tribunal de justiça

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VIGÉSIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006417-10.2009.8.19.0208
RELATOR: DES. MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES
APELANTE: MARLUCIA BARBOSA DE ANDRADE E OUTROS
APELADO: GAMEM - Grupo de Assistência Médica
APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZATÓRIA. SERVIÇOS
MÉDICOS. CLÍNICA DE ASSISTENCIA MÉDICA
NEFROLOGICA. CONTAMINAÇÃO POR VIRUS DA
AIDS. FALHA NÃO DEMONSTRADA. VÍCIO DE
INFORMAÇÃO EM RELAÇÃO AO PACIENTE
E
FAMILIARES. DANO MORAL.
1. Pretendem os autores indenização por dano moral
advindo da falha no serviço da ré que levou a contaminação
de paciente pelo vírus HIV quando realizava sessões de
hemodiálise nas dependências da ré.
2. A conclusão simples e lógica dos autores ante a
contaminação no decorrer do período em que o autor se
tratava na clínica ré não leva em conta fato que o autor
originário omite em sua inicial de que, no decorrer de seu
tratamento junto à ré, viera a ser internado no hospital Rocha
Faria tendo recebido transfusão de 4 bolsas de sangue
fornecido pelo Instituto de Hematologia do Hemorio. Diante
de tais circunstâncias, o laudo pericial produzido nos autos
se mostra inconclusivo acerca da contaminação ter se dado
nas dependências da ré ou em decorrência do material
transfundido no Hospital Rocha Faria.
4. O reaproveitamento dos chamados filtros dialisadores no
tratamento de pacientes com insuficiência renal não é vedada
pela Resolução da Diretoria Colegiada da ANVISA de n.
154/2004 obviamente impondo cautelas que visem a assepsia
correta do material e sua utilização por um único paciente,
fato que a ré alega ser de praxe e que foram verificadas pelo
perito in locum.
5. Ainda que reconhecido para ré o reaproveitamento do
filtro dialisador utilizado pelo autor, paciente soropositivo,
violando assim normas da Anvisa, circunstância esta que se
deduz advindo do desconhecimento da ré de tal condição,
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MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES:000009673 Assinado em 29/01/2015 19:39:57
Local: GAB. DES MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES
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não se mostra hábil a mesma a ensejar o contágio se somente
o paciente usa aquele material. Por uma lógica simples, se a
ré demonstra que cada paciente tem separado
individualmente em gavetas o seu filtro dialisador somente a
troca entre pacientes poderia ocasionar o contágio e isto não
foi demonstrado na demanda.
6. Confrontadas as possibilidades de contágio na hipótese,
vê-se que o expert reafirma a excelência do serviço prestado
pelo Hemorio porém reconhece casos conhecidos de
contaminação de pacientes que receberam material da
renomada instituição; ao revés, dadas as cautelas na
prestação do serviço realizada pela ré ante a imposição das
normas que regem tal atividade, não foram noticiados casos
de contaminação advinda de tratamento de hemodiálise pelo
que tal hipótese é considerada pelo perito como improvável.
7. Acerca do vício de informação, a tentativa da ré de impor
ao laboratório conveniado à empresa a responsabilidade pela
ausência informação do exame anual que deveria ter sido
feito não prospera dada a responsabilidade objetiva e
solidária que volta a ambas as empresas, ora advinda da
relação de consumo que se vislumbra na hipótese, nos
termos do § único do art. 7º do C.D.C., integrando ambas a
mesma cadeia de consumo bem como em razão do que
dispõe o art. 18 do citado diploma legal.
8. Evidente que a ausência de tal informação, dado o
delicado quadro de saúde do autor originário, representava
risco de agravamento de seu estado por complicações
advindas da grave doença a que fora exposto, violando
assim o art. 6 inciso III do CDC, ensejando o dano moral que
reclama a reparação em bases justas e adequadas às
circunstâncias do caso eis que excessivo o valor pleiteado
pelo autor.
9. Recurso parcialmente provido
Vistos, relatados e examinados os autos da Apelação Cível
nº. 0006417-10.2009.8.19.0208, em que figuram como apelante
MARLUCIA BARBOSA DE ANDRADE E OUTROS sendo apelada
GAMEM - Grupo de Assistência Médica.
ACORDAM
os
Desembargadores
que
compõem
a
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Vigésima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio
de Janeiro em DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso apresentado,
nos termos do voto do relator, por unanimidade.
