Artigo de Revisão Variabilidade da frequência cardíaca e controle

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Arq Sanny Pesq Saúde 1(1):72-82, 2008
Artigo de Revisão
Variabilidade da frequência cardíaca e controle metabólico.
Lucieli Teresa Cambri1, Lenise Fronchetti2, Fernando Roberto De-Oliveira3, Monique da Silva Gevaerd4
1. Doutoranda em Ciências da Motricidade – UNESP – Rio Claro, SP
2. Mestre em Ciências do Movimento Humano – UDESC – Florianópolis, SC.
3. Prof. Dr. Departamento de Educação Física - Universidade Federal de Lavras, MG.
4. Profª Drª Lab. de Análises Multisetorial - Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, SC.
Resumo
O objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão sobre a variabilidade da frequência cardíaca (VFC),
controle metabólico e limiar de variabilidade da frequência cardíaca. Para a busca dos artigos foram
consultadas as bases de dados PUBMED e LILACS utilizando os termos: autonomic nervous system, risk
factors, heart rate, heart rate variability, physical exercise. Foram selecionados 37 artigos entre os anos de
1982 e 2007, dando-se prioridade aos artigos originais mais recentes. Os dados desta revisão nos permitem
concluir que, a VFC em repouso é influenciada por diversos fatores de riscos cardiovasculares e com isso, a
avaliação destas variáveis em conjunto (morfológicas e bioquímicas e regulação autonômica cardíaca)
possibilita um melhor conhecimento do quadro clínico do indivíduo. Entretanto, no que se refere à VFC em
indivíduos sedentários e/ou com patologias, o enfoque é dado à VFC em repouso. Quanto a VFC em
exercício, a mesma está associada aos indicadores de aptidão aeróbia, podendo ser utilizada como
parâmetro fisiológico para prescrição de exercícios.
Palavras chaves: sistema nervoso autônomo, fatores de risco, frequência cardíaca, exercício físico.
Abstract
This paper presents a review about the relationship between heart rate variability (HRV) variables and
metabolic control. The literature search was based on PUBMED and LILACS databases, using the keywords:
autonomic nervous system, risk factors, heart rate, heart rate variability, physical exercise. Thirty-seven
articles were selected giving priority to the most recent and original between the years 1982 e 2007. The
data of this review shown that VFC in rest is influenced by several factors of risks cardiac, thus, the
evaluation this variable allows a better understanding of the individual clinical situation. In sedentary
and/or pathological people, the emphasis is the study of the HRV in rest. In exercise, the HRV is associated
with the aerobic fitness and can be used as a physiological parameter for exercise prescription.
Key Words: autonomic nervous system, risk factors, heart rate, physical exercise.
Cambri et al., Frequência cardíaca e controle metabólico.
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INTRODUÇÃO
A duração do ciclo cardíaco, medida pelo
tempo transcorrido entre duas ondas R
consecutivas do eletrocardiograma (intervalo RR), não é constante, ocasionando uma variação
entre os intervalos R-R sucessivos, denominada
de variabilidade da frequência cardíaca (VFC)1.
Durante o ritmo sinusal normal, o valor da
frequência cardíaca (FC) resulta da influência
dinâmica de vários mecanismos fisiológicos que a
regulam instantaneamente. Neste curto período
de tempo entre batimentos, a FC é controlada
pela atividade simpática e parassimpática. O
exame da flutuação da FC é uma janela para a
observação da integridade do sistema nervoso
autônomo (SNA). Quanto maior a variabilidade
temporal dos intervalos entre batimentos
consecutivos
(R-R),
maior
a
atividade
parassimpática2-4. Com isso, pela facilidade de
mensuração, o comportamento da FC tem sido
amplamente estudado em diferentes condições
associadas ao repouso e ao exercício5.
