gestão e conservação de rios urbanos utilizando vegetação riparia

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REB Volume 7 (4): 371-386, 2014
ISSN 1983-7682
GESTÃO E CONSERVAÇÃO DE RIOS URBANOS UTILIZANDO
VEGETAÇÃO RIPARIA TENDO EM VISTA SUA INSERÇÃO EM PROJETOS
DE ENGENHARIA DE REQUALIFICAÇÃO DE RIOS URBANAS: UM CASO
DE ESTUDO NA RIBEIRA DA LAGE OEIRAS – PORTUGAL.
MANAGEMENT AND CONSERVATION OF URBAN RIVERS USING
RIPARIAN VEGETATION DUE TO ITS INCLUSION IN ENGINEERING
PROJECTS OF REHABILITATION OF URBAN RIVERS: A CASE STUDY IN
RIBEIRA DA LAGE OEIRAS - PORTUGAL.
Terencio Aguiar Junior
Biólogo, Mestre em Gestão e Conservação de Recursos Naturais e Doutorando em
River Restoration and Management, Universidade da California, Bolsista FCT. Contato:
[email protected]
RESUMO
As numerosas funções físicas, biológicas e ecológicas atribuídas às galerias ribeirinhas
salientam o papel fundamental que desempenham no ecossistema fluvial. O
conhecimento da sua estrutura e composição em situação de referência e a
caracterização da situação atual, é uma vertente da avaliação do estado de conservação
de um sistema fluvial. Este conhecimento permite o desenvolvimento fundamentado de
ações de conservação e requalificação no espaço ribeirinho. Esse trabalho tem como
objetivo desenvolver um plano de avaliação da qualidade biótica da vegetação ripária,
tendo em vista sua inserção em projetos de engenharia de requalificação de rios
urbanos. Concluímos que a utilização dos serviços prestados pela vegetação riparia é de
suma importância para o ecossistema fluvial e sua incorporação em projetos de
engenharia de restauro de rios urbanos e de elevada importância para manutenção desse
ecossistema.
372
Palavras-chave: restauro fluvial; vegetação riparia; engenharia urbana; rios.
ABSTRACT
The numerous physical functions, biological and ecological assigned to riverine
galleries reinforce the key role they play in the river ecosystem. The knowledge of its
structure and composition and baseline characterization of the current situation, it is an
aspect of the assessment of the conservation status of a river system. This knowledge
allows the development of reasoned action conservation and restoration in the riverside
area. This study aims to develop a plan for assessing the quality of biotic riparian
vegetation, given its inclusion on engineering projects of rehabilitation of urban rivers.
We conclude that the use of services provided by riparian vegetation is very important
for the river ecosystem and its incorporation in engineering projects for the restoration
of urban rivers and of high importance to maintaining this ecosystem.
Keywords: river restoration; riparian vegetation; urban engineering; river.
INTRODUÇÃO
As numerosas funções físicas, biológicas e ecológicas atribuídas às galerias
ribeirinhas salientam o papel fundamental que desempenham no ecossistema fluvial
(Cummins et al, 1984). O conhecimento da estrutura e composição florística da
vegetação ripária, é um instrumento essencial quando se pensa em ações de restauro ou
reabilitação de ecossistemas fluviais.
As zonas ripárias são definidas como uma área de interconexão entre o
ecossistema terrestre e o ecossistema aquático. As suas fronteiras estendem-se,
lateralmente, até à zona histórica de limite de cheia, e verticalmente, até ao topo das
copas das árvores (Gregory et al, 1991). Não obstante, para efeitos de gestão, é
frequentemente utilizado o limite lateral coincidente com o leito menor, correspondente
ao limite das cheias anuais médias.
A vegetação ripária é vital para a manutenção da integridade do ecossistema
fluvial (Hancock & Froend, 1996; Roth et al, 1996). O conhecimento da sua estrutura e
composição em situação de referência e a caracterização da situação atual, é uma
vertente da avaliação do estado de conservação de um sistema fluvial. Este
373
conhecimento permite o desenvolvimento fundamentado de ações de conservação e
requalificação no espaço ribeirinho.
