreático principal, da via biliar principal e de complicações
como os cistos de pâncreas. Gradativamente, com o aprimoramento das imagens
que fornece, ocupa cada vez maior espaço no estudo dos pancreatopatas crônicos,
especialmente em relação aos métodos endoscópicos. A pancreatocolangiorressonância, quando associada à estimulação pancreática por secretina, pode ser
um recurso útil para o diagnóstico precoce das pancreatites crônicas.(6)
Nos raros casos em que se verifica a presença de uma massa pancreática
e permaneçam dúvidas quanto a tratar-se de uma pancreatite crônica em fase
de reagudização ou uma neoplasia pancreática, a tomografia por emissão de
pósitrons (PET – pósitron emission tomography) pode ser de grande valia. Durante este exame, fornece-se ao paciente um radiofármaco contendo glicose que
A Gastroenterologia na Prática Clínica
161
Diagnóstico Precoce da Pacreatite Crônica: É Possível?
é avidamente captada por células neoplásicas, diferentemente do que ocorre
com as lesões inflamatórias. Este efeito pode ser flagrado por uma câmara de
cintilação modificada e o método, embora não suficientemente sensível, tem
alta especificidade.
A pancreatocolangiografia endoscópica permite o detalhado delineamento
da anatomia ductal, mas, com o desenvolvimento de técnicas não invasivas,
é reservada hoje para o pré-operatório de cirurgias pancreáticas ou para procedimentos terapêuticos. É particularmente útil naqueles casos que evoluem
com derrames cavitários (ascítico e pleural) por permitir, na maioria das vezes,
localizar a fístula pancreática ou, mesmo, um cisto roto. Não é um exame isento
de riscos e sua principal complicação relaciona-se à infecção, tanto do pâncreas
quanto das vias biliares, condição esta mais comum naqueles casos com ducto
pancreático principal muito dilatado, com cistos com comunicação com os
ductos pancreáticos ou quando há compressão do colédoco.(3,4,8)
A ecoendoscopia realiza criterioso estudo anatômico do parênquima pancreático e do sistema ductal sem sofrer com a interposição gasosa que limita a
ultrassonografia convencional. Os principais achados de uma ecoendoscopia
são a textura heterogênea do parênquima, os cistos, as dilatações e irregularidades ductais e as calcificações, sendo um exame valioso para o diagnóstico
precoce do comprometimento pancreático crônico. Além das imagens obtidas,
esta técnica permite punção aspirativa por agulha fina do próprio parênquima
ou de cistos, sendo fundamental para o diagnóstico diferencial de lesões císticas
pancreáticas.
A elastografia pancreática por ecoendoscopia, disponível em poucos centros,
é capaz de avaliar a distorção do tecido sob pressão, permitindo diagnóstico
diferencial entre pancreatite crônica e câncer de pâncreas, com 80 a 90% de
acurácia.(10)
Quando o fator etiológico para a pancreatite crônica não for esclarecido,
não deve ser esquecida a possibilidade da presença de mutações genéticas,
especialmente no CFTR (cystic fibrosis transmembrane conductance regulator),
relacionadas à fibrose cística, e no PRSS1 (cationic trypsinogen), relacionadas à
pancreatite crônica hereditária. Nestes casos, mais do que diagnóstico precoce,
os estudos genéticos permitem antever a possibilidade de surgimento de uma
doença.(1,11,12)
Para investigar as pancreatites crônicas autoimunes, além da busca de doenças autoimunes concomitantes, níveis elevados de IGg4 sérica ou em tecido
reforçam a hipótese diagnóstica, embora sua ausência não a afaste.(2)
162 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dra. Dulce Reis Guarita • Dr. Guilherme Eduardo Gonçalves Felga
Dra. Marianges Zadrozny Gouvea da Costa • Dra. Martha Regina Arcon Pedroso
Em resumo, o diagnóstico precoce da pancreatite crônica NÃO é tarefa
fácil. Deve ser baseado na história clínica do paciente e nas provas de função
pancreática exócrina, quando disponíveis, nos estudos genéticos, quando há
suspeita de afecções relacionadas a mutações nos genes CFTR e PRSS1 e, principalmente, na cuidadosa avaliação da tomografia computadorizada de abdômen,
da pancreatocolangiografia por ressonância magnética, se possível com estímulo
por secretina, e na ultrassonografia endoscópica.(3,4)
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A Gastroenterologia na Prática Clínica
163
164 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 17
Provas de Função
Hepática Alteradas.
O Que Significam?
Dr. Adávio de Oliveira e Silva
D
iferentes autores abominam o termo “provas de função hepática
alteradas”. Advogam que deveriam ser definidas apenas como painel de
testes bioquímicos que definem agressão hepatocelular, restringindo-se
a determinações de níveis séricos de algumas enzimas: bilirrubina total e suas
frações, de albumina, atividade de protrombina e fator V. No entanto, embora
se entenda que tal fato se constitui uma realidade, não se pode negar que tais
provas são: 1. úteis no rastreamento de doenças hepáticas de curso assintomático; 2. importantes na confirmação da presença de agressão hepatobiliar;
3. muito úteis enquanto existem dúvidas quanto ao diagnóstico diferencial e
prognóstico evolutivo de diferentes hepatopatias; 4. significativas para monitorização evolutiva das enfermidades e definição sobre resposta à terapêutica
adotada e; 5. empregadas na composição de pesquisas clínicas podem atuar,
sobretudo, na avaliação de eficácia de terapêutica instituída.
Diante disso, embora em certas situações clínicas possa faltar especificidade, permitirá definir a existência de lesão hepatocelular valendo-se de valores
séricos de aminotransferases (ALT, AST), doença colestática determinando-se
níveis de fosfatase alcalina (FA) e gamaglutamil-transferase (GGT) e icterícias
de despertar congênito através de mensuração da bilirrubina indireta (BI). Por
sua vez, definição de síntese hepatocelular se mostra possível quando definidas
determinações de níveis séricos de albumina, atividade de protrombina e fator
V, enquanto doenças metabólicas se expressam por marcadores específicos
e as autoimunes são definidas através de pesquisas de dosagens de autoanti-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
165
Provas de Função Hepática Alteradas. O Que Significam?
corpos. Por outro lado, testes imunes sorológicos específicos são importantes
na definição das etiologias das hepatites virais. Finalmente, tais aspectos serão comentados neste capítulo, tornando possível hoje quando empregados,
permitirão a construção de escores que expressam fielmente a intensidade da
fibrose presente naqueles com hepatopatias crônicas, a nossa última preocupação nessa explanação.
Aspectos anatômicos macro e microscópicos do fígado
O fígado é normalmente perfundido por sangue proveniente da veia porta,
formada pela confluência da veia mesentérica superior e esplênica, disposta
posteriormente ao pâncreas, bifurcando-se em ramos direito e esquerdo antes
de adentrar no fígado, órgão que passa então a receber nutrientes provenientes
do estômago, intestino delgado e grosso. Complementam os 1.200 a 1.400 ml
de sangue que o órgão recebe por minuto, que são provenientes da artéria
hepática originária do tronco celíaco, em cerca de 80% dos casos, rico em oxigênio. Esta dupla irrigação forma no interior do parênquima um sistema típico
de circulação, gerando aspectos hemodinâmicos que definem topograficamente
a zona 1 periportal, responsável pelo metabolismo energético, liberação de glicose e utilização de aminoácidos, formação de ureia, colesterol e bile; zona 2
intermediária onde ocorre maior captação de sais biliares e geração da fração
de bile canalicular dependente de sal biliar e, finalmente, a zona 3 perivenosa,
realizadora de captação de glicose, da lipogênese, além da formação de glutamina e cetogênese. Resumidamente, o fígado exerce papel no metabolismo:
dos carboidratos (armazena glicogênio, converte galactose e frutose em glicose
e mantém níveis séricos normais de glicemia), das gorduras (oxidação beta dos
ácidos graxos para produção de colesterol, sendo 80% deste convertido em
sal biliar) e de fosfolípides, através de conversão de carboidratos em gorduras.
Envolve-se também no metabolismo das proteínas, deaminando aminoácidos,
formando ureia visando eliminação da amônia, geração e produção de proteínas plasmáticas, bem como de fatores de coagulação (fibrinogênio, complexo
protrombínico composto dos fatores V, VII, IX, X e alguns outros) e globulinas.
Volta-se também ao armazenamento de vitaminas (A, D e B12), metabolização
de drogas e hormônios, e excreção de várias substâncias através da bile. Todos
esses passos obedecem a um modelo de zoneamento metabólico que confere
heterogeneidade funcional ao ácino hepático (tabela 1).
Essa heterogeneidade funcional não depende apenas das condições hemo-
166 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Adávio de Oliveira e Silva
dinâmicas já descritas, mas sobretudo da atuação de suas células parenquimatosas, os hepatócitos com seu citoplasma envolvido por membranas plasmáticas
permeáveis dotadas de microvilos, mas também de suas organelas, sobretudo de
mitocôndrias, retículo endoplasmático rugoso e liso, aparelho de Golgi, lisossomos
e peroxissomos. São essas que para execução de suas funções dependem não
apenas da integridade anatômica e funcional, mas também de sua matriz extracelular, responsável pela promoção de coesão, indução de polarização intracelular,
comunicações intercelulares e de expressão gênica. Para execução desses passos
metabólicos vale-se também do funcionamento harmônico de outras estruturas,
tais como as células sinusoidais, representadas pelas: 1. endoteliais, fenestradas e
responsáveis pela formação de uma barreira entre sinusoides e espaço de Disse; 2.
células de Kupffer, de forma estelar, com grandes diâmetros móveis e responsáveis
por executar fagocitose de células mais velhas, tecidos tumorais, vírus, parasitas
e bactérias; 3. lipócitos ou células de Ito, precursores inativos dos fibroblastos,
Tabela 1. Modelo do zoneamento metabólico (heterogeneidade funcional) do ácino hepático
Zona periportal
Zona perivenosa
Metabolismo oxidativo energético
- Oxidação de ácidos graxos
- Ciclo do ácido cítrico
- Cadeia respiratória
Metabolismo de carboidratos
- Gliconeogênese
- Síntese de lactato
- Degradação do glicogênio a glicose
Glicólise
- Síntese de glicogênio a partir da glicose
- Degradação do glicogênio a lactato
Metabolismo de lipídios
- Síntese de colesterol
Cetogênese
- Síntese de ácidos graxos
Metabolismo de aminoácidos
- Conversão para glicose
- Degradação de aminoácidos
- Formação de ureia
- Uso de glutamina
Detoxificação da amônia
- Formação de glutamina
- Metabolismo de xenobióticos
- Mono-oxigenação
- Formação de ácido mercaptúrico
- Glicuronidação
Metabolismo de proteção
- Peroxidação de glutation
- Conjugação de glutation
Formação de bile
- Excreção de ácido cólico
- Excreção de bilirrubina
A Gastroenterologia na Prática Clínica
167
Provas de Função Hepática Alteradas. O Que Significam?
esses mais numerosos nas áreas pericentrais, encerrando gotículas de gordura
ricas em retículo endoplasmático rugoso, além de actina e miosina. Tornam-se
assim responsáveis pela formação de colágenos tipos I, III, IV e laminina, além
de inibidores das metaloproteinases e, finalmente; 4. células pit e linfócitos NK,
atuantes contra células neoplásicas ou proteínas virais.
Desse universo participa também o espaço de Disse, o qual se estende entre
hepatócitos contíguos, encerrando lipócitos, microvilos dos hepatócitos e plasma, além de fibras de reticulina com diâmetros entre 5-10 mm. Tem a função
de condução da linfa que se forma no fígado a partir da filtração do plasma
originário dos sinusoides, continuando-se pelo espaço de Mall, tendo seu livre
fluxo facilitado por fibras colágenas, as quais penetram junto com vênulas e
arteríolas na placa limitante.