Os fatores de riscos cardiovasculares
como, excesso de massa de gordura corporal,
hiperglicemia, hipersinsulinemia, pressão arterial
e dislipidemias estão fortemente associados com
a redução da VFC6-12. Uma redução do tônus
vagal cardíaco e, por conseguinte, da VFC,
independentemente
do
protocolo
de
mensuração, está associada à disfunção
autonômica
cardíaca,
doenças
crônicodegenerativas, arritmias letais, eventos cardíacos
isquêmicos em indivíduos normais, e representa,
dessa forma, um importante indicador do estado
de saúde e fator prognóstico e influenciador
independente
da
morbi-mortalidade
cardiovascular1,5,13. Com isso, a baixa VFC é um
independente fator preditor de mortalidade para
diversas populações1,14. A partir disto, verifica-se
que o equilíbrio entre a atividade simpática e
parassimpática exercidas sobre o coração
apresenta grande significado em diversas
condições clínicas e funcionais, e pode ser
determinante
de
manifestações
cardiovasculares13,15, o que justifica a avaliação
clínica da função autonômica cardíaca. Outra
finalidade é avaliar os benefícios obtidos com um
determinado procedimento, como o treinamento
físico, uma vez que o aumento da atividade vagal
está relacionado a uma melhor aptidão física15.
Vários estudos têm mostrado a relação da VFC
com alguns índices de aptidão aeróbia15-19, assim
como, sua sensibilidade a efeitos de
treinamento20,21.
Dentro deste contexto, o objetivo deste
artigo é fazer uma revisão sobre a relação entre
variáveis derivadas da medida da VFC em
repouso, exercício e controle metabólico. A busca
dos artigos foi realizada através das bases de
dados PUBMED e LILACS utilizando os seguintes
termos: autonomic nervous system, risk factors,
heart rate, heart rate variability, physical
exercise. Foram selecionados os artigos entre os
anos de 1982 e 2007, priorizando-se os artigos
originais mais recentes. Em algumas situações,
utilizou-se a lista de referências bibliográficas dos
artigos escolhidos. A seleção inicial foi realizada a
partir dos títulos e resumos encontrados, sendo
selecionados os artigos que atendiam ao objetivo
do estudo, associando os temas: modulação
autonômica cardíaca, variabilidade da frequência
cardíaca, controle metabólico e limiar de
variabilidade da frequência cardíaca. A partir
destes critérios, foram selecionados 36 artigos
para a elaboração da presente revisão.
Análise da Variabilidade da Frequência Cardíaca
A liberação da acetilcolina pelos terminais
parassimpáticos exerce sua influência na
despolarização do nodo sinoatrial e, por
apresentar uma velocidade de remoção muito
rápida, provoca oscilações na duração dos
intervalos R-R, acarretando variações rítmicas na
FC. Inversamente, a noradrenalina, liberada pelos
terminais simpáticos, possui uma velocidade de
remoção lenta, ocasionando uma variação rítmica
na FC, que pode ser observada somente em
registros de longo prazo. Desta forma, a VFC é
determinada pela integração entre a modulação
rápida e a lenta. Contudo, essas variações na FC
são atribuídas, principalmente, às oscilações da
atividade parassimpática e, portanto, a amplitude
da VFC reflete a atividade vagal sobre o
coração2,3,17.
A mensuração da VFC é um método que
nos permite analisar o controle neural cardíaco
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durante períodos curtos ou prolongados, em
diversas condições fisiológicas (durante o sono,
monitoramento de 24 horas, repouso, exercício
físico
e
bloqueio
farmacológico)
e
patológicas1,3,11,14,22-24. Este tipo de análise teve
grande impulso após o estabelecimento da forte
e independente relação entre VFC e mortalidade
pós-infarto agudo do miocárdio1, tendo a
vantagem de possibilitar uma avaliação não
invasiva e seletiva da função autonômica, além
de ser um recurso metodológico de grande
simplicidade e fácil aplicação17. Igualmente,
mediante a análise da curva de VFC durante o
exercício físico é possível identificar um ponto de
transição (primeiro limiar de transição fisiológica)
associado à intensidade de esforço e à FC na qual
a influência da atividade parassimpática é
reduzida (retirada vagal), denominado de limiar
de variabilidade da frequência cardíaca - LiVFC, o
qual foi associado aos limiares de lactato17 e
ventilatório18,23,25.
A VFC pode ser avaliada por dois
métodos: pelo cálculo de índices baseado em
operações estatísticas dos intervalos R-R
(domínio do tempo) e pela análise espectral de
intervalos R-R ordenados (domínio da
frequência). As análises podem ser realizadas em
segmentos curtos - 0,5 a 5 minutos - ou em
gravações de eletrocardiograma de 24 horas26.
O Task Force2 considera as medidas no
domínio do tempo como o método mais simples
para analisar a VFC, por meio do qual são obtidos
índices de um registro contínuo de
eletrocardiograma, determinando-se a dispersão
da duração dos intervalos entre os batimentos.