Trata-se de ação indenizatória onde alegam autores,
herdeiros do autor originário habilitados na demanda, ora apelantes, em
síntese, que o autor originário adquiriu o vírus HIV em procedimentos
de hemodiálise que realizava na clínica ré, visto ser paciente de doença
renal crônica; que realizou o tratamento de março/abril de 2007 a agosto
de 2008, tendo realizado exames de sangue prévios, nos quais não foram
constatadas anormalidades nem a presença de qualquer outra doença
inclusive o Vírus HIV; que ao ser transferido para tratamento em outra
clínica mais perto de sua residência foi detectada a presença do vírus em
exame de admissão do paciente, pelo que requereu ao final a procedência
do pedido com a condenação da ré a indenização por dano moral visto a
perda de objeto dos demais pedido com o falecimento do autor
originário.
A sentença proferida às e-fls. 521/523 julgou
improcedentes os pedidos autorais por entender que não há como se
afirmar que o contágio ocorreu por prática irregular pelos prepostos da
ré; que a reutilização de dialisadores é permitida nos moldes
estabelecidos pela legislação; que o laudo informa não ser possível
verificar onde e quando o autor foi contaminado, vendo-se que o autor já
havia sido hospitalizado em abril/2007 e recebido sangue transfundido
com possibilidade de contágio.
Apelaram os autores apresentando suas razões às e-fls.
525/540 onde alega, em síntese, que a causa de pedir não dizia respeito
somente ao contágio mas também a ausência de informação quanto ao
mesmo eis que o autor realizou exame periódico antes de mudar o local
de tratamento e tal resultado, omitido do paciente e sua família, já
acusava a doença; se a empresa contratou laboratório para realizar os
exames, caberia a ela fiscalizar a prestação deste serviço assim como
cobrar resultados, providenciando outro local em caso de omissão; que a
empresa não impugna o fato de ter se omitido no tocante as informações
que deveria prestar ao autor a a sua família; que a empresa não
demonstra excludente de sua responsabilidade; que a ré confessa a
reutilização do filtro dialisador, o que é vedado pela resolução da
Diretoria Colegiada da Anvisa 154 de 15/07/2004 ademais em pessoas
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soropositivas; que a ré informa o uso de dialisadores individuais,
guardados em gavetas; que tal se mostra irregular pois os dialisadores
deveriam ser descartados; que descabida a alegação da ré acerca do
desconhecimento da contaminação ou janela imunológica, pois o
resultado do exame periódico não foi divulgado; que o laudo pericial não
descarta a possibilidade de contaminação pelo vírus HIV em sessões de
hemodiálise, esperando ao final o provimento do apelo com a reforma
integral da sentença recorrida.
Contrarrazões apresentadas às e-fls. 543/555.
É O RELATÓRIO. DECIDO :
Pretendem os autores indenização por dano moral
advindo da falha no serviço da ré que levou a contaminação de paciente
pelo vírus HIV quando realizava sessões de hemodiálise
nas
dependências da ré.
Dois pontos principais norteiam a presente demanda - a
verificação da responsabilidade da ré no contágio do autor pelo vírus
HIV e a violação ao dever de informação advindo da omissão da empresa
ré no repasse de informações contidas em exame de sangue anualmente
realizado pelo paciente.
A tese autoral da responsabilidade da empresa pelo
contágio baseia-se no fato do autor ter sido diagnosticado com o vírus
HIV por ocasião da realização de exame admissional junto à clínica que
sucedeu à ré no tratamento realizado pelo autor. Confrontado com o
resultado do exame admissional junto à ré que dera resultado negativo
para o vírus concluíram os autores que a contaminação se dera por
ocasião de seu tratamento, nas sessões que eram realizadas várias vezes
por semana na clínica ré.
A conclusão simples e lógica, dado o quadro de saúde do
autor e o tratamento realizado junto à ré de 18/04/2007 a agosto/2008
esbarra, entretanto, em circunstância que o autor omite em sua inicial e
que possui grande relevância no deslinde da questão - o autor, com grave
crise de ulcera gástrica no decorrer de seu tratamento junto à ré, em
14/11/2007,
vem a ser internado no hospital Rocha Faria e recebe
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transfusão de 4 bolsas de sangue fornecido pelo Instituto de Hematologia
do Hemorio, recebendo alta em 20/11/2007.
Diante de tais circunstâncias, o laudo pericial produzido
nos autos em e-fls. 385/391 se mostra inconclusivo acerca da
contaminação ter se dado nas dependências da ré ou em decorrência do
material transfundido no Hospital Rocha Faria (e-fls. 389 quesito 15 do
autor).
A míngua de exames eficazes que detectassem naquele
hospital público a contaminação do
paciente, imputar a ré a
responsabilidade pelo contágio seria especular com base em fatos não
demonstrados e que o autor insiste em imputar à ré - em especial a troca
de filtros dialisadores entre pacientes.
O reaproveitamento dos chamados filtros dialisadores no
tratamento de pacientes com insuficiência renal não é vedada pela
Resolução da Diretoria Colegiada da ANVISA de n. 154/2004 obviamente
impondo cautelas que visem a assepsia correta do material e sua
utilização por um único paciente, fato que a ré alega ser de praxe e que
foram verificadas pelo perito in locum.
