Universidade Federal do Rio de Janeiro Instituto de Economia A FORMAÇÃO DO ESTADO E DO MERCADO NACIONAIS ALEMÃES: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA CLARICE MENEZES VIEIRA Rio de Janeiro 2006 Clarice Menezes Vieira A FORMAÇÃO DO ESTADO E DO MERCADO NACIONAIS ALEMÃES: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA Tese de Doutorado apresentada ao Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutora em Economia Industrial. Orientador: Prof. Dr. José Luis Fiori Rio de Janeiro 2006 Vieira, Clarice Menezes A formação do estado e do mercado nacionais alemães: uma perspectiva histórica / Clarice Menezes Vieira. – Rio de Janeiro : UFRJ/IE, 2006. 148f.: il.; 30 cm. Orientador: José Luis Fiori Tese (doutorado) – UFRJ, Instituto de Economia, Programa de Pós-graduação em Economia Industrial, 2006. Bibliografia: f. 124-133. 1. Alemanha – Política econômica – História. 2. Alemanha – História econômica – Século 19. 3. Alemanha – Política e governo – História. I. Fiori, José Luis. CDD 330.943155 A FORMAÇÃO DO ESTADO E DO MERCADO NACIONAIS ALEMÃES: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA Clarice Menezes Vieira Tese de Doutorado apresentada ao Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutora em Economia Industrial. Aprovado por: _______________________________________ Presidente, Prof. Dr. José Luis Fiori (IE/UFRJ) _______________________________________ Prof. Dr. Jaques Kerstenetzky (IE/UFRJ) _______________________________________ Prof. Dra. Vânia Maria Cury (IE/UFRJ) _______________________________________ Prof. Dr. José Carlos de Souza Braga (IE/UNICAMP) _______________________________________ Prof. Dr. Fernando Augusto da Rocha Rodrigues (IFCS/UFRJ) Rio de Janeiro 2006 ao Pepeto, que tantas alegrias me trouxe AGRADECIMENTOS O momento de elaborar esta lista é aquele em que nos damos conta de que, no fundo, não somos nós que merecemos os “louros”. Todos os eventuais méritos desse trabalho vão para as inúmeras pessoas que contribuíram de alguma forma para a sua realização, em especial: 9 a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, da qual fui bolsista; 9 o Prof. José Luis Fiori, mente cuja criatividade, liberdade e brilhantismo encontrei poucas similares; 9 o Prof. Fernando Rodrigues, que me prestou “consultoria” atenciosa na língua alemã; 9 meus colegas da graduação: Estherzinha, Val, Fábio, Dodô, Débora; 9 os funcionários do Instituto de Economia, especialmente a Beth e a (queridíssima) Anna Lucia; 9 todos os meus professores, mas especialmente Getulio, Lucia, Vânia e Carmen (em memória), que me ensinaram tudo que é preciso saber para viver com coragem, ética e dignidade; 9 os amigos do GAPA, especialmente Carlos Eduardo & Rosemary e Cristiana & Alexandre; 9 os amigos da OIKOS: Succar, Aninha, Seven, Ed; 9 os amigos do coração: Maria Freire, Julio, Pedrosa, Arthur, Maria Malta, Mauricio, Marcinha & Elci, Flávinha; 9 e, acima de tudo, a minha grande e maravilhosa família, que suportou com paciência todos os meus humores: Mamy, Papy, Rose, Vladito, Coisinha, CC, Mansur, Fernando, Hazel, Débora, Claudinha, Dana, Letixe, Gisele, Marcelinho, Tita, Cynthia e Sonia. “Toda a explicação unilateral me parece odiosa e, hoje, diante da amplitude da tarefa, um pouco vã. Karl Marx que, entretanto, tinha esse desejo autoritário, próprio a todo o sábio, de visar o essencial e o simples (...) escrevia, não obstante, a 18 de março de 1872, a Maurice de La Châtre: ‘Não há estrada real para a Ciência.’ Não o esqueçamos muito! É por múltiplos e difíceis atalhos que nos cumpre caminhar.” Fernand Braudel RESUMO O processo de formação do Estado Nacional Alemão foi abordado a partir de um referencial teórico que privilegia a constituição simultânea de uma unidade política territorial centralizada e de um espaço econômico “coerente”. Neste sentido, partiu-se do conceito de Estado Nacional enquanto produto de uma combinação histórica particular entre as forças econômicas e a configuração geopolítica de um determinado espaço. Foram inicialmente analisados do ponto de vista histórico: i) o processo de centralização de poderes internos e de expansão territorial da “Prússia” a partir de meados do século XVII; ii) o espaço “econômico” da Europa Central em inícios do século XIX. Buscou-se mostrar, a partir destas análises, que, ao longo do século XIX, o espaço da Europa Central “alemã” gradualmente apontou para a formação de uma unidade econômica “coerente” sem a incorporação da Áustria, materializada na União Alfandegária (Zollverein) instituída em 1834. A formação desta unidade, ao mesmo tempo, foi fortemente influenciada pela configuração geopolítica da Europa Central ao longo daquele século, instituída especialmente no Congresso de Viena, que correspondeu ao “congelamento” das fronteiras territoriais de seus Estados, embora mantendo uma tensão política permanente entre eles. Neste sentido, as forças econômicas teriam se combinado de forma original às forças geopolíticas para dar origem, com a formação do Segundo Império Alemão em 1871, à unidade híbrida do “estado-economia nacional” alemão, que apresentava, enquanto tal, dinâmica econômica e política que poderia ameaçar o status quo europeu em inícios do século XX. ABSTRACT The formation process of the German National State was considered from a theoretical point of view which privileges the simultaneous constitution of both a centralized politicalterritorial unity and a coherent economic space. In this way, my starting point was the concept of National State as a product of a particular historical combination of economic forces and geopolitical configuration on a given space. At first, I analyzed from a historical point of view: i) the processes of internal power centralization and territorial expansion of “Prussia” in the middle of the seventeenth century; ii) the “economic” space of Central Europe in the beginnings of the nineteenth century. The purpose of this analysis was to show that the German space in Central Europe tended gradually, during the nineteenth century, to the formation of a coherent economic unity without Austria, materialized in the Tariff Union (Zollverein) instituted in 1834. At the same time, the formation of this unity was strongly influenced by the geopolitical configuration of Central Europe in that century, as instituted by the Vienna Congress, a configuration marked by States with “frozen” territorial boundaries that were, nevertheless, kept in a state of permanent political tension. The economic forces would so have recombined themselves, in an original way, with the geopolitical ones, giving birth to the hybrid unity of the German “national state-market” of the Second Reich in 1871; as such, this unity comprised political and economic dynamics that could even threat the European status quo in the beginnings of the twentieth century. SUMÁRIO PREFÁCIO 01 INTRODUÇÃO: DEFINIÇÕES E METODOLOGIA 02 CAPÍTULO 1: A CONSTRUÇÃO E A EXPANSÃO TERRITORIAL DO ESTADO PRUSSIANO 13 1.1 – O Estado Hohenzollern: 1648 1.2 – A Evolução do Estado Hohenzollern: 1648-1806 CAPÍTULO 2: O ESPAÇO ECONÔMICO “ALEMÃO” EM ÍNÍCIOS DO SÉCULO XIX 2.1 – Introdução 2.2 – Características Gerais 2.3 – Principais Regiões Econômicas 13 19 45 45 47 55 CAPÍTULO 3: A CONFEDERAÇÃO GERMÂNICA E A FORMAÇÃO DO ZOLLVEREIN 68 3.1 – O “mercantilismo” no Sacro Império Romano até 1806 3.2 – A Confederação Germânica e o Estado Prussiano: 1815 3.3 – A Tarifa de 1818 e a Formação de Uniões Alfandegárias: 1815-1828 3.4 – A Formação do Zollverein 68 75 84 96 CAPÍTULO 4: A FORMAÇÃO DO “ESTADO-ECONOMIA NACIONAL” ALEMÃO 4.1 – A Evolução do Zollverein 4.2 – O “estado-economia nacional” alemão 4.3 – Conclusões e Hipóteses 102 103 111 116 REFERÊNCIAS 124 APÊNDICES 134 LISTA DE FIGURAS Figura 1: Possessões das Principais Dinastias da Europa Central: 1648 14 Figura 2: A Expansão Territorial Hohenzollern: 1648-1807 37 Figura 3: Quadro Cronológico: 1648-1807 42 Figura 4: O Espaço Econômico “alemão”: Inícios do Século XIX 67 Figura 5: A Confederação Germânica: 1815 76 Figura 6: Uniões Alfandegárias na Confederação Germânica: 1828 95 Figura 7: O Zollverein: 1834 101 Figura 8: A Evolução do Zollverein: 1834-1866 104 Figura 9: Configurações Geopolíticas da Europa: Séculos XVIII e XIX 120 Figura 10: Estrutura Política do Sacro Império Romano 137 Figura 11: Estrutura Geral das Titulações Nobres do Sacro Império Romano 139 Figura 12: Evolução Dinástica Hohenzollern: 1415-1618 145 1 PREFÁCIO A ciência econômica desenvolveu, a partir da necessidade de definir um objeto próprio de estudos, uma maneira particular de se relacionar às demais ciências sociais. Em poucas palavras, afirmou que a vida econômica tem um tal grau de autonomia com relação às demais esferas da vida social que se torna viável e apropriado o desenvolvimento de uma ciência única para dela tratar. Se os fatos econômicos têm uma dinâmica própria e relativamente independente daquela dos demais fatos sociais, é possível elaborar todo um campo de saber isolando os primeiros dos últimos e os tratando de forma “pura”. Economistas que afirmem que a vida econômica não pode ser compreendida, sequer na Modernidade, de forma isolada dos demais elementos da vida social, especialmente dos elementos políticos, são, portanto, na maioria dos casos, tratados como heterodoxos. Não é interesse desta tese discutir a validade das “hipóteses” acima, ou até que ponto elas correspondem à realidade das pesquisas da ciência econômica atual. Porém, sua motivação inicial originou-se de dois elementos por elas sugeridos: i) da impressão de que os economistas a utilizam indiscriminada e, muitas vezes, arbitrariamente; ii) de que meus estudos até a entrada no Programa de Doutorado não haviam sido suficientes para adotá-las sem reservas. Enquanto investigação empírica, o problema da formação dos Estados Nacionais e, em especial, aquele do relacionamento entre a formação dos mercados e dos estados nacionais pareciam bons candidatos a coadjuvantes no tratamento desta questão teórica “mal resolvida” acerca da possibilidade da ciência econômica pura. A Alemanha, em especial, com seus contra-sensos, suas “peculiaridades”, sua maneira única de simultaneamente se alinhar e desalinhar à Europa, insinuava-se como um bom “estudo de caso”. 2 INTRODUÇÃO: DEFINIÇÕES E METODOLOGIA As Ciências Sociais1 têm dedicado grande atenção ao estudo da formação dos Estados Nacionais da Europa do século XX2,3. A forma mais comum de “contar estas histórias” é olhar para o passado à luz das realidades contemporâneas, ou seja, buscar caminhos que conduzam aos Estados existentes no presente. Em outras palavras, grande parte dos estudos sobre a formação dos Estados Nacionais utiliza o que Charles Tilly denominou “análise retrospectiva”4. Este tipo de análise, porém, como destaca o autor, envolve inúmeras dificuldades conceituais e teóricas: The choice of contemporary states as units for the long-run comparison of ‘political development’ causes grave difficulties. For everything which is dubious about the coherence of a nation, political system, or society identified by its relationship to a particular state at a single point in time becomes much more dubious when it comes to the study of a very long span of time. (1975c, pp. 618-619) Ao mesmo tempo, outro elemento “tradicional” às abordagens sobre a formação dos Estados Nacionais é a tentativa de associar historicamente a Nação e o Estado, ou, mais especificamente, observar como uma determinada “Nação” encontrou seu caminho para a formação de uma entidade política unificada. As dificuldades sugeridas por Tilly ampliam-se ainda mais para estes casos, pois, como demonstrou Hobsbawm (1990), o conteúdo objetivo ou “científico” do conceito de “Nação” é bastante limitado5. No caso da Alemanha contemporânea, a importância adquirida historicamente pela idéia da “Nação Alemã” tem levado a uma concentração do “foco” historiográfico em seu entorno, especialmente a partir da suposta existência de uma tensão entre a Nação “Cultural” e a Nação 1 Englobando nestas não apenas a Sociologia, mas igualmente as Ciências Políticas, Econômicas e a História; De fato, esta parece ter se tornado uma “linha de pesquisa” própria não apenas da História, mas também da Ciência Política e da Sociologia, e, portanto, o número de estudos a ela dedicado é bastante volumoso; para citar apenas uma referência, embora de grande importância para os diversos “campos” das Ciências Sociais, ver TILLY (ed.), 1975; neste contexto, as próprias definição e caracterização do “Estado Nacional” são alvo de disputas teóricas; 3 Entenda-se que, doravante, termos como “Estados Nacionais”, “Nações”, “Estados Territoriais”, etc. estarão sendo utilizados apenas no contexto da Europa Moderna; 4 “A retrospective analysis begins with some particular historical condition (...) and searches back for its causes.” (1975b, p. 14); as dificuldades e possibilidades de serem utilizados outros tipos de análise, especialmente a chamada “análise prospectiva”, são problemas “metodológicos” próprios daquela “linha de pesquisa” e, em grande medida, da historiografia em geral; para uma discussão no que se refere à formação dos Estados Nacionais, ver o Capítulo 1 da obra editada por Charles Tilly; 5 Esta é a “definição” do conceito por Walter Bagehot: “a nação é um daqueles muitos fenômenos que compreendemos, desde que não nos façam perguntas sobre ele, mas que não sabemos explicar em termos breves e sucintos” (citado em BAUER, 2000, p. 45); para uma resenha acerca das discussões teóricas sobre o conceito de “nação”, ver SMITH, 2000; 2 3 “Política”. Esta concentração, porém, parece ter aumentado ainda mais a complexidade das pesquisas centradas sobre a formação de seu Estado Nacional, na medida em que impôs a elas, como uma de suas tarefas, a busca de correspondências claras e objetivas entre o “Estado Nacional Alemão” e a “Nação Alemã”6. Grande parte das pesquisas, daí por diante, passou a se organizar em torno de um problema central: como justificar, a partir dos critérios gerais que orientam o entendimento contemporâneo a respeito da “nacionalidade”, o caminho tomado pelo Estado Nacional Alemão, ou, mais especificamente, por que certas regiões, como a Áustria, não teriam sido nele incluídas.7 Estes “problemas” ganham ainda importância na medida em que a historiografia da formação dos Estados Nacionais privilegia três “casos” empíricos centrais: os da França, da Inglaterra e da Alemanha; e na medida em que, para os dois primeiros, não encontra em geral as mesmas dificuldades em estabelecer tais correspondências como para o terceiro. Em outras palavras, o “desafio” de encontrar tais justificativas torna-se mais instigador quando se amplia na pergunta: por que, para a Alemanha, não existe o mesmo grau de correspondência entre a “Nação” e o “Estado” modernos daquele observado para os casos da França e da Inglaterra? Mais geralmente, a historiografia parece encontrar uma certa continuidade entre as entidades pré e pós formação do Estado Nacional para os casos da França e da Inglaterra, usualmente atribuída ao elemento da nacionalidade8, que não encontra para o “caso” da Alemanha. Esta continuidade teria como evidência, por exemplo, localizações geográficas relativamente estáveis destes Estados séculos antes da instituição de suas “formas” Nacionais9 (auxiliada, no 6 A obra tradicional a respeito do relacionamento entre o Estado e a Nação Alemães é a de MEINECKE (1970); para uma discussão moderna, ver ABELLÁN (1997); ou LANGEWIESCHE (1994); 7 “If Germany was defined in terms of language, culture or even race, how could it end at the borders created by Bismarck? Should it not include Germans in Austria, in White Russia, in the Americas and the African colonies?” (BLACKBOURN, 1998, p. xvii); 8 Certamente isto não significa, no entanto, que este elemento, que torna tais identificações supostamente mais diretas, seja objetivo e claramente identificável, ou que coincida com aqueles que viriam a reivindicar os nacionalismos britânico e francês dos séculos XIX e XX; ver, a esse respeito, o capítulo 1 de HOBSBAWM (1990); 9 Ou, mais geralmente, por serem aquilo que GIDDENS classificou como ‘estados contínuos’: “Os dois exemplos básicos [de Estados que instalaram capitais fixas relativamente cedo], a França e a Inglaterra, foram ‘Estados contínuos’ por centenas de anos. Isso quer dizer que eles não foram conquistados ou sujeitos a um domínio alheio sobre suas regiões centrais.” (2001, p. 142); porém, as dificuldades metodológicas em associar entidades históricas em diferentes pontos do tempo são, para estes casos, dirimidas, mas não resolvidas: “Among the areas studied in this volume, England and France seem the least contestable cases; even there we must make hard decisions concerning Scotland, Wales, Ireland, Britany, and Alsace (not to mention Jersey, Guernsey, Andorra, or Monaco).” (TILLY, 1975c, p. 619); 4 caso da Inglaterra, por sua posição insular, e, no caso da França, por uma centralização política precoce em torno de sua Corte). Em resumo, a ausência de uma centralização geográfica ou territorial estável10, um foco excessivo sobre a idéia de “Nação Alemã” e a comparação com os casos inglês e francês contribuíram para atribuir ao estudo da formação do Estado Nacional Alemão um caráter semelhante ao de um “enigma” historiográfico11. Grande parte da historiografia da Alemanha parece contribuir para a permanência deste caráter ao não questionar ou sequer expor a abordagem metodológica que implicitamente adota. Na maioria dos casos, supõe-se inicialmente uma continuidade histórica tal que seja possível estudar a Alemanha desde períodos históricos muito remotos, sem explicitar sobre que elementos se sustenta; chegado, então, o “momento” de se tratar a formação de seu Estado Nacional no século XIX, pergunta-se: por que esta continuidade teria sido rompida? E as respostas são buscadas na comparação com os “casos” inglês e francês, onde, supostamente, teria sido mantida. Nas obras “clássicas” sobre a História da Alemanha, que em geral se iniciam no período de Carlos Magno (ou no Tratado de Verdun), raramente é possível encontrar uma definição objetiva de seu objeto, como se não fosse necessário, de tão evidente, explicitá-lo. Mas, abrindo-se mão da idéia de “Nação Alemã”, o que seria a Alemanha antes de 1871?12 Alguns autores parecem considerar, ainda que não explicitamente, que, até a formação de seu Estado Nacional, a Alemanha e o Sacro Império Romano se igualavam. Neste caso, porém, retorna ainda com mais intensidade o problema de justificar por que a continuidade teria sido rompida em 1871, ou seja, por que a Áustria foi excluída do Estado formado naquele ano. 10 Este é um dos elementos utilizados, por exemplo, por ELIAS (1997) em sua “teoria” a respeito da evolução do habitus alemão; a idéia é fortalecida pelo autor pela observação da constante tensão política e militar às quais os territórios da Alemanha estiveram historicamente submetidos: “As tribos de fala germânica, que se instalaram nas terras baixas a oeste do Elba e numa vasta área entre o Elba e os Alpes ao longo dos séculos de migração dos povos (Völkerwanderung), encontraram-se encravados entre tribos cuja língua era derivada do latim e tribos orientais falando línguas eslavas. Esses três grupos de povos lutaram por mais de mil anos em defesa das fronteiras de suas respectivas áreas de povoamento. (...) O processo de formação do Estado entre os alemães foi profundamente influenciado pela sua posição como bloco intermediário na configuração desses três blocos de povos.” (1997, pp. 16-17); 11 De fato, este caráter foi de certa forma inaugurado ainda no século XVIII por Goethe e Schiller com sua famosa pergunta de 1797, citação quase obrigatória dos livros sobre a História da Alemanha (“Deutschland? Aber wo liegt es? Ich weiβ das Land nicht zu finden.” [“Alemanha? Mas onde ela está? Eu não consigo encontrar esse país.”]); desde então, “persegue” a historiografia, a ponto de ter sido desenvolvido um programa de pesquisa específico para supostamente “decifrar” o enigma: a teoria do Sonderweg alemão (ver à frente); 5 Na prática, os historiadores adotam um modelo “híbrido”, onde a causa da “descontinuidade” localiza-se no suposto anacronismo do Sacro Império Romano, ou o que Breuilly denominou abordagem nacionalista narrativa: Uma típica história ‘nacional’ começa pelo estado de coisas tradicional e pré-nacional. Por exemplo, os textos de história da Alemanha começam pelo Sacro Império Romano dos séculos XVIII e XIX. O historiador aponta os inúmeros pontos fracos das instituições imperiais tradicionais e da multidão de pequenas unidades políticas. Em seguida, volta a sua atenção para grupos e instituições mais novos e mais dinâmicos – nesse caso, os Estados territoriais (especialmente a Prússia) – e para os agentes portadores de idéias e práticas modernas (empresários, funcionários instruídos). O fio da narrativa consiste em mostrar como as instituições tradicionais desmoronaram, com maior ou menos rapidez, frente às forças modernas; estas, por sua vez, convergem e se reforçam mutuamente. (2000, p. 166) Em outras palavras, a “análise retrospectiva” é utilizada não apenas para localizar no “passado” objetos de estudo, mas igualmente para justificar o rumo da dinâmica histórica. **** As considerações anteriores sugerem a busca de abordagens “alternativas”, ou seja, sem a concentração de seu foco sobre o elemento da nacionalidade, para o estudo da formação do Estado Nacional Alemão. Uma das possibilidades, sob a qual esta pesquisa estará orientada, é a utilização do “modelo” proposto por Fiori (2004), construído a partir das sugestões originais de Braudel (1996a, 1996b), entre outras. Ao definir o “mercado nacional”, Braudel afirma: Assim se designa a coerência econômica adquirida de um dado espaço político, sendo esse espaço de uma certa dimensão, antes de tudo a que chamamos o Estado territorial, a que antigamente se preferia chamar o Estado nacional. Uma vez que, nesse quadro, a maturidade política precedeu a maturidade econômica, a questão é saber quando, como e por que razões esses Estados adquiriram, economicamente falando, uma certa coerência interna e a faculdade de se comportar como um conjunto em relação ao resto do mundo. (1996b, p. 255, grifo meu) Como se nota, a construção do “mercado nacional” corresponderia para o autor a uma transformação, operada sob um certo espaço territorial definido politicamente, de suas relações econômicas de forma a que estas atingissem uma “certa” coerência interna. Ao mesmo tempo, a força necessária a esta transformação é eminentemente política: 12 “The difficulties become apparent when we attempt to analyze the development of a unit called ‘Germany’ from, say, 1550 to 1950. What are its boundaries?” (TILLY, 1975c, p. 619); 6 O mercado nacional, finalmente, é uma rede de malhas irregulares, freqüentemente construídas a despeito de tudo: a despeito das cidades demasiado poderosas que têm sua política própria, das províncias que recusam a centralização, das intervenções estrangeiras que acarretam rupturas e brechas, sem contar interesses divergentes da produção e das trocas (...) A despeito também dos enclaves de auto-suficiência que ninguém controla. Não é de estranhar que tenha havido necessariamente na origem do mercado nacional uma vontade política centralizadora: fiscal, administrativa, militar ou mercantilista. (1996b, p. 265, grifo meu)13 Sob os aspectos político e econômico, portanto, o Estado Nacional corresponderia a uma unidade “híbrida”, constituída simultaneamente por um poder territorial e por um mercado nacional, ou ao que Fiori (2004) denominou diretamente de “estado-economia nacional”. Em princípio, portanto, o processo geral de formação dos Estados Nacionais poderia ser investigado a partir de dois sub-processos simultâneos: a formação, por um lado, de unidades territoriais centralizadas e, por outro, desta “rede de malhas” que constituiriam os mercados nacionais. Porém, como a formação do segundo esteve necessariamente relacionada à do primeiro, a investigação deve incluir a maneira como estes dois “sub-processos” se interconectaram. É precisamente a partir desta motivação, ou seja, reconstruir historicamente o “‘momento’ lógico e histórico em que o ‘poder político’ se encontra com o ‘mercado’ e recorta as fronteiras dos primeiros ‘estados/economias’ e ‘identidades/interesses’ nacionais” (FIORI, 2004, p. 20), que Fiori apresenta os conceitos de “economia-mundo” e “política-mundo” européias. Por volta dos séculos XII e XIII, o espaço europeu constituía, por um lado, uma “economiamundo”: Um território unificado por uma rede mais densa de comércio que unia, entre si, um conjunto hierarquizado de cidades, portos e feiras mercantis (...) articulado em torno da liderança de uma cidade ou pólo dominante que comandava o comércio e as finanças do sistema. (2004, p. 21) E, por outro, uma “política-mundo”: 13 Vale notar, porém, que, para BRAUDEL, as relações entre o poder político e o mercado nacional não são diretas, pois a “maturidade política” não garante automática e necessariamente o surgimento do mercado nacional: “As explicações tradicionais valorizam demais as medidas autoritárias que desvencilharam o espaço político das alfândegas internas e dos pedágios que o fragmentavam, ou pelo menos prejudicavam a circulação nele. Levantados esses obstáculos, o mercado nacional começa a tornar-se eficiente. Não será uma explicação simples demais?” (1996b, p. 266); ou ainda “Se o mercado nacional nascesse desse reordenamento, só haveria mercados nacionais no continente europeu no final do século XVIII, no princípio do século XIX. É evidentemente um exagero. Aliás, bastará suprimir os pedágios para ativar os tráficos?” (1996b, p. 267); 7 (...) [Um] pedaço[s] do planeta interligado[s] e unificado[s] por conflitos e guerras quase permanentes. Território[s] ocupado[s] por vários centros de poder e alguns ‘núcleos imperiais’, contíguos e competitivos, que acabaram se impondo aos demais – a partir dos séculos XII e XIV – e acumulando o poder indispensável à criação dos estados nacionais, através de alianças e matrimônios, mas, sobretudo através da guerra. (2004, pp. 21-22) A investigação a respeito do processo de formação dos “estados-economias nacionais” pode, neste contexto, ser conduzida a partir da apreciação histórica do relacionamento entre o “jogo das guerras” da “política-mundo” e o “jogo das trocas” da “economia-mundo” européias. Uma das conclusões iniciais de Fiori é a de que, embora estes “jogos” tenham estado, desde pelo menos o século XII, conectados14, seus “resultados”, em termos da construção dos Estados Nacionais, só se concretizariam em fins do século XVII, com a formação do primeiro “estado-economia nacional” maduro, ou seja, a Inglaterra. Mesmo neste caso, porém, a origem primordial da conexão entre aqueles “jogos” não deixou de ser o financiamento das guerras: Como no passado, uma vez mais, foi a necessidade de financiamento das guerras inglesas que esteve na origem dessas mudanças. Mas desta vez, o encontro do poder com os bancos produziu um fenômeno absolutamente novo e revolucionário: os ‘estados-economias nacionais’. Verdadeiras máquinas de acumulação de poder e riqueza que se expandiram a partir da Europa e através do mundo, numa velocidade e numa escala que permitem falar num novo universo em expansão, com relação ao que havia acontecido nos séculos anteriores. (FIORI, 2004, p. 34) Em outras palavras, o período aproximado entre os séculos XVI e XVII assistiu, como antes, à forte ligação entre o poder e a riqueza, materializada especialmente pelas necessidades de financiamento das guerras; naquele momento, porém, produziu o fenômeno historicamente inédito de formação dos “estados-economias nacionais”. **** As considerações anteriores forneceram os principais elementos utilizados para “recortar” e definir as linhas centrais desta pesquisa, que podem ser resumidas nas seguintes perguntas: como teria se dado, no “espaço alemão” (ou no espaço Europeu entre os Rios Reno e Oder), a conexão entre o processo de construção, por um lado, de um Estado Territorial unificado, e, por outro, de “malhas” econômicas de natureza “nacional”? No momento em que o espaço 14 “A história desta convergência, entretanto, começou muito antes do século XVI, quando são tecidos os primeiros laços de dependência mútua entre o ‘jogo das trocas’ e o ‘jogo das guerras’, dentro dos espaços da ‘economia-mundo’ e da ‘política-mundo’ européias.” (FIORI, 2004, p. 29); 8 alemão atingiu a forma de um estado territorial unificado, qual era, “economicamente falando”, sua “coerência interna”? Se ou como teria operado a “vontade política centralizadora” que conduziu aos processos de unificação política e de construção do mercado nacional nos termos de Braudel? Como o “jogo das trocas” associou-se, naquele espaço, ao “jogo das guerras”? Como aquela unidade política e econômica se inseriu, desde aproximadamente o século XVII, na “economia-mundo” e na “política-mundo” européias e no processo geral de formação dos “estados-economias nacionais”? Dadas estas linhas gerais investigativas, um dos “problemas” com os quais a historiografia “tradicional” comumente se defronta, ou seja, a escolha do “espaço” e do “tempo” de uma investigação genérica acerca da formação do Estado Nacional Alemão15, vê-se bastante esvaziado. Pois estas escolhas podem ser dirigidas diretamente para a formação simultânea de uma unidade territorial unificada e de um “mercado nacional”, nos termos de Braudel, no espaço “alemão” da Europa Central. Como se sabe, do ponto de vista político, em termos formais, o espaço alemão esteve historicamente organizado sob diversas formas, sendo a mais recente a do Estado criado com a reunificação de 199016. Porém, a formação do Império Alemão em 1871 é significativa no 15 De fato, como o próprio conceito de “Estado Nacional” não está plenamente estabelecido entre as ciências sociais, não existe consenso historiográfico sequer a respeito de quando, efetivamente, se instituiu o Estado Nacional Alemão; para o público leigo, ele teria nascido em 1871, com a formação do Império Alemão; essa não é, porém, a opinião dos historiadores especializados, em função tanto das distintas interpretações do conceito de “Estado Nacional”, quanto das dificuldades em associar o Império Alemão à “Nação Alemã”; para ABELLÁN, por exemplo: “El nuevo Estado alemán, el Deutsches Reich, por el contrario, sí puede ser considerado un Estado nacional, a diferencia del antiguo Reich y de la Confederación Germánica, si bien las importantes limitaciones de distinta naturaleza con que se creó permiten hablar de un Estado nacional incompleto o inacabado.” (1997, p. 89); para uma discussão historiográfica, ver KOHN (1954); HOFER (1954); SHEEHAN (1981) [que chega a afirmar que: “German history, as a singular process, had not yet really begun.” (p. 10)]; e EVANS (1992), que comenta: “The idea of Germany as a nation-state was increasingly replaced by the admission that there was not one German history but several. (…) Bismarck’s creation of the empire of 1871 seemed increasingly to have been a tour de force, its artificial nature underlined by the fact that its existence was followed within a few decades by two world wars for which it was largely responsible. Its boundaries did not stand the test of time; they were revised in 1918 by the Treaty of Versailles, in 1938 by the Anschluss of Austria and the annexation of the Sudetenland — a return to the ‘big German’ concept of national unity that Bismarck had so forcefully rejected in 1866 — and again during the Second World War, before final defeat in 1945 destroyed the existence of a single state for the Germans altogether. As the fortieth anniversary of the end of the Second World War came and went, Germany increasingly seemed to have reverted to what was arguably its natural condition of division into a number of different independent states.” (p. 238); 16 Resumidamente, em primeiro lugar sob o Sacro Império, cuja data de criação considera-se em geral a de 843, com o Tratado de Verdun, ou ainda a de 800, com a coroação de Carlos Magno (embora a designação de “Sacro Império Romano da Nação Germânica” só comece a ser utilizada no século XVI); em 1806, sob a Confederação do Reno; em 1815, sob a Confederação Germânica; em 1866, sob a Confederação da Alemanha do Norte; finalmente, em 1871, sob o Império Alemão; 9 que diz respeito tanto à criação de uma entidade política “unificada”, quanto à delimitação de um espaço econômico de caráter “nacional”17. Será, portanto, sobre esse primeiro referencial, ou seja, a formação do Império Alemão de 1871, que esta investigação estará orientada, e, como conseqüência, sobre o processo de construção e expansão territorial do Estado Prussiano, na medida em que aquela formação correspondeu, na prática, a mais uma etapa na expansão daquele Estado18. Por outro lado, para observar adequadamente este processo é necessário (e, como será sugerido, suficiente) investigar como evoluiu aquele Estado, no contexto europeu em geral, e no do Sacro Império Romano em particular, a partir do Tratado de Westphalia, já que: In the peace of Westphalia the princes secured all the essentials and most of the trappings of sovereignty; thereafter every prince was emperor in his lands. All the powers they had acquired as a result of the Reformation and of the Thirty Years War were confirmed in the treaty of peace, in particular their authority in matters of religion and their right to alliances. Any direct interference by the emperor with administration, either in particular regions or throughout the empire, was henceforth out of the question. (BARRACLOUGH, 1946, p. 382)19 Deverá ser, portanto, sobre este ambiente, ou seja, o espaço “alemão” entre o Tratado de Westphalia e a instituição do Império em 1871, que esta pesquisa estará focada, e especialmente sobre a construção do Estado Prussiano e suas relações com as demais 17 Ver, a respeito, LANGEWIESCHE (1994); sobre o caráter territorial do Império Alemão de 1871 vis-à-vis o Sacro Império Romano, ver BRYCE (1964); e PORTILLO (1994) vis-à-vis a Confederação Germânica de 1815 a 1866; 18 “Os historiadores às vezes se referem à unificação da Alemanha como a expansão da Prússia, não apenas porque a unificação foi conquistada pela força das armas prussianas, mas também porque grande parte do sistema monárquico prussiano foi transferido, de forma efetiva, para o segundo Reich Alemão.” (STACKELBERG, 2000, p. 521); 19 De fato, esta tendência já vinha se desenvolvendo mesmo antes da Guerra dos Trinta Anos: “Even before the beginning of the war in 1618 a number of the more important states – Hesse, Saxony, Brandenburg and, in particular, the Palatinate – had maintained ambassadors at foreign courts, working side by side with, and as often as not in opposition to, the imperial ambassadors. They had not hesitated to enter into foreign alliances without imperial assent. Hence by 1648 they were already acting as independent powers in European politics (...).” (BARRACLOUGH, 1946, p. 381); é importante ressaltar, porém, que as opiniões negativas do autor a respeito do Império [“(...) long before the demise of the empire was publicly announced in 1806, it had ceased to exist.” (1946, p. 383); ou ainda: “After 1648 the empire was a meaningless historical survival (...).” (1946, p. 383)], vêm sendo crescentemente questionadas pela historiografia, na medida em que podem ser identificadas importantes funções políticas, econômicas e culturais desempenhadas pela estrutura imperial a partir de 1648, especialmente a que ARETIN identifica no Imperador Leopoldo I: “The Westphalian Peace Treaty, with regard to the federal rights of the Reichsstandes as well as in other regulations, established a bias in favor of the larger Reichsstandes. It was perhaps the greatest success of Emperor Leopold I’s imperial policy that he was able to halt this development, except in the case of Brandenburg-Prussia, and established himself as the guarantor of the continued existence of the smaller and smallest Reichsstandes.” (1986, p. S144); ver a respeito ainda VANN (1986); 10 “vontades políticas centralizadoras” e com as “política-mundo” e “economia-mundo” européias. **** Como provavelmente em qualquer outro “caso” empírico de formação de um Estado Nacional, a Alemanha possui seus “mitos” e debates historiográficos tradicionais. O fato de se estar utilizando, neste estudo, uma abordagem “alternativa” previne, em certa medida, os riscos e possibilidade de associações diretas àqueles “mitos”. Entretanto, como alguns destes tornaram-se desmedidamente populares, convém comentá-los, especialmente para justificar sua ausência doravante. O papel da Prússia no Estado Nacional Alemão, em especial, tornou-se tema recorrente desde meados do século XIX. Se até inícios do século XX a tendência dominante foi por uma espécie de supervalorização positiva da Prússia em função de seu (suposto) papel na unificação alemã20, após a Segunda Guerra Mundial um grupo de historiadores passou a identificar precisamente nas características daquele Estado as “origens” do nazismo. Ou seja, a Prússia passou, da glória do século XIX associada à unificação, à condenação do século XX associada ao nazismo, consolidando-se uma divisão na historiografia entre “prussófilos” e “prussofóbicos”21: And we can trip its history [of Prussia], which now lies completely before us, of the legends which distorted it while it was still going on: the golden legend according to which the unification of Germany had always been Prussia’s mission, a mission deliberately pursued by the Prussian Kings and indeed by the Electors of Brandenburg before them; and also the black legend that refused to see in Prussia anything other than rapacious militarism and branded Frederick the Great and Bismarck as predecessors of Hitler. Both this legends are yesterday’s propaganda. (HAFFFNER, 1998, p. 3)22 20 A chamada “borussificação” da História da Alemanha: “Después de la revolución [1848], se impuso en la historiografía y en la historia literaria una borussificacíon de la imagen de la historia alemana. (...) El papel de líder de Prusia durante el proceso de unificación de los años sesenta y la fundación del Reich parecía confirmar de manera deslumbrante la leyenda histórica, según la cual la historia alemana en su conjunto se había encaminado desde hacía siglos hacia el Estado nacional dominado por Prusia.” (LANGEWIESCHE, 1994, pp. 45-46); 21 Os termos são originalmente de MEHRING (1975, Parte II, Seção 2, §1); 22 EVANS comenta ainda: “The ‘little German’ model ruled, with a traditional Prussian or National Liberal historiography, narrating the story of German history as an inevitable, almost predestined progress towards the unification of 1871 under Prussian leadership, being increasingly overlaid during the twentieth century by a second, much more critical model, telling the same story, but in more negative terms, as an inevitable, almost predestined progress towards the Third Reich of 1933-45. The point was that both models shared many of the same assumptions about the centrality of Prussia to modern German history, and the concomitant marginality of Austria”. (1992, p. 239); 11 O fato de ter sido selecionada, nesta pesquisa, a formação do Império Alemão como referencial não guarda quaisquer relações com tais “lendas”. A escolha orientou-se unicamente pelo referencial teórico-conceitual utilizado, ou seja, o estudo da formação dos “estados-economias nacionais”. Se a Prússia possuiu qualquer “missão” no processo de formação do Estado Nacional Alemão, positiva ou negativa, ou se sua participação naquele causou outros desdobramentos políticos específicos no futuro são questões que não fazem parte de seu escopo. Por motivos semelhantes, também estarão ausentes questões relacionadas ao debate sobre as “peculiaridades” da Alemanha, ou seja, à teoria do Sonderweg23. Como se sabe, o debate tendeu a concentrar-se sobretudo na configuração de forças entre (e nas atitudes políticas de) as diferentes “classes” da Alemanha do século XIX, especialmente na suposta ausência de uma burguesia politicamente “desenvolvida”. Neste contexto, relaciona-se a outra “tradição” historiográfica, porém da Prússia, qual seja, a de localizar nas disputas entre as diferentes “classes” (ou Estamentos) dos territórios prussianos a força dinâmica dos “rumos” tomados por aquele Estado a partir do século XVII24. Embora seja praticamente inviável prescindir de comentários a respeito do relacionamento entre as diferentes “classes” na Prússia, especialmente no período anterior ao século XIX, julgamentos a respeito da natureza daquelas relações, bem como de suas conseqüências para períodos posteriores, serão, em geral, evitados. **** Com uma proposta de investigação de um período histórico de aproximadamente dois séculos, esta pesquisa estaria condenada à superficialidade se seu objeto não fosse rigorosamente 23 Esta foi simultaneamente sistematizada e criticada em 1980 com a publicação do livro de BLAKBOURN e ELEY (1984); para uma discussão a respeito, ver MOMMSEN, 1995, cap. 11; para uma resenha historiográfica recente, ver LEDFORD (2003); ou FEUCHTWANGER (2002); o debate a respeito do Sonderweg engloba, em grande medida, as diversas formulações da “Questão Alemã”, e tem sido fortemente dirigido a uma formulação contemporânea em particular, sumarizada por DAHRENDORF: “Why is it that so few in Germany embraced the principle of liberal democracy?” (1968, p. 14); ou por KITTELSON: “...why Germany failed to develop by the late nineteenth century into a liberal society along the models of western Europe.” (1986, p. S124); para outras formulações da “Questão”, ver o capítulo 1 de DAHRENDORF (1968); 24 Esta “tradição” não é, porém, exatamente particular à Prússia, orientando, de fato, as pesquisas a respeito da formação dos Estados Nacionais em geral: “The alternatives of autocracy, federalism, or oligarchy which clearly differentiated European political systems in the nineteenth century were forming in the class alliances made by the state makers of the previous three centuries.” (TILLY, 1975b, p. 77); no caso da Prússia, a principal referência é o livro clássico de ROSENBERG (1958) onde o autor desenvolveu a chamada “teoria do compromisso”, baseando-se especialmente no Acordo de 1653 (ver à frente), segundo a qual os Governantes Hohenzollern teriam realizado uma espécie de “pacto” com a Nobreza Junker “sobre” o campesinato para 12 limitado. Qualquer tema, portanto, que fuja aos objetivos acima expostos, assim como os debates historiográficos “tradicionais” supra citados, estarão ausentes, apresentando, sempre que possível, suas principais referências bibliográficas. Foram elaborados, porém, três Apêndices contendo informações gerais adicionais a respeito da estrutura política do Sacro Império Romano (Apêndice 01), da evolução dinástica da Casa Hohenzollern (Apêndice 02) e da sucessão dos principais representantes da Dinastia (Apêndice 03) para auxiliar a narrativa. Com o objetivo de localizar geograficamente os temas tratados, foram preparadas figuras esquemáticas representativas, cuja metodologia de elaboração encontra-se no Apêndice 04. Quanto às referências, foram selecionadas obras em língua inglesa e portuguesa preferencialmente ao alemão, não apenas pelas limitações da autora, mas igualmente por entender que a maioria do público da ciência econômica no Brasil não domina aquele idioma. garantir a construção do Estado Prussiano; esta é semelhante à tese de ANDERSON (1989); ou de MOORE, Jr. (1983); para sua crítica, ver HAGEN (1989); 13 CAPÍTULO 1: A CONSTRUÇÃO E A EXPANSÃO TERRITORIAL DO ESTADO PRUSSIANO O objetivo deste capítulo é, no âmbito da proposta geral desta pesquisa, investigar o processo de construção e expansão territorial do Estado Prussiano, especialmente a partir do Tratado de Westphalia. Seu primeiro passo, portanto, será o de “apresentá-lo”, no contexto da estrutura política do Sacro Império Romano ou, mais geralmente, da Europa Central de meados do século XVIII. 1.1 – O Estado Hohenzollern: 1648 Formalmente, a “Prússia”, em 1648, designava o território que se estendia desde o Brandemburgo até aproximadamente o Rio Niemen, e que fazia parte do então Reino da Polônia. O território estava dividido em duas porções: a Oriental (denominada “Prússia Ducal” ou “Ducado da Prússia”), sob posse da Dinastia Hohenzollern como feudo do Rei da Polônia; e a Ocidental, ou o “Reino da Prússia”, parte do Reino da Polônia. Foi apenas, como será visto, em função de uma “manobra” diplomática de Frederico I (1688-1713), então Margrave1 do território do Brandemburgo e Eleitor do Sacro Império Romano, que o nome passaria a estar associado, a partir de inícios do século XVIII, a todas as possessões da Dinastia Hohenzollern2. 