Entende-se por avaliação da estrutura da vegetação ripária, a caracterização das
sequências de vegetação ripária entre as cabeceiras e a foz, a descrição da continuidade
longitudinal da vegetação lenhosa, a definição da estrutura interna da vegetação
entendida como o mosaico de espécies e número de estratos de vegetação ripária
(herbáceo, arbustivo e arbóreo), bem como a proporção relativa dos vários estratos e
composição florística da vegetação (Tanágo e Jalón, 2006).
Apesar da importância para a preservação do meio ambiente e da biodiversidade,
muitos trabalhos têm demonstrado um alto índice de devastação das zonas riparias.
Aguiar (2010) cita entre as principais causas para a degradação das matas ciliares, o
desmatamento para expansão de áreas agrícolas e urbanas, os incêndios e a extração de
areia nas áreas ribeirinhas e cita entre outras consequências do mesmo, as frequentes
inundações verificadas no conselho de Oeiras pelo transbordamento da ribeira da Laje.
Nas visitas técnicas na ribeira da Laje, foi observadas áreas de lavoura chegando
até as margens da ribeira com ausência total de área de preservação e muitas vezes
apresentando características de degradação avançada por processos erosivos e longos
trechos cobertos por canas (Arundo sp).
Nas observações preliminares realizadas na ribeira demonstram a importância da
adoção de medidas urgentes que visem a contenção do processo de degradação, a
recuperação das áreas degradadas e a preservação das áreas ainda não degradadas com o
objetivo de preservar as fontes naturais de água e a biodiversidade.
OBJETIVO
Esse trabalho tem como objetivo principal a avaliação da qualidade biótica da
vegetação ripária, analisando os diferentes graus de conservação e naturalidade de uma
ribeira, tendo em vista sua inserção em projetos de engenharia de requalificação de rios
urbanos.
374
MÉTODOS
Para a avaliação da qualidade biológica da vegetação riparia foi utilizado o
índice QBR (Riparian habitat quality), Este índice vem sendo usado na Europa a mais
de 18 anos e tem como principal função avaliar a qualidade do bosque de ribeira
(Munne et al., 1998 e 2003).
É um índice de fácil e rápida utilização. Utilizam-se parâmetros relativos à
cobertura riparia e vegetal, e ao grau de naturalidade do canal. As características
ecológicas e geomorfológicas são expressas quantitativamente, traduzindo uma classe
de qualidade, adicionalmente foi realizada análise visual, cartográfica e de fotografia
aérea para avaliação da morfologia da ribeira.
Foi também utilizado dados da qualidade da água utilizando os dados do Sistema
Nacional de informações de recursos hídricos (SNIRH) e dados fornecidos pela empresa
de Saneamento da Costa do Estoril, S.A. (SANEST).
DISCUSSÃO
Avaliação da mata ripária
O trabalho de campo foi desenvolvido nos dias 25 e 28 de maio onde foi
aplicado o índice QBR em 28 pontos (figura 1), a avaliação geral do índice variou entre
“Início de uma importante alteração, qualidade aceitável” e “Degradação extrema,
péssima
qualidade”
conforme
tabela 1.
Figura 1. Pontos de aplicação do índice QBR.
a
375
Os principais parâmetros responsáveis pela avaliação foram à baixa percentagem
da cobertura vegetal da zona ribeirinha, falta de conectividade entre o bosque ribeirinho
e a baixa qualidade da cobertura vegetal.
Além desses parâmetros a grande presença de espécies exóticas, estruturas
hidráulicas no leito do rio, lixo, zonas com elevado impacto da ocupação irregular e
presença de agricultura contribuem não só para uma má qualidade da vegetação
ribeirinha mais também para uma má qualidade da água (figura 2).
Figura 2. Grande presença de cana em substituição da galeria ripícola (esquerda),
trecho do rio canalizado (direita).