Mostra-se importante ainda o sistema de canais biliares intralobulares com 1-2
mm de diâmetro, dispostos entre hepatócitos aos quais se ligam as membranas
de sua porção apical. Distribuem-se pelos lóbulos, penetrando nos canais de
Hering. São estruturas típicas voltadas à secreção e condução da bile, desde o
interior do parênquima até o intestino, sendo compostas pelos: 1. colangíolos,
revestidos por células epiteliais, com núcleos ovais; 2. ductos interlobulares,
com diâmetros entre 15-80 mm, revestidos também por células epiteliais que
repousam sobre a membrana basal e, envolvidos por tecido colágeno; 3. ductos
septais, também revestidos por células colunares epiteliais e envolvidos por
feixes colágenos. Drenagem da bile então formada se processa pelos ductos
biliares, direito anterior e posterior, enquanto o esquerdo se origina da convergência entre ramos medial e lateral, todos formando o ducto hepático comum.
Assume importância ainda o seu sistema linfático, o qual se volta à drenagem de linfa dotada de elevado teor proteico, sendo originário do espaço
perisinusoidal de Disse e dos espaços portais. Assume disposição periarterial,
alargando-se seus diâmetros em torno de veias porta e dos ductos biliares, até
atingirem gânglios celíacos, ligamento falciforme, gânglios paraesternais ou
dispondo-se ao longo das veias gástrica esquerda e mediastinais posteriores. Além disso, o fígado tem rica inervação parassimpática e simpática, formadoras
de um rico feixe perivascular que envolve também células perisinusoidais e hepatócitos, inervando ramos extra-hepáticos e intra-hepáticos da artéria hepática,
veias porta e hepáticas, participando das junções rígidas dos ductos biliares.
As lesões que se estabelecem sobre essas estruturas constituem-se na base
das doenças hepatobiliares, as quais se traduzem por manifestações agudas ou
crônicas, síndromes colestáticas ou não, diagnosticadas através de sintomas e
168 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Adávio de Oliveira e Silva
sinais típicos, aspectos do exame físico, com expressão laboratorial própria.
Tais aspectos serão comentados em sequência, logo a seguir.
Sintomas e sinais típicos de doenças hepatobiliares
Algumas doenças hepatobiliares podem cursar assintomáticas durante longos anos. Este comportamento pode ser observado nas hepatites crônicas ou
na colangite esclerosante primária, e na cirrose biliar primária, bem como em
afecções metabólicas, como hemocromatose hereditária, na doença de Wilson
ou deficiência de α-1-antitripsina, mesmo nas fases cirróticas. Outras vezes
expressam-se por quadro agudo, traduzido por adinamia, náusea, vômito, febre,
calafrio e manifestações sistêmicas típicas, tal como se observa nas hepatites
aguda viral e autoimune. Ascite, encefalopatia ou distúrbios da coagulação
ocorrem nas fases descompensadas da cirrose, mas podem constituir sinais de
instalação rápida nas necroses fulminantes do parênquima hepático, típicas da
redução da reserva funcional parenquimatosa. A avaliação desses pacientes
obedece a uma sequência típica (quadro 1).
Quadro 1. Comportamento diante de suspeita de doença hepatobiliar
I. IDENTIFICAÇÃO DE FATORES DE RISCO
Caracterização dos aspectos demográficos (idade, sexo e raça)
Importante, pois determinadas doenças são mais comuns entre os jovens (hepatites virais),
enquanto outras entre os mais idosos (câncer). Por sua vez, mulheres são mais afetadas
por processos como hepatite autoimune e cirrose biliar primária, enquanto homens pela
hemocromatose hereditária e colangite esclerosante primária
II. HISTÓRIA FAMILIAR
Extremamente importante na caracterização de doenças herdadas, como hemocromatose
hereditária, Doença de Wilson, deficiência de a-1-antitripsina, fibrose cística, etc.
III. HÁBITOS PESSOAIS
Nesses casos se mostram importantes as histórias de alcoolismo, ingesta de fármacos, uso
de drogas ilícitas parenterais, comportamento sexual promíscuo, parceiro sexual portador
de hepatite pelo vírus B ou C, transfusões de sangue ou cirurgia pretéritas.
IV. HISTÓRIA DE SURTOS ICTÉRICOS PREGRESSOS
Pode indicar hepatite de evolução insidiosa, coledocolitíase (sempre acompanhada de dor
abdominal, febre e calafrios) ou obstrução biliar nos casos de cirurgia biliar prévia. Esse
comportamento pode também ser observado em pacientes com colangite esclerosante
primária.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
169
Provas de Função Hepática Alteradas. O Que Significam?
Aspectos do exame físico
A icterícia é um sinal importante na suspeita de doença hepatobiliar. Pode
evoluir silenciosamente ou acompanhada de sinais típicos agudos, como
náusea, vômito e adinamia, como ocorre nas hepatites virais. Também pode
ser encontrada naqueles que cursam com febre, calafrio e prurido, comportamento observado nas obstruções de vias biliares intra ou extra-hepáticas.
A sua acentuação com rápida progressão, quando acompanhada de aranhas
vasculares, desnutrição, eritema palmar, ginecomastia, atrofia testicular, perda
de pelos corpóreos, petéquias, hematomas, edema periférico e ascite, é mais
observada na cirrose, em decorrência da redução da população de hepatócitos.
Circulação colateral abdominal e torácica, ascite e edema, esplenomegalia e
hemorroidas traduzem existência de hipertensão portal. Outras manifestações
físicas são: a contratura de Dupuytren e o aumento de volume das parótidas,
identificados em alcoólatras. Pele bronzeada, artropatia, testículo doloroso e
reduzido de volume e sinais de insuficiência cardíaca, são identificados em
doentes com hemocromatose hereditária e síndrome metabólica de resistência
à insulina. Distúrbios da movimentação, tremores, espasticidade e disartria
são próprios do envolvimento neurológico na doença de Wilson. Enfisema
faz parte do quadro clínico de pacientes com deficiência de α-1-antitripsina.
Icterícia, colúria, acolia, prurido cutâneo, febre e calafrio são identificados,
sobretudo, nas colestases intra ou extra-hepáticas. Também tais sinais são
típicos de pacientes submetidos a cirurgia hepatobiliar ou transplante de fígado, quando pacientes cursam com estenose de anastomose biliodigestiva ou
devendo-se a fenômenos de rejeição celular aguda ou crônica, ou naqueles
com doença veno-oclusiva pós-transplante de medula óssea.
Expressão laboratorial
Pacientes com lesão hepatocelular ou doença colestática podem ser avaliados através do emprego de múltiplos testes bioquímicos, os quais poderão
expressar agressão hepatocelular e definir a etiologia das doenças metabólicas
(tabela 2).
Testes imune-sorológicos definirão os marcadores das hepatites virais
(tabela 3), anticorpos não órgãos específicos caracterizarão as doenças autoimunes (tabela 4) e o comportamento da coagulação sanguínea, expressando
170 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Adávio de Oliveira e Silva
Tabela 2. Testes bioquímicos úteis na avaliação de doenças hepatobiliares
Testes bioquímicos
Aspartato
aminotransferase
Alanina aminotransferase
Bilirrubina Total
Bilirrubina Direta
Fosfatase alcalina
Gamaglumil-transferase
Albumina
Tempo de protrombina
Doenças metabólicas
Hemocromatose
Valores normais
(5-40 UI/L)
(5-35 UI/L)
(0,5-1 mg/DL)
(0,2-0,4 mg/DL)
(35-150 UI/L)
(10-48 UI/L)
(3,5-5,0 g/L)
(12-16²)
Lesão hepatocelular
> 8 X LSN
> 10 X LSN
> 15 X LSN
< 10 X LSN
> 3 X LSN
> 3 X LSN
N, exceto cirrose
Alargado, não-responsivo
A Vitamina K
Teste inicial
Teste confirmação
Ferritina sérica > 400 μg/L Índice de saturação 55%
Colestase
< 3 X LSN
< 3 X LSN
> 20 X LSN
> 15 X LSN
> 4 X LSN
> 5 X LSN
N
Alargado, responsivo
A Vitamina K
Teste definitivo
Índice fé/idade ≥ 2
Deficiência de a-1-At
> Nível sérico a-1-At
Doença de Wilson
Ceruloplasmina < 10 mg/Dl CUU: CUS > 80 μg/24 H
Biópsia hepática com
glóbulos Pas (+) Positivos
Biópsia hepática
Cu > 50 μg/G de tecido
seco
Fenótipo PI
LSN = Limite Superior Normal; a-1-AT = a-1-Antitripsina; CU = Cobre; FE = Ferro; CUU = Cobre Urinário;
CUS = Cobre Sérico; N = Normal.
Tabela 3. Testes imune-sorológicos úteis na avaliação de hepatites virais
Hepatites virais
A
Aguda
ANTI-VHA
Crônica
–
B
IgAgHBs, AgHBe, ANTI-AgHBc
IgM e DNAVHB
D
C
E
G
AgHBs (+) ANTI-VHD (+)
RNAVHC (+)
RNAVHE (+)
RNAVHG (+)
I – AgHBs (+) DNAVHB (+)
II – AgHBs (+) AgHBe (-) DNAVHB (-)
III – AgHBs (+) AgHBe (-) DNAVHB (+)
AgHBs (+) ANTI-VHD IgG (+)
RNAVHC (+)
RNAVHE IgG (+)
RNAVHG (+)
+ = Positivo; 2 = Negativo.
Tabela 4. Anticorpos nas doenças hepáticas autoimunes
Doenças hepáticas autoimunes
Hepatite autoimune
Tipo I
Tipo II
Tipo III
Cirrose biliar primária
Colangite esclerosante primária
Autoanticorpos
Antinúcleo e/ou antimúsculo liso
Antimicrossomal fígado-rim (ANTI-LKM-1)
Antígeno solúvel de fígado
Antimitocôndria
p-ANCA (60%)
A Gastroenterologia na Prática Clínica
171
Provas de Função Hepática Alteradas. O Que Significam?
diferentes situações clínicas (quadro 2). São, portanto, indicativos de diferentes
formas de doenças hepatobiliares e participam juntamente com outras provas
que quantificam a reserva funcional do órgão (tabela 5).
Quadro 2. Comportamento da coagulação sanguínea
Síntese reduzida dos fatores de coagulação
Menor massa de hepatócitos funcionantes
Deficiência de síntese ou absorção de vitamina K (Esteatorreia)
Síntese reduzida dos inibidores da coagulação
Produção de proteínas anormais
Maior atividade fibrinolítica
Clareamentro reduzido de ativadores de fibrinólise
Proporção reduzida de inibidores de fibrinólise
Reduzido clareamento hepático de fatores ativados de coagulação
Coagulação intravascular disseminada (Multifatorial)
Anormalidades plaquetárias
Tabela 5. Provas de quantificação da reserva funcional parenquimatosa
Sítio
Substrato
Função
Técnica
Galactose
Galactoquinase
(Fosforilação)
Injeção endovenosa para saturação do
sistema enzimático responsável pela
eliminação.
N-Demetilação
Aminopirina marca com 14C, administrada
v.o. resultado a cada 2 horas, traduzido
pelo desaparecimento da radioatividade
plasmática.
N-Demetilação
Correlacionam-se clearance sérico e da saliva
Interferência da idade e fumo com o resultado
da prova
Concentrações séricas dos metabólitos de
linocaína (MEGx) Reduzem-se na cirrose
avançada.
Hidroxilação/
Metilação
Vida média ultrapassa 30 horas na cirrose
grave.
Citosol
Aminopirina
Microssomo
(Cit P450)
Cafeína
Antipirina
172 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Adávio de Oliveira e Silva
Mais recentemente, ferramentas laboratoriais não invasivas têm sido empregadas, visando construções de escores que baseados em exames bioquímicos definirão graus de fibrose em portadores de doenças hepáticas crônicas.