1 A denominação de “Marca” e, conseqüentemente, de Margraviado (Markgraf = Mark + Graf = “Conde de Marca”) aplicava-se em geral a territórios localizados nas fronteiras do Império; 2 HAFFNER (1998, p. 5); porém, para ROSENBERG: “As late as the mid-eighteenth century, it was only in the language of international diplomacy that the ‘Prussia’ (la Prusse) denoted all the territorial possessions of the Hohenzollerns. In domestic parlance the formula ‘His Royal Majesty’s States and Provinces’ was then still in general use. (...) Not before 1807 did ‘Prussia’ become the official name of the Hohenzollern monarchy as a hole.” (1958, pp. 27-28); BE RG WÜRTTEMBERG TIROL Ansbach BAVÁRIA Bayreuth BOÊMIA ÁUSTRIA SI A IMPÉRIO OTOMANO A RI NG U H REINO DA POLÔNIA DUCADO DA PRÚSSIA FIGURA 1: POSSESSÕES DAS PRINCIPAIS DINASTIAS DA EUROPA CENTRAL: 1648 SUÍCA BADEN PALATINADO HESSE SAXÔNIA BRANDEMBURGO POMERÂNIA ORIENTAL LÉ TRIER JULICH WESTPHALIA MARK BRUNSWICK MECKLENBURGO POMERÂNIA OCIDENTAL ÁLT RB MA SI FRANÇA LIÈGE CLÉVES PAÍSES BAIXOS UNIDOS M E ORT ON D AR DINAMARCA ICO EUROPA ÁSIA ® LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA POSSESSÕES SUECAS Seculares POSSESSÕES WITTELSBACH Eclesiásticas POSSESSÕES WETTIN Culmbach POSSESSÕES HOHENZOLLERN Brandemburgo Austríacos Espanhóis POSSESSÕES HABSBURGO Limites do Sacro Império Romano LEGENDA 14 15 A Figura 1 indica que as possessões Hohenzollern em 1648 eram modestas se comparadas, por exemplo, às da Dinastia Habsburgo. De fato, os Habsburgo não apenas detinham o maior território, como sucessivamente elegiam o Sacro Imperador Romano3. De relativa importância, igualmente, eram os territórios eclesiásticos e aqueles associados às Dinastias Wettin e Wittelsbach4; e embora os Hohenzollern possuíssem, enquanto Margraves do Brandemburgo, um voto na Eleição Imperial, sua importância política no contexto da Europa Central era bastante reduzida. O “Estado Hohenzollern”5 era formado por um conjunto de territórios pertencentes ao Império6 e pelo Ducado da Prússia. Com exceção do Margraviado do Brandemburgo, os territórios ou tinham sido “recebidos” naquele mesmo ano a partir dos acordos do Tratado de Westphalia – a Pomerânia Anterior, Halberstadt e Minden – ou a Dinastia não possuía sobre aqueles soberania em sentido estrito – Ravensberg, Mark e Cléves ainda em disputa dinástica, e o Ducado da Prússia com a atribuição de “feudo” da Polônia. É necessário, portanto, compreender que características associavam os Hohenzollern a cada um de “seus” territórios e, em especial, o que significava, em termos políticos, a titulação de Margraves do Brandemburgo. Por um lado, pela estrutura política formal do Sacro Império Romano (ver Apêndice 01), não existia nenhuma autoridade entre o representante de um Estado Territorial como o Brandemburgo e o Imperador. O Margrave possuía, em princípio, direitos plenos sobre os territórios, garantidos pelo Landeshoheit7 sobre aqueles. Na prática, porém, esta soberania era limitada por uma estrutura real de poder que caracterizava não apenas o Brandemburgo, mas também a maioria dos territórios germânicos: 3 Entre 1438 e a dissolução formal do Império em 1806, efetivamente todos os Imperadores foram Habsburgo, com exceção de três anos durante a Guerra de Sucessão Austríaca (ver à frente); 4 Para uma comparação das estruturas históricas de poder das três dinastias, ver ANDERSON (1989, pp. 252260); 5 Para evitar mal-entendidos, será utilizado doravante este termo para designar o conjunto das possessões territoriais daquela Dinastia; 6 Para a descrição detalhada destes e da forma pela qual foram “adquiridos” pela Dinastia, ver o Apêndice 02; 7 “(...) perhaps best translated as 'territorial lordship', an authority recognized neither formally nor informally as conferring true sovereignty on the territorial rulers of the Empire, but which approached that position more and more closely from the sixteenth century onward.” (GAGLIARDO, 1991, p. 12); para ROSENBERG (1958, p. 27), porém, a posse do Landeshoheit, no contexto do Sacro Império Romano, “(...) merely meant that they possessed the legal title to the dynastic domain in these territories and held also certain customary rights of limited government over polities which until then had been organized as independent Ständestaaten”; para uma análise das relações entre os Estados do Império (Reichsstände) e a estrutura de poder imperial, ver VANN (1986); 16 o chamado Standestaat8. A característica central deste “Estado” é precisamente a descentralização do poder político e seu parcelamento entre as diferentes Ordens ou Estamentos9 tradicionais, ou seja, a Nobreza, as Cidades Livres e o Clero. A reivindicação da soberania pelo governante central, neste contexto, é continuamente colocada em cheque pelos Estamentos, e sua efetivação depende, portanto, de seu poder frente àqueles10, que variou consideravelmente entre os diferentes territórios europeus ao longo dos séculos XV, XVI e XVII. Para o caso do território do Brandemburgo de meados do século XVII, os Estamentos se igualavam, na prática, à Nobreza, já que as Cidades Livres e o Clero haviam praticamente desaparecido como forças políticas do território (as primeiras, notadamente ao longo dos séculos XV e XVI, e o segundo especialmente como resultado da Reforma e da secularização das propriedades eclesiásticas em meados do século XVI)11. E, no que se refere à força política efetiva da Dinastia Hohenzollern vis-à-vis a Nobreza, a historiografia concorda majoritariamente com o seguinte diagnóstico: “In Brandenburg-Prussia in 1640 the nobledominated Estates had ruled the roost, and the powers of the Elector had reached their nadir” (FINER, 1975, p. 140)12 8 Esta é a definição de ROSENBERG para o termo: “In essence, the Standestaat was a corporate-aristocratic form of superficially centralized territorial rulership in which the elite of the patrimonial bureaucracy and the notables were the decisive forces. Both central and local government management were the preserve of a hereditary, pluralistic oligarchy which did not have, however, the character of a rigorously closed corporation. The princely ruler, himself regarded as a superior estate, was a primus inter pares.” (1958 , p. 11); 9 A tradução para a língua portuguesa mais comum do termo Standestaat é “Estado de Estamentos”; seguindo esta tradição, utilizar-se-á o termo “Estamentos” para designar o “stand” do alemão, que corresponde ao “estate”, do inglês; 10 “The result of this struggle was a kind of dual system, of checks and balances, between the prince and the estates of the territory. The main weapon of the Estates in this struggle was their right to grant or refuse ‘extraordinary’ contributions. The main weakness of the prince was their ever more inadequate financial and fiscal basis in a time of increasing governmental obligations, mounting expenditures and, with the beginning of the sixteenth century, a long price revolution. ” (BRAUN, 1975, p. 251); 11 Sobre a decadência política das cidades, ver especialmente CARSTEN (1954); esta não é, porém, uma “peculiaridade” do Brandenburgo ou das demais possessões Hohnezollern: “In the sixteenth and early seventeenth centuries, the government of, by, and for the landed aristocracy was the preponderant pattern of rulership in the east German principalities. Political status, rights, and freedom were functions of landowning.” (ROSENBERG, 1958, p. 31); para CARSTEN, ainda, esse é um fator essencial à compreensão de toda a história da Prússia e da Alemanha: “The most important factor in the social history of Brandenburg and Prussia, and of many other eastern European countries, was the decline of the towns and the subsequent rise of the nobility: it definitely separated the developments in the east from those in the west and created a boundary line between two different social systems.” (1954, p. 276); 12 ANDERSON assim resume a “situação” geral da Prússia à época da Guerra dos Trinta Anos: “Um enraizado sistema de Estados, sob o domínio da nobreza, vetou o desenvolvimento de um exército permanente e, virtualmente, de qualquer política externa, fazendo do Eleitorado um dos mais nítidos exemplos de um Standestaat descentralizado na Alemanha da Reforma.” (1989, p. 238); 17 Dentre as causas em geral sugeridas para justificar esta evolução13, uma das principais está associada ao relacionamento financeiro existente entre os Estamentos e o representante legal do Landeshoheit. Em termos fiscais, pelo menos até o século XVII, o princípio que orientava o Standestaat, tanto do Brandemburgo como dos territórios do Império em geral, era o de que as Casas Principescas, ou os Governantes Territoriais, deveriam “viver por sua própria conta”, ou seja, se sustentar, como qualquer outro membro da Nobreza, a partir dos recursos gerados em seus domínios diretos14. Tais recursos eram gerados especialmente por lucros das atividades econômicas, especialmente agrícolas, conduzidas no interior daqueles domínios, ou por rendas, monetárias ou em espécie, pagas diretamente por suas populações camponesas. No caso dos Governantes Territoriais, podiam ser complementados ainda por rendas advindas de certas prerrogativas e privilégios associados à soberania (os chamados regalia), tais como a mineração, a caça, o monopólio sobre a distribuição de certos produtos, o controle sobre o tráfego nas estradas, o direito de impor tributos sobre os judeus, e outros. A instituição de taxas adicionais, em princípio, era uma prerrogativa dos Estamentos que estes reservavam apenas para objetivos específicos, em geral militares, e por períodos limitados15. No caso do Brandemburgo, a prática de penhorar as propriedades e, com elas, os direitos associados à soberania havia sido amplamente utilizada ao longo dos séculos XVI e XVII para atender às necessidades financeiras dos Margraves. Os Estamentos, ou seja, a Nobreza, adquiriam, desta forma, não apenas propriedades, mas especialmente as funções “públicas” que estariam em princípio sob controle do Governante Territorial, ou seja, a Alta Justiça, as funções de polícia, de coleta de impostos, taxas e pedágios, etc16. Em outras palavras, tanto os 13 Para uma discussão geral destas, ver ANDERSON (1989, pp. 195-220); e CARSTEN (1954, caps. 1 a 4); “Deixando de lado seu papel como chefe militar, conquistador e distribuidor de novas terras, a base do poder social do suserano consistia nas posses de sua família, na terra que controlava diretamente e com a qual tinha que sustentar seus serviçais, corte e agregados armados. Neste respeito, o suserano não desfrutava de situação melhor que a de qualquer outro governante territorial.” (ELIAS, 1993, pp. 29-30); 15 “Up to the eighteenth century, the traditional concept of taxation, in theory if not in fact, evaluated tax collection as an ‘expedient in times of emergency and even an abuse which as soon as possible should be replaced by income from public property, particularly domains, and by voluntary contributions’.” (BRAUN, 1975, p. 244); 14 16 FAY (1964), comentando as necessidades financeiras de Joachim II, cita um acordo celebrado entre o Eleitor e os Estamentos em 1540: “The Estates assumed responsability for the debts to the extent of 850,000 talers, an enormous sum for those days. In return the Elector promised ‘to undertake no weighty matter, touching the weal or woe of the land, except with the previous advice and consent of the Estates’. He promised them a share in the government such as they had never before aspired to. He consented that the management of the debts that they assumed should be taken out of his own hands and placed under a committe representing the Estates.” (pp. 2324); alguns anos depois, em 1571, contra uma nova garantia financeira, dessa vez a partir da aprovação de 18 domínios quanto as funções associadas ao possuidor do Landeshoheit foram paulatinamente transferidas para a Nobreza como contrapartida de recursos financeiros. Por este processo, esta se tornou não apenas a detentora de fato da soberania sobre o território, mas igualmente a principal agente credora dos sucessivos Margraves, o que aumentava ainda mais seu poder de “barganha” em outras disputas envolvendo tal soberania. Desta forma, no Brandemburgo, em inícios do século XVII, a Nobreza “(...) and not the prince, were the real rulers of the country, controlling the finances and the administration, the Church, the universities, as well as all appointments in state and Church” (CARSTEN, 1954, p. 166)17. No que se refere à organização do Standestaat, os Estamentos se reuniam periodicamente em assembléias locais (Kreistage) nos aproximadamente 20 distritos ou “círculos” (Kreis) nos quais o território estava dividido. Nestes eram nomeados um ou mais diretores para cada distrito (Kreisdirectores), tanto para cuidar de seus interesses, como para supervisionar a coleta de impostos não militares (basicamente, o imposto sobre a terra levantado pelos nobres de suas populações camponesas e o imposto sobre a cerveja coletado das cidades). Anualmente, estes diretores se reuniam aos representantes das cidades e das fundações eclesiásticas para deliberar a respeito dos assuntos financeiros gerais do território. Além destas, o Eleitor ou os Estamentos podiam convocar as chamadas Dietas Gerais (Landtage), que reuniam os representantes de todos os Estamentos do território. É genericamente neste contexto, portanto, que se deve compreender a associação existente, em meados do século XVII, entre a Dinastia Hohenzollern e, não apenas o Brandemburgo, mas o conjunto de suas possessões. Segundo Rosenberg, um Standestaat dominado pela Nobreza era, com ligeiras graduações, o traço político marcante de todas as possessões Hohenzollern em 1648 (1958, p. 31). Apenas no Ducado de Cléves e no Condado de Mark, ou impostos a serem cobrados sobre as populações do campo e das cidades “... the Elector had to concede that the collection, administration, and expenditure of these taxes should be exclusively in the hands of the Estates. Thus, by the side of the Elector’s Treasury and fiscal agents there rose up a duplicate financial machinery (Ständisches Kreditwerk), with its own treasure chests, accounting and disbursing officials, and debt obligations, all managed by agents appointed by the Estates and totally independent of the Elector.” (p. 24); 17 Esse é o diagnóstico de ROSENBERG (1958, p. 30): “The mainspring of the Junker strength was the combination of large-scale landownership with the patrimonial possession of autocratic rights of local government. Local dominance was complete, for, in course of time, the Junker had become not only an exacting landlord, hereditary serf master, vigorous entrepreneur, assidous estate manager, and nonprofessional trader, but also the local church patron, police chief, prosecutor, and judge.”; 19 seja, nos territórios ocidentais ainda em disputa dinástica, o poder da Nobreza era contrabalançado por forças citadinas significativas. Em resumo, portanto: In 1619, there was no state of Prussia. There was a clutch of distinct territories – states if one wishes – which had all come, by the accident of hereditary descent, under the dominion of George William of the ruling line of the Hohenzollerns. (...) The central territory was Brandenburg (...) dominated by the nobles in the Estates which (...) succeeded in exercising control over all extraordinary taxation, over foreign policy, and even over the raising and administration of troops. (FINER, 1975, pp. 134-135) A estrutura de poder efetivo associada à figura do governante central, portanto, se e quando existia, restringia-se, como na maioria dos Estados do Sacro Império, especialmente à administração do patrimônio dinástico, não ultrapassando em abrangência os limites provincianos18. E, ao mesmo tempo, convivia com outras estruturas associadas aos poderes da Nobreza, especialmente no que diz respeito às finanças e à justiça19. 1.2 – A Evolução do Estado Hohenzollern: 1648-1806 Tomando como referência o ano de 1806, ou seja, aquele que assistiu, simultaneamente, à dissolução formal do Sacro Império Romano e à derrota militar do Estado Prussiano, o período que se inicia em 1648 para a “Prússia” pode ser caracterizado pela realização de dois processos relacionados: por um lado, o de centralização de poderes no interior de suas possessões em torno da figura do representante dinástico; e, por outro, de expansão territorial. Deve-se destacar, novamente, que estes processos não foram particulares ao Estado Hohenzollern: todos os Estados Dinásticos de relativa importância do Sacro Império Romano, com maiores ou menores graus de intensidade e sucesso, conduziram políticas daquela 18 “When the Thirty Years War engulfed Brandenburg and the other Hohenzollern possessions, no progress at all had been made towards their unification and the creation of common institutions. Inside each small principality the power of the Estates was too strong to be affected by a mere change of ruling house. (...) There was not one Hohenzollern state, but only a number of principalities which happened to have the same ruler but had no other bond between them.” (CARSTEN, 1954, p. 178); 19 “This meant a confusing and disastrous dualism in finance, which extended more or less throughout the government. The Estates eventually had their own troops, separate from those of the Elector; they even tried to pursue a foreign policy at variance with his. And they demanded a share in the appointment of the Elector’s officials. This division of control and duplication of machinery deprived the Elector of effective power in domestic legislation and foreign policy, and made Prussian policy especially vulnerable to foreign intrigue and even corruption.” (FAY, 1964, p. 25); 20 natureza. Ainda mais geralmente, pode-se compreender o fenômeno inserindo-o no contexto europeu do Absolutismo: Profound changes were taking place within the political shell of the Empire. They can be summarized in the phrase state-building. This had two meanings. It applied, first, to the physical expansion of a given territory through peaceful or non peaceful methods. (...) Secondly, it meant attempts by individual rulers to construct more centralized, rationalized states within their territorial borders. These efforts, part of a European-wide phenomenon of absolutism, involved the enlargement of state bureaucracies and were directed against intermediate institutions that stood between ruler and subject: nobility, churches, guilds, parliamentary estates. (BLACKBOURN, 1998, p.19)20 Anderson, ao analisar os determinantes do Absolutismo no oriente, embora atribua papel central à necessidade de construção de um aparelho de repressão da mobilidade rural,21 vincula-os igualmente às “pressões internacionais”: Foi a pressão internacional do absolutismo do Ocidente, o aparelho político de uma aristocracia feudal mais poderosa, que dominava sociedades mais avançadas, que forçou a nobreza do Leste a adotar uma máquina de Estado identicamente centralizada para poder sobreviver. De outra maneira, a superioridade militar dos exércitos absolutistas ampliados e reorganizados cobraria inevitavelmente o seu tributo, através da forma habitual de competição interfeudal: a guerra. (1989, p. 198) No que se refere ao Estado Hohenzollern, embora em geral compartilhando estes argumentos “gerais”, grande parte dos historiadores vê na busca pela centralização política e pela expansão territorial o caminho “racional” frente à situação “peculiar” daquele Estado, especialmente em função de sua divisão territorial e de sua vulnerabilidade a inúmeras ameaças externas: The task facing a prince in such a situation was obvious. He had to try to link up his geographically dispersed domains by somehow acquiring or conquering the territories separating them; and he had to transform individual domains with their own characteristics into a unified state. (HAFFNER, 1998, p. 20) 20 Os processos gerais do Absolutismo Dinástico, da “Segunda Servidão” no Leste e da “Crise Geral” do Século XVII (ver à frente) são em geral associados pelos historiadores: “In any case, the pathological end-phase of sixteenth-century economic growth created social and political instabilities issuing in the wars, demographic reverses, and ensuing economic stagnation or depression that, in the material realm, constitute the seventeenthcentury crisis. In the sphere of politics, the crisis manifested itself in conflicts that, in many European lands, found this steely resolution under a regime of absolutism. For those among the nobility allied to the Crown, this outcome spelled rescue and the rewards of office and patronage. For the peasantry, it entailed degradation through taxation and, in Europe east of the Elbe, tightened bonds of personal serfdom and redoubled seigneurial exploitation.” (HAGEN, 1989, p. 303); ver, igualmente, ANDERSON (1989, pp. 195-220); 21 “Foi, portanto, a constante preocupação senhorial com o problema da mobilidade de mão-de-obra no Leste o fator que esteve por trás de grande parte do impulso interno em direção ao absolutismo. (...) Um aparelho repressivo impiedosamente centralizado e unitário era uma necessidade objetiva para a vigilância e a supressão da mobilidade rural generalizada, em épocas de depressão econômica (...).” (ANDERSON, 1989, p. 208); 21 Em um contexto de Standestaat, como indica a citação anterior de Blackbourn, a centralização de poderes em torno da figura do Governante central é feita, em grande medida, em detrimento dos Estamentos22 e corresponde, portanto, à superação daquele “tipo” de Estado. De fato, Rosenberg (1958) distingue três tipos de Estados que se seguiram cronologicamente: o Standestaat, o Estado Absolutista e o Estado Liberal Moderno. O Estado Absolutista teria apresentado tipicamente duas etapas: a do Absolutismo Dinástico e a do Absolutismo Burocrático. Para o caso da Prússia, a transformação do Standestaat para o Absolutismo Dinástico estaria localizada precisamente no período que se seguiu à Guerra dos Trinta Anos, mais especificamente no período do Grande Eleitor (1640-1688)23. A causa central para o processo de construção do Absolutismo Dinástico Hohenzollern seria, portanto, diretamente a guerra: War almost inevitably leads to a great increase in the activity and power of the prince or the central government. Military efficiency necessitates increased taxes; and increased taxes mean new methods, new officials, and more centralized administrative institutions. So it happened that the Thirty Years’ War, and especially the Northern War, aided the Great Elector in building up a more unified administration and in establishing his absolutism at the expense of the Estates. (FAY, 1964, pp.53-4) 24, 25 22 “Before the period of state preeminence, power-wielding deliberative assemblies were acting at all levels of political life (...). Building strong Royal power meant co-opting, subordinating or destroying these institutions; that program absorbed a large part of the energy of seventeenth-century kings, and its outcome strongly affected the next phase of political history.” (TILLY, 1975b, p. 22); 23 Esta cronologia é semelhante a de BRAUN (1975, p. 268), FISCHER; LUNDGREEN (1975, p. 509) e FINER (1975, pp. 109-110); a definição de ROSENBERG para o Estado Absolutista é a seguinte: “Through this momentous usurpation of preponderant influence, backed up by superior military force, the Ständestaat gave way to an absolute state in the sense that the legal authority of the prince was released from the restraints which natural law, rivaling jurisdictions, old-standing customs, and the special liberties of the ruling groups had imposed upon him.” (1958, pp. 11-12); 24 “Above all, war and economic depression appeared to strengthen the case for concentration of power. Resources had to be mobilized, economic activity directed, and crown revenues increased to meet the cost of defence. All this made a higher degree of union the order of the day.” (ELLIOTT, 1992, p. 63); 25 Entre os anos de 1648 e 1806, como será visto doravante, o Estado Hohenzollern esteve envolvido diretamente em quase todos os conflitos militares europeus, além, naturalmente, da Guerra dos Trinta Anos: na Primeira e na Segunda Guerras Nórdicas (respectivamente, 1655-60 e 1700-21), nas chamadas Guerras de Agressão de Luís XIV (especialmente a Guerra Franco-Sueca de 1672-1679); na Guerra de Sucessão Espanhola (1701-13); na Guerra de Sucessão Austríaca (1740-8); na Guerra dos Sete Anos (1756-1763); na Guerra de Sucessão Bávara (chamada também de “Guerra do Tomate”, 1778-9); e nas Guerras Napoleônicas (apenas, porém, no período entre 1792 e 1795 e novamente em 1806); 22 A situação geopolítica particularmente delicada colocada aos territórios Hohenzollern a partir do Tratado de Westphalia potencializaria, ao mesmo tempo, aquelas motivações26. A Dinastia, através dos territórios sobre sua possessão, foi colocada no centro de todas as disputas políticas e militares européias relevantes: os três territórios do Reno ainda em disputa (Halberstadt, Cléves e Mark) a deslocavam em direção à arena francesa e, conseqüentemente, de todos os demais Estados europeus ocidentais; a manutenção da porção posterior da Pomerânia pela Suécia garantia a esta uma porta de entrada direta ao Brandemburgo; e, finalmente, com a manutenção polonesa da Prússia Ocidental, a Polônia ocupava todo o território entre as duas principais possessões Hohenzollern (o Brandemburgo e o Ducado da Prússia). Este posicionamento geopolítico tornava, portanto, prioritários à Dinastia o fortalecimento e a expansão militar27 e conseqüentemente a necessidade de desenvolvimento de uma máquina maior e mais eficiente de coleta e administração de seus recursos28. Ou seja, o princípio financeiro central do Standestaat, o de que as Casas Principescas deveriam “viver por sua própria conta”, tornava-se crescentemente irrealista frente às necessidades militares do Monarca, e, portanto, um novo “arranjo” entre as forças políticas “internas” deveria ser conduzido. Tais argumentos articulam-se fortemente à análise mais geral de Anderson, que vê na ameaça sueca o principal estopim do processo de desenvolvimento do absolutismo na Prússia: A construção do absolutismo prussiano a partir da década de 1650, por iniciativa do Grande Eleitor, constituiu em grande medida uma resposta direta à latente ameaça dos suecos: o exército permanente que seria a pedra de toque da autocracia Hohenzollern, e o seu sistema fiscal, foram aceitos pelos Junkers em 1653 para acudir a uma situação de guerra iminente no teatro do Báltico e para resistir aos perigos externos. (1989, p. 200) Ao mesmo tempo, as catástrofes econômicas e especialmente populacionais29 causadas pela Guerra dos Trinta Anos sobre os territórios Hohenzollern, aumentadas por recorrentes 26 “Thus Brandenburg found itself in two of the main war arenas, the Rhineland and the Baltic. Brandenburg had acquired lands of ‘great strategical importance’ that were ‘coveted’ by various European states, and had done this ‘without any military exertions’ of its own, of which, at the time, it was incapable.” (WALLERSTEIN, 1980, pp. 227-228); 27 “If the Elector Frederick William, who reigned from 1640 until 1688, was to continue to be a prince at all after the Thirty Years’ War, then he obviously needed an army.” (MEHRING, 1975, Parte II, seção 1, §18); 28 Mais geralmente: “The protective function (protectio) alone became an enormous burden for the princes when the feudal military system, which rested on the principle of clientship, decomposed in the Late Middle Ages and at the same time the costs for war and defense were being drastically raised by firearms and other innovations in warfare. To bear the costs of war out of the ordinary revenues of the patrimonium was for most of the princes simply impossible; even minor warfare heaped up debts and usually led to insolvency.” (BRAUN, 1975, p. 254); 29 De acordo com os dados de HAGEN (1989, pp. 314-315) para o Brandemburgo, em 1640, a população das cidades provincianas teria caído em 80% com relação aos números de antes da Guerra; no campo, a queda teria 23 epidemias de Peste e quebras de colheitas30, enfraqueceram a já precária situação financeira da Dinastia, na medida em que sua principal fonte de receitas, ou seja, a cobrança de tributos sobre as populações camponesas de seus domínios diretos, retraiu-se consideravelmente31. Battle, murder, starvation, and suicide had swept away more than half the population of Bandenburg. Fields went out of cultivation; roads and bridges were impassable; clipped and counterfeit coins drove out good money; and commerce decayed. Berlin (...) had only 6000 inhabitants in 1640 compared with 14,000 in 1618, Frankfort on the Oder 2000 instead of 12,000, and Preslau on the Pomeranian frontier 600 instead of 9,000! (...) The total number of the Great Elector’s subjects at his accession had shrunk from about 1,500,000 before the war to hardly 600,000 souls, about 240,000 in Brandenburg (including the New Mark), 260,000 in Prussia, and 100,000 in Cleves, Mark and Ravensberg. (FAY, 1964, p. 43)32 Em resumo, além de estar no centro das disputas européias, tendo que defender (e eventualmente disputar) um conjunto de territórios não contíguos frente a inúmeros vizinhos, atestadamente mais fortes, mais poderosos e belicosos, a conjuntura sem precedentes de despopulação no interior de suas possessões enfraquecia sobremaneira a situação financeira da Dinastia. Se um exército forte era portanto uma contingência, apenas um novo arranjo de forças internas, ou a superação do Standestaat, sobretudo no Brandemburgo, poderia viabilizá-lo. Por sua vez, quanto mais territórios fossem anexados aos domínios da Dinastia, maiores os volumes de pessoas e recursos disponíveis para formar aquele exército; o que, por sua vez, poderia aumentar ainda mais seu poder de extração de recursos financeiros frente aos Estamentos, e assim sucessivamente. Ou seja, uma “espiral” financeira-militar-expansionista33 sido de cerca de 90% nos distritos mais afetados e de 20 a 40% nos demais; em 1652, 50% das fazendas do Brandemburgo a oeste do Rio Oder estariam completamente desertas; assim como 50% das habitações do Neumark a leste daquele Rio em 1650; 30 Os registros de epidemias de Peste no território Brandemburgo indicam os anos de 1625, 1626, 1628, 1630-1, 1643 e 1648 como de especial severidade; 31 Segundo HAGEN (1989), estas receitas, sob a forma de rendas ou corvéias, eram cobradas antes da Guerra sobre seis mil propriedades; após os conflitos, o número de propriedades tributáveis caíra em 50%, o que representou uma queda em 2/3 nas receitas totais da Dinastia: “... in order for ‘the State’ to survive, the entire fiscal and financial organization had to be reformed; both the British and the Brandenburg-Prussia governments were in a state of bankruptcy.” (BRAUN, 1975, p. 268); 32 Falando a respeito da situação da “Alemanha” em geral no pós-guerra, GAGLIARDO comenta: “A sharp increase in municipal indebtedness -- much of it due to 'contributions' -- plagued many urban budgets for years and added its influence to that of the overall collapse of business activity in town and countryside as a cause for a drastic reduction in tax revenues which for a long time crippled the fiscal strength of government at all levels. It was a lesser but still bothersome problem for the fiscal system that good coins and precious metals had been removed from Germany throughout the war by the foreigners who fought on its soil, while much of what remained was hoarded.” (1991, p. 92); 33 Ou seja, sua transformação no que ELLIOTT denominou de “the eighteenth-century fiscal-military state” (1992, p. 70); 24 seria o caminho “racional” colocado a qualquer representante dinástico que estivesse no lugar de Frederico, Grande Eleitor, em 164834. Este argumento pode ser compreendido ainda observando a análise de Norbert Elias a respeito da “sociogênese do Estado” nos “casos” da França e da Inglaterra por volta dos séculos XII e XIII. Num contexto como o Europeu daquele período, onde as trocas eram ainda pouco desenvolvidas, ou em que um sistema monetário ainda não tinha alcançado um relativo grau de desenvolvimento: A Casa que dominava politicamente o território era também a mais rica no mesmo, detentora da mais extensa área de terra, e seu poder político diminuía caso o seu poder militar, que tinha origem no volume de receita produzida pelo domínio e número de servos e agregados, não excedesse o de todas as demais famílias de guerreiros da área. (1993, p. 90) Tal característica teria dado origem, naquele espaço, a um tipo de “processo social” no qual suas diferentes unidades políticas tendem à expansão territorial e à centralização, engendrando uma espécie de “luta de eliminação” e, portanto: (...) uma sociedade com numerosas unidades de poder e de propriedade de dimensão relativamente iguais tende, sob fortes pressões competitivas, para a ampliação de umas poucas unidades e, finalmente, para o monopólio (...). (1993, p. 93)35 No contexto do Sacro Império de meados do século XVII, portanto, o Estado Hohenzollern estaria apenas experimentando a realidade daquele “processo social”. O que Elias chama de “acidentes”, ou seja, a ausência de um herdeiro masculino em uma Dinastia, ou as qualidades pessoais individuais de certos representantes dinásticos, poderia acelerar ou retardar esse processo, mas não evitá-lo. **** O processo de centralização das forças políticas internas em torno do representante dinástico, no Estado Hohenzollern, consistiu, na prática, de três elementos relacionados: a construção de 34 Deve-se comentar, no entanto, que, embora estas circunstâncias possam ter sido exacerbadas no caso prussiano, nenhuma delas lhe era inteiramente exclusiva ou peculiar: “Todas as observações sobre o aumento geral nos dispêndios governamentais ou sobre as novas organizações para coleta de impostos, ou sobre a transformação das relações entre os reis e estados em princípio da Europa moderna continuam abstratas enquanto não se falar da importância central do conflito militar.” (KENNEDY, 1989, p. 75); 35 “Assim como, outrora, cada tribo era um constante perigo para as outras tribos, também hoje em dia, cada Estado representa um perigo constante para os outros Estados. (...) Um mecanismo de ameaça e medo recíprocos – chamo a isso um processo de dupla ligação – impele os Estados a tornarem-se mais fortes e mais poderosos do que outros, a fim de não serem por eles suplantados. Em particular, é um estado de coisas normais nas relações interestatais que os Estados mais fortes, em qualquer época dada, se envolvam 25 um aparelho burocrático “moderno”36 associado àquela figura; a manutenção de um exército permanente; e a ampliação dos poderes provincianos a todas as possessões dinásticas37. Se o período de Frederico, o Grande (1740-1786), é considerado como o zênite da expansão territorial Hohenzollern (ver à frente), o período fundamental no que se refere à centralização das forças políticas internas é o que se inicia em 1648, até aproximadamente 1725, sob Frederico, Grande Eleitor (1640-1688), Frederico I (1688-1713) e Frederico Guilherme I (1713-1740). Como dito, o “costume” no território do Brandemburgo era o de taxas ou impostos “extraordinários” serem aprovados pelos Estamentos apenas por períodos limitados e com funções específicas, notadamente situações concretas ou potenciais de guerra. Com o prolongamento da Guerra dos Trinta Anos, tais cobranças foram sucessivamente aprovadas no território, a ponto de se tornarem praticamente regulares. O sistema de arrecadação, porém, continuava sob seu controle, e os membros da Nobreza permaneciam isentos dos pagamentos. Com o fim dos conflitos em 1648, os Estamentos imediatamente reafirmaram seu direito “costumário” de decidir acerca das cobranças e de associá-las apenas a situações extraordinárias; e, portanto, as demandas recorrentes do Eleitor, nos anos de 1650 e 1651, para a reinstalação dos impostos militares, sobretudo em função das disputas de fronteira com a Suécia no recém adquirido território da Pomerânia Oriental, foram sucessivamente negadas38. mutuamente em lutas hegemônicas – em parte apenas porque vivem no medo constante uns dos outros.” (ELIAS, 1997, p. 164); 36 O adjetivo esta sendo utilizado apenas para diferenciar a “nova” burocracia daquelas associadas tipicamente ao Standestaat, ou seja, de caráteres essencialmente patrimonial e provinciano; 37 Novamente, esta não é, porém, uma “peculiaridade” do Brandenburgo: “These petty absolutisms, whose sole object was self-glorification, rested on the twin pillars of the administration and the army, with moral support from the church. The Thirty Years War had created a soldiery which the princes took care to retain on a permanent footing after peace was restored. Thus the standing army made its first appearance in Germany as a basis and support for local absolutism; in international politics the independent value of the petty armies of the German princes was negligible, but they were useful for securing stability and obedience at home. Hence all liquid capital available, when the voracious needs of princely pomp had been satisfied, was applied to building up armies and bureaucracies. It was to finance the administration and the military system that more and more rigorous taxation was imposed after 1650, because the administration and the army were the instruments through which the princes reduced their subjects to tutelage. The multiplication of bureaucracies was a mark of the times.” (BARRACLOUGH, 1946, p. 390); 38 No que diz respeito às resistências dos Estamentos frente às invetidas financeiras dos Governantes Territoriais do Sacro Império Romano, BRAUN afirma que: “They had to be especially careful that their contributions to the expenditure of their ruling house and their provision of collateral for the princely debts would not lead to a precedent for legalizing an expansion of the dominium eminens in the absolutistic sense. This is why they opposed the princes’ attempts to institute unlimited compulsory levies and were willing to agree only to taxes of 26 O impasse se manteve até 1652, quando o Eleitor convocou uma Dieta Geral no Brandemburgo. Sua proposta inicial era bastante abrangente: não apenas a de que os fundos destinados ao exército fossem obtidos através da cobrança de impostos indiretos sobre certas mercadorias, mas igualmente a de uma reformulação geral no sistema financeiro do território, especialmente com a transferência das funções de coleta e administração fiscais para representantes diretos do Eleitor. Ambas as demandas, no entanto, foram veementemente rejeitadas pelos Estamentos. Um acordo só seria eventualmente obtido após a desmobilização da Dieta, em fins de 1653, o que fez com que ficasse conhecido como o Recesso do Landtag. Contra uma lista de exigências dos Estamentos, tratando especialmente de suas relações com as populações camponesas39, estes se comprometiam a levantar um fundo por seis anos para o exército. No que diz respeito à coleta e à administração destes recursos, nada foi alterado em relação ao “costume”, ou seja, elas continuariam sendo conduzidas pelos Estamentos que repassariam os fundos ao Eleitor. O Recesso de 1653 é uma das datas mais destacadas pela historiografia do Estado Hohenzollern, pois sua opinião geral é a de que, na prática, ele instalou, no território do Brandemburgo, a chamada “Segunda Servidão” (ver à frente). Porém, de importância igualmente notória é o fato de que, desde o Recesso, o exército do Estado Hohenzollern nunca mais seria desmobilizado. Os fundos garantidos pelo Acordo, porém, se mostraram rapidamente insuficientes para sustentar os custos militares da Primeira Guerra Nórdica (1655-60). Em 1656, portanto, o Conselho Privado do Eleitor se dirigiu aos Estamentos do Brandemburgo para a aprovação de novos fundos que foram, como rezava o “costume”, negados. Frente à negação, porém, o Eleitor “passou por cima” dos Estamentos e instruiu seus representantes a cobrar as taxas, se necessário pela força, diretamente das populações do território. O que pôde fazer com que, pela primeira vez de forma bem sucedida, o Eleitor “enfrentasse” os Estamentos no que diz respeito à cobrança de impostos foi a presença dos chamados limited duration. For the same reason they sought to grant only earmarked revenues, to control the collection and allocation of the contributions granted, and to develop their own fiscal administration.” (1975, p. 255); 39 Segundo MEHRING: “Not only the ‘customary’ services, duties and burdens, that is to say the actual ones, (and in one part of the Mark even they were undefined in law) but also advowson, seigneurial courts and the maintenance of public order fell into the hands of the Junkers.” (1975, Parte II, Seção 1, § 22); e ainda: “The 27 Comissários de Guerra (Kriegskommissare) no Brandemburgo. Ao longo da Guerra dos Trinta Anos, o Eleitor havia apontado alguns agentes locais nos diferentes distritos do território. Suas funções eram essencialmente militares: organização e treinamento de tropas, provisão de alimentos e uniformes, etc. Em alguns distritos, esses Comissários começaram, ainda durante a Guerra, a coletar diretamente os impostos militares aprovados pelos Estamentos. Com a paz em 1648, embora perdendo parte de suas funções, os Comissários não foram completamente desmobilizados e, portanto, em 1656, quando os Estamentos se recusaram a aumentar o volume dos fundos militares, estes agentes puderem ser utilizados para cobrá-los diretamente. Ao longo da Guerra Nórdica, o que parece ainda mais importante, este expediente começou a ser transferido para as outras províncias Hohenzollern. É aproximadamente deste período, ou seja, a partir da Primeira Guerra Nórdica (e, portanto, em acordo com a hipótese de Anderson anteriormente apresentada), que se podem identificar com maior clareza, por um lado, o início da “espiral” militar-financeira ascendente que levaria o Conde Mirabeau a afirmar que “Prussia was not a country which had an army, but an army which had a country” (citado em CHILD et al, 1959, p. 4); e, por outro, a forte conexão existente, desde os “primórdios” daquele Estado, entre a formação de uma burocracia e de um exército permanente associados à figura do representante dinástico. Os primeiros agentes efetivos que representavam o poder central no Brandemburgo possuíam funções puramente militares e, em tempos de paz, financeiras, mas ainda com vistas a garantir fundos militares. E foi especialmente através destes agentes que a estrutura de poder do Estado se desenvolveu: (...) the organs of financial administration that were developed for the army’s support soon came to form a centralized and efficient civil service. This gradually supplanted the various lax and decentralized agencies that had been managed by the Estates. By the time of the Great Elector’s death, his absolutist officials had pretty generally taken the place of the particularistic agents of the Estates. So the two main pillars of the Prussian state arose side by side: the standing army and the civil service. (FAY, 1964, pp. 69-70) Aos poucos, não apenas no Brandemburgo mas em todas as províncias Hohenzollern, a figura dos Comissários de Guerra começou gradativamente a se confundir, em suas funções, com a dos antigos Diretores Distritais nobres40. Desenvolvimento semelhante ocorreu, ainda com Brandenburg Diet decision of 1653 made the Junkers petty king on their estates, with their own judiciary and police powers, and things were even worse elsewhere.” (HAFFNER, 1998, p. 22); 40 Os antigos organismos de poder associados à Nobreza nas áreas rurais são denominados genericamente de Regierungen em analogia aos officiers franceses; FISCHER e LUNDGREEN comentam que: “... the development from the rule of Estates toward absolute monarchy can be described ... by the gradual reduction of the old Regierungen to purely judicial matters in favor of the gradual expansion of the War and Domains Chambers (Kammern and Kommissariaten) in size and tasks.” (1975, p. 511); ver à frente; 28 maior intensidade, nas cidades. Pelos termos do Acordo de 1653, estas seriam responsáveis por arrecadar 59% do Fundo prometido ao Eleitor. Inicialmente, tanto os impostos diretos quanto os indiretos eventualmente instituídos eram cobrados pelas autoridades urbanas e repassados ao Eleitor. Como freqüentemente as cidades não conseguiam atingir o valor acordado, o Eleitor começou, a partir de meados dos anos 1670, a apontar representantes oficiais para coletá-los, chamados comissariius loci (Steuerkommissare). Esta figura, paulatinamente, tendeu a incorporar, assim como os Comissários de Guerra no campo, outras funções de governo direto sobre as cidades, “depriving the towns of the oligarchic selfgovernment and political power which they had enjoyed since the Middle Ages.” (FAY, 1964, p. 57). Os poderes dos Steuerkommissare nas cidades chegaram a ser formalizados (o que não ocorreu para os Kriegskommissare no campo) por um Decreto dinástico de 1689, que incluía, entre outros, o controle dos preços dos alimentos, o estabelecimento de pesos e medidas e a regulação sobre o tráfego das estradas e rios navegáveis41. Finalmente, o sistema de Comissários também foi estendido, ao longo da Primeira Guerra Nórdica, aos domínios do Eleitor, especialmente para coordenar e administrar as taxas de caráter militar, através dos Amtkommissariat. Foi desta forma, ou seja, através de Comissários responsáveis por arrecadar receitas militares, no campo, nas cidades, e nos domínios diretos da Dinastia, que a centralização política e administrativa foi conduzida nos territórios Hohenzollern. Gradativamente, o Eleitor podia fortalecer “seu” exército e, com isso, aumentar ainda mais seus poderes de coleta de recursos financeiros. Com uma estrutura assim montada, a passagem para um sistema administrativo centralizado e geral, pelo menos no que diz respeito aos assuntos militares, veio quase como conseqüência direta. Essa passagem, de fato, se iniciou ainda durante a Guerra, quando o Eleitor apontou um Comissário Geral de Guerra (Generalkriegskommissar) para supervisionar todo o exército Hohenzollern. Foram apontados, igualmente, Oberkriegskommissare para Cléves e para a 41 Antes desta data, em 1680, o Eleitor havia tornado obrigatórios os impostos indiretos nas cidades; comenta-se que foi precisamente através da instituição de uma estrutura fiscal diferenciada entre o campo e a cidade (impostos diretos versus indiretos) que o Eleitor teria conseguido “quebrar” o Standestaat: além das assembléias locais, os Estamentos em geral só se reuniam para discutir questões fiscais de todo o território, ou quando este estivesse ameaçado; ao se instituir o sistema fiscal diferenciado, o sentido das assembléias gerais dos Estamentos foi praticamente esvaziado; o Eleitor poderia, doravante, discutir separadamente com cada um dos Estamentos através de suas assembléias locais; de fato, a Dieta de 1652 foi a última de caráter geral a se reunir no Brandemburgo; 29 Prússia e, após o fim dos conflitos, tais agentes foram mantidos42. Em 1680, finalmente, o Eleitor colocou todos os Comissários assim distribuídos pelos territórios sob supervisão de um único órgão, que se transformaria na instituição central de seu governo: o Generalkriegskommissariat (Comissariado Geral de Guerra), responsável por todos os assuntos militares (recrutamento, provisão, treinamento, entre outros) e pela administração dos impostos de caráter militar. O órgão, localizado em Berlim, dispunha dos Oberkriegskommissare em cada província e estes de seus oficiais diretos: os Kreiskommissare nos distritos rurais, os Steuekommissare nas cidades, e os Amterkommissare nos domínios diretos da Dinastia. No que se refere à administração das receitas civis43, esta só seria centralizada em um único órgão em 1713, no Reinado de Frederico I, com a criação do Diretório Geral das Finanças (Generalfinanzdirectorium). Portanto, nos primeiros anos do Rei Soldado (1713-1740), duas estruturas centrais distintas de administração, com abrangência a todas as províncias Hohenzollern, co-existiam: o Generalkriegskommissariat, responsável por todos os assuntos militares; e o Generalfinanzdirectorium, responsável pela administração financeira dos domínios dinásticos. Além destes, os assuntos externos eram tratados diretamente pelo Rei junto a um grupo de conselheiros especialmente designados para tal (o chamado Cabinetemministerium), e as questões eclesiásticas e jurídicas pelo Departamento de Justiça. Frederico Guilherme I, de fato, seria o grande articulador da burocracia Hohenzollern, como se manteria até 1806, ao unificar, em 1723, os dois órgãos administrativos em um único corpo através da fundação do General-ober-Finanz-Kriegs-und Domänen-directorium (Diretório Geral das Finanças, dos Domínios e da Guerra), ou, abreviadamente, o Generaldirectorium. Quando de sua formação, o Diretório foi estruturado em quatro departamentos, com características tanto funcionais quanto regionais: i) Prússia e Pomerânia; Fronteiras e Agricultura; ii) Minden e Ravensberg; Orçamento Geral; iii) Brandemburgo, Magdeburgo e Halberstadt; Exército; iv) Cléves-Mark, Neuchatel, Moers e Geldern; Sistema Postal e Cunhagem de moeda. 