PROCESSOS COGNITIVOS E A METODOLÓGIA CENTRADA NA INTELIGÊNCIA DO ALUNO Introdução Autor(a): Angela de Souza Lira Email: [email protected] Ao longo da história, filósofos, matemáticos, biólogos e outros pesquisadores se interessaram pelas capacidades mentais que os seres humanos possuem, constituindo várias teorias a respeito de porquê elas existem e como elas funcionam. Platão e Aristóteles (427-347 a.C.), já teorizavam sobre o pensamento e a memória, partindo de sua base empírica. Assim, o problema do conhecimento humano sempre esteve intimamente relacionado com os temas estudados pela psicologia cognitiva (fins dos anos 1950 e princípios dos anos 1960). A psicologia cognitiva estuda a cognição, os processos mentais que estão por detrás do comportamento. Esta área de investigação cobre diversos domínios, examinando questões sobre a memória, atenção, percepção, juízo, imaginação, pensamento e linguagem, representação de conhecimento, raciocínio, criatividade e resolução de problemas. Pode-se definir cognição como a capacidade para armazenar, transformar e aplicar o conhecimento, sendo um amplo leque de processos mentais. A neurociência cognitiva é uma área acadêmica que se ocupa do estudo científico dos mecanismos biológicos subjacentes à cognição, com foco específico nos substratos neurais dos processos mentais e suas manifestações comportamentais. Se questionam sobre como as funções psicológicas e cognitivas são produzidas no circuito neural. A neurociência cognitiva unificando e interconectando-se com várias outras subdisciplinas, tais como a psicologia cognitiva, psicobiologia e neurobiologia. Seus estudos são baseados na psicologia experimental ou neurobiologia, porém podem vir de várias disciplinas, tais como a psiquiatria, neurologia, física, matemática, linguística e filosofia. Os métodos empregados na neuropsicologia incluem paradigmas experimentais de psicofísica e da psicologia cognitiva, neuroimagem funcional, genômica cognitiva, genética comportamental, assim também como estudos eletrofisiológicos de sistemas neurais. Estudos clínicos de psicopatologia em pacientes com déficit cognitivo, constitui um aspecto importante da neurociência cognitiva. A neuropsicologia (1904-1985), como área de interface, sua história confunde-se com a história da psicologia e a da medicina. Já eram conhecidos desde a antiguidade que pessoas que sofriam traumatismos cranianos, muitas vezes, passavam a ter alterações em suas funções mentais, tais como a linguagem, o pensamento e a memória, chegando mesmo a provocar alterações profundas e duradouras no seu comportamento (alterações de personalidade). As contribuições Luria e de Vigostski à localização das funções cerebrais modificando as noções de centros da ação reflexa a partir dos analisadores corticais fixos propostos por Pavlov (1849-1929) como centros da ação reflexa para um sistema de localização funcional dinâmica e mutável. A neuroplasticidade das funções nervosas está entre as suas principais contribuições à neurociência moderna. Seus estudos com Vigotskii referem-se à instalação, perda e recuperação de funções ao nível do sistema nervoso central considerando tanto as variáveis que interferem na filogênese – ou história evolutiva da espécie como a partir das formações sociais histórico- 1 culturalmente definidas além da ontogênese ou historia individual. Diversos testes psicométricos foram propostos a partir das concepções neuropsicológicas de Luria (especialmente expressas no seu livro Higer Cortical Functions in man,1966), alguns inclusive conhecidos e comentados por ele que ressaltava sua limitação diante da abordagem interpessoal e a importância da flexibilidade na abordagem com o paciente para adaptarem-se as necessidades especiais deste no processo de identificar as lesões primárias e complicações subjacentes por prejuízo nas funções mentais superiores. Uma atenção especial deve ser dada aos processos de percepção (inputs) e expressão (outputs). Os papiros de Edwin Smith já descreviam dificuldades de linguagem. Os estudos mais recentes, de Franz Gall e Paul Broca, no século XIX, associavam regiões do cérebro como responsáveis por determinadas funções mentais; havendo algum dano, haveria algum tipo de sintomatologia. É uma interface ou aplicação da psicologia e da neurologia, que estuda as relações entre o cérebro e o comportamento humano, contudo