ESTUDO DO PROCESSO DE CRISTALIZAÇÃO DO ÁCIDO CÍTRICO POR RESFRIAMENTO C. C. de CASTRO1, T. A. A. de SOUZA1, F. S. LOBATO1 e R. A. MALAGONI1 1 Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Engenharia Química E-mail para contato: [email protected] RESUMO – O ácido cítrico é uma substância de grande relevância e vasta aplicabilidade em nosso cotidiano, estando presente em diversas frutas cítricas, tais como o limão e laranja e em órgãos humanos e de animais. Industrialmente, sua aplicabilidade é ainda maior, podendo ser utilizado na produção de alimentos, bebidas e fármacos. Neste contexto, o ácido cítrico é comumente obtido através do processo de cristalização, uma operação de separação capaz de obter materiais particulados de alta pureza e baixo custo. Cristalizadores bateladas agitados e de resfriamento pertencem aos equipamentos mais freqüentemente utilizados na indústria química e pouco conhecidos. Por isso, este trabalho tem por objetivo contribuir para o estudo e do processo de cristalização batelada por resfriamento. Diante deste cenário, este trabalho buscou caracterizar a influência das principais variáveis de operação na produção de ácido cítrico por resfriamento. Para essa finalidade foi proposto um planejamento composto central no qual foram avaliados os efeitos das variáveis grau de supersaturação e população de sementes na produção do ácido cítrico por resfriamento de 50°C a 40°C. A partir dos resultados preliminares observa-se que ambas as variáveis interferem significativamente no crescimento dos cristais e na qualidade da produção do ácido cítrico. 1. INTRODUÇÃO Usado como conservante natural (antioxidante), o ácido cítrico ou ácido 2-Hidroxi-1,2,3propanotricarboxílico (C6H8O7), é um sólido cristalino branco de sabor levemente ácido, inodoro, encontrado em várias frutas cítricas como limões, tangerinas e morangos, além de ser constituinte natural e um metabólito comum de plantas e animais. Este ácido, que confere sabor ácido e refrescante à preparação de alimentos e bebidas, é bastante utilizado na indústria alimentícia, por exemplo, na fabricação de refrigerantes, sucos de frutas, geleias e conservas de hortaliças (The Columbia Encyclopedia, 2001). As principais características do ácido cítrico que o tornam tão utilizado e um acidulante versátil, segundo Ferreira (1987), são a alta solubilidade e a ação sequestrante de íons metálicos, que previne reações indesejáveis de oxidação, mudança de cor e de aromas em produtos alimentícios. Como visto em Mullin (2001), em temperaturas de 20 a 35°C, o ácido cítrico puro encontra-se na forma cristalina, na temperatura de 20°C a sua solubilidade é de 137 g de ácido cítrico anidro por 100 gramas de água. Em escala industrial, o ácido cítrico é produzido através de processos de biossíntese, tendo como agente biológico o fungo Aspergillus niger (Bessa, 2001). Segundo a empresa Cargill, uma das produtoras de ácido cítrico no Brasil (ABIQUIM, 2014), o produto da empresa é obtido pelo processo de fermentação a partir de sacarose ou dextrose e o comercializa na forma anidra granular e fino granular em sua maioria. Devido a grande importância industrial do ácido cítrico, é cada vez mais importante que seja estudada a melhora do método de finalização dessa substância. A operação utilizada atualmente pelas grandes empresas é o processo de cristalização. De acordo com Mullin (2001), este é método que fornece um produto com elevado grau de pureza, baixo nível de contaminação, cristais de boa aparência, de fácil manuseio e estocagem. Cristalizadores bateladas agitados e de resfriamento são uns dos equipamentos mais utilizados na indústria química, a produção descontínua tem algumas vantagens, como equipamentos simples, porém, sem o controle do resfriamento, o produto final é de baixa qualidade e fino, características que causam problemas na lavagem, secagem e estocagem do ácido cítrico. A baixa qualidade e deficiência no tamanho dos cristais ocorrem em decorrência do resfriamento rápido no início da operação, que leva a formação não controlada de núcleos de cristais, que não atingem maiores dimensões durante o tempo de uma batelada (Nývlt, 2001). Dessa forma, este trabalho visa estudar uma forma de aperfeiçoar a cristalização do ácido cítrico efetuando o processo em um regime de resfriamento controlado e com agitação constante. Assim, podem-se avaliar as influencias de parâmetros importantes ao processo, tais como grau de supersaturação e população de sementes na produtividade do ácido cítrico. 