Os diversos índices recomendados para
mensuração da VFC no domínio do tempo podem
ser derivados de cálculos aritméticos, estatísticos
ou geométricos (histograma R-R). Os métodos
estatísticos podem derivar direto dos intervalos
R-R, ou da FC instantânea(s). Os métodos
geométricos convertem uma série de intervalos
R-R em um gráfico para posterior cálculo da
distribuição da densidade de sinais.
As medidas do domínio da frequência são
derivadas da análise do espectro de potência que
apresenta a distribuição da densidade em função
da frequência2. Esta análise decompõe a FC em
seus componentes causadores, apresentando-os
de acordo com a frequência com que alteram a
FC. E, além da quantidade de variabilidade, podese também mostrar as bandas de frequência das
oscilações do ritmo cardíaco1.
Para o cálculo da densidade espectral
podem ser utilizados os métodos de
transformação rápida de Fourrier ou modelo
auto-regressivo. Ambos delimitam 4 faixas de
frequência distintas: 1) alta frequência (0,15 a
0,40 Hz), modulada pelo Sistema Nervoso
Parassimpático (SNP) e gerada pela respiração; 2)
baixa frequência (0,04 a 0,15 Hz) modulada pelo
SNP e Sistema Nervoso Simpático (SNP). Esta
frequência tem sido relacionada ao sistema
barorreceptor e termorregulador, à atividade
vasomotora e ao sistema renina-angiotensina; 3)
muito baixa frequência (0,01 a 0,04 Hz),
considerada um marcador da atividade simpática,
e 4) ultra baixa frequência (10-5 a10-2 Hz), que
não apresenta uma correspondência fisiológica
clara1.
Os componentes de alta e baixa
frequência são assim chamados devido ao fato do
nervo vago e o sistema simpático enviarem,
respectivamente, uma maior ou menor
frequência de impulsos sobre o nodo sinusal27.
Os componentes de baixa e alta
frequência são mensurados em unidades
absolutas de potência (ms2) ou podem ser
expressos em valores relativos à potência total
subtraindo-se o componente de muito baixa
frequência
(unidades
normalizadas,
alta
frequência %, e baixa frequência %). A relação
entre a potência de baixa para a de alta
frequência (baixa frequência/alta frequência)
pode ser considerada uma medida de equilíbrio
simpatovagal. O estudo dos componentes de
muito baixa frequência e ultra baixa frequência
requer metodologias específicas e períodos
longos e ininterruptos de registros dos dados 28.
As medidas de VFC no domínio do tempo
e da frequência são somente métodos distintos
de avaliar o mesmo fenômeno, tornando-se
possível evidenciar uma correlação entre alguns
índices dos dois domínios1.
A análise da VFC durante exercício
apresenta certa dificuldade, uma vez que
inúmeros fatores influenciam nos seus
resultados, entre estes, aumento da atividade
respiratória e do estado não estacionário do
organismo28. Durante o exercício físico, os
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intervalos R-R numa série temporal tendem a
diminuir devido ao aumento da FC, acarretando
um estado não estacionário, o que causa uma
interferência nos dados calculados por meio da
análise espectral e métodos tradicionais
realizados no domínio do tempo25. É
imprescindível realizar uma interpretação da VFC
que remova a tendência ao aumento da FC. A VFC
no domínio do tempo pode ser calculada pela
plotagem de Poincaré, que é um método não
linear de análise da VFC baseado no registro das
durações de uma série de batimentos cardíacos
sucessivos, medidas pelos intervalos R-R. A partir
desse registro, associam-se graficamente cada
intervalo R-R com o intervalo anterior. Em
indivíduos saudáveis, em repouso, esses
intervalos são bastante irregulares, sobretudo
pela predominância vagal na modulação cardíaca,
fazendo com que se visualize uma nuvem de
pontos com a forma aproximada de uma elipse –
figura 1 16-17. O eixo longitudinal da elipse - desvio
padrão a (SD2) - expressa a tendência do
conjunto de intervalos R-R analisados em médio e
longo prazo. O eixo transverso da elipse - desvio
padrão b (SD1) - representa a variabilidade
instantânea dos intervalos R-R.17,25.