praticamente dedica-se a investigar como diferentes lesões causam déficits em diversas áreas da cognição humana, ou tal como denominado pelos primeiros estudos nesse campo, estuda as funções mentais superiores, deixando áreas como agressividade, sexualidade para abordagens mais integrativas da fisiologia e biologia (neurobiologia, neurofisiologia, psicofisiologia, psicobiologia) ou melhor da neurociência. Metodologia Centrada na Inteligência Durante minha experiência profissional como psicóloga escolar, professora e diretora da escola Nossa Senhora da Rosa Mystica no período de 1994 a 1999, na cidade do Recife, vivenciei a necessidade de desenvolver uma metodologia que se adequasse àquela realidade {diante de professores defasados e alunos com bastante dificuldade de aprendizagem – alexia (incapacidade para ler e escrever), dislexia (é a dificuldade de: 1- transformar uma letra em som, o que compromete a leitura e a escrita de uma criança com dislexia, e 2- a sua dificuldade na hora de juntar letras formando silabas, 3- e depois de juntar silabas formando palavras), Acalculia (incapacidade para operar matemáticamente) discalculia (dificuldade parcial de operar matemáticamente), disgráfia (dificuldades relacionadas a grafia das letras, incapacidade de recordar a grafia da letra. Ao tentar recordar este grafismo escreve muito lentamente o que acaba unindo inadequadamente as letras, tornando a letra ilegível), disortográfica (conjuntos de dificuldades na aprendizagem da ortografia, confusões de letras, sílabas de palavras, e trocas ortográficas já conhecidas e trabalhadas pelo professor), dislalia (consiste na má pronúncia das palavras, seja omitindo ou acrescentando fonemas, trocando um fonema por outro ou ainda distorcendo-os ordenadamente)e disartria (fala lenta e arrastada devido a alterações dos mecanismos nervosos que coordenam os órgãos responsáveis pela fonação)}. 1º passo, verifiquei qual o material disponível no mercado, 2º passo, de posse do material e da minha experiência profissional, pude desenvolver um material e uma metodologia centrada nas reais dificuldades dos nossos alunos, 3º passo, a partir do diagnóstico obtido através da primeira avaliação (páscoa), pude orientar os professor para começar a conhecer melhor seus alunos e em seguida formar grupos de habilidades específicas, o mais homogêneo possível de acordo com as suas habilidades 2 cognitivas; para trabalhar, em cada grupo, os conteúdos significativos através das suas habilidades mais evidentes (aquela que faz os olhos dos alunos brilharem, que lhe da prazer em aprender, que eles dominam com mais facilidade), procurei estimular os vários sentidos através da apresentação dos grupos, com o objetivo de que cada aluno pudesse concluir o seu processo de aprendizagem vendo ouvindo, manuseando objetos e fazendo gestos. ex: que tal ensinar o pensamento matemático através de estórias construídas pelo professor junto com seus alunos (para o grupo de alunos que se sobressaem mais nas atividades da leitura e menos nas atividades matemáticas); é muito mais fácil alfabetizar, através de musicas específicas para esse fim, aquele grupo de alunos que aprende com facilidade as músicas infantis e demonstram dificuldades para aprender a ler através das suas lições escolares (ex: a,a,a,faz a abelhinha...e,e,e,faz a estrelinha...i,i,i,faz a igrejinha...o,o,o,faz a ovelhinha...u,u,u,faz a uvinha...) e ao mesmo tempo estimular as memórias auditiva e visual através das tarefas escolares. 4º passo, observei que, com essa técnica, o trabalho realizado com um grupo compensava as dificuldades dos outros grupos. Diante desta observação, pude concluir que o processo de aprendizagem ia além do que imaginávamos naquela época (Howard Gardner, em 1983, escreveu a teoria das inteligências múltiplas, porém, os recursos da informática eram bastante limitados, havia controvérsia e sua teoria era pouco difundida no Brasil), daí em diante orientei os professores a trabalhar os grupos isoladamente e em seguida, cada grupo apresentar o conteúdo trabalhado da forma que aprendeu. O resultado foi surpreendente, pudemos observar que cada turma estava acompanhando, os conteúdos programáticos de forma homogenia, ao passo que com essa técnica, conseguíamos fazer com que, os alunos com dificuldade de aprendizagem conseguissem acompanhar o ritmo, dos alunos sem dificuldade. A comprovação dos