42 Esta “evolução” foi igualmente influenciada pelo novo envolvimento militar da “Prússia”, na Guerra FrancoSueca, como comenta ANDERSON: “Até então, a evolução do absolutismo brandenburguês seguira uma via administrativa semelhantes à das primeiras monarquias ocidentais. A eclosão da guerra de 1672-78 marcou uma súbita e decisiva virada. Com efeito, o Generalkriegskommissariat começou então a comandar quase toda a máquina do Estado.” (1989, p. 244); 43 Em todo o período sob estudo, tanto a coleta quanto a administração de receitas e despesas civis e militares do Estado Hohenzollern foram mantidas rigorosamente separadas, pelo receio dos sucessivos Eleitores de que os fundos militares fossem desviados para outros fins que não o exército; 30 Cada departamento era encabeçado por um “ministro” que se reunia pessoalmente com o Rei uma vez por semana, e nenhum possuía poder executivo independente dos demais. Substituindo os antigos Steuerkommissare e os Kriegskommissare no campo, foram criadas as Câmaras de Guerra e Domínios provincianas, compostas de conselheiros com o status de Comissários; em nível local, as Câmaras eram representadas pelos Steuerräte nas cidades e pelos Landräte nos distritos rurais. Ou seja: Frederick William I welded into a single hierarchical system the older offices, concerned with the administration of the dynastic estates and the traditional regalian rights, and the new military-fiscal agencies of the absolute state. He reorganized the whole machinery of executive royal power on the central, provincial, and local level. As chief organ of central administration he founded the collegiate General Directory, headed by four ministers who were supervisors, nor directors of the state’s bureaucratic activity. The transformation of the Hohenzollern principalities into administrative provinces found institutional expression in the newly established Boards of War and Domains. (ROSENBERG, 1958, p. 39) A característica central daquela estrutura, como se nota, era seu caráter exclusivamente financeiro e militar44. No que se refere à maioria das demais funções consideradas “públicas”, a estrutura de poder Hohenzollern alterou em poucos aspectos as características típicas do Standestaat, ou seja, aquelas continuaram, em grande medida, sob controle dos “Estamentos”, especialmente da Nobreza45. Deve-se destacar, porém, que a penetração dos representantes do poder central nas funções “públicas” antes desempenhadas pelos Estamentos variou no que se refere às regiões rurais vis-à-vis as urbanas. Como dito, os poderes autônomos dos órgãos citadinos já estavam, na Europa Oriental de meados do século XVII, bastante enfraquecidos. Naquelas, portanto, a penetração dos órgãos do governo central foi bastante superior à observada no campo46: 44 Falando a respeito do Diretório Geral, DORN comenta: “With the exception of foreign and judicial affairs, its sphere of competence embraced everything which in the modern state has been assigned to the various ministries. As was inevitable in eighteenth-century Prussia the Directory’s most important functions were financial: it superintended the collection of taxes, granted remissions when necessary, and prepared and controlled provincial and municipal budgets. No less important was the profitable exploitation of the extensive royal domains, which in 1740 constituted one fourth of all the land of the Prussian monarchy and yielded one third of the entire public revenues.” (1932, p. 77); 45 “(...) the newly devised monarchical machinery of domination supplement rather than supplanted the old organs of executive government. The Junker-directed Regierungen, the courts of law, and the existing ecclesiastical authorities were encroached upon but retained. (...) The ‘Prussian’ government did not swallow up the local authorities of the countryside. In altered forms, therefore, the dual structure of the Ständestaat lived on in the Prussian body politic.” (ROSENBERG, 1958, p. 43); 46 Criou-se, a partir deste elemento, a analogia de que o Estado Prussiano se sustentava sobre duas “pernas” de tamanhos diferentes: a maior atingia, nas cidades, até seu último habitante; no campo, terminava nos Landräte: “The power of the monarch and the bureaucracy and, thus, of the dynastic state ended with the semibureaucractic Landrat.” (ROSENBERG, 1958, p. 39); 31 The Landrat was the director of the district assemblies of the Estates (Kreis-Direktor) in preabsolutist days; (...) When the standing army was established he gradually shifted towards a semi-royal servant, being charge of commissary affairs... But he never gave up his connections with the landed squirearchy of which he remained the first among equals. Thus he remained a mixture between royal servant and Estates’ representative... The King of Prussia did not more than approve a list of candidates out of which the Landrat was elected by the nobility. (FISCHER; LUNGREEN, 1975, p. 514)47 Se o período de Frederico Guilherme I, com a formação do Diretório Geral, é fundamental no que se refere à criação de uma estrutura de administração centralizada e de um exército permanente estruturado na “Prússia”, o período imediatamente posterior, de Frederico, o Grande (1740-86), é tipicamente aquele em que o Estado se expandiu vertiginosamente em termos territoriais. De fato, embora as alterações formais observadas na estrutura acima apresentada tenham sido modestas, e o Diretório Geral tenha se mantido como órgão central do Estado Hohenzollern até 180648, alguns comentários a respeito da forma como a política dinástica foi conduzida “internamente” entre 1740 e 1806 são fundamentais para a compreensão dos rumos que tomaria aquela estrutura a partir em 1807. Pois, para Rosenberg, este período corresponde precisamente à transformação de um Absolutismo “Dinástico” em um Absolutismo “Burocrático”: Everywhere, earlier or later, dynastic absolutism was superseded by bureaucratic absolutism before the absolute state itself was seriously challenged by modern liberalism. (...) In Prussia this development did not become clearly discernable before the latter part of the eighteenth century. (...) At the dawn of the nineteenth century (...) [t]he administrative servants of the 47 Ou ainda: “In theory, the Landrat’s official task was to harmonize the objectives of the central government with those of the local Junkers Landowners. In action, he usually was loyal to his class and acted as the trustee of the landed aristocracy, without neglecting, however, his personal affairs and self-interests.” (ROSENBERG, 1958, p. 167); é neste aspecto, ou seja, na fraca penetração do interesse dinástico nos “assuntos” da Nobreza, especialmente em seu relacionamento com as populações camponesas, que alguns historiadores identificam o motivo pelo qual a Nobreza teria “permitido” a expansão do poder dinástico Hohenzollern; ver, a respeito, especialmente MEHRING (1975); vale citar, porém, as observações de SEELEY a respeito das Câmaras de Guerra e Domínios: “The War and Domains Chamber had been originally, as its name imports, charged with the affairs of the Domains, the principal source of revenue, and of the Army, the principal object of revenue; in other words, it had been mainly financial. But in the course of time, as a convenient nucleus, it had gathered to itself most of the functions of Local Government. In particular it had acquired a judicial as well as an administrative character. All matters connected with the financial administration or with rural police were brought before the Justice Deputation of the Chamber, which was distinct from the Financial Board and consisted of persons learned in the law. At the same time the Chamber exercised in most parts of the Monarchy a tutelage like that of the French Intendants over the affairs of the localities.” (1879, p. 476); 48 Frederico, segundo GAGLIARDO, “could afford the luxury of only fine-tuning the governamental and administrative system he had inherited.” (1991, p. 321); ou ainda: “The Great Elector and Frederick William I had been fertile in creating new institutions and in organizing the resources of their lands. Frederick the Great added valuable new lands, but created little that was new in the way of institutions, being content to use and develop those that he inherited.” (FAY, 1964, p. 126); 32 crown finally succeeded in curtailing the arbitrary powers of the king and in making him the political prisoner of the ruling class. (1958, p. 18-23)49 Para Rosenberg, o estímulo inicial para esta transformação surgiu da forma pela qual as questões de Estado foram conduzidas por Frederico, o Grande, especialmente no relacionamento com a “sua” burocracia. Em uma palavra, Frederico esteve permanentemente desconfiado de seus representantes, especialmente daqueles do Diretório Geral, tanto no que diz respeito à sua eficiência quanto à sua honestidade e, portanto, levou ao limite extremo o caráter autocrático de seu governo. Estas iniciativas excessivamente autocráticas, por sua vez, teriam estimulado, para Rosenberg, o “descolamento” da burocracia com relação à Dinastia, causando posteriormente, em inícios no século XIX, a transformação supra citada. Frederico, em primeiro lugar, utilizou exacerbadamente o “Governo de Gabinete”, ou seja, a prática, inaugurada ainda por seu antecessor direto, de que todas as decisões políticas relevantes fossem tomadas direta e isoladamente pelo Monarca em seu Gabinete50 e encaminhadas aos órgãos burocráticos através de ordens escritas51. Ao mesmo tempo, Frederico criou sucessivamente novas “funções” ou “órgãos” de governo com os quais mantinha relações diretas, “passando por cima”, portanto, do Diretório Geral. Com isso, não apenas evitava que qualquer departamento possuísse independência e agisse enquanto um corpo administrativo autônomo, como destruía o caráter essencialmente colegiado do Diretório. Como aponta Dorn: 49 O “atraso” identificado por ROSENBERG para o caso da Prússia nesta transformação é justificado da seguinte forma: “At the helm of the Prussian absolute state, prior to the French Revolution, stood three men who for long periods ruled autocratically in person: the Elector Frederick William, later called the Great Elector (16401688), King Frederick William I (1713-1740), and Frederick II, better known as Frederick the Great (17401786).” (1958, p. 19); o autor não apresenta em sua obra uma definição formal para o “Estado Moderno”, embora pareça identificá-lo diretamente a um Estado Liberal; finalmente, Rosenberg não define em que momento o Estado Prussiano teria atingido este último “estágio”; 50 É importante distinguir, porém, o que se costuma chamar de “Governo de Gabinete” do Cabinetsministerium já citado; tradicionalmente, os Monarcas ou Representantes Dinástico contavam com um Conselho (que, no caso da Prússia, denominava-se Conselho do Eleitor): “Created in almost all territories of any size by shortly before or after 1500, (...) it was a permanent body which met regularly according to a set schedule. (...) a major part of its business was judicial in nature and frequently involved nobles as litigants or petitioners. (...) Originally, the competence of the council extended to every aspect of the prince's territorial government, including not only justice and supervision of finances and the internal administration, but also war and foreign affairs.” (GAGLIARDO, 1991, p. 110); o Conselho tornou-se, ainda em 1604, o Conselho Privado do Eleitor (Geheimer Rat) e, ao longo do século XVIII, passou a ser chamado de Cabinetsministerium, concentrando-se quase exclusivamente em questões diplomáticas e de Política Externa; sua importância política cresceu especialmente no período após a morte de Frederico II e, com as Reformas de inícios do século XIX, seria extinto ou transformado no Ministério das Relações Internacionais (ver capítulo 3); 51 “He reserved to himself the supreme leadership and control of the administrative machine by pushing to the extreme autocratic direction from the cabinet, and by extending the employment of spies and informers.” (ROSENBERG, 1958, p. 168); ou ainda: “As a matter of practice (...) royal autocracy was carried to such an 33 Not content with the formation of special functional ministries, he proceeded to dissolve the collective solidarity of the General Directory itself, first by ordering individual ministers not to concern themselves with the other members of the General Directory, then by dealing with individual ministers rather than with this body as a collective unit.(...) After 1770 common decisions of the General Directory were the exception rather than the rule. (1932, p. 81) Em 1741, Frederico criou um ministério especial do Comércio que, por volta de 1769, se tornaria inteiramente independente do Diretório Geral. Outros “ministérios especiais” se seguiram: em 1742, para a Silésia; em 1746, para o Exército; em 1768, para as minas; e em 1770 para as florestas (extinto em 1786); em 1751, o Rei colocou a cunhagem de moedas sob um oficial especial que se reportava diretamente a ele; e fez o mesmo em 1766 com o banco e o monopólio do tabaco do governo. Havia ainda um departamento de selos, um para o monopólio da lenha e da madeira, o Seehandlung (uma companhia “mista” que funcionava simultaneamente como banco comercial e instituição financeira), entre outros52. Ainda mais importante, o Monarca frequentemente passava instruções diretamente aos antigos representantes do governo local nas áreas rurais (o Regierung) e urbanas, e, com isso, aqueles poderes, especialmente a Nobreza, experimentaram um período de relativa revitalização: Frequently, Frederick bypassed the Directory and also the other central agencies by giving orders directly to prominent members of the provincial and local administration or by appointing special commissars for special tasks. (...) Therefore he sanctioned the reemergence of non bureaucratic agencies of corporate self-government and a limited revival of the political influence of the noble landowners, as a group, in the affairs of the dynastic state. (ROSENBERG, 1958, p. 171) As relações do Monarca com “sua” burocracia parecem ter se deteriorado especialmente com a depressão econômica observada nos territórios Hohenzollern e a exaustão financeira de seu Estado após a Guerra dos Sete Anos. Em 1765, frente às resistências do Diretório Geral em conduzir uma reforma fiscal solicitada por Frederico, o Monarca apontou um oficial francês como chefe do Régie, um novo “órgão” que deveria, a partir de então, conduzir todos os assuntos fiscais e financeiros dos territórios. Em resumo, portanto: extreme that all important matters above the level of ordinary routine business were sent to the King for final decision even when the formal document had been issued by the General Directory.” (DORN, 1932, p. 78); 52 Uma reformulação do Diretório Geral foi introduzida em 1748 por Frederico, com a organização dos territórios Hohenzollern em dezessete Províncias Administrativas, cada qual com uma respectiva Câmara de Guerra e Domínio, subordinadas a Departamentos específicos do Diretório, da seguinte forma: Departamento I: Prússia Leste, Pomerânia e Neumark; Departamento II: a Marca do Brandemburgo e Magdeburgo; Departamento III: Cléves, Condado de Mark, Moers, Gueldern, Frísia Leste; Departamento IV: Halberstadt, Minden, Ravensberg, Tecklenburgo e Lingen; em 1766, os Departamentos III e IV foram fundidos em um, chamado de Departamento III; em 1771, o Ducado de Magdeburgo foi separado do Departamento II e passado ao III, de forma a que todos os territórios na margem esquerda do Elba ficassem submetidos àquele; 34 (...) Frederick (...) tried to curb the bureaucracy by a policy of making public administration by a single, unified group impossible. This he sought to accomplish by strenghtening the position of the established competing authorities; by breaking the central administration into many units; and by creating, through the medium of the Régie, a new rival authority. (ROSENBERG, 1958, p. 168) As conseqüências gerais dessa política, porém, não foram especialmente sentidas no período de Frederico, já que a rigidez de seu governo e sua dedicação completa ao Estado53 mantiveram a unidade e a coerência que haviam sido perdidas entre os inúmeros “órgãos” de governo54. Nos vinte anos que se seguiram, porém (ou seja, entre a morte de Frederico e a derrota militar do Estado Hohenzollern), nenhum instrumento de coordenação e homogeneização burocrática55 pôde servir à tarefa antes desempenhada diretamente pelo Monarca56. Foi exatamente neste período que se iniciou, portanto, a formação de uma “oposição” no interior da burocracia demandando reformas, especialmente na estrutura administrativa; e, quando a derrota militar de 1806 “devastou” o Estado Prussiano, foi especialmente sobre aquela que recaíram suas responsabilidades. Por este processo geral, portanto, Frederico teria “preparado o terreno” para a transformação identificada por Rosenberg do Absolutismo Dinástico para o Absolutismo Burocrático. As tentativas do Monarca, por um lado, de penetração nos poderes locais da Nobreza, e, por outro, de evitar qualquer transferência de poderes para a “sua” burocracia, levou apenas a uma exacerbação nas disputas entre estes grupos vis-à-vis o poder central, e a uma intensificação de suas identidades enquanto grupos políticos57. Seu poder real, portanto, frente a estes grupos tendeu a declinar paulatinamente na segunda metade do século XVIII. Com a morte de Frederico, e com a subida ao trono de dois representantes dinásticos sem o mesmo viés 53 GOOCH (1948, p. 41) comenta: “His state was so small and his energy so unflagging that for forty-six years he governed Prussia like no Hohenzollern before or after him. The Sovereign, he declared, was bound to act as if he had every moment to render an account of his stewardship to his fellow-citizens. He only slept for six hours. When his doctor ordered the old man of sixty-nine to cancel a journey of inspection, he replied, 'You have your duties and I have mine, and I will carry them out till my last breath.'”; 54 “Frederick’s method of governing proved, especially in the last twenty years of his reign, to be more and more an obstacle to the efficient working of the state apparatus. Every widow’s application for support, every officer’s promotion had to be decided upon him personally.” (WEIS, 1986, p. S190); 55 Citando apenas um exemplo, embora de grande importância no Estado Hohenzollern, ainda que Frederico tenha criado um “ministério” especial para o exército, existiam, em fins do século XVIII, cinco agências governamentais diferentes e autônomas relacionadas às questões militares (CRAIG, 1968, p. 29); 56 “Harmonious coordination of the central agencies of administration (...) was notoriously lacking in eighteenth-century Prussia. Such coordination and unity as there was, was not to be found in the central administrative organs themselves, but in the autocracy of the Prussian monarch.” (DORN, 1932, p. 75); 57 “The royal policy of playing off the landed nobility and the bureaucracy against each other resulted, in fact, in the formation of a united front against the arbitrary power of the crown.” (ROSENBERG, 1958, p. 196); 35 autocrático (Frederico Guilherme II e Frederico Guilherme III), o caminho estaria “livre” para a “vitória” política final da Burocracia (aliada, porém, à Nobreza58). **** Após considerar os processos de centralização política “interna” no Estado Prussiano e de construção de um aparato de poder associado à figura do Governante Central, trata-se neste momento de observar seus “resultados” no que se refere à expansão territorial daquele Estado. Deve-se, porém, inicialmente, alertar que a historiografia em geral não atribui essa causalidade inequivocamente, ou seja, o sucesso experimentado pelo Estado Hohenzollern na “arena” das disputas militares e diplomáticas da Europa no século XVIII não deve ser atribuído apenas aos esforços dinásticos de centralização e construção burocrática e militar. Pois, como dito, todos os Estados europeus em geral, e aqueles de maior importância no Sacro Império em particular, seguiram, em maiores ou menores graus, políticas “absolutistas” e militaristas59, 60. De qualquer forma, uma das alterações principais observadas entre 1648 e 1806 na composição e na distribuição de forças políticas do “clube” das Grandes Potências européias foi precisamente o ingresso de um novo Estado, a Prússia, mesmo que ainda como o seu mais fraco membro. Em 1648, como comenta Barraclough a respeito dos Estados do Sacro Império: The princes might be sovereigns in their own lands, unimpeded either by the emperor above or by the estates below, but -- excluding Austria -- none, not even Brandenburg-Prussia, was more than a second-rate power, and none was strong enough to adopt an attitude of independence in foreign affairs. (1946, p. 383) 58 Sobre o relacionamento entre a Nobreza e a Burocracia após 1786, ver ROSENBERG (1958, caps. 8 e 9); para ELIAS, de fato, esse é outro elemento fundamental à compreensão do desenvolvimento histórico da Prússia: “Surgiu assim uma constelação em que a nobreza se submeteu ao rei; os aristocratas serviam-no como oficiais, funcionários da corte e administradores. Mas, ao mesmo tempo, o rei também se submeteu à aristocracia; incumbiu-se de garantir a posição dela como o mais alto estado, ou classe política, do país. Esse pacto fez dele o protetor de privilégios aristocráticos.” (1997, p. 68); 59 Sobre o “militarismo” da Prússia, HAFFNER comenta que “admittedly Prussia was merely doing to an exaggerated degree what had become the universal usage in Europe at the time. Prussian militarism was no isolated phenomenon.” (1998, p. 47); 60 As causas mencionadas para o “sucesso” da Dinastia variam desde as habilidades individuais dos sucessivos Hohenzollern, especialmente de Frederico II (por exemplo, CHILD et al, 1959) até a situação geopolítica da Prússia no contexto europeu do período, especialmente por seu papel na disputa entre a França e a Inglaterra (por exemplo, SCHROEDER, 1996); 36 Em 1786, o ano da morte de Frederico, o Grande, a Prússia, embora ainda fosse experimentar a derrota militar de 1806, já se mostrava como, no mínimo, um aliado que as Grandes Potências não podiam dispensar, ou como um inimigo que não desejavam possuir. A expansão territorial do Estado Hohenzollern deu-se, na prática, através de um conjunto de manobras militares e diplomáticas, e relacionou-se, portanto, às disputas políticas que envolviam toda a Europa61. A Figura 2 apresenta a evolução desta expansão através de quatro Quadros cronológicos: o Quadro A, tratando do período entre 1648 e 1740; o Quadro B, correspondente ao período de Frederico, o Grande (1740-86); o Quadro C, entre a morte de Frederico e a derrota militar de Jena (1786-1806); e, finalmente, o Quadro D, que apresenta a configuração do Estado Prussiano após o Tratado de Tilsit em 1807. 61 Para uma descrição destas, ver KENNEDY (1996, cap. 3); 37 QUADRO A: 1648-1740 MAR QUADRO B: 1740-1786 O TIC BÁL PR 1679 E MAR DO NORT 1721 Elb MAR E MAR DO NORT Por Poc Fl a Lg MD Tc CL Gl Mo RV O TIC BÁL a El Ví st BR Oder PrOc Elb Od ul a Ví st ul er a MG HB MA o o n Re n Re Sl Territórios Hohenzollern até 1648 Ganhos Posteriores Territórios Hohenzollern até 1740 Tratado de Westphalia Aquisições territoriais do período QUADRO D: 1807 QUADRO C: 1786-1807 MAR O TIC BÁL MAR O TIC BÁL E MAR DO NORT E MAR DO NORT Elb Elb a a NPrE Ví st Od er Ví st Od ul a er ul a PrS no Re o n Re Bt Ab Territórios Hohenzollern em 1807 Territórios Hohenzollern até 1786 Aquisições territoriais do período LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA FIGURA 2: A EXPANSÃO TERRITORIAL HOHENZOLLERN: 1648-1807 CONVENÇÕES: Fronteira do Sacro Império Romano Principais Rios Fronteiras Territoriais TERRITÓRIOS: BR: Brandemburgo PR: Ducado da Prússia (1648) Por: Pomerânia Oriental MD: Minden HB: Halberstadt RV: Ravensberg MA: Mark CL: Cléves MG: Magdeburgo Mo: Moers GL: Geldern Superior Tc: Tecklenburgo Lg: Lingen Fl: Frísia Leste Sl: Silésia El: Ermland PrOc: Prussia Ocidental PrS: Prussia Sul NPrE: “Nova Prússia Leste” Ab: Ansbach Bt: Bayreuth EUROPA ® ÁSIA 38 O Estado Hohenzollern, em 1648, era composto de: o Margraviado do Brandenburgo, a Pomerânia Anterior, os Principados secularizados de Halberstadt e Minden, e o Ducado da Prússia, ainda como feudo da Polônia. A seqüência dos eventos que acompanha a evolução dos Quadros anteriores, sumarizada na Figura 3, pode ser resumida da seguinte forma: QUADRO A • A participação dos Hohenzollern na Primeira Guerra Nórdica (1655-60) leva, com o Tratado de Oliva62 em 1660, à libertação da suserania da Prússia com relação à Polônia63; • A herança reclamada pelos Hohenzollern sobre o Ducado de Julich-Berg seria resolvida em 166664, quando a Dinastia recebe então oficialmente os territórios de Cléves-Mark65 e de Ravensberg, que deveria ser administrado em conjunto com o bispado secularizado de Minden, como Minden-Ravensberg66; • Ainda como resultados do Tratado de Westphalia, a Dinastia recebe o Ducado secularizado de Magdeburgo em 1680; • Como resultado da participação Hohenzollern na Guerra Franco-Sueca (1672-9), uma das chamadas “Guerras de Agressão” de Luís XIV, a Prússia obtém uma pequena “franja” do território da Pomerânia, do lado direito do Rio Oder, sem incluir ainda o porto de Stettin; 62 Frederico, em 1656, entrou na Guerra do lado sueco, recebendo garantias de liberação da vassalagem da Polônia em caso de vitória; em 1657, com o enfraquecimento da Suécia, Frederico “troca de lado” e estabelece um novo acordo com a Polônia em termos semelhantes; para detalhes, ver STEINBERG (1945, pp. 131-132); 63 No que se refere à Primeira Guerra Nórdica, convém citar a seguinte passagem de KENNEDY: “But the outcome of the First Northern War provides a better clue to the final harvest of his closely interrelated foreign and domestic policies, for his attainment of full sovereignty over Prussia in 1660 merely symbolizes the real purpose and direction of his reign and its true achievement: the imposition of a genuine working sovereignty over all his dominions that would give them the character of a single state, if indeed a still geographically divided and imperfectly unified one, and would enable him to pass on to his son and successor an army and the outlines of an administration sufficiently strong and developed to keep it that way. Looked at from this perspective, foreign and domestic policy were simply different aspects of a single military policy which served the higher goal of state-building.” (1989, p. 300-301); 64 Segundo STEINBERG (1945, p. 130-131), o Eleitor teria invadido Julich em 1651 para “resolver” definitivamente a questão; o Ducado de Cléves, no Baixo Reno, e o Condado de Mark, na Westphalia, já estavam ocupados pelo Eleitor desde 1609 (ver Apêndice 02); 65 Tratavam-se de dois territórios separados: o Ducado de Cléves, no Baixo Reno, e o Condado de Mark, na Westphalia; 66 O território de Minden-Ravensberg seria unificado em 1719 e estaria sobre administração de uma Câmara de Guerra e Domínios específica a partir de 1723; 39 • Em 1701, a “Prússia” eleva-se à condição de “Reino”, a partir de uma manobra diplomática de “troca de favores” com o Imperador67; os Hohenzollern podem a partir de então se denominar Reis “na” Prússia, mas não “da” Prússia, na medida em que não era permitida a existência de “reinos” no interior das fronteiras do Império68; • Com a Guerra de Sucessão Espanhola, seguem-se outros ganhos territoriais, seja pelo reconhecimento de certos “direitos” hereditários solicitados e aceitos pelo Imperador (no caso do Condado de Moers, adjacente ao Ducado de Cléves, em 1702; e de Neuchatel, em 1707); seja pelos acordos do fim da Guerra (o Geldern Superior, em 1713); seja por compra (Lingen, em 1702; e Tecklenburgo, em 1707); • Em 1721, com a Segunda Guerra Nórdica (1700-1721), a Prússia anexa a porção ocidental da Pomerânia, incluindo Stettin. QUADRO B • Cinco meses após a elevação de Frederico II ao trono da Prússia, os Hohenzollern invadem e ocupam o território Habsburgo da Silésia sem uma declaração de guerra, iniciando, simultaneamente, a Primeira Guerra Silesiana entre a Áustria e Prússia (1740-42) e a Guerra de Sucessão Austríaca (1740-48), envolvendo a maioria dos Estados europeus; com a Paz de Breslau de 1742, assinada separadamente com a Áustria, a possessão sobre aquele território é garantida; • Frederico retorna ao conflito em 1744, iniciando a Segunda Guerra Silesiana (1744-5), numa manobra considerada em geral como uma “guerra preventiva” para garantir o território recém adquirido, ameaçado pelo fortalecimento da Áustria em sua Guerra de Sucessão; novamente, Frederico assina um acordo de paz em separado com a Áustria em 1745, nos mesmos termos do acordo de 1742; • Em 1756, Frederico ataca e ocupa, sem uma declaração de guerra, a Saxônia, iniciando a Guerra dos Sete Anos (1756-63); aquela não traria, a qualquer de seus participantes, alterações territoriais significativas; porém, através dela, Frederico 67 A motivação de Frederico e a disposição do Imperador em aceitar os termos do acordo parecem ter sido especialmente influenciadas pelo exemplo dado pelo Eleitor da Saxônia que se tornara, em 1679, ao abandonar o Protestantismo, Rei na Polônia (STEINBREG, 1945, p. 118); 68 O único Rei “do” Império era o Sacro Imperador Romano, o “Rei dos Germanos”, porém a Prússia não estava no interior de suas fronteiras; 40 garante definitivamente a Silésia, bem como a “elevação” de seu Estado ao “clube” das Grandes Potências européias69. • Em 1744, o Monarca reclama (e obtém) uma suposta sucessão ao território da Frísia Leste, que garante então aos Hohenzollern uma saída para o Mar do Norte; • A morte de Augusto III, Rei da Polônia e Eleitor da Saxônia, em 1763, iniciou uma crise política no território polonês, em que a Rússia esteve diretamente envolvida graças à tentativa de Catarina II de impor seu candidato à sucessão; frente aos avanços de Catarina sobre a Polônia nos anos seguintes, a Áustria e a Prússia conseguem, diplomaticamente, um acordo em 1772 para prevenir a dominação completa da Rússia sobre o território polonês, conhecido como Primeira Partição da Polônia; este traz aos Hohenzollern a Prússia Ocidental, com exceção de Danzig, e o Bispado de Ermland70; • Em 1777, com a extinção do ramo principal da Dinastia Wittelsbach, o Imperador Habsburgo estabelece um acordo com sua linhagem Paladina e ocupa, com uma alegação de sucessão, o território da Boêmia; Frederico declara guerra à Áustria, iniciando a Guerra da Sucessão Bávara (também conhecida como Guerra do Tomate, 1778-9); com o conflito, Frederico garante o direito à reversão dos territórios de Ansbach e Bayreuth para a Linhagem Brandemburgo dos Hohenzollern (o que ocorre em 1791), e evita uma maior expansão da Áustria sobre a Bavária; • Manobra semelhante foi conduzida em 1785, quando se tornam públicos os planos da Áustria de “trocar”, com a Dinastia Wittelsbach, os Países Baixos Austríacos pela Bavária; Frederico reúne em uma Liga dos Príncipes (Fürstbund) Hanover, Brunswick, Hesse e Mecklenburgo (e posteriormente também a Saxônia), supostamente para “defender” as instituições imperiais, e, sem a necessidade de qualquer confronto, evita a efetivação daqueles planos. 69 “(...) by winning Silesia, and proving his ability to retain it, he destroyed the old German constitution and raised Prussia to a position of virtual equality with Austria.” (CRAIG, 1968, p. 13); 70 É após a Primeira Partição que Frederico II teria mudado sua titulação de Rei “na” Prússia para Rei “da” Prússia e que o nome passaria a ser utilizado para designar todas as possessões Hohenzollern (STEINBERG, 1945, p. 152); 41 QUADROS C e D • Com a Segunda Partição da Polônia (1793), a Dinastia recebe os territórios Danzig, Thorn, Posen, Gnesen e Kalish, que formariam então a “Prússia Sul”; • Com a Terceira Partição da Polônia (1795)71, recebe toda a porção entre os Rios Bug e Niemen, que formaria a “Nova Prússia Leste”; • Em 1807, com a derrota militar para os exércitos napoleônicos, a Prússia perde boa parte dos ganhos obtidos nos anos anteriores, assim como todas as suas possessões ocidentais. 71 As Partições da Polônia estão, como já dito, relacionadas especialmente com a configuração de forças entre os três principais estados “orientais”, Rússia, Prússia e Áustria; sobre estas, ver KENNEDY (1989, pp. 118-128); BARRACLOUGH (1946, pp.402-403) afirma que: “It was fear of Russia and open jealousy and distrust between Austria and Prussia which led to the three partitions of Poland in 1772, 1792 and 1795.”; vale notar que a atitude unilateral de Frederico II com relação à França em 1795 (o Tratado de Basel) é em geral compreendida neste contexto, ou seja, foi a intenção de se concentrar sobre as disputas no Leste e aproveitar a oportunidade de uma nova expansão territorial que teria feito com que o Monarca assinasse a paz com a França (BROSE, 1997, p. 31); 1688 1640 1650 1660:“Aquisição” da Prússia 1648: Tratado de Westphalia 1630 1670 1700 1701: “Reino” da Prússia 1680: Magdeburgo 1690 1720 1713: Geldern Superior 1770 1780 “Guerra do Tomate” 1797 1790 1810 1807: Derrota de Jena 1795: “Nova Prússia Leste” (Terceira Partição da Polônia) 1800 (1840) Frederico Guilherme III FIGURA 3: QUADRO CRONOLÓGICO: 1648-1807 *Prússia envolvida apenas em: 1792-1795; 1806; 1813-1815; 1793: “Prússia Sul” (Segunda Partição da Polônia) 1786 Frederico Guilherme II Guerras Napoleônicas* 1772: Prússia Ocidental e Ermeland (Primeira Partição da Polônia) 1791: Ansbach e Bayreuth 1760 Guerra dos Sete Anos, 3ª G. Da Silésia 1742, 1745, 1763: Confirmação da Silésia 1750 1744: Frísia Leste 1740: Silésia 1740 1ª e 2ª Guerras da Silésia 1730 1721: 1707: Pomerânica Neuchatel e Sueca Tecklenburgo 1710 Guerra de Sucessão Espanhola 1702: Moers e Lingen 1680 1679: “Franja” na Pomerânia 1666: Cléves-Mark e Ravensberg 1660 Guerra FrancoSueca EVENTOS DESTACAD0S (GANHOS HOHENZOLLERN) 1620 Guerra dos Trinta Anos Primeira Guerra Nórdica 1740 Frederico II, o Grande Guerra de Sucessão Austríaca Frederico Guilherme I “Rei Soldado” Segunda Guerra Nórdica 1713 Frederico III / Frederico I GUERRAS COM ENVOLVIMENTO DA PRÚSSIA 1640 Frederico, Grande Eleitor GOVERNANTES HOHENZOLLERN 42 43 Gooch resume da seguinte forma a “história” da construção do Estado Hohenzollern entre 1648 e 1786: The Great Elector attracted the attention of Europe to Prussia by his victories and his diplomacy, created a standing army, and laid the foundations of the autocracy on which the Hohenzollerns reared one of the mightiest political edifices of the modern world. His son Frederick I placed the crown upon his head, and his grandson, Frederick William I, created an administrative machine the efficiency of which was unmatched in Europe. Finding a welltrained army and an overflowing treasury on his accession in 1740, Frederick the Great seized Silesia on the death of the Emperor Charles VI six months later, and held it against the combined efforts of half Europe. (1948, p. 40) Além da característica amplamente ressaltada pela historiografia do caráter fortemente militarista daquele Estado, é necessário destacar ainda um aspecto dos processos apresentados acima: na prática, no período entre meados do século XVII e inícios do XIX, o Estado Prussiano se expandiu, ou foi construído através da expansão, ao longo de territórios notadamente “orientais”. Seja pelas combinações das forças políticas na Europa do período, pelas “oportunidades” abertas por aquelas combinações, ou por algum direcionamento intencional dos Hohenzollern, o espaço territorial prussiano foi articulado essencialmente como um Estado da Europa Oriental. Embora mantendo suas possessões no Ocidente, e sem negar a importância que aquelas possam ter adquirido para seus interesses dinásticos, foi sobre os territórios do “Leste” da Europa que, em inícios do século XIX, o Estado Hohenzollern se afirmou enquanto entidade política. Do ponto de vista das disputas políticas no interior do Sacro Império, Brose resume da seguinte forma a situação em fins do século XVIII: Thus by the late eighteenth century the political equilibrium of the Holy Roman Empire was no longer threatened by the emperors, whose imperial powers had eroded, or by religious antagonists, whose hatreds had found less violent outlets. The deepening feud between Austria and Prussia, on the other hand, was a definite source of destabilization. Precipitated by Prussia's growing power, the rivalry worsened after 1648 as the House of Hohenzollern steadily consolidated and expanded its holdings at the expense of small states in the northwestern and north-central portions of the empire. (1997, pp. 13-14) Em resumo, portanto, o que se assiste no período entre meados do século XVII e fins do século XVIII é a “escalada” de uma unidade política, a Prússia, à arena central do “jogo das guerras” do espaço da Europa Centro-Oriental. O processo de centralização de poderes em torno da figura do Governante Central no Estado Hohenzollern, como visto, não foi isolado, e se assemelha ao “processo social” identificado por Elias na Europa Ocidental dos séculos XII e XIII. Este “jogo” não levou, como naquele caso, à formação de um ou alguns ‘estados- 44 economias nacionais’ unificados até fins do século XVIII, porém delineou com maior clareza quais seriam os candidatos prováveis a assumir aquela forma. Em fins do século XVIII, o “jogo das guerras” da Europa “alemã” transformara-se, pela expansão do Estado Hohenzollern, na disputa entre a Áustria e a Prússia. Neste momento convém, portanto, seguindo a proposta desta investigação, observar sobre que relações econômicas operaram esta e outras “vontades políticas centralizadoras” e em que medida interferiram naquele ambiente econômico; ou, em outras palavras, descrever o “jogo das trocas” naquele mesmo espaço. 45 CAPÍTULO 2: O ESPAÇO ECONÔMICO “ALEMÃO” EM ÍNÍCIOS DO SÉCULO XIX 2.1 – Introdução O interesse deste Capítulo é discutir sobre que relações econômicas começam a operar, a partir de 1648 no espaço “alemão”, as “vontades políticas centralizadoras” que estão, para Braudel, na origem do “mercado nacional”. Como visto, o “sistema” político instituído pelo Tratado de Westphalia propiciou um ambiente institucional adequado para operação daquelas “vontades” entre os Estados do Sacro Império Romano. Do ponto de vista econômico, os dois “grandes” temas da historiografia da Alemanha até o século XX são a Guerra dos Trinta Anos e a Revolução Industrial. Em especial, no que se refere à Guerra, esta se dedicou obstinadamente em entender, embora sem alcançar consensos significativos: i) qual a situação econômica da “Alemanha” antes da Guerra; e ii) que efeitos teria trazido àquela economia1, 2. Rabb, em um artigo focado precisamente sobre as controvérsias historiográficas a respeito do tema, comenta em suas conclusões: The attempt to see either prosperity or decline as a uniform condition in Germany before 1618 has been a major stumbling block in most approaches to the problem. The absence of unity in Germany and the different conclusions reached by local studies make generalizations about the economic situation before the war virtually impossible. (1962, p. 51) Mas estas “generalizações” seriam possíveis após a Guerra? Sheehan comenta o seguinte a respeito de inícios do processo de industrialização na Alemanha: (...) it is misleading to talk about a German economy in the 1830s, when local, regional, and transnational economic relationships almost certainly remained of much great importance for most central Europeans. (1981, p. 12) As duas citações destacadas apontam, em conjunto, para as considerações de Braudel a respeito da conexão entre o Estado Territorial e o “mercado nacional”: não existe uma “economia nacional” até o momento em que um Estado, a partir de uma vontade política, a recorta de um espaço econômico mais amplo. Elaborar, portanto, um quadro geral da 1 Ver, sobre o tema, RABB (1962); CARSTEN (1956); KAMEN (1968); e POLISENSKY (1955); O seguinte “diagnóstico” é fornecido por GAGLIARDO: “In economic terms, while no historian has argued that the war had anything but a woeful effect on Germany as a whole, a debate has raged over whether the war alone caused an economic downturn, or whether it merely exacerbated a decline already in evidence by 1618 (or perhaps was even partly caused by such a decline). The weight of scholarly opinion now clearly inclines to the latter view which, by placing Germany in a wider European context, emphasizes the early seventeenth century as a period of transition between the long-term economic expansion of the sixteenth century and the more recessionary environment of the seventeenth.” (1991, p. 91); 2 46 “economia alemã” antes de se instituir um Estado unificado politicamente só seria possível se o “conceito” fosse compreendido no sentido genérico de “economia dos territórios alemães”. Com este sentido, porém, não existiria apenas “uma” economia, ou alguma coerência que unisse, enquanto conjunto, as diferentes “economias” daqueles territórios. Por outro lado, a possibilidade de identificar tendências que envolvessem todos os territórios alemães, ou que os “unificassem” economicamente, deve-se, em grande medida, à sua “participação” na economia européia e, em especial, na chamada “Crise Geral da Economia Européia do século XVII”3: After 1618 there was a significant change. As the war successively struck various sections of Germany, it drastically reduced the number of prosperous areas. Economic growth became so rare a phenomenon that at last it is possible to conclude that decline was the prevalent condition. (RABB, 1962, p. 51) O que Rabb não explicita em seu artigo é o fato de que o “declínio ser a condição prevalecente” não é uma característica particular dos territórios alemães naquele período e, portanto, não confere àqueles a suposta coerência de um espaço econômico único. Este “problema metodológico” tem sido resolvido pela historiografia econômica da Alemanha pré-formação do Estado Territorial através da descrição das diversas “economias” dos territórios alemães, que usualmente também inclui generalizações sobre as tendências gerais daquela “economia”. Estas últimas são, porém, antes generalizações a respeito da Europa em geral do que propriamente da economia “alemã” em particular. Quanto à economia européia, existe consenso de que, economicamente, a Europa de, digamos, 1815, era muito similar àquela de 1648 no que se refere às atividades produtivas4. Se a “Crise” e sua reversão afetaram aquela economia, estes efeitos foram antes locais e, no máximo, regionais, pelo menos até meados do século XIX. Este Capítulo, portanto, está dividido em duas seções. Em primeiro lugar, tentar-se-á apresentar o que era, em linhas gerais, a “economia alemã” em inícios do século XIX, tendo em mente que suas características eram, em grande medida, antes da economia européia do 3 Sobre a “Crise”, ver HOBSBAWM (1954a e 1954b); para um sumário da discussão historiográfica a respeito, ver WALLENSTEIN (1980, Prefácio e Introdução); para a “Crise” no que se refere ao Brandemburgo, ver HAGEN (1989, pp. 303-304); 4 Embora isso não seja verdade, como se verá, quanto à “organização social da produção”; 47 que especificamente alemã5. Na segunda seção, serão apresentadas as “principais” regiões econômicas daqueles territórios, algumas por se destacarem pela prosperidade, outras por fugirem ao “padrão geral” europeu, indicando, sempre que possível ou necessário, os efeitos que a “Crise” e sua reversão tenham àquelas trazido. 2.2 – Características Gerais A característica central que unifica a economia “alemã” até pelo menos inícios do século XIX é o caráter predominantemente agrário tanto de sua produção quanto de suas populações (BRUFORD, 1957, p. 293; GAGLIARDO, 1991, p. 128). Como se sabe, esta não é uma característica particular da Alemanha naquele período6. De qualquer forma, segundo Blackbourn, três quartos dos alemães viviam, por volta de 1800, em áreas rurais (1998, p. 3; para Mehring [1975, Seção IV, parte 1, §13], este número seria de dois terços e, para o caso específico da Prússia, de três quartos7) e 80% deles estavam envolvidos na atividade agrícola (1998, p. 12). Segundo Gagliardo, 70-75% do PNB “alemão” em meados do século XVIII era gerado pela agricultura (1991, p. 129). No que se refere à produção agrícola, o quadro geral é, por um lado, o de pequenos cultivos de bens de primeira necessidade destinados majoritariamente a uma economia de subsistência, ou comercializados em raios muito limitados. E, por outro, o de grandes propriedades destinadas ao cultivo de cereais para exportação (ver à frente). O efeito central que a “Crise” do século XVII teria trazido a esta economia agrária ocorreria no que se costuma chamar de “organização social da produção agrícola” e, em especial, nas regiões que se dedicavam tipicamente à produção para exportação de grãos, notadamente o Leste do Elba (ver à frente). Pois o século e meio após a Guerra dos Trinta Anos assiste, para estas regiões, ao que se convencionou chamar de “Segunda Servidão no Leste”8. 