não descartes estas ideias

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GARY HAYDEN
NÃO DESCARTES
ESTAS IDEIAS
ESTRANHAS TEORIAS
DOS GRANDES FILÓSOFOS
Gary Hayden
8
índice
introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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1. Não é mau. Apenas disparatado . . . . . . . . . . . . . . . . . .
2. Não podia ser melhor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
3. Não podia ser pior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
4. Motivos egoístas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
5. Nada muda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
6. Nada permanece o mesmo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
7. Perfeição absoluta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
8. O mundo real . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
9. As laranjas não são cor de laranja . . . . . . . . . . . . . . . . .
10. Consequências cósmicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
11. É tudo uma questão de números . . . . . . . . . . . . . . . .
12. Dan Brown contra Shakespeare . . . . . . . . . . . . . . . . .
13. Arde, bebé, arde . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
14. Uma vez, e outra, e outra. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
15. Está tudo na mente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
16. Já me lembro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
17. Apostar em Deus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
18. O fantasma na máquina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
19. Como aconteceu isso? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
20. O fantástico conto de fadas de Leibniz . . . . . . . . . . .
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Não Descartes Estas Ideias
21. Ai! Sinto-me bem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
22. Não é possível prever o futuro . . . . . . . . . . . . . . . . . .
23. O fim do sofrimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
24. O sexo mais fraco? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
25. O egoísmo é uma virtude . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
26. Bater palmas com uma mão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
27. Irás matar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
28. O cérebro no frasco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
29. Harry Potter existe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
30. Ninguém tem culpa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
31. O dever chama! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
32. Porta-te bem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
33. Troca de corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
34. Dilemas canibais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
35. Filosofia? Disparates! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
36. Mundo 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
37. Não há nada a discutir . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
38. Que Deus descanse em paz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
39. O derradeiro vício . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
40. Regras… regras… regras… . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
41. Absurdo, mas verdadeiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
42. Sem provas científicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
43. A vida por analisar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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outras leituras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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índice remissivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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«Não é possível conceber algo tão estranho e implausível
que não tenha ainda sido dito por algum filósofo.»
René Descartes
introdução
Os filósofos são pessoas inteligentes. Alguns são mesmo muito
inteligentes. No entanto, são capazes de dizer coisas profundamente bizarras!
Pensemos no filósofo alemão Gottfried Leibniz: concebeu
máquinas de cálculo, inventou o cálculo independentemente de
Isaac Newton e apresentou contribuições importantes para a física,
a lógica, a história, a teologia e métodos de arquivo para bibliotecários. Era difícil ser mais inteligente. Contudo, argumentou
que os objetos não têm forma nem dimensão; disse igualmente
que o mundo não poderia ser melhor do que é.
Pensemos também no filósofo francês Blaise Pascal, que levou
a cabo trabalhos inovadores na física do vácuo, inventou a seringa,
deu ao mundo o «Triângulo de Pascal» e foi um dos fundadores
da teoria da probabilidade. Todavia, declarou que temos de acreditar em Deus, mesmo que duvidemos da Sua existência.
Para quê ser tão estranha?
A filosofia é fértil em ideias bizarras. À medida que for lendo
este livro vai descobrir que os mais argutos pensadores da história
defenderam que a matéria não existe, que os unicórnios existem,
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Não Descartes Estas Ideias
que os bebés merecem ir para o Inferno e que a mente não nos
influencia o comportamento.
Porquê? O que tem a filosofia que dê azo a tanta estranheza?
Como é possível que indivíduos tão brilhantes possam dizer coisas tão chocantes? Será por o génio e a loucura andarem de mãos
dadas? Ou haverá um outro motivo?
Bem, talvez a principal razão para toda essa bizarrice se prenda
com a natureza da própria filosofia. A filosofia dedica-se às questões mais extremas. Isso leva a que, por vezes, os filósofos se
vejam a trabalhar nos limites do pensamento, no extremo do
cognoscível. A bem da verdade, esse pode ser um local muito
estranho.
Pensemos nos físicos vanguardistas que tentam perceber o que
se passa a nível quântico ou no centro de um buraco negro. Eles
apresentam um mundo que não se enquadra de todo no domínio
do senso comum. É um mundo onde o espaço e o tempo se
encontram distorcidos, onde as partículas fundamentais surgem
e desaparecem e onde múltiplos universos ganham vida.
Os filósofos não são muito diferentes. Também eles se debatem com questões difíceis e profundas, com o tipo de questões
que levam o conhecimento aos seus limites – e mais além. De que
forma se relaciona a mente com o corpo? Poderemos alguma vez ter
a certeza absoluta seja do que for? Qual é o objetivo da vida, a existir? O que faz com que algumas ações sejam «corretas» e outras
«erradas»? Se Deus existe, que tipo de ser será Ele?
Ao investigar tais questões, os filósofos afastam-se da linha
vulgar de pensamento. Assim sendo, não surpreende que tenham
ideias que nos soam profundamente bizarras.
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Introdução
Formas de ser bizarro
As ideias presentes neste livro são, todas elas, estranhas. No
entanto são estranhas a vários níveis. Algumas delas, como, por
exemplo a reivindicação por parte de John Locke de que as laranjas não são cor de laranja, parecem-nos, pura e simplesmente,
erradas. Outras, como a insistência por parte de São Tomás de
Aquino de que a masturbação é pior do que a violação, são profundamente chocantes. Outras ainda, como a declaração de
Pitágoras de que «tudo são números», nem sequer fazem grande
sentido.
