PNEUMONIA ASSOCIADA A VENTILAÇÃO MECÂNICA: Revisão de literatura Jayra Adrianna da Silva Sousa1 kércia Vitória de Moura Rêrgo2 Nayra Fernanda da Silva Sousa3 Guilherme Luis de Brito Oliveira4 Viviane de Sá Coelho5 RESUMO A pneumonia é a segunda infecção nosocomial em termos gerais e a infecção mais comum em unidades de terapia intensiva. Diante disso, sentiu-se necessidade de recorrer à literatura com vistas a organizar os principais conceitos e recomendações relacionadas ao uso de suporte ventilatório invasivo, enfatizando principalmente o risco de pneumonia associada a esta prática. Observou-se que a maioria dos pacientes internados nas UTI estava em ventilação mecânica; que nos pacientes intubados, a incidência de pneumonia é de 7 a 21 vezes maior do que aqueles que não necessitam do ventilador e que prática da traqueostomia precoce reduz significativamente o tempo de ventilação artificial e permanência na UTI e, portanto a incidência de pneumonia. Alguns autores enfatizaram o importante impacto de programas educacionais na redução de PAV, através do treinamento da equipe multiprofissional. Palavras-chave: Prevalência. Pneumonia. Ventilação Mecânica. UTI. ABSTRACT Pneumonia is the second nosocomial infection in general and the most common infection in intensive care units. Given this, it was felt necessary to resort to literature with a view to organizing the main concepts and recommendations regarding the use of invasive ventilatory support, highlighting the risk of pneumonia associated with this practice. It was observed that most patients were admitted to the ICU on mechanical ventilation, which in intubated patients, the incidence of pneumonia is 7 to 21 times higher than those who do not need the fan and practitioner of early tracheostomy significantly reduces the time artificial ventilation and ICU stay and therefore the incidence of pneumonia. Some authors have emphasized the important impact of educational programs in reducing VAP, through the training of multidisciplinary team. Keywords: Prevalence. Pneumonia. Mechanical Ventilation. ICU. ____________________ 1 Enfermeira. Pós-graduada em Urgência e Emergência pela Faculdade NOVAFAPI, Pósgraduada em Saúde Pública pela UNIPÓS, Pós-graduanda em Terapia Intensiva pelo IBPEX, e-mail: [email protected] 2 Orientadora. Enfermeira. Pós-graduada em Terapia Intensiva pela Faculdade NOVAFAPI; Mestre em Terapia Intensiva pela SOBRATI, e-mail: [email protected] 3 Enfermeira. Pós-graduada em Terapia Intensiva pela Faculdade NOVAFAPI, e-mail: [email protected] 4 Enfermeiro, e-mail: [email protected] 5 Enfermeira. Pós-graduada em Saúde da Família, pela UVA, Mestranda em Enfermagem pela UFMA, e-mail: [email protected] 1 INTRODUÇÃO O uso do suporte ventilatório invasivo constitui-se um dos pilares terapêuticos da Terapia Intensiva e, sem dúvida, foi um avanço no tratamento da insuficiência respiratória. A intubação traqueal é utilizada basicamente para a manutenção da permeabilidade das vias aéreas de pacientes submetidos à ventilação mecânica. Apesar de salvar muitas vidas, a intubação traqueal pode gerar uma série de efeitos adversos, como instabilidade hemodinâmica, maior freqüência de infecções respiratórias e lesões físicas. Essas alterações estão relacionadas a uma maior morbidade, devido às repercussões sistêmicas que provocam, gerando um aumento dos custos da internação hospitalar, assim como a uma maior mortalidade desses pacientes. A pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) é definida como uma infecção pulmonar que surge 48 a 72 horas após intubação endotraqueal e instituição da ventilação mecânica invasiva, como também até 48 horas após a extubação. É uma das infecções hospitalares mais incidentes nas unidades de terapia intensiva, com taxas que variam de 9 a 40% das infecções adquiridas nesta unidade. Portanto, encontra-se como um dos efeitos adversos mais temíveis no ambiente da terapia intensiva (BOUNDY et al., 2009). As taxas de pneumonia associada à ventilação mecânica podem variar de acordo com a população de pacientes e os métodos diagnósticos disponíveis. Mas vários estudos demonstram que a incidência desta infecção aumenta com a duração da ventilação mecânica e apontam taxas de ataque de aproximadamente 3% por dia durante os primeiros cinco dias de ventilação e depois 2% para cada dia subseqüente. A pneumonia hospitalar compromete a maior parte dos pacientes de Unidade de Terapia Intensiva, principalmente aqueles