5 Neste capítulo, serão considerados “territórios alemães” todos aqueles compreendidos na Europa entre os Rios Reno e Oder, com um foco, porém, sobre aqueles que viriam a compor o Império Alemão em 1871; 6 “De fato, fora algumas áreas comerciais e industriais bastante desenvolvidas, seria muito difícil encontrar um grande Estado europeu no qual ao menos quatro de cada cinco habitantes não fossem camponeses.” (HOBSBAWM, 1977, p. 27); 7 Segundo HAFFNER (1998, p. 75), por volta de 87% da população da Prússia em 1800 vivia em áreas rurais; dos 13% restantes, apenas 6% vivia em cidades com mais de 20 mil habitantes; 8 Ver, a respeito do fenômeno, especialmente ANDERSON (1989, pp. 192-220); 48 Dada a queda nos preços dos produtos agrícolas no mercado “internacional” após a Guerra dos Trinta Anos, especialmente o dos cereais9, os grandes produtores teriam encontrado, em uma nova forma de organização social de sua produção, ou seja, em um novo modelo de relacionamento com as populações camponesas de seus domínios, uma forma de “compensar” as perdas associadas àquela queda. Mais geralmente, para Braudel, o fenômeno da “Segunda Servidão” no Leste da Europa, iniciado já no século XVI e, portanto, antes da Crise do século posterior, seria apenas um dos aspectos do fenômeno mais geral de transformação do Leste em uma região colonial, fornecedora de matérias-primas para o Ocidente (BRAUDEL, 1996a, pp. 231-232)10. Isso não impede, porém, que tenham existido igualmente impulsos de caráter interno às próprias regiões: Esse agravamento generalizado da corvéia nas regiões do Leste europeu tem raízes ao mesmo tempo externas e internas. Externas: a procura maciça da Europa do Oeste, que é preciso alimentar e abastecer de matérias-primas. Segue-se um poderoso apelo à produção exportável. Internas: na corrida competitiva entre os Estados, as cidades e os senhores, estes últimos estão por quase toda a parte (salvo na Rússia) em posição dominante. À decadência das cidades e dos mercados urbanos, à fraqueza do Estado corresponde o arresto da mão-de-obra (e também da terra produtiva) que impulsiona o sucesso dos feudais. (BRAUDEL, 1996a, pp. 233-234)11 Ou seja, a própria especialização de algumas regiões, ao longo do século XVI, na produção exportável de grãos, impulsionada especialmente pelo aumento de sua demanda a partir do Ocidente, teria transformado o Oriente europeu em uma região tipicamente servil, especialmente onde não encontrou fortes resistências urbanas ou dos Estamentos em geral a sua infiltração: 9 Segundo GAGLIARDO (1991, p. 128) esta queda seria integralmente revertida apenas a partir de meados do século XVIII; 10 ANDERSON, porém, discorda desta associação na medida em que o “modo de produção feudal”, ainda dominante da Europa Ocidental dos séculos XVI e XVII, seria, para o autor, incapaz de gerar uma integração econômica entre Ocidente e Oriente avançada o suficiente para determinar os padrões sociais no Leste (1989, pp. 195-198); 11 ARDANT desenvolve igualmente uma explicação conectando o fenômeno diretamente ao processo de centralização política dos Estados Europeus: “The countries of Eastern Europe, especially Russia, realized that they lacked an economy of exchange strong enough on which to base a policy of modern state-building. Cities were too rare, merchants too few, and the subsistence economy too widespread; they could not imitate the fiscal policies of the western monarchies and impose indirect taxes. As to direct taxes, the burden and the inevitably simplistic character of assessment led to a flight of taxpayers. In order to build the infrastructure for both taxation and the state, they had to freeze potential taxpayers in the places of production and reduce the mobility of the peasantry. In order to insure the inflow of taxes the czars reimposed serfdom starting in the fifteenth century and continuing to the nineteenth; this was the same process that had occurred, and for similar reasons, in the Late Roman Empire. All of Eastern Europe and a part of Central Europe underwent this kind of political and social change.” (1975, p. 197); 49 The debasement of the status of the peasantry, rural poverty, the contraction of the urban economy and of political burgher strength, and the unrestrained manipulation of village government by the squires were intimately associated with the decline of small-scale cultivation and the ascendancy of commercialized production, based on large and middle-sized units. These trends helped to consolidate the institution of Gutsherrschaft, henceforth the great citadel of seigniorial coercion. (ROSENBERG, 1958, p. 29) Esta opinião assemelha-se à de Hobsbawm: A área de servidão oriental pode portanto ser considerada também uma ‘economia dependente’, produtora de alimentos e matérias-primas para a Europa Ocidental, de forma análoga às colônias de além-mar. (1977, p. 31) De qualquer forma, o fenômeno viria a delinear esse que é, para muitos historiadores, um elemento central da dinâmica histórica européia, qual seja, o contraste entre um Oriente servil de grandes propriedades e um Ocidente onde os camponeses dispunham de relativa liberdade individual e da propriedade sobre as terras. Para Hobsbawm: Do ponto de vista das relações de propriedade agrária, podemos dividir a Europa – ou melhor, o complexo econômico cujo centro ficava na Europa Ocidental – em três grandes segmentos. A oeste da Europa ficavam as colônias do além-mar. (...) A leste da Europa Ocidental, mais especificamente a leste de uma linha que passaria mais ou menos ao longo do rio Elba (...) ficava a região da servidão agrária. (1977, pp. 29-30) Esta cisão, que divide a Europa em duas regiões, aplica-se igualmente à Alemanha, já que sua linha divisória encontra-se precisamente no interior de seus territórios12. De fato, o contraste entre o Grundherrschaft ocidental e o Gutsherrschaft oriental é um dos elementos mais utilizados pela historiografia da Alemanha para justificar sua dinâmica histórica13. Para Blackbourn: Details varied, but one of the most firmly established generalizations of modern German history is the difference between east and west. In Prussia east of the river Elbe (and the Habsburg lands east of the Bohemian forest), under the so-called Gutsherrschaft system, the lord enjoyed direct control over the peasant. In exchange for the land they worked, peasants provided labor services and made other payments in cash or kind: the lord could prescribe where they milled their grain or sold their own produce; they were not free to move without his permission. The East Elbian lord had other powers, including police authority and rights of ‘patrimonial’ justice over the peasants on his estate, control over local government, and often 12 “In Eastern Germany, as in most parts of eastern Europe, the progressive degradation of the peasantry started in the fifteenth century. Simultaneously, the process of the disintegration of the seigniorial system developed further in western Europe, including German “West Elba”.” (ROSENBERG, 1958, p. 29); 13 E parece também ser assim considerado por HOBSBAWM para a Europa em geral: “O problema agrário era portanto o fundamental no ano de 1789 (...). E o ponto crucial do problema agrário era a relação entre os que cultivavam a terra e os que a possuíam, os que produziam sua riqueza e os que a acumulavam.” (1977, p. 29); vale lembrar que os conceitos e definições do Grundherrschaft e do Gutsherrschaft ainda são amplamente debatidos na literatura; ver a respeito WALLERSTEIN (1980, pp. 225-226, nota 299); 50 the right to nominate to church livings. In the regions to the west and south the prevailing Grundherrschaft system was less stifling. Labor services had often commuted over time into cash payments, so that peasants were in effect tenants. In some cases tenant rights had even become hereditary. (1998, p. 4)14 A supremacia da Nobreza da Europa Oriental no Standestaat, característica já comentada, pode portanto ser compreendida a partir de seu elemento econômico, ou seja, do papel da Nobreza enquanto principal articuladora da produção de grãos exportáveis para o Ocidente. Pois na Europa a leste do Elba, aquela tendeu a se envolver diretamente na produção, e, com isso, a desempenhar um papel econômico que tipicamente não possuía nas regiões ocidentais: Where landed estates tended to be small or medium-sized, as in most of the south, southwest and west, noble proprietors clearly preferred a profusion of peasant tenancies to entrepreneurial Gutswirtschaft in any case, since many of them had lived from ground rents and various outside sources of income for so long as to have lost both knowledge of and interest in agriculture per se. (GAGLIARDO, p. 130) A segunda atividade em importância econômica na “Alemanha” do século XVIII era a manufatura (GAGLIARDO, 1991, p. 136). Assim como para a agricultura, o quadro geral era o da produção de artigos de primeira necessidade destinados a mercados de raio bastante limitado: Almost all of those engaged in manufacturing were craftsmen serving local needs: shoemakers, tailors, carpenters, masons, coopers. Even in towns where trade was more diversified and sophisticated, the gold-beater, hatter, bookbinder and skilled furniture-maker would generally be working for bespoke customers, servicing members of court, patriciate or some other corporations. (BLACKBOURN, 1998, p. 12) No que se refere à “organização social” da produção manufatureira, é possível discernir dois sistemas gerais distintos: por um lado, o antigo sistema das cidades, onde os principais aspectos da produção (preços, quantidades, qualidade, distribuição) eram controlados pelas guildas ou pelos chamados corpos de ofício15, 16; e, por outro, o “novo” sistema “mercantil”17, onde aqueles aspectos eram parcial ou integralmente controlados por mercadores. 14 O próprio BLACKBOURN, porém, afirma alguns parágrafos depois: “The east-west distinction is not false, but recent research suggests that it needs some qualification. As far as western Grundherrschaft is concerned, everyone agrees that, while peasantry was not personally dependent to the same degree, noble and clerical lords not only remained legal owners of the land but retained some seigneurial privileges, typically involving hunting. The real question is whether seigneurialism in the east amounted (or still amounted) to fully fledged serfdom.” (1998, p. 5); 15 Embora BRAUDEL utilize, para se referir a esta instituição, o termo “corpos de ofícios”, utilizar-se-á diretamente o termo guilda, tradução direta do Zunft alemão ou do guild inglês; de qualquer forma, a expressão “antigo sistema das cidades” será utilizada para designar o sistema produtivo manufatureiro corporativo, cuja característica central é o controle de todos os aspectos da produção por aquela instituição citadina; 51 Through their agents of ‘factors’, merchants provided raw materials that poor rural households worked up into finished goods. This had gone on since the late middle ages, but the practice became much more widespread in the second half of the eighteenth century. It was found in many branches of production, including metals, but especially in the spinning and weaving of textiles. (BLACKBOURN, 1998, pp. 29-30) 18 No período após a Guerra dos Trinta Anos, de fato, a tendência foi tipicamente pelo fortalecimento do sistema mercantil vis-à-vis o antigo sistema das cidades19; porém, neste caso, as diferenças, tanto regionais quanto setoriais, são acentuadas. De qualquer modo, o sistema mercantil tornou-se a maior fonte de produção da Europa no século XIX (GAGLIARDO, 1991, p. 136), sendo responsável, em 1800, por 43% de toda a produção manufatora da “Alemanha” (BROSE, 1997, p. 9). A penetração de mercadores como organizadores da produção manufatora, competindo com as corporações citadinas, teve como um de seus principais efeitos o deslocamento da produção para áreas rurais vis-à-vis as urbanas. Em princípio, o Verlagsystem pode operar tanto em áreas urbanas quanto em áreas rurais; e, de fato, mesmo nas cidades, ele parece ter se “infiltrado”: (...) Nesse sistema de trabalho por peça, o mestre dos corpos e ofícios torna-se muitas vezes, por sua vez, um assalariado. Depende do mercador que lhe fornece a matéria-prima, em geral importada de longe, que depois assegurará a venda, para exportação, dos fustões, dos tecidos de lã ou de seda. Assim, todos os setores da vida artesanal podem ser atingidos e o sistema corporativo então se destrói, embora mantendo as mesmas aparências. (BRAUDEL, 1996a, p. 277) 16 “The guild was a classic institution of corporate society. It was based on a specific privilege (the monopoly production of certain goods within a particular area); it made highly elaborate distinctions between masters, journeymen and apprentices; and to preserve this internal order and the standing of the guild it aimed to regulate how its members should behave beyond the workshop.” (BLACKBOURN, 1998, p. 7); ou ainda: “A vocação dos corpos de ofício é o entendimento entre os membros de uma mesma profissão e a sua defesa contra os outros, em contestações mesquinhas, mas que afetam a vida de todos os dias. A vigilância corporativa estabelece-se sobretudo para com o mercado da cidade que cada ofício quer ter por inteiro.” (BRAUDEL, 1996a, p. 275); 17 Neste caso, foi escolhido o termo “sistema mercantil” para designar o sistema produtivo manufatureiro no qual o papel de organização e controle da produção é desempenhado pelo mercador, em oposição ao antigo sistema das cidades; novamente, está sendo utilizada a tradução direta do Verlagsystem alemão, que corresponde ao putting-out-system inglês; encontra-se com freqüência a expressão “sistema doméstico” como seu sinônimo; 18 Ou ainda: “O Verlagssystem é uma organização da produção em que é o mercador, o Verleger, quem dá o trabalho, adianta ao artesão a matéria-prima e parte do salário, sendo o restante pago mediante entrega do produto acabado” (BRAUDEL, 1996a, p. 276); 19 Para a discussão a respeito da Europa em geral e das causas desta tendência, ver VRIES (1983, pp. 119-127; e pp. 131-135); Hobsbawm conecta o fenômeno à própria Crise do Século XVII: “The main result of the 17th century crisis on industrial organization was to eliminate the crafts, and with them the craft-dominated towns, from large-scale production and to establish the ‘putting-out’ system, controlled by men with capitalist horizons and operated by easily exploitable rural labor.” (1954b, p. 51); 52 Porém, ao encontrar a resistência do antigo sistema das cidades, especialmente seu controle rígido sobre a mão de obra, a tendência típica foi a de seu deslocamento para as áreas rurais, onde eram menores as imposições sobre aquela. Ou seja, foi a resistência da organização produtiva das cidades que fez com que o Verlager se dirigisse, em busca especialmente de uma mão de obra menos controlada, para o campo; e, portanto, com que grande parte da produção manufatureira da Europa se deslocasse para as regiões rurais20. O controle do produto final, porém, se fosse “realizado” no campo ou na cidade, era do mercador, e essa era a característica central do novo sistema21. Nas cidades alemãs, na virada do século XVII para o XVIII, embora tendo sofrido a concorrência do sistema mercantil, o antigo sistema ainda prevalecia. Porém, a maior parte da produção manufatureira da Alemanha já era controlada pelos grandes mercadores e tinha se deslocado para áreas rurais (MEHRING, 1975, Parte IV, Seção 2; WALLERSTEIN, 1980, p.194)22. Em especial, os setores da manufatura onde o novo sistema se instalou com maior intensidade foram aqueles de maior tradição nos territórios alemães, ou seja, a fabricação de tecidos e a mineração (GAGLIARDO, 1991, p. 139; BRAUDEL, 1996a, p. 280). Se transcrevêssemos num mapa todas as ligações que ele cria [o Verlagssystem], todo o território alemão seria cortado por seus traços múltiplos e finos. Umas após outras, as atividades prendem-se a essas redes. (....) Mas, no século XV é o vasto setor dos têxteis o campo operatório mais característico do sistema, dos Países Baixos, (...) até os Cantões suíços. A fabricação dos fustões – mescla de linho e algodão –, que implica a importação, por Veneza, do algodão da Síria, é por natureza um ramo em que o mercador, que detém a matéria-prima 20 “Toda essa evolução encontrou certas cumplicidades no interior dos corpos de ofícios urbanos. O mais das vezes, chocou-se com sua oposição feroz. Mas o sistema tem o terreno livre nos campos, e o mercador não se priva dessa vantagem. Intermediário entre o produtor de matéria prima e o artesão, entre o artesão e o comprador do produto acabado, entre o perto e longe, ele é também o intermediário entre a cidade e o campo. Para lutar contra a má vontade ou contra os altos salários das cidades, pode, se necessário, recorrer largamente às indústrias rurais.” (BRAUDEL, 1996a, p. 277); 21 Neste sentido, portanto, não parece adequada a utilização do termo “sistema rural” para designá-lo; 22 “Frustrated by stifling corporate restrictions, renegade woolen and linen producers began as early as the sixteenth century to move a portion of their operations beyond city walls. Raw materials like wool were distributed to poor rural families for inexpensive spinning, collected by agents (factors), then returned to town for weaving and finishing. By the late eighteenth century this so called putting out system had spread throughout the Reich. In some regions, villages and small towns in the vicinity of guild-controlled cities grew into impressive centers of cottage handicraft production. Crefeld, Elberfeld, and Barmen were classic examples of this new type of town, while west of Aachen, pre-industrial textile output multiplied in Burtscheid, Düren, Vaels, Monschau, and Verviers.” (BROSE, 1997, pp. 7-8); 53 longínqua, desempenha forçosamente o seu papel, seja em Ulm, seja em Augusburgo ... (BRAUDEL, 1996, p. 280) 23 Ao longo do século XVI, com a fortuna dos grandes mercadores-financistas alemães24 (especialmente no eixo comercial e financeiro de Nuremberg, Augsburgo e Ulm), sua penetração na produção mineira teria sido especialmente ampla. Os mercadores se apoderavam, por exemplo, do ouro, da prata e do cobre da Boêmia e especulavam com as ações de suas minas (chamados Kuxen) nos centros financeiros mundiais (BRAUDEL, 1996a, pp. 280-282). Com o século XVII, e com a decadência relativa dos financistas alemães, estes parecem ter “se retirado”, mas não completamente, da produção direta, mantendo seu papel especialmente enquanto articuladores da distribuição (BRAUDEL, 1996a, p. 282). No que diz respeito ao comércio, o padrão geral “alemão” era o de volumes modestos e de pequenas distâncias, dados a pobreza das comunicações, o limitado sistema de estradas, as dificuldades envolvidas nos tráfegos fluviais e, especialmente, a imensa estrutura de tarifas e pedágios. Ou seja, tratava-se essencialmente do deslocamento de produtos alimentícios ou manufaturas simples por terra entre vilas e pequenas cidades. No que se refere ao sistema monetário, embora tenha havido uma série de tentativas de estabelecer um sistema uniforme para o Sacro Império Romano, através de leis ou convenções, a prática reinante até sua dissolução em 1806 era a de cada Território Imperial, incluindo os territórios eclesiásticos e as cidades livres, cunhar sua própria moeda. As dificuldades em estabelecer um padrão único ou relações estáveis entre as diferentes moedas estavam ligadas não apenas ao grande número de “emissores”, mas igualmente à prática reinante entre os soberanos de utilizar a desvalorização monetária como instrumento de financiamento. Esse expediente foi especialmente empregado durante e nos anos posteriores à Guerra dos Trinta Anos. Por volta da segunda metade do século XVIII circulavam no território, portanto, inúmeras moedas distintas, a maioria delas com base na prata. Porém, grosso modo, três “sistemas” principais se desenvolveram. 23 O exemplo de um importante produtor de tecidos de algodão de Augsburgo indica que, em sua manufatura, ele empregava, nos anos 1770, 350 trabalhadores, contra 3500 que “trabalhavam fora” (BLACKBOURN, 1998, p. 31); 24 A respeito destes ver, especialmente, ARRIGHI (1996, pp. 126-128); 54 O primeiro estava baseado no thaler25 e servia especialmente aos Estados do Norte. A partir de 1556, e até aproximadamente meados do século XVIII, o thaler era a moeda oficial do Império, com o nome de Reichstaler. Embora servisse como unidade de conta principal aos Estados do Norte, especialmente em suas interrelações comerciais e financeiras, estes mantiveram a prática de cunhar outras moedas, sobretudo diferentes tipos de thalers, em nome tanto do Governante Territorial, como do Imperador, que eram constantemente desvalorizados em relação à moeda “oficial”. No interior daqueles territórios, portanto, continuava em circulação uma ampla gama de moedas distintas. Um segundo sistema, baseado no florim, servia de forma semelhante aos Estados do Sul (na Áustria, os florins austríacos). E, finalmente, as cidades livres do Império, especialmente Lübeck e Hamburgo, e seus grandes centros comerciais realizavam suas transações comerciais e financeiras especialmente com base no schilling e, ao longo do século XVII, crescentemente com o marco emitido por Hamburgo. Mesmo os câmbios entre as moedas destes grandes “sistemas” e entre aquelas e as inúmeras outras circulantes no Império (das quais se destacam o heller e o kreuzer) mantinham-se variando continuadamente. O último acordo monetário relevante do Sacro Império foi a Convenção de Viena, de 1753, assinada originalmente entre a Áustria e a Bavária mas seguida pela maioria de seus Estados. A Convenção estabeleceu uma medida padrão de prata a partir da qual seriam realizados os câmbios entre as diferentes moedas circulantes26 porém, à época das Guerras Napoleônicas, estes câmbios já haviam flutuado largamente. Em termos das finanças, os principais fornecedores de crédito, tanto público como privado, eram os financistas individuais, que agiam essencialmente como bancos27. Dentre estes, o principal centro financeiro da “Alemanha” e mesmo da Europa Central em meados do século XVIII era Frankfurt, já que as grandes casas financeiras com centro em Augsburgo haviam praticamente desaparecido do cenário das finanças internacionais. 25 Moeda de prata supostamente emitida no Império desde meados do século XIV, especialmente para responder à então escassez do ouro; 26 Chamada de “foot measure” e correspondente ao número de moedas cunhadas a partir de um marco de Colônia, que pesava aproximadamente 233 gramas; no norte da Alemanha (Prússia, Hanover e outros) a medida correspondia a 14 thalers, a 20 florins austríacos nos domínios Habsburgo, a 24 florins nos estados do Sul, e a 34 marcos em Hamburgo e Lübeck; 27 A era das grandes transferências intragovernamentais, especialmente o imenso fluxo de subsídios da Holanda, da Inglaterra e da França para os Estados do Império, começaria só após meados do século XVIII; 55 Em segundo lugar estava Hamburgo que, além de concentrar um conjunto de financistas individuais, contava, desde 1619 (GAGLIARDO, 1991, p. 147), com o Banco de Hamburgo, que cunhava sua própria moeda bancária (o chamado Mark Banco). Em resumo, tudo indica que a maior parte dos territórios alemães em meados do século XVIII havia sido pouco tocada pelo que Braudel denominou “economia de mercado”, ou seja, mantinha-se na “zona de opacidade, nesta outra metade informal da atividade econômica, a da auto-suficiência, da troca dos produtos e serviços num raio muito curto” (BRAUDEL, 1995, p. 12)28. Isto não impede, porém, que algumas regiões fugissem nitidamente a este padrão e se localizassem “acima do andar térreo da vida material” (BRAUDEL, 1996a, p.7), ou seja, participassem, de alguma forma, da “economia de mercado”: como produtoras de manufaturas destinadas ao comércio “exterior”, como nódulos em canais de trocas de maior amplitude, como compradoras de mercadorias produzidas em outras regiões, como locais de circulação de moedas “internacionais”, etc. Sobre estas deverá tratar a próxima seção. 2.3 – Principais Regiões Econômicas Para mapear adequadamente as principais regiões econômicas do território “alemão” em meados do século XVIII, é importante, em primeiro lugar, ressaltar que a “economia de mercado” depende, essencialmente, da circulação, seja de bens, de pessoas, de moedas, etc. Neste contexto, pelo menos dois elementos são fundamentais no que se refere à estrutura de circulação naquele território: i) suas principais rotas ainda seguiam os caminhos fluviais e, especialmente, os dos vales do Reno, do Elba, do Oder e do Vístula; ii) seu eixo central localizava-se no Norte, especialmente pelo tráfego através ou em torno dos Mares Báltico e do Norte. Um conjunto de portos situados às margens ou próximos a estes Mares (sendo os principais, em sentido leste-oeste, Königsberg, Danzig, Stettin, Lübeck, Hamburgo e Bremen), portanto, concentravam (e competiam por) a maior parte dos fluxos do território. De fato, mesmo a circulação entre a Europa Ocidental e a Oriental ou, mais geralmente, entre o Leste e o Oeste, seguia em geral estes caminhos, e não diretamente por terra, em função da limitação e da precariedade das estradas e da imensa estrutura de tarifas do Sacro Império. 28 “Não esqueçamos, enfim, que, mesmo abaixo das trocas, aquilo a que chamei vida material, na falta de melhor expressão, constituiu, durante os séculos do Ancien Régime, a zona mais espessa de todas.” (BRAUDEL, 1995, p. 8); 56 Duas rotas centrais em sentido norte-sul ligavam o território alemão ao Mar Báltico: i) uma delas através do vale do Vístula, desde Varsóvia até Danzig, passando por Thorn; e ii) uma segunda, partindo de Breslau e seguindo aproximadamente os caminhos do Oder até Stettin, passando por Frankfurt (ou seja, atravessando o território do Brandemburgo). No que se refere ao Mar do Norte, as duas principais rotas eram: i) a que ligava Leipzig, no centro do território, a Hamburgo; ii) a rota através do vale do Reno, que unia Frankfurt aos portos Holandeses, passando por Colônia. Finalmente, estes portos ou centros de circulação das regiões próximas ou nos Mares do Norte e Báltico ligavam-se através de estradas por terra entre si e com portos holandeses, Antuérpia e Bruges. A importância das demais rotas e pontos de circulação do território alemão era em grande medida determinada por suas conexões àquelas rotas “centrais” e por sua capacidade de unir os centros comerciais nelas localizados às regiões no interior do território. Algumas destas rotas “secundárias” mais importantes eram: i) desde Belgrado até Viena, passando por Budapeste; de Viena, atingia-se Breslau (e o caminho do Báltico) ou Leipzig, seguindo o caminho do Danúbio, via Ratisbona e Nuremberg (e o caminho para o Mar do Norte); ii) desde Breslau até Leipzig; iii) as rotas através da planície Norte do território, especialmente a que ligava Colônia a Minden, e Magdeburgo a Königsberg, passando por Berlim. O porto de Danzig fazia especialmente a ligação, através do Mar Báltico, dos países ocidentais com o leste, pois, de Varsóvia, uma estrada por terra seguia para o Império Russo. A importância de Stettin, por sua vez, estava especialmente associada à ligação das regiões da Silésia, da Boêmia e da Morávia (ou do Império Austríaco em geral) ao Mar Báltico através do vale do Oder29. Hamburgo, por sua vez, era um dos nódulos centrais de toda a circulação do território “alemão” em meados do século XVIII. Sua importância advinha particularmente de sua ligação, por terra, a Leipzig, que, sobretudo através de sua feira internacional, era o grande centro comercial interno do território e “o maior mercado da Europa Oriental” (MEHRING, 1975). A Leipzig chegavam estradas que partiam de praticamente todas as regiões economicamente importantes, tanto do Império (especialmente as cidades da Suábia de Nuremberg, Ratisbona e Ulm e o Império Austríaco), como de todo o Leste, e mesmo da Itália. 29 A construção de um canal ligando o Oder ao Sper, finalizado em 1669, porém, teria desviado parte do tráfego desta rota para Berlim e para Hamburgo (GAGLIARDO, 1991, p. 144); 57 De fato, as feiras internacionais de Frankfurt e Leipzig eram os maiores centros de exportação e importação da “Alemanha” (GAGLIARDO, 1991, p. 143-144), e as rotas comerciais destas para Hamburgo e Bremen eram tradicionais desde a Idade Média (HENDERSON, 1967b, p. 15). Em meados do século XVIII, a feira de Leipzig se destacava especialmente como nódulo central de transações comerciais, enquanto a de Frankfurt como nódulo de transações financeiras (BRAUDEL, 1996a, p. 161)30. Porém, para BRAUDEL (1996b, pp. 75-78), a partir do século XVII, a prosperidade das trocas não se encontra mais especialmente nas feiras, ou seja, estas já seriam formas “arcaicas” de organização mercantil. O avanço econômico das feiras de Leipzig e Frankfurt nos século XVII e XVIII é, portanto, antes um sinal de atraso do que de prosperidade econômica, pois, no século XVIII, “delineia-se então uma Europa dos entrepostos que substituiu a Europa das feiras” (1996b, p. 78). Este argumento reforça, ao mesmo tempo, a posição de Hamburgo como um dos principais centros econômicos do teritório. No que se refere à importância mercantil e econômica de Leipzig, porém, vale ressaltar que, historicamente, a cidade, a partir do século XVI (mas com maior intensidade no século XVII), atraiu para si a prosperidade que antes se encontrava sobretudo nas cidades da Suábia, especialmente Nuremberg, Ulm e Ratisbona31, fenômeno relacionado ao deslocamento do eixo econômico do território alemão do Ocidente para o Oriente : A longo prazo, ocorre um movimento de gangorra a favor da Alemanha oriental, da Alemanha mais continental. Esta subida do Leste concretiza-se já no século XVI, sobretudo depois das falências de 1570 em Nuremberg e em Augsburgo, com a ascensão de Leipzig e de suas feiras. Leipzig consegue impor-se às minas da Alemanha, reunir dentro dela o mercado mais importante dos Kuxen, ligar-se diretamente a Hamburgo e ao Báltico libertando-se da escala de Magdeburgo. Mas mantém-se também fortemente ligada a Veneza, as ‘mercadorias de Veneza’ sustentam um setor inteiro de sua atividade. Torna-se, além disso, o lugar por excelência de passagem dos bens entre oeste e leste. (BRAUDEL, 1996a, pp. 160-161) 30 BRAUDEL, falando a respeito da feira de Frankfurt nos séculos XVI e XVII, comenta: “Mercadores estrangeiros mudam-se de vez para a cidade, onde representam firmas da Itália, dos Cantões suíços, da Holanda. Segue-se uma colonização progressiva. Esses estrangeiros, habitualmente os caçulas das famílias, instalam-se na cidade com simples direito de residência (o Beisesserschutz); é o primeiro passo; a seguir, conseguem o Burgerrecht; em breve se comportam como senhores” (1996b, p. 67); 31 “Nuremberg, cidade de primeira grandeza, industrial, mercantil, financeira, ainda é, no segundo terço do século XVI, levada pelo impulso que, algumas décadas antes, fizera da Alemanha um dos motores da atividade européia. Nuremberg está, portanto, associada a uma economia de raio amplo e seus produtos, que são enviados para longe, chegam ao Oriente Próximo, às Índias, à África, ao Novo Mundo. (...) Johannes Muller mostrou que Nuremberg fora, durante a primeira parte do século XVI, como que o centro geométrico da vida ativa da Europa” (BRAUDEL, 1996a, p. 160); 58 Este fenômeno pode, ao mesmo tempo, explicar parcialmente a importância comercial e a prosperidade econômica de Breslau neste período. Tradicionalmente, a ligação das regiões do Império Austríaco com o Norte era feita através da Suábia, via Leipzig ou Frankfurt. No entanto, a partir de meados do século XVII, a ligação por Breslau começa gradativamente a ocupar aquele posto e, em meados do século XVIII, a cidade já era o principal intermediário comercial da Dinastia Habsburgo, tanto pelo caminho via Leipzig a Hamburgo, como pelo caminho direto através do vale do Oder até Stettin32. As rotas comerciais entre a Feira de Leipzig e tanto o Império Austríaco como o Mar Báltico, de fato, em geral seguiam por terra até Breslau, e, portanto, por lá circulavam todos os tipos de fluxos, comerciais e financeiros. Finalmente, a importância de cada um destes pontos ou rotas de circulação no que diz respeito aos fluxos dependia, naturalmente, de fatores não apenas relacionados diretamente às trocas, mas igualmente às diferentes imposições políticas e alfandegárias sobre aqueles. Para efeitos de sistematização, é possível dividir os fluxos comerciais em dois principais grupos: os de matérias primas e os de bens manufaturados. Estes fluxos não estão, porém, dissociados, combinando-se para formar a ampla malha de comércio que unia praticamente todas as regiões economicamente dinâmicas dos territórios “alemães” em meados do século XVIII33. No que diz respeito ainda ao fluxo de matérias primas, é possível agrupá-los em três sub-grupos centrais: o dos cereais, o dos minérios e o dos produtos tipicamente de importação34. O fluxo de cereais, em primeiro lugar, envolvia, direta ou indiretamente, praticamente todo o território alemão. Considerando este território enquanto uma unidade, tratava-se tipicamente de um fluxo de “saída”; ou seja, ainda que boa parte da produção de cereais circulasse no interior do território para o abastecimento de algumas de suas regiões, um volume considerável era enviado, como exportação, para fora de seus limites, não sendo significativo o volume “importado”. 32 “Much of what the monarchy imported came through Silesia, and most of the exports from Bohemia and Moravia were funneled abroad by the same route. Not only was Silesia the principal commercial intermediary between the Habsburg monarchy and the outside world; it was also a major entrepot for the trade between eastern and western Europe. Further, Silesia was one of the most industrialized parts of the monarchy and a heavy contributor to the royal treasure.” (FREUDENBERGER, 1960, p. 384); 33 Não existem estatísticas sistemáticas a respeitos dos fluxos comerciais nestes territórios no período; os comentários que se seguem, portanto, são de caráter geral, e têm como objetivo apenas identificar as tendências principais envolvendo aqueles fluxos; 34 Isso não significa necessariamente que não fossem importados, para o território, minerais, como será visto doravante; mas o terceiro grupo aqui construído refere-se especificamente a produtos que não eram tradicionalmente produzidos em escala ampla em seu “interior”; 59 Embora envolvesse quase todo o território, eram tipicamente as regiões do chamado “Leste do Elba” que se destacavam, no conjunto, não apenas como maiores produtoras, mas igualmente como exportadoras dos grãos para fora dos limites do Império e/ou da Europa. Os cereais destas regiões, de fato, participavam de um sistema de comércio que envolvia praticamente todo o “mundo”: serviam diretamente aos consumos inglês, francês e holandês, e eram descarregados para outras regiões por mercadores daquelas nacionalidades (ver à frente). Quanto à localização destas áreas, a historiografia se refere em geral indistintamente à porção territorial da Europa a leste do traçado do Rio Elba (estendido em direção sul até o Danúbio). De fato, tanto as regiões do território alemão situadas nesta porção (a parcela do Brandemburgo entre os Rios Elba e Vístula35, a Pomerânia, as Mecklenburgos, a Saxônia e a Silésia), como os demais territórios do Império Austríaco, o Império Russo e os Reinos da Polônia e da Hungria estavam envolvidas na produção de cereais destinados à exportação. No que se refere à produção do território “alemão”, enquanto a da porção próxima ao Mar Báltico (Pomerânia, Mecklenburgos e Brandemburgo) tipicamente se destinava para fora dos limites do Império (especialmente para a Inglaterra, para a França e para a Holanda), a produção das regiões setentrionais (Saxônia e Silésia) seguia majoritariamente para os mercados imperiais. Embora alguns autores tenham caracterizado a produção do “Leste” como “capitalista”, no sentido de utilizarem técnicas produtivas avançadas, nem todas as suas áreas passaram, ao longo dos séculos XVII e XVIII, por modernizações nas técnicas produtivas ou organizacionais tais que seja possível empregar este adjetivo sem qualificações. De qualquer forma, a produção era conduzida especialmente em grandes propriedades que utilizavam o trabalho servil. De fato, o fenômeno da “Segunda Servidão no Leste” é em geral associado diretamente à produção cerealífica. O Leste teria passado, como visto, especialmente ao longo de meados dos séculos XVI e XVII, por um processo de “especialização” na produção de cereais destinados à exportação. Esta especialização ter-se-ia relacionado sobretudo ao aumento da demanda mundial: 35 Segundo GAGLIARDO (1991, p. 132), 53% de toda a produção de alimentos dos territórios Hohenzollern em fins do século XVIII era de cereais; 60 Esses suprimentos [de cereais e navais] haviam-se tornado absolutamente essenciais para a condução da guerra terrestre e marítima na Europa, em função do esgotamento dos suprimentos concorrentes vindos do Mediterrâneo na primeira metade do século XVI. (ARRIGHI, 1996, p. 136)36 Com a “Crise” do século XVII, porém, e especialmente com a queda dos preços dos cereais nos mercados internacionais, a produção teria encontrado, como dito, uma maneira de compensar as perdas a ela associadas em uma nova forma de “organização social”. Esta mudança direcionou-se especialmente para a transformação do trabalho agrícola em trabalho servil e para o aumento do tamanho das propriedades pela apropriação de terras comunais. Neste contexto, embora a produção e o fluxo de cereais ainda fossem de importância econômica vital a amplas regiões do território “alemão”, seu zênite já havia passado em meados do século XVIII37. Seu grande auge localiza-se especialmente em meados do século XVI, quando o mercado de cereais do Mar Báltico era “o [mercado] mais estratégico da economia mundial européia” (ARRIGHI, 1996, p. 138). É importante ressaltar, porém, que o declínio observado no comércio cerealífico do Báltico a partir especialmente da segunda metade do século XVII está igualmente associado a um relativo deslocamento do eixo de escoamento dos grãos para o Mar do Norte, relacionado sobretudo à prosperidade de Hamburgo como entreposto comercial e financeiro da Europa38. Até aproximadamente fins do século XV, os canais de exportação da produção cerealífica do Nordeste Europeu eram controlados especialmente pelas cidades da Liga Hanseática39. Ao longo do século XVI, porém, este controle passa paulatinamente aos mercadores holandeses, que não apenas monopolizam sua distribuição, mas participam igualmente no adiantamento dos créditos para a produção, através de agentes concentrados especialmente em Danzig 36 ARRIGHI identifica no mercado de cereais e de suprimentos navais, em meados do século XVI, um “crônico desequilíbrio temporal e espacial entre a demanda e a oferta” (1996, p. 137); 37 “No decorrer (...) de meados do século XVI até meados do século XVIII, o volume dos carregamentos de grãos do Báltico para a Europa Ocidental mostra uma grande flutuação, mas com uma tendência secular de estagnação e, por fim, de declínio.” (ARRIGHI, 1996, p. 136); ou ainda “O comércio do Báltico, medido pelas taxas aduaneiras aplicadas pelo rei da Dinamarca, declinou em quase todos os anos desde 1618 até 1630 e manteve-se em níveis permanentemente reduzidos até muito pelo século XVIII dentro, principalmente por causa de menores embarques de cereais para a Europa ocidental.” (VRIES, 1983, p. 157); 38 “Em julho de 1567, após muitas hesitações, os ingleses escolhem Hamburgo como escala dos seus tecidos; a cidade, que lhes oferecia um caminho de acesso ao mercado alemão mais fácil do que aquele aberto por Antuérpia, em breve se mostrou capaz de acabar e vender os panos crus da Ilha.” (BRAUDEL, 1996b, p. 136); 39 A respeito da Hansa, ver especialmente BRAUDEL (1996b, p. 87-91); LIST (1986, capítulo II); e CARSTEN (1954); 61 (BRAUDEL, 1996a, p. 235)40. Danzig, em função da presença holandesa, torna-se, em meados do século XVII, o principal porto cerealífico mundial (BRAUDEL, 1995, p. 110)41. Entretanto, a partir de meados do século XVII e mais especialmente com o século XVIII, a proeminência de agentes holandeses nos circuitos financeiros e comerciais da produção cerealífica já sofre a concorrência intensa de agentes franceses e ingleses, localizados majoritariamente em Hamburgo. Deste modo, embora Danzig ainda concentrasse, em meados do século XVIII, boa parte da produção cerealífica dos territórios alemães destinada à exportação, a tendência típica no período foi a de Hamburgo substituir crescentemente seu papel enquanto centro “mundial” de exportações de cereais (HENDERSON, 1967b, p. 10)42. O segundo fluxo de bens primários de grande importância para todos os territórios alemães é o dos minérios. A “Alemanha” é, tradicionalmente, desde a Idade Média, um importante centro mundial de extração43. Embora esta importância decline gradativamente a partir de meados do século XVI, com a entrada maciça no Continente dos minérios americanos, o fluxo de minérios ainda era, em inícios do século XIX, um dos principais do território. Se, como visto, o fluxo de cereais é tipicamente de “saída” ao considerar o território “alemão” enquanto uma unidade, o mesmo não pode ser dito sem reservas no que diz respeito aos minérios. Pois, embora sejam explorados em praticamente todas as suas regiões, em alguns casos sua oferta não é suficiente para atender à demanda44. De qualquer forma, pelo menos no que se refere a alguns produtos (notadamente o carvão), a extração gerava um importante fluxo de exportações. Três regiões do território, em especial, devem ser destacadas deste amplo conjunto “extrativista”: a Saxônia, a Silésia e a região ocidental da Renânia / Westphalia. Os minérios 40 De fato, a primazia comercial e financeira holandesa está fortemente associada ao controle, a partir de meados do século XVI e até meados do século XVII, da distribuição dos cereais do Leste via Báltico: “Ao longo destas lutas, a fonte primordial da riqueza e poder holandeses foi o controle do abastecimento de cereais e suprimentos navais vindos do Báltico. (...) Graças ao declínio anterior do poder da Liga Hanseática e suas próprias tradições de navegação (...) a comunidade mercantil holandesa estava singularmente posicionada para explorar esse crônico desequilíbrio temporal e espacial entre a demanda e a oferta.” (ARRIGHI, 1996, pp. 136-137); 41 “Um verdadeiro rio de cereal senhorial desce o Vístula e chaga a Gdansk.” (BRAUDEL, 1996b, p. 234); 42 A importância crescente de Hamburgo como centro de exportação cerealífica deve-se igualmente a seu papel como ponto de exportação de tecidos ingleses para o Continente (ver à frente); 43 Até começarem as importações de minérios das Américas, a “Alemanha” era, segundo KITCHEN, a maior produtora mundial de prata (1996, p. 82); 44 As regiões de Saar e de Siège, por exemplo, importantes centros de manufatura do ferro, dependem, ainda em meados do século XVIII, da importação de sua matéria prima, que chega especialmente da Bélgica e da Inglaterra; 62 extraídos nestas regiões serviam tanto como matéria prima para pequenas manufaturas locais (ver à frente), como atendiam a outras regiões manufatoras do território. A “produção” de alguns minérios chegava mesmo a ser exportada para fora de seus limites, como é o caso, por exemplo, do carvão extraído do vale do Ruhr, na Westphalia45; ou do ferro e do carvão da Silésia46, que também extraía quantidades consideráveis de chumbo. No caso dos minérios exportados, sua principal via de “saída” majoritária era Hamburgo que, através de seus mercadores “espalhados” pelo território, controlava praticamente todo seu fluxo. Finalmente, um grupo de matérias primas ou bens primários era tipicamente importado para o território alemão: temperos indianos, frutas e especiarias da Península Ibérica, algodão das Américas, pescado da Escandinávia, etc. Novamente, o grande ponto de “entrada” destes produtos era Hamburgo e sua distribuição era feita especialmente através de Leipzig. No que se refere ao segundo grande fluxo comercial considerado, ou seja, o de bens manufaturados, sua variedade é bastante ampla. É necessário distinguir, em primeiro lugar, os produtos tipicamente importados, por um lado, e aqueles produzidos internamente que podiam tanto atender à demanda do próprio território quanto serem exportados para fora de seus limites. A produção manufatora interna, embora fosse igualmente bastante variada, tinha dois grandes ramos tradicionais e centrais: o de produtos de ferro e aço e o de têxteis. O desenvolvimento das manufaturas no interior do território, ao mesmo tempo, estava amplamente relacionado às suas duas outras atividades econômicas centrais, ou seja, a extração de minérios e a produção cerealífica. Este relacionamento evidencia-se nitidamente, por exemplo, nos casos da Silésia e da Saxônia. A Silésia, região tipicamente produtora de cereais para exportação mas também um centro de extração de minérios, concentrava tanto pequenas manufaturas de produtos de aço e ferro, beneficiadas com o fornecimento direto de suas matérias primas, quanto uma importante manufatura têxtil, cujas origens localizam-se aproximadamente no século XVI. Seus produtos 45 Segundo HENDERSON, a região contava, em 1737, com 102 minas de carvão em operação, onde trabalhavam cerca de 700 mineiros (1967a); é importante notar, porém, que a descoberta de maiores depósitos de carvão na região ocorreria apenas em inícios do século XIX; 46 Segundo BLACKBOURN (1998, p. 32), em 1785, estavam em operação 243 minas na Silésia; a região chegou a ser denominada, na segunda metade do século XVIII, de “Peru Prussiano”; 63 de linho47, por exemplo, encontravam, além do mercado imperial (especialmente através de Breslau e/ou Leipzig), mercados tão distintos quanto a Inglaterra, a Holanda, a Polônia e a Rússia, e suas respectivas colônias. Dos portos holandeses ou de Hamburgo, poderiam seguir para a Espanha, Portugal e mesmo para o Levante. A produção de tecidos silesiana estava tipicamente sob controle direto de grandes proprietários de terra, em geral também envolvidos na produção cerealífica48. Esta era conduzida sobretudo em pequenas vilas nas propriedades dos senhores, e os artesãos, sendo em suas maioria servos (WALLERSTEIN, 1980, p. 235), pagavam àqueles uma taxa para “comprar” o direito de produzir e vender os tecidos (chamado Weberzins). Ou seja, a organização da indústria rural do linho silesiana estava baseada na “ordem feudal” (KISH, 1959, p. 542). Em geral, um pequeno mercador da vila adquiria as mercadorias e as transportava até os centros comerciais próximos, especialmente Breslau. Ali, encontrava grandes mercadores, holandeses, ingleses e/ ou hamburgueses, que adquiriam o produto e o distribuíam. De fato, na origem da emergência da manufatura de linho silesiana destinada ao mercado mundial está tipicamente o processo do “sistema mercantil” descrito anteriormente49. Os principais “agentes” que operaram a transformação, ou os grandes “clientes” dos senhores feudais, eram os mercadores de origem inglesa e holandesa50. Os senhores nobres, por seu turno, apoiaram a expansão desta indústria rural na medida em que a mesma podia não apenas valorizar suas terras, como converter em rendas monetárias aquelas até então pagas em espécie pelas populações camponesas. 