Permitirão, inclusive, ao serem expressos tais escores em números, abolir a
variabilidade interpretativa existente interobservdor e intraobservador dos
fragmentos resultantes de biópsias hepáticas. Além disso, tornam possível o
acompanhamento em mais curtos espaços de tempo dos pacientes, pois não
se revelam invasivos e são dotados de elevada acuidade, avaliando a intensidade e progressão da fibrose sem impor riscos aos pacientes advindos da
punção do fígado, valendo-se de agulhas de fino ou grosso calibre orientadas por ultrassonografia ou videolaparoscopia. São testes válidos, sobretudo
para acompanhamento evolutivo de pacientes portadores de hepatite crônica
viral C e esteato-hepatite não alcoólica, segundo algumas proposições, tais
como: 1. valendo-se do escore MELD, proposto, sobretudo, para indicações
dos transplantes de fígado adotando-se a equação: MELD = 0,378 x (log
e bilirrubina total mg/dl) + 1,120 x (log e INR) + 0,957 x (log e creatinina
mg/dL) + 0643; 2. também esse objetivo pode ser conseguido pelo emprego
do escore APRI, baseado na fórmula: APRI [AST (x LSN)/plaquetas (10ª/LJ
x 100)]; 3. em paralelo a esse desenvolvimento, propõe-se acompanhá-los
através de algoritmo SAFE (algoritmo sequencial para avaliação de fibrose),
atualmente validado em população de 2.035 pacientes com hepatite crônica, encontrando-se correlação de seus valores com o diagnóstico de fibrose
significativa (> cF2; AUROC 0,89) e cirrose (F4; AUROC 0,92). Concluem os
autores que caso fosse adotado, em torno de 46,5% das biópsias poderiam
ser evitadas naqueles com fibrose significativa e 81,5% dos cirróticos se conduzidos valendo-se dessa proposição.
Esse terreno estará ampliado já nesses próximos anos, valendo-se da
definição de atividade sérica de biomarcadores indiretos como metaloproteinases, degradadoras da matriz extracelular (MEC), além de seus inibidores
tais como TIMP-1 e TIMP-2, bem como dos constituintes do colágeno/MEC
(procolágeno tipo III) peptídeo aminoterminal (P III NP), YKL-40 e ácido
hialurônico, refletindo o comportamento desses elementos, o processo de
fibrogênese hepática.
Bibliografia recomendada
1. Baker AL. Liver chemistry. Em: Kaplowitz N. Liver and Biliary Disease. 2th ed. Baltimore,
Williams & Wilkins, 1996.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
173
Provas de Função Hepática Alteradas. O Que Significam?
2. Bodily KO & Fitz G. Approach to the patients with suspected liver disease. Em: Grendell JH,
McQuaid KR & Friedman SL. Current Diagnosis and Treatment in Gastroenterology. Londres,
Orentice-Hall International Inc., 1st ed., 1995.
3. Friedman LS, Martin P & Muñoz SJ. Liver function testes and the objective evaluation of
the patients with liver disease. Em: Zakim D & Boyer TD. Hepatology. A Textbook of Liver
Disease, 3rd ed., Philadelphia, Saunders Co, 1996.
4. Katz N & Jungermann K. Metabolic heterogeneity of the liver. Em: Tavoloni N & Berk PD.
Hepatic Transport and Bile Secretion. Nova Iorque, Raven Press, 1st ed., 1993.
5. Klatskin G & Conn HO. The normal liver. Em: Klatskin G & Conn HO. Histopathology of
the Liver. Nova Iorque, Oxford University Press, 1993.
6. Sherlock S & Dooley J. Assessment of liver function. Em: Sherlock S & Dooley J. Diseases
of the Liver and Biliary System, 10th ed. Oxford, Blackwell Science, 1997.
7. Fan GG, Steer CJ. Cellular biology of the normal liver. Em: Bacon BR, O’Grady JG, Di Bisceglie AM, Lake JR (eds.). Comprehensive Clinical Hepatology. Londres, Mosby Elsevier,
p 17, 2006.
8. Luxon BA. Functions of the liver. Em: Bacon BR, O’Grady JG, Di Bisceglie AM, Lake JR
(eds.). Comprehensive Clinical Hepatology. Londres, Mosby Elsevier, p. 43, 2006.
9. Howdle PD. History and physical examinations. Em: O’Grady JG, Di Bisceglie AM, Lake JR
(eds.). Comprehensive Clinical Hepatology. Londres, Mosby Elsevier, p. 61, 2006.
10.Imperial JC, Keeffe EB. Laboratory tests. Em: O’Grady JG, Di Bisceglie AM; Lake JR (eds.).
Comprehensive Clinical Hepatology. Londres, Mosby Elsevier, p. 73, 2006.
11.Portmann BC. Development and anatomy of the normal liver. Em: O’Grady JG, Di Bisceglie
AM, Lake JR (eds.). Comprehensive Clinical Hepatology. Londres, Mosby Elsevier, p. 1, 2006.
12.Smith JO, Sterling RK. Systematic review: Noninvasive methods of fibrosis analysis in chronic
hepatitis C. Aliment Pharmacol Therapeut 2009;30:557-576.
13.Firedman SL. Evolving challenges in hepatic fibrosis. Nat Rev Gastroenterol Hepatol
2010;7:425-436.
14.Tafarel JR. Avaliação dos escores MELD, Child-Turcotte-Pugh, Apri, contagem de plaquetas
e exames de bioquímica hepática como indicadores da presença de varizes de esôfago com
ou sem necessidade de profilaxia para sangramento. Tese Doutorado em Ciência. UNIFESP,
2010.
15.Figueiredo Mendes CG. Estudo de marcadores indiretos do grau de desarranjo estrutural do
parênquima hepático em portadores do vírus da hepatite C. Tese Doutorado em Medicina.
UNIFESP, 2007.
16.Clark PJ, Padel K. Noninvasive tools to assess liver disease. Curr Op Gastroenterol 2011;
27:210-216.
17.Wiesner RH. Patient selection in the era of organ shortage. Em: Wright TL, Rocky DC (eds.).
Liver Disease: Form Bench to Bedside. AASLD, Postograduate Course 2004. p. 191.
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19. Sebatianini G, Halfon P, Castera L et al. SAFE biopsy: A validated method for large-scale
staging of liver fibrosis in chronic hepatitis C. Heopatology 2009;40:1821-1827.
174 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 18
O Fibroscan Pode
Substituir a Biópsia na
Avaliação da Fibrose
Hepática?
Dr. João Galizzi Filho
A
biópsia hepática tem sido considerada ao longo dos anos como o
procedimento “gold standard” para diagnosticar e acompanhar a evolução das doenças hepáticas. Trata-se, como se sabe, de método invasivo
e baseado em parâmetros morfológicos. À medida que novos métodos não
invasivos de auxílio ao diagnóstico das hepatopatias têm sido desenvolvidos,
o papel da biópsia hepática como referência padrão para detecção e estadiamento da fibrose hepática tem sido questionado. Com efeito, este importante
procedimento tem várias limitações: sendo invasivo, acarreta desconforto e
dor significativa em pelo menos um quinto dos pacientes, além de pequeno
risco – 0,5% - de sangramento ou de hemobilia que, em certas situações, pode
tornar-se maior. Além disso, o fragmento hepático obtido por punção-biópsia
corresponde a apenas cerca de 1/.50.000 do parênquima hepático e pode não
refletir fielmente as alterações predominantes no órgão - “erro de amostragem”
-, já que as doenças crônicas do fígado, embora difusas, são geralmente heterogêneas em sua expressão morfológica.(1)
Acrescente-se que a interpretação da histologia hepática está sujeita a variações intra e interexaminadores, mesmo com o uso de critérios protocolares
validados de observação e descrição. Tais desvantagens limitam o uso da biópsia
hepática especialmente para o seguimento de pacientes hepatopatas, quando
o procedimento precisaria ser repetido.
Por outro lado, há natural resistência ao uso dos novos métodos não invasivos em vista do pequeno número de estudos para validá-los cientificamente
A Gastroenterologia na Prática Clínica
175
O Fibroscan Pode Substituir a Biópsia na Avaliação da Fibrose Hepática?
em vários casos e de dificuldades várias em se aceitar mudanças num comportamento diagnóstico - uso da biópsia hepática - consolidado há muitos anos.
O fato de a biópsia hepática ser usada como “gold standard” apesar de suas
importantes limitações impede uma concordância ideal (AUROC ~ 1) dos testes
não invasivos de detecção de fibrose. Alem disso, deve-se considerar que o estadiamento da fibrose é feito por critérios morfológicos - alterações arquiteturais -,
bem diferentes da “quantidade total de fibrose”. Torna-se problemática, pois,
a pretensão de uma correlação direta entre os estágios de fibrose e os valores
obtidos com os diferentes métodos não invasivos que usam, isoladamente ou
em diferentes combinações, marcadores sorológicos rotineiros, marcadores
biológicos de fibrose e métodos de imagem como ultrassonografia, tomografia
computadorizada e ressonância magnética. Variações destes métodos, como
ARFI (acoustic radiation force impulse) e outros têm sido investigadas.(1-3)
A elastografia hepática transitória (ET) utilizando o aparelho Fibroscan baseiase na emissão de onda vibratória de pequena amplitude e baixa frequência
que se propaga pelo parênquima hepático em velocidade medida através de
aquisições ultrassônicas. A velocidade de propagação da onda relaciona-se
diretamente com a “dureza” ou “firmeza” (stiffness), do parênquima hepático,
sendo que quanto mais duro for o parênquima, maior será a velocidade medida
em quilopascais (kPa). É método não invasivo e reprodutível, avaliando uma
área do parênquima hepático cerca de 100 vezes maior que a biópsia hepática
e reduzindo muito o risco de erro de amostragem.(1,4) Pode ser utilizado em
diferentes tipos de hepatopatias e ser repetido várias vezes para seguimento.
Sendo de execução rápida, parece ter adequada relação custo/eficácia. Entre
suas limitações, estão as dificuldades em indivíduos com obesidade mórbida,
além do fato de que nem sempre a dureza do parênquima hepático reflete
presença de fibrose. Com efeito, fatores como edema, inflamação, colestase e
congestão podem interferir com a medida da consistência do fígado independentemente de haver fibrose. No entanto, já há um considerável número de
publicações médicas avaliando a eficácia da ET por Fibroscan em diferentes
patologias hepáticas, atestando sua capacidade de detectar fibrose significativa
e em especial, cirrose hepática, principalmente quando se considera o tipo de
hepatopatia subjacente.(4-6)
As hepatites crônicas, em especial a hepatite C crônica, são as doenças hepáticas nas quais os métodos não invasivos para detecção de fibrose foram mais
testados, separadamente ou em diferentes combinações. A ET por Fibroscan
foi validada em vários estudos com pacientes com hepatite C crônica, demons-
176 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. João Galizzi Filho
trando grande capacidade de detecção de fibrose significativa e cirrose.(6-8) Na
hepatite B crônica o número de estudos é menor, mas eles mostram comparável
eficiência, embora elevações das aminotransferases séricas, refletindo processo
inflamatório em atividade, possam interferir com as medidas.(9) (tabela 1).
Na doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA), a ET por Fibroscan
tem demonstrado boa eficácia diagnóstica de fibrose em estudos com adequado número de pacientes que não revelaram influência de esteatose, processo
necroinflamatório e IMC nos resultados. No entanto, algumas observações sugerem que em pacientes obesos com IMC mais elevado, os resultados possam
ser afetados pela gordura hepática.(10-12) O exato papel do Fibroscan na detecção
de fibrose na DHGNA/EHNA necessita ainda de maiores estudos, inclusive do
possível benefício de se quantificar a gordura hepática com o novo dispositivo
C.A.P. (Controlled Attenuation Parameter).