em ventilação mecânica, aumentando os índices de mortalidade, devido a sua maior gravidade e complexidade. O uso de assistência ventilatória aumenta os índices das infecções respiratórias e a mortalidade cresce nestes pacientes, estando intimamente relacionada com a pneumonia. O custo hospitalar do atendimento a estes pacientes é bastante elevado, assim como o tempo de permanência é maior (BRUNNER & SUNDDARTH, 2009). O desejo de estudar esta temática partiu da necessidade de compreender a estreita relação entre o desenvolvimento de pneumonia em pacientes submetidos à assistência ventilatória invasiva na Unidade de Terapia Intensiva. Diante disso, sentiu-se necessidade de recorrer à literatura com vistas a organizar os principais conceitos e recomendações relacionadas ao uso de suporte ventilatório invasivo, enfatizando principalmente o risco de pneumonia associada a esta prática. E contribuir, portanto para o alcance de uma prática fundamentada, minimizando os danos decorrentes de um processo que tem como principal objetivo atender as exigências respiratórias dos pacientes que necessitam de assistência ventilatória. Com base nessas considerações, esta pesquisa tem como objetivo fazer um levantamento na literatura sobre pneumonia associada à ventilação mecânica; verificar as tendências dos trabalhos encontrados e descrever os resultados e análises feitas pelos autores dos trabalhos sobre este tema. 2 METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa bibliográfica sobre pneumonia associada à ventilação mecânica em Unidade de Terapia Intensiva. Segundo Medeiros (2000), a pesquisa bibliográfica constitui-se em fonte secundária, tendo como objetivo adquirir informações sobre um assunto de relevante interesse. Para a elaboração do estudo, seguiu-se o percurso metodológico sugerido por Marconi e Lakatos (2000), que consiste nos seguintes passos: escolha do tema; elaboração do plano de trabalho; identificação; localização; fichamento; análise; interpretação e redação. A busca dos artigos foi realizada mediante busca eletrônica na base de dados do SCIELO (Scientific Electronic Library On Line), no período de 2000 a 2010, com os seguintes descritores: prevalência; pneumonia; ventilação mecânica e UTI. Foram localizadas 14 publicações. Tais artigos pertencem às seguintes publicações: 06 artigos da Revista Brasileira de Terapia Intensiva, 03 artigos do Jornal Brasileiro de Pneumologia, 01 artigo da Revista Nursing, 01 artigo do Jornal de Pediatria e 01 artigo da Revista Latino-americana de Enfermagem. Foram utilizados também 02 livros para que a coleta de informações fosse a mais completa possível. A análise se fez pela construção subjetiva, conforme os focos apresentados nos estudos selecionados, sobre o tema pneumonia associados à ventilação mecânica. Os resultados obtidos foram categorizados para melhor compreensão do leitor. 3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Foram selecionados a partir do banco de dados SCIELO, 14 trabalhos ou fontes nacionais sobre pneumonia associada à ventilação mecânica. Tais publicações são de abordagem qualitativa e quantitativa. Segundo a área profissional dos autores dos artigos selecionados, observou-se que havia médicos, enfermeiros, odontólogos e fisioterapeutas. Os textos foram categorizados, para melhor compreensão. 3.1 Aspectos clínicos, epidemiológicos e laboratoriais Pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) é uma resposta inflamatória do hospedeiro à multiplicação incontrolada de microorganismos invadindo as vias aéreas distais. No estudo histológico, pneumonia é caracterizada pelo acúmulo de neutrófilos na região dos bronquíolos distais e alvéolos (MARTINS et al.,2010). A patogênese da pneumonia relacionada à assistência à saúde envolve a interação entre patógeno, hospedeiro e variáveis epidemiológicas que facilitam esta dinâmica. Vários mecanismos contribuem para a ocorrência destas infecções, porém o papel de cada um destes fatores permanece controverso, podendo variar de acordo com a população envolvida e o agente etiológico. A pneumonia relacionada à assistência à saúde é geralmente de origem aspirativa, sendo a principal fonte, as secreções da vias áreas superiores, seguida pela inoculação exógena de material contaminado ou pelo refluxo do trato gastrintestinal. Estas aspirações são, mais comumente, microaspirações silenciosas, raramente há macroaspirações, que quando acontecem trazem um quadro de insuficiência respiratória