Automedicação com fitoterápicos, seus efeitos adversos e colaterais. Geralmente os consumidores consideram as ervas medicinais seguras e as têm como uma alternativa natural às medicações tradicionais. Mas, muitas dessas ervas medicinais podem ter efeitos danosos ao fígado. O diagnóstico de uma lesão hepática pode se tornar difícil, pois somente 40% da população comunicam ao seu médico quando usa alguma medicação fitoterápica. REAÇÕES TÓXICAS E EFEITOS ADVERSOS PROVOCADOS POR PLANTAS MEDICINAIS O uso milenar de plantas medicinais mostrou ao longo dos anos, que determinadas plantas apresentam substâncias potencialmente perigosas. Do ponto de vista científico, pesquisas mostraram que muitas delas possuem substâncias potencialmente agressivas e, por esta razão, devem ser utilizadas com cuidado, respeitando seus riscos toxicológicos. Como exemplos de efeitos tóxicos de substâncias presentes em plantas podem ser citados os efeitos hepatotóxicos de apiol, safrol, lignanas e alcalóides pirrolizidínicos; a ação tóxica renal que pode ser causada por espécies vegetais que contém terpenos e saponinas e alguns tipos de dermatites, causadas por espécies ricas em lactonas sesquiterpênicas e produtos naturais do tipo furanocumarinas. Componentes tóxicos ou antinutricionais, como o ácido oxálico, nitrato e ácido erúcico estão presentes em muitas plantas de consumo comercial. Diversas substâncias isoladas de vegetais considerados medicinais possuem atividades citotóxica ou genotóxica e mostram relação com a incidência de tumores. O intenso apelo comercial advindo do forte movimento cultural dos naturalistas aqueceu, em todo o mundo, o consumo de plantas medicinais. Entretanto, não há respeito aos limites de uso dos fitoterápicos, não se fornecem informações sobre efeitos colaterais, e o consumo de plantas, do modo com vem sendo feito, representa cada vez mais um risco para a saúde humana. Estudos multidisciplinares, associando fitoquímicos e farmacólogos, tornam-se cada vez mais importantes para a definição dos potenciais terapêuticos e tóxicos de extratos vegetais. Um dos efeitos tóxicos relatados recentemente foi ocasionado pelo uso de cápsulas de têucrio (Teucrium chamaedrys L. – Labiateae), que causou uma epidemia de hepatite na França. A origem do efeito tóxico foi atribuída a diterpenos do tipo neo-clerodano, transformados pelo citocromo P450 em metabólitos hepatotóxicos, que apresentavam uma subunidade epóxido. Anteriormente, o uso do têucrio era tido como seguro até que a comercialização do vegetal em cápsulas associado à camomila, prescrito para dietas de emagrecimento, desencadeou os casos de hepatite tóxica. Estudos farmacológicos mostraram que os diterpenóides furânicos (muitos estão presentes entre os clerodanos) causam apoptose dentro de 2 h em hepatócitos de ratos. Metabólitos eletrofílicos podem estimular a apoptose pela captura de tióis, aumento da concentração de cálcio e ativação das enzimas transglutaminase e endonuclease dependentes de cálcio. Em países como a Inglaterra, o têucrio era constantemente utilizado, sem aviso aos consumidores, para substituir extratos de escutelária (Scutellaria lateriflora) em associações com valeriana. A mistura tóxica levou erroneamente à crença de que tanto a valeriana quanto a escutelária poderiam ser tóxicas quando em misturas, por efeito sinérgico. Outro caso importante é o do confrei (Symphytum officinale L.). Esta planta é utilizada na medicina tradicional como cicatrizante devido à presença da alantoína, mas também possui alcalóides pirrolizidínicos, os quais são comprovadamente hepatotóxicos e carcinogênicos. Após diversos casos de morte ocasionados por cirrose resultante de doença hepática veno-oclusiva, desencadeadas por estes alcalóides, o uso do confrei foi condenado pela OMS. Outras plantas medicinais são potencialmente perigosas, podendo-se citar as espécies do gênero Senecio, a jurubeba (Solanum paniculatum L.), ipeca (Cephaelis ipecacuanha (Brot.) A. Rich.) e arnica (Arnica montana L.), que podem causar irritação gastro-intestinal; o mastruço (Chenopodium ambrosioides