A doença hepática alcoólica apresenta um espectro de alterações histopatológicas, incluindo esteatose, hepatite alcoólica e cirrose, frequentemente
em associação. Neste contexto, a fibrose tem características diferentes, sendo
frequentes as formas perisinusoidal e perivenular. Outros fatores que podem
interferir com a avaliação com Fibroscan ou outros métodos não invasivos são
esteatose e processo necroinflamatório.(1) Estudo recente avaliou a eficácia do
Fibroscan e de outros métodos não invasivos – Fibrotest, Fibrometer, Hepatoscore, APRI (índice de relação AST/plaquetas), PGA (tempo de protrombina, GGT,
apolipoproteína A1), PGAA (PGA + alfa-2 macroglobulina) e ácido hialurônico
– em pacientes com hepatopatia alcoólica, sendo a ET o mais eficiente método
Tabela 1. Métodos não invasivos utilizados na avaliação de
fibrose hepática em pacientes com hepatite C crônica(1)
Métodos
Marcadores séricos/Fibroscan
Fibroscan
Elastografia hepática
Fibrotest
GGT, haptoglobina, bilirrubina, apolipoproteína A1, alfa-2 macroglobulina
Forns
Idade, GGT, colesterol, plaquetas
APRI
TGO, plaquetas
FIB-4
Idade, TGP, TGO, plaquetas
Hepascore
Idade, sexo, alfa-2 macroglobulina, hialuronato, bilirrubina, GGT
Fibrometer
Plaquetas, tempo de protrombina, macroglobulina, TGO, hialuronato,
idade, ureia
ELF
Propeptídeo N-terminal do colágeno tipo III, ácido hialurônico, TIMP-1
(inibidor tissular da proteinase-1), idade
A Gastroenterologia na Prática Clínica
177
O Fibroscan Pode Substituir a Biópsia na Avaliação da Fibrose Hepática?
em caracterizar diferentes estágios de fibrose hepática, com valores de cut-off
mais elevados para caracterizar fibrose significativa e cirrose que os encontrados
na hepatite C crônica.(13) Tal fato reafirma a necessidade de se considerar cut-offs
diversos para diferentes patologias hepáticas. Este e outros estudos confirmam
o valor da ET por Fibroscan na hepatopatia alcoólica.
Alguns poucas investigações clínicas comprovaram a eficácia da ET por Fibroscan em detectar fibrose avançada e cirrose em outros tipos de hepatopatias,
como as doenças colestáticas cirrose biliar primária e colangite esclerosante,
ampliando o leque de patologias cuja investigação se beneficia do método.(1,6)
O metotrexato é droga com reconhecido potencial de produção de fibrose
hepática, sendo importante no tratamento da artrite reumatoide, da psoríase e
de alguns casos de doença de Crohn. O Fibroscan pode ser útil no controle de
tais pacientes, restringindo as indicações de biópsia hepática e usando-se cut-off
semelhante ao de pacientes com esteato-hepatite não alcoólica (EHNA), que
tem bom valor preditivo negativo para excluir fibrose significativa.(14)
A ET com Fibroscan parece ter grande potencial para o acompanhamento de
pacientes submetidos a transplante hepático que apresentem fibrose significativa e/ou hipertensão porta após recorrência da hepatite C, com vários estudos
revelando boa correlação entre a pressão portal e a dureza do fígado. Tal fato
tem grande importância por predizer os pacientes com risco de descompensação
hepática após o transplante.(1,16)
Uma das aplicações mais importantes do Fibroscan parece ser na avaliação
do prognóstico de várias hepatopatias, já que os resultados do método mostram
boa correlação com a pressão venosa portal e, consequentemente, com suas
complicações clínicas. Alguns estudos demonstraram que valores da consistência hepática abaixo de 19 kPa são altamente predizíveis de ausência de varizes
esofágicas de maior volume, com valor preditivo negativo de 93%. No entanto,
deve-se considerar que a correlação entre a pressão portal e a dureza do fígado
diminui quando o gradiente de pressão venosa hepática ultrapassa 12 mmHg.(1,16)
A ET por Fibroscan poderá ser útil também em predizer a probabilidade
de surgimento de carcinoma hepatocelular (CHC) em hepatopatas crônicos.
Isto foi demonstrado num amplo estudo japonês com pacientes com hepatite
C crônica. A probabilidade cumulativa de desenvolver CHC em três anos teve
elevado grau de correlação com os resultados basais da ET por Fibroscan (0,4%
em pacientes com valores iguais ou abaixo de 10 kPa e 38% naqueles com
valores acima de 25 kPa).(17)
Outra provável utilidade do método é na avaliação dos resultados da tera-
178 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. João Galizzi Filho
pêutica das hepatites B e C crônicas sobre a fibrose hepática, já que a resposta
virológica sustentada associa-se a melhoria do processo necroinflamatório e a
regressão da fibrose, que podem ser detectados pelo Fibroscan e por alguns
outros marcadores não invasivos.(1) (tabela 2).
Em conclusão, a ET por Fibroscan tem validade já estabelecida para detectar e estadiar fibrose significativa ou cirrose em importantes situações clínicas
como hepatites B e C crônicas, coinfecção HCV-HIV, receptores de transplante
hepático, doenças colestáticas e hemocromatose. Mostra-se promissora, mas
necessitando de maiores estudos, em várias outras condições clínicas, como
no seguimento e predição das complicações da cirrose hepática. Para evitar
interpretações errôneas dos resultados da ET deve-se considerar os mencionados
fatores obesidade, aminotransferases elevadas ou resultados muito variados,
com elevado grau de dispersão. Certamente a ausência de valores de cut-off
validados para os vários estágios de fibrose e para as diferentes etiologias de
doenças hepáticas são desafios a serem resolvidos. Por outro lado, é possível
que os resultados do Fibroscan devam ser interpretados não apenas em comparação com os estágios histológicos de fibrose, mas entendendo melhor o
significado físico de suas medidas e explorando seu potencial prognóstico em
predizer complicações das hepatopatias crônicas.(5)
Embora a biópsia hepática continue importante em muitas situações, a utilização da ET por Fibroscan pode torná-la prescindível em vários contextos clínicos.
Tabela 2. Diferentes pontuações de cut-off propostas para estadiamento
de fibrose por Fibroscan de acordo com etiologias das doenças hepáticas(6)
Populações estudadas
Hepatite C (n=327)
Hepatite C (n=193)
Várias etiologias (n=711)
Hepatite C com ALT normal (n=40)
Hepatite C/hepatite B (n=228)
Hepatite B (n=287)
Cirrose biliar primária/colangite esclerosante (n=23)
Doença gordurosa hepática não alcoólica (n=67)
Hepatite C pós-transplante hepático (n=95)
Valores de cut-off
(sensibilidade/especificidade)
Fibrose significativa Cirrose
8.7 (73/84)
7.1 (67/89)
7.2 (64/85)
8.7 (100/100)
8.3 (85/91)
7.5 (94/88)
7.3 (84/87)
6.6 (83/81)
7.9 (81/76)
14.5 (87/96)
12.5 (87/91)
17.6 (77/97)
-14.0 (78/98)
11.8 (86/96)
17.3 (93/95)
17.0 (100/98)
12.0 (93/93)
Um cut-off de 5,6 +/- 1,6 kPa foi proposto para indivíduos normais.
A Gastroenterologia na Prática Clínica
179
O Fibroscan Pode Substituir a Biópsia na Avaliação da Fibrose Hepática?
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180 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 19
Como Tratar a
Esteato-Hepatite
Não Alcoólica?
Dr. Angelo Alves de Mattos
Dra. Andrea Benevides Leite
A
tualmente a esteato-hepatite não alcoólica (EHNA) está dentro
de uma conceituação mais ampla, sendo considerada parte do espectro
da doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA). Essa doença
passou de uma curiosidade médica no início, dos anos 80, para uma situação
clínica de grande relevância nos dias atuais. Quando se avaliaram as causas de
doença hepática crônica nos Estados Unidos, ela compartilhava em frequência
com a hepatite C e com a doença hepática alcoólica. Outro motivo que desperta o interesse da comunidade científica é o reconhecimento do seu potencial
evolutivo, pois pode, inclusive, evoluir para cirrose.(1-4) Desta forma entendese fundamental o conhecimento da conduta terapêutica mais adequada a ser
ofertada a esta população de pacientes.
É importante ressaltar que a DHGNA vem sendo considerada como o componente hepático da síndrome metabólica (SM).(5,6) Esta síndrome (tabela 1),
um conjunto de fatores de risco para doença cardiovascular aterosclerótica,
reúne condições diretamente promotoras de aterogênese e de resistência à
insulina (RI).(7)
O consenso capitaneado pela International Diabetes Federation,(8) publicado
em 2009, mantém os critérios de 2005, mas sugere que cada país determine seu
ponto de corte para circunferência abdominal. Para a América do Sul, recomenda
> 90 cm em homens e ≥ 80 cm em mulheres.
Ao se identificar um paciente com DHGNA, deve-se avaliá-lo quanto aos critérios de SM. Os que preenchem os critérios estão sob risco cinco vezes maior de
A Gastroenterologia na Prática Clínica
181
Como Tratar a Esteato-Hepatite Não Alcoólica?
Tabela 1. Critérios de Síndrome Metabólica (AHA, 2005)
Pressão arterial sistólica
≥ 130 mmHg e/ou diastólica ≥ 85 mmHg.
Triglicerídeos
≥ 150 mg/dL.
HDL
< 40 mg/dL para homens / < 50 mg/dL para mulheres.
Glicemia de jejum
≥ 100 mg/dL.
Circunferência abdominal
≥ 102 cm em homens / ≥ 88 cm em mulheres.
Para diagnóstico devem ser preenchidos pelo menos 3 dos 5 critérios.
evoluir para diabetes mellitus;(9) duas vezes maior de morbidade cardiovascular
e 1,5 vez maior de mortalidade geral.(10) Um dos objetivos na intervenção clínica
nesses pacientes é prevenir ou retardar o aparecimento de diabetes mellitus do
tipo 2 e/ou doença cardiovascular aterosclerótica.(7) Redução da gordura visceral
e da RI é a medida terapêutica mais abrangente, mas cada critério alterado da
SM tem seu tratamento bem definido, inclusive por diretrizes brasileiras.(11-14)
A RI talvez seja o fator sobrejacente mais relevante nos pacientes com DHGNA “primária”, ou seja, não secundária a fatores pontuais, como uso de drogas
ou contato com derivados petroquímicos, por exemplo. A medida da circunferência abdominal, a determinação da glicemia de jejum, o teste de tolerância à
glicose e o cálculo do índice de HOMA-IR(15) são ferramentas simples que dão
ao médico substrato para uma eventual intervenção e medida de comparação
no acompanhamento do tratamento de seu paciente.
O cálculo do índice de HOMA-IR está descrito no quadro abaixo (quadro 1).
Valores acima de 2,71 são indicativos de resistência à insulina na população
nacional, segundo pesquisa do Brazilian Metabolic Syndrome Study Group
(BRAMS)(16) realizada em 2006. Em 2009, o mesmo grupo definiu o ponto de
corte do HOMA-IR em 2,3 como tendo boa correlação com o diagnóstico de
SM.(17) Em 2010, Salgado e col.(18) realizaram um estudo na Escola Paulista de
Medicina para definir o melhor ponto de corte do HOMA-IR para o diagnóstico
de DHGNA, chegando ao valor de 2, com sensibilidade de 85% e especificidade de 83% (AUC = 0,84), ou 2,5 com sensibilidade de 72% e especificidade
de 94% (AUC = 0,83).