grave e rapidamente progressiva (LOPES & LOPEZ, 2009). De acordo com os dados de vigilância do National Nosocomial Infection Surveillance (NNIS) do CDC, a pneumonia é a segunda infecção nosocomial em termos gerais e a infecção mais comum em unidades de terapia intensiva. Nos pacientes intubados, a incidência desta infecção é de 7 a 21 vezes maior do que aqueles que não necessitam do ventilador (BERALDO & ANDRADE, 2008). Damasceno et al. (2006) realizaram um levantamento epidemiológico da ventilação mecânica no Brasil e puderam observar que a maioria dos pacientes internados nas UTI estava em ventilação mecânica, apresentando-se clinicamente mais graves e com tempo de internação superior aos pacientes não ventilados. A principal indicação para o suporte ventilatório foi a insuficiência respiratória aguda, sendo esta originada predominantemente por pneumonia. Estas características traduzem maior gravidade e por este fato o tempo de ventilação mecânica é mais prolongado. Um limite de tempo de 48 horas foi aceito como base para diferenciar pneumonia “precoce” (presente no momento da intubação endotraqueal ou que se desenvolve logo após a intubação) daquela “tardia” ou verdadeira pneumonia associada à ventilação mecânica (presente ou incubada no momento da intubação). Geralmente, as pneumonias de início precoce decorrem da aspiração da orofaringe, são provocadas principalmente por Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae e Staphylococcus aureus. (ENCORI & HUGHES, 2006). Segundo Teixeira et al.(2004) as pneumonias tardias relacionam-se principalmente à própria ventilação mecânica, sendo secundárias à colonização das vias aéreas superiores e à aspiração de secreções contaminadas, freqüentemente causadas por enterobacterias (Enterobacter sp, E. coli, Klebsiella sp, Proteus sp, Serratia sp), Pseudomonas aeruginosa, S. aureus e Acinetobacter sp. Apesar da grande importância da pneumonia no âmbito hospitalar, o diagnóstico etiológico correto apresenta muitas dificuldades, principalmente nas pneumonias relacionadas ao uso do ventilador. Os critérios diagnósticos utilizados na maioria das instituições são baseados nas condições clínicas do paciente, nos achados laboratoriais e radiológicos e outras evidências de infecção. Segundo Carvalho et al. (2005), os critérios clínicos convencionais incluem febre, leucocitose, presença de expectoração purulenta e o aparecimento de um novo e persistente infiltrado pulmonar, à radiografia de tórax. Entretanto, estes achados clínicos, laboratoriais e radiológicos são pouco específicos. Várias condições clínicas podem apresentar manifestações indistinguíveis da pneumonia, especialmente no paciente hospitalizado, com dispnéia, taquipnéia, tosse, febre, dor tipo pleural, aparecimento de infiltrado pulmonar, o que torna o diagnóstico baseado exclusivamente em critérios clínico - radiológicos, muitas vezes de difícil interpretação. Os métodos disponíveis atualmente para diagnosticar pneumonia nosocomial incluem aspirado traqueal (através de sonda de aspiração, realizado em pacientes intubados) e lavado bronco-alveolar (BAL – através de um fibrobroncoscópio). Em geral, culturas de aspirado não são úteis para o diagnóstico etiológico de pneumonia hospitalar, mas podem ajudar na identificação do agente etiológico e na conduta terapêutica mais adequada. O lavado broncoalveolar é um método mais fidedigno para investigação microbiológica do trato respiratório inferior, realizado por equipe médica especializada, que permite a visualização da árvore brônquica e possível comprometimento pulmonar (BARACAT et al., 2009). Guimarães et al. (2006) utilizaram os seguintes critérios para o diagnóstico de PAV na UTI do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro: contagem de leucócitos acima de 10.000/mm3 ou abaixo de 4.000/mm3; temperatura axilar > 38ºC ou < 36ºC; presença de secreção traqueal purulenta, ou mudança em seu aspecto; presença de novos, persistentes ou progressivos infiltrados, consolidações, cavitações pulmonares ou derrame pleural (radiografia, tomografia computadorizada de tórax, ou ambas) - excluídas outras causas não-infecciosas; e positividade em culturas de amostras de aspirado de secreção traqueal, do lavado broncoalveolar. No estudo realizado por eles foram incluídos 278 pacientes sob ventilação mecânica por mais de 24 horas, com idade mediana de 52 anos (intervalo interquartil 25% - 75% de 37 66 anos), sendo 50% deles do sexo masculino. Destes 