Para além do seu valor estético, as vegetações ciliares tem uma elevada
importância ecológica devido a sua atuação como um poderoso filtro biológico
impedindo que os fertilizantes, pesticidas e outros poluentes provenientes das
escorrências contaminem as linhas de água, as raízes das árvores e arbustos estabilizam
as margens das linhas de água evitando a sua erosão, devido ao efeito de
ensombramento regulam a temperatura da água e limitam a proliferação de algas
indesejáveis, reduzem a velocidade da corrente, diminuindo os efeitos negativos das
cheias, além de proporcionarem abrigo e alimento para a fauna terrestre e aquática,
promovendo assim o incremento da biodiversidade.
A componente herbácea sob coberto é pouco variada, albergando espécies com
baixo grau de associação ao meio aquático, desde espécies emergentes tolerantes à
oscilação do nível de água, como os juncos, junças e tabúas, até às espécies higrófitas,
376
espécies que têm como habitat preferencial locais com grande humidade, mas
estabelecidas geralmente em substratos não alagados e várias espécies de musgos,
hepáticas e pteridófitos. Uma característica deste tipo de sistemas é a penetração de
espécies terrestres, sendo frequente encontrar um elenco florístico terrestre superior ao
das espécies associadas ao meio aquático.
A perturbação e uso antropogénico dos sistemas fluviais, quer no leito, quer nas
margens ou nas zonas envolventes é uma constante no local de estudo. Essa constante
reflete-se numa homogeneização florística e na intrusão de espécies ruderais (i.e.
próprias de sítios artificializados, como margens de caminhos), espécies adventícias
(fugidas de culturas) e nitrófilas (estabelecem-se preferencialmente em habitats ricos em
nutrientes), em relação a espécies aquáticas presenciamos no troço uma grande presença
de vegetação no leito do rio, possivelmente gerada por excesso de nutrientes lixiviados
da agricultura nas margens.
Tabela 1. Resultados da análise do QBR e qualidade da água na ribeira da Laje.
Resultado QBR
Ponto de coleta
Qualidade da água
Presença
Humana
IV
1
AG / OH
/O
2
AG
IV
3
-
IV
4
O
IV
5
-
6
-
7
-
8
AG
/O
9
IV
IV
-
AG /O
10
AG /O
11
AG /O
12
AG /O
/OH
377
13
AG
14
/O
15
AG
IV
16
/O
IV
17
AG
18
/O
IV
19
-
AG
20
-
/O
21
-
AG
22
/O
23
AG
24
/O
25
AG
26
/O
27
AG
28
/O
/OH
/OH
/OH
/OH
/OH
/OH
/OH
/OH
* III - Início de uma importante alteração, qualidade aceitável, IV- Forte alteração, má
qualidade, V- Degradação extrema, péssima qualidade. AG- Agricultura, OH- Obras
Hidráulicas, O- Outros impactos humanos.
Análise da qualidade da água
A análise da qualidade da água na ribeira da Laje para os anos de 2000 de 2012
variou entre “Razoável” e “Muito má” (tabela 1 e 2).
Tabela 2. Parâmetros responsáveis pela classificação da qualidade da água.
Ano
Parâmetros responsáveis pela classificação
2000
Fosforo total, nitrogênio total, nitrogênio e coliformes totais
2001
Fosforo total, nitrogênio total e coliformes totais
2002
Fosforo total, nitrogênio total e coliformes totais
378
2003
Coliformes totais, coliformes fecais, e nitrogênio total
2004
Fosforo total, nitrogênio total e coliformes totais
2005
Nitrogênio total e coliformes totais
2006
Coliformes fecais, coliformes totais e nitrogênio total
2007
Coliformes fecais, coliformes totais e nitrogênio total
2008
Coliformes fecais, coliformes totais e nitrogênio total
2009
Coliformes fecais, coliformes totais e nitrogênio total
2010
Coliformes totais, coliformes fecais, fosforo total e nitrogênio
total
2011
Coliformes totais, coliformes fecais, fosforo total e nitrogênio
2012*
Coliformes totais, Fosforo total e nitrogênio total
* Dados referentes aos meses de janeiro a abril de 2012.