Quadro 1. Cálculo do índice de HOMA-IR
Glicemia de jejum mg/dL x Insulina de jejum µU/mL
405
182 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Angelo Alves de Mattos • Dra. Andrea Benevides Leite
Outro desafio a ser considerado é a identificação da EHNA, e seu correto
estadiamento, diante de pacientes com esteatose à ultrassonografia. Para tanto,
o método padrão áureo continua sendo a biópsia hepática, apesar das limitações
de amostragem e variabilidade entre observadores. Por ser um procedimento
invasivo, uma opção no estadiamento da doença, ainda que insatisfatória, é o
uso de modelos não invasivos preditores de fibrose hepática. Aparelhos como
o Fibroscan® e escores computadorizados tais como o Fibrometer® têm boa acurácia na determinação de fibrose avançada das hepatites virais.(19,20) No entanto,
a falta de precisão na determinação de fibrose mais incipiente e a carência de
estudos em DHGNA são limitações desse tipo de ferramenta. Um escore fácil
de ser usado na prática clínica, mas também limitado quanto à detecção de
fibrose mais inicial, foi desenhado por Angulo e col.(21) em 2007, sendo específico para fibrose da DHGNA. O teste se propõe a separar pacientes com e sem
fibrose avançada. O cálculo está disponível na internet: http://nafldscore.com.
Em 2008, este escore foi validado para uma população de obesos mórbidos
no Paraná. (22) Enfatizamos que os métodos não invasivos atualmente não são
capazes de diagnosticar a EHNA.
Os pacientes com EHNA necessitam de tratamento para evitar uma possível
progressão para cirrose, além de ser oportuna uma vigilância para o risco de
desenvolvimento de carcinoma hepatocelular.
Em uma abordagem inicial, a dieta com redução de calorias e o exercício
físico continuam sendo as bases do tratamento da EHNA, posto que a perda de
tecido adiposo intervém no mecanismo básico da doença ao reduzir a RI, além
de melhorar os níveis pressóricos, glicêmicos e o perfil lipídico.(7,23)
Em 2010, Promrat e col.(24) realizaram um estudo randomizado e controlado
em 31 pacientes com índice de massa corpórea (IMC) entre 25 e 40 kg/m2, de
um ano de duração, com o objetivo de detectar o efeito da intervenção do estilo
de vida nos níveis de aminotransferases e achados histológicos na EHNA. Os
autores concluíram que a magnitude da perda de peso correlaciona-se fortemente
com a melhora nos marcadores de EHNA, e que um mínimo de 7% de perda
de peso é necessário para se atingir algum impacto nas alterações histológicas.
Ressalte-se que nenhum participante mostrou melhora no grau de fibrose.
O tratamento farmacológico da obesidade, indicado a obesos ou pacientes
com sobrepeso e comorbidades que não conseguiram emagrecer com mudança
no estilo de vida, inclui diversas drogas, sendo sibutramina e orlistate as mais
seguras.(14) Um trabalho com 25 pacientes, onde estes medicamentos foram
utilizados, relata significativa melhora na bioquímica hepática, na RI medida
A Gastroenterologia na Prática Clínica
183
Como Tratar a Esteato-Hepatite Não Alcoólica?
pelo HOMA-IR e redução de peso, além de regressão da esteatose avaliada pela
ultrassonografia na maioria dos pacientes. A falta de biópsia hepática seriada é
uma limitação deste estudo.(25)
A atividade física, além de contribuir para a perda de peso, traz benefícios
adicionais relacionados à regulação das vias metabólicas de controle do metabolismo, inflamação e fibrose.(26,27) Dessa forma, a prática regular de exercícios,
mesmo quando não resulta em perda de peso, é capaz de retardar a progressão
para o diabetes mellitus, melhorar o perfil lipídico(28,29) e, naqueles com DHGNA,
reduzir enzimas hepáticas e esteatose.(30-32)
A quantidade, intensidade e modalidade de exercício necessárias para obterse benefício na DHGNA ainda não foi precisamente estabelecida.(33) Podemos
apenas supor que quanto mais, melhor. O trabalho de Kistler e col.(34) vem ao
encontro dessa questão. Nesta pesquisa transversal foram estudados 813 adultos
com DHGNA comprovada por biópsia. Os participantes foram alocados em três
grupos: praticantes de atividade física intensa, moderada ou inativos, de acordo com a recomendação americana de prática de atividade física. Os autores
observaram que os praticantes de atividade intensa tinham uma menor chance
de ter EHNA que os demais (OR 0,65); aqueles que ultrapassavam os critérios
de atividade intensa tinham chance ainda menor de apresentar fibrose avançada (OR 0,53). Os praticantes de atividade moderada não obtiveram resultado
estatisticamente diferente daquele dos inativos.
Para o tratamento da EHNA, nenhuma droga isoladamente foi aprovada até o
presente momento como primeira linha de tratamento.(35-37) A literatura é escassa
em dar respostas mais definitivas e os ensaios clínicos em EHNA sofrem uma
série de limitações. Talvez a mais relevante seja a curta duração dos ensaios,
e consequente incapacidade de se refletir melhora histológica em benefício
clínico, como redução de morbimortalidade.
Dentre as drogas elencadas aquela que, ultimamente, tem conseguido maior
prestígio parece ser a vitamina E, graças ao seu papel antioxidante. O estudo
PIVENS,(38) conduzido pela NASH Clinical Research Network, comparou o efeito
de 800 UI/dia de vitamina E e de 30 mg/dia de pioglitazona com placebo no
tratamento da EHNA em 247 adultos não diabéticos. O estudo durou 2 anos e
foram feitas biópsias hepáticas antes e depois do tratamento. Ambas as drogas
mostraram redução no escore de atividade de DHGNA (NAS(39)), sendo que a
resolução da EHNA ocorreu em 21% dos pacientes em uso de placebo, 36%
daqueles em uso de vitamina E e em 47% dos que estavam em uso de pioglitazona. Nos dois grupos de tratamento ocorreu redução significativa da esteatose
184 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Angelo Alves de Mattos • Dra. Andrea Benevides Leite
e da inflamação lobular quando comparados ao placebo. A balonização celular
foi reduzida em maior proporção nos grupos de tratamento, mas no grupo da
pioglitazona só houve diferença significativa em uma segunda análise. Nenhuma
das drogas demonstrou melhora no índice de fibrose.
Existem formulações de vitamina E de 400 UI, em cápsulas. Atenção deve
ser dada ao uso prolongado dessa dose, já que uma meta-análise(40) com 11
estudos de uso de vitamina E em doses superiores a 400 UI/dia mostrou risco
aumentado de mortalidade geral.
As tiazolidinedionas, como a pioglitazona e a rosiglitazona, são drogas usadas
no tratamento do DM por promoverem melhora da sensibilidade à insulina no
tecido adiposo, hepático e músculo-esquelético.(41)
Estudos anteriores ao PIVENS já foram conduzidos para avaliar o poten­cial terapêutico da pioglitazona na EHNA, a maioria obtendo resposta histológica.(42-44)
Um deles foi conduzido para observar os efeitos da suspensão da droga,
constatando-se perda dos benefícios obtidos após o fim do tratamento. (45) Seria
então necessário seu uso de forma prolongada. Atualmente há alguma inquietação no uso da pioglitazona devido à observação recente de uma possível
associação da droga com câncer de bexiga.(46)
A rosiglitazona também foi satisfatoriamente eficaz no tratamento da EHNA,
ao longo de 1 ano, segundo alguns estudos(47-49) mas, no Brasil, teve sua comercialização suspensa após suspeitas de que estivesse associada a risco aumentado
de infarto agudo do miocárdio e insuficiência cardíaca.(50-53)
Levando em consideração o mecanismo fisiopatogênico básico da maioria
dos casos de DHGNA, parece ser racional o tratamento da EHNA com metformina, um agente redutor da RI. Na prática clínica, a metformina é uma droga
largamente utilizada no tratamento de pacientes com diabetes mellitus e prédiabetes, sendo de baixo custo e estando disponível no Sistema Único de Saúde
(SUS). É sabido que esta droga também melhora o perfil lipídico e pode induzir
alguma perda de peso.(54) Alguns estudos com metformina foram realizados em
pacientes com EHNA, demonstrando alguma melhora bioquímica na maioria,
porém, naqueles em que havia controle histológico, não houve mudança ou
melhora estatisticamente significativa.(55-58) Um único estudo demonstrou resposta
bioquímica e histológica após 1 ano de tratamento com 2 g/dia de metformina,
sendo a melhora significativa ao ser comparada com o braço tratado com vitamina E 800 UI/dia e com aqueles tratados com dieta hipocalórica. No entanto,
dos 55 casos em uso de metformina, apenas 17 submeteram-se a biópsia ao
fim do tratamento, além do que não houve biópsia pós-tratamento dos contro-
A Gastroenterologia na Prática Clínica
185
Como Tratar a Esteato-Hepatite Não Alcoólica?
les. (59) Portanto, ainda não existem fortes evidências para a indicação específica
da metformina no tratamento da EHNA. Nos casos de sua indicação dentro de
um contexto clínico, afora os cuidados de prescrição quanto à acidose láctica,
deve-se dar atenção ao nível de vitamina B12 no uso prolongado da droga,
para evitar deficiência da vitamina.(60,61)
Ao abordar o tratamento da EHNA é preciso estar ciente da complexidade da
fisiopatogenia da doença, ainda não totalmente elucidada. Atentar apenas para a
resolução da RI e supor que todos os casos respondem da mesma forma é uma
abordagem simplista para uma doença de etiologia e fisiopatogenia multifatorial.
O mais recente estudo sobre o efeito da rosiglitazona na EHNA, o FLIRT 2,(62)
colocou em evidência essa questão. Nesse estudo, os autores observaram que
a melhora da esteatose, verificada no primeiro ano de uso (estudo FLIRT(48)),
não se repetiu nos dois anos subsequentes, mesmo tendo novamente havido
melhora nas aminotransferases e na sensibilidade à insulina. O tratamento por
três anos não foi capaz de alterar o escore de inflamação e houve, inclusive,
um discreto e não significativo aumento no escore global de fibrose. Ou seja, a
queda no índice de HOMA-IR não é preditor de resposta histológica. Isso reforça
o conceito de múltiplos mecanismos envolvidos na patogênese da EHNA, que
podem vir a ser alvo de tratamento, sendo este um vasto campo de pesquisa.
Ao largo dessa vertente, alguns estudos têm focado no papel dos antioxidantes, do fator antinecrose tumoral alfa (anti-TNFα) e do ácido ursodesoxicólico
(AUDC).
Além da vitamina E, outros antioxidantes, como a betaína e a N-acetilcisteína
vêm sendo estudados. Em 2009, Abdelmalek e col.(63) publicaram um estudo
placebo-controlado de 1 ano de tratamento com betaína anidra em 55 pacientes
com EHNA, não encontrando alterações na biópsia pós-tratamento. Também
não houve aumento nos níveis de adiponectina, ou diminuição nos níveis de
glicemia, insulina e S-adenosil-homocisteína. No entanto, a maioria dos pacientes
interrompeu a droga por efeitos adversos. Quanto à N-acetilcisteína, o único
estudo randomizado e controlado(64) disponível até o momento não avaliou
resposta histológica. O resultado desse trabalho mostrou alguma melhora na
bioquímica hepática, mas não estatisticamente significativa.
A pentoxifilina apresentou resposta histológica em um pequeno estudo(65) de
25 pacientes com EHNA. Outros dois ensaios estão para ser publicados, ambos
com algum grau de resposta histológica. Uma meta-análise recente concluiu
que a pentoxifilina não diminui os níveis de IL-6 ou TNFα.(66)
O efeito do AUDC (na dose de 12–15 mg/kg) nas alterações histológicas da
186 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Angelo Alves de Mattos • Dra. Andrea Benevides Leite
EHNA foi relatado em alguns estudos, havendo dois randomizados e placebocontrolados ambos com dois anos de duração. O de Lindor e col.,(67) com 166
pacientes, encontrou melhora não significativa das lesões histológicas, assim
como das enzimas hepáticas. O de Dufour e col.(68) constatou ausência de efeito
na histologia hepática daqueles em uso exclusivo da droga, apesar da resposta
bioquímica. Recentemente, um terceiro ensaio clínico randomizado, placebocontrolado,(69) com biópsias seriadas, foi realizado com doses altas de AUDC
(23–28 mg/kg); este também não encontrou mudanças na histologia hepática,
exceto por melhora na inflamação lobular.