38,1% desenvolveram a PAV, com taxa de 35,7 casos por 1.000 dias de ventilação: 45,3% por bacilos gram negativos, Pseudomonas aeruginosa (22%) o mais comum e 43,4% por germes multi-resistentes. Estes resultados ultrapassam os dados do National Nosocomial Infections Surveillance System, cuja taxa é de 13,5 casos por 1.000 dias de ventilação. Ao serem analisadas as complicações durante a VM, verificaram que os pacientes com PAV apresentaram mais freqüentemente pneumotórax, atelectasia, traqueobronquite, síndrome do desconforto respiratório agudo, sinusite, maiores tempos de ventilação mecânica, de desmame, de permanência no hospital e na unidade de terapia intensiva. 3.2 Procedimentos invasivos e não-invasivos Suporte respiratório com ventilação mecânica não-invasiva com pressão positiva (VMNIPP) consiste em um método de assistência ventilatória em que uma pressão positiva é aplicada à via aérea do paciente por meio de máscaras e outras interfaces sem a utilização da intubação traqueal (ROCHA & CARNEIRO, 2008). Atualmente esta medida é indicada em pacientes com insuficiência respiratória aguda (IRA) hipercapnia ou alto risco de desenvolvê-la e na IRA hipoxêmica de diferentes etiologias. CARNEIRO et al. (2008) relataram um caso de uma paciente com diagnóstico provável de pneumonia por Pneumocystis jirovecii que recebeu suporte respiratório com ventilação mecânica não-invasiva com pressão positiva e observaram que o quadro de insuficiência respiratória aguda foi revertido, encurtando assim o tempo de permanência hospitalar, além de evitar a intubação traqueal. A ventilação não-invasiva com pressão positiva tem uma série de vantagens em relação à ventilação invasiva: é de fácil aplicação e remoção, preserva as vias aéreas superiores, garante maior conforto ao paciente, evita o trabalho resistivo do tubo traqueal e as complicações da própria intubação, como traumatismos de vias aéreas superiores e/ou pneumonia nosocomial. Ademais, o fato de que a disponibilidade de ventiladores e de vagas nas UTI ser muito reduzida na maioria dos hospitais, viabiliza mais a opção por esta técnica. Intubação traqueal consiste na introdução de um tubo na luz da traquéia. Ela pode ser realizada através das narinas (via nasotraqueal) ou boca (via oratraqueal). Infelizmente esse procedimento reduz a eficácia das defesas nasais e pulmonares. Sendo assim é coerente afirmar que pacientes intubados e criticamente doentes, têm um risco particularmente elevado de desenvolver infecção como a pneumonia nosocomial. ZEITOUN et al. (2001) realizaram, um estudo prospectivo em uma Unidade de Terapia Intensiva de um Hospital Geral da rede privada da Cidade de São Paulo, com 20 pacientes intubados e mecanicamente ventilados para avaliar a incidência de colonização e pneumonia nosocomial comparando o sistema aberto vs sistema fechado de aspiração endotraqueal. Os resultados mostraram que o sistema aberto está associado com significante aumento na colonização (41,67% vs 25%) comparado com o sistema fechado. A intubação endotraqueal diminui bruscamente as defesas naturais das vias aéreas superiores e pulmonares do paciente, mesmo com o uso de ventiladores mecânicos modernos a qualidade do ar pode não ser garantia para uma atuação eficaz dos mecanismos de defesa das vias aéreas inferiores. Outros fatores como o uso de narcóticos e a atropina também interferem no reflexo de tosse e viscosidade do muco dificultando a mobilização das secreções. A utilização do decúbito elevado, cabeceira em 30º a 45º, salvo na existência de contra-indicação, reduz o risco de aspiração do conteúdo gastrintestinal ou orofaríngeos e de secreção nasofaríngea, por este motivo, diminui a incidência de PAV, especialmente em pacientes recebendo nutrição enteral. Outra razão para o acréscimo desta intervenção é a melhoria dos parâmetros ventilatórios. Os pacientes nesta posição apresentam um maior volume corrente quando ventilados com pressão de suporte e redução no esforço muscular e na taxa de atelectasia (ROCHA & CARNEIRO, 2008). Diversos estudos têm demonstrado diminuição das pneumonias associadas à ventilação quando a higiene oral é realizada com clorexidina veículo oral (0,12% ou 0,2%). Muitos protocolos preconizam a higiene da cavidade oral com clorexidina oral, formulação de 0,12%, com uma pequena esponja, evitando lesões da cavidade, três a quatro vezes ao dia. Beraldo e Andrade (2008) através da avaliação de oito artigos científicos constataram que o uso