Os monitores de FC Polar® modelo
Vantage NV e S810i permitem o cálculo da VFC,
empregando a plotagem de Poincaré17, o qual é
uma estratégia que permite calcular as alterações
dinâmicas do coração, mesmo com a tendência
da elevação da FC25. Há evidências de que o
índice SD1 quantifica a modulação vagal da FC,
sem influência de tendências não estacionárias,
pois o mesmo reduziu progressivamente durante
o exercício físico mediante doses progressivas de
atropina
bloqueador
farmacológico
25
parassimpático .
Figura 1. Representação da Plotagem de Poincaré pelo Programa HRV Analysis
A maioria dos trabalhos com indivíduos
sedentários e/ou com patologias analisa a VFC
apenas em repouso4,11,22, tendo poucas
informações sobre o comportamento desta
variável durante exercício.
Variabilidade da Frequência Cardíaca e Controle
Metabólico
Fatores de riscos cardiovasculares como
excesso da massa e de gordura corporal,
hiperglicemia, hipersinsulinemia, elevação nos
níveis de colesterol total, triglicerídeos,
lipoproteínas de baixa densidade (LDL), pressão
arterial sistólica e diastólica, assim como redução
nos níveis de lipoproteínas de alta densidade
(HDL) são associados com a redução da VFC,
sobretudo em obesos e indivíduos diabéticos6-12.
Neste contexto, a VFC em repouso é uma das
medidas comumente utilizadas para estabelecer
estas relações9-12 e o treinamento físico, ao
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modificar estas variáveis, pode intervir na
melhora da regulação autonômica com
consequente aumento da VFC22.
Pacientes diabéticos comumente apresentam
comprometimento silencioso de ambos os ramos
do SNA, devido à degeneração neurológica que
afeta as pequenas fibras do SNC e SNP, conhecido
como neuropatia autonômica, que pode ser
caracterizada pela redução da VFC, e é causa
frequente de morbi-mortalidade cardiovascular
nestes indivíduos11,22,24,29,30.
Diabéticos apresentam mais casos de morte
súbita após infarto do miocárdio comparado aos
não diabéticos, e a neuropatia autonômica pode
ser a responsável24. Com isso, a detecção precoce
da disfunção autonômica nestes indivíduos é
importante para estratificar o risco e
posteriormente intervir farmacologicamente e no
estilo de vida11.
A VFC está associada à glicemia de jejum,
sendo que diabéticos e indivíduos com glicemia
alterada apresentam componente parassimpático
reduzido9. Isto foi confirmado com o trabalho de
Schroeder et al11, que observaram uma
correlação inversa entre glicemia de jejum e VFC
nos sujeitos não diabéticos. Indivíduos diabéticos
e sujeitos com hiperinsulinemia apresentaram
menor VFC do que não diabéticos e os sujeitos
sem hiperinsulinemia, respectivamente11.
A atividade parassimpática tende a se
associar negativamente com o índice de massa e
A
baixa
atividade
gordura
corporal8.
parassimpática é um fator de risco independente
para doença arterial coronariana, assim como é
um fator predisponente para arritmia e morte
súbita em obesos. Além disso, o tônus
parassimpático aumenta com a redução de massa
corporal em mulheres obesas10.
Indivíduos hipertensos tendem a ter
menor VFC e maior FC de repouso que
normotensos6-7; sendo que normotensos com
VFC reduzida tendem a apresentar maior risco de
desenvolver hipertensão7.
Há evidências de que a menopausa reduz
a atividade simpato-vagal devido ao aumento da
gordura corporal, pressão arterial e perfil
lipídico12. Estas alterações frequentes na
menopausa fazem com que as mulheres
apresentem risco aumentado, ficando similar ao
observado em homens para o acometimento de
doenças cardiovasculares. Neste caso, não são
encontradas diferenças entre gêneros na
atividade simpato-vagal quando observada pela
VFC, diferentemente de adultos jovens, fase em
que as mulheres apresentam maior atividade
vagal que os homens31.
A
contribuição
dos
diferentes
componentes da síndrome metabólica (diabetes
mellitus, hipertensão e dislipidemia) na etiologia
de VFC é complexa. Liao et al.29 verificaram
associações negativas entre os níveis de insulina
em jejum e VFC, o que sugere que a resistência à
insulina pode explicar parcialmente a reduzida
VFC nos indivíduos com múltiplas desordens.