47 De acordo com HENDERSON (1967a), os têxteis ainda contavam por 74% do produto manufatureiro total da Silésia em 1800, com o linho sendo o mais importante ramo da manufatura (60%); os produtos da indústria do metal vinham em segundo lugar; na virada do século XVIII, segundo MEHRING (1975), produtos de linho eram manufaturados em 287 diferentes localidades na Silésia, praticamente todas através do sistema mercantil localizado em zonas rurais; as principais destas eram as de Hirshberg, Greifenberg, Schmiedeberg e Landeshut; 48 “Além do mais, pode acontecer que esses domínios possuam seus próprios burgos e sirvam de base a empresas industriais: olarias, destilarias de álcool, fábricas de cerveja, moinhos, louçarias, altos-fornos (como na Silésia). (...) Durante a segunda metade do século XVIII, na Áustria, os senhores participam da instalação das manufaturas têxteis.” (BRAUDEL, 1996b, pp. 234-5); 49 “At that time [the 16th century] foreign merchants entered the Silesian countryside and organized a domestic industry in order to tap the labor services of the rural population that had been spinning and weaving on a parttime basis and mostly for its own use. These trades deliberately bypassed the urban crafts because the corporate fetters made the guild artisans quite incapable of adjusting to the requirements of the new production as demanded by the foreign markets.” (KISH, 1959, p. 543); 50 KISH relata, por exemplo, uma reclamação dirigida às autoridades Habsburgo por parte dos comerciantes locais em 1601 de que “(...) the Dutch and English competitors were undermining their traditional privilegies and thus their very existence.” (1959, p. 544); 64 Mesmo que, desde meados do século XVIII, o comércio do linho silesiano começasse a sofrer intensamente a competição de produtos importados e, ao mesmo tempo, do algodão como produto substituto: Taking advantage of the growth in world commerce during the second half of the 18th century, the lords and the King succeeded in their efforts at industrial expansion. (…) Without doubt, the linen trades had become one of the decisive factors in the regional economy (…). (KISH, 1959, p. 546) Padrão bastante semelhante, tanto no que diz respeito à organização da produção quanto aos principais produtos, se aplica ao caso da Saxônia. As características econômicas destas regiões, especialmente sua diversificação, ou seja, o desenvolvimento concomitante tanto da produção cerealífica para exportação, quanto da extração de minérios e da manufatura de têxteis e metais, as tornavam os principais centros econômicos do território em meados do século XVIII51. Embora não tão ampla, esta mesma espécie de “sinergia econômica” entre setores aplica-se ainda ao caso do Brandemburgo. De fato, o território é um importante centro exportador de cereais, e, ao mesmo tempo, um dos maiores centros de exportação de roupas (também de linho) da “Alemanha” 52. Paralelamente a estas regiões orientais do território, porém, suas áreas “tradicionais” de produção manufatora eram o Sul e o Oeste, ou, mais especificamente, a Renânia, a Westphalia, as cidades da Suábia, a Bavária e Württemberg. No caso da Renânia e da Westphalia, a “sinergia” com a extração mineral é direta: Directly connected with the Rhenish Province was the coal and iron district, which provided it with part of its raw materials and belonged to it industrially. There was a reciprocal relationship between industry and an import-export trade with all parts of the world, which was very extensive by German standards, and a significant direct traffic with all the great emporia of world trade. The flourishing state of trade and industry encouraged the accumulation of capital… (BLACKBOURN, 1998) Neste contexto, tanto a manufatura de minérios como a de têxteis (especialmente a do linho) apresentavam importantes desenvolvimentos. Os produtos de linho e de ferro da Westphalia 51 A Silésia era, em meados do século XVIII, a “região econômica central do Leste da Alemanha” (WALLERSTEIN, 1980, p. 235); e a Saxônia, “a porção mais desenvolvida da Alemanha” (MEHRING, 1975); 52 Em 1793, por exemplo, 61% do total de manufaturas dos territórios Hohenzollern a leste do Elba consistia de tecidos de linho, algodão e seda (GAGLIARDO, 1991, p. 139); 65 encontravam mercados como a Holanda, a Itália, a Dinamarca e mesmo os Estados Unidos, em geral através de portos holandeses no Mar do Norte. Sobre a Renânia, Kish afirma que: Advantageously situated at the crossroads of European trade, it had enjoyed since early medieval times an entrepôt trade that prompted local industry and commercial endeavor. This was particularly so because the Rhine river and an exhaustive network of roads linked the Rhineland with the contiguous Netherlands economy, where in the 16th and 17th centuries the emerging forces of capitalism manifested their greatest vitality. (1959, p. 554) Ao mesmo tempo, diferentemente do Leste, a tendência típica é a de que a produção fosse controlada diretamente pelo artesão ou por grandes mercadores, especialmente holandeses. Em grande parte dos casos, camponeses livres, em geral pequenos proprietários de terra, complementavam sua “renda” através do envolvimento na produção manufatora, a partir de adiantamentos fornecidos por mercadores. As cidades da Suábia, a Bavária e Württemberg, embora também contassem com importantes manufaturas de ferro, destacavam-se especialmente no setor têxtil. Embora estas “velhas” indústrias do Sul e do Oeste da “Alemanha” sejam em geral identificadas como as mais prósperas do território, para Wallerstein, em meados do século XVIII, elas estavam tipicamente em declínio (1980, p. 196). Pois, em seu caso, a forte dependência da produção em relação aos mercadores estrangeiros a tornava amplamente vulnerável às flutuações financeiras e de preços no mercado “internacional”. No caso das regiões orientais citadas anteriormente, embora o “sistema mercantil” também tivesse apresentado um amplo desenvolvimento, o envolvimento na produção de grandes proprietários exportadores de cereais limitava relativamente tal vulnerabilidade. Finalmente, em termos dos bens manufaturados tipicamente importados pelo território, o seu maior canal de distribuição era naturalmente a feira de Leipzig. Os principais produtos eram: os tecidos (especialmente de algodão) e os produtos de ferro da Inglaterra, os bens de luxo da França e o vinho da Península Ibérica. **** A Figura 4 pretende concentrar as principais informações apresentadas neste capítulo. De qualquer forma, Snyder resume da seguinte maneira o panorama econômico da “Alemanha” em inícios do século XIX: The Germany of 1815 was in a weak economic position. The glory of the Hanseatic League had disappeared with the opening of the New World, and the German states had not yet fully 66 recovered from the devastation and desolation of the Thirty Years' War. The economy remained predominantly agricultural, with some three-fourths of the population engaged in agriculture. In the west and in the south, where there were many small farms, the great baronies of the lords constituted a strong aristocratic and conservative counterbalance. The entire town population of Germany was only half as much again as the population of Paris. There were no industries in the modern sense of the term, no important coal production, no steam engines, no large factories. There were such countryside industries as distilleries in Prussia and breweries in southern Germany, and such handicrafts as the making of cutlery in Solingen, clocks and toys in the Black Forest, and weaving in Silesia, but the country workers or peasants who devoted their spare time to handicraft were not adequate material for an independent prosperous middle class. (1969, pp. 86-87) Porém, além deste “panorama geral” sempre enfatizado pela historiografia que, como dito, corresponde fortemente ao panorama europeu, um aspecto merece destaque a partir da apresentação anterior. Se os territórios alemães continham (e tudo indica que realmente continham) regiões que se destacavam sobre esta grande “zona de opacidade” da “economia de auto-suficiência”, o controle quase absoluto sobre aquelas era de agentes de outras “nacionalidades”; ou (para fugir do anacronismo do termo) de agentes que não se relacionavam diretamente com as entidades políticas recortadas naquele espaço. Se estes possuíam alguma “origem”, no sentido de representação política, esta era antes inglesa, francesa e holandesa, e se possuíam um “domicílio”, este em geral era Hamburgo53. Em outras palavras, o “jogo das trocas” não era desconhecido no continente, mas estava fortemente descolado das unidades de poder que então se desenvolviam. O próximo passo desta pesquisa será observar como as “vontades políticas centralizadoras”, ou as iniciativas daquelas unidades de poder, começaram a interferir e se relacionar com este ambiente econômico a partir do século XIX. 53 Como se sabe, a primazia de Hamburgo e de seus mercadores de várias “nacionalidades” viera subsituir o quadro anterior onde estes controles estavam praticamente nas mãos dos mercadores holandeses: “As the only or most important purchasers of German raw products and the only suppliers of Indian spices, they secured an almost intolerable monopoly, which reached its climax through the unconditional dependence of Germany on the Dutch money market during the period 1600-1750. And what Holland was with regard to Indian wares, France was with regard to manufactures and objects d'art. Those Hanseatic towns that were not ruled by Dutch business managers (Lieger) were in slavery to English creditors. Denmark sought to destroy German navigation, fisheries, and trade by its tolls on the Sound and the Elbe, and by its commercial companies.” (SCHMOLLER, 1897); Straszburg Main Ulm Wurrzburg AUGSBURGO NUREMBERG Bamberg Coburg LEIPZIG Halle Od er io Danúb Praga Dresden Frankfurt a. O. Berlim STETTIN O de Viena tula Vís Thorn Cracóvia Varsóvia Königsberg Budapeste Elbing Danzig Oppeln BRESLAU Posen he Wa rt r Principais Rotas Comerciais Principais Centros Financeiros Centros Comerciais Secundários Principais Centros Comerciais Fronteiras do Sacro Império (até as Guerras Napoleônicas) ÁSIA ® LEGENDA EUROPA LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA Manufaturas / Minérios / Cereais Manufatura Manufatura / Minérios Principais Regiões Econômicas FIGURA 4: O ESPAÇO ECONÔMICO “ALEMÃO”: INÍCIOS DO SÉCULO XIX Karlsruhe Mannheim Darmstadt FRANKFURT r Mainz e Wes se o Ren Koblenz ale Trier COLÔNIA Dortmund Essen Sa Mo a Elb ba Bonn BREMEN HAMBURGO Hanover Osnabrück Minden Brunswick Münster Magdeburgo Oldenburgo LÜBECK Rostock El la Dusseldorf Rotterdam Amsterdam Norte Mar do a Stralsund M ál rB tico 67 68 CAPÍTULO 3: A CONFEDERAÇÃO GERMÂNICA E A FORMAÇÃO DO ZOLLVEREIN Nos capítulos anteriores, foram apresentados a evolução do Estado Hohenzollern até 1806, no contexto da situação geopolítica do Sacro Império Romano e da Europa, e um “panorama geral” da economia dos territórios alemães por volta de inícios do século XIX. Este seria, portanto, o “momento” de tentar articular estes dois elementos, ou seja, observar como a “vontade política centralizadora” em geral, e a prussiana em particular, operou sobre aquele ambiente econômico; ou como o “jogo das trocas” articulou-se ao “jogo das guerras” no espaço “alemão”. Deve-se ressaltar que a escolha por interromper as narrativas precedentes em inícios do século XIX não foi casual e deverá se justificar doravante. Como será visto, as Guerras Napoleônicas e o subseqüente fim do “sistema de Westphalia” seriam determinantes não apenas para o ambiente institucional e econômico da Europa Central, mas igualmente para a constituição do Estado Prussiano e para a forma com que o “jogo das guerras” passou a ser conduzido naquele espaço. Para iniciar adequadamente esta análise, convém inicialmente apresentar e discutir o caráter das políticas mercantilistas conduzidas nos territórios do Sacro Império até inícios do século XIX. 3.1 – O “mercantilismo” no Sacro Império Romano até 1806 Como visto anteriormente, o “mercantilismo” é, para Braudel, uma das forças originárias na formação dos “mercados nacionais”1. Schmoller, ainda em 1884, escrevia a respeito: (…) in its innermost kernel it is nothing but state making – not state making in a narrow sense, but state making and national-economy making at the same time; state making in the modern sense, which creates out of the political community an economic community, and so gives it a heightened meaning. The essence of the system lies not in some doctrine of money, or of the balance of trade; not in tariff barriers, protective duties, or navigation laws; but in something far greater: - namely, in the total transformation of society and its organization, as well as of the state and its institutions, in the replacing of a local and territorial economic policy by that of the national state. (1897, §49) 1 Para FIORI, seguindo a linha de Braudel: “(...) se pode dizer que o mercantilismo foi o bisturi utilizado pelos estados territoriais para extrair os ‘mercados nacionais’ de dentro da ‘economia-mundo’ européia do século XVI. E depois, foi a política utilizada, pelos mesmos estados, para proteger sua nova ‘criatura’ contra a concorrência e o ataque dos demais ‘estados/economias nacionais’ emergentes.” (2004, p. 36); 69 Analisando o “fenômeno” sob a perspectiva geral das disputas econômicas intra-européias, Deyon comenta: O mercantilismo pertence à história dos Estados em vias de emancipação econômica, é a política dos que se libertam, nos séculos XV e XVI, da dominação comercial da Itália e dos Países Baixos, dos que combatem no século XVII a das Províncias Unidas, depois no século seguinte a da França e da Inglaterra, é um momento do desenvolvimento nacional dos diferentes povos europeus. (2004, p. 83) No que se refere, no entanto, à “Alemanha”, embora todos os Estados de relativa importância do Sacro Império, ao longo especialmente do século XVIII, tenham, em maiores ou menores graus, conduzido políticas “cameralistas”2, existem inúmeras controvérsias historiográficas tanto no que diz respeito a seus objetivos quanto a seus resultados3. O diagnóstico em geral mais aceito, porém, é similar ao de Barraclough: The mercantilism of the age was not foreign to Germany; there were princes enough who saw the advantage of pursuing a definite economic policy and stimulating economic life; but the units were in general too small and artificial, the bounds within which they worked too narrow, for mercantilism to register any notable success. Except for provinces like Meissen, with its rich mineral deposits, commerce and industry in Germany, ruined in the Thirty Years War, continued to be fragile growths, even where most carefully tended, and the middle classes remained economically and politically weak. (1946, p. 392) O mercantilismo não teria sido bem sucedido na “Alemanha”, segundo Barraclough, por não ter contribuído para alterar o quadro “regressivo” de sua economia entre 1648 e inícios do século XIX, especialmente por não ter desenvolvido o comércio e a indústria e fortalecido as “classes médias”. Porém, do ponto de vista de Braudel, Schmoller ou Deyon, ou seja, no que se refere à construção de “economias nacionais” como instrumento de “libertação” de economias dominantes, até que ponto ele teria sido eficiente? O principal representante do cameralismo entre os Hohenzollern foi Frederico II4, sendo em geral considerado inclusive um “Absolutista Iluminado”5. As discussões precedentes, porém, destacaram como traço central do governo de Frederico, bem como dos Hohenzollern a ele 2 Para uma descrição destas, ver GOOCH (1948, pp. 41-55); Ver, sobre o mercantilismo na “Alemanha”, MAGNUSSON (1994, pp. 03-17; pp. 174-219); e HECKSCHER (1955); 4 “Frederico II é o modelo perfeito. De todos os soberanos da Europa Central e Oriental da segunda metade do século XVIII, é ele provavelmente aquele cuja administração mais lembra o ministério de Colbert.” (DEYON, 2004, p. 42); 5 O conceito foi cunhado inicialmente em 1874 pelo economista Wilhelm Roscher para descrever a última fase do Absolutismo, a partir de 1740; recentemente, porém, vem sendo qualificado pela historiografia como inadequado para descrever as práticas dos três principais monarcas aos quais em geral se aplica: Frederico II, José II, da Áustria e Leopoldo II, da Rússia; ver, a respeito, WEIS (1986); e INGRAO (1986); 3 70 precedentes, o militarismo. De fato, quaisquer análises das práticas cameralistas dos Estados do Sacro Império devem ser conduzidas a partir desta perspectiva: As for economic principles, cameralistic practice was full of contradictions due to the fact that economic development, though a cherished goal of government, was not an end in itself, but had to serve the reason of state and was not supposed to disrupt the existing social order. (BRAUN, 1975 p. 281) Como discutido, a principal fonte de recursos financeiros do Estado Hohenzollern era de natureza fiscal, especialmente pelas receitas dos domínios dinásticos e pelos impostos cobrados diretamente sobre as populações, sobretudo camponesas, tanto destes como dos domínios privados. Ao mesmo tempo, o volume populacional era uma das variáveis centrais para manter um contingente militar significativo. Estes elementos, portanto, “explicam” porque a principal política “mercantilista” na Prússia desde Frederico, Grande Eleitor, e ainda mais intensamente no Reinado de Frederico II, tenha sido a colonização de seus territórios, especialmente dos que vinham sendo gradualmente incorporados aos domínios “originais” da Dinastia desde 16486. Neste contexto poderia ser, portanto, compreendida a (suposta) afirmação de Frederico II de que “the first principle, the most general and most true, is this: that a state’s true strength lies in its large population.” (citado em HAFFNER, 1998, p. 38). A tradição de atração de populações inicia-se na “Prússia” quando o Grande Eleitor, “em resposta” à revogação do Edito de Nantes pela França, lançou no mesmo ano (1685) o Edito de Potsdam, “convidando” os Protestantes perseguidos a ingressarem em seus territórios7. Por volta do ano de 1700, segundo Haffner (1998, p. 37), um em cada três habitantes de Berlim era de origem francesa. Durante o Reinado de Frederico Guilherme I, uma nova onda de imigração teria trazido aproximadamente 20 mil “fugitivos” da Contra-Reforma em Salzburgo, colonizados especialmente na Prússia Leste, então devastada por epidemias de Peste. A política populacional de Frederico II, porém, teria sido a mais extraordinária ao atrair aproximadamente 300 mil emigrantes para os territórios prussianos (DORN, 1931, p. 404). 6 Deve-se recordar, neste contexto, que a despopulação foi especialmente severa após a Guerra dos Trinta Anos e até meados do século XVIII; este elemento, ou seja, a falta crônica de populações, é utilizado com freqüência não apenas para compreender as políticas Hohenzollern, mas igualmente, como visto, o fenômeno da Segunda Servidão, dada a necessidade dos grandes proprietários de “fixar”o camponês à terra para garantir a mão de obra necessária aos cultivos nos domínios; ver, a respeito, ANDERSON (1989); deve-se recordar, neste contexto, que metade das receitas dos Hohenzollern eram ainda, em 1740, geradas pela economia de seus domínios diretos; 7 STEINBERG, porém, destaca o papel diplomático e político da ação de Frederico, utilizando a revogação do Edito de Nantes para romper sua aliança com a França (1945, p. 134); 71 Além de um volume populacional significativo, qualquer exército necessita de um fluxo regular e significativo de alimentos, uniformes e armas. Neste sentido, portanto, também podem ser compreendidas as práticas intervencionistas recorrentes do “cameralismo” sobre estes mercados. Frederico II, por exemplo, interveio naqueles tanto diretamente, através de práticas de “preço máximo” e de proibição de exportações8; quanto indiretamente, com a criação, por exemplo, dos Landschaften9. Seu interesse sobre a Silésia, e o conseqüente investimento em suas indústrias e minas, esteve majoritariamente voltado para a extração de minérios, sobretudo ferro, e o simultâneo desenvolvimento da manufatura de armas (HENDERSON, 1967b, pp. 4-9), em regiões próximas a Oppeln (que possuía uma ligação direta com Berlim). No que se refere ao sistema de comunicações internas, Frederico II foi especialmente refratário: em primeiro lugar, porque julgava que qualquer melhoria nos canais existentes poderia facilitar a entrada ou a passagem de tropas inimigas (HENDERSON, 1967b, p. 37); em segundo, porque acreditava que a retenção de mercadores transportando bens ao longo daqueles canais seria benéfica para o orçamento do Estado, já que facilitaria a coleta de taxas e pedágios. Em resumo: 8 “That happened so that he could have cheap bread for his army and full granaries in case of war.” MEHRING (1975, Parte II, Seção 2.2, §5); segundo FAY: “Frederic’s grain policy was much the same of the Great Elector, but was pursued on a much larger scale. Generally the exportation and importation of grain was forbidden, though he sometimes allowed his own grain officials to import under cover from Poland. With the frontiers generally closed to grain, Frederick bought up and stored in government warehouses wheat, barley, and rye in plentiful years when the price was low, and sold it again in years of bad harvest when prices tended to rise and would otherwise have caused great hardship to consumers. In this way he succeeded in his aim of keeping a fairly stable price level for grain and at the sime time made a handsome profit.” (1964, pp. 124-125); finalmente, TILLY acrescenta que: “Much of the Hohenzollern grain policy went into building up stores and supply systems for a big standing army, and assuring the free movement of grain into those provinces where the army was concentrated. (…) Obviously, it served the Junkers of the East, who were simultaneously masters of war and masters of rye.” (1975a, p. 453); 9 Tecnicamente, os Landschaften eram sociedades de crédito privadas, instituídas em nível provinciano com o incentivo de Frederico II (em alguns casos, inclusive, com sua participação financeira), entre os grandes proprietários de terras nobres, especialmente após a “bancarrota” generalizada causada pela a Guerra dos Sete Anos; na prática, porém, passaram em muitos casos a se constituir como um corpo político representante da Nobreza; ver, a respeito, ROSENBERG (1958, pp. 169-170); sobre as petições dos senhores nobres da Silésia após a Guerra dirigidas a Frederico II, KISH afirma: “The King heard them with sympathy and granted them their principal demand, the establishment of a land mortgage bank, the so-called Landschaft, meant to restore the lords credit standing and channel the flow of capital once more in their direction.” (1959, p. 550); HEATON sugere que os Landschaften teriam sido os percussores das instituições de crédito do século XIX: “They obtained funds by selling bonds which, being backed by the entire property of all the members, enjoyed the low interest rate of a gilt-edged security. The plan was copied after 1830 in other central European states and found a jointstock state-subsidised variant in the French Crédit Foncier, launched in 1852.” (1971, p. 25); 72 All the other state departments were rigidly subordinated to the requirements of the army. Its maintenance was made the principal task of the treasury. Compulsory school-attendance was ordered (though not effected) in 1717, because the army wanted a host of non-commissioned officers who had mastered the three R's. After a heavy outbreak of the plague, peasants were settled in the deserted districts of East Prussia, and large-scale ameliorations of bogs and sandy plains were subsidized, because the village supplied the army with the fittest recruits. The manufacture of cloth was encouraged, because the army had to be properly clothed. Industrial life as a whole, with protectionist tariffs here and freedom of trade there, was regulated according to the diverse needs of the commissariat. (STEINBERG, 1945, p. 143) 10 No que se refere a seus órgãos de execução, foram especialmente através das 17 Câmaras Provincianas do território Hohenzollern que as políticas “cameralistas” de Frederico II foram conduzidas. As Câmaras, formadas em geral por 20 a 30 membros, assemelhavam-se a órgãos financeiros: mantinham os tesouros provincianos, coletavam os impostos e a renda dos domínios reais, regulavam as despesas oficiais, etc. Contudo, através de reuniões periódicas entre seus Presidentes e o Monarca em Berlim, convocados para discutir com Frederico II “medidas para aumentar as receitas de cada Província” (DORN, 1932), elas se transformaram gradativamente nos órgãos executivos de suas políticas econômicas: colonizavam estrangeiros em novos territórios, estabeleciam novas indústrias, observavam os movimentos do comércio e dos preços, mantinham contanto com os mercadores locais, fiscalizavam as feiras nas cidades, informavam-se a respeito das necessidades de consumo, inspecionavam as plantações dos camponeses nas áreas rurais e as lojas dos comerciantes nas vilas, e viajavam à procura de mercados para as manufaturas prussianas. Os trabalhos das Câmaras variavam, naturalmente, conforme a Província. Na Prússia Leste, por exemplo, onde eram extensos os domínios reais, seus trabalhos eram majoritariamente agrícolas; na Silésia, comerciais e industriais; nas províncias da Westphalia, preocupavam-se especialmente com o desenvolvimento da indústria mineira; na Frísia Leste, com o desenvolvimento da pesca; em Magdeburgo, com o monopólio real do sal. 10 O fortalecimento das chamadas “classes médias”, portanto, não é, necessariamente, um objetivo per se: “The bourgeoisie was expected to produce the weapons and the uniforms for the army and to pay the bulk of the military taxes; the peasantry was to supply both the food and the recruits who would eat it.” (CRAIG, 1968, p. 17); 73 Para Dorn, mesmo que o objetivo de Frederico II ainda girasse especialmente em torno do aumento das receitas disponíveis para o exército11, a realização daquele interesse representou, na prática, um incentivo às atividades produtivas12: At no time, however, in the entire course of its history did it perform services of greater importance for the future of the Prussian monarchy than in the second half of the reign of Frederick the Great. It managed to support the army of a first-rate power on the resources of a third-rate state and at the same time accumulated a large reserve in the public treasury; it opened up the mining industry in Silesia and in the Ruhr district; it carried through a project for extensive internal colonization in urban and rural districts which added upwards of 300,000 inhabitants to the sparsely populated provinces of Prussia, thus making in 1786 every fifth inhabitant a colonist; it did much to introduce the improved British agricultural methods among the backward Prussian peasantry; it liberated the craft guilds and adapted them to the needs of capitalistic industry while it endeavored to execute, and not altogether without success, a comprehensive plan to industrialize an almost wholly agricultural country. (1931, p. 404)13 Em resumo, portanto, a lógica mercantilista, no contexto dos Estados do Império, dado seu caráter militarista e expansionista, está diretamente associada ao aumento de receitas para fins militares14. O desenvolvimento da indústria e do comércio, o fortalecimento das “classes médias”, e, finalmente, a construção de um espaço econômico coerente, de um “protomercado nacional”, poderiam surgir apenas, neste contexto, como sub-produtos de políticas voltadas para o que Braun denominou “razão de estado”15. 11 “To support the growing financial needs of this army was the pivotal function of the Prussian bureaucracy. All improvements in administrative methods and the wider scope and greater intensity of bureaucracy activity were made to serve the supreme end of producing a maximum public revenue.” (DORN, 1931, p. 405); ver ainda STEINBERG (1945, p. 150); mais geralmente, ARDANT trata diretamente das limitações impostas aos sistemas financeiros dos proto-estados modernos ao longo dos séculos XVII e XVIII e associa a prática mercantilista diretamente àquelas: “We have much evidence that they [the governing classes] reasoned quite simply as follows: seeing that taxation requires a certain economic structure, developed economic exchange active commerce, and the division of labor, it behooves the state, and is in fact vital to its existence as a state, to bring its power to bear upon that structure and to shape it into a structure better able to support taxation.” (1975, p. 196); e, portanto: “Fiscal concerns were at the root of mercantilist policy.” (1975, p. 196); 12 Deve-se comentar, porém, que a lógica das políticas de Frederico II ainda é tema de debates historiográficos: “The reason for Frederick’s policy choices remain a biographical as well as a factual puzzle: did Frederick not follow the debates and discussions then being held among the Physiocrats, members of the École comerciale, and free-enterprise theorists, as well as the contemporary economic developments in western Europe, or were they perhaps unknown to him? Or were the economic policies he applied from 1763 onward (as many maintain) really ‘the best suited for Prussia’s interests?” (WEIS, 1986, p. S189); 13 O diagnóstico de WEIS, porém, é mais cauteloso: “(...) Frederick’s economic policies were beneficial in some areas and inhibitory in others. Of course, one cannot state for certain how the prussian economy at that time would have developed without Frederick’s direction. In any event, the productivity of his country’s economy increased in the second half of the eighteenth century – although, indeed, no more so than in the other large European states of the time.” (1986, p. S189); 14 VEBLEN, por exemplo, resume o “cameralismo” com a máxima: “making the most of the nation’s resources for the dynastic purposes of the State” (1915, p. 70); 15 Mais geralmente, DEYON (2004, p. 43) afirma que: “O mercantilismo é, antes de tudo, um serviço da política, uma administração do tesouro real, um instrumento de grandeza política e militar. O dirigismo 74 Se o mercantilismo, portanto, é compreendido enquanto uma doutrina de incentivo às atividades produtivas e ao fortalecimento do mercado nacional per se, não se poderia julgar inequivocamente se a Prússia foi ou não bem sucedida16 ao longo do século XVIII na aplicação daquela “doutrina”. Entretanto, se é visto enquanto um conjunto de práticas de intervenção na atividade econômica orientadas pela vontade política do Estado, a Prússia certamente foi um dos mais bem sucedidos Estados mercantilistas do Império, na medida em que aquelas conseguiram “modelar a economia às necessidades do exército” (CRAIG, 1968, p. 15) e, ao mesmo tempo, elevar aquela unidade territorial ao “clube” das Grandes Potências, ainda que como seu “membro” mais fraco. Do ponto de vista da criação de um (proto) mercado nacional, porém, as políticas mercantilistas de Frederico representaram incentivos para a formação de “espaços econômicos coerentes” antes em nível Provinciano do que propriamente “nacional”. Como será visto doravante, de fato, os Presidentes das Províncias se tornariam os principais opositores da proposta de unificação tarifária do Estado Hohenzollern apresentada em 1817. Finalmente, ainda que o desenvolvimento das atividades produtivas observado no período de Frederico II por si mesmo pudesse apontar futuramente para uma maior unificação econômica dos territórios prussianos (no sentido de aumentar a circulação e incentivar a “economia de mercado”), este desenvolvimento se concentrou especialmente sobre o eixo Silésia – Berlim – Mar Báltico, ou seja, sobre o espaço da Europa Oriental entre os Rios Elba e Vístula; e, portanto, apontaria mais para a formação futura de um proto mercado nacional “prussiano” do que propriamente “alemão”. Na segunda metade do século XVIII e em inícios do século XIX, como frisam grande parte dos historiadores da economia da “Alemanha” (especialmente para justificar o “atraso” daquela), o “espaço econômico alemão” era notadamente segregado, sobretudo pela imensa estrutura de tarifas, pedágios, impostos e alfândegas, a partir dos quais os Governantes “absolutistas” tiravam boa parte de seu “sustento”17. E suas práticas cameralistas, pelo discutido acima, apenas contribuíram para levar esta segregação a seus limites máximos. econômico do Estado clássico corresponde a motivações financeiras, é um sistema de produção, de riqueza e não de distribuição.”; 16 Esse parece ser precisamente o ponto de vista a partir do qual MEHRING (1975) julga as políticas econômicas de Frederico II: “in short [...] that confused chaos of a degenerate mercantilism, completely alienated from its original sense.”; 17 Esta segregação, de fato, advinha não apenas daqueles “entraves” mas igualmente das recorrentes “guerras tarifárias” entre os Estados do Império; um exemplo típico foi a disputa que envolveu a Áustria, a Prússia e a 75 3.2 – A Confederação Germânica e o Estado Prussiano: 1815 Como se sabe, a Revolução Francesa e especialmente as Guerras Napoleônicas alteraram profundamente a fisionomia política da Europa Central18. Entre outras coisas, o Sacro Império Romano deixou formalmente de existir em 1806. Porém, o que é mais importante, a maioria das alterações políticas e territoriais operadas sob a influência francesa no período entre 1795 e 1806, especialmente a secularização dos territórios eclesiásticos e a anexação (ou “mediatização”) de pequenos estados e das cidades imperiais, não foram canceladas após sua derrota em 1813. A nova organização dos territórios alemães, a Confederação Germânica, correspondeu à transformação das aproximadamente 234 unidades políticas do Império em 38 Estados soberanos (e 04 cidades livres), como mostra a Figura 5 abaixo. Saxônia entre 1755 e 1786 a respeito das exportações de bens manufaturados prussianos para aqueles Estados (HENDERSON, 1939, p. 37); 18 Para uma descrição detalhada de seus efeitos em cada um dos principais Estados do Império, ver GOOCH (1948, pp. 193-209); para descrição dos eventos diplomáticos e políticos entre 1792 e 1815, ver BRUNN (1965); 76 LEGENDA o ltic á B ar Schleswig Norte o d r a M Königsberg M Kiel Lb 08 01 Danzig Rostock 06 34 Hb 05 Br Oldenburgo Elb er a 07 18 Rotterdam Brunswick Berlim r Fulda 15 Fk Mainz Main 04 24 26 14 13 Oppeln 20 21 30 Coburg 23 22 02 Praga Darmstadt Trier Breslau Dresden Weimar 27 28 13 Koblenz la de Gotha 29 se O Erfurt 12 Wetzlar Mo Luxemburgo Leipzig 25 Colônia 33 Varsóvia ba 31 01 35 Posen El ale 32 r o Ren 16 Sa e Wes Dortmund tula Frankfurt a. O. Magdeburgo 17 Vís 01 19 Münster Wa rt he Hanover Minden Thorn Od 03 Amsterdam Aachen Stettin Wurrzburg Bamberg Mannheim 09 Nuremberg CONVENÇÕES Fronteiras da Confederação Stuttgart Straszburg 09 10 Fronteiras Políticas 37 Danúb Ulm Augsburgo 11 38 Freiburg Rios Principais Cidades Principais io Viena Munique LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA Basel Zurich 36 02 EUROPA ® ÁSIA FIGURA 5: A CONFEDERAÇÃO GERMÂNICA: 1815 01: PRUSSIA 02: ÁUSTRIA Estados “do Meio”: 03: HANOVER 04: SAXÔNIA 05: MECKLENBURGO-STERLITZ 06: MECKLENBURGO-SCHWEIS 07: OLDENBURGO 08: HOLSTEIN 09: BAVÁRIA 10: WÜRTTENBERG 11: BADEN Estados da Europa Central 12: HESSE-KASSEL 13: HESSE-DARMSTADT 14: HESSE-HOMBURG 15: NASSAU 16: WALDECK 17: LIPPE 18: SCHAUNBURGO-LIPPE 19: BRUNSWICK Estados da Turíngia 20: REUSS-SCHLEIZ 21: REUSS-GLEIZ 22: REUSS-LOBENSTEIN 23: REUSS-EBERSDORF 24: SCHWAZ.-RUDOLSTADT 25: SCHWAZ.-SONDERSHAUSEN 26: SAXÔNIA-HILDBURGHAUSEN 27: SAXÔNIA-WEIMAR-EISENACH 28: SAXÔNIA-MEININGEN 29: SAXÔNIA-GOTHA-ALTENBURG 30: SAXÔNIA-COBURG-SAALFELD Ducados Anhalt 31: ANHALT-KÖTHEN 32: ANHALT-BERNBURG 33: ANHALT-DESSAU Outros Estados 34: LAUENBURGO 35: LUXEMBURGO 36: LIECHENSTEIN 37: HOHENZOLLERN-HECHINGEN 38: HOHENZOLLERN-SIGMARIEN Cidades Livres Br: BREMEN Hb: HAMBURGO Lb: LÜBECK Fk: FRANKFURT 77 Em termos de distribuição de poderes na Confederação, a “potência” dominante, como antes no Sacro Império, continuava sendo a Áustria, embora sua presença territorial no Sul da “Alemanha” tenha desaparecido. Em seguida, estava naturalmente a Prússia, cujos territórios agora concentravam aproximadamente metade da população da Confederação, porém apresentando uma localização bastante distinta do período anterior às Guerras. Como “compensações” pela perda de territórios no Leste e por “abrir mão” de boa parte da Saxônia, à Prússia recebeu os territórios ocidentais da Renânia e da Westphalia, especialmente para prevenir uma possível agressão francesa19. O território Hohenzollern seria agora composto de dois grandes blocos separados por Hanover, Brunswick e Hesse-Cassel. Seguidos da Áustria e da Prússia20 estavam os chamados “Estados do Meio” (Mittelstaaten): Oldenburgo, Hanover, Holstein, Mecklenburgo-Sterlitz, Mecklenburgo-Schweis, Baden, Württemberg, Bavária e Saxônia. O termo foi cunhado especialmente para designar aquelas entidades que, embora nitidamente inferiores política e territorialmente com relação à Áustria e a Prússia, podiam se colocar como obstáculos ao expansionismo de ambas: In practice Austria and Prussia were the two states that inevitably played a role on the European stage, while the others tried to prevent either one of them from gaining a dominant position or (...) the two together establishing a joint hegemony. (BLACKOBURN, 1998, p. 93) Todos os 38 membros da Confederação eram Estados Dinásticos e apenas quatro cidades mantiveram seu status de cidades livres: Frankfurt, Hamburgo, Bremen e Lübeck. 19 “Thus it was the English desire for a strong barrier against French aggression, reinforced by the necessity for finding territorial compensations to offset the Russian absorption of nearly the whole of Poland, which led to the acquisition by Prussia of a major accretion of territory on the Rhine -- a cardinal change in the political geography of the Prussian state and in the direction of Prussian policy without which its rise to predominance between 1815 and 1871 would scarcely have been thinkable.” (BARRACLOUGH, 1946, p. 411); a conseqüência, como comenta o próprio autor, foi a de que “(…) the center of gravity of the former BrandenburgPrussia, having been shifted to the east by Napoleon, now tilted even more sharply to the west.” (BARRACLOUGH, 1946, p. 393); vale notar, porém, que, nesta ocasião, embora a região fosse, de fato, uma das mais desenvolvidas economicamente dos territórios alemães, suas grandes reservas de carvão ainda não haviam sido descobertas e não havia sinais de que se transformaria, em meados do século, na principal área industrial da Alemanha; ou seja, estas compensações não foram uma “vitória” da Prússia, pelo contrário: “(...) Prussia received its compensation for Polish losses in a place where it had never expected it and where indeed it was not all that welcome ... The frontier which had to be defended there was still regarded as threatened; the ‘Watch on the Rhine’ was not an enviable task. (...) The British historian A. J. P. Taylor has called this compensation by annexation of the Rhineland a kind of practical joke played on poor Prussia by the great powers.” (HAFFNER, 1998, p. 92); 20 Nem todos os seus territórios, porém, foram incluídos na Confederação, mas apenas aqueles que faziam antes parte do Sacro Império; do Império Austríaco estavam excluídos portanto os Reinos da Hungria, Dalmácia, Galícia, Croácia e Eslavônia, Lombardia e Veneza, Istíria, a Principalidade da Transilvânia e o Ducado de Bucovina; do Reino da Prússia, agora dividido em 10 províncias (09 em 1824, com a junção das Províncias de Cléves-Berg e do Baixo Reno), não faziam parte as Províncias da Prússia Leste e Oeste e Posen (as sete outras eram: Silésia, Brandemburgo, Saxônia, Westphalia, Baixo Reno, Cléves-Berg e Pomerânia); 78 A estrutura política da Confederação21, como articulada pelas Atas Finais do Congresso de Viena22 e, posteriormente, pela Constituição Final de Viena em 182023, correspondeu a uma forma de associação bastante frouxa entre seus membros, que mantiveram praticamente todas as prerrogativas de Estados soberanos. Ao mesmo tempo, as possibilidades efetivas de atuação da Confederação enquanto unidade política foram bastante limitadas24. De fato, a opinião geral entre os historiadores é a de que a forma pela qual a Confederação foi articulada teria “respondido” a duas necessidades centrais da conjuntura política da Europa pósnapoleônica: por um lado, a de evitar a formação de um Estado soberano unificado no espaço da Europa Central; e, ao mesmo tempo, a de assegurar a existência de uma entidade com uma articulação política suficiente para inibir a expansão de outros Estados sobre aquele espaço25. Em outras palavras, a Confederação teria garantido um “equilíbrio de poder” entre as cinco “Grandes Potências”, ou correspondido a uma espécie de “pentarquia” européia. Para Portillo: La Confederación Germánica surge, como es sabido, ante todo con esta voluntad, la reordenación del espacio alemán como sistema de seguridad europeo sobre las bases planteadas en el Congreso de Viena. (...) En realidad, como es también sabido, se estaba assistiendo a un reordenamiento de Europa que congeniara las aspiraciones de cinco o a lo sumo seis grandes poderes. (...) Ambos circunstancias – la necessidade de reordenar el centro europeo y la búsqueda de un nuevo sistema de seguridad – enmarcan y contextualizan el nacimiento de la Confederación Germánica en 1815. (1994, p. 12)26 O elemento essencial para garantir a estabilidade desta “solução”, pelo menos internamente à Confederação, seria, naturalmente, um “compromisso” entre seus dois maiores Estados, já que suas disputas, ao longo do século anterior, haviam determinado em grande medida os 21 Para detalhes sobre esta, ver PORTILLO (1994); para um resumo da Ata Final da Confederação, lançada em 1820, ver ORRUÑO et al. (1994, pp. 165-166); 22 Para uma descrição sumária, ver GULICK (1965); A chamada Wiener Schluβakte, aprovada por unanimidade pelo Bundestag da Confederação naquele ano; Como comenta PORTILLO, mais especificamente, as possibilidades políticas da Confederação estavam mais relacionadas a questões internas a seus Estados membros: “Efectivamente, escasos son los elementos de definición positiva del orden interalemán que se hallan en los documentos fundacionales de la Confederación. Únicamente se precisan y detallan, também posteriormente en 1819 y 1820, aquellos que más podían servir para el mantenimiento del principio monárquico, la legitimidad dinástica y el control de los movimientos y grupos revolucionarios.” (1994, p. 11); 25 “In the interest of European peace the princes would have to relinquish the right to wage war on each other and agree to live together in a loose association or confederation of states. At the same time the fact that the princes would remain rulers of virtually sovereign states was the best possible insurance against the creation of a united Germany. Thus before the Congress of Vienna assembled in the autumn of 1814 the Great Powers had already decided upon the creation of a German Confederation.” (CARR, 1979, p. 3); 26 A crítica de SCHROEDER (1992) com relação à utilização da idéia de “balanço de poder” ao sistema instituído com o Congresso de Viena não altera o elemento que interessa especialmente a esta pesquisa, ou seja, o congelamento das fronteiras políticas do espaço alemão; GULICK comenta, de qualquer forma: “The settlement as a whole, unfair in many respects, incomplete in numerous details, destined to be thus endlessly revised, was yet remarkably consistent with the ideal of re-establishment in Europe a balance state system.” (1965, p. 665); 23 24 79 conflitos militares no interior do Sacro Império27. Hobsbawm resume da seguinte forma o panorama político da Europa Central em 1815: Em termos econômicos e territoriais, a Prússia lucrou relativamente mais com a organização de 1815 do que qualquer outra potência, e de fato tornou-se pela primeira vez uma grande potência européia em termos de recursos reais (...). A Áustria, a Prússia e o rebanho de Estados alemães menores, cuja principal função internacional era fornecer um bom estoque de criação para as casas reais da Europa, vigiavam-se mutuamente dentro da Confederação Alemã, embora a ascendência da Áustria não fosse desafiada. A principal função internacional da Confederação era manter os Estados menores fora da órbita francesa, na qual eles tradicionalmente tendiam a gravitar. (1977, p. 121) Deixando temporariamente de lado as discussões a respeito das bases em que esse “compromisso” foi estabelecido e as conseqüências que traria posteriormente, o período entre 1815 e 1866 não testemunhou, de qualquer forma, conflitos militares entre os Estados da Confederação e, portanto, naquele sentido, atingiu o objetivo ao qual supostamente se propôs28. Em outras palavras, o “jogo das guerras” foi “congelado” durante 50 anos, ou passou a ser travado em outras esferas que não diretamente através de conflitos bélicos. Do ponto de vista econômico, as conseqüências da Revolução Francesa e das Guerras Napoleônicas não foram da magnitude daquelas trazidas ao território “alemão” em termos políticos. Porém, como se sabe, uma das exigências do Tratado de Tilsit de 1807 foi a aderência ao Bloqueio Continental pela Rússia e pela Prússia29, ou seja, ao Decreto de Berlim de novembro de 1806, pelo qual os portos continentais estariam fechados a quaisquer transações com a Inglaterra e todos os bens de origem ou embarque ingleses seriam confiscados e destruídos30. Ao mesmo tempo, e ainda mais importante para aquelas “economias”, foi o fato de não ter ocorrido um retorno à chamada “política comercial frouxa” 27 “ .. cualquier proyecto de ordenamiento interalemán y de seguridad europea debía pasar por un compromiso entre las dos grandes potiencias alemanas.” (PORTILLO, 1994, p. 13); deve-se comentar que isso é verdadeiro mesmo considerando que os resultados da disputa Habsburgo-Hohenzollern fossem fortemente determinados pelo balanço da guerra “maior” entre a França e a Inglaterra, como o foram durante o século XVIII (KENNEDY, 1989); 28 “Despite latent tension, Habsburg-Hohenzollern rivalry was more muted in these years than it had been in the eighteenth century. There was to be peace between the sovereign members of the Confederation until 1866.” (BLACKBOURN, 1998, p. 96); para HOBSBAWM: “De fato, não houve nenhuma Guerra total na Europa, nem qualquer conflito armado entre duas grandes potências, da derrota de Napoleão à Guerra da Criméia, em 1854-6. Na verdade, exceto a Guerra da Criméia, não houve nenhuma Guerra que envolvesse mais do que duas grandes potências entre 1815 e 1914” (1977, p. 118), embora GULICK advirta que: “the absence of a general European war cannot reasonably be attributed to the arrangements mode at Vienna and Paris in 1814-15, since many significant parts of those arrangements were soon changed.” (1965, pp. 666-667); 29 “From Napoleon's point of view, all the campaigns which France had waged since 1793 were only part of the war against England; his victories in Italy, Germany and elsewhere were important to him only in so far as they served his ultimate purpose.” STEINBERG (1945, p. 165); 30 Como se sabe, a Áustria (em 1809) e a Suécia (em 1810) também entrariam no Bloqueio; 80 dos anos anteriores à Guerra. Em geral, todos os países europeus adotaram o “protecionismo” e “fecharam” seus mercados a bens tanto manufaturados como agrícolas31. Como discutido no capítulo anterior, todas as regiões economicamente dinâmicas do território “alemão” possuíam uma característica comum: dependiam, em maiores ou menores graus, de agentes de outras “nacionalidades” como articuladores do comércio e da produção, tanto manufatora quanto agrícola (especialmente aqueles de origem inglesa “sediados” em Hamburgo). A “economia” exportadora de grãos do Leste do Elba, os “grandes” centros manufatores e mineradores (Silésia, Saxônia, Brandemburgo, Renânia e Westphalia), os centros internos de “distribuição” (Leipzig e Frankfurt) em geral eram controlados por estes agentes, cujos canais de circulação giravam em torno dos Mares do Norte e Báltico. Desta forma, tanto o Bloqueio Continental como as políticas protecionistas dos países europeus após 1815 representariam um profundo choque àquelas economias. A produção de grãos para exportação, em especial, foi seriamente afetada. De fato, todo o período entre 1806 e 1837 é considerado como de “crise agrícola” nos territórios alemães (BLACKBOURN, 1998, p. 68; KITCHEN, 1996, p. 24), com os preços dos grãos no mercado “internacional” atingindo níveis próximos àqueles do período após a Guerra dos Trinta Anos32. As regiões dedicadas exclusivamente às atividades cerealíficas (como a Pomerânia, Posen, as Mecklenburgos, e as Prússias Leste e Oeste) foram naturalmente mais atingidas33. No que se refere à manufatura, tanto de têxteis quanto de metais, embora algumas regiões tenham experimentado um rápido surto de prosperidade como conseqüência do Bloqueio Continental34, em geral concorda-se que, após 1815, apenas aquelas que “se especializaram” 31 Este seria precisamente o período da instituição das chamadas Leis do Trigo na Inglaterra, que também foram eventualmente adotadas pela França e pela Holanda: as importações de cereais pela Inglaterra estiveram inteiramente interrompidas entre 1814 e janeiro de 1816, novamente de novembro de 1817 a fevereiro de 1818 e de fevereiro de 1819 até 1822; 32 “La primera parte del siglo XIX, y, especialmente, la época posterior a las guerras napoleónicas, trajo consigo una crisis en la agricultura alemana. En un comienzo, la imposibilidad de exportar a Inglaterra ejerció presión sobre los precios; después, las buenas cosechas de 1819 a 1821 produjeron sobre-producción y una caída dramática de los precios. Hasta los años 1830 no se superó la depresión agrícola de la década anterior…” (PIEREMKEMPER, 2001, p. 104); 33 Segundo BROSE (1997, p. 111), entre 1824 e 1834, 230 grandes proprietários da Prússia Leste teriam declarado falência; boa parte das propriedades falidas foram compradas por elementos não Nobres ou “burgueses”, cujo direito de aquisição de domínios “nobres” havia sido recentemente garantido pelas Reformas de Stein e Hardenberg (ver à frente); desta forma, aproximadamente entre 10 e 15% das propriedades Nobres teriam passado para as mãos de Comuns na Prússia Leste neste período; 34 Em especial a região da Renânia a oeste do Reno, anexadas diretamente por Napoleão, não apenas pela interrupção da concorrência de produtos ingleses, mas igualmente pela “abertura” dos mercados da França e da Bélgica; 81 na produção para o mercado “interno” foram capazes de manter sua atividade relativamente ativa. Mesmo nestes casos, porém, as guerras tarifárias no interior da Confederação, que se intensificaram especialmente na segunda década do século (ver à frente), limitavam fortemente as possibilidade de expansão naquele “mercado”35. Henderson assim resume a situação: The Napoleonic wars had seriously disorganized the German economy. (…) Overseas trade had been drastically curtailed, while internal commerce had been forced into unaccustomed channels. (…) The flood of imports of manufactured goods (particularly textiles and hardware) from England when the German ports were opened on the collapse of the Continental System seriously hampered the efforts of German industrialists and merchants to increase their sales in the home market. The depression of industry and trade at this time reached its climax in 1817 when the failure of the harvest led to a serious shortage of food supplies. (1967b, p. 14) Nesta conjuntura, a crise agrícola rapidamente transformou-se em uma crise econômica e financeira para a maioria dos Estados da Confederação, e especialmente para a Prússia: For at least a decade after the Napoleonic Wars Prussian agriculture, industry and trade were in a depressed condition. The export of cereals, timber and linen cloth – the staple trades of Prussia’s Baltic ports – were grievously restricted by the high tariffs of many European countries. In the years 1821-5, for example, the quantity of cereals sent to Britain from Danzig and Elbing was only about one-fifth of what had been exported between 1801 and 1805. An increase in the export of raw wool to Britain was, for a time, almost the only favourable aspect of Prussia’s Baltic trade. West of the river Elbe the small-scale manufactures of the Prussian provinces of Saxony, Westphalia and the Rhineland could not compete with cheap massproduced British goods. (HENDERSON, 1968, p. 119) **** Seria, porém, com um “novo Estado” que a Prússia deveria enfrentar os anos de crise após 1815, pois o período entre 1807 e aproximadamente 1814 havia sido precisamente aquele 35 Em termos relativos, o setor mais afetado foi o da manufatura do linho, voltado especialmente ao mercado “externo”; a Silésia, neste contexto, foi seriamente atingida e tendeu a se “desindustrializar”; seu setor têxtil, além de já ter começado a experimentar, em meados do século XVIII, a concorrência dos tecidos de algodão e dos tecidos de linho do Norte da Irlanda e da Escócia, “sofreu” relativamente mais com a crise, em função de ser, como visto, em geral dirigido pela aristocracia senhorial, que tendeu a deslocar seus investimentos para a compra de terras; as manufaturas de algodão foram especialmente beneficiadas com o Bloqueio e a interrupção da concorrência dos tecidos ingleses; a região mais beneficiada neste caso foi a Saxônia, que tendeu a se tornar “menos agrícola”; os avanços das manufaturas saxônicas no período não foram totalmente perdidos após 1815, e a região passou a fornecer largamente para o mercado interno; o mercado de lã bruta, essencialmente exportador, foi praticamente destruído durante o Bloqueio, mas, após o fim da Guerra, se expandiu relativamente, em função das grandes importações britânicas; o preço da lã teria subido tanto (em relação aos cereais) que grandes proprietários do Leste do Elba tenderam a converter suas plantações em pastagens, especialmente no Brandemburgo, nas Mecklenburgos e na Saxônia (o que eventualmente teria levado a uma relativa queda dos preços após 1825); 82 onde as chamadas “Reformas” do Estado Hohenzollern foram em sua maioria implementadas36. Para grande parte dos historiadores, as Reformas representaram na prática apenas um avanço temporário das chamadas “alas reformistas” da burocracia e do exército prussianos, que já vinham se articulando no interior do Estado desde o século XVIII37. Haffner identifica nestas tendências uma espécie de crise “interna” que ameaçava, tanto quanto a crise “externa”, a existência da Prússia enquanto Estado independente: Not only in its foreign policy did Prussia find itself caught in the crossfire of the great European conflict with Napoleon and the French Revolution, but this crossfire also ran right through domestic politics, and Prussia was fighting for its existence in a state of internal division, pulled one way and another between reform and reaction. (1998, p. 72) Com a derrota militar de 1806 e a imposição do Tratado de Tilsit, as forças reformistas teriam ganho espaço político suficiente para conduzir algumas de suas principais propostas, para se verem novamente eclipsadas pela ala “conservadora” após a derrota de Napoleão e o Congresso de Viena38: 36 O período das Reformas se inicia, formalmente, em julho de 1807 quando Frederico Guilherme III apontou uma Comissão para Reorganização Militar, essencialmente designada para investigar as causas da derrota de 1806 e propor medidas de reorganização do exército; ver, a respeito das Reformas Militares, CRAIG (1968); logo depois é instituída uma Comissão Imediata encarregada de uma reformulação de todo o sistema político da Prússia; ver, especialmente, SEELEY (1879); para uma resenha das interpretações historiográficas das Reformas, ver RÜRUP (2000); 37 Para BROSE (1997, p. 61), por exemplo: “In stark contrast to Francis in Austria, the Hohenzollern's administration had discussed ambitious reforms such as reorganization of the bureaucracy along French lines, peasant emancipation, a popular militia, termination of guild restrictions, and other measures to liberalize the economy. But Frederick William possessed neither the self assurance to trust his instincts and his enlightened advisers, nor the audacity to challenge conservatives entrenched in the bureaucracy, army, and nobility. Consequently, the social, governmental, and military system of Frederick the Great came crashing down in 1806, a victim of France's spreading revolution.”; para o autor, de fato, mais geralmente: “There were forces of change at work everywhere in the German state and society on the eve of the French Revolution, but none had progressed to the point of upsetting Germany's balance. The Holy Roman Empire survived in altered form despite the ravages of the Reformation, the Thirty Years War, and Austro-Prussian rivalry.