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1. Preparo das Soluções Saturadas Em todos os ensaios de cristalização do ácido cítrico foram utilizadas soluções supersaturadas, que é relacionada com a condição de saturação segundo a Equação 1. Esta relação é conhecida como grau de supersaturação da solução. S= C C* (1) Oliveira et al. (2013) estudaram a solubilidade do ácido cítrico em água para uma faixa de temperatura de 60 a 20ºC e propuseram um ajuste aos dados que foi utilizado neste estudo, segundo as Equações 2 e 3. 1204,744 x = exp 2,053 − T + 273,15 x= m1 M1 m1 m2 + M1 M 2 (2) (3) Utilizou-se destas relações para determinar a fração mássica (x) de ácido cítrico na temperatura inicial de operação (50ºC) e assim a concentração de saturação do mesmo (C*). Tendo em mão os valores de grau de supersaturação (S) que se desejava estudar e a concentração na saturação (C*) foi possível determinar a concentração do ácido cítrico na solução (C) para o preparo dos sistemas. 2.2. Obtenção das Sementes Os cristais de ácido cítrico comercial utilizados como sementes para este trabalho foram obtidos através da técnica de peneiramento. Esta técnica também utilizada por outros autores foi melhor descrita em Malagoni (2010) e Teixeira (2011). Após a etapa de peneiramento, os cristais que ficaram retidos entre as malhas Tyler 20 e 16 passaram por um processo de desumidificação em que ficaram submetidos a uma temperatura de 60°C durante um intervalo de 24h, para só então serem utilizados no processo. 2.3. Processo de Cristalização Com a finalidade de se estudar a influência dos parâmetros grau de supersaturação e população de sementes em um processo de cristalização batelada mecanicamente agitado, uma unidade experimental foi desenvolvida e montada conforme a Figura 1. Para iniciar o processo de cristalização introduziu-se aproximadamente 280 ml de solução supersaturada de ácido cítrico devidamente preparada a uma temperatura de 50ºC. Em seguida adicionou-se as sementes e acionou-se a agitação constante a 198 rpm. A cristalização do ácido cítrico foi então monitorada por um termopar e submetida a um processo de resfriamento controlado por um período de 2 horas e 30 minutos até alcançar a temperatura de 40°C. Figura 1 – Esquema do aparato experimental: (a) cristalizador de vidro encamisado, (b) agitador mecânico com hélice naval, (c) termopar para controle da temperatura da solução e (d) banho termostatizado para resfriamento do sistema. Após finalizar o processo de cristalização, todo o ácido cítrico foi retirado do cristalizador de vidro, separado da solução mãe e levado à estufa por 24horas a uma ma temperatura de 60°C. A produtividade do ácido cítrico foi determinada segundo a Equação 4. m y (%) = f − 1 * 100 ms (4) 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Um planejamento lanejamento composto composto central com 11 experimentos, duas variáveis e três réplicas no ponto central foi proposto posto para este estudo visando à produtividade do ácido cítrico como resposta. Foi considerado variável x1 o grau de supersaturação da solução e x2 a população de sementes medida em gramas. A Tabela 1 reporta os valores encontrados considerando-se considerando um alfa de 1,414. Tabela 1 – Matriz codificada do planejamento composto central com as respostas experimentais Experimento x1 x2 y (%) 1 -1 -1 195,11 2 -1 1 162,65 3 1 -1 272,62 4 1 1 193,29 5 -α 0 153,85 6 α 0 262,86 7 0 -α 256,78 8 0 α 162,95 9 0 0 196,34 10 0 0 202,33 11 0 0 194,68 Desta forma, observou-se que a produtividade média alcançada foi de 204,86 % de ácido cítrico cristalizado com relação à massa de sementes introduzidas no cristalizador. A máxima produtividade alcançada foi de 272,62% para um alto grau de supersaturação e baixa quantidade de sementes, e a mínima produção foi de 153,85% para o menor grau de supersaturação estudado e um valor intermediário de sementes. Este comportamento está de acordo com a literatura Bessa (2001) e Teixeira (2011). A Tabela 2 reporta os níveis utilizados para as variáveis independentes codificadas e seus respectivos intervalos. Tabela 2 - Níveis codificados do PCC -α -1 0 1 α S(x1) 1,08 N(x2) 20,98 1,10 1,15 1,20 1,22 23,8 30,6 37,4 40,21 As Equações 5 e 6 trazem a fórmula de decodificação das variáveis x1 e x2 aplicadas neste trabalho. x1 = Supersaturação − 1,15 0,05 (5) x2= Pop.Sementes − 30,6 6,8 (6) Utilizando-se o software Statistica e adotando um nível de significância p de 0,05, buscouse determinar os efeitos principais e os de interação das variáveis de processo tendo como resposta a produtividade do ácido cítrico (y). ( Desta forma, foi possível estabelecer um ajuste das d variáveis codificadas que é apresentado pela Equação 7, 7, cujo coeficiente de correlação quadrático (R2) foi de 0,96623. yˆ = 204,86 + 32,7892x1 − 30,5607 x2 − 11,7175x1 x2 (7) No ajuste encontrado pode-se pode observar que a variável x1 possui um efeito positivo na produtividade, enquanto a variável x2 possui um efeito negativo. Além disso, o efeito de interação destes parâmetros não pode ser desconsiderado. O efeito das variáveis grau de supersaturação e população de sementes pode ser mais bem visualizado observando-se se a Figura 2. Figura 2 – Superfície de resposta em função das variáveis codificadas. A Figura 2 evidencia que no processo de cristalização por resfriamento uma maior produtividade é alcançada para altos níveis de supersaturação e níveis mais reduzidos de sementes. Isto acontece por existir uma competitividade entre as sementes pelo soluto durante o processo de cristalização. Além disso, quanto maior o grau de supersaturação maior a quantidade de soluto disponível no sistema para a cristalização. 4. CONCLUSÃO Através do planejamento de experimentos e de uma ajuste matemático foi possível determinar o efeito dos parâmetros de processo na produtividade do ácido cítrico na cristalização batelada agitada por resfriamento. Observou-se que tanto grau de supersaturação quanto quantidade de sementes são parâmetros significativos ao processo de cristalização, assim como sua interação. A partir dos dados obtidos neste trabalho, notou-se que valores representativos de produtividade, cerca de 270%, podem ser alcançados com elevado nível de supersaturação e quantidade de sementes moderada, sendo explicado pela maior disponibilidade de soluto e menor competitividade entre as sementes. 5. NOMENCLATURA C Concentração do sistema [g/g de água] C* Concentração de saturação na temperatura do sistema [g/g de água] m1 Massa de ácido cítrico [g] M1 Massa molecular do ácido cítrico [g/mol] m2 Massa de água [g] M2 Massa molecular da água [g/mol] mf Massa final de ácido cítrico [g] ms Massa de sementes [g] N População de sementes [g] S Grau de supersaturação [-] T Temperatura de operação do sistema [ºC] x1 Variável codificada do grau de supersaturação [-] x2 Variável codificada da população de sementes [-] 6. REFERÊNCIAS ABIQUIM. Anuário da Indústria Química Brasileira. São Paulo: Associação Brasileira da Indústria química, ano 41, 2014. BESSA, J. A. de A. Cristalização de ácido cítrico – influência da agitação com paleta rotativa e com discos vibrados. 2001. 93 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Química) – Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2001. FERREIRA, A. F. S. Acidulantes na indústria de alimentos. I Simpósio Sobre Aditivos Para Alimentos. Campinas: ITAL, SP, 9-11 pp. 1987. MALAGONI, R.A. Cristalização de ácido cítrico em leito vibrado. 2010. 297 f. Tese (Doutorado em Engenharia Química) - Universidade Federal de Uberlândia, Programa Pós-Graduação em Engenharia Química, Uberlândia, 2010. MULLIN, J. W. Crystallization. 4 ed. Oxford: Butterworth-Heinemann, 2001. 594p. NÝVLT, J.; HOSTOMSKÝ, J.; GIULIETTI, M. Cristalização. 1. ed. São Carlos: EdUFSCar/IPT, 2001. 160p. OLIVEIRA, M. L. N.; MALAGONI, R. A.; FRANCO, M. R. Solubility of citric acid in water, etanol, n-propanol and in mixtures of etanol+water.FluidPhaseEquilibria, v. 352, p. 110-113, 2013. TEIXEIRA, G. A. Estudo da produtividade no processo de cristalização de ácido cítrico em leito vibrado. 2011 95f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Química) – Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2011. THE COLUMBIA ENCYCLOPEDIA. Nova York, Ed. 6ª, Columbia University Press, 2001. 7. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à FAPEMIG (EV/PCE/00068-16) pelos recursos concedidos no Projeto de Participação Coletiva em Eventos, à PROGRAD/UFU pela bolsa de graduação, à CAPES pela bolsa de Mestrado e também à Faculdade de Engenharia Química da Universidade Federal de Uberlândia pela estrutura física disponibilizada para o desenvolvimento desta pesquisa no Laboratório de Cristalização.