Igualmente, os autores observaram redução
significativa da VFC com o aumento do número
de desordens associadas. A presença de
hipertensão ou diabetes mellitus isolados foi
associada com um decréscimo na VFC, ao
contrário da dislipidemia que não apresentou
associação isolada. Quanto à combinação das
desordens, a VFC foi inversamente associada com
a combinação diabetes mellitus com hipertensão
e diabetes mellitus com dislipidemia; ao contrário
da combinação hipertensão e dislipidemia.
Relativo aos programas de exercícios
físicos, a literatura apresenta evidências de que o
treinamento físico pode amenizar a neuropatia
cardiovascular autonômica. Em Diabéticos com
diferentes graus de neuropatia, submetidos a 12
semanas de exercícios durante 30 minutos a 65%
FCmáx de reserva, a VFC aumentou nos indivíduos
sem
neuropatia
ou
com
neuropatia
cardiovascular autonômica branda, ao contrário
dos sujeitos com neuropatia severa22
A partir dos itens apresentados, observase que a VFC em repouso é influenciada por
diversos fatores de riscos cardiovasculares. No
entanto, em relação à VFC em sedentários e/ou
com patologias, os estudos abordam unicamente
VFC em repouso, não tendo nenhum indicativo
do comportamento desta variável em exercício.
Desta forma, um maior número de trabalhos com
estes objetivos são necessários, sobretudo,
envolvendo grupos com características mais
heterogêneas quanto ao controle metabólico e a
aptidão aeróbia. Outro ponto a ser abordado é
verificar o efeito do treinamento sobre a VFC e a
FC em repouso.
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Variabilidade da Frequência Cardíaca durante os
Exercícios Físicos
Inúmeros estudos têm demonstrado que
durante o exercício progressivo ocorre uma
redução da atividade do SNP e um aumento do
SNS que controlam a FC17,20,23,25. Durante teste
progressivo, a VFC diminui progressivamente até
cerca de 50% da carga máxima; a partir desse
ponto, tende a se estabilizar17. Esse
comportamento foi constatado em outros
que
utilizaram
diferentes
trabalhos23,25
protocolos de testes e métodos de identificação
da VFC. Essa tendência de comportamento
ocorre, possivelmente, devido à redução da VFC
durante o esforço físico estar continuamente
integrada ao mesmo fenômeno, ou seja, a
retirada da influência vagal sobre o nodo
sinoatrial. O controle da FC durante o exercício é
realizado pela combinação de três distintos
mecanismos fisiológicos: o mecanismo intrínseco
do coração, os fatores humorais e o SNA25.
Recentemente, foi mostrada a associação
da VFC com alguns indicadores de aptidão
aeróbia15-19,27, além da sua sensibilidade a efeitos
de treinamento em diferentes níveis de
intensidade20-21. Foi apresentada a possibilidade
de identificação de um ponto de transição da
regulação autonômica, denominado LiVFC. Esta
intensidade foi identificada em bicicleta e em
esteira, com a possibilidade de identificação do
fenômeno a partir de diversos métodos. O LiVFC
foi considerado um demarcador da retirada da
dominância parassimpática cardíaca para a
acentuação simpática16,17,19,23,25,27.
Alonso et al.23 constataram que embora a
VFC diminua desde os instantes iniciais do
exercício, essa redução só atinge níveis
expressivos a partir de 60% do VO2 pico (de 4560% da cargamáx e do limiar anaeróbio) e, a partir
desses pontos, a VFC apresenta uma
estabilização. A FC aumentou progressivamente
até o pico do exercício, enquanto a VFC reduziu
até o limiar de lactato, a partir do qual, mantevese inalterada até o final do teste, o que
demonstra que a diminuição da VFC ocorre
durante a fase do exercício em que predomina o
metabolismo aeróbio e é dependente, em grande
parte, da retirada vagal, ao passo que nos
estágios subsequentes a elevação da FC se deve a
intensificação da atividade simpática.
Vale salientar que as respostas da FC
durante o exercício físico são influenciadas por
diversos fatores, incluindo idade, tipo de
exercício, posição do corpo, condicionamento
físico, volume sanguíneo, meio ambiente e ritmo
circadiano3.
O treinamento aumenta o delta entre a
FC do final do exercício e a FC dos instantes
iniciais no período de recuperação, sendo que,
uma VFC reduzida após um exercício máximo e a
volta a calma é um indicador de disfunção
cardíaca, demonstrando um risco relativo
aumentado para mortalidade cardiovascular5.