(…) Finally, absolutism found no serious, far reaching challenges from the private discussions, correspondence, and partly underground culture of the cultivated bourgeoisie..” (1997, p. 23); 38 A derrota de 1806 e o Tratado de Tilsit são destacados pela historiografia como eventos determinantes para o Estado Prussiano, na medida em que evidenciaram seu caráter exclusivamente militarista; para CRAIG (1968), por exemplo: “In referring thus briefly to the basic weakness of the Frederician state, one must add hastily that its collapse, like its rise, was essentially military in nature.” (p. 22) “In the months that followed the capitulation of Tilsit, only the most optimistic could place much faith in the continued existence of Prussia as an independent state.” (p. 37); para STEINBERG: “The Prussian state was a mechanical automaton without a living spirit; when one particle of the machinery broke, the whole works came to a standstill and became a useless heap of scrap. The recently annexed inhabitants of Hanover and Westphalia rejoiced openly at the downfall of their conquerors. The Brandenburgers, Pomeranians and East Prussians accepted it equably, not a few even with satisfaction.” (1945, p. 164); e, finalmente, para BROSE: “The kingdom that previous Hohenzollerns had forged into a great European power was halved in size, compelled to support a French army of occupation, and forced to pay a huge indemnity. Prussian ports were closed to English commerce and a decade of lucrative agricultural 83 In this internal struggle the defeat of 1806-7, which threatened its existence, resulted in temporary victory for the reforming party; the saving War of Liberation of 1813-15, however, led to the triumph of reaction. (…) Yet in this impoverished and humiliated Prussia all the great reform plans, which prior to the disaster had been just plans, were now carried out, hard upon each other: the liberation of the peasantry, self-administration for the cities, opening up of the officers’ corps to commoners, equal rights for nobility and bourgeoisie with regard to land ownership, equal civil rights for the Jews, free pursuit of trades, the new French military system, abolition of corporal punishment in the army – in short, the entire social programme of the French Revolution. (HAFFNER, p. 72 e 83) O programa de Reformas, bem como os diferentes graus de suas implementações, não serão discutidos exaustivamente39, inclusive porque, como a citação anterior indica, o “triunfo da reação” em 1813 fez com que grande parte daquelas “não saísse do papel”40. Duas de suas conseqüências, porém, são de especial importância: a reestruturação do sistema administrativo e burocrático do Estado e as reformas no que se costuma denominar “mercado de fatores”. Com respeito à reformulação administrativa e burocrática, conforme conduzida especialmente por Stein (Ministro do Comércio em 1804) e Hardenberg (Chanceler do Estado entre 1810 e 1822), a grande inovação foi o desaparecimento de todos os órgãos de caráter provinciano até então existentes. O Diretório Geral foi formalmente abolido ainda em 1806 e substituído por um Staatsministerium (Ministério de Estado) de caráter inteiramente funcional e geral, composto de cinco ministérios: da Guerra, das Relações Internacionais, do Interior, das Finanças Públicas e da Justiça. O Cabinetsministerium foi formalmente extinto e em seu lugar foi estabelecido um Conselho de Estado, uma espécie de “Câmara Nobre”, na qual os príncipes reais, os Ministros, os Presidentes das Províncias, os Comandantes dos Corpos Militares e outros 34 membros apontados pelo Rei possuíam voz. exports to the booming industrial island halted. The subsequent recession in an already devastated countryside quickly spread to the towns, where many artisans and manufacturers had to close shop. Prussia's tax base was demolished, making it doubly difficult to pay the French.” (1997, p. 62); 39 Para estas descrições, ver especialmente SEELEY (1879, pp. 447-498); sobre as interpretações da Reforma, embora a opinião mais comum entre a historiografia seja a de que representaram, de fato, uma “revolução modernizadora” no Estado Prussiano (ver, especialmente, FINER, 1975, pp. 152-154), ROSENBERG as descreve da seguinte maneira: “There was no revolution against either absolute government or privilege as such. A streamlined system of political absolutism; a modified pattern of aristocratic privilege and social inequality; a redistribution of oligarchical authority among the revitalized segments of the traditional master class; a promotion of personal liberty and freedom of occupation and economic enterprise – these were the principal results of the work of the bureaucratic saviours of Prussia.” (1958, p. 203); 40 “Each one of the reforms was in practice a shadow of what was intended, and a curiously grim parody of the French Revolutionary ideal. True the serfs were emancipated: which merely meant that they could move if they chose. For the rest the noble could still exact services from them (unless the peasant paid a quit rent), the noble’s exemption from the land tax survived until 1861, his police authority in his district until 1872, and even his domestic jurisdiction over his own peasants until 1848. The municipal reform did indeed begin a new era; but it was only a start.” (FINER, 1975, p. 154); HAFFNER comenta ainda que: “Prussia had no need to restore its Hohenzollerns, but it no longer wished to think about reforms.” (1998, p. 95); 84 As Câmaras de Guerra e Domínios foram abolidas e em seu lugar foram instituídas 10 Províncias (9, em 1824), encabeçadas por um Presidente, divididas em Distritos Governamentais e sub-divididas em Áreas, contando ainda com uma Assembléia consultiva formada pelas três “classes” (nobreza, burguesia e campesinato). O poder judiciário foi separado do executivo e seria composto das Cortes Locais, das Cortes Provincianas e das Cortes Superiores. Finalmente, ainda que tenha sido formado um Ministério da Guerra, a organização militar foi mantida em separado e independente da estrutura burocrática central: cada Província conteria um Corpo Militar sob comando de um General, cada Distrito Governamental, uma Divisão, e cada Área, um Regimento. Como se nota, portanto, as Reformas instituídas naquele período representaram, na prática, a consolidação de uma burocracia “moderna” no Estado Prussiano, ou seja, não mais de caráteres provinciano e patrimonial41. Por outro lado, as Reformas trouxeram também mudanças ao ambiente “institucional” dos territórios prussianos, com a abolição simultânea do monopólio das guildas de conduzir atividades comerciais e de seus privilégios com relação ao trabalho; do monopólio das populações urbanas em conduzir atividades manufatoras; e das restrições impostas aos “comuns” para a aquisição de propriedades rurais. Em poucas palavras, portanto, as Reformas instituíram uma espécie de “ambiente econômico livre” no que se refere aos “mercados” da terra e do trabalho42. 3.3 – A Tarifa de 1818 e a Formação de Uniões Alfandegárias: 1815-1828 Definidos em linhas gerais os acertos políticos que em princípio garantiriam a “paz” no espaço europeu em 1815, o governo prussiano precisava, como a maioria dos demais, organizar suas finanças: 41 “Compared with the monarchist absolutism of the eighteenth century the institutionally structured Prussian civil service state after 1815, with its clear division of competences, begins to look like a constitutional state (...).” (HAFFNER, 1998, p. 95); 42 Deve-se destacar, porém, que, neste aspecto, elas institucionalizaram tendências que já vinham em grande medida sendo observadas em várias regiões do território prussiano desde meados do século XVIII; após a Guerra dos Sete Anos, por exemplo, com a “falência” de grandes proprietários de terras nobres, um pequeno grupo de “comuns” solicitara e recebera permissão para adquirir tais propriedades; desde essa época, outras permissões foram sendo regularmente conferidas e, portanto, uma espécie de “mercado de terras” já estava bastante desenvolvido em inícios do século XIX, ao ponto de o período entre a virada do século XVIII e a derrota de Jena ter sido caracterizado como de “febre” especulativa naquele mercado; o mesmo vale, como visto anteriormente, no que se refere à disseminação de manufaturas em áreas rurais; 85 The budget deficit for 1818 was estimated at 9,000,000 Thalers. Moreover too much money was in circulation. Prussia was on the verge of bankruptcy and there was a real danger that the government would be unable to pay either the troops or the civil service. (Henderson, 1968, p. 124) As tentativas iniciais de estabelecer acordos comerciais com Estados vizinhos foram praticamente incipientes43. Ao mesmo tempo, a imensa estrutura de coleta de impostos, taxas e pedágios havia se tornado extremamente dispendiosa para o Governo. Os impostos alfandegários, como se sabe, não eram uniformes no território e não eram cobrados nas fronteiras, mas nas estradas e rios navegáveis (segundo Henderson existiam, em 1815, aproximadamente 60 taxas diferentes desta natureza [1967b, p. 22]; Snyder acusa 67 tarifas distintas e 119 moedas em circulação no território [1969, p. 87]). A multiplicação das alfândegas, ao mesmo tempo, não apenas na Prússia mas em grande parte dos territórios alemães44, estimulava uma ampla rede de contrabando interno45, diminuindo, portanto, as receitas oriundas de tarifas sobre as transações comerciais. Neste contexto, ainda em 1814, o então Ministro das Finanças von Büllow foi encarregado diretamente por Frederico Guilherme III de preparar um plano para a reconstrução do sistema de finanças “públicas” dos territórios: The depressed condition of Prussian agriculture, industry and commerce; the hostile tariffs of other European countries and the failure to secure any substantial reduction in those tariffs forced Prussia to look for salvation in a reform of her own custom system. (...) her financial needs made it imperative to increase considerably the revenue from import duties and if the tariff were too high the income derived from it would fall. (...) Some local dues had been abolished in December, 1805, but a more thorough reform was clearly needed. (HENDERSON, 1968, pp. 36-37) As “compensações” recebidas pela Prússia em 1815 colocavam ao Estado um problema similar, porém agora em um contexto geopolítico bastante distinto daquele com o qual a Dinastia Hohenzollern se defrontara em 1648. Naquele ano, como visto, os dois principais territórios dinásticos (o Brandemburgo e a Prússia) estavam separados territorialmente, como agora suas porções ocidental e oriental. Naquela ocasião, tornou-se uma das prioridades 43 Em 1814, por exemplo, um tratado comercial com a Bélgica pelo qual as manufatoras da Renânia e da Westphalia poderiam ser enviadas àquele território com baixos impostos ficou em vigor por apenas um ano (de novembro de 1814 a novembro de 1815); 44 Apenas os territórios do Sul haviam, ainda no período napoleônico, instituído um sistema tarifário “moderno”, com a unificação dos impostos alfandegários e o deslocamento da cobrança para as fronteiras: a Bavária, em 1807, Württemberg, em 1810, e Baden, em 1812; 45 Segundo BLACKBOURN, praticamente todo o comércio que se manteve imediatamente após as Guerras era daquela natureza (1998, pp. 11-12); 86 dinásticas a conexão daqueles dois “blocos” através da expansão territorial sobre os espaços que os separavam. No novo contexto geopolítico da Europa, porém, as possibilidades de alterações ulteriores nas fronteiras definidas pelo Congresso de Viena eram bastante limitadas46. Do ponto de vista econômico, estes dois espaços eram em grande medida complementares, já que o bloco “oriental”, como visto, era sobretudo agrícola, e a Renânia e a Westphalia, a porção “ocidental”, especialmente manufatoras e mineradoras. Ao mesmo tempo, as conexões produtivas daquele espaço econômico em geral, antes garantidas sobretudo por agentes “internacionais”, haviam sido fortemente desarticuladas pelo Bloqueio Continental e pelas políticas protecionistas dos Estados Europeus47. Por outro lado, as deliberações do Congresso de Viena no que diz respeito às relações comerciais entre os Estados da Confederação foram bastante limitadas. Sua Constituição Federal, pelo Artigo 19, estabelecia que os Estados Confederados reservavam para si o direito de decidir, na primeira reunião da Dieta da Confederação em Frankfurt, sobre a maneira de regular o comércio e a navegação de um Estado para outro. Por um acordo de março de 1815, posteriormente endossado pelo Ato Final do Congresso, os Estados separados ou atravessados pelo mesmo rio navegável deveriam regular por consentimento os detalhes referentes a sua navegação, observando o princípio da liberdade. Até inícios de 1817, porém, nenhuma resolução concreta com relação ao comércio terrestre ou fluvial havia sido efetivada, especialmente pela forte resistência da Áustria, e os Estados em geral mantinham suas políticas protecionistas autônomas. Ao mesmo tempo, as iniciativas e pressões de alguns Estados e Organizações Comerciais para a transformação da Confederação em uma zona de livre comércio48 foram em geral negligenciadas ou ignoradas pela Dieta Federal, tanto nas Conferências de Calsbach de 1819, quanto na Reunião Ministerial de 1820. É sobre esta conjunção de fatores interligados, ou seja: a eminência de uma falência financeira do Estado Prussiano; a desarticulação produtiva de seus espaços econômicos e, com esta, a 46 Isso evidenciou-se, por exemplo, no fracasso das tentativas do futuro Ministro das Finanças da Prússia von Motz, em 1815, de manter a Principalidade de Fulda, que eventualmente faria tal conexão (ver, a respeito, HENDERSON, 1968, p. 80); 47 Para HENDERSON, ainda: “The failure to secure East Frisia meant that Prussia no longer possessed even a minor port on the North Sea and all the overseas trade of western provinces had to pass through such ports as Antwerp, Rotterdam, Hamburg and Bremen over which she had no control. The failure to bridge the narrow gap between Prussia’s western and eastern provinces hampered trade between the industrial Rhineland and Westphalia and the predominantly agrarian territories east of the Elbe.” (1968, p. 46); 48 Especialmente dos Estados do Sul, sobretudo Württenberg; 87 diminuição das receitas fiscais advindas de suas fontes; o ambiente protecionista generalizado da Europa; a necessidade de conectar e articular de alguma forma seus dois “blocos” territoriais49; e, finalmente, o início de discussões a respeito de tratados comerciais e alfandegários entre alguns Estados da Confederação a partir de suas pressões mal sucedidas junta à Dieta Federal em estabelecer áreas de livre comércio comuns, que se deve compreender a natureza das medidas instituídas sobre o território Prussiano em 1818. O plano solicitado ao Ministro das Finanças, conforme apresentado em janeiro de 1817, consistia de dois elementos principais: a substituição, por um lado, da massa de impostos gerais, provincianos, locais e privados por um imposto indireto unificado sobre bens consumidos internamente, e, por outro, de todas as taxas relacionadas a bens importados ou que cruzassem o território por uma tarifa unificada a ser cobrada nas fronteiras, baixa o suficiente para desencorajar o contrabando. O plano permaneceu por mais de um ano em negociações, pois a resistência advinha de todas as frentes e atacava ambas as propostas: tanto a tarifa, considerada “baixa” pela chamada ala “protecionista” da burocracia, quanto o imposto unificado, especialmente combatido pelos representantes provincianos. A nova Lei Tarifária seria promulgada em maio de 1818. Sobre os bens importados deveria ser aplicada uma tarifa única a ser cobrada nas fronteiras (Einfuhrzoll)50 e sobre os bens consumidos internamente, fossem ou não importados, um imposto indireto unificado (Verbrauchssteuer). Sobre os produtos importados e consumidos internamente, portanto, seriam aplicadas ambas as taxas que, juntas, atingiam aproximadamente 10% do valor para bens manufaturados e entre 20 e 30% do valor para bens tropicais e sub-tropicais. Os bens em trânsito pelo território pagavam apenas a tarifa de importação (e, em casos excepcionais, um imposto de exportação) e alguns pedágios. Todos os demais impostos indiretos e proibições de importação ou exportação foram abolidos51, sendo elaborada uma lista de bens livres de todos os impostos, estando a maioria das matérias 49 “At a stroke of the pen the population of Prussia doubled, the centre of gravity of the kingdom moved from Poland to Germany, and Prussia became the guardian of Western Germany against France. Prussian policy changed direction accordingly; it now became a primary objective in Berlin to extend Prussian influence over the territories separating Brandenburg from the Rhineland; in short, the unification of North Germany was thrust upon this powerful and restless state by the facts of her political geography.” (CARR, 1979, pp. 7-8); 50 A tarifa inicialmente foi diferenciada para as duas Províncias Ocidentais, sendo ligeiramente menor do que a utilizada para as Orientais; as duas seriam unificadas em 1821; 51 Os impostos diretos seriam eventualmente reformulados e unificados em 1820 com a instituição do famoso Klassensteuer, ou seja, um imposto proporcional segundo as “classes” (sendo estabelecidas quatro categorias principais, com três sub-grupos cada, de acordo com a propriedade, o grau de educação e a ocupação funcional); 88 primas nela incluídas. Em 1821, os impostos de importação e consumo seriam combinados em uma única tarifa, e os impostos de trânsito incluídos em uma conta separada. Embora se saiba, por Braudel, que a abolição dos pedágios e das barreiras internas não representa, por si só e diretamente, a formação de um mercado “nacional”, ela certamente é um elemento importante em qualquer processo de unificação econômica, ainda que sua motivação central no caso da Prússia em 1818 tenha sido, como visto, de caráter financeiro e político. O objetivo central da tarifa, para a maioria dos historiadores especializados, era antes aliviar os imensos custos de manutenção do sistema tarifário anterior e reduzir o contrabando, aumentando, com isso, as possibilidades de arrecadação fiscal do Estado; e, ao mesmo tempo, ampliar, através da criação de uma “zona” econômica, a influência política da Prússia, especialmente na porção norte da Confederação. Para Henderson, por exemplo: The Kingdom was divided into two groups of provinces and some financial sacrifice from abolishing internal dues would be necessary if trade between them were to be encouraged. But both parts of the country lay on important trade routes and transit dues levied on international commerce would not only benefit the Prussian exchequer but would be a useful weapon to use against small German neighbours. (HENDERSON, 1968, p. 38) A respeito do futuro Ministro das Finanças da Prússia (a partir de 1825), que seria o principal articulador do Zollverein (embora morresse antes de este ser efetivamente implementado), Henderson afirma ainda que: As early as 1815 Motz realized that Prussia’s new frontiers were unsatisfactory and that some attempt must be made to bridge the gap between the eastern and western provinces. The failure to keep Fulda showed Motz that there was little hope of securing a territorial link between the two parts of Prussia. He realized later that his objective could be secured in another way – by the establishment of customs unions between Prussia and states with territories in the corridor separating the Rhenish-Westphalian provinces from the eastern part of the Kingdom. (1968, p. 80) **** O novo sistema tarifário da Prússia foi amplamente criticado, dentro e fora de seus territórios. Internamente, tanto a ala “protecionista” como a “liberal” não aprovaram o sistema, ainda que por motivos inversos (a primeira por julgar a tarifa muito baixa, e a segunda, muito alta); em outros Estados da Confederação, e mesmo da Europa em geral, protestava-se em função dos efeitos que supostamente causaria: a alteração nos padrões comerciais da Europa Central; e a perda do mercado consumidor prussiano. Segundo List: 89 Os Estados alemães menores e de segunda categoria, além de já estarem excluídos dos mercados austríacos, francês e inglês, tinham agora que ser excluídos também do mercado da Prússia, o que os afetava com particular dureza, já que muitos deles estavam cercados, totalmente ou em grande parte, por províncias prussianas. (1986, p. 66) De fato, o maior efeito do novo sistema não seria sobre a conjuntura de crise econômica e financeira do Estado Prussiano52, mas sobretudo nas reações políticas, e especialmente nas políticas econômicas, que desencadeou entre os Estados da Confederação. Em uma palavra, sua instituição foi um dos principais estopins do processo que conduziria à formação de três Uniões Alfandegárias no interior daquele espaço em 1828. O problema imediato trazido pelo novo sistema era o relacionamento comercial entre a Prússia e seus enclaves ou, mais especificamente, o de como seriam tratados os bens partindo de ou chegando àqueles Estados53. O Governo prussiano decidiu unilateralmente, algumas semanas após a divulgação da nova tarifa, tratá-los como seu próprio território e, portanto, cobrar impostos de importação dos bens que cruzavam suas fronteiras em direção àqueles. Tal decisão causou imediatos protestos por parte dos enclaves, especialmente de SchwarzburgSonderhausen, e da maioria dos Estados da Confederação, iniciando-se uma espécie de guerra tarifária entre aqueles e a Prússia54. Eventualmente, porém, através de negociações sucessivas, apoiadas especialmente pela pressão econômica que seu extenso território poderia exercer, todos os enclaves adotaram tanto o sistema tarifário quanto o sistema fiscal da Prússia. O primeiro deles foi precisamente Schwarzburg-Sonderhausen, em maio de 1819, porém ainda apenas em sua porção norte, cercada pela Prússia. O processo, porém, através do qual a Prússia gradualmente “impunha” seu novo sistema a todos os enclaves de seu território, encontrou, em alguns casos, fortes resistências, das quais os Ducados de Anhalt são os melhores exemplos. Como dito, o princípio da livre navegação fluvial foi acordado no Congresso de Viena, porém ainda não havia, em 1819, sido ratificado. O Ducado de Anhalt-Köyhen utilizava 52 De acordo com HENDERSON, os primeiros sinais de superação da “crise” na Prússia só viriam em meados da década de 1820 (1968, p. 42); 53 Como se nota pela Figura 5, tratava-se dos três Ducados Anhalt, de uma parcela do território da SaxôniaWeimar-Eisenbach, de uma parcelo do território de Schwarzburg-Sonderhausen e de parcelas de SchwarzburgRudolstad; 54 Hesse-Cassel, por exemplo, ainda em inícios de 1819, proibiu a entrada de qualquer bem de origem prussiana em seu território; 90 intensamente o Elba como canal de transações comerciais com os territórios do Sul da Confederação, especialmente com a Saxônia, sobretudo através da ligação de seu porto de Ressau com Dresden. Sua estratégia de “resistência” e de evasão das tarifas de importação prussianas foi, portanto, apoiando-se no princípio da livre navegação, concentrar todo seu tráfico sobre aquela rota. Quando um mercador de Köyhen, em junho de 1820, negou-se a pagar a tarifa prussiana ao entrar no território via Saxônia em direção a Ressau, seu navio foi detido, e o Duque apelou à Dieta Federal da Confederação. A questão trazida pelo Duque apressou a assinatura do Ato de Navegação do Elba (em junho de 1821, ratificado em dezembro), através do qual foram estabelecidas as 15 casas alfandegárias oficiais com permissão para cobrar tarifas e os valores daquelas. Todos os monopólios e privilégios de navegação de cidades e guildas com portos ao longo do Rio foram abolidos. A Prússia, embora endossando o Ato, instituiu, em inícios de 1822, para evitar a entrada de bens em seu território através de Köyhen (que poderiam ser re-exportados para outros territórios55), uma espécie de “cordão de isolamento” em suas fronteiras. Paralelamente, suas negociações com o Ducado de Anhalt-Bernburg evoluíram, e a porção Norte daquele, bem como o distrito de Mühlinmgen, aderiram aos sistemas fiscal e tarifário da Prússia em outubro de 1823; com a subida de von Motz ao Ministério das Finanças Públicas, e com sua política de ameaças freqüentes aos Ducados, a última parcela de Anhalt-Bernburg aderiu ao sistema em maio de 1826. Com o argumento de que Ressau havia se tornado um ponto de entrada de bens “ilegais” no território Prussiano, von Motz instruiu seus agentes, em 1827, a cobrarem novamente impostos de importação sobre mercadorias seguindo em direção a Köyhen pelo Elba, a menos que se pudesse “provar” que seriam consumidos no próprio território. Os Ducados de Köyhen e Dessau, portanto, apelaram novamente à Dieta Federal, que os apoiou. Porém, neste caso, a Prússia se recusou a aceitar a decisão da Dieta e, frente à ameaça de instituir um novo “cordão de isolamento”, os dois Ducados acabaram cedendo e aderindo a seu sistema. Os dez anos entre 1818 e 1828, de fato, assistiram a intensas negociações de tratados comerciais e alfandegários envolvendo praticamente todos os Estados da Confederação. Neste 55 De fato, HENDERSON (1968) sugere que os Ducados de Anhalt tornaram-se, naquele período, verdadeiros centros de contrabando de bens estrangeiros para a Prússia; 91 sentido, a outra iniciativa central de von Motz foi a aproximação de Estados que encontravam dificuldades em estabelecer outros acordos. Esse foi especialmente o caso de HesseDarmstadt que, em inícios de 1823, negociava com a Bavária, Württemberg, Baden, HesseCassel, Nassau, Saxônia-Weimar, os Ducados da Saxônia e as Principalidades Reuss para a formação de uma zona de livre comércio. O Estado, essencialmente agrário, havia sido amplamente prejudicado com a tarifa prussiana, pois encontrava, desde então, dificuldades em obter bens manufaturados a preços acessíveis. Frente aos impasses nas negociações com os demais Estados do Reno e do sul, HesseDarmstadt acabou por abandoná-las, unificar interna e isoladamente seu sistema de impostos, transferindo as tarifas alfandegárias para as fronteiras, e se aproximar da Prússia. Este é mais um dos exemplos citados pela historiografia no qual as motivações prussianas nas negociações estiveram mais relacionadas a aspectos políticos do que propriamente econômicos. Pois as vantagens puramente econômicas advindas de um tratado alfandegário com Hesse-Darmstadt eram menores do que as prometidas por um tratado apenas comercial. A razão da escolha de Motz por uma união alfandegária teria sido, portanto, sobretudo pelos efeitos políticos que geraria: o de, por um lado, aumentar a influência da Prússia sobre o espaço da Alemanha do norte; e, por outro, o de neutralizar parcialmente os esforços de formação de outras Uniões no centro e no sul. Em fevereiro de 1828, Hesse-Darmstadt adotou o sistema alfandegário da Prússia, embora tenha mantido seu sistema próprio de impostos internos. Devido às diferenças naqueles, portanto, tarifas sobre alguns bens comercializados entre os Estados continuariam a ser cobradas. Por um acordo suplementar, supostamente secreto, o Estado consentia em que a Prússia alterasse os valores de suas tarifas em futuros acordos com Estados que não fizessem com ele fronteira; e, ao mesmo tempo, garantia à Prússia a liberdade de tomar medidas retaliativas contra políticas econômicas de outros Estados. Dessa forma, portanto, em fevereiro de 1828, a União Alfandegária do Norte foi formalmente estabelecida, embora não fosse a primeira desta natureza na Confederação, pois a União Alfandegária do Sul já havia sido formada em janeiro daquele mesmo ano. De fato, frente, por um lado, às fortes resistências da Áustria em conduzir qualquer acordo comercial no âmbito da Confederação Germânica, e, por outro, à pressão do sistema tarifário prussiano de 1818, as discussões entre os demais Estados, especialmente os do Sul (Bavária e 92 Württemberg) e os do Reno (Baden, Hesse-Darmstadt e Nassau), já haviam se iniciado desde 181956. Os Estados do Reno eram especialmente favoráveis à formação de uma área de livre comércio para assegurar o tráfico nas importantes rotas comerciais que “comandavam”57. A Bavária e Württemberg, por outro lado, privilegiavam uma União Alfandegária, na medida em que viam como ameaça a suas manufaturas a liberdade irrestrita de comércio. Estas diferenças entre os dois “blocos” eventualmente se mostrariam impeditivas ao avanço de quaisquer negociações entre seus Estados58. Como já comentado, Hesse-Darmstadt foi o primeiro a abandonar as negociações e se aproximar da Prússia, seguido por Nassau que, na ocasião, uniformizou suas tarifas. Bavária e Württemberg, alarmadas com a “deserção” dos Estados do Reno, decidiram-se, em um acordo preliminar autônomo ainda em 1824, por uma União Alfandegária. Até a eventual implementação desta, porém, seguiram-se alguns anos em que novamente foram experimentadas aproximações com os Estados Renanos, todas contudo fracassadas pelos motivos já comentados. A União Alfandegária do Sul foi estabelecida, finalmente, em janeiro em 1828, sendo formada pela Bavária (porém sem o território do Palatinado), Württemberg, Hohenzollern-Hechingen e Hohenzollern-Sigmaringen. Os impostos de importação instituídos sobre os bens manufaturados eram inferiores àqueles da União do Norte, porém superiores no caso dos bens tropicais e sub-tropicais. **** O estabelecimento das duas Uniões Alfandegárias supra-citadas em inícios de 1828 trouxe vários problemas para os Estados da Confederação que não participavam de nenhuma delas. Hanover, Oldenburgo e Brunswick, por exemplo, Estados essencialmente agrícolas, dependiam fortemente da importação de bens manufaturados, especialmente da Prússia. Era de seu interesse, portanto, manter as estradas entre os portos do Mar do Norte e os mercados de Frankfurt e Leipzig abertas e “livres”. Os Estados Turingianos, ao mesmo tempo, controlavam importantes passagens comerciais e, portanto, dependiam fortemente da manutenção de um fluxo regular por seus territórios. A Saxônia, por outro lado, era umas das 56 “The failure to carry out Article 19 of the Federal Constitution, the introduction of the Prussian tariff of 1818 and the continuance of the Austrian prohibitive system forced the South German States to try to improve their economic position without reference to either Austria or Prussia.” (HENDERSON, 1968, p. 59); 57 Baden, neste contexto, era especialmente resistente à colocação de tarifas elevadas, na medida em que possuía um trânsito comercial considerável, dada sua posição entre a França, a “Alemanha” e a Suíça; 58 “The united front of the South German States against Prussia and Austria had been broken and there followed a series of tariff wars between them.” (HENDERSON, 1968, p. 61); 93 principais regiões manufatoras do espaço “alemão” e, por isso, temia restrições às suas exportações por parte dos “blocos” comerciais e alfandegários que se formavam. Ainda antes de se formarem as duas Uniões, de fato, tanto a Prússia como a Bavária, que disputavam de forma mais intensa o espaço econômico e político na Confederação, tentaram ampliar sua influência sobre aqueles Estados. No caso da Prússia, seu interesse estava particularmente voltado para Hesse-Cassel, Nassau e Saxônia-Weimar, que garantiriam a união comercial entre os blocos oriental e ocidental de seu território. Todos estes, porém, resistiram fortemente às iniciativas de ambos os “lados”. A Saxônia, neste contexto, tentou uma aproximação comercial com os Ducados da Turíngia: além de pertencerem à mesma Casa Dinástica, embora em diferentes linhagens, eles representavam as únicas alternativas de expansão de seu mercado, na medida em que seu território estava “cercado”, nas demais “frentes”, pela Áustria, pela Prússia e pela Bavária, ou seja, pelos Estados economicamente mais influentes da Confederação. Em março de 1828, o primeiro acordo para uma futura União entre o Reino da Saxônia, Saxônia-Weimar e os demais ducados saxônicos da Turíngia foi rascunhado. Os termos da União exigiam, por um lado, que seus membros abrissem mão de ingressar em qualquer outra União Alfandegária; e, por outro, que mantivessem as estradas em bom estado. A partir deste acordo prévio, seguiu-se um período de intensas pressões políticas sobre a questão: os Estados da Confederação já organizados em outras Uniões tentavam “barrar” a iniciativa; a Áustria e os demais Estados Europeus (notadamente a França, a Inglaterra e as Províncias Unidas) estimulavam a formação desta União da Alemanha “do Meio” (Mitteldeutscher, como veio a ser chamada), com vistas a evitar que qualquer uma das duas já estabelecidas se fortalecesse em demasia59. As negociações se iniciaram em agosto de 1828 e no fim de um mês já haviam sido concluídas: os Estados de Hanover, Saxônia, Hesse-Cassel, Nassau, Brunswick, Oldenburgo, Frankfurt, Bremen, os Ducados Saxônicos, as Principalidades Reuss, Hesse-Homburg, Schwarzburg-Rudolstadt e o Alto Reino de Schwarzburg-Sonderhausen formaram então a União Comercial da Alemanha “do Meio”, que entraria em vigor em dezembro daquele ano. 59 Comenta-se em geral que o interesse da Inglaterra na formação de uma União “do Meio” com baixas tarifas residia especialmente na manutenção das rotas de Hamburgo e Bremen para a Itália, através de Hanover, HesseCassel, o Reno e a Suíça, e para a Boêmia, através dos Estados Turingianos e da Saxônia; no caso dos Países Baixos, seu interesse residia sobretudo em suas exportações, a partir de Amsterdam e Rotterdam, para os Estados do Sul, especialmente do açúcar refinado; 94 A União, diferentemente das do Sul e do Norte, não era alfandegária, mas apenas comercial. Pelo acordo, seus membros se comprometiam a não ingressar em qualquer União Alfandegária antes do fim de 1834 (quando o tratado entre a Prússia e Hesse-Darmstadt expirava); a manter as estradas existentes em bom estado e construir algumas outras; e a não cobrar impostos de trânsito sobre bens de ou para outros membros, com a condição de serem para consumo “interno”60. O comentário historiográfico geral a respeito da União da Alemanha “do Meio”, especialmente a partir das dificuldades em estabelecer um acordo alfandegário que tenderia a tornar convergentes as políticas econômicas de cada um de seus membros, é o de que, na prática, o acordo foi estabelecido sobretudo para, por um lado, evitar a expansão e o fortalecimento econômico das Uniões Alfandegárias do Norte e do Sul (especialmente pois “emperraria” o comércio no sentido Leste-Oeste); e, por outro, para manter “abertas” as principais rotas comerciais do espaço alemão em sentido Norte-Sul, especialmente as de Hamburgo e Bremen para Frankfurt e Leipzig, pelas quais trafegava um importante volume de bens ingleses61. De qualquer forma: At the end of 1828 three customs unions had been formed in Germany. The Prussia-HesseDarmstadt union, though nominally an arrangement between two independent sovereign States, was, in fact, the absorption of the smaller country into the custom system of the larger. The Bavaria-Württemberg union fell far short of the great South German customs union which it had been hoped too construct. The Middle Union had no common tariff and its objects were to a great extent negative – to prevent either of the other unions from expanding. (HENDERSON, 1968, p. 68) 60 Com essa medida, portanto, impediu-se a passagem de bens livremente entre os dois territórios da Prússia; “Before throwing in their lot with Prussia, a group of middle states that included Saxony, Hesse-Cassel, Hanover, Frankfurt am Main and several tiny principalities, chose an independent course. This ‘Middle Union’ amounted to little more than an attempt to preserve its members’ autonomy between the northern and southern commercial blocs. Its aim was to keep open the trade routes along which British imports travelled from North Sea ports to the merchant capitals of Frankfurt and Leipzig.” (BAZILON, 1990, p. 197); 61 Aachen o Ren Freiburg Basel Straszburg Ulm Munique Augsburgo Nuremberg Bamberg Coburg Wurrzburg Main Weimar Leipzig Magdeburgo a Berlim er io Danúb Praga Frankfurt a. O. Od Dresden Bál Stettin Mar O de Viena Breslau Posen he Wa rt r Oppeln Danzig tula Vís Thorn Varsóvia Königsberg Cidades Principais Fronteiras Políticas Rios Principais Fronteiras da Confederação CONVENÇÕES Estados da Confederação fora de Uniões Alfandegárias ou Comerciais União Comercial da Alemanha “do Meio” União Alfandegária do Sul União Alfandegária do Norte ÁSIA ® LEGENDA EUROPA LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA FIGURA 6: UNIÕES ALFANDEGÁRIAS NA CONFEDERAÇÃO GERMÂNICA: 1828 Stuttgart Mannheim Zurich r Frankfurt e Wes Darmstadt Fulda Erfurt ale Mainz Wetzlar Elb Sa Koblenz Gotha Brunswick Hanover Hamburgo Rostock ba Colônia Dortmund Münster Minden Bremen Lübeck El la se Mo Trier Luxemburgo Rotterdam Amsterdam Oldenburgo Norte Mar do Kiel tico 95 96 3.4 – A Formação do Zollverein Como se nota pela Figura 6, embora a zona de “liderança” econômica da Prússia já fosse, em 1828, significativa no “espaço” da futura Alemanha, através da União Alfandegária do Norte, um importante “corredor” comercial, ligando os Mares do Norte e Báltico aos Estados do Sul, à França, à Suíça e à Áustria, ainda estava fora de seu “controle”, e seus grandes blocos territoriais ainda não estavam comercialmente conectados. Deve-se comentar, neste contexto, que a principal “arma” que a União da Alemanha “do Meio” possuía em sua estratégia de “barrar” o “expansionismo” econômico e, especialmente, comercial da Prússia era precisamente o controle das rotas comerciais que partiam do Mar do Norte, notadamente de Hamburgo e Bremen, e seguiam, em direção sul, até Frankfurt e Leipzig, e dos Países Baixos até a Itália e a Boêmia. Como visto, a primeira representava na prática a principal rota comercial da “Alemanha”, candidata mais provável à localização do “jogo das trocas”: através da importação e exportação de bens com a Inglaterra, dos negócios além-mar, da distribuição tanto para o território alemão, como para os Impérios Russo e Austríaco, da conexão com o Oriente através da Itália, das feiras de Leipzig e Frankfurt, da “residência” dos grandes financistas e banqueiros. Não parece, portanto, surpreendente que os seis anos entre a formação das três Uniões de 1828 e o Zollverein tenham assistido a uma cuidadosa “costura” política por parte da Prússia para desarticular a União do Meio. Esta costura teve diversas frentes e foi personificada especialmente por seu Ministro das Finanças, von Motz, ao qual Henderson se refere da seguinte forma: He appreciated the inherent weakness of this union which appeared to block any further attempts of Prussia to extend her tariff system to neighbouring territories. He saw that mutual jealousies and internal dissensions would soon break out among the members of the Middle Germany Commercial Union. Motz realized that he might yet achieve his aims by a change in tactics. He now approached the problem of securing the economic unification in a new way. He tried to improve commercial relations between Prussia and the southern states. (1968, p. 92) O primeiro passo foi a assinatura, em maio de 1829, de um tratado comercial entre as Uniões do Norte e do Sul, com vistas a uma futura União Alfandegária. Porém, ainda mais importante, o Estado Prussiano tentou atrair para si, ou desviar, o volume comercial que utilizava os “caminhos” da União da Alemanha “do Meio”. Essa “estratégia” foi conduzida especialmente através do “investimento” em rotas “alternativas”. Pois a política de von Motz 97 concentrou-se em, por um lado, negociar a “abertura” do Reno e, por outro, construir duas grandes estradas em sentido Norte-Sul ao longo dos territórios prussianos. É o que comenta Bazilon: Berlin outflanked and destroyed the Middle Union by concluding commercial and roadbuilding agreements with neighbours states. Withouth toll-free access to seaports, the small states found themselves checkmated. By 1840 Saxony was prepared to negotiate entry into the Prussian customs union. (1990, p. 197) Pelos acordos finais do Congresso de Viena, a navegação do Reno seria livre de tarifas de trânsito jusqu’a la mer. Porém, os privilégios das cidades de Colônia, Mainz e Manheim foram mantidos, e, portanto, as cargas transportadas deveriam ser transferidas de embarcação em seus portos. Ao mesmo tempo, a Holanda, que controlava sua foz, manteve, especialmente ao defender uma interpretação particular do termo jusqu’a la mer, o virtual monopólio que possuía sobre o comércio ao longo da rota. Desde o Congresso de Viena, portanto, e especialmente a partir de 1820, a Prússia passou a protestar regularmente junto à Dieta da Confederação contra os privilégios comerciais holandeses no Reno. Em 1825, um acordo de divisão do tráfico foi estabelecido entre as três principais companhias de navegação que nele operavam, duas holandesas e uma alemã. O importante ramo entre Rotterdam e Colônia, porém, foi mantido por uma das companhias holandesas. A Prússia renovou, portanto, suas pressões políticas sobre a questão e chegou a articular uma frente de pequenos estados para se dirigir à Dieta. Após um longo período de negociações, o Ato de Navegação do Reno foi assinado em março de 1831: a navegação seria “livre até o mar” para navios que pertencessem a membros dos Estados do Reno62. O monopólio das guildas de navegação foi quebrado, assim como a obrigação de troca de embarcações em Colônia, Mainz e Mainheim. Por outro lado, os projetos de construção de estradas em sentido Norte-Sul através do território prussiano representaram formas não apenas de desviar o tráfico sob controle da União da Alemanha “do Meio”, mas igualmente de “forçar” negociações com seus Estados membros, já que aquelas necessariamente passariam por seus territórios. 