Algumas das ideias parecem estranhas quando as ouvimos pela
primeira vez, mas perdem um pouco dessa estranheza quando
pensamos nelas. Várias foram consideradas extravagantes aquando
da sua apresentação, mas desde então tornaram-se bastante banais
(pelo menos entre os filósofos). Tudo isso nos leva a uma questão
importante…
Estranho mas verdadeiro?
As ideias bizarras não são, necessariamente, erradas.
Ao longo deste livro vai deparar-se com ideias que o vão surpreender, divertir, ofender e confundir. Contudo vai também
encontrar ideias que o vão convencer. Por vezes vai dar consigo a
acenar com a cabeça em concordância e a aceitar ideias que
nunca julgou ser capaz de aceitar.
Por isso, fica o aviso. Daqui a duas centenas de páginas poderá
ter passado a acreditar que as laranjas não são cor de laranja,
a matéria não existe, o Harry Potter existe e este mundo não é o
mundo real.
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Não Descartes Estas Ideias
Como usar este livro
Organizei este livro em 43 capítulos independentes, cada um
tratando de uma única ideia. Os tópicos analisados englobam
ética, lógica, política, metafísica, psicologia, sexo e religião. Por
uma questão de equilíbrio, talvez seja preferível ler os capítulos
por ordem, mas não se coíba de perder algum tempo a refletir
entre cada um. Claro que isso não é fundamental. Nada o impede
de ir saltando entre capítulos, ou de ler todo o volume de um
fôlego, se preferir.
Inicio cada capítulo introduzindo uma ideia bizarra e depois
apresento alguns dos argumentos avançados por um filósofo famoso
em sua defesa. Sempre que possível isso foi feito de modo relativamente favorável para com o ponto de vista do filósofo. Depois,
regra geral, adianto algumas críticas, argumentos que põem em
causa o conceito do filósofo. No geral, tentei manter-me imparcial, para que o leitor possa decidir por si o que pensar da ideia.
No final de cada capítulo indico capítulos relacionados. Destinam-se a quem preferir ir saltando de acordo com os interesses
pessoais. No final do livro apresento sugestões para novas leituras. Assim, se por acaso considerar determinado filósofo ou ideia
particularmente interessante terá a possibilidade de desenvolver
o seu conhecimento.
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1
não é MAU. apenas disparatado
O filósofo grego Sócrates (c. 469-399 a. C.) depositou grande
fé no poder do raciocínio humano. Acreditava que a razão, quando
devidamente cultivada, nos tornaria virtuosos e felizes, que assim
que percebêssemos realmente o que é o bem iríamos praticá-lo e
que quem age de forma errada apenas o faz por ignorância.
Os céticos bem poderão interrogar-se quanto ao planeta em
que Sócrates vivia. A experiência já nos mostrou o quão impotente a razão pode ser e o enorme fosso que existe entre saber o
que está correto e praticá-lo.
A voz da razão
Claro que não seria de esperar que um filósofo do calibre de
Sócrates fizesse uma afirmação tão bizarra sem ter um motivo.
Com efeito, ele lá tinha as suas razões. Em seguida, podemos ler
os argumentos que ele apresentou em sua defesa.
Todos somos hedonistas, ou seja, tudo o que fazemos obedece
ao desejo de sentir prazer ou de evitar a dor. Isso significa que tudo
o que se refere ao «bem» e ao «mal» acaba por se resumir a uma
questão de prazer e de dor. Chamamos «bem» a tudo o que leva ao
prazer e chamamos «mal» a qualquer coisa que resulte em dor.
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Não Descartes Estas Ideias
Como é óbvio, ninguém escolhe, conscientemente, a dor em
detrimento do prazer. Claro que isso equivale a dizer que ninguém escolhe, em consciência, o mal em detrimento do bem (uma
vez que os termos são intercambiáveis). Assim sendo, quem escolhe o mal em detrimento do bem irá fazê-lo erradamente – porque o confunde com o bem.
Consequentemente, quem se serve da razão irá sempre fazer o
que é bom para si próprio. No entanto, será que essa sabedoria
tornará essas pessoas virtuosas? Irá levá-las a tratar os outros igualmente bem? Sócrates julgava que sim. Eis o porquê. O filósofo
defendia que as ações injustas são prejudiciais não só para aqueles
que lesamos, mas também para nós próprios. Quando agimos
de forma injusta danificamos a nossa alma. Assim sendo, agir
de forma correta para com os outros é fazer o que está certo para
nós.
A voz da experiência
Sócrates defendia, então, que, quando sabemos concretamente o que é o bem, iremos fazê-lo; o conhecimento é virtude.
A resposta óbvia é que o argumento do filósofo não pode estar
correto, já que a conclusão é claramente falsa. As pessoas escolhem
muitas vezes o mal, mesmo quando sabem que isso não é correto.
Por exemplo, um indivíduo que sofra de obesidade mórbida
pode não duvidar de que a alimentação elevada em gordura e em
açúcar que faz está a arruinar-lhe a saúde, a torná-lo pouco
atraente e a diminuir-lhe a auto-estima. Contudo, esse conhecimento é impotente. Uma e outra vez dá consigo a escolher,
conscientemente, o mal em detrimento do bem.
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