Em resumo, até o momento também não há evidências na literatura que
dêem suporte ao uso de betaína, N-acetilcisteína, pentoxifilina ou AUDC, no
tratamento da EHNA.
Voltando à intervenção na síndrome metabólica, drogas que atuam no
metabolismo dos lipídeos e anti-hipertensivos também foram avaliadas em pequenos estudos para tratamento de EHNA, com resultados interessantes para o
telmisartan.(70-74) Mais evidências são necessárias antes de alguma dessas drogas
se estabelecer como tratamento da EHNA.
O papel da flebotomia no tratamento da EHNA, tendo em vista eventual
sobrecarga secundária de ferro, é discutível. A flebotomia melhora a RI e diminui os níveis de aminotransferases, no entanto, deve-se aguardar estudos
controlados antes de uma postura mais definitiva.(75)
Vários estudos têm surgido na literatura abordando o reflexo que a cirurgia
bariátrica poderia ter na EHNA. No entanto, ainda não é possível estabelecer
seu papel no tratamento da DHGNA pela falta de ensaios clínicos randomizados,
com desenhos metodológicos adequados, segundo uma revisão feita em 2010
pela base de dados Cochrane.(76)
Em resumo, o tratamento da EHNA envolve primordialmente mudança do
estilo de vida. Reduzir a gordura visceral através de exercícios físicos e dieta
hipocalórica retira o estímulo fisiopatogênico básico indutor da DHGNA. Algumas drogas podem ser utilizadas para tratamento da EHNA, em associação
com essas medidas, no entanto, a literatura carece de dados conclusivos para
respaldar uma conduta medicamentosa mais definitiva. Os medicamentos mais
promissores são a vitamina E e a pioglitazona, com a ressalva do possível aumento de mortalidade induzido pela vitamina E a longo prazo e do possível
risco de câncer de bexiga associado à pioglitazona. Na prática clínica, a metformina pode ser utilizada nos casos de RI, como se verifica naqueles pacientes
com circunferência abdominal aumentada ou HOMA-IR elevado. Faz parte do
A Gastroenterologia na Prática Clínica
187
Como Tratar a Esteato-Hepatite Não Alcoólica?
trabalho do gastroenterologista/hepatologista, enquanto médico, tratar os pacientes quanto aos fatores de risco para DHGNA, estimulando a mudança no
estilo de vida e lançando mão de anti-hipertensivos ou hipolipemiantes quando
julgar necessário.
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192 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Capítulo 20
Qual o Melhor
Betabloqueador
em Cirróticos?
Dr. Mário Reis Álvares-da-Silva
A
hipertensão portal é uma complicação importante da cirrose e
está por trás de muitas de suas complicações, como sangramento de
varizes esofagogástricas, gastropatia hipertensiva, hiperesplenismo,
ascite, peritonite bacteriana espontânea, síndrome hepatorrenal, encefalopatia
hepática. Quando aferida pelo gradiente de pressão venosa hepática (HVPG), a
pressão portal acima de 10 mmHg representa uma situação de risco, sendo que
o sangramento digestivo costuma ocorrer em valores superiores a 12 mmHg.
O surgimento de varizes esofágicas em um paciente cirrótico é um marco.
Isto atesta a passagem para um patamar mais grave da doença. A classificação do
status clínico da cirrose leva em consideração a presença de varizes. O surgimento
de ascite em momento seguinte demonstra que a hipertensão portal está se tornando mais grave, o que se correlaciona com o risco de mortalidade. A figura 1
demonstra os status clínicos da cirrose e a mortalidade em um ano, incorporando
o conceito de hipertensão portal clinicamente significativa, que associa o aumento
progressivo da pressão portal à descompensação da cirrose e ao óbito.
Estratégias para reverter a hipertensão portal são de grande interesse, mas
infelizmente ainda limitadas ao uso de betabloqueadores não seletivos (NSBBs). As recomendações habitualmente seguidas no seu controle advêm das
Reuniões de Consenso de Baveno, desenvolvidas desde a segunda metade da
década de 80. Os consensos de Baveno baseiam a intervenção na hipertensão
portal de acordo com a presença de varizes de esôfago. Estas intervenções podem ser feitas em diferentes momentos: a) profilaxia pré-primária, para evitar
A Gastroenterologia na Prática Clínica
193
Qual o Melhor Betabloqueador em Cirróticos?
Figura 1. Status clínicos da cirrose. Onde HVPG = gradiente de pressão venosa hepática.
Status I
Status II
Status III
Status IV
1%
3%
20%
57%
Varizes
Varizes
Varizes
sangrantes
Ascite
+ Ascite
Mortalidade 1 ano
HVPG
6 mmHg
100 mmHg
200 mmHg
a formação de varizes; b) profilaxia primária, a fim de evitar o sangramento
de varizes já existentes; c) profilaxia secundária, com o propósito de evitar um
novo sangramento em paciente com história de sangramento varicoso prévio.
O consenso mais recente é Baveno V, do ano de 2010. A tabela 1 resume os
principais pontos sugeridos por Baveno V em relação ao uso de NSBBs.
Onde: NSBBs= betabloqueadores não seletivos; ISMN= mononitrato de isossorbida; LEVE= ligadura endoscópica de varizes de esôfago; HVPG= gradiente
de pressão venosa hepática; EEVE= escleroterapia endoscópica de varizes de
esôfago. Na coluna Baveno V, números e letras se referem, respectivamente, a
evidência e grau de recomendação (sistema Oxford).
O fármaco mais empregado no controle da hipertensão portal é o propranolol. Largamente utilizado, o propranolol carrega a alcunha de “aspirina do
hepatologista”. Seu uso reduz a pressão portal em 2/3 dos pacientes, através
da diminuição do fluxo sanguíneo portal e do índice e da frequência cardíacos.
Em torno de 30% deles surgem sintomas de intolerância que impedem que a
droga seja mantida. Além disso, a evidência clínica de betabloqueio atestada
pela redução em 25% da frequência cardíaca não reflete necessariamente a
redução da pressão portal. De fato, para que se determine a eficácia da droga
deve-se indicar um procedimento invasivo – a aferição do HVPG. Na prática
194 Federação Brasileira de Gastroenterologia
Dr. Mário Reis Álvares-da-Silva
Tabela 1. Recomendações para o controle da hipertensão
portal de acordo com as mais recentes Reuniões de Consenso de Baveno
Critério
O que estava em Baveno IV
O que mudou em Baveno V
Profilaxia
pré-primária
Cirrose = endoscopia para avaliar
varizes; não está indicado o uso de
NSBBs sem endoscopia prévia; não
há indicação para tratamento na
prevenção da formação de varizes.
Inclui o HVPG ≥ 10 mmHg como preditor da
formação de varizes (1b;A), mas restringe
seu uso com este propósito apenas a
ensaios clínicos (5;D); recomenda o
tratamento da doença hepática de base
como forma de reduzir a pressão portal e a
formação de varizes (1b;A).
Profilaxia primária
(VE pequeno calibre)
Recomenda o uso de NSBB caso haja
sinais vermelhos ou pacientes
Child-Pugh C.
Discute a possibilidade de serem indicados
NSBBs para qualquer paciente com varizes
de pequeno calibre (1b;A).
Profilaxia primária
(VE médio-grande
calibre)
Não faz comentários específicos.
NSBB ou LEVE recomendados para a
profilaxia primária (1a;A); a escolha
depende da expertise do local,
preferências do paciente, efeitos adversos
e contraindicações (5;D); NSBB + LEVE
não é recomendada, assim como não
há evidências de que NSBB + ISMN ou
espironolactona devam ser associados
(1b;A); carvedilol é uma alternativa
promissora, mas necessita de maiores
estudos (1b;A); EEVE, shunts ou ISMN não
devem ser usados neste cenário (1a;A).
Profilaxia primária
(varizes gástricas)
Sugere ensaios clínicos randomizados
para definir a conduta.
Recomenda NSBBs.
Aferição do HVPG
(para controle do
tratamento)
Não faz comentários específicos.
A diminuição de ao menos 20% em relação
ao baseline ou a queda para ≤12 mmHg
após tratamento crônico com NSBBs é útil
para profilaxia primária (1a;A); resposta
aguda após propranolol IV pode ser usada
para identificar respondedores a NSBBs queda de 10% do HVPG ou
HVPG ≤12 mmHg (1b;A).
Profilaxia
secundária em
cirróticos
NSBBs, LEVE ou ambos devem
ser usados na prevenção do
ressangramento. Avaliação da
resposta hemodinâmica à droga
dá informações sobre o risco de
ressangramento.
A associação de ISMN a NSBB pode
aumentar a eficácia do tratamento em
pacientes que não responderem do ponto
de vista hemodinâmico (5;D). Nos pacientes
que não podem ou não querem ser tratados
com LEVE, NSBB+ISMN é o tratamento de
escolha (1a;A).
A Gastroenterologia na Prática Clínica
195
Qual o Melhor Betabloqueador em Cirróticos?
clínica não se costuma aferir o gradiente e a maior parte dos pacientes que utiliza
propranolol a longo prazo o faz sem que se saiba se está sendo efetivo ou não.
O nadolol é outro agente bastante estudado para o controle da pressão portal,
embora não seja tão empregado clinicamente como o propranolol. Um recente estudo francês mostrou que há risco na administração de NSBBs na cirrose
avançada. Os autores avaliaram de forma prospectiva, porém observacional, 151
pacientes portadores de cirrose e ascite refratária em uso ou não de propranolol
para a profilaxia de sangramento varicoso. A probabilidade de sobrevida em 1
ano no grupo controle foi de 64% vs. 19% naqueles que recebiam propranolol
(p<0,0001), sugerindo que NSBBs não devam ser usados nesta população.
O estudo tem sido criticado por suas deficiências metodológicas, mas teve o
grande mérito de trazer esta questão à tela. O uso de propranolol em cirróticos
avançados provavelmente será tema de ensaios clínicos randomizados no futuro.
Dentre os NSBBs o mais promissor, talvez o agente ideal, é o carvedilol.
Ele é um potente agente betabloqueador e em menor escala (1/10 da atividade
betabloqueadora), uma droga anti-α-adrenérgica. O carvedilol, como betabloqueador, por ação nos receptores β1 do miocárdio, diminui o débito cardíaco,
enquanto sua ação nos receptores β2 da circulação mesentérica promove vasoconstrição esplâncnica. Sua ação anti-α- -adrenérgica diminui o tono vascular
hepático (figura 2). O efeito benéfico da associação das ações betabloqueadora
Figura 2. Mecanismos associados à redução da pressão portal
com o uso de carvedilol. Onde: FC= frequência cardíaca.
Carvedilol
E tono vascular
hepático
Efeito bbloqueador seletivo
Efeito betabloqueador a1adrenérgico
E da resistência
hepática
E do fluxo
portal
E da pressão
portal
196 Federação Brasileira de Gastroenterologia
E FC e do índice
cardíaco
Vasoconstrição
esplâncnica
Dr. Mário Reis Álvares-da-Silva
e bloqueadora-α-adrenérgica já havia sido testado no passado com a associação
de propranolol e prazosina. Desenvolvido para o tratamento da hipertensão
arterial e insuficiência cardíaca, o carvedilol tem 2 a 4 vezes maior potência
betabloqueadora que o propranolol. Além disso, tem efeito antioxidante que
poderia ser especialmente útil em cirróticos. No entanto, há riscos de que sua
ação vasodilatadora sistêmica promova hipotensão arterial e retenção de sódio. Vários estudos demonstram efeitos benéficos do carvedilol no controle da
pressão portal, superiores àqueles obtidos com propranolol. Alguns estudos
sugerem que em doses relativamente baixas (12,5 mg/dia ou 6,25 mg 2 vezes
ao dia) há queda significativa da pressão portal com menor risco de hipotensão
sistêmica. No entanto, ainda são necessários mais estudos para determinar sua
eficácia clínica e sua segurança.