62 Com essa provisão, evitava-se que a Prússia realizasse a conexão entre seus blocos oriental e ocidental utilizando o Reno (via Mar do Norte); 98 Uma das estradas projetadas, na porção Oriental dos territórios prussianos, partiria de Hamburgo e, seguindo os vales do Elba e do Saale, atingiria o Norte da Bavária. A rota tinha duas alternativas no que diz respeito à sua porção norte: diretamente pelo território de Hanover; ou através dos territórios de Lauenburgo e Mecklenburgo-Schweis. Após atravessar o território prussiano, em sua porção sul a rota necessariamente passaria ainda pelos Ducados Saxônicos. Embora as negociações com os territórios do Norte tenham sido mal-sucedidas, a Prússia estabeleceu, entre julho e dezembro de 1829, acordos com os Ducados Saxônicos (da Saxônia-Coburg-Gotha e da Saxônia-Meiningen-Hildburghausen63) e com as Principalidades Reuss para a construção da estrada. Os termos dos acordos, ou a maneira de garantir a passagem através daqueles territórios foi, notadamente, a concessão de empréstimos e subsídios64. A porção central da estrada, portanto, de Magdeburgo até Bamberg, na Bavária (através das montanhas da floresta turingiana, via Gotha e Coburg), foi aberta em 1831. Ainda mais importante, ao sul de Gotha a estrada ligava-se a outras rotas em direção Nordeste (via Erfurt) e Sudoeste (para Frankfurt e Wurzburg). O tráfico nestas novas estradas não pagaria pedágios; por artigos supostamente secretos das negociações, ainda, os Estados saxônicos entrariam no sistema alfandegário da Prússia quando suas obrigações com a União da Alemanha “do Meio” expirassem, ou seja, em janeiro de 1835. A segunda estrada projetada, na porção Ocidental dos territórios, sairia de Bremen seguindo pelo vale do Weser até Minden (e atravessando, portanto, o território de Hanover), e seguiria para o Sul até Frankfurt, passando pelo território de Hesse-Darmstadt. Toda a seção em território prussiano foi rapidamente construída e, com isso, uma boa parte do volume comercial de Bremen, um dos mais importantes portos do Mar do Norte, foi deslocada para aquela rota. Em inícios da década de 1830, uma espécie de primeiro “resultado” da “estratégia” de Motz, e de grande importância para o futuro da União da Alemanha “do Meio”, viria, quando Hesse63 Os cinco ducados saxônicos da Turíngia transformaram-se, em 1825-6, em quatro, quando a Linhagem Saxônia-Gotha se extinguiu; os territórios foram divididos entre os ducados da Saxônia-Coburg-Saalfeld (doravante Ducado da Saxônia-Coburg-Gotha), da Saxônia-Meiningen (doravante Ducado da SaxôniaMeiningen-Hildburghausen) e da Saxônia-Hildburghausen (doravante Ducado da Saxônia-Altenburgo); 64 Coburg, por exemplo, recebeu empréstimo de 80 mil thalers e subsídios de 25 mil th.; e Meiningen um empréstimo de 25 mil th.; 99 Cassel, “violando” a cláusula dos acordos da União de não ingressar em nenhuma outra alfândega até 1834, entra, em agosto de 1831, no sistema alfandegário da Prússia, em termos semelhantes a Hesse-Darmstadt65. O Estado, porém, obteve diversas concessões para a Feira de Cassel e, ao mesmo tempo, a garantia da Prússia de não penalizar os tráficos em sentido Norte-Sul de Estados fora do seu sistema, já que as conseqüências poderiam ser sentidas diretamente por aquela. Com o acordo, a Prússia não apenas uniu, em termos comerciais e alfandegários, seus dois blocos territoriais, como separou a União da Alemanha “do Meio”: Hanover não possuiria mais uma ligação comercial “direta” com os Estados Turingianos e com a Saxônia. Em maio de 1832, Hanover, Oldenburgo, Brunswick, Nassau, Bremen e Frankfurt fizeram um protesto formal à Dieta contra Cassel pela violação de seu acordo com a União da Alemanha “do Meio”, mas, frente à defesa veemente da Prússia, a mesma nunca passou qualquer julgamento sobre a questão. Enquanto Hanover liderava tais protestos, as negociações prussianas seguiram, por um lado, com a Saxônia66 e, por outro, com os Estados do Sul e os Ducados Saxônicos; e, ao longo do ano seguinte, foram finalmente seladas com a formação do Zollverein, que entrou em vigor em janeiro de 1834. Bazilon faz o seguinte comentário a respeito da evolução destes acontecimentos: Liberals south of the River Main objected the treaty on political grounds, but the government of Bavaria and Württemberg concluded that the economic advantages outweighed possible risks. Saxony joined a week later, after Prussia granted the same tariff concessions to the Leipzig trade fair enjoyed by its own commercial centres. Berlin also agreed to ease duties on such vital semi-finished goods as the cotton and woolen yarn used in Saxon textile mills. These compromises satisfied Saxony’s most influential business interest and persuaded its government to minimize the sovereignty issue in anticipation of financial gain weigh. (1990, p. 189) 65 A entrada foi influenciada sobremaneira pelos distúrbios revolucionários de 1830, uma parte dos quais foi dirigido precisamente contra as casas alfandegárias do território; 66 Com o “colapso” da União da Alemanha “do Meio”, tornou-se quase imperativo para a Saxônia entrar no sistema prussiano; suas manufaturas importavam a maioria de suas matérias primas, especialmente algodão, via territórios prussianos; sua população crescente dependia da importação de trigo da porção que havia sido adquirida pela Prússia em 1815; seus mercadores, porém, eram alegadamente contra a entrada, pois as tarifas adotados pelo sistema prussiano eram relativamente superiores às então vigentes; deste modo, embora os acordos tenham começado ainda em 1831, eles não avançaram até 1833, especialmente pela resistência, por um lado, dos tecelões da Silésia e das feiras de Frankfurt am Oder e Naumburgo (que temiam a competição de Leipzig) e, por outro, dos comerciantes da Feira de Leipzig; 100 Formado inicialmente por 22 Estados67 (Figura 7) para um período inicial de oito anos, o Zollverein era estritamente uma união alfandegária e, portanto, alguns de seus EstadosMembros, como a Bavária e Württemberg, puderam manter seus sistemas fiscais próprios. Suas questões seriam reguladas por um Congresso Geral anual no qual era necessária a unanimidade68. Frente às pressões de Hanover na Dieta Federal da Confederação, que nesse momento se dirigiriam para a re-abertura das discussões do Artigo 19 da Constituição Federal, foi inserida uma cláusula no acordo prevendo que, em se adotando o livre comércio na Confederação, a União seria automaticamente dissolvida. A contingência foi incluída com o objetivo claro de evitar qualquer precedente de intervenção da Dieta na União. No mesmo ano, Hanover e Brunswick formaram, em uma espécie de “retaliação” ao Zollverein, uma União Fiscal (Steuerverein), à qual viriam se juntar ainda Oldenburgo (em 1836) e Lippe-Schaumburg (em 1838). Além destes, estavam inicialmente fora do Zollverein: as três cidades hanseáticas, Frankfurt, as duas Mecklenburgos, Schleswig, Holstein e Lauenburgo, Nassau, Baden e a Áustria. O território do Zollverein, portanto, ainda não “possuía” acesso à costa do Mar do Norte e às fozes de importantes rios alemães, notadamente, o Elba, o Weser e o Reno. Em resumo: The Zollverein was founded after fifteen years of bitter economic strife that followed the issue of Prussia’s tariff of May 1818. The notion that it was set up as the result of the rise of a German national consciousness and was a touching example of brotherly co-operation on the part of the various States will not bear examination for a moment. Banaerts points out that ‘the formation of the German customs union was characterized by the very opposite of this ‘national movement’ which legendary history and inaccurate writings subsequently ascribed to it’. The States concerned fought for their own narrow interests and many of them joined the Zollverein only when economic depression and empty exchequers made further resistance to Prussia impossible. (HENDERSON, 1968, p. 95) 67 Em 1834, a Confederação Germânica contava com 37 Estados e 04 Cidades Livres; os 22 Estados do Zollverein eram: a Prússia, os três Ducados de Anhalt, Waldeck, Hesse-Darmstadt, Hesse-Cassel, Bavária, Württemberg, Saxônia, os quatro Estados Saxônicos da Turíngia, as quatro Principalidades Reuss, SchwazburgRudolstadt, Schwazburg-Sonderhausen, Hohenzollern-Hechingen e Hohenzollern-Sigmarien; 68 Apenas 15 destes Congressos foram de fato realizados entre 1834 e 1866; o Ren Freiburg Basel Straszburg Zurich Munique Augsburgo Nuremberg Berlim er io Danúb Praga Frankfurt a. O. Od Dresden Bál Stettin Mar O de Viena Breslau Posen he Wa rt r Oppeln Danzig tula Vís Thorn FIGURA 7: O ZOLLVEREIN: 1834 Leipzig Magdeburgo Weimar Bamberg Coburg Wurrzburg Main Ulm Fulda Stuttgart Mannheim Darmstadt Frankfurt r Mainz e Wes Trier Wetzlar Erfurt ale Koblenz Gotha Sa Colônia Brunswick Hanover Elb a Rostock ba la se Aachen Dortmund Münster Minden Bremen Hamburgo Lübeck El Mo Luxemburgo Rotterdam Amsterdam Oldenburgo Norte Mar do Kiel tico Varsóvia Königsberg ÁSIA Cidades Principais Fronteiras Políticas Rios Principais Fronteiras da Confederação CONVENÇÕES Estados da Confederação fora de Uniões Alfandegárias ou Comerciais União Fiscal Territórios do Zollverein LEGENDA EUROPA ® LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA 101 102 CAPÍTULO 4: A FORMAÇÃO DO “ESTADO-ECONOMIA NACIONAL” ALEMÃO Para Blackbourn (1998), a história do “longo século XIX” germânico tratou-se, entre outras coisas, de um conjunto de distintas “respostas” à pergunta formulada originalmente por Schiller e Goethe em 17971. Por outro lado, a historiografia alemã “tradicional”, tendo Treitschke como seu principal porta-voz, enxerga antes no mesmo uma seqüência “lógica” e “natural” de eventos que encaminharam a “Alemanha” para a Kleindeutschland de 1871. De uma forma ou de outra, porém, sabe-se que aquela “resposta” foi, do ponto de vista político, eminentemente efêmera. Pelo menos um de seus elementos, entretanto, teve um caráter de permanência: a exclusão da Áustria das entidades às quais doravante atribuir-se-ia o adjetivo “alemão”, ainda que ela tenha sido incorporada ao Terceiro Império de Hitler. A data central para esta exclusão, como se sabe, foi a vitória da Prússia na Guerra de 1866. Muito ainda se discute entre os historiadores a respeito das ações deliberadas da Prússia para conduzir a Alemanha ao Império de 1871: se e desde quando teria “adotado” aquela “estratégia”? Quais de suas iniciativas podem ser enquadradas na mesma? Até que ponto as Guerras da Unificação Alemã faziam parte de seus “planos”? Independentemente, porém, dos inúmeros matizes que comumente se atribuem à ação da Prússia, e abrindo mão de julgamentos a respeito de sua intencionalidade, o contexto político da Europa do século XIX, e especialmente o da Confederação Germânica, são suficientes para considerar seu conflito com a Áustria como um dos elementos centrais em sua estrutura política ao longo de todo o século. Se a Guerra de 1866 selou politicamente seus resultados, qual seria seu momento decisivo em termos econômicos? 1 Ver p. 4, nota 11 da Introdução; 103 4.1 – A Evolução do Zollverein A “evolução” do Zollverein entre 1834 e 1866 consistiu, do ponto de vista formal, sobretudo no aumento do número de seus Estados-Membros, ou seja, a União não alterou seu caráter estritamente alfandegário. Na prática, porém, o espaço por ela delimitado começou gradativamente a apresentar (ou ser conduzido na direção de) certas características típicas de um “espaço econômico coerente”. De qualquer forma, em 1866, após a Guerra AustroPrussiana, 29 dos 32 Estados da recém extinta Confederação Germânica e a cidade de Frankfurt2 faziam parte da União (Figura 8). A Prússia permaneceu exercendo controle praticamente integral sobre a mesma, o que significava, na prática, decidir acerca das tarifas adotadas e dos acordos “internacionais” estabelecidos (ainda que, formalmente, tais decisões devessem ser tomadas por unanimidade em seus Congressos Gerais anuais). Esse “controle”, porém, foi exercido em um ambiente de permanentes pressões internas e externas, e para garanti-lo, portanto, a Prússia precisou utilizar todas as possibilidades abertas por seu relativo poder político, militar e tributário. Ao mesmo tempo, e paralelamente a estas pressões, a Prússia tentava atrair, também utilizando toda a sorte de instrumentos, a entrada sucessiva dos Estados remanescentes da Confederação no Zollverein. Estes ingressavam, em geral, sob um misto de pressão3, necessidade4 e “sedução” prussianas, sobretudo pela concessão de vantagens comerciais e financeiras5. 2 No âmbito da Confederação, só não eram membros do Zollverein, portanto, as três cidades Hanseáticas e a Áustria; 3 Karl Von Rotteck, por exemplo, o então eminente líder da causa liberal no Parlamento de Baden, afirmava, em 1835, às vésperas da entrada do Estado na União: “(...) no, no aceptamos esta unidad, cujo fundamento no es realmente una economia nacional alemana sino, por el contrario, una explotación de la nacíon alemana y una operación financiera del gobierno. No aceptemos esta unidad y mostremos a la nación que nuestros sentidos y nuestros esfuerzos se dirigen hacia algo más elevado y noble que convertirmos em un remolque de Prussia y que no hemos perdido la esperanza de alcanzar todavia esse fin mas elevado.” (citado em ABELLÁN, 1997, p. 43); 4 Um comerciante da Saxônia afirmava, em dezembro de 1833: “(...) a direct line of communication will be formed over Offenbach; all the Saxon manufacturers who have hitherto visited our fairs will in future proceed to Offenbach; the remaining portion of our transit and active trade will follow in the same channel; our retail trade with the immediate neighbourhood, already so considerably impaired, will be almost entirely ruined, and the majority of our fellow-citizens will in vain seek their livelihood, whilst our neighbours will reap the fruits of this new formation of the trade of our German Fatherland from the enjoyment of which we shall willfully have excluded ourselves.” (citado em HENDERSON, 1968, p. 117); 5 BAZILON comenta que: “Recent scholarship therefore tends to find the raison d’être for the Zollverein in the state’s desire for a dependable source of non-tax revenue. Governments became financially independent of legislatures that were susceptible to liberal influences, a result that certainly impeded political modernization.” (1990, p. 196); o Ren Koblenz Basel Zurich Stuttgart Mannheim Darmstadt BADEN (1836) Freiburg r Straszburg e Wes Ulm Wurrzburg Frankfurt (1836) Mai n Fulda Munique Augsburgo Nuremberg Bamberg Mar Bál er io Praga Danúb Dresden Frankfurt a. O. tico O de Viena Breslau Posen he Wa rt r Oppeln Danzig tula Vís Thorn Varsóvia Königsberg FIGURA 8: A EVOLUÇÃO DO ZOLLVEREIN: 1834-1866 Leipzig Magdeburgo Weimar Coburg Erfurt ale NASSAU (1836) Wetzlar Gotha Sa Aachen BRUNSWICK (1842) Brunswick Berlim ba Colônia Dortmund LIPPE (1842) Münster Minden Hanover El LUXEMBURGOa (1842) l Mainz se Mo Trier Luxemburgo Rotterdam Amsterdam HOLSTEIN (1865) Rostock Od Lübeck (1887) LAUENBURGO MECKLENBURGO (1866) (1865) Hamburgo (1888) Stettin Bremen (1888) Oldenburgo Elb a OLDENBURGO (1854) HANOVER (1854) Norte Mar do Kiel SCHLESWIG (1865) Cidades Principais Fronteiras Políticas Rios Principais Fronteiras da Confederação CONVENÇÕES Entradas Posteriores Entradas em 1865-6 Entradas em 1854 Entradas em 1842 Entradas em 1836 Territórios do Zollverein em 1834 ÁSIA ® LEGENDA EUROPA LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA 104 105 Os Estados tradicionalmente fortes da Confederação, sendo ou não membros do Zollverein (notadamente, Bavária, Württemberg, Hesse-Darmstadt, Cassel, Hanover, Oldenburgo, Brunswick, Saxônia e as cidades Hanseáticas), tentavam, por sua vez, manter, com diferentes graus de intensidade e sucesso, sua política de “resistência” ao que se então denominava “expansionismo prussiano”. A “resistência” dos Estados do Norte, alguns ainda organizados sob a União Fiscal, dava-se em nome do “liberalismo”, a partir de seu interesse em manter as rotas comerciais continentais que partiam dos Mares do Norte e Báltico “abertas”; pois, desta forma, poderiam continuar desempenhando seu “papel” tradicional naquele sistema comercial, ou seja, o de serem “porta” de entrada e pontos de distribuição (neste caso, especialmente Frankfurt) dos bens importados da Inglaterra e da Holanda (e também crescentemente dos EUA), manufaturados ou coloniais. Nesta resistência, puderam portanto contar freqüentemente com o apoio daqueles “fornecedores”. Os Estados do Sul, especialmente a Bavária e Württemberg, com seus interesses protecionistas relacionados a seus frágeis setores manufatureiros, protestavam a cada passo “liberal” tomado pela Prússia. Os resultados obtidos, porém, com a participação no Zollverein, não apenas pela abertura dos mercados do Norte, mas igualmente pelo volume de receitas recebidas, aumentavam sobremaneira o “custo de oportunidade” de prescindir daquela participação6. Além destas pressões “internas”, a Prússia se deparava freqüentemente com as “externas”. Como dito, a idéia de um “balanço de poder” permeara toda a retórica dos acordos do Congresso de Viena; e a perspectiva da emergência de uma potência econômica unificada no espaço da Europa Central poderia ameaçar aquele “balanço” tanto quanto uma unidade política. Tais pressões manifestavam-se especialmente em termos das políticas comerciais adotadas pelas “potências” européias: nas negociações de tratados envolvendo o Zollverein, em acordos paralelos entre países com intensas relações comerciais, na imposição direta de restrições aos Estados do Zollverein, etc. A Inglaterra, como já comentado, articulava estas pressões tanto 6 Sobre as vantagens financeiras e comerciais do Zollverein para os Estados do sul comparativamente à Prússia, HENDERSON afirma: “The benefits derived from establishing the Zollverein were felt sooner in South Germany than in the North. Prussia obtained only a comparatively small extension of markets and this was offset by a decline in customs receipts. Bavaria and Württemberg, however, could now send their products to the populous districts of North Germany. So there was an expansion of Southern industries.” (1968, p. 138); 106 diretamente, através de sua ligação dinástica com Hanover, como através de suas intensas conexões comerciais com Frankfurt e Hamburgo. Sua preocupação imediata, além da possibilidade de imposição de restrições a seu comércio, voltava-se sobretudo para o desenvolvimento do setor manufatureiro continental, especialmente o de tecidos de algodão, que poderia ameaçar um de seus principais mercados consumidores. Para a Holanda, também uma grande fornecedora de manufaturas e bens coloniais (especialmente do café do Brasil e da Jamaica) para o Continente, eram igualmente alarmantes as possibilidades de restrições comerciais, por um lado, e do desenvolvimento da produção de manufaturas, por outro, em seu caso sobretudo na região Renana, já que o escoamento de seu comércio utilizava notadamente a rota do Reno, partindo de Amsterdam ou Rotterdam7. Desta forma, a Holanda utilizou as vantagens geradas pelo controle da foz do Rio para, simultaneamente, impor restrições à saída de cereais do território do Zollverein e para enviar para aquele seus produtos manufaturados, especialmente o açúcar refinado. Imediatamente após o estabelecimento do Zollverein, a estratégia da Prússia foi impor, em nome da União, tarifas adicionais a navios holandeses que seguissem pelo Reno. Sua manobra seguinte, no entanto, seria a de buscar uma aproximação comercial com a Bélgica, com vistas a substituir Amsterdam e Rotterdam por Antuérpia como centro comercial do eixo Renano, aproveitando-se especialmente de sua ligação por estradas a Colônia. Um tratado comercial com a Bélgica, portanto, seria assinado em 1844, ficando em vigor por seis anos. Se o acordo, por um lado, levou ao aumento das importações de ferro pelo Zollverein, principal interesse da Bélgica no mesmo, por outro lado a Holanda, sentindo os efeitos negativos sobre seu comércio, aceitou o estabelecimento do livre comércio e navegação ao longo de todo o Reno, encerrando, dessa forma, seu monopólio sobre as transações que passavam por sua foz. No caso da França, dado seu posicionamento geopolítico, as preocupações econômicas aliavam-se mais diretamente às conseqüências políticas que o surgimento de uma “potência” 7 Vale notar que os “negócios” da Holanda no eixo comercial do Reno não se restringiam apenas à compra e à venda, mas igualmente às transações financeiras que as envolviam: adiantamentos de créditos, seguros, etc: “Their commerce by this route was of two kinds. On the one hand, the export of coffee from Java and Brazil to Germany was still largely under the control of Dutch middlemen who secured profits both from financing the trade and from shipping the goods – a lucrative trade both to merchants and to the State. (…) On the other hand, the export of other colonial products and of manufactured and semi-manufactured articles was coming under the control of German importers who either used Dutch intermediaries merely as commission agents or go into direct touch with the producers.” (HENDERSON, 1968, p. 167); 107 econômica unificada poderia gerar. Ao mesmo tempo, suas exportações de vinho e seda para o território poderiam ser igualmente ameaçadas. Sua estratégia foi a assinatura de tratados comerciais com os Estados da Confederação que ainda não haviam ingressado no Zollverein, notadamente Nassau e as duas Mecklenburgos, não apenas para garantir suas vendas naqueles, mas igualmente para servirem como pontos de entrada de “contrabando” no território da União. Interessa destacar ainda, no “cenário” externo do Zollverein, as conturbadas relações entre a Prússia e a Áustria. Como visto, no processo que levou ao estabelecimento da União em 1834, e, de fato, desde a formação das primeiras Uniões Alfandegárias na Confederação Germânica, a Áustria se manteve relativamente independente. Não apenas porque, internamente, não havia passado por uma “modernização” (leia-se, uniformização e deslocamento para as fronteiras) de seu sistema de alfândegas e impostos, como para manter sua autonomia e a possibilidade de “proteger” suas regiões manufatureiras. Em poucas palavras, a Áustria resistia a acordos que interferissem em sua autonomia tarifária e fiscal. Gradativamente, porém, após o estabelecimento do Zollverein, seja pelas pressões causadas pela existência de um bloco comercial e tarifário unificado nas regiões com as quais mantinha ligações comerciais, seja pela percepção das vantagens potenciais que sua entrada poderia gerar, a Áustria começou a tomar certas iniciativas que apontavam naquela direção. Especialmente porque, pode-se especular, sua situação econômica e financeira tendeu a se deteriorar ao longo das décadas de 1830 e 1840 (ver à frente). Em novembro de 1841, às vésperas da renovação dos tratados do Zollverein, conduziu-se a primeira tentativa, porém ainda mal-sucedida, de reforma em seu sistema interno de tarifas, condição necessária para qualquer possibilidade de ingresso no mesmo. A Prússia, porém, se nos primeiros acordos parecia disposta a negociar a entrada da Áustria, começa, a partir da década de 1840, não apenas a demonstrar desinteresse pela questão, mas a tomar certas ações dirigidas a evitá-la. O expediente típico utilizado nesta política era a manutenção de tarifas moderadas. A cada nova negociação tarifária no âmbito do Zollverein, a Prússia resistia às pressões protecionistas tanto dos Estados do Sul, como dos representantes de regiões manufatoras de alguns de seus próprios territórios que, com o avanço do processo 108 de industrialização a partir de meados do século, passaram a fazer eco às alas “protecionistas” da Confederação (notadamente, a Renânia e a Westphalia)8. A entrada da Áustria seria debatida no âmbito da Confederação a partir de 1849, especialmente com o fracasso das tentativas da Prússia em dissolver a mesma e substituí-la por um Estado unificado sem a presença da Áustria, materializado no evento conhecido como “humilhação de Ölmutz”9. A proposta austríaca, porém, formalmente apresentada à Dieta da Confederação em 1850, seria mais ousada: a substituição do Zollverein por uma União Econômica que incluísse todos os Estados da Confederação. A proposta, como foi notado pelos observadores contemporâneos, representou uma demonstração nítida de que a Áustria, doravante, adotaria uma postura mais ativa nos assuntos da Confederação e do Zollverein, o que, por sua vez, poderia ameaçar a posição prussiana. Para viabilizá-la, a fronteira alfandegária entre a Áustria e a Hungria foi abolida em 1850 e o sistema tarifário do Império foi reformado em 1852. O momento mostrava-se oportuno pois o acordo do Zollverein venceria em fins de 1853 e precisaria ser renovado. Segundo Henderson: Thus, on the eve of the ninth Zollverein General Custom Congress the aims of Austria and Prussia had been clearly stated. Austria favored the creation of an Austro-German customs union. Prussia offered no more than an Austro-Zollverein commercial treaty. The position of the smaller German States was less plain. As far as possible they avoided coming to any decision but hoped to make satisfactory terms – especially financial terms – for themselves by playing off one German Great Power against another. (1968, p. 209) A atitude da Prússia frente à “ameaça” austríaca foi negociar em 1851, sem a consulta aos demais membros do Zollverein, a entrada de Hanover e da União Fiscal no mesmo. O acordo com Hanover, por um lado, “empurrava” a Prússia em direção ao liberalismo, já que o Estado era o mais ativo dentre os defensores daquelas políticas; e, por outro, a “garantia”, caso os demais membros do Zollverein, especialmente os “protecionistas” do Sul, se aproximassem da Áustria. Pelo acordo, o Zollverein e a União Fiscal seriam amalgamados em janeiro de 1854, e Hanover, por seu turno, receberia uma série de vantagens financeiras e comerciais10. 8 “Prussia continued to favour moderate duties. She had to consider the interests of her agricultural eastern provinces as well as those of her manufacturing districts. She thought, too, that so long as her duties remained fairly low it would be impossible for Austria (with her high tariff) to attempt to enter the Zollverein and to gain a new influence in Germany economic affairs.” (HENDERSON, 1968, p. 181); 9 Para o mesmo, ver JOLL (1971); deve-se lembrar igualmente que em 1848 Metternich, o principal opositor da “modernização” alfandegária, foi afastado do cargo de Primeiro Ministro, o que contribuiu igualmente para a mudança em sua política com relação ao Zollverein e à Confederação em geral; 10 “Prussia was prepared to grant much that she had previously refused since she was faced with the possibility of the defection of the South German States when the existing Zollverein treaties expired at the end of 1853. In 109 Os anos de 1851 e 1852 assistiram, portanto, a uma verdadeira “queda de braços” entre a Áustria e a Prússia no que se refere à questão alfandegária e comercial. O Congresso Geral do Zollverein, em 1852, chegou mesmo a ficar “emperrado” por meses, já que a Prússia insistia em negociar a renovação da União antes de discutir os planos austríacos. O resultado final – que contou inclusive com a intervenção diplomática do Czar, interessado na manutenção de um bloco político unido como contrapeso à França na Europa Central – foi a assinatura de um tratado comercial entre a Áustria e a Prússia, em 1853. Segundo Henderson, o Tratado, que duraria por doze anos: (...) was in fact a Prussian success which to some extent balanced the ‘humiliation’ of Olmütz. The chief obstacle in the way of renewing the Zollverein treaties had been removed and further negotiations for Austria’s admission to the Zollverein had been postponed until 1860. This gave Prussia the opportunity of strengthening the free-trade and anti-Austria elements in the Zollverein. Prussia had prevented Austria from entering her custom union, had frustrated the attempt to detach the South German States from the Zollverein and had secured the adhesion of the Tax Union. (1968, p. 223) Um segundo episódio similar ocorreria ainda na década de 1860, estimulado especialmente pelo acordo comercial entre a França e a Inglaterra assinado em 1860. O fato de a França “aplicar” os termos do tratado apenas ao comércio com a Inglaterra, e não estendê-lo, como aquela, aos demais países com os quais mantinha relações comerciais, poderia prejudicar os fluxos comerciais do Continente. A França, neste contexto, utilizou a conjuntura para pressionar por uma diminuição das tarifas aplicadas pelo Zollverein a seu comércio, contra a qual os Estados do Sul manifestaram-se veementemente. A Prússia novamente negociou unilateralmente com a França, em 1862, um acordo de redução de tarifas, na expectativa de “forçá-lo” posteriormente aos demais membros do Zollverein. Como a União deveria ser novamente renovada em 1865, a aceitação do tratado poderia ser utilizada pela Prússia como condição de sua manutenção. Se a manobra fosse bem sucedida, as chances de a Áustria ingressar no Zollverein estariam praticamente eliminadas: The free-trade era opened on 23 January 1860, when Britain and France accorded each other most-favoured-nation status. The Prussian government resisted overtures from Paris for almost two years before deciding to join the movement toward lower tariffs. Berlin eventually decided that a commercial agreement with France promised greater advantage than did a defensive alliance with Austria; and Vienna, in any event, would never endanger its undeveloped domestic industry by encouraging foreign competition. Conversion of the Zollverein to free trade would esclude Austria from the organization forever, a consequence these circumstances the adhesion of Hanover would, to some extent, compensate Prussia for her loss of economic influence in South Germany.” (HENDERSON, 1968, p. 214); 110 that despleased even those middle states, such as Saxony, that stood to gain from easier access to the French market. (BAZILON, 1990, p. 209)11 O ano de 1862 assistiu, portanto, ao início de uma espécie de “guerra de bastidores” que colocava a Áustria e a Prússia no campo de batalha. Após a subida ao poder de Bismarck, porém, sua posição seria peremptória: os membros do Zollverein que não estivessem dispostos a aceitar os termos do acordo comercial com a França poderiam livremente abandonar a União. O resultado da manobra, novamente, foi positivo: o acordo foi aceito sem a saída de nenhum dos membros do Zollverein e o mesmo foi renovado por mais quinze anos. Em resumo, “às vésperas” da Guerra da Dinamarca (1864), considerada a primeira das Guerras da Unificação Alemã, a Prússia saía vitoriosa de uma “guerra” comercial e, em grande medida, econômica, que já a acompanhava por aproximadamente 30 anos. Como se sabe, o resultado do conflito seria o controle prussiano de Schleswig e do porto de Kiel (em Holstein), a anexação de Lauenburgo, e a entrada de Schleswig e Holstein no Zollverein. Apenas um ano depois, a Guerra Austro-Prussiana, que custou à Prússia apenas três breves semanas de conflito, selaria os destinos políticos da Confederação Germânica. Após a Guerra, a Prússia comunicou o fim da Confederação, anexou diretamente Hanover, Hesse-Cassel, Nassau, Schleswig-Holstein e Frankfurt e formou, junto com outros 22 Estados, a Confederação da Alemanha do Norte. O que é ainda mais importante, os Estados do Sul, os mais combativos opositores da Prússia (além da Áustria) na antiga Confederação, estabeleceram com a mesma uma aliança militar, temendo o expansionismo de Napoleão III. A Confederação da Alemanha do Norte era uma união alfandegária e seus tratados específicos seriam assinados em meados de 186712. O Zollverein contaria agora com oficiais próprios e com um Conselho e um Parlamento Alfandegários, que apenas a Prússia tinha formalmente o direito de convocar e dissolver. 11 HENDERSON adiciona que: “If Prussia were able to force upon the Zollverein a commercial treaty with France that killed all hope of an Austro-German customs union, Prussia’s economic position in Germany would obviously be greatly strengthened. Victory in the economic field might well be the prelude to victory in the political field. It was becoming clear that the Germanic Confederation would soon have to be reformed.” (1968, p. 279); 12 Hamburgo e Bremen, porém, mantiveram sua independência econômica e não ingressaram na União; 111 Finalmente, com a Guerra Franco-Prussiana, a Prússia consegue finalmente “quebrar” a resistência dos Estados do Sul e, após a rápida derrota da França13, o Segundo Império Alemão foi proclamado em janeiro de 1871, no Salão dos Espelhos, em Versailles. 4.2 – O “estado-economia nacional” alemão Foi desta forma, portanto, como uma espécie de sub-produto da disputa entre a Áustria e a Prússia, que se delimitou um espaço interno “economicamente coerente” na Europa Central, já relativamente estabelecido em 1866. Porém, pode-se perguntar: em que medida aquele era, de fato, um espaço “coerente”? Em termos comerciais, embora interesses divergentes segregassem os Estados do Zollverein, a política tarifária da Prússia – que, como visto, precisava responder, simultaneamente, a pressões “protecionistas” relacionadas ao setor manufatureiro, tanto internas quanto externas ao território prussiano, e a pressões “liberais”, tanto dos centros comerciais como dos setores agrícolas – acabou por “representar”, de certa forma, todo o território. A “coerência interna” foi, portanto, “forçada” ou “costurada” por esta política, na medida em que, por um lado, as regiões tradicionalmente manufatureiras podiam se servir livremente do mercado “interno” como consumidor de seus produtos relativamente “protegidas” da concorrência externa; e, ao mesmo tempo, utilizar-se dos canais comerciais tradicionais do Continente como meio de exportação, especialmente para suas porções orientais; e que, por outro lado, as regiões tradicionalmente agrícolas podiam tanto “alimentar” o setor manufatureiro com suas matérias primas ou bens primários em geral, como continuar lucrando com o comércio de exportação de grãos, ainda que gradativamente menos. Como se nota pela evolução do Zollverein (Figura 8), as maiores “resistências” ao estabelecimento daquela “coerência” foram colocadas pelos Estados do Norte e pelas cidades hanseáticas, ou seja, pelos elementos tradicionalmente envolvidos na “economia de mercado” do território “alemão”. De qualquer forma, a “divisão de trabalho” tradicional em espaços “economicamente coerentes”, que consiste na troca livre entre regiões manufatureiras e agrícolas, e que 13 Para uma descrição do Império, ver MOMMSEN (1995); para o período entre 1862 e 1870, ver ABRAMS (1995, cap. 3); para o período entre 1871 e 1919, ver STÜRMER (2001); para a descrição da Guerra FrancoPrussiana e dos detalhes do processo de unificação política, ver FOOT (1971); 112 necessita que ambas acompanhem o ritmo de desenvolvimento econômico, foi gerada, no território do Zollverein, como sub-produto da política comercial da Prússia. Sua “resposta” à disputa política no interior da Confederação acabou levando à “internalização” de espaços que podiam estabelecer aquele tipo de sinergia. O ferro extraído tanto na Silésia como na Saxônia podia servir às manufaturas da Renânia e da Westphalia; o carvão destas últimas, como combustível às manufaturas das primeiras; os grãos das regiões orientais podiam alimentar as populações que aumentavam em todo o território; os centros comerciais podiam articular o comércio de entrada e saída do mesmo; porém, agora, todos deveriam pagar os tributos, utilizar a moeda, receber financiamentos do Estado Prussiano. A articulação desse mercado “interno” seria concretizada na prática pelos avanços naquele que Blackbourn considera como o setor mais dinâmico na “Alemanha” até pelo menos a década de 1870: o de transportes e comunicações (1998, p. 117). Os progressos se deram, como se sabe, notadamente na construção de estradas de ferro, que foram igualmente acompanhadas pela “abertura” dos canais fluviais internos à navegação, que se fazia, cada vez mais, através de navios a vapor. As primeiras estradas de ferro abertas no território alemão, na segunda metade da década de 1830, eram pequenas linhas de subúrbio, em geral conduzidas apenas pelo capital privado14. Entre 1839 e 1846, porém, data-se em geral o primeiro grande “boom” de construção de ferrovias, empreendimentos já conduzidos diretamente pelo capital público, ou através de parcerias com o capital privado.15 O surto construtivo segue em ritmo acelerado até as últimas décadas do século, de forma que, por volta da época da constituição da Confederação da Alemanha do Norte, a “Alemanha” já contava com diferentes sistemas ferroviários, tanto em sentido norte-sul como leste-oeste, notadamente: • em sentido norte-sul: i) na porção leste do território, o sistema que ligava Stettin a Berlim, de onde as linhas podiam seguir em direções sul (Praga) e sudeste (Breslau); ii) na porção central do território, de Hamburgo a Cassel, via Bremen, seguindo para o 14 A primeira na Bavária, aberta em fins de 1835, de Nuremberg a Furth; a segunda, em 1838, de Berlim a Potsdam; a terceira, também em 1838, entre Brunswick e Wolfenbuttel; 15 Em 1839, uma linha de 70 milhas de Dresden para Leipzig; em 1840, mais quatro linhas importantes: Leipzig para Magdeburgo, Munique para Augsburgo, Frankfurt am Main para Mainz e Mannheim para Heidelberg; em 1841, Berlim para Anhalt, Dusseldorf para Elberfeld, Colônia para Aachen; esta última, concluída em 1843, em especial, era parte da nova rota através da Bélgica para Antuérpia, dentro dos planos da Prússia de evitar os centros comerciais holandeses do Reno; 113 sul e o oeste; iii) na porção ocidental do território, o sistema através do vale do Reno, das fronteiras da Holanda às da Suíça; • em sentido leste-oeste: i) o sistema ao longo da planície do Norte (Aachen, Hanover, Berlin, Danzig, Königsberg); ii) o sistema através da porção central (Essen, Cassel, Dresden, Breslau, Beuthen); iii) o sistema na porção sul (Mannheim, Stuttgart, Munique, Viena); No que se refere à “unificação” das finanças, é necessário ter em mente, como dito, que, até inícios do século XIX, os principais agentes financeiros nos territórios da “Alemanha” eram casas bancárias privadas de origem “internacional”, estabelecidas especialmente em Frankfurt e Hamburgo. A Prússia, porém, dispunha na prática de um importante volume financeiro gerado pelas receitas do Zollverein que era, como visto, administrado “diferencialmente”. Dessa forma, a Prússia pôde gradativamente, tanto através do manejo daqueles recursos, como da administração de sua própria dívida pública, transformar-se no principal agente financeiro dos Estados-Membros do Zollverein. Ao “abrir mão” da parcela de receitas que seria a ela destinada em função de sua relativa preponderância populacional na União, a Prússia criava, na prática, uma espécie de “dívida pública” de seu Estado com relação aos demais membros da União. Estes, por sua vez, ganhavam a liberdade financeira necessária para agirem, no âmbito de seus territórios, de forma semelhante. Uma espécie de fluxo financeiro interno, circular e permanente, criava-se, dessa forma, no território delimitado pelo Zollverein, através do qual as receitas alfandegárias eram recolhidas e redistribuídas diferencialmente no interior do mesmo. Ao mesmo tempo, as receitas adicionais necessárias àquele “sistema” começaram gradativamente a serem fornecidas por agências privadas criadas especialmente para este fim, estimuladas fortemente pelo “setor público”: as sociedades anônimas, tanto companhias como bancos16, que freqüentemente negociavam com títulos emitidos pelo governo (especialmente 16 “The first of these banks, protecting its masters against the unlimited risks involved in setting up railway companies and the like, was the Darmstadter Bank, founded by an international consortium led by Sal Oppenheim Jr & Cie of Cologne. This soon gravitated to Berlin, to be close to the seat of power and industry, as did the Disconto Gesellschaft, the Dresdner Bank, the Commerzbank and many others, while the Deutsche Bank began there. The Berlin stock exchange was the German leader and, after 1873, the Reichsbank added further to the city’s financial importance. Russian loans were managed from there for the next twenty years, as was the trade of the entire Baltic region, and much investment in both North and South America.” (STÜRMER, 2001, p. 48); 114 da Prússia) 17. Em 1818, quando a Prússia inicia o expediente de multiplicação de sua dívida pública, são os Rothschild, estabelecidos em Frankfurt, que agenciam o empréstimo, levantado no mercado de Londres. A partir da década de 1840, porém, serão os bancos criados sob a tutela do setor “público” que passariam a agir como intermediários daqueles negócios18. Em uma palavra, as finanças do território do Zollverein foram “nacionalizadas”. No que se refere à unificação monetária, os acordos originais do Zollverein previam, em seu Artigo 14, que os Estados-Membros deveriam “tomar medidas em futuro próximo” para padronizar seus sistemas. Suas obrigações financeiras poderiam ser pagas em thalers da Prússia ou em florins dos Estados do Sul, a uma taxa de 7 florins para cada 4 thalers. A “moeda” da Áustria, o florin austríaco, estaria portanto fora do “sistema”. Em 1838, no Segundo Congresso Geral do Zollverein, que foi simultaneamente uma Convenção Monetária (chamada Convenção de Dresden), foi estabelecida uma nova relação entre os três principais padrões monetários da Confederação, ainda com base no marco de Colônia (ver capítulo 2). Após uma tentativa frustrada, em 1842, de estabelecer uma moeda única para os Estados do Zollverein (o Vereinmünze, valendo 2 thalers prussianos ou 3,5 florins dos Estados do Sul), a Convenção Monetária de 1857 (chamada Convenção de Viena), estabeleceu novos padrões de conversão e novas regras gerais para a emissão monetária, desta vez incluindo a Áustria. A proposta original austríaca era substituir a prata pelo ouro como padrão monetário da Confederação, especialmente em função da grande desvalorização do florin austríaco com relação ao thaler. A proposta foi naturalmente rejeitada pela Prússia e estabeleceu-se o acordo conhecido como Deutsche Münzverein. 