As águas da ribeira da Laje apresenta um alto índice de contaminação por
Coliformes totais e fecais além de fosforo (P) e nitrogênio (N), a presença de nutrientes
na água é parte dos ciclos normais da natureza e para a maioria dos nutrientes vegetais
não têm sido relatados problemas em relação a níveis excessivos. O problema de
contaminação fica restrito a alguns micronutrientes e, principalmente, ao nitrogênio (N)
e fósforo (P) que são adicionados pelo homem no ecossistema de forma indiscriminada.
Das diversas formas de nitrogênio presentes na natureza, à amônia (NH3) e, em
especial, o nitrato (NO3-) podem ser causas da perda de qualidade da água. Embora a
amônia, quando presente na água em altas concentrações, possa ser letal aos peixes pela
toxicidade que representa para esse grupo da fauna, a amônia originada no solo ou
aplicada via fertilizante tende a ser rapidamente convertida em amônio (NH4+) e esse,
por sua vez, é convertido em nitrato pelo processo microbiano da nitrificação.
Logo, o nitrato é a principal forma de nitrogênio associada à contaminação da
água pelas atividades agropecuárias. Isso ocorre pelo fato de que o ânion nitrato,
caracterizado por ser fracamente retido nas cargas positivas dos colóides, tende a
permanecer mais em solução, principalmente, nas camadas superficiais do solo, nas
quais a matéria orgânica acentua o caráter eletronegativo da fase sólida (repelindo o
nitrato), e os fosfatos aplicados na adubação ocupam as cargas positivas disponíveis. Na
379
solução do solo, o nitrato fica muito propenso ao processo de lixiviação e ao longo do
tempo pode haver considerável incremento nos teores de nitrato nas águas subterrâneas.
Merece destaque o fato de que a elevação dos teores de nitrato na água é
indicativo de risco potencial para a presença de outras substâncias indesejáveis, tais
como muitas moléculas sintéticas de defensivos agrícolas que possivelmente
comportam-se de forma análoga ao nitrato (Nugent et al., 2001; Aguiar, 2010).
A retirada da vegetação natural da bacia para ocupação por agricultura, mesmo
que seja em pequena escala representa, usualmente, uma etapa intermediária no
processo de deterioração de um corpo d’água. Os vegetais plantados pelos agricultores
na ribeira são retirados para consumo humano, muito possivelmente fora da própria
ribeira da Laje. Com isto, há uma retirada, não compensada naturalmente, de nutrientes,
causando uma quebra no ciclo interno dos mesmos. Para compensar esta retirada, e para
tornar a agricultura mais intensiva, os agricultores da Laje fazem uso de fertilizantes,
isto é, produtos com elevados teores de nutrientes como o nitrogênio e fósforo. Os
agricultores, visando garantir uma produção elevada, adicionam quantidades elevadas
de N e P, frequentemente superiores à própria capacidade de assimilação dos vegetais.
A substituição das matas por vegetais agricultáveis pode causar também uma
redução da capacidade de infiltração no solo. Assim, os nutrientes, já adicionados em
excesso, tendem a escoar superficialmente pelo terreno, até atingir, eventualmente, o
leito do rio conforme figura 3.
Figura 3. Exemplo de processo de lixiviação ocorrido devido a adição de nutrientes
na ribeira da Laje (Nugent et al., 2001).
380
O aumento do teor de nutrientes no corpo d’água causa um certo aumento do
número de algas e, em consequência, dos outros organismos, situados em degraus
superiores da cadeia alimentar, culminando com os peixes. Esta elevação relativa da
produtividade primaria do corpo d’água pode ser até bem-vinda, dependendo dos usos
previstos para o mesmo. O balanço entre os aspectos positivos e negativos
(eutrofização) dependerá, em grande parte, da capacidade de assimilação de nutrientes
pela ribeira.
A respeito dos coliformes o índice na ribeira da Laje também indica um alto
problema não só para o ecossistema, mais também para saúde humana, tendo em vista
que os agricultores utilizam a água da ribeira como principal fonte de irrigação para
suas plantações, contaminando os alimentos produzidos com agentes biológicos, estes
agentes são principalmente bactérias e outros vermes parasitas que estavam nas fezes e
sobrevivem na água à espera de um novo indivíduo para parasitar e se multiplicar.
Diversas doenças podem ser causadas por estes indivíduos, principalmente as infecções
gastrointestinais.