L.) e a trombeteira (Datura suaveolens Humb. & Bopl ex Willd.), que podem lesionar o sistema nervoso central; o cambará (Lantana camara L.), conhecido por sua hepatotoxicidade; a cáscara-sagrada (Rhamnus purshiana DC), que causa distúrbios gastro-intestinais (como diarréia grave) e a arruda (Ruta graveolens), que pode provocar aborto, fortes hemorragias, irritação da mucosa bucal e inflamações epidérmicas. Em doses elevadas, até mesmo o jatobá (Hymenaea courbail L.), conhecido como expectorante e fortificante, pode desencadear reações alérgicas, e a sucuúba (Himathantus sucuuba (Spruve) Woodson), usada no combate à amebíase, úlcera e gastrite, pode ser abortiva. No caso de gestantes, o uso de espécies vegetais deve seguir rigorosamente os mesmos cuidados dos medicamentos alopáticos. Entre as plantas medicinais que podem causar riscos para mulheres grávidas, por estimular a motilidade uterina e provocar aborto, encontram-se alho (Allium sativum), aloe (Aloe ferox), angélica (Angelica archangelica), arnica (Arnica montana), cânfora (Cinnamomum canphora), confrei (Symphitum officinalis), eucalipto (Eucaliptus globulus), alecrim (Rosmarinus officinalis), gengibre (Zengiber officinalis) e sene (Cassia angustifolia e Cassia acutifolia). Alguns óleos essenciais também devem ser evitados, como exemplo, os provenientes de bétula (Betula alba), cedro (Cedrela brasiliensis), erva-doce (Pimpinella anisum), jasmim (Jasminum officinalis), manjericão (Origanum basilicum), manjerona (Majorana hortensis), tomilho (Thymus vulgaris), rosa (Rosa sp.) e lavanda (Lavanda angustifolia). Neste último caso, deve-se evitar o consumo, especialmente nos primeiros meses de gravidez. Estudo recentes, realizados com ratas grávidas, apontaram o efeito colateral abortivo da espinheira-santa (Maytenus ilicifolia), planta medicinal de comprovada baixa toxicidade e ação anti-ulcerogênica, anti-inflamatória e antinoniceptiva. Extratos hidroalcoólicos dessa planta mostraram-se abortivos por atuarem no período de pré-implantação dos embriões no útero. Quím. Nova vol.28 no. 3 São Paulo May/June 2005 É muito importante conhecer as interações entre as ervas e entre erva e droga alopática. Por exemplo, a erva de São João pode potencializar o efeito de drogas como a ciclosporina, etinil-estradiol e digoxina, pois todos se utilizam da mesma via de metabolização hepática: a via do citocromo P450. Outras ervas com efeitos anticoagulantes como a gincobiloba, ginseng e alho podem aumentar o risco de sangramento em pacientes que utilizam warfarina ou outros inibidores da agregação plaquetária. A preocupação com o uso indiscriminado de produtos combinados é crescente, pois pode resultar em risco aumentado de interação entre as ervas. Um exemplo é a combinação de efedra, guaraná e Citrus aurantium que pode aumentar o risco de hipertensão, arritmia e acidente vascular cerebral. Finalmente, qualquer caso suspeito deve ser investigado clinicamente e laboratorialmente e notificado à Agência de Vigilância Sanitária com o interesse de proteger a saúde pública e gerar nova informações. A Unidade de Farmacovigilância informa que a Agência Européia para a Avaliação de Medicamentos (EMEA) divulgou um alerta sobre a conexão potencial entre produtos fitoterápicos contendo Cimicifuga racemosa (cohosh negro) e hepatotoxicidade. CIMICIFUGA RACEMOSA E RISCO DE HEPATOTOXICIDADE A Cimicifuga racemosa (Cimicifuga racemosae rhizoma) é uma planta medicinal nativa da América do Norte utilizada principalmente no tratamento da menopausa como alternativa à terapia de reposição hormonal. No Brasil esta planta faz parte da composição de vários medicamentos fitoterápicos como Tepemen® (Abnat), Mencirax® (Ativus), Menocimed® (Cimed), Tensiane® (Greenpharma) e Clifemin® (Herbarium), dentre outros. O paciente que utiliza produtos à base de Cimicifuga racemosa deve estar atento ao desenvolvimento de sinais e sintomas sugestivos de deficiência hepática, tais como cansaço, perda de apetite, amarelamento da pele e dos olhos ou dor severa na parte superior do estômago com náusea e vômito ou urina escurecida. Neste