tópico de clorexidina na higiene bucal de pacientes sob ventilação mecânica diminui a colonização da cavidade bucal, podendo reduzir a incidência da PAV. A interrupção diária da sedação para avaliação da prontidão do paciente para a extubação tem sido correlacionada com uma redução do tempo de ventilação mecânica e, portanto a uma redução na taxa de PAV. Mas é preciso ter cautela, pois apesar dos benefícios gerados pela interrupção diária da sedação, esta intervenção pode apresentar alguns riscos. O exemplo disso está na extubação acidental, no aumento do nível de dor e ansiedade e na possibilidade de assincronia com a ventilação, o que pode gerar períodos de dessaturação. É importante implantar um protocolo de avaliação diária da sedação, avaliar a prontidão neurológica para extubação, incluir precauções para evitar a extubação acidental, tais como maior monitorização e vigilância, avaliação diária multidisciplinar e implementação de uma escala a fim de evitar aumento da sedação. A indicação de traqueostomia nos pacientes em ventilação mecânica ocorre principalmente com o objetivo de evitar complicações associadas à intubação traqueal translaríngea prolongada, facilitar a aspiração de secreções respiratórias, diminuir o espaço morto e o trabalho muscular respiratório e promover maior conforto ao paciente. A possibilidade de realização deste procedimento à beira do leito por técnicas de dilatação percutânea e a maior quantidade de pacientes em ventilação mecânica prolongada nas UTI, tem promovido um incremento no número de traqueostomia nesta população. Muito se discute sobre o melhor momento para a sua realização, mas ainda não existe um consenso que defina esta questão, devendo ser considerado a avaliação do seu contexto clínico e sua evolução. Damasceno et al. (2006) observaram que a traqueostomia precoce reduzia significativamente o tempo de ventilação artificial e o tempo de internação na UTI e observaram nos pacientes traqueostomizados uma menor taxa de mortalidade. Quanto às razões que justifiquem maior freqüência de traqueostomias a resposta parece se encontrar nas causas de indicações de ventilação mecânica. Entre as causas a IRA foi a mais freqüente, com predominância da pneumonia, visto que os pacientes com pneumonia, freqüentemente apresentam maior necessidade de aspiração das secreções de vias aéreas, além de precisarem de algum tempo de antibioticoterapia, para que seu processo infeccioso possa ser considerado controlado, e só então ser deflagrado o início do desmame da ventilação mecânica. A contribuição da traqueostomia na descontinuação da ventilação mecânica destes pacientes, muitas vezes justifica a realização de um procedimento mais precoce (BARACAT et al., 2009). 3.3 Antibioticoterapia O CDC recomenda que não se administre agentes antimicrobianos de forma sistêmica e habitual para prevenir pneumonia nosocomial. O uso indevido destes agentes são fatores predisponentes importantes na aquisição de pneumonias por microrganismos resistentes. O tratamento empírico inicial pode ser alterado após a identificação do microorganismo, levando a um tratamento mais direcionado com a possibilidade de diminuir o espectro de antimicrobianos utilizados. O uso inadequado de antimicrobianos leva à resistência bacteriana, dificultando o tratamento da infecção respiratória baixa, aumentando o tempo de internação do paciente, a mortalidade e os custos hospitalar. É importante que antimicrobianos apropriados sejam administrados em doses terapêuticas adequadas, evitando o surgimento de cepas resistentes (GARNER et al., 2006). No paciente intubado, a febre pode ser resultado de vários fatores e não necessariamente um processo infeccioso; o próprio uso de antimicrobianos e infecção em outro sítio pode ter relação com o processo febril. Os critérios usados para definição de caso são muito inespecíficos e favorecem o superdiagnóstico, cabendo uma reflexão sobre a pouca especificidade do método, tanto clínicos como radiológicos, já citados anteriormente. Alcântara et al.