benefícios dessa técnica veio com o resultado da segunda avaliação (festa junina), onde pudemos observar que conseguimos incluir os alunos que apresentavam tais dificuldades entre os bem sucedidos, devido ao fato de que o sucesso foi construído ao longo do processo de ensino aprendizagem, seja do ponto de vista cognitivo, integrando a aprendizagem e o desenvolvimento do educando, seja do ponto de vista coletivo, integrando o educando num grupo de iguais, o todo da sociedade. Segundo a neurocientísta, Suzana Houzel, “A produção da fala costuma ser função de uma área do lado esquerdo do cérebro,que seleciona, ordena as palavras e as pronuncias. Mas, se ele trabalhasse sozinho, sem o lado direito, nossa fala seria monocórdica, sem inflexão alguma – e sem informação sobre nosso estado interior. Todo o conteúdo emocional da fala é dado pela melodia da voz, chamada prosódia, acrescentada ás palavras pela região equivalente no lado direito do cérebro,sem a prosódia a fala não transmite emoção alguma. Acontece que toda melodia – falada, cantada, sintetizada ou orquestrada – ativa os mesmos circuitos que o cérebro emprega para gerar e interpretar a melodia que dá o conteúdo emocional da fala. O resultado é o contágio emocional que comunica o estado de espírito representado pela melodia – e ainda é capaz de deixar memórias marcantes associadas a ela”.(2009) 3 Para a autora,o aprendizado depende de três fatores: “repetição”(base das mudanças sinápticas que implementam a nova maneira de agir,pensar ou sentir), “retorno negativo”(que informa quando se erra e é preciso tentar de novo de outra maneira)e “retorno positivo”(que sinaliza quando se fez a coisa certa que deve ser repetida no futuro).Em primeiro lugar vem o “desejo”, a identificação do aluno com aquele atividade(herança genética),em segundo lugar vem a “oportunidade”,ninguém se torna um pintor bem sucedido se não experimentar pintar a primeira tela,ou um excelente bailarino se nunca começar a aprender balé;experimentar é muito importante e nos abri portas para descobrir do que gostamos,em terceiro lugar vem a “motivação” que nos assegura horas e horas de prática, e conseqüentemente, nos proporciona desempenhos excepcionais de músicos,atletas etc. a herança genética nos dá a condição e a motivação para desempenhar muito bem tal atividade, porém, a oportunidade nos dá a condição para a realização desse desejo, porque sem a prática as nossas habilidades não serão desenvolvidas e muito menos reconhecidas pelo meio social em que vivemos, bem como, a prática também nos proporciona a oportunidade de conhecermos as nossas incompatibilidades e inabilidades específicas, tais como surdez musical, inabilidade para cálculo, para leitura, para interpretação e redação de textos, para desenhar etc. o ‟retorno negativo‟ tem seu papel mas não serve de motivação,porque é importante saber que nós não estamos acertando, ou ouvir de outra pessoa que está tudo errado,para que nosso cérebro tente de outra forma da próxima vez. Porém, só haverá próxima vez para aqueles que têm motivação apesar dos erros. O que nos leva a acertar e continuar tentando são o retorno positivo e a expectativa de acertar na próxima vez, o retorno positivo é fundamental para o processo de aprendizagem, porque o cérebro se premia sozinho com sensações agradáveis toda vez que acerta,ativando o sistema de recompensa (o prazer de acertar reforça os acertos e ainda serve de motivação- a expectativa de mais retorno positivo- para se continuar praticando). Desse modo, o aluno desejará resolver mais problemas de matemática quando aprender a aplicar a fórmula ou a fazer contas de cabeça, a tocar um instrumento musical quando seus dedos acertam as notas, a fazer uma redação quando aprender a aplicar as regras de português etc. nesse aspecto, o papel do professor motivador é fundamental porque o cérebro ainda não aprendeu a reconhecer sozinho quando acerta, ele precisa de tutela, de demonstrações de encorajamento na forma de elogios e incentivos, mesmo aquele cérebro que se auto-encorajar precisa de elogios. As brincadeiras tradicionais da infância também são um excelente exercício para o córtex pré-frontal das crianças (parte do cérebro que organiza nossas ações, faz planos, elabora estratégias e, sobretudo, diz não as respostas impulsivas do cérebro). As crianças pequenas não possuem um córtex pré-frontal maduro, não