Na análise dos parâmetros físicos da água foi registrado uma diferença de
temperatura entre os pontos com qualidade riparia boa, péssima e aquelas com
agricultura. A presença ou não da vegetação ripária esta associada ao aumento ou
diminuição da temperatura da água superficial da ribeira conforme figuras 4 e 5. A
manutenção da vegetação ciliar é a maneira mais efetiva de prevenir aumentos da
temperatura da água, conforme relatado em vários estudos (Swift e Messer, 1971;
Corbett e Spencer, 1975; Sugimoto et al., 1997). Na maioria dos pontos da ribeira da
Laje a mata ripária é incipiente, estando limitada a pequenos fragmentos localizados
junto às nascentes. Os cursos d’água encontram-se quase que totalmente expostos à
radiação solar direta. Consequentemente, as temperaturas são mais elevadas que nas
regiões com vegetação ripícola preservada.
381
Figura 4. Valores de máximas mensais registradas em zonas com má e razoável
qualidade de cobertura ciliar de acordo com o índice QBR, na ribeira da Laje de abril de
2011 a abril de 2012.
Figura 5. Valores de mínimas mensais registradas em zonas com má e razoável
qualidade de cobertura ciliar de acordo com o índice QBR, na ribeira da Laje de abril de
2011 a abril de 2012.
Há que se considerar ainda, que o represamento existente em dois trechos da
ribeira é outro fator que pode contribui para a elevação das temperaturas da água na
382
ribeira da Laje. A modificação da correnteza, que se torna mais lenta, cria massas de
água com temperaturas das camadas superficiais mais elevadas do que a temperatura
média da água da ribeira (Branco e Rocha, 1977). A temperatura da água regula o
metabolismo basal dos peixes e influencia o crescimento e a reprodução de
macroinvertebrados e vegetação aquática. A taxa de crescimento está positivamente
correlacionada com o acréscimo da temperatura, desde que o óptimo térmico não seja
excedido e não existam outros fatores limitantes. Em relação à reprodução, a
temperatura tem forte influencia nesse processo provocando modificações na duração
dos períodos de desenvolvimento embrionário, incubação e crescimento dos alevinos.
Métodos de mitigação dos impactos
A avaliação do QBR caracteriza o local de estudo como “Degradação extrema,
péssima qualidade”. Os principais problemas a serem trabalhados no local é a melhoria
da dimensão das margens onde poderia se criar uma zona de amortecimento para os
nutrientes lixiviados das zonas agrícolas (figura 6) a retirada de espécies exóticas como
o arundos, Populus deltoides e Populus canadenses que contamina geneticamente as
choperas e favorecer o plantio de espécies nativas que se encontra em perigo de
extinção, segundo Tanágo e Jalón (2008), o plantio de espécies nativas em substituição
de espécies exóticas nos troços modificados melhora não só a estética mais também a
qualidade da água, da morfologia do canal e as condições das margens que pode ainda
ser melhoradas com a retirada dos diques laterais e obras hidráulicas que quebra a
conectividade lateral, vertical e longitudinal da Laje conforme figura7.
383
Figura 6. Imagem demonstrando o funcionamento de uma zona de amortecimento para
fertilizantes utilizado em agricultura (Tanágo e Jalón, 2008).
Figura 7. Imagem do trecho do rio antes e depois da remoção do dique lateral que
confina o rio, seguido por plantio de espécies nativas.
A canalização de rios além de destruir a vegetação ciliar contribui para o
aumento do risco de cheias, nos modelos hidráulicos utilizados nos projetos se tomam
como hipóteses condições do canal que são muito difíceis de manter com o tempo. Em
geral pode se considerar que as canalizações reduzem a frequência das inundações
previsíveis correspondente a períodos de retorno mais curtos, porém não modifica a
frequência das inundações devido a aumentos esporádicos, que são os de maior
magnitude e causam maiores danos (figura 7).