Em relação às respostas ao treinamento
aeróbio, Catai et al.32 observaram bradicardia
induzida ao treinamento, atribuindo tal evento às
alterações intrínsecas no nodo sinusal, uma vez
que não houve incrementos nos componentes de
alta frequência nem a decréscimos nos
componentes de baixa frequência. Em
contrapartida, Carter, Banister & Blaber33, ao
analisarem a VFC em grupos de diferentes idades
e gênero, após 12 semanas de treinamento
aeróbio, verificaram redução da FC em repouso,
bem como durante exercício submáximo,
associada a um aumento da VFC em repouso em
todos os grupos. Sendo evidenciado que os
indivíduos mais jovens têm maior potencial de
adaptação autonômica ao treinamento. Da
mesma forma, as mulheres apresentam uma
regulação parassimpática superior no controle da
FC, quando comparadas com seus congêneres do
sexo masculino. Entretanto, estas diferenças
tendem a desaparecer com o decorrer da idade33.
Resultados não satisfatórios foram
observados por Loimaala et al.34, que não
encontraram diferenças sobre os índices de VFC
de sedentários após cinco meses de treinamento
aeróbio. O treinamento foi realizado 4-6 vezes
por semana, dividido em: exercícios de baixa
intensidade (FC em 55% VO2máx); exercícios de
alta intensidade (FC em 75% VO2máx) e grupo
controle. Foi observado aumento significativo no
VO2máx e redução na FC de repouso somente no
segundo grupo.
De acordo com Almeida & Araújo5,
indivíduos com elevada condição aeróbia têm
uma FC de repouso e atividade simpática mais
baixa, concomitante à elevada atividade vagal.
Entretanto, esta condição não é necessariamente
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uma consequência direta do treinamento, uma
vez que as características genéticas também
influenciam na FC, pois os limites de aumento do
retorno venoso e do volume sistólico, que geram
a diminuição da FC para manter o débito cardíaco
constante (lei Frank-Starling), também são
determinados geneticamente.
Limiar de Variabilidade da Frequência Cardíaca
Recentemente, a análise da VFC, tem sido
indicada para identificar a intensidade de esforço
onde ocorre o primeiro limiar de transição
fisiológica16-17,19,23,25-27. Isto se deve ao fato de que
a mesma é determinada pelo equilíbrio entre
atividade vagal e simpática do SNA. Como as
variáveis usualmente utilizadas para identificação
de limiares metabólicos – ventilação, lactato, FC são reguladas pelo SNA, esses limiares poderiam
também ser identificados pela VFC 16-17,19,23,25-27.
A análise da VFC permite quantificar a modulação
do SNA na frequência de disparo do nodo
sinoatrial2. Com isso, o LiVFC pode ser
considerado um indicador da capacidade aeróbia
e, assim, ser utilizado como parâmetro fisiológico
para prescrição de exercício.
Na literatura encontra-se três critérios
para determinação do LiVFC: 1) Critério de Lima &
Kiss17: identificado na primeira intensidade de
exercício a apresentar SD1 inferior a 3 ms na
curva de decréscimo da VFC em função da
intensidade; 2) Critério de Tulppo et al.16
considera-o como LiVFC o primeiro estágio no
decréscimo da curva, em que a diferença entre o
SD1 de dois estágios consecutivos é menor que 1
ms e 3) Critério de Regressão Múltipla Linear:
identificado no ponto de intersecção que melhor
divide a curva da VFC em função da velocidade
em dois segmentos, à partir da escolha da
equação que apresenta maior valor de R² e
menor somatória de resíduos (regressão linear
múltipla), sendo adaptado de Orr et al.35.
Estudos utilizando a VFC em testes
progressivos têm evidenciado que a modulação
parassimpática
tende
a
diminuir
progressivamente até 50 a 60% do VO2pico3. Foi
sugerido que a intensidade de esforço
correspondente a redução acentuada da retirada
vagal e ao início da participação mais expressiva
da modulação simpática representa um limiar de
transição fisiológica, em intensidade similar aos
limiares ventilatório 16,19,23,25,27 e de lactato17 e por
isso foi denominado de LiVFC26. A partir destas
constantações, foi sugerida uma relação causal
entre estes limiares20. No modelo proposto, a
partir da ocorrência do LiVFC, a atividade
simpática aumentada modularia a ativação do
metabolismo glicolítico, pela estimulação
adrenérgica da enzima fosforilase muscular,
ocasionando um acúmulo progressivo de lactato
e íons H+ 17 que, por sua vez, acarretaria quebra
da linearidade no aumento da ventilação em
protocolo de exercício progressivo18. Esses
eventos associados demarcam a transição entre
os domínios moderado e intenso de esforço17,
sendo o LiVFC considerado um indicador da
capacidade aeróbia.