Obviamente que, visando dar mais segurança aos
pacientes das instituições que realizam o tratamento de hemodiálise, a
dita resolução veda a reutilização dos filtros dialisadores e linhas arteriais
e venosas em pacientes soropositivos, falha que a ré reconhece ter
cometido em relação ao autor supostamente por desconhecer sua
condição de soropositivo eis que o perito narra em seu laudo ter
observado na clínica o procedimento padrão de utilização de filtros novos
em pacientes com esta condição.
É de se concluir pelo desconhecimento da empresa da
condição do autor de soropositivo em vista dos argumentos que
apresenta na tentativa de denunciar à lide o laboratório que realizava os
exames anuais dos pacientes sustentando sua responsabilidade por não
lhe terem sido passadas informações acerca do exame anual realizado
pelo autor.
Tal falha (o reaproveitamento do filtro dialisador do
paciente soropositivo), entretanto, não se mostra hábil a ensejar o
contágio se somente o paciente usa aquele material. Por uma lógica
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simples, se a ré demonstra que cada paciente tem separado
individualmente em gavetas o seu filtro dialisador (e-fls. 139) somente a
troca entre pacientes poderia ocasionar o contágio e isto não é
demonstrado na demanda.
Não há como se imputar à ré uma responsabilização por
fato de tal gravidade com base em informações não demonstradas que
os familiares do autor alegam ter ouvido na clinica por parte de
funcionários de que os filtros eram trocados entre os pacientes
considerando que até mesmo o local de tratamento e horários dos
pacientes soropositivos eram diferenciados dos demais pacientes (vide efls. 385/386 item II - Visita na Clínica Gamen).
Confrontadas as possibilidades de contágio na hipótese,
vê-se que o expert reafirma a excelência do serviço prestado pelo Hemorio
porém a impossibilidade de detecção da contaminação em material
colhido de doadores com contaminação recente levou a casos conhecidos
de contaminação de pacientes que receberam material da renomada
instituição; ao revés, dadas as cautelas na prestação do serviço realizada
pela ré ante a imposição das normas que regem tal atividade, não foram
noticiados casos de contaminação advinda de tratamento de hemodiálise
pelo que tal hipótese é considerada pelo perito como improvável.
Restando, portanto, pouco provável que a contaminação
tenha se dado por falha da ré, neste ponto a responsabilização pretendida
não prospera, restando unicamente a questão acerca do vício de
informação.
A tentativa da ré de impor ao laboratório conveniado à
empresa a responsabilidade pela ausência informação do exame anual
que deveria ter sido feito não prospera dada a responsabilidade objetiva e
solidária que volta a ambas as empresas, ora advinda da relação de
consumo que se vislumbra na hipótese, nos termos do § único do art. 7º
do C.D.C., integrando ambas a mesma cadeia de consumo bem como em
razão do que dispõe o art. 18 do citado diploma legal.
Evidente que a ausência de tal informação, dado o
delicado quadro de saúde do autor originário, representava risco de
agravamento de seu estado por complicações advindas da grave doença
a que fora exposto, violando assim o art. 6 inciso III do CDC, ensejando o
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dano moral que reclama a reparação em bases justas e adequadas às
circunstâncias do caso.
Vista a capacidade econômica das partes, o objetivo
compensatório ao que se acresce um componente pedagógico-punitivo
que objetiva impulsionar a ré a melhoria de seus serviços, diante das
circunstâncias do caso concreto - eis que ausente demonstração efetiva de
que óbito do autor originário tenha advindo de circunstância
exclusivamente relacionada ao contágio em si, excessivo o valor
indenizatório pleiteado pelo que justo e adequado ao caso o valor de
R$20.000,00 (vinte mil reais), a ser corrigido desde a presente data nos
termos da sumula 97 deste Tribunal e com juros legais desde a citação
diante da responsabilidade de natureza contratual nos termos do art. 405
do CC/2002, ambos até a data do efetivo pagamento.
Diante do que orienta o verbete da súmula 105 deste
Tribunal, vista a perda de objeto dos demais pedidos apresentados na
inicial com o falecimento do autor originário no curso da demanda, deve
a ré arcar com as despesas processuais e honorários advocatícios no
percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação.
Assim, voto no sentido de DAR PARCIAL PROVIMENTO
ao recurso apresentado reformar a sentença recorrida e condenar a ré a
pagar ao autor o valor de R$20.000,00 (vinte mil reais) a título de
indenização por dano moral, a ser corrigido desde a presente data e com
juros legais desde a citação, ambos até a data do efetivo pagamento.
Rio de Janeiro,
MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES
DESEMBARGADOR RELATOR
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