Qualidade da água
Para melhoria da qualidade da água, além das recomendações acima
recomendamos também a retirada de pontos de emissão de esgotos clandestinos e
aumento da fiscalização, durante o período analisado, foram verificadas manilhas de
esgotos explodidas, com seu transbordo dirigido para o leito do rio, o que configura
uma possível fonte de coliformes fecais para a ribeira. Dessa forma, faz-se necessária a
limpeza periódica das tubulações de esgoto para evitar o entupimento. Verificou-se que
os agricultores utilizam fezes de coelho, cavalo entre outros como fonte de adubo
orgânico. Esse material é utilizado in natura, ou seja, sem sofrer um processo de
compostagem o que transforma em uma possível fonte de coliformes fecais e ureia para
o rio aumentando assim, a carga de poluição.
384
Também foi verificado o uso excessivo de fertilizantes e agrotóxicos, por parte
dos agricultores. Como a utilização indiscriminada destes produtos pode causar
eutrofização, além do aparecimento de espécies resistentes, torna-se necessária a
utilização de instrumentos de educação ambiental e boas praticas de agricultura
sustentável, como cursos e distribuição de material educacional, como forma de instruir
os agricultores a respeito de práticas de cultivos sustentáveis e ecologicamente corretas.
CONCLUSÕES
As galerias mediterrânicas têm uma importância desproporcionada em relação à
pequena área que ocupam, sendo essencial a sua conservação, gestão ou
requalificação/restauro. A proteção e conservação são processos preferíveis à
requalificação dos sistemas fluviais, mas nem sempre é possível reformular ações de
proteção e gestão sustentável em sistemas com grandes desvios ecológicos dos sistemas
naturais. O restauro destes ecossistemas é um processo complexo e dinâmico, que
envolve a integração e conhecimento de um vasto conjunto de processos hidrológicos,
geomorfológicos, edáficos, microclimáticos e biológicos.
O conhecimento dos padrões de composição e estrutura das galerias ribeirinhas
assume um papel primário no restauro das formações lenhosas ribeirinhas, a par da
avaliação e monitorização da qualidade ecológica dos sistemas fluviais. Na ribeira da
Laje não é raro observar espécies exóticas e agricultura ao longo de toda a ribeira, no
sentido de “recuperar” a vegetação, ou a introdução de espécies sem atender às suas
preferências habitacionais, edafo-climáticas e aos padrões biogeográficos. Por outro
lado, a requalificação não pode ter o objetivo insensato de retorno à situação pristina,
impraticável e insustentável do ponto de vista científico, económico e ecológico. O
ecossistema ripário restaurado de forma adequada deve possuir capacidade de auto
sustentabilidade estrutural e funcional, e demonstrar resiliência à variabilidade natural,
além de garantir a ligação entre os ecossistemas aquático e terrestre e a manutenção das
funções, serviços e atributos que desempenharia em condições ditas naturais.
A Diretiva Quadro da Água da União Europeia (DQA; 2000/60/EC) compõe de
momento, a principal ferramenta de política da comunidade Europeia relativa ao tema
água, estando já adaptada para a legislação portuguesa (Lei da Água, Lei nº 58/2005 de
385
29 de Dezembro, complementada pelo Dec. Lei nº 77/2006 de 30 de Março). A gestão e
recuperação de sistemas fluviais estão contempladas nas leis supracitadas, estando
prevista a recuperação e monitorização de sistemas fluviais degradados, de modo a
atingir uma boa qualidade ecológica até 2015. É de suma importância, uma tomada de
consciência por parte de gestores, técnicos, consultores, e decisores na aplicação dos
conhecimentos técnicos e científicos sobre os processos fluviais e a flora ribeirinha na
recuperação de ecossistemas degradados. Por outro lado, é necessário reconhecer que
cada ação de restauro tem um carácter único e integrador dos ecossistemas envolventes,
necessitando de uma gestão abrangente e dinâmica, devidamente regulada pela
monitorização da qualidade ecológica.
Dessa forma concluímos que a utilização dos serviços prestados pela vegetação
riparia é de suma importância para o ecossistema fluvial e sua incorporação em projetos
de engenharia de restauro de rios urbanos e de elevada importância para manutenção
desse ecossistema.
AGRADECIMENTOS
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
pela bolsa concedida.
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