A maioria dos protocolos nos quais a VFC
é analisada durante exercício progressivo envolve
cicloergômetro3,15,17-20,23,25,27, com poucos sendo
realizados em esteira36 ou em campo37, com
valores médios de intensidade referente à carga
externa (%carga máxima) no LiVFC de: Lima e
Kiss17 - 49%; Nakamura et al.20 - 46%; Fronchetti15
- 48%; Fronchetti et al.21 - 46-48%
Os achados do estudo de Brunetto et al.19
mostraram que alguns indivíduos apresentaram
LiVFC após o limiar ventilatório, do mesmo modo
que, em outros a resposta foi oposta. O fato
revela que, as relações entre lactato sanguíneo e
ventilação apresentam oscilações para predizer
uma relação direta de causa e efeito. Entretanto,
a literatura apresenta consenso de que estas
respostas fazem parte do mesmo fenômeno30.
Com isso, justifica-se a identificação da transição
fisiológica por diferentes métodos, sendo a
escolha do método mais apropriado vinculada a
aspectos práticos como disponibilidade de
equipamento, especificidade, reprodutibilidade,
acurácia e se a técnica é invasiva17-19.
As vantagens na mensuração da VFC
durante o exercício devem-se ao fato de que a
mesma é determinada pelo equilíbrio entre
atividade vagal e simpática do SNA. A análise da
VFC possibilita quantificar a modulação do SNA
na frequência de disparo do nodo sinoatrial2.
Deste modo, sua mensuração acrescentaria
expressivamente a quantidade de informação
capaz de ser obtida com a medição da FC (em
intervalos R-R) durante o exercício, ressaltando
que a avaliação da FC além de ser um
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procedimento acessível e não invasivo, é
comumente utilizada nas rotinas de avaliação e
treinamento19. Com isso, o LiVFC pode ter grande
aplicabilidade, sendo utilizado como parâmetro
fisiológico para prescrição de exercícios para
pessoas
saudáveis
e/ou
com
doenças
cardíacas17,25, representando o limite inferior
para treinamento aeróbio e sendo considerado
um indicador de capacidade aeróbia17. Deste
modo, o LiVFC representa uma alternativa
simplificada para obter informações sobre o
metabolismo aeróbio durante o exercício.
Segundo Alonso et al.23, o estudo do
LiVFC reveste-se de importante implicação
clínica, sugerindo que a prática de exercícios
físicos em intensidades até o limiar de lactato
parece proporcionar ao praticante maior
segurança em relação aos prováveis riscos
cardiovasculares, visto que, nestas intensidades,
a ação protetora vagal ainda está presente. Da
mesma forma que o LiVFC parece representar a
transição entre intensidades de esforço, com
maior probabilidade de ocorrerem eventos
cardiovasculares, pois intensidades acima da
ausência da modulação vagal na FC, com o
incremento da atividade simpática pode
aumentar o risco de vulnerabilidade cardíaca19,25.
Lima & Kiss17 encontraram o LiVFC a 49%
da carga máxima, com intensidade similar ao
limiar de lactato. Da mesma forma, Brunetto et
al.18 encontraram associação entre o LiVFC e o
limiar ventilatório, com FC média de 143 e 149
bpm, respectivamente. Mais recentemente,
Cottin et al.36 e Cottin et al.37, igualmente,
constataram similaridades entre o LiVFC e o
limiar ventilatório com r= 0,97 em ambas as
investigações.
Em outro estudo, Brunetto et al.19
avaliaram adolescentes, nos quais o LiVFC foi
identificado de acordo com três critérios: Tulppo
et al. 16, Lima e Kiss17 e ocorrência de ambos os
critérios simultaneamente e não verificaram
diferenças significativas entre os mesmos e o
limiar ventilatório.