17 Um grande avanço neste processo foi a fundação, em 1846, do Diskontogesellschaft, conhecido como Banco da Prússia, como instituição semi-privada, sob controle público, para emissão de moeda; e especialmente sua reorganização, em 1856, quando foram abolidas todas as limitações de emissão de moeda e proibido o uso de moedas bancárias estrangeiras no território prussiano; 18 Sobre a disputa entre os Rothschild e os novos bancos “alemães”, ver KITCHEN (1978, pp. 87-101); vale notar que os Rothschild, de fato, eram os principais fornecedores de crédito para os Habsburgo; a substituição destes nos mercados financeiros da “Alemanha” corresponderam, portanto, a mais um elemento na “decadência” da Dinastia: “The poor performance of the Austrian and Hungarian economies prompted the Diskontogesellschaft to enter the Austrian capital market in search of bargains and to make up for the shortcomings of banks like the Rothschilds in Frankfurt and Vienna who were no longer able to meet the demands of the Austrian government for fresh bond issues. In this process the Diskontogesellschaft gradually absorbed the Rothschilds in Frankfurt.” (KITCHEN, 1978. p. 116) 115 Novamente, não houve consenso quanto à adoção de uma moeda única no interior da Confederação19 e apenas uma nova padronização monetária foi acordada. As três principais moedas circulantes no território deveriam ser padronizadas doravante pelo pound métrico (Zollpfund), com peso de 500 gramas, em substituição ao marco de Colônia. Um pound métrico de prata seria convertível a 30 thalers, ou 52,5 florins, ou 45 florins austríacos. Duas novas moedas de prata (o Vereinsthaler e o Vereinsthaler duplo) e duas novas de ouro (o krone e o meio krone) deveriam ser emitidas tanto no interior do Zollverein com nos domínios Habsburgo. As demais moedas deveriam ser retiradas de circulação do território. Foram estabelecidos, finalmente, limites superiores de emissão monetária para cada região envolvida no acordo. O projeto de criação do Vereinsthaler nunca evoluiu. Ao mesmo tempo, com a grave crise financeira pela qual passaria em 1858, especialmente agravada pela Guerra da Itália em 1859, a Áustria abandonou a Convenção, desvalorizando sua moeda e adotando o padrão ouro. Com a Confederação da Alemanha do Norte, a emissão de moedas bancárias era agora responsabilidade e exclusividade do Banco da Prússia. E, como se sabe, em 1871, o Império adotou o padrão-ouro e o thaler tornou-se sua moeda oficial, com o nome de marco. Kindelberg resume o processo de unificação econômica na “Alemanha” da seguinte forma: In 1818, Prussia consolidated tariffs within its borders, which included, after eighteenth century conquests, Silesia and Saxony and stretched from the east to the Rhineland. A further consolidation occurred in 1834 with the formation of the Zollverein and southern and northern monetary agreements, followed by their joining into a single money. A common law for bills of exchange was agreed on in 1851, weights and measures in 1856-1858, and a commercial code in 1857-1861. With the victory of Prussia over France in 1871 the unification of Germany – ex Austria which had been a challenger of Prussia for leadership in the greater Germany until its 1866 defeat by Prussia – was complete, even enlarged by the acquisition of Alsace and Lorraine. The Prussian taler, renamed the mark, was made the empire's monetary unit of account. The Reichbank was established in 1875. With their interest in world trade, the Hanseatic cities held aloof from the Zollverein as long as politically possible, but the last, Hamburg, finally succumbed in 1881 after the 1879 tariff. (1996, p. 151) Um indicador pertinente de que o “espaço” delimitado pelo Zollverein já apresentava, na década de 1860, um relativo grau de articulação interna, podendo ser caracterizado, portanto, como um “mercado nacional” nos termos de Braudel, foi sua capacidade de se manter relativamente imune aos conflitos políticos que envolveram seus “Estados” naqueles anos: 19 “Particularist prejudice stood in the way of the acceptance of Saxony’s sensible proposal that the Zollverein should adopt a uniform monetary system based on a unit worth one-third of a Prussian Thaler. Not until thirtythree years later was such a coin (the mark) introduced throughout Germany.” (HENDERSON, 1968, p. 140); 116 Despite the political conflict of the years 1862 to 1866, economic relations among the Zollverein states remained intact, and even the war failed to disrupt trade and commerce among them. Total revenues accruing to members of the Custom Union in 1866 were only 11 per cent lower than in the previous year. It was as if the Zollverein had an independent existence unaffected by the turmoil generated by the struggle for political hegemony. (BAZILON, 1990, p. 210) Porém, o mesmo autor adverte: Yet economic integration could proceed only so far on the basis of common tariff policies and administrative measures negotiated among sovereign states. A centuries-long tradition of Prussian expansionis, together with the Customs Unions’ history of internecine squabbling, suggested that sooner or later Berlin would oblige its partners to yeald their autonomy. (1990, p. 210) 4.3 – Conclusões e Hipóteses Pode-se dizer, praticamente sem riscos de exageros, que não existe uma data, ou um evento singular, na história da “Alemanha”, cujas interpretações sejam tão variadas e polêmicas quanto a instituição do Segundo Império Alemão. Dentre estas, uma, em particular, elaborada especialmente para combater o mito da “missão” prussiana de liderar o “espírito alemão” rumo à constituição de uma Nação Alemã moderna, vê no Império um subproduto da expansão política e militar da Prússia, bem sucedida não por “representar” o “espírito alemão”, mas antes pela genialidade de Bismarck: (…) in the nineteenth century the disparate German lands were unified by ‘blood and iron’, a political, diplomatic and military process culminating in Prussia military defeat of Austria in 1866 at Königgratz and her victory over France at Sedan in 1870. (…) In practice, unification can legitimately be seen as a form of Prussian expansionism. (…) The unification of Germany (…) was the result of Birmarck’s skilful diplomacy in promoting the interests of Prussia by harnessing national and economic sentiment in favour of a Kleindeutsch solution to the German question. (ABRAMS, 1995, pp. 8-9)20 Independentemente da quantidade e variedade das interpretações, porém, poucas relacionam de forma direta e detalhada a unificação política com a unificação econômica, alvos da breve reconstrução histórica desenvolvida nesta pesquisa. Em termos econômicos, o tema mais popular entre a historiografia do período continua sendo o processo de industrialização 20 Para uma discussão de Bismarck, ver SCHNABEL (1954); e MARTIN (1954); para as ações de Bismarck no período até 1870, ver WALLER (1999, caps. 2 e 3); para a discussão historiográfica do papel de Bismarck na unificação e, mais geralmente, na história da Alemanha do século XX, ver PFLANZE (1971, pp. 3-14); 117 observado nos territórios alemães a partir, aproximadamente, da década de 185021; e, mesmo nas apreciações a respeito do Zollverein22, é em torno de seus efeitos sobre aquele, especialmente, que as pesquisas se concentram. O estudo de Henderson, porém, foge a este padrão. O autor sugere diretamente que “Prussia’s ‘customs’ empire proved to be the first step toward the establishment of a German Empire under Prussian domination” (1968, p. 341), defendendo a hipótese de que o estabelecimento do Império Alemão representou sobretudo uma vitória econômica daquele Estado. A unificação econômica teria, para Henderson, antecedido e facilitado a unificação política. Sheehan, porém, comentando a interpretação de Henderson, afirma: Henderson, like the majority of scholars who have worked on the Zollverein, simply assumed that it had an important economic impact. His major concern was with the bureaucratic decisions which led to its formation and extension. Furthermore, once the union was in place, it became the basis for talking about a German economy, which was historically linked to the national economic system established in 1866-1871. (1990, p. 12) A conexão entre os processos de construção do Zollverein, por um lado, e de fortalecimento da Prússia, por outro, era evidente para os observadores contemporâneos. Metternich, ainda em 1829, notando a aproximação das Uniões Alfandegárias do Norte e do Sul, afirmava: In the great Confederation there is arising a smaller subsidiary union, a status in statu in the full sense of the term, which will only too soon accustom itself to achieve its ends by its own machinery in the first place and will only pay attention to the objects of the machinery of the Confederation in so far as they are compatible with the former. (citado em HENDERSON, 1968, p. 96) O Cônsul Geral da Inglaterra em Hamburgo, em uma carta enviada para o Comitê para o Comércio do Conselho Privado, escrevia, em 1833: (...) their Lordships observe with regret the perseverance of the Prussian Government and the success which has attended its endeavours to establish and to extend a system, the manifest object of which is that of combining commercial monopoly with political aggrandizement. (...) Their Lordships will further bear in mind, in any reduction of duties which they may possibly have to propose, in regard to imports from the shores of the Baltic, the war which they conceive to have been declared by Prussia upon British commerce and will be strongly 21 Ver, sobre a industrialização da “Alemanha”, KEMP (1987, cap. 11); PIERENKEMPER (2001, pp. 83-120); POLLARD (1981); HENDERSON (1967b); TREBILCOCK (1981, pp. 22-105); sobre o papel do Estado, ver HENDERSON (1967a); para a interpretação da tese clássica de GERSCHENKRON (1962, pp. 5-30) a respeito do processo, ver TILLY (1994); 22 Para a discussão historiográfica sobre o Zollverein, seus efeitos sobre a industrialização e sobre a unificação política, ver BAZILON (1990); e TILLY (1994); 118 inclined to favour the productions of countries actuated by a more liberal and friendly spirit. (citado em HENDERSON, 1968, p. 98) Blackbourn adverte, porém, que seria um exagero supor, como fizeram vários autores com relação aos posicionamentos políticos da Prússia, que a construção do Zollverein tenha tido como motivação primordial a unificação alemã (1998, p. 117). A tarifa de 1818, por exemplo, foi instituída com objetivos fiscais, e esteve relacionada especialmente à configuração territorial da Prússia de 1815. Considerando estas “recomendações”, a historiografia tende a localizar, portanto, no ano de 1849 o momento a partir do qual é possível enquadrar a política da Prússia como direta e coerentemente dirigida para aquele fim. Após a humilhação de Ölmutz, e com as iniciativas austríacas em “tomar as rédeas” políticas e econômicas da Confederação, a Prússia teria passado a agir com o objetivo de unificar política e economicamente a Alemanha excluindo a Áustria. É o que sugere Bazilon: Although Berlin ignored the political implications of Motz’s edifice for some years, the Zollverein in due course transcended its ‘originally purely administrative and fiscal objectives’ and ‘turned out to be a step on the way to a large unified Empire’. (1990, p. 190) Observando a evolução dos processos de centralização política e de “unificação” econômica na Europa Central do século XIX sob a ótica do modelo de Fiori, estas polêmicas são, em grande medida, dirimidas; e algumas conclusões principais se insinuam. Em primeiro lugar, tudo indica que a construção de uma unidade política centralizada precedeu temporalmente o processo de unificação econômica no espaço da Europa “alemã”. Como visto, a Europa Central assistiu, entre o fim da Guerra dos Trinta Anos e a Revolução Francesa, à construção e à expansão de um Estado Territorial, que manteve, neste período, poucas características de uma unidade econômica “coerente”. Mais geralmente, nenhuma das entidades políticas que coexistiam e disputavam com a Prússia pela hegemonia naquele espaço apresentaram tais características. Em outras palavras, até inícios do século XIX, as forças que “empurraram” o Estado Hohenzollern em direção ao absolutismo, à concentração de poderes, à expansão territorial, agiram pouco no sentido de aproximá-lo aos canais comerciais, aos centros financeiros, às regiões envolvidas no comércio de longa distância, ou seja, à “economia de mercado” nos termos de Braduel. 119 O “mercantilismo” Hohenzollern, como visto, não se concentrava especialmente sobre o fortalecimento econômico ou sobre a formação de uma “economia nacional”. O Estado Prussiano nasceu e ascendeu politicamente prescindindo de conexões com os centros econômicos do Continente, utilizando, para isso, sobretudo sua eficiente máquina militar de extração fiscal, que se re-alimentava a cada nova conquista territorial. E isto foi possível especialmente por aquele Estado ter ocupado um lugar “peculiar” na dinâmica geopolítica européia dos séculos XVII e XVIII, “encravado” como estava entre as principais forças políticas daquele espaço. Como se pode notar pelo Quadro 1 da Figura 9 abaixo, os territórios prussianos encontraramse “pressionados”, ao longo do século XVIII, por praticamente “todos os lados”. O Reino da Suécia, como se sabe, saía de uma etapa notadamente expansionista, e, até meados do século, ainda ameaçava os territórios Hohenzollerrn. Os Habsburgo ainda eram a Dinastia mais poderosa do Sacro Império e estiveram em guerra contra a Prússia em mais de uma ocasião, especialmente pela disputa em torno da Silésia. O Reino da Polônia, embora em fins do século viesse a desaparecer do cenário político europeu, ainda ocupava, até meados daquele século, todo o território entre o Brandemburgo e a Prússia. E, após seu colapso e a “contenção” da Suécia, o Império Russo viria ocupar o espaço político deixado na Europa Oriental. A França entraria em sua fase tipicamente expansionista, especialmente com o Reinado de Luis XIV, que iniciou uma seqüência de “Guerras de Agressão” contra os Estados europeus. A Inglaterra mantinha suas pressões sobre o Continente, dados seus interesses econômicos, especialmente comerciais, sobre aquele e, neste sentido, tentava manter “sob controle” a pressão francesa. Finalmente, o Sacro Império ainda continha importantes Dinastias disputando pela “hegemonia” política em seu interior, notadamente os Wittelsbach, da Bavária, e os Wettin, da Saxônia. Essa configuração “peculiar” teria levado à primeira etapa na concentração de poderes do Estado Hohenzollern, que se prolongaria até aproximadamente fins do século XVIII, caracterizada sobretudo por uma lógica estritamente territorialista, e, portanto, sem conexões diretas com as “forças econômicas” de seus territórios. 120 QUADRO A: SÉCULO XVIII RA REINO DA DINAMARCA REINO DA SUÉCIA Norte Mar do lo cu AS CI ÍN OV A NI LÔ PO PR DA WI TTE LS BA UN CH O IN RE ID AS tico ál rB Ma tad ed os é IN A GL R TE da me WETTIN nd a m et ad e do sé cu lo HABSBURGO Se WITTELSBACH IMPÉRIO RUSSO gu gu n HABSBURGOS Se RIO O PÉ IM MAN O T O ÇA AN FR SACRO IMPÉRIO ROMANO QUADRO B: SÉCULO XIX GL IN A RR E AT tico ál rB Norte Mar do Ma IMPÉRIO RUSSO ÇA AN FR CONFEDERAÇÃO GERMÂNICA IMPÉRIO AUSTRÍACO FIGURA 9: CONFIGURAÇÕES GEOPOLÍTICAS DA EUROPA: SÉCULOS XVIII e XIX 121 Com a Revolução Francesa e a e as Guerras Napoleônicas, uma nova dinâmica política se delineou na Europa, com a “varredura” operada pelos exércitos de Napoleão, que, entre outras coisas, levou ao fim do Sacro Império Romano. A configuração geopolítica européia (ver Quadro 2), a partir do estabelecimento da Confederação Germânica como instrumento de “congelamento” de fronteiras, “pacificou-se”, embora mantendo uma tensão permanente. Este “congelamento” se sustentou, como se sabe, sobre uma espécie de “pacto” entre as “Grandes Potências”, materializado pela Santa Aliança, que se aliou à Inglaterra em seu objetivo comum de “conter” a França. A Confederação Germânica pôde servir tanto àquele objetivo, como ao de “conter” a Rússia, que ingressava então em seu processo de construção do Estado e de expansão territorial. Literalmente no centro deste “equilíbrio”, a disputa entre a Áustria e a Prússia tornou-se o principal elemento dinâmico no interior da Confederação, porém sendo vedada a possibilidade de eclosão de qualquer conflito direto que o ameaçasse. Como todas as “Grandes Potências” envolveram-se na determinação da “solução” encontrada em Viena, e todas defendiam, ao menos temporariamente, sua manutenção, não haveria espaço para a adoção de uma lógica estritamente territorialista no processo de construção do Estado Prussiano. Neste momento, que coincide, ao mesmo tempo, com a divisão da Prússia em dois blocos territoriais em grande medida complementares do ponto de vista econômico, inicia-se, portanto, uma nova fase, com distintas características, naquele processo. Em outras palavras, a nova configuração geopolítica européia do século XIX, gerada essencialmente pela seqüência da Revolução Francesa, das Guerras Napoleônicas e do Congresso de Viena, “empurrou” a Prússia para outros “caminhos” no processo de concentração de poderes e fortalecimento de seu Estado. Esses levariam, entre outras coisas, à tarifa de 1818, ao Zollverein de 1834, ao acordo com Hanover de 1853, ao acordo com a França de 1862, ou seja, às datas fundamentais para a consolidação do “mercado nacional”, ou de um “espaço econômico coerente”. Foi desta forma, portanto, que o “jogo das guerras” articulou-se novamente, porém de forma original, ao “jogo das trocas”, para dar origem ao “estado-economia nacional” alemão. Como visto, as principais forças econômicas de “mercado”, naquele espaço, concentravam-se em alguns pontos e rotas fortemente controlados por agentes “internacionais”. Em sua disputa 122 (pacífica) com a Áustria, a Prússia foi levada a “internalizar” aquelas forças, especialmente pela forma que conduziu as questões do Zollverein. O processo de integração política, doravante, poderia, com a aquisição gradual daquela “coerência econômica” no território delimitado pelo Zollverein, contar com uma nova “arma”: o “mercado nacional”. Com a Guerra da Criméia, o primeiro sinal de que o “equilíbrio” europeu se desintegrava, o processo encontrou suas etapas finais nas chamadas Guerras de Unificação Alemãs. Em primeiro lugar, com a Guerra da Dinamarca, que incorporou, do ponto de vista político, os Estados do Norte da Confederação; alguns anos depois, com a Guerra Austro-Prussiana, que excluiu definitivamente a Áustria dos “assuntos” alemães; e, finalmente, com a Guerra Franco Prussiana que, por um lado, conteve a França em seus limites Ocidentais, e, por outro, “quebrou” a resistência dos Estados do Sul ao “expansionismo” prussiano. Nos anos seguintes, com a “internalização” dos últimos territórios do espaço “alemão” que ainda não funcionavam de acordo com a lógica daquele “mercado nacional” (ou seja, as três cidades hanseáticas), o processo estaria finalmente concluído. Não parece relevante “decidir”, neste contexto, se a Prússia possuía ou não “intenções” em unificar a Alemanha, incluindo ou não Áustria. Importa antes que a situação geopolítica da Europa do século XIX colocou ambas em uma espécie de “guerra fria” que passou a ser disputada, pela Prússia, na “arena” econômica. A criação de um “espaço econômico unificado”, progressista e desejável do ponto de vista político como possa ser, não precisa ser encarada, portanto, como uma “escolha” prussiana: foi antes o “caminho” para o qual aquela conjuntura a “empurrou”. Porém, ao fazê-lo, transformou-a em um “estado-economia nacional”, dotando-a com isso de uma dinâmica econômica e política que desafiaria até mesmo os que já haviam alcançado aquele status séculos antes: a França e a Inglaterra. Se o “caminho” da construção do Estado Prussiano, ao longo dos séculos XVII e XVIII, prescindiu de conexões com o “mercado”, ao longo do século XIX foi precisamente sobre elas que se apoiou. Neste processo, gradualmente, os elementos de um mercado nacional foram sendo criados: em primeiro lugar, um espaço de tributação exclusiva; em segundo, a adoção de uma política comercial comum; em terceiro, a unificação monetária, com a “expulsão” do florim dos mercados do Zollverein e a consolidação do thaler como sua moeda oficial; finalmente, a “nacionalização” das finanças e a multiplicação da dívida pública, que dariam origem ao que se costuma denominar “capital financeiro”. 123 Para Fiori, o “jogo das guerras”, a partir da necessidade de seus “jogadores” em se financiar, imbricou-se, de uma maneira particular, em um determinado momento histórico, com o “jogo das trocas”, para dar origem à unidade do “estado-economia nacional” na Inglaterra e na França. No século XIX europeu, quando o “jogo das guerras” já era jogado em outros “tabuleiros”, quando os “primeiros colocados” já estavam definidos, a conexão dos dois “jogos” novamente fez nascer mais uma destas unidades. O que levou a Prússia à vitória no “jogo das guerras”, portanto, foi sua conexão original com o “jogo das trocas”, embora, no momento da vitória, o vencedor não fosse mais propriamente o Estado prussiano, e sim a unidade sui generis do “estado-economia nacional” alemão, dotado como tal de uma força que poderia mesmo, como o fez, desestruturar o sistema político e econômico da Europa no século posterior. Nesse sentido, um dos possíveis desdobramentos para o qual esta pesquisa aponta é a avaliação do grau em que este processo (ou seja, a criação da unidade híbrida do “estadoeconomia nacional” alemão) teria contribuído para a experiência sem precedentes de crescimento econômico observada na Alemanha em fins do século XIX, que a transformaria eventualmente em um das maiores potências industriais e financeiras do mundo. 124 REFERÊNCIAS ABBELLÁN. J. Nación y nacionalismo en Alemania. La “cuestión alemana” (1815-1990). Madrid: Tecnos, 1997. ABRAMS, L. 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A Bula de Ouro, definida na Assembléia que reuniu os principais líderes eclesiásticos e seculares do Império em Nuremberg, estabeleceu, além da lista de Eleitores, que seus territórios deveriam ser indivisíveis e, ao mesmo tempo, que a sucessão deveria ser garantida para que o voto estivesse sempre a eles associado. Prescreveu ainda que quatro votos seriam suficientes para eleger o Rei, ou seja, o princípio da maioria; e, finalmente, estabeleceu uma série de privilégios associados à figura dos Eleitores, colocando-os com papel político de destaque no Império. Os direitos imperiais (regalia) atribuídos ao Imperador foram primeiramente enumerados em Assembléia em 1158. A lista incluía questões relacionadas a estradas públicas, tarifas, cunhagem de moedas e a investidura de oficiais e nobres. O último Imperador Hohenstauffen, Frederico II, porém, concedeu, em 1220, o Confoederatio cum princibus ecclesiasticis, abrindo mão de um grande número de regalia em favor dos bispos, incluindo questões relacionadas a tarifas, cunhagem de moeda e fortificações. Em 1232, o Statutum in favorem principum estendeu estes direitos aos territórios seculares. A partir deste momento, os governantes territoriais passam a ser denominados domini terrae, ou “senhores” de suas terras. A partir de 1486, a Assembléia onde se reuniam os Eleitores e os demais duques seculares e eclesiásticos passou a se denominar Assembléia Imperial (Reichstag), estabelecendo-se como corpo legislativo do Império. A Assembléia só se tornaria permanente, porém, após 1663. 1 A principal referência a respeito da estrutura e da história política do Império é BRYCE (1964); para um resumo, ver GAGLIARDO (1991, pp. 2-4); ou GOOCH (1948, cap. 3); 135 A estrutura política básica do Império foi estabelecida formalmente com as quatro Bulas aprovadas na Assembléia Imperial de Worms em 1495, cujo conjunto ficou conhecido como Reforma Imperial (Reichsreform). Entre outras coisas, a Reforma designou os Círculos dos Estados Imperiais (que só foram finalizados, porém, em 1512) e o Tribunal de Justiça Imperial (Reichskammergericht) como a Corte Suprema para todos os territórios do Império, em paralelo ao Conselho da Corte Imperial (Reichshofrat), que continuou a existir. Os Círculos, inicialmente estabelecidos em seis, mas ao longo dos anos seguintes atingindo o número de dez, seriam instrumentos para a execução da legislação imperial, em especial para a coleta de impostos. Ao mesmo tempo, a Reforma instituiu a Paz Territorial Eterna (Ewiger Landfriede), segundo a qual o Império seria um corpo legal único e, portanto, a feudalidade não poderia ser instrumento de relações políticas entre seus membros. A Reforma estava relativamente concluída em 1555 com o Regimento Executivo Imperial (Reichsexekutionsordnung), que regulava os detalhes de funcionamento dos Círculos. Por volta de meados do século XVII, portanto, a estrutura de poder no Império era aproximadamente como se segue. Os poderes territoriais mais destacados recebiam o status formal de “imediatos” (unmittelbar) ao Imperador ou possuíam “imediatice” imperial (Reichsunmmitelbarkeit). Em princípio, qualquer categoria titular poderia ser um Imediato (duques, conselhos de cidades, bispos, etc) e o status concedia a seu dono a soberania territorial (Landeshoheit) sobre seus domínios, ou seja, o direito de decidir sobre questões legais, arrecadação de impostos, justiça, poder de polícia, etc. Em fins do século XVII, existiam no Império cerca de 1800 destas unidades. O status de Estado Imperial (Reichsstandschaft), por outro lado, era concedido àquelas unidades que, dentro deste conjunto, pagassem os tributos imperiais, ou seja, estivessem incluídas na Reichsmatrikel, a lista de unidades pagadoras do Império. Formalmente, não havia autoridade acima de um Estado Imperial além do Imperador. Os Estados Imperiais estavam organizados através dos dez Círculos Imperiais (Reichskreise) e a eles era concedido o direito de voto na Assembléia Imperial. Esta Assembléia era constituída por três Conselhos: o Conselho de Eleitores, o Conselho de Príncipes e as Cidades Livres (Freistädte) ou Cidades Imperiais (Reichsstädte). O Conselho de Eleitores era composto, de acordo com a Bula de Ouro de 1356, por sete membros, chamados Príncipes Eleitores (Kurfürsten): o Rei da Boêmia, o Arcebispo de 136 Mainz, o Arcebispo de Trier, o Arcebispo de Colônia, o Duque da Saxonia-Wittenberg (ou Saxônia Eleitoral), o Margrave do Brandemburgo e o Conde-Paladino da Renânia. Esta estrutura sofreu poucas alterações ao longo dos séculos seguintes2, e, em fins do século XVIII, o Conselho de Eleitores era formado por oito membros, com a inclusão, na lista anterior, de Hanover. O Conselho de Príncipes (Fürstenrat) era composto por duas “bancadas”, a eclesiástica (Geistlichebank) e a secular (Weltlichebank). No século XVIII, havia aproximadamente 100 votos neste Conselho. Como regra, os maiores Territórios Imediatos tinham voto individual (Virilstimme) e os menores eram agrupados em Cúrias com voto coletivo ou curial (Kuriatstimmen). As cúrias da bancada secular eventualmente organizavam-se através de Colegiados de Condes Imperiais3. A bancada eclesiástica, incluía, além de bispos e arcepispos, o Grão Mestre da Ordem Teutônica e o Grão Mestre da Ordem de São João, ambos com votos individuais. O Conselho das Cidades Imperiais era agrupado em dois Colegiados: da Suábia e do Reno, cada um com um voto coletivo na Assembléia. Ao Conselho, porém, não era permitida a participação nas decisões acerca de várias questões políticas relevantes, como, por exemplo, a admissão de novos territórios no Império. Finalmente, os membros dos Círculos Imperiais (Reichskreisstandschaft) tinham direito a assento e voto nas Assembléias Circulares ou Dietas Circulares (Kreistage). A importância destas Assembléias residia no fato de os votos de Condes terem o mesmo peso daqueles dos Príncipes (ver a estrutura das titulações abaixo) e, portanto, de serem o principal espaço político dos Estados Territoriais menores, que não participavam das Assembléias Imperiais. Originalmente, todos os Estados Imperiais eram membros de algum Círculo Imperial e da Assembléia Imperial. Gradualmente, entretanto, este quadro foi sendo alterado4. Já no século XVIII, é comum a algumas famílias ou territórios seculares possuírem representação nas 2 Durante a Guerra dos Trinta Anos, o Conde-Paladino da Renânia perdeu seu status de Eleitor, passado ao Duque da Bavária. Após a guerra, o oitavo Eleitorado foi então criado para incluir novamente a Renânia. Em 1692, o Duque de Brunswick-Hanover tornou-se o nono membro do Conselho. Em 1777, com a extinção da Dinastia da Bavária e com sua herança pelo Conde-Paladino da Renânia, os dois votos passaram a representar apenas um, e o Conselho volta a ter oito membros, permanecendo neste número até a dissolução do Império; 3 Era comum que algumas famílias principescas com voto individual no Conselho também participassem nos votos curiais destes Colegiados; 4 O status de Estado membro de um Círculo Imperial de uma família ou de um ramo de uma família extintos passava em conjunto com o território a seu novo governante, assim como suas obrigações fiscais; mas as posições na Assembléia Imperial nem sempre eram automaticamente herdadas; 137 Assembléias dos Círculos Imperiais, mas não na Assembléia Imperial, e vice-versa. Alguns Estados Imperiais, inclusive, podiam não estar representados em qualquer das Assembléias. Finalmente, o Império possuia duas Cortes Supremas separadas: o Conselho Áulico em Viena e o Tribunal Cameral Imperial em Wetzlar. As informações descritas acima estão resumidas na Figura 10 abaixo. IMPERADOR ESTADOS IMPERIAIS Renânia (+Bavária em 1777) votos na Eclesiásticos organizados através de ASSEMBLÉIA IMPERIAL Colônia CÍRCULOS IMPERIAIS ASSEMBLÉIAS CIRCULARES Mainz Trier SaxôniaWirttemberg Brandemburgo Boêmia Brunswick-Hanover (em 1693) Áustria Bavária Burgùndia Francônia Reno Eleitoral CONSELHO DE ELEITORES CONSELHO DE PRÍNCIPES Bancada Secular CONSELHO DAS CIDADES Bancada Eclesiástica Reno-Westphalia Saxônia Reno Superior Votos Individuais Votos Curiais Colegiados de Condes Imperiais Saxônia Superior Suábia FIGURA 10: ESTRUTURA POLÍTICA DO SACRO IMPÉRIO ROMANO Estrutura Geral das Titulações Nobres Além desta estrutura política hierarquizada, o Império também estava organizado segundo uma estrutura bastante formal para a Nobreza, que se mesclava e confundia com a primeira. Em termos de sua constituição, a Nobreza estava dividida segundo três categoriais formais principais na segunda metade do século XV: i) os Governantes Territoriais; ii) os Cavaleiros Imperiais; e iii) a Nobreza Territorial. Os Governantes Territoriais tinham o direito ao Landeshoheit em suas possessões e representação na Assembléia Imperial, ou seja, eram reconhecidos como Estados Imperiais 138 (Reichsstände). Estes, junto com suas famílias, formavam a Alta Nobreza (Hochadel) e estavam sub-divididos em dois grupos: i) príncipes (Fürsten); e ii) condes (Grafen) e lordes (Edlen Herren). Os Cavaleiros Imperiais eram, da mesma forma que os anteriores, governantes de Territórios Imediatos, com o direito ao Landeshoheit em suas possessões, porém seus territórios não estavam incluídos nos Círculos Imperiais e não pagavam os tributos imperiais. Não eram considerados, portanto, Estados Imperiais. Os Cavaleiros Imperiais se agrupavam basicamente em três Círculos “Cavaleirescos” (Ritterkreise): os da Suábia, da Francônia e da Renânia. A maioria das famílias nobres pertencia, porém, à categoria de Nobreza Territorial (Landsadel), não possuindo o direito ao Landeshoheit em suas possessões, estando sob jurisdição dos governantes dos Territórios Imediatos correspondentes. Os Príncipes eram a categoria nobre mais influente no Império. Originalmente, o privilégio central de estar incluído no chamado Rank Principesco era o direito a voto individual no Conselho de Príncipes da Assembléia Imperial. As Casas que possuíam voz individual neste conselho em 1582 foram chamadas Casas Principescas Antigas (Altfürstliche Häuser), totalizando vinte famílias (entre estas se encontravam os Hohenzollerns, como imediatos do Margraviato do Brandemburgo). Originalmente, o número de votos seculares individuais no Conselho de Príncipes não era fixo e dependia das divisões e heranças das famílias principescas. Em princípio, cada ramo possuía um voto individual. Quando era criado um novo ramo, porém, nem sempre era criado um novo voto. Inversamente, quando um ramo se extinguia, o voto deveria ser herdado por algum ramo remanescente, regra que não foi, porém, sempre respeitada. Em geral, votos de famílias extintas eram preservados e dados às famílias que herdavam o território correspondente. As Casas que receberam o direito a voto no Conselho de Príncipes ao longo dos séculos XVII e XVIII e entraram no Rank Principesco neste período são chamadas de Novas Casas Principescas (Neufürstliche Häuser). Como os títulos foram gradativamente sendo utilizados como instrumentos políticos, e não necessariamente como representação de domínios territoriais, algumas entre estas não possuíam sequer Territórios Imediatos no Império. 139 Os Condes eram governantes territoriais que possuíam o status de Estados Imperiais, mas não estavam incluídos no Rank Principesco e, portanto, não participavam da Assembléia Imperial. Finalmente, os governantes de Territórios Imediatos sem qualquer titulação eram denominados Lordes Nobres (Edlen Herren). As informações descritas acima estão resumidas na Figura 11. Governantes de Territórios Imediatos com direito à soberania “Alta Nobreza”: podiam ser Estados Imperiais “RANK” PRINCIPESCO Voto individual no Conselho de Príncipes da Assembléia Imperial e nas Assembléias Circulares NOBREZA GOVERNANTES TERRITORIAIS CONDES CAVALEIROS IMPERIAIS NOBREZA TERRITORIAL LORDES Participação apenas no Colegiado de Condes Imperiais do Conselho de Príncipes da Assembléia Imperial Sem voto nas Assembléias do Império FIGURA 11: ESTRUTURA GERAL DAS TITULAÇÕES NOBRES DO SACRO IMPÉRIO ROMANO 140 APÊNDICE 02: EVOLUÇÃO TERRITORIAL E DINÁSTICA HOHENZOLLERN ATÉ 16185 A chamada “Marca do Norte” ou “Velha Marca” (Nordmark ou Altmark), centro do futuro Margraviado do Brandemburgo, havia sido originalmente estabelecida como território germânico em 948 pelo Imperador Otto I. A posse de fato sobre a região, porém, seria perdida pelos próximos dois séculos para os povos eslavos; e o domínio germânico só seria consolidado (e eventualmente expandido para o leste) a partir de meados do século XII, seguindo o processo geral de “colonização alemã do leste” (Ostsiedlung)6. Os principais artífices deste processo para o caso da Marca foram os representantes da chamada Dinastia Ascaniana de Margraves, lá instalada em 1134 quando Alberto, o Urso, príncipe da Casa de Anhalt, recebe do Imperador a soberania sobre o território. Ao longo de seus dois séculos de possessão sobre o Brandemburgo, a Dinastia Ascaniana adquire territórios contíguos à Marca original, ultrapassando, inclusive, o Rio Oder em direção Leste; e o território recebe a denominação de Marca do Brandemburgo e, em 1230, o status de Eleitorado do Império. A Marca, por volta de meados do século XIV, já é constituída pela chamada “Marca do Meio” (entre os Rios Elba e Oder, e onde se localizava o centro da Dinastia), a “Velha Marca”, a oeste do Elba, e a “Nova Marca”, do Oder até as margens do Vístula7. Após a extinção da Dinastia Ascaniana em 1319, o território passa à soberania dos Wittelsbach, tradicional casa Dinástica do Império, e posteriormente é vendido ao Imperador Luxemburguês Carlos IV. Neste período, grande parte dos avanços territoriais empreendidos pela Dinastia Ascaniana no que diz respeito à colonização germânica é perdida à Pomerânia, mas especialmente à Polônia, em função de constantes trocas de soberania e do aparente desinteresse político, especialmente dos luxemburgueses, no território8. 5 A evolução dinástica dos Hohenzollern pode ser encontrada com detalhes em CARLYLE (1858); para a história da Prússia e do Brandemburgo neste período, ver CARSTEN (1954); e HAFFNER (1998); 6 “Entre o século XII e o século XIII, até mesmo no século XIV, os colonos da Germânia em sentido lato (...) instalaram-se a leste do Elba, graças a complacências políticas e sociais, e a violência também. (...) Trata-se de um movimento imenso. Mas esta colonização faz-se no interior de um povoamento eslavo já instalado, numa rede mais ou menos cerrada, chamada a resistir aos recém-chegados, a fechar-se por necessidade sobre eles.” (BRAUDEL, 1995, pp. 84-85); para o fenômeno, ver ainda HAFFNER (1998); e CARSTEN, (1954); 7 Por volta de meados do século XVII, porém, a Marca estava dividida, para efeitos administrativos, em três regiões, ou províncias, o Altmark, o Mittelmark (a cuja porção norte chamava-se Uckermark) e o Neumark; 8 “The decline of the march began after the extinction of the Ascanian dynasty in 1319, when Louis of Bavaria sought to obtain the province for the Wittelsbachs. The subsequent contests for possession and the concessions 141 No início do século XV, em 1412, o então Imperador Luxemburguês Segismundo transplantou a Dinastia Hohenzollern para o Brandemburgo, como recompensa pelo apoio a sua candidatura9 imperial, e o então Burgrave de Nuremberg, Frederico VI Hohenzollern, recebe o título de Statthalter (Vice-Regente) do território (apenas em 1417 Frederico passaria a ser um dos Eleitores do Império). Data, portanto, do início do século XV a conexão entre o futuro território da Alemanha e a família Hohenzollern10. Por outro lado, a primeira documentação histórica referente aos “Zollerns”, do ano de 1061 (FAY, 1964, p. 6), localiza a residência original da família na porção sudoeste do Império, na região conhecida por Suábia11. Por volta de 1170, um membro da família, Conrado de Hohenzollern, teria deixado a região para lutar ao lado do Imperador Frederico Barbaroxa, recebendo, como recompensa, o título de Burgrave12 de Nuremberg, cidade situada na Região da Francônia. Como a titulação não estava associada à posse de terras, Conrado e seus descendentes lentamente adquiriram, através de compras, casamentos ou conquistas, domínios nas cidades de Ansbach e Bayreuth (ou no território conjunto denominado Culmbach) e em torno delas. É nesta região, portanto, que as fontes históricas localizam a “origem” da Dinastia, sem quaisquer conexões com o Brandemburgo ou com qualquer uma de suas possessões em 1648. Antes da Guerra dos Trinta Anos, as formas mais comuns de expansão e aquisição de novos territórios pelas Casas Dinásticas do Sacro Império Romano eram os casamentos e os acordos dinásticos13. As polêmicas e disputas entre as princpais Casas, neste contexto, em geral eram made to secure support inevitably played into the hands of the aristocracy, whose power reached its peak under Sigismund's absentee rule.“ (BARRACLOUGH, 1946, p. 357, nota 2); 9 Existem versões conflitantes com respeito às razões da investidura; CARLYLE, biógrafo de Frederico II, por exemplo, atribui a ação do Imperador ao pagamento de dívidas por ele adquiridas com a Dinastia (1858, cap. 1); BARRACLOUGH (1946, p. 358), por exemplo, afirma a respeito: “Engrossed in the problems of Bohemia and Hungary, in dire need of money and allies, and in despair of governing the land, which had become more of a liability than an asset, Sigismund made Frederick of Hohenzollern, burgrave of Nürnberg, his lieutenant in the march of Brandenburg and later, in 1415, created him Elector in reward for his services.” 10 “The original march of Brandenburg was merely created to protect the bishoprics of Magdeburg, Brandenburg and Havelberg. It was remote from the centres of international affairs and the great trade-routes; it lacked metal mines, salt-pits and timber; its sandy soil was unsuited for intensive agriculture and for horticulture. The twin-town of Cölln-Berlin, its capital, was amongst the least important Hanse towns; the University of Frankfurt-on-the-Oder, founded in 1506, contributed little to science and learning.” (STEINBERG, 1945, p. 129); 11 Algumas regiões do Império receberam nomes associados às tribos germânicas que lá habitavam “originalmente”, como é o caso da Suábia e da Francônia, e de outras, como a Turíngia, a Bavária e a Saxônia; 12 A denominação de Burgraviato (ou Burgraviado) e de Burgraves associava-se essencialmente às cidades do Império (Burgraf = Burg + Graf = “Conde do Burgo”); 13 Falando a respeito dos Hohenzollern neste período, HAFFNER comenta que: “They were average German territorial princes, no better no worse than many who are now forgotten, and they pursued the same busy and 142 resolvidas pelo Conselho de Eleitores ou diretamente pelo Imperador, dependendo da força dos últimos vis-à-vis o primeiro. Duas questões em particular frequentemente eram trazidas às discussões do Conselho: a possibilidade de herança de territórios por mulheres e a divisão destes entre herdeiros masculinos. Dependendo da instituição ou não, para os territórios de cada Dinastia, das chamadas Leis Sálica e de Primogenitura, uma mesma Dinastia podia possuir (e frequentemente possuía) mais de uma Linhagem, associadas à possessão de diferentes territórios. Quando os Hohenzollern herdam a Marca Eleitoral do Brandemburgo em 1415, a Dinastia apresentava apenas uma Linhagem. Porém, dado que possuía territórios tão dispersos quanto Ansbach, Bayreuth e Nuremberg, na Francônia, e o Brandemburgo, alguns anos depois ela seria dividida. O primeiro e o segundo Eleitores Hohenzollern, Frederico I e Frederico II, acumularam todas as titulações associadas à Dinastia. Após a morte de Albert Achilles, Terceiro Eleitor do Brandemburgo, a Dinastia foi contudo dividida em duas linhagens. O Sistema de Primogenitura havia sido aprovado pelo Imperador à época de Albert Achilles, em 1473, através de um dispositivo conhecido como Dispositio Achillea. Os territórios da Dinastia só poderiam a partir de então serem divididos em três partes, ou seja, o Brandemburgo, Ansbach e Bayreuth, cada qual devendo seguir individualmente o Sistema de Primogenitura. Com a morte de Alberto Achilles, portanto, em 1486, a Dinastia é dividida em duas Linhagens: a Linhagem Culmbach, associada aos territórios da Francônia, e a Linhagem do Brandemburgo, associada à Marca. O ramo Culmbach assim iniciado, conhecido futuramente como “Velha” Linhagem Hohenzollern-Cumlbach, se extinguiria apenas em 1618, ocasião em que seus domínios retornariam à Linhagem do Brandemburgo. Porém, o Dispositio não evitou que mesmo o território do Brandemburgo fosse dividido, pois o Sistema de Primogenitura só se aplicava ao território eleitoral, ou seja, à Kurmark. Com a intenção de garantir que, no caso de extinção da Linhagem Culmbach, seus territórios passariam à do Brandemburgo, Johann George, Sétimo Eleitor, estabeleceu em 1598 um acordo de Mitbelehnung com o Imperador, conhecido como Gera Bond. Pelo acordo, todos os domínios Hohenzollern, com exceção dos territórios de Ansbach e Bayreuth, seriam a partir petty family politics as the rest of them: a policy of marriage and inheritance aimed at the acquisition of ‘claims’ and the gathering into family ownership of as many territories as possible.” (HAFFNER, 1998, p. 15); 143 de então indivisíveis, ou seja, deveriam, em caso de extinção de um ramo, ser repassados ao outro. O objetivo central do Eleitor, com o acordo, era o de garantir aos Hohenzollern do Brandemburgo a herança da Prússia Oriental, sob posse dos Hohenzollern-Culmbach, Linhagem em vias de se extinguir Originalmente, “prussianos” era a denominação utilizada para designar uma das muitas tribos de origem báltica que ocupavam a porção norte da Europa Oriental na Idade Média, situada em torno das margens do Lago Vístula, próximo ao litoral do Mar Báltico, que teria ali se estabelecido desde o século V a.c.. Formavam um grupo étnico distinto dos Germanos e dos Eslavos, falando uma variedade de línguas pertencentes ao ramo ocidental da família de línguas bálticas, denominado posteriormente “velho prussiano”14. A primeira menção em fontes históricas a esta designação aparece em conexão com o nome de Adalberto de Praga, em 997, para lá enviado como missionário em uma Cruzada de cristianização. Só no século XIII, porém, a tribo seria cristianizada, não sem resistência e violência, pela Ordem dos Cavaleiros Teutônicos, convocados para a missão pelo Papa Honório III, em 1217. A Ordem lá se estabeleceu, adotando a designação de “Prússia”, e formou um Estado eclesiástico pertencente ao Sacro Império Romano, bastante próspero, segundo as fontes, ao longo de todo o século XIV15. O envolvimento do Estado em uma série de guerras com os Reinos da Polônia e da Lituânia ao longo do século XV, porém, assinala sua decadência, e, em 1466, pelo Segundo Tratado de Thorn, a Ordem perde sua independência para a Polônia e o Estado se retira do Império. A porção oeste da “Prússia” (em relação ao traçado do Vístula) é diretamente ocupada pelos poloneses, e denominada desde então “Prússia Real”, e a porção Leste permanece ocupada pela Ordem, porém como feudo da Polônia. Desde então, a Ordem sucessivamente tentou evitar a homenagem ao Rei polonês. Em 1511, Albert de Hohenzollern-Culmbach, um dos filhos do Margrave de Ansbach-Bayreuth, é escolhido pelo Imperador Maximiliano como Grão Mestre da Ordem Teutônica e, portanto, senhor territorial da chamada “Prússia Leste”. A escolha do Imperador parece ter sido orientada precisamente pela intenção de contrabalançar a influência polaca ou, até mesmo, 14 A língua teria morrido definitivamente em 1667; vale notar, apenas a título de registro, que existem diversas divergências em torno da origem e das características destes povos, especialmente entre os historiadores alemães, poloneses e lituanos; 144 obter a independência do território: Albert parte para a Prússia com a promessa de não render homenagem a seu tio, o Rei da Polônia. Após 14 anos de disputas em torno da questão, que incluíram conflitos armados, Alberto, seu tio e os cavaleiros da Ordem chegam em 1525 a um acordo, supostamente agenciado por Lutero. O Grão Mestre introduziu a Reforma na Prússia, dissolvendo o Estado eclesiástico da Ordem Teutônica, e se fez Duque hereditário, estabelecendo a capital do ducado em Königsberg. Passam a existir, portanto, a “Prússia Real” (futura Prússia Oeste em 1772, com a Primeira Partição da Polônia), domínio territorial direto do Rei da Polônia; e a “Prússia Ducal” (futura Prússia Leste), ou o Ducado da Prússia, feudo da Polônia, sob governo, portanto, de um Hohenzollern da Linhagem Culmbach. Paralelamente, aproveitando-se das dificuldades financeiras enfrentadas pela Ordem, Frederico II, Eleitor Hohenzollern do Brandemburgo, recuperou para a Dinastia o território conhecido como “Nova Marca”, antes vendido à Ordem Teutônica e então recomprado pelo Eleitor em 1455. Com a intenção de garantir a herança da Prússia pelos Hohenzollern, o Oitavo Eleitor, Joachim Friedrich, não apenas se casa com uma das filhas do então Duque da Prússia, mas faz o mesmo com seu herdeiro, futuro Nono Eleitor, Johann Sigismund. Ao se extinguir, portanto, em 1618, a “velha” Linhagem Hohenzollern-Culmbach, a Linhagem do Brandemburgo recebe, como herança, a Prússia Ducal. Os ganhos associados à extinção da Linhagem Culmbach, porém, não se restringiram apenas à Prússia. Pois Albert Friedrich, último representante da “Velha” Linhagem, casa-se com a filha mais velha do Duque de Cléves, cujos domínios, além do Ducado de Cléves, consistiam de Julich, Berg, Ravenstein, Ravenserg e Mark. Com a morte do único herdeiro masculino do Ducado em 1609 (sua irmã, esposa de Albert Frederico da Prússia, já havia morrido em 1608), o Nono Eleitor, em nome da Prússia, reclama a suposta herança sobre os territórios. A questão, porém, só seria decidida, como visto, em 1666, pois outras irmãs, especialmente a Duquesa do Palatinado Superior (Pfalz-Neueberg), também reclamam a herança. Com o fim da Guerra dos Trinta Anos, o Tratado de Westphalia atribuiu como “compensações” à Dinastia, especialmente por “perder” à Suécia a parte Posterior da 15 É deste século, por exemplo, o florescimento de diversas cidades da Prússia, como Danzig e Königsberg, através, especialmente, de suas ligações comerciais via Mar Báltico e seu envolvimento com a Liga Hanseática; 145 Pomerânia, a Pomerânia Anterior e os Principados secularizados de Halberstadt e Minden, e confirmou sua possessão sobre o Ducado da Prússia, ainda como feudo da Polônia. O Tratado de Westphalia determinou finalmente que o Ducado secularizado de Magdeburgo, governado pelo Duque da Saxônia, deveria ser repassado aos Hohenzollern após sua morte, que ocorre em 1680. Finalmente, em 1618, com a extinção da Velha Linhagem Culmbach, os tios do então Nono Eleitor Hohenzollern do Brandemburgo iniciam a Nova Linhagem Culmbach, associada aos territórios Hohenzollern da Francônia, só extinta em 1806. A evolução dinástica dos Hohenzollern entre 1415 e 1618 pode ser visualizada na Figura 12 abaixo. FREDERICO I ELEITOR – 1415:1440 Margrave de Ansbach-Bayreuth (1372-1440) JOHANNES (1401-1464) FRIEDRICH (1460-1536) JOACHIM I V ELEITOR: 1499 (1484-1535) Acordo de MITBELEHNUNG – GERA BOND – 1598 CHRISTIAN (1581-1655) FREDERICO II II ELEITOR: 1440 (1413-1471) ALBERT ACHILLES (1414-1486) III ELEITOR: 1471 JOHANN CICERO IV ELEITOR: 1486 (1455-1499) Acordo de ERBVERBRUDERUNG com o Ducado de Leignitz – 1537 Dispositio Achillea – 1473 JOACHIM ERNST (1583-1625) “Nova” Linhagem HohenzollernCulmbach, extinta em 1806 Início da “Velha” Linhagem HohenzollernCulmbach Grão-Mestre da Ordem Teutônica – 1511 Duque da Prússia – 1525 ALBERT (1490-1568) JOACHIM II HECTOR VI ELEITOR: 1535 (1505-1571) Recuperação, por compra, do Neumark – 1456 ALBERT FRIEDRICH (1553-1618) Extinção da “Velha” Linhagem HohenzollernCulmbach – 1618 JOHANN GEORGE VII ELEITOR: 1571 (1525-1598) JOACHIM FRIEDRICH VIII ELEITOR: 1598 (1547-1608) Duque da Prússia – 1618 JOHANN SIGISMUND IX ELEITOR: 1608 (1572 – 1619) FIGURA 12: EVOLUÇÃO DINÁSTICA HOHENZOLLERN: 1415-1618 146 APÊNDICE 03: GOVERNANTES HOHENZOLLERN: 1618-1918 ELEITORES DO BRANDEMBURGO • George Guilherme (1619-1640): Décimo Eleitor • Frederico Guilherme I, Grande Eleitor (1640-1688): Décimo Primeiro Eleitor • Frederico III (1688-1701): Décimo Segundo Eleitor REIS DA PRÚSSIA • Frederico I (1701-1713) • Frederico Guilherme I, o Rei Soldado (1713-1740) • Frederico II, o Grande (1740-1786) • Frederico Guilherme II (1786-1797) • Frederico Guilherme III (1797-1840) • Frederico Guilherme IV (1840-1861) • Guilherme I (1861-1888) • Frederico III (1888) • Guilherme II (1888-1918) 147 APÊNDICE 04: METODOLOGIA DE ELABORAÇÃO DAS FIGURAS As Figuras Esquemáticas apresentadas nessa pesquisa, na forma de Mapas, foram elaboradas como compilações de Mapas Históricos disponibilizados em sites de pesquisa na Internet. A principal fonte utilizada foi o Kartenserver do Institut Für Europäische Geschichte Mainz – IEG (www.ieg-mainz.de), disponibilizado em seu site na Internet (www.ieg-maps.unimainz.de). A partir de um de seus Mapas Históricos, escolhido aleatoriamente, os contornos da Europa central foram digitalizados utilizando o programa CorelDRAW 12 for Windows, bem como a localização das principais cidades e rios do Continente, como apresentado abaixo. As Figuras foram então elaboradas através da sobreposição da Figura Primária sobre os Mapas Históricos obtidos na Internet, e a posterior digitalização das informações desejadas, utilizando o programa CorelDRAW 12 for Windows. Como fontes, além dos Mapas do IEG, foram utilizados: • a série de Mapas do WHKMLA (World History at Korean Minjok Leadership Academy) Historical Atlas, disponibilizados no site www.zum.de/whkmla/histatlas); • a série de Mapas Históricos organizados pelo Germany GenWeb Project, disponibilizados no site www.rootsweb.com/~wggermn/; • a coleção de mapas da EURATLAS – Periodical Historical Atlas of Europe, disponibilizada no site www.euratlas.com; • a coleção de mapas da Perry-Castañeda Library da University of Texas at Austin, disponibilizada no site www.lib.utexas.edu/maps/; • a série de mapas organizada pela Rundfunk Berlin-Brandenburg, na ocasião da elaboração do Preussen Chkronik – Eines Deutschen Staates (programa de comemoração dos 300 anos da Prússia), disponibilizada no site www.preussenchronik.de; Foram utilizados, ainda, como fontes de informações adicionais: • os mapas do Diercke Schulatlas für Höhere Lehranstalten (DIERCKE, 1928); 148 • os mapas do Penguin Atlas of World History, vols. I e II (HILGEMANN, W.; KINDER, H., 1974 e 1978). Figura Primária: Königsberg Danzig Stettin Oldenburgo Thorn Hanover Minden Berlim Brunswick Magdeburgo r de O Dresden