caso, ele deverá procurar imediatamente assistência médica e até que isso não aconteça parar o uso do produto. Alerta SNVS/Anvisa/Nuvig/Ufarm nº 2, de 26 de julho de 2006 Erva de São João - (Hypericum perforatum) - Fiscalização intensificada através da Resolução. A Erva de São João (Hypericum perforatum) é um fitoterápico utilizado popularmente como sedativo leve, colagogo, para tratamento de inflamações crônicas do estômago, do fígado, da vesícula, dos rins e afecções ginecológicas. Também é empregada pela população para tratamento da ansiedade, tensão nervosa, perturbações na menopausa e síndrome prémenstrual, apesar de todas estas supostas indicações não terem sido comprovadas cientificamente até o momento. Por este motivo, a única indicação aprovada pela Anvisa, respaldada por evidências clínicas, é para tratamento de depressão leve e moderada. Recentes relatos de agências regulatórias de produtos pelo mundo indicam importantes interações entre os produtos à base da Erva de São João (Hypericum perforatum) e medicamentos prescritos, tais como: ciclosporina, digoxina, contraceptivos orais, teofilina, varfarina, indinavir e potencialmente com diversos outros medicamentos vendidos sob prescrição médica. Tais interações podem levar a uma redução dos efeitos destes medicamentos ou ainda podem provocar efeitos de toxicidade dos medicamentos sob interação (em especial ciclosporina, digoxina, contraceptivos orais, teofilina e varfarina) pela suspensão do uso dos produtos a base de Erva de São João (Hypericum perforatum). Tabela 1 – Importantes Interações com Hypericum perforatum DROGA EFEITOS DA INTERAÇAO HYPERICUM + DROGA Indinavir Redução dos níveis sanguíneos da droga com possível perda da supressão do HIV Varfarina Redução do efeito anticoagulante da droga e necessidade de aumento da dose de Varfarina Ciclosporina Redução dos níveis sanguíneos da droga com risco de rejeição do transplante Contraceptivos orais Redução dos níveis sanguíneos da droga com risco de gravidez não intencional Anticonvulsivantes Redução dos níveis sanguíneos da droga com risco (Carbamazepina; Fenobarbital; de ataques convulsivos Fenitoína). Digoxina Redução dos níveis sanguíneos da droga com risco para a perda do controle do ritmo cardíaco Teofilina Redução dos níveis sanguíneos da droga com perda do controle da asma Os consumidores brasileiros podem estar adquirindo produtos à base de Erva de São João (Hypericum perforatum) sem nenhuma avaliação médica, a partir da aquisição de produtos sem a tarja vermelha contendo a frase de advertência "Venda sob prescrição médica", aumentando, desta forma, o risco de interações medicamentosas clinicamente importantes, além disso, esses produtos podem estar sendo consumidos de forma irracional e indiscriminada. Em vista disso a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa resolveu por meio de publicação da Resolução - RE nº 357, de 28 de fevereiro de 2002, promover uma medida de interesse sanitário de apreensão dos produtos à base de Erva de São João que não possuam tarja vermelha contendo os dizeres "Venda sob prescrição médica", bem como os que não possuam registro na Anvisa. Os produtos sem o devido padrão de rotulagem deverão ser apreendidos imediatamente e a empresa será autuada. KAVA- KAVA -(Piper methysticum L.) - Fiscalização intensificada. O Kava-Kava é um dos fitoterápicos mais utilizados no país para o alívio dos sintomas da ansiedade e insônia. Em outubro de 2001, foram registrados 25 casos de hepatotoxicidade na Suíça e Alemanha, destes seis casos foram de insuficiência hepática onde uma pessoa morreu, quatro necessitaram de transplante hepático e a sexta está em observação para saber se será necessário um transplante. Muitos dos pacientes que tiveram dano hepático tomaram os extratos acetônicos de kava, e logo foi levantada a suspeita de que seria esta a causa dos danos. Além da reação adversa grave (insuficiência hepática), o Kava-Kava tem interações com diversos outros fármacos, como por exemplo, álcool, e os benzodiazepínicos que, quando utilizados concomitantemente, provocam um