Em resumo, os NSBBs são importantes agentes para o controle da hipertensão
portal em pacientes portadores de cirrose. Propranolol e nadolol são os agentes
mais estudados, mas apresentam limitações. Carvedilol parece ser a melhor
alternativa. No entanto, ainda no consenso Baveno V é recomendado que este
agente venha a ser melhor estudado antes que venha a substituir o propranolol
como droga de escolha. De tal forma que em resposta à pergunta formulada no
título pode-se hoje afirmar que não há ainda um agente betabloqueador que
preencha todas as características necessárias para que seja classificado como o
betabloqueador ideal.
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200 Federação Brasileira de Gastroenterologia
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Uma Dose Diária1-3
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Manutenção 5-7
Indução à remissão 4,8,9
Mesacol® MMX*
2400mg/dia
1x ao dia
Mesacol® MMX*
4800mg/dia
1x ao dia
Mesacol® MMX* não é recomendado em casos de hipersensibilidade a salicilatos. A administração da mesalazina
pode potencializar a toxicidade do metotrexato.
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GR et al. Effect of once or twice-daily MMX mesalamine (SPD476) for the induction of remission of mild to moderately active ulcerative colitis. Clin Gastroenterol Hepatol. 2007;5:95-102. 10) Lista de genéricos. Guia da Farmácia. 2011;18(220 Supl):2-32. 11)
Hu MY, Peppercorn MA. MMX mesalamine: a novel high-dose, once-daily 5-aminosalicylate formulation for the treatment of ulcerative colitis. Expert Opin Pharmacother. 2008;9(6):1049-58.
Mesacol® MMX* - mesalazina - Uso adulto - Apresentações e composição: Comprimidos revestidos de liberação prolongada, com 1,2 g de mesalazina cada. Embalagens com 10 e 30 unidades. Indicações: antiinflamatório de ação local no tratamento
da colite ulcerativa ativa leve a moderada, na fase aguda (indução da remissão) e na manutenção da remissão. Contra-indicações: Este medicamento não deve ser usado por pacientes com história de hipersensibilidade aos salicilatos (que inclui o ácido
acetilsalicílico), à mesalazina, à sulfassalazina ou a qualquer dos componentes da fórmula; pacientes com insuficiência hepática e/ou renal graves; pacientes com úlcera gástrica e duodenal ativa; pacientes com tendência elevada a sangramento. Este
medicamento é contra-indicado para menores de 18 anos. Precauções e advertências: As mesmas precauções e advertências relacionadas com o uso de preparações contendo mesalazina ou pró-drogas de mesalazina devem ser consideradas
para Mesacol® MMX*. Assim como todos os salicilatos, a mesalazina deve ser utilizada com cautela em pacientes com história de úlcera gástrica ou duodenal, por pacientes asmáticos (em função das reações de hipersensibilidade), com disfunção renal
ou hepática (leve a moderada), ou com história de miocardite ou pericardite. Mesalazina não é recomendada para pacientes com disfunção renal grave e deve-se ter cautela com pacientes com níveis sangüíneos aumentados de uréia ou com proteinúria. A
mesalazina é rapidamente excretada pelos rins, principalmente o seu metabólito ácido N-acetil-5-aminossalicílico. Em ratos, altas doses da mesalazina, administradas por via intravenosa, causaram toxicidade tubular e glomerular. Em caso de aparecimento de
disfunção renal durante o tratamento deve-se suspeitar de nefrotoxicidade induzida pela mesalazina. Nestes casos é recomendado monitorar a função renal, especialmente no início do tratamento. Durante tratamento prolongado, é também necessário monitorar
regularmente a função renal (creatinina sérica). Ainda não está estabelecida a segurança do produto em crianças. Gravidez e lactação: Mesacol® MMX* está classificado na Categoria B de risco de fármacos destinados ao uso em grávidas. O produto, a princípio,
não deve ser empregado em gestantes e lactantes, exceto quando absolutamente necessário. A segurança de Mesacol® MMX* para uso durante a gravidez ou a amamentação ainda não foi estabelecida, mas sabe-se que a mesalazina atravessa a placenta
e é excretada pelo leite materno em pequenas quantidades. Estudos pré-clínicos não revelaram evidência de efeitos teratogênicos ou de toxicidade fetal oriundos da mesalazina, nem na evolução da gestação ou no desenvolvimento perinatal e pós-natal. A
pequena experiência de uso da mesalazina em outras formulações durante a gravidez não mostrou efeito prejudicial ao feto; entretanto, a mesalazina deve ser usada com cautela durante a gravidez e somente quando os benefícios para a mãe forem superiores
aos riscos potenciais ao feto. Baixas concentrações de mesalazina e de seu metabólito N-acetilado foram detectadas no leite materno, mas o significado clínico desta evidência ainda não foi determinado. Portanto, deve-se ter cautela na administração da
mesalazina a lactantes. Categoria B de risco na gravidez – Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica ou do cirurgião-dentista. Pacientes pediátricos: Devido à falta de dados sobre a administração da mesalazina em
altas doses na população pediátrica, Mesacol® MMX* não é recomendado para pacientes menores de 18 anos. Pacientes idosos: Não existe experiência suficiente sobre o uso de Mesacol® MMX* em pacientes com idade acima de 65 anos. No entanto, não
foram identificadas diferenças entre o uso em pacientes mais jovens e em idosos com outras formulações de mesalazina. Pacientes com insuficiência renal: não são disponíveis informações sobre o uso em pacientes com insuficiência renal leve ou moderada.
O medico deverá avaliar a relação risco/benefício para o seu uso. Pacientes com insuficiência hepática: não são disponíveis informações sobre o uso em pacientes com insuficiência hepática leve ou moderada. O medico deverá avaliar a relação risco/benefício
para o seu uso. Dirigir e operar máquinas: É improvável que o uso deste medicamento tenha qualquer efeito na capacidade de dirigir veículos ou de usar máquinas. Interações medicamentosas: Nenhum estudo formal de interação foi conduzido. Não
são disponíveis informações sobre interações entre Mesacol® MMX* e outros fármacos. Entretanto, existem relatos de interação entre a mesalazina (outras formulações) e outros medicamentos. O uso concomitante da mesalazina com agentes sabidamente
nefrotóxicos, inclusive com os anti-inflamatórios não-hormonais (AINHs – como aspirina, ibuprofeno, diclofenaco, etc.) e azatioprina, pode aumentar o risco de reações renais; o potencial para discrasias sangüíneas da azatioprina e da 6-mercaptopurina pode
ser aumentado; a ação hipoglicemiante das sulfoniluréias pode ser intensificada; a atividade anticoagulante dos derivados cumarínicos (varfarina) pode ser reduzida; a toxicidade do metotrexato pode ser potencializada; o efeito uricosúrico da probenecida e
da sulfimpirazona pode ser diminuído, assim como a ação diurética da furosemida e da espironolactona e a ação tuberculostática da rifampicina. Em tese, a administração concomitante de anticoagulantes orais deve ser feita com cautela. Substâncias como
a lactulose, que diminuem o pH do cólon, podem reduzir a liberação da mesalazina dos comprimidos revestidos de Mesacol® MMX*. Reações adversas: A maioria das reações adversas relatadas com Mesacol® MMX* foi transitória, e de intensidade leve a
moderada. Foram descritas as seguintes reações adversas, distribuídas em grupos de freqüências: Reação comum (> 1/100 e < 1/10): Gastrintestinal: Flatulência e Náusea. Sistema Nervoso: Cefaléia. Estas reações ocorreram em menos de 3% dos pacientes,
independente da dose administrada. Reação incomum (> 1/1.000 e < 1/100): Gastrintestinal: vômito, dor abdominal, distensão abdominal, diarréia, dispepsia, pancreatite, colite e pólipo retal. Hepatobiliar: aumento das transaminases, anormalidades no teste
da função hepática. Sistema nervoso: tontura, sonolência, tremores. Cardiovascular: taquicardia, hipertensão e hipotensão arterial. Respiratório: dor faringolaríngea. Ouvido e labirinto: otalgia. Pele e tecido subcutâneo: acne, alopécia, prurigo, urticária, exantema,
prurido. Sangue e linfa: Redução do número de plaquetas. Musculosqueléticas: artralgia, lombalgia. Gerais: Astenia, fadiga, pirexia, edema da face. Posologia e modo de usar: Mesacol® MMX* é para uso exclusivo por via oral. Para o tratamento da colite
ulcerativa leve a moderada, a dose usual para adultos acima de 18 anos é de 2.400 mg a 4.800 mg (2 a 4 comprimidos) ao dia, administrada em dose única, de preferência sempre à mesma hora de cada dia, acompanhada de uma refeição. Caso o paciente
esteja tomando a dose mais elevada (4.800 mg/dia), deve ser reavaliado após 8 (oito) semanas de tratamento. Não apresentando mais sintomas, pode-se prescrever uma dose diária de 2.400 mg (2 comprimidos) para prevenir a recorrência de novas crises
da doença (manutenção da remissão). A duração recomendada é de 8 semanas consecutivas, salvo critério médico diferente. Este medicamento não deve ser partido, mastigado ou dissolvido. A PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ
SER CONSULTADO. MEDICAMENTO SOB PRESCRIÇÃO. USO ADULTO, ACIMA DE 18 ANOS. Registro MS - 1.0639. 0248 MEMX_0109_1210_VP.
Material destinado exclusivamente a profissionais habilitados a prescrever e/ou dispensar medicamentos. Nov/2011.
Nycomed Pharma Ltda.
Rua do Estilo Barroco, 721 - 04709-011 - São Paulo - SP
Mais informações poderão ser obtidas diretamente com o nosso
Departamento Médico ou por meio de nossos representantes.
MESACOL® é Marca Registrada da Nycomed Pharma Ltda., MMX* é Marca Depositada de Giuliani S.p.A.
u
o
egou
40mg
*
pantoprazol magnésico
di-hidratado
Apresentações:3
A evolução no
tratamento da DRGE.
1,2
30 e 60 comprimidos
3
Posologia na DRGE:
1 comprimido de 40mg, 1x ao dia
6060441 – TE LIVRO PRÉ-CONGRESSO – Nov/2011
CChheg
Contraindicação: Tecta não deve ser usado em casos de hipersensibilidade conhecida ao pantoprazol ou aos demais componentes da fórmula.
Interação medicamentosa: Tecta , assim como outros medicamentos da mesma classe, não deve ser coadministrado com atazanavir/nelfinazir.