conseguem praticar bem suas ações, por essa razão as brincadeiras como morto vivo, batatinha frita, seu mestre mandou, lenço atrás, etc. além de diverti-las e fazê-las correr, também auxiliam no amadurecimento do seu córtex préfrontal. Do mesmo modo, tanto como em qualquer „aula‟ de organização, como bê-á-bá 4 (escolher a resposta certa para cada estímulo), como nas brincadeiras mais simples do nível-1(que exigem que se faça alguma coisa ao ouvir um comando) também colaboram, enquanto aprende o cérebro se diverte com seus erros, o que garante muitas horas de brincadeira e aprendizado. A medida que o córtex pré-frontal vai amadurecendo, as brincadeiras vão mudando para bola, cartas, jogos de sociedade etc. até atingir o nível adulto por excelência: pôquer (ler as emoções dos outros, blefar etc.), pois o córtex pré-frontal leva cerca de trinta anos para amadurecer. Segundo LURIA (1981), as funções neuropsicológicas que estão envolvidas em processos cerebrais mais complexos são: Atenção é a capacidade do indivíduo de focalizar a mente e algum aspecto do ambiente ou de algum conteúdo da própria mente; Memória é um sistema integrado que permite tanto processamento ativo quanto armazenamento transitório de informações. Inclui as habilidades de armazenar, recordar e reconhecer conscientemente fatos e acontecimentos envolvidos em tarefas cognitivas, tais como: compreensão, aprendizado e raciocínio; Funções Motoras, implica na análise das praxias, isto é, das formas complexas da construção dos movimentos voluntários (tônus muscular, sistema ótico-espacial, regulação verbal do ato motor). O lobo frontal giro pré-central (área motora). No lobo frontal também vamos encontrar a área da palavra falada (Área de Broca) e Funções Superiores, capacidade global agregada do individuo para agir com propósito, expressam a nossa humanidade:a de contarmos uma história individual ou de grupo,educar e ser educado, comunicar-se pó meio da linguagem etc. pensar racionalmente e lidar efetivamente com o meio que está inserido. Reflete a soma das experiências aprendidas pelo indivíduo que permitem conceituar, organizar, desenvolver, resolver problemas e ser criativo. O lobo frontal é responsável por nosso temperamento, nossa relação com as pessoas, nosso jeito de ser. É o que nos faz indivíduos ímpares, é a parte mais sofisticada do cérebro (orbito-frotal e dorsolateral), nos permite: a capacidade de planejamento e análise das consequências de ações futuras. Metodologia Este estudo, desenvolvido a partir de um relato de experiência. Tendo por base leitura de vários autores que tratam do tema em estudo. Considerações Finais Neste estudo discutimos a causa, os problemas e as possíveis soluções para as dificuldades de aprendizagem do ponto de vista da avaliação neuropsicológica no sistema educacional. Enfocando a avaliação multidisciplinar contribuindo para a reabilitação e inclusão desses alunos no sistema educacional. A causa e os sintomas das dificuldades de aprendizagem decorrentes das funções neuropsicológicas são obstáculos que a escola e os profissionais da educação enfrentam no seu desempenho profissional. 5 O diagnóstico equivocado leva a encaminhamento para tratamentos desnecessários e à exclusão, tirando a oportunidade do aluno de superar suas dificuldades. As dificuldades de aprendizagem raramente têm uma única causa. Supostamente têm base biológica (Lesão cerebral, alterações no desenvolvimento cerebral, desequilíbrios químicos, hereditariedade). Mas é o ambiente-família-escola-comunidade que determina a gravidade do impacto da dificuldade. O que a escola pode fazer para mudar esse contexto da inclusão em relação às dificuldades de aprendizagem, e de que forma os professores podem colaborar com essa mudança, depende do tipo de avaliação realizado na escola, da avaliação multidisciplinar e da metodologia aplicada, contribuindo para a reabilitação e o bom desempenho dos alunos. Devemos capacitá-los e atualizá-los, auxiliando-os em suas dificuldades, para o seu bom desempenho como profissionais e como cidadãs. Referências HOUZEL,Suzana Herculano.Pílulas de neurociência: Para uma vida melhor. Rio de janeiro: Sextante, 2009. 190 p. LURIA, A. R. Fundamentos de Neuropsicologia. Livros Técnicos e Científicos Ed. S A, EDUSP, 1981. KIMBLE, Daniel. A psicologia como ciência biológica. 1ª ed. Rio de janeiro: Zahar editores, 1975. 295 p. 6