Fronchetti et al.15 verificaram a relação
entre FC de repouso, índices de VFC e a
intensidade no LiVFC e encontraram associação
negativa entre FC repouso e SD1. Assim como
correlação positiva com a intensidade no LiVFC.
No entanto, não foi observada associação
significativa entre SD1 e FC no limiar. Vale
salientar que os índices que expressam
predominância parassimpática, dentre estes o
SD1, apresentam maior associação com a
intensidade no LiVFC. A partir disto, pode-se
concluir que sujeitos com índices de SD1 elevados
na condição de repouso tendem a alcançar
maiores cargas no que se refere ao LiVFC,
refletindo numa ação mais prolongada da
atividade parassimpática durante exercício
progressivo, e consequentemente tendem a
apresentar uma melhor aptidão aeróbia.
Há evidências de que o LiVFC apresenta
sensibilidade aos efeitos, tanto do treinamento
aeróbio quanto do intervalado, ambos de curto
prazo, uma vez que, a intensidade de esforço no
LiVFC foi superior após três semanas de
treinamento. Presume-se que o treinamento
reduziu a participação simpática, assim como,
ocasionou uma modulação parassimpática mais
duradoura da FC nas intensidades mais baixas do
teste progressivo20,21.
O
condicionamento
físico
está
relacionado à modulação vagal da FC durante o
exercício, independente da idade, evidenciando
que uma boa condição aeróbia apresenta efeitos
benéficos na função autonômica cardiovascular.
Isto suporta o conceito de que a VFC está
fortemente atrelada à aptidão aeróbia, uma vez
que indivíduos com melhor capacidade de
exercício apresentam maior modulação vagal da
FC durante o esforço físico, assim como, a
intensidade na qual a modulação vagal
desaparece é superior, comparada àqueles com
capacidade inferior16.
O estudo da VFC em exercício pode ser
utilizado para verificar a integridade do sistema
autonômico,
assim
como
determinar
intensidades adequadas de treinamento e os
efeitos do mesmo. Uma vez que, devido
influência de alguns fatores de risco
cardiovasculares,
muitos
podem
ter
comprometimento em ambos os ramos do SNA11.
Com isso, a prescrição do exercício físico,
realizada pelo LiVFC, constitui-se numa
alternativa que leva em consideração a avaliação
da integridade do SNA e suas limitações para o
exercício.
Cambri et al., Frequência cardíaca e controle metabólico.
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Arq Sanny Pesq Saúde 1(1): 72-82, 2008
Considerações Finais
A partir dos itens abordados observa-se
que a VFC em repouso é influenciada por diversos
fatores de riscos cardiovasculares. As associações
observadas entre as variáveis morfológicas e
bioquímicas com a regulação autonômica
cardíaca sugerem a importância de se avaliar
estas variáveis em conjunto, o que possibilita um
melhor conhecimento do quadro clínico do
indivíduo. Contudo, quanto a VFC em indivíduos
sedentários e/ou com patologias, os estudos
abordam unicamente VFC em repouso, não tendo
indicativos do comportamento desta variável em
exercício. Com isso, se torna interessante
verificar o efeito do treinamento sobre a VFC e a
FC tanto em repouso, quanto em cargas de
esforço submáximas. Desta forma, a análise da
VFC em repouso e para determinar o LiVFC, além
de ser um método fácil e acessível, é um
procedimento de controle de intensidade de
exercício comum em avaliação e treinamento,
tendo a vantagem de fornecer informações
importantes sobre a regulação autonômica
durante o repouso e o exercício, capaz de ser
obtida com a medição da FC, destacando-se o
fato de ser um procedimento não invasivo. A
associação de índices de VFC em repouso com o
LiVFC pode ser útil na predição das intensidades
em que ocorre a retirada vagal em exercício, a
qual é identificada pelo LiVFC. Diante do exposto,
ressalta-se a relevância da análise da VFC, devido
a possibilidade da utilização de uma variável de
fácil interpretação e, principalmente, que pode
ser realizada pelos profissionais da educação
física como forma de triagem e avaliação em
programas de promoção da saúde e prevenção
dos fatores de risco cardiovasculares.
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Endereço para correspondência:
Monique da Silva Gevaerd
Laboratório de Análises Multisetorial
Universidade do Estado de Santa Catarina
Rua Pascoal Simone, 358 Bairro Coqueiros
Florianópolis SC Brasil. Cep 88080-350.
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