®
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USO ORAL USO ADULTO ACIMA DE 18 ANOS Apresentações e composição: Comprimidos gastrorresistentes de 40 mg. Embalagens com 2, 15, 28,30, ou 60 comprimidos. Indicações: TECTA® 40 mg está indicado para o tratamento das esofagites de refluxo moderada ou
grave e dos sintomas de refluxo gastroesofágico. Também é indicado para tratamento intermitente de sintomas de acordo com a necessidade (on demand). Contra-indicações: TECTA® não deve ser usado em casos de hipersensibilidade conhecida ao pantoprazol ou aos demais
componentes da fórmula. TECTA®, assim como outros IBPs, não deve ser coadministrado com atazanavir/nelfinazir (vide Advertências e Precauções/Interações Medicamentosas). TECTA® não deve ser administrado em terapia combinada para erradicação do Helicobacter pylori a pacientes
com disfunção hepática ou renal moderada a grave, uma vez que não existe experiência clínica sobre a eficácia e a segurança da terapia combinada nesses pacientes. Este medicamento é contra-indicado na faixa etária de 0 a 18 anos. Categoria B de risco na gravidez: Este medicamento
não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica ou do cirurgião-dentista. Advertências e Precauções: Quando prescrito dentro de uma terapia combinada, as instruções de uso de cada uma dos fármacos devem ser seguidas. Na presença de qualquer sintoma de
alarme (como significante perda de peso não intencional, vômitos recorrentes, disfagia, hematêmese, anemia ou melena) e quando houver suspeita ou presença de úlcera gástrica, deve ser excluída a possibilidade de malignidade, já que o tratamento com pantoprazol pode aliviar os
sintomas e retardar o diagnóstico. Casos os sintomas persistam apesar de tratamento adequado, investigações adicionais devem ser consideradas. Gravidez e lactação: Categoria B de risco na gravidez. Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica
ou do cirurgião-dentista. TECTA® não deve ser administrado em gestantes e lactantes, a menos que absolutamente necessário, uma vez que a experiência clínica sobre seu uso em mulheres nestas condições é limitada. Estudos de reprodução em animais demonstraram uma fetotoxicidade
leve com doses acima de 5 mg/kg. Os dados disponíveis sobre o uso de pantoprazol em lactantes são limitados. A excreção do pantoprazol no leite humano foi detectada em caso isolado após uma única dose oral de 40 mg. A relevância clínica desta descoberta não é conhecida. TECTA®
só deve ser utilizado durante a gravidez e a lactação quando o benefício para a mãe for considerado maior que o risco potencial ao feto ou à criança. Pacientes idosos: Não é necessária nenhuma adaptação posológica para pacientes idosos. TECTA® pode ser utilizado por pessoas com
mais de 65 anos. Em voluntários idosos, a ASC e a Cmax (concentração máxima) aumentam discretamente, quando comparadas às de indivíduos jovens; porém, estes aumentos não são clinicamente significativos. Não se recomenda nenhum ajuste posológico baseado na idade. A dose
diária em pacientes idosos, via de regra, não deve ultrapassar os regimes posológicos recomendados. Pacientes pediátricos: A segurança e eficácia do emprego de TECTA® não foram estabelecidas em menores de 18 anos, portanto o seu uso não está indicado para pessoas menores de
18 anos. Insuficiência renal: para paciente com disfunção renal leve a moderada não é necessário ajuste posológico; a dose diária não deve ultrapassar os regimes posológicos recomendados. Nos casos de insuficiência renal grave o paciente deve ser cuidadosamente monitorado. Em
pacientes com função renal reduzida (p. ex., pacientes em diálise), nenhum ajuste de dose é necessário. Assim como para indivíduos sadios, a meia-vida do pantoprazol é curta. Somente pequenas quantidades de pantoprazol são dialisáveis. Embora a meia-vida do principal metabólito
tenha sido moderadamente aumentada para 2-3 h, a excreção é ainda rápida e, portanto não ocorre acúmulo. Insuficiência hepática: não é recomendado ajuste posológico para paciente com disfunção hepática leve a moderada. Em caso de redução intensa da função hepática a dose deve
ser ajustada para 1 comprimido de 40 mg a cada dois dias. Em pacientes com insuficiência hepática grave, devem ser regularmente monitoradas as enzimas hepáticas durante o tratamento com TECTA®; se houver aumento nos valores enzimáticos, o tratamento deve ser descontinuado.
A meia-vida aumentou para 7 e 9 horas, a ASC aumentou em um fator de 5 a 7 e a Cmax aumentou em um fator de 1,5 em pacientes com cirrose hepática em comparação com indivíduos sadios após a administração de 40 mg de pantoprazol sódico. Efeitos na capacidade de dirigir e
operar máquinas: não há efeitos conhecidos na capacidade de dirigir e operar máquinas. Interações medicamentosas: O conteúdo de magnésico em um comprimido de TECTA® não é clinicamente significante (1,268 g a cada comprimido de 40 mg). Assim, não são esperadas
diferenças nas interações medicamentosas entre o pantoprazol magnésico e o pantoprazol sódico. Como os demais membros de sua classe, TECTA® pode alterar a absorção de medicamentos cuja biodisponibilidade seja dependente do pH do suco gástrico, como o cetoconazol e
itraconazol. Isso se aplica também a medicamentos ingeridos pouco tempo antes de TECTA®. Assim como outros medicamentos da mesma classe, não deve ser coadministrado com atazanavir/nelfinazir, pois a absorção desses antirretovirais é pH dependente, podendo ocorrer uma
redução substancial na biodisponibilidade dos mesmos (ver Contra-Indicações). Pantoprazol é extensivamente metabolizado no fígado. Inicialmente sofre desmetilação e oxidação a sulfonas pelas subenzimas CYP2C19 e CYP3A4 do citocromo P 450 (Fase I do metabolismo). Como
conseqüência da baixa afinidade do pantoprazol e de seus metabólitos, o hidroxipantoprazol e o hidroxipantoprazol sulfona pelas enzimas do citocromo P 450, seu potencial de interação na Fase I é limitado, o que permite que o fármaco saia rapidamente do retículo endoplasmático e seja
transferido subsequentemente para o citoplasma para ser conjugado com sulfato, na Fase II do metabolismo. Esta baixa afinidade resulta em predominância do metabolismo no sistema de conjugação (Fase II) que, ao contrário do sistema P 450, não é saturável e consequentemente
não-interativa. Esta etapa independe do sistema enzimático citocromo P 450. A interação entre pantoprazol e outras substâncias metabolizadas na Fase I do metabolismo não pode, em princípio, ser excluída. Nos estudos sobre interações medicamentosas conduzidos até o momento, onde
foram analisados os substratos de todas as famílias do citocromo P450 envolvidas no metabolismo de fármacos no homem, verificou-se que pantoprazol não afeta a farmacocinética ou a farmacodinâmica da carbamazepina, cafeína, diazepam, diclofenaco, digoxina, etanol, glibenclamida,
metoprolol, naproxeno, nifedipina, fenitoína, piroxicam, teofilina, e contraceptivos orais. TECTA® não aumenta a excreção urinária dos marcadores de indução, ácido D-glucarídico e 6 ß-hidroxicortisol. Da mesma forma, os fármacos investigados não influenciaram a farmacocinética do
pantoprazol. Embora, em estudos clínicos farmacocinéticos não tenha sido observada nenhuma interação durante a administração concomitante à femprocumona ou à varfarina, foram observados no período de pós-comercialização alguns casos isolados de alterações no INR (tempo de
protrombina do paciente/média normal do tempo de protrombina) nessas situações. Consequentemente, em pacientes que estão sendo tratados com anticoagulantes cumarínicos, é recomendada a monitoração do tempo de protrombina/INR após o início, término ou durante o uso irregular
de pantoprazol. Não existe interação na administração concomitante com antiácidos. De maneira geral, o tratamento diário com qualquer medicamento bloqueador de ácido por um longo tempo (p. ex., mais que três anos) pode levar a uma má absorção da cianocobalamina (vitamina
B12). Estudos de interação farmacocinética em humanos, administrando-se pantoprazol simultaneamente aos antibióticos claritromicina, metronidazol e amoxicilina não demonstraram nenhuma interação clinicamente significativa. Ingestão com alimentos: O consumo de alimentos não
interfere com as ações do TECTA® no organismo. Interferência em testes de laboratório: Em alguns poucos casos isolados, detectou-se alterações no tempo de coagulação durante o uso de pantoprazol. Desta forma, em pacientes tratados com anticoagulantes cumarínicos, recomenda-se
a monitoração do tempo de coagulação após início, final ou durante o tratamento com pantoprazol. Reações adversas: O perfil de segurança do TECTA® não deve diferir do observado com o pantoprazol sódico, uma vez que ambos contêm o mesmo princípio ativo – o pantoprazol
“livre” dissociado (ânion pantoprazol, íons Mg ou Na). Embora o pantoprazol (a substância ativa) seja muito bem tolerado, a maioria dos eventos adversos observados tem sido leve e transitória, não apresentando nenhuma relação consistente com o tratamento. Assim, podem ocorrer
as seguintes reações adversas com o uso do produto: Reações comuns (ocorrem entre 1% e 10% dos pacientes que utilizam este medicamento): dor abdominal, diarréia, constipação, flatulência, cefaléia. Reações incomuns (ocorrem entre 0,1% e 1% dos pacientes que utilizam este
medicamento): náusea/vômito, vertigem, distúrbios visuais (visão turva), reações alérgicas como prurido e exantema. Reações raras (ocorrem entre 0,01% e 0,1% dos pacientes que utilizam este medicamento): boca seca, artralgia. Reações muito raras (ocorrem em menos de 0,01% dos
pacientes que utilizam este medicamento): depressão, leucopenia, trombocitopenia, edema periférico, dano hepatocelular grave levando a icterícia com ou sem insuficiência hepática, reações anafiláticas, incluindo choque anafilático, aumento nos níveis de enzimas hepáticas
(transaminases, γ-GT), aumento nos níveis de triglicerídios, elevação da temperatura corporal, mialgia, nefrite intersticial, reações dermatológicas graves como síndrome de Stevens Johnson, eritema multiforme, síndrome de Lyell, fotossensibilidade, urticária e angioedema. Atenção: este
produto é um medicamento novo e, embora as pesquisas tenham indicado eficácia e segurança aceitáveis, mesmo que indicado e utilizado corretamente, podem ocorrer eventos adversos imprevisíveis ou desconhecidos. Nesse caso, notifique os eventos adversos pelo Sistema de
Notificações em Vigilância Sanitária NOTIVISA, disponível em http://www8.anvisa.gov.br/notivisa/frmCadastro.asp, ou para a Vigilância Sanitária Estadual ou Municipal. Posologia e modo de usar: A posologia habitualmente recomendada é de 1 comprimido de 40 mg ao dia, antes,
durante ou após o café da manhã, a menos que seja prescrito de outra maneira pelo seu médico. A duração do tratamento fica a critério médico e dependente da indicação. Na maioria dos pacientes, o alívio dos sintomas é rápido e um período de tratamento de 4 a 8 semanas é, em geral
suficiente. TECTA® é para uso exclusivamente oral e os comprimidos devem ser ingeridos inteiros com um pouco de líquido. Na doença de refluxo gastroesofágico: Tratamento da esofagite de refluxo - 1 comprimido de 40 mg ao dia em um período de 4 semanas. Nos casos com esofagite
não cicatrizada ou com sintomas persistentes é recomendado um período adicional de 4 semanas. Os sintomas recorrentes poderão ser controlados administrando-se 1 comprimido de TECTA® 40 mg ao dia, quando necessário (“on demand”), de acordo com a intensidade dos mesmos.
A mudança para terapia contínua deve ser considerada nos casos em que os sintomas não puderem ser devidamente controlados sob terapia “on demand”. Em casos isolados de esofagite por refluxo, a dose diária pode ser aumentada para 2 comprimidos ao dia, particularmente nos casos
de pacientes refratários a outros medicamentos antiulcerosos. MS – 1.0639.0256. MEDICAMENTO SOB PRESCRIÇÃO.TC40_1004_0611_VPS.
Referências bibliográficas: 1) Hein J. Comparison of the efficacy and safety of pantoprazole magnesium and pantoprazole sodium in the treatment of gastro-oesophageal reflux disease: a randomized, double-blind, controlled, multicentre trial. Clin Drug Investig. 2011;31(9):655-64.
2) Nycomed Clinical Trial Report.Trial ID: TS2.6.7.5, 310. 2003. Data on file. 3) Tecta® [Bula]. São Paulo: Nycomed Pharma.
Material exclusivo à classe médica.
Nycomed Pharma Ltda. Rua do Estilo Barroco, 721 - 04709-011 - São Paulo - SP.
Mais informações poderão ser obtidas diretamente com o nosso
Departamento Médico ou por meio de nossos representantes.
*Marca depositada.
a persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado.
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