Discurso do Presidente do Banco Central, Dr. Henrique Meirelles, na Cerimônia de Posse do Diretor Alexandre Schwartsman O Banco Central conclui hoje o processo de transição para sua nova diretoria. E o faz em um momento em que começam a se tornar mais visíveis os resultados positivos das medidas duras que fomos obrigados a adotar ao longo deste ano difícil. A inflação segue uma trajetória de convergência para as metas de longo prazo. O país venceu a crise e já se encontra na rota do crescimento. Os fundamentos da economia são sólidos. Pela primeira vez em décadas, o Brasil reúne as condições favoráveis para ingressar em um processo de crescimento sustentado, sem gerar desequilíbrios nas contas externas ou pressões inflacionárias. É do crescimento sustentado que nascerá o novo Brasil, com geração de empregos e inclusão social. Cerimônias de posse fazem parte daqueles momentos “entre o passado e o futuro” de que nos falava Hannah Arendt, propícios a balanços e esperança. Balanço do que foi feito no passado. Esperança quanto ao que resta a fazer no futuro. Processos de sucessão de altíssimo nível facilitam discursos de boas-vindas e despedidas. As qualidades dos homenageados falam por si. De Beny, sempre lembraremos aqui a competência, a correção, o profissionalismo e o temperamento entusiasmado que marcaram sua intensa dedicação à causa pública nos seus quase dois anos como diretor do Banco Central. Espero sinceramente, Beny, que você repita em suas futuras atividades o mesmo sucesso que teve até aqui. Muito obrigado. Alexandre reúne todas as credenciais – sólida formação acadêmica e larga experiência profissional – que o habilitarão a desempenhar com brilho e segurança o cargo que ora assume. Aqui a esperança é uma certeza. Alexandre, em nome de todos no Banco Central gostaria de expressar a você as boas-vindas e os votos de êxito em suas novas funções como diretor de Assuntos Internacionais. Êxito que será também do Banco Central e, conseqüentemente, de todo o país. O ajuste das contas externas tem sido um dos pilares do processo de reconquista da confiança levado a cabo com sucesso pelo governo Lula. No momento de troca de comando na área internacional do Banco Central, gostaria de relembrar algumas das conquistas recentes do Brasil na área externa. Mais que vitórias passadas, estas conquistas projetam um cenário muito mais favorável à nossa frente. O risco Brasil está hoje abaixo dos 600 pontos. A comparação com os mais de 2.400 pontos registrados em setembro do ano passado dá uma dimensão precisa da retomada de confiança na economia brasileira. Essa melhora possibilitou uma recuperação consistente da taxa de rolagem da dívida externa privada. Há menos de um ano, no auge da crise, empresas brasileiras encontravam dificuldade para rolar, ainda que 1 parcialmente, suas dívidas. Nos últimos meses, a taxa de rolagem tem permanecido consistentemente acima de 100%. Peça fundamental no ajuste externo é a evolução da taxa flutuante de câmbio. Hoje, o câmbio está estabilizado e registra baixa volatilidade. Além de não representar pressão sobre a inflação, tem viabilizado excelentes resultados na balança comercial. Os números revelam uma mudança sólida e permanente no comércio exterior brasileiro. No valor acumulado em 12 meses, a balança comercial registrou em outubro um superávit superior a US$ 23 bilhões. É o melhor resultado já apurado na história do Brasil. Por coincidência, ainda há poucos meses arautos do pessimismo previam para setembro ou outubro uma crise cambial decorrente da queda das exportações... Não por coincidência, as cassandras estavam mais uma vez erradas... Os saldos comerciais positivos decorrem de uma mudança estrutural do comportamento do comércio exterior brasileiro e não de meras conjunturas pontualmente favoráveis. Os termos de troca brasileiros registraram uma ligeira melhora recentemente, mas ainda estão muito distantes dos picos históricos. Esse fato comprova que os sólidos saldos positivos da balança comercial derivam em grande parte de ganhos de produtividade e eficiência da economia brasileira, sem os artificialismos que marcaram nosso comércio exterior no passado. Vale repetir: o Banco Central não tem uma meta para a taxa de câmbio. As compras de dólares do Tesouro, por exemplo, buscam apenas aproveitar boas oportunidades oferecidas pelo mercado. A ampliação do prazo para as aquisições de moeda estrangeira pelo Tesouro tem a mesma finalidade. De janeiro a setembro deste ano, a conta corrente do balanço de pagamentos registra um superávit de US$ 3,8 bilhões. Pela primeira vez em dez anos, devemos fechar o ano com superávit em conta corrente. No conceito de liquidez internacional, as reservas brasileiras totalizaram em setembro US$ 52,7 bilhões, um nível perfeitamente confortável para o regime de câmbio flutuante. No conceito de reservas líquidas sem os recursos do FMI, as reservas brasileiras estão hoje em US$ 17,5 bilhões. No início do ano, tínhamos a previsão de que fecharíamos o ano de 2003 com reservas líquidas da ordem de US$ 13,8 bilhões. Senhoras e senhores, O sólido processo de reconquista da confiança permitiu que o Brasil voltasse aos mercados internacionais. As incertezas que pairavam sobre o país impediram captações externas até abril deste ano. Em pouco mais de cinco meses, conseguimos efetivar o lançamento de US$ 4,6 bilhões em títulos internacionais, cumprindo a meta de emissões para este ano, que totalizava US$ 3,1 bilhões. Além da meta, já lançamos este ano mais US$ 1,5 bilhão – ou mais de 25% de nossas necessidades para o ano que vem. 2 Há um detalhe que não tem merecido a devida atenção por parte de muitos analistas: o Brasil, em seu último lançamento, voltou a emitir títulos em dólares com taxa de juros de apenas um dígito. Isso não acontecia desde 1998 e comprova que o Brasil retomou definitivamente sua presença no mercado internacional. Essa presença se reflete na participação brasileira nos fóruns multilaterais internacionais. Na última reunião de ministros e presidentes de bancos centrais do G-20, realizada há dez dias no México, obtivemos importante vitória diplomática. Por iniciativa da delegação brