climate

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VARIABILIDADE DO REGIME DE MONÇÕES SOBRE A REGIÃO DO CERRADO: O
CLIMA PRESENTE E PROJEÇÕES PARA UM CENÁRIO COM 2XCO2 USANDO O
MODELO MIROC.
Rodrigo José Bombardi1 e Leila Maria Véspoli de Carvalho2
RESUMO
O presente trabalho consiste em estabelecer um estudo observacional da variabilidade espacial e
interanual da precipitação sobre o cerrado brasileiro, associada ao Regime de Monções da América do
Sul, e verificar algumas projeções para esta região baseadas num cenário futuro de mudanças globais.
Dados globais de precipitação em pêntadas obtidos do Global Precipitation Climatology Project
(GPCP) foram investigados entre 1979 e 2004. Saídas do modelo climático global acoplado MIROC
(Model for Interdisciplinary Research On Climate) foram utilizadas para investigar dois cenários
distintos: o clima do século XX (1981-2000) e o clima numa condição com o dobro da concentração
atual de CO2 na atmosfera (compreendendo dez anos). Verificou-se o adiantamento do início da
estação chuvosa, uma diminuição na duração da estação chuvosa e um aparente aumento no total
precipitado durante a estação chuvosa sobre o cerrado, para o cenário com 2xCO2.
ABSTRACT
The present work consists of an observational study of the spatial and interannual variability of
precipitation over the Brazilian savannah (Cerrado), associated with the South American Monsoon
System, and verification of projections for this region based on future scenarios of global changes.
Global pentad precipitation data were obtained from Global Precipitation Climatology Project (GPCP)
are investigated between 1979 and 2004. Results of the global climate coupled model MIROC (Model
for Interdisciplinary Research on Climate) are used to investigate two distinct scenarios: the climate of
the 20th century (1981-2000) and the climate in a condition with the double of the current CO2
concentration in the atmosphere (ten years climate). There is indication of earlier onset, shorter
duration and increased of total seasonal precipitation over the savannah during the rainy season for a
scenario with 2xCO2.
Palavras-Chave: Monções, Mudanças Climáticas, Cerrado.
INTRODUÇÃO
A ocupação humana sobre o domínio dos cerrados trouxe grandes alterações ao bioma. Apesar da
expansão agrícola e da urbanização contribuirem para o crescimento econômico e social na região, a
biodiversidade vem sendo prejudicada e o consumo humano e agrícola de água vem aumentando.
Aliados a estes aspectos regionais, mudanças climáticas forçadas pelo aquecimento global oriundo do
aumento de CO2 do último século (IPCC-2001) podem produzir feedbacks ainda desconhecidos,
alterando o regime de precipitação e seus extremos.
1 – IAG/USP. Rua do Matão, 1226 – Cidade Universitária – São Paulo / SP – Brasil – 05508-900
Tel: 55 (11) 3091-4675 – [email protected]
2 – IAG/USP Rua do Matão, 1226 – Cidade Universitária – São Paulo / SP – Brasil – 05508-900
Tel: 55 (11) 3091-4737 – [email protected]
O objetivo do presente estudo está em caracterizar variabilidades no início e término das
monções de verão sobre o Brasil e avaliar o comportamento destas características num cenário futuro
de mudanças globais, utilizando o modelo climático MIROC. Além disso, pretende-se contribuir para o
prognóstico de evolução do cerrado brasileiro, uma vez que o início, fim e duração da estação chuvosa
e a regularidade das chuvas na região têm um papel importante para a manutenção do bioma. Este
trabalho tem também por finalidade contribuir com o projeto temático intitulado “Interação BiosferaAtmosfera Fase-2: Cerrados e mudança do uso da terra” (FAPESP: 02/09289-9).
MATERIAL E MÉTODOS
Os dados de precipitação utilizados são resultantes das análises de pêntadas (média de cinco dias)
construídas pelo Projeto Climatológico de Precipitação Global (Global Precipitation Climatology
Project – GPCP) a partir de conjuntos de dados baseados em estimativas de satélite e medidas de
estações de superfície (Xie et al. 2002). Os dados são criados com resolução de 2,5º de latitude e
longitude. O período considerado é de 1979 a 2004. Além disso, foram examinadas as saídas do
modelo japonês MIROC (Model for Interdisciplinary Research On Climate) para dois cenários
distintos: o clima do século XX (1981-2000) e o clima numa condição com o dobro da concentração
atual de CO2 na atmosfera (dez anos). Para este trabalho foi escolhida uma região que compreende o
domínio entre 5.0 º norte e 35.0 º sul e entre 30.0 e 80.0 º oeste.
O início, o fim e conseqüentemente a duração da estação chuvosa foram determinados utilizando
somente dados de precipitação através do método proposto por Liebmann e Marengo (2001), tal que:
S (dia ) =
∑ (R(n) − R )
dia
(1)
n = dia0
Onde R (n ) é a precipitação medida na pêntada n, R é a precipitação média anual (tomados os
365 dias). Para se determinar o início da estação chuvosa, calcula-se a somatória S para cada pêntada
do ano, iniciando na estação seca de um determinado ano e terminando na estação seca do ano
seguinte. Inicialmente, a somatória S terá contribuições negativas. O momento em que S passa a ter
contribuições positivas de forma a apresentar um ponto de mínimo é considerado o início da estação
chuvosa. Analogamente, determina-se o fim da estação chuvosa quando a somatória S, antes positiva,
passa a ter contribuições negativas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O clima presente
Os maiores valores de mediana do total precipitado durante a estação chuvosa encontram-se
sobre a região Amazônica, variando de 1600 mm no sul, leste e centro, 1400 mm no oeste e diminuindo
para norte, atingindo valores 800 mm no extremo norte. Um máximo sobre a região da foz do
Amazonas também é observado. Sobre a região do cerrado brasileiro a precipitação é razoavelmente
menor, apresentando medianas entre 1000 a 1400 mm (não mostrado).
O modelo, para o cenário atual, consegue reproduzir alguns padrões, porém, algumas vezes falha
na distribuição espacial (não mostrado). Sobre o cerrado, a precipitação foi bem representada, porém,
superestimada, ficando entre 1200 a 1400 mm.
Grande parte do Brasil central apresenta medianas de início da estação chuvosa entre as pêntadas
56 a 64 (Fig. 1a). As medianas de início sobre o oeste e noroeste da Amazônia variam entre as pêntadas
44 e 60. Fica por volta da pêntada 68 Sobre a foz do Amazonas e da pêntada 60 sobre o sul da
Amazônia (Fig. 1a), o que concorda com Liebmann e Marengo (2001), embora a região noroeste da
Amazônia apresente valores relativamente superiores dos observados por eles. O fato da Região
nordeste da AS apresentar valores menores de medianas de início da estação chuvosa deve-se ao início
das monções de verão do Hemisfério Sul. A convecção forma-se sobre a América Central, noroeste da
região Amazônica e sudeste do Pacífico Norte, em seguida desloca-se na direção sudeste da AS
intensificando-se progressivamente (Kousky 1988, marengo et al. 2001 e Gan et al. 2004).
a)
b)
Figura 1 – Mediana do Início da estação chuvosa para os dados do (a) GPCP; (b) MIROC no cenário atual.
Sobre o Brasil central, O MIROC consegue reproduzir as características de início da estação
chuvosa, para o clima do século XX, de modo bastante semelhante ao observado, apresentando as
principais diferenças sobre o Nordeste do Brasil e sobre o extremo sul do país (Fig. 1b), onde existem
diferenças nas distribuições espaciais e atraso do início da estação chuvosa. É importante lembrar que a
resolução espacial dos dados do GPCP é inferior à dos dados do modelo, o que pode ser responsável
por parte das diferenças encontradas.
A mediana de duração da estação chuvosa varia entre 32 a 36 pêntadas na maior parte da AS,
apresentando os maiores valores no interior do continente (não mostrado). Kousky (1988) utilizou um
critério para caracterização da estação chuvosa baseado em dados de radiação de onda longa emergente
(ROLE) e verificou uma tendência a estações chuvosas mais duradouras a partir do sudeste do Brasil
em direção ao noroeste até o oeste da Bacia Amazônica. O mesmo pôde ser observado aqui, porém
próximo ao sudoeste da Bacia Amazônica em direção noroeste a duração da estação chuvosa passa a
diminuir. O modelo representa muito bem o cenário atual, tanto em relação à magnitude quanto à
distribuição espacial (não mostrado)
O Clima para cenário de 2CO2.
Para o cenário de 2CO2, o modelo indica um aumento na precipitação em todo o domínio
observado em relação aos dados do cenário presente (não mostrado), apresentando um aumento
significativo na precipitação sobre as regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil. Sobre o cerrado, a
mediana da precipitação durante a estação chuvosa fica em torno de 1200 a 1600 mm.
Figura 2 – Mediana do Início da estação chuvosa para os dados do modelo MIROC para o cenário com 2CO2.
Para o início da estação chuvosa, o modelo indica um comportamento bastante diferente para o
cenário com 2CO2 (fig. 2) em relação ao cenário presente (fig. 1), apresentando valores maiores para a
mediana de início da estação chuvosa sobre o litoral da região Nordeste do Brasil, entre as pêntadas 58
e 64, e uma larga faixa com valores consideravelmente pequenos para a mediana de início da estação
chuvosa, variando entre as pêntadas 44 e 56 (início de agosto e início de outubro) (fig. 2). Esta faixa
abrange o Sul e Sudeste do Brasil e se estende até o noroeste da AS, incluindo toda a região do cerrado
brasileiro e Pantanal e, também, grande parte da região Amazônica.
O modelo indica uma diminuição na mediana da duração da estação chuvosa, em quase todos os
pontos de grade, para o cenário de 2CO2 em relação ao cenário presente (não mostrado). Sobre o
cerrado, a duração da estação chuvosa simulada pelo modelo passa a ter 32 pêntadas (cinco meses).
Variabilidade da estação chuvosa sobre o cerrado em modelos climáticos globais.
Nesta parte do trabalho foi escolhida uma sub-região com 3 x 5 pontos de grade (15 pixels)
localizada sobre as regiões Sudeste (SE) e Centro-Oeste (CO) do Brasil (22,5S e 12,5S; 47,5W e
52,5W). O objetivo deste estudo foi fazer uma análise estatística das características da estação chuvosa,
na região dos cerrados, obtidas por rodadas do modelo climático global MIROC.
Miroc-h Cenário Futuro 2xCO2 (10 anos): região CO
c)
2550
2750
2550
2750
2350
2150
1950
1750
1550
1350
1150
950
750
550
350
Miroc-h Cenário Futuro 2xCO2 (10 anos): região SE
Perc 25%: 965 mm (- 6.0 %)
12
Perc 50%: 1224 mm (+ 6.3 %)
10
Perc 75%: 1440 mm (+ 9.7 %)
Precipitação total durante a estação
chuvosa (mm)
d)
2350
2150
1950
1750
1550
1350
1150
950
750
550
150
8
6
4
2
0
350
Frequência (%)
Frequência (%)
2550
2350
2150
1950
1750
1550
1350
1150
950
150
2750
2550
2350
2150
1950
1750
1550
1350
1150
950
750
750
550
350
150
Frequência (%)
Miroc-h Cenário Atual (1981-1999): região SE
12
10
8
6
4
2
0
Precipitação total durante a estação
chuvosa (mm)
b)
Precipitação total durante a estação
chuvosa (mm)
Perc 25%: 1001 mm (- 2.4 %)
Perc 50%: 1203 mm (+ 4.5 %)
Perc 75%: 1386 mm (+5.6 %)
Perc 25%: 1106 mm (- 0.2 %)
Perc 50%: 1448 mm (+ 13.6 %)
Perc 75%: 1718 mm (+ 15.2 %)
12
10
8
6
4
2
0
2750
a)
350
12
10
8
6
4
2
0
550
Perc 25%: 1282 mm (+ 15.7 %)
Perc 50%: 1429 mm (+ 12.1 %)
Perc 75%: 1624 mm (+ 8.9 %)
150
Frequência (%)
Miroc-h Cenário Atual (1981-1999): região CO
Precipitação total durante a estação
chuvosa (mm)
Figura 3 – Distribuição de freqüência da precipitação total durante a estação chuvosa, dos dados do modelo,
para o cenário atual nas região (a) CO e (c) SE. E para o cenário de 2CO2 nas regiões (b) CO e (d) SE. A figura
apresenta os percentis da distribuição e a diferença destes em relação à distribuição do GPCP.
O modelo, para o cenário atual, tende a superestimar a quantidade total de chuva durante a
estação chuvosa para as duas regiões (Fig. 3a e 3c). Para o cenário com o dobro de CO2, a distribuição
da precipitação total durante a estação chuvosa para a região SE muda para uma distribuição bi-modal
(Fig 3d), apresentando diferenças em relação aos dados do GPCP de até 9,7% no percentil de 75% e de
-6,0% no percentil de 25%. Já para a região do centro-oeste, observa-se uma maior dispersão desta
distribuição, indicando tanto a presença de anos mais secos como de anos mais chuvosos (Fig. 3b). As
diferenças em relação aos dados do GPCP chegam até 13,6% para a mediana e -0,2% para o percentil
de 25%.
CONCLUSÃO
Sobre a região do cerrado, a precipitação durante a estação chuvosa apresenta medianas entre
1000 e 1400 mm. A estação chuvosa o sobre esta região apresenta medianas de início entre as pêntadas
56 e 64 e medianas de 32 a 36 pêntadas (5 a 6 mêses).
O modelo MIROC, de maneira geral, consegue uma boa representação do início, duração e total
acumulado da estação chuvosa no cenário atual. Consegue, também, representar a variabilidade
interanual do início das monções sobre a América do Sul. Mas algumas vezes falha ao simular a
distribuição espacial e tende a superestimar a precipitação em toda a região estudada. Indica, para um
cenário futuro com o dobro da concentração atual de CO2 na atmosfera, que a estação chuvosa passa a
começar aproximadamente 2 mêses mais cedo sobre o noroeste, centro e sudeste da América do Sul, ao
mesmo tempo em que a estação chuvosa passa a ter menor duração nesta região (por volta de um mês),
somada a um aumento de aproximadamente 200 mm do total precipitado durante a estação chuvosa.
Ainda para o cenário de 2CO2, a distribuição de freqüência do total precipitado durante a estação
chuvosa na região SE muda para uma distribuição bi-modal Já para a região do centro-oeste, há uma
assimetria ainda maior nas caudas da distribuição, indicando a possível ocorrência tanto de anos mais
chuvosos quanto de anos mais secos.
AGRADECIMENTOS
O presente trabalho tem apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e
Tecnológico – CNPq (Processo: 111949/2004-1)
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