aumento da depressão do sistema nervoso central (SNC), caracterizado por sedação, cansaço e diminuição dos reflexos; antagonistas dopamínicos que causam bloqueio dopaminérgico provocando distonia, discinesia e parkwsonismo; inibidores da mono aminoxidase - IMAO associados ao KavaKava provocam uma inibição excessiva da MAO provocando um aumento da toxicidade do kava, caracterizado por irritabilidade, hiperatividade, insônia, ansiedade, hipotensão, cansaço, colapso cardiovascular, alucinações, flushing, taquipnéia, taquicardia e desordens de movimento. Paralelo às essas medidas, o FDA (Food and Drug Administration) está investigando tais reações associadas com Kava Kava ou Piper methysticum . Pode-se encontrar no mercado brasileiro os seguintes fitoterápicos contendo Kava-Kava ou Piper methysticum: LAITAN®, BIOKAVA®, KAVA CUR®, KAVA KAVA FLORA MEDICINAL®, KAVA KAVA TEUTO®, CALMITON®, KAVAKAN®, KAVAZEPAM®, KAVATRON®, KAVAIN®, CALMONEX®, KAVALAC®, ANSIOPAX®, KALMINET®, SPM 100®, KAVASEDON® Anvisa suspende comércio e uso de fitoterápico sem registro A Anvisa vai suspender, em todo o país, a fabricação, distribuição, comércio e uso do medicamento Extrato Kutelak, fabricado pela empresa Laboratório Irmãos Kutelak Indústria e Comércio Ltda. Vendido com o nome de Elixir Kutelak, o produto é um fitoterápico e não possui registro na Agência. O laboratório, com sede em Ubatuba (SP), também não possui Autorização de Funcionamento. Na terça-feira (25/7), a Anvisa e a Vigilância Sanitária do município de Ubatuba interditaram a empresa. A polícia civil apreendeu, no local, três computadores e 35 frascos do medicamento. O proprietário foi preso em flagrante e será indiciado por crime contra a saúde pública por vender medicamento sem registro. Com alta concentração de álcool, o Elixir Kutelak tem grande potencial tóxico e não passou por testes que comprovem a eficácia de seu princípio ativo. Há suspeita de que o uso prolongado do fitoterápico esteja associado ao desenvolvimento de cirrose hepática em alguns usuários. O produto também era vendido ilegalmente pela internet. Outros produtos suspensos Fabricante Produto Resolução LABORATÓRIO FITOTERÁPICO AFROMED LTDA. Como medida cautelar de interesse sanitário a suspensão da fabricação, distribuição, comércio e uso, em todo o território nacional, do produto FLOR DA ÍNDIA. Resolução – RE n° 2351de 27 de julho de 2006 D.O.U N° 144 de 28/07/2006 POLIERVAS Determinar a suspensão da PRODUTOS fabricação, do comércio e do uso, NATURAIS LTDA em todo o território nacional, de todos os lotes do produto KIT SANA-FUMO. ERVAS NATU’S Determinar a suspensão da fabricação, distribuição, comércio e uso, em todo o território nacional, do produto INDIANO TALUM 100MG – C. DA ÍNDIA TALUN Resolução – RE n° 2348 de 27 de julho de 2006 D.O.U N° 144 de 28/07/2006 Resolução – RE n° 1864 de 14 de junho de 2006 D.O.U N° 115 de 19/06/2006 F.F. Determinar, como medida cautelar de interesse MOREIRA & sanitário, a suspensão da fabricação, distribuição, CIA LTDA. comércio e uso dos seguintes produtos AFRIGEL – GEL DE ARNICA 200G; ÓLEO DE COPAÍBA 30ML, EXTRATO DE GOTA SANTA-BOLDO DE JURUBEBA 30ML; EXTRATO DE PATA DE VACA 30ML; EXTRATO DE BERINJELA E ALGAS MARINHAS; SABONETE DE COPAÍBA; SABONETE DE AROEIRA; COMPOSTO DE MEL COM PRÓPOLIS – MENTA ROMÃ; POMADA REUMAFRI – COMPOSTA DE COPAÍBA; GINKGO BILOBA 30ML; EXTRATO DE MARACUJÁ 30ML; PROSTAK 200ML. LABOTÂNICO INDUSTRIAL LTDA. Determinar como medida cautelar de interesse sanitário a proibição da fabricação, distribuição, comércio e uso, em todo o território nacional, dos produtos Saúde da Mulher 400ml, Circulação Composto Vegetal 400ml, Sete Ervas Composto 400ml, Paratudo, Anêmico Plus “A” 400ml, Elixir de Catuaba, Sangra D’água Composta com Barbatimão, Urinari Vegetal 400ml, Elixir Depurativo. Resolução – RE n° 1612 de 25 de maio de 2006 D.O.U N° 101 de 29/05/2006 Resolução – RE n° 1.605 de 25 de maio de 2006 D.O.U N° 101 de 29/05/2006 Agradecemos o seu contato e colocamo-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos. Atenciosamente Vilmair Zancanaro [email protected]