(2005) realizaram um estudo na Unidade de Terapia Intensiva de um hospital privado de médio porte, no período de março a agosto de 2002, procurando identificar qual a real incidência de pneumonia nesta instituição e comparar os critérios da National Nosocomial Infection Surveillance System (NNISS) para pneumonia com o diagnóstico clínico do médico. Fizeram parte da amostra todos pacientes adultos internados na Unidade de Terapia Intensiva que, no período do estudo, receberam tratamento que incluía intubação orotraqueal ou traqueostomia e uso de aparelho de assistência ventilatória e que tiveram o diagnóstico e tratamento médico para pneumonia hospitalar. O levantamento dos dados foi realizado através de busca ativa e da aplicação de formulário próprio do serviço de Controle de Infecção. No período do estudo, de 224 pacientes internados na Unidade de Terapia Intensiva, 14 tiveram diagnóstico e foram tratados para pneumonia hospitalar. A terapia antimicrobiana inicial, na maioria das vezes, foi empírica e de amplo espectro. Essa era modificada conforme o resultado dos exames culturais solicitados, na tentativa de um ajuste terapêutico mais adequado, o que foi observado na maioria dos casos. Cada paciente usou um mínimo de 1 chegando até 5 antimicrobianos diferentes com uma média de 3 drogas por paciente com diagnóstico de pneumonia. Houve casos em que foram utilizados em média, até 3 esquemas prévios ao diagnóstico de pneumonia, o que pode contribuir na seleção da microbiota mais resistente. De acordo com o Consenso Internacional no Diagnóstico e Tratamento de Pneumonia Associada à ventilação mecânica (ATS, 2001) a terapia antimicrobiana deve começar empiricamente, dentro das primeiras 12 horas, baseado nos resultados clínicos e radiológicos do paciente, uso prévio de antimicrobianos, início da entubação e fatores de risco específicos para pneumonia. 3.4 Medidas preventivas Alguns estudos observaram importante impacto de programas educacionais na redução de PAV, através do envolvimento da equipe de saúde na prevenção da infecção hospitalar. A higiene das mãos deve fazer parte de todas as campanhas educativas tanto fortalecendo os conceitos da periodicidade como da técnica. O treinamento da equipe multiprofissional que presta assistência a pacientes em ventilação mecânica é fundamental e tem impacto direto nas taxas de PAV. As estratégias devem ser de preferência, multimodais, envolvendo metodologias variadas: aulas teóricas e práticas, com simulações e discussão da prática à beira do leito. O conhecimento desses fatores é importante para esclarecimento dos profissionais que lidam com esses pacientes gravemente enfermos e suas famílias. Alguns desses fatores podem ser potencialmente evitados, diminuindo a incidência de PAV e sua letalidade. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS A pneumonia é a segunda infecção nosocomial em termos gerais e a infecção mais comum em unidades de terapia intensiva. Através dos resultados apresentados pôde-se observar que a maioria dos pacientes internados nas UTIs estava em ventilação mecânica, apresentando-se clinicamente mais graves e com tempo de internação superior aos pacientes não ventilados e que apesar da grande importância da pneumonia no âmbito hospitalar, o diagnóstico etiológico correto apresenta muitas dificuldades, principalmente nas pneumonias relacionadas ao uso do ventilador (PAV). A ventilação não-invasiva com pressão positiva tem uma série de vantagens em relação à ventilação invasiva: é de fácil aplicação e remoção, preserva as vias aéreas superiores, garante maior conforto ao paciente, evita o trabalho resistivo do tubo traqueal e as complicações da própria intubação, como traumatismos de vias aéreas superiores e/ou pneumonia nosocomial. Nos pacientes intubados, a incidência desta infecção é de 7 a 21 vezes maior do que aqueles que não necessitam do ventilador. Sendo assim é coerente afirmar que pacientes intubados e criticamente doentes, têm um risco particularmente elevado de desenvolver PAV. Já a prática da traqueostomia precoce reduz significativamente o tempo de ventilação artificial e permanência na UTI e há uma menor taxa de mortalidade. Necessita-se de maiores investimentos em programas educacionais, através do envolvimento da equipe de saúde na busca incessante por uma assistência mais humanizada e de melhor qualidade ao paciente crítico, diminuindo os fatores extrínsicos de exposição à infecção e conseqüentemente reduzindo a PAV nas UTIs. REFERÊNCIAS ALCÂNTARA, L.R.; BERQUÓ, L.S. Pneumonia Associada à Ventilação Mecânica: Critério do National Nosocomial Infection Surveillance System (NNISS) e Diagnóstico Médico. Revista Nursing, V 88. Nº. 8. Setembro 2005. BARACAT, E. C.; MARTINS, H. S.; VELASCO, I. T. Atualização em Emergências Médicas. 1ª edição. São Paulo: Manole, 2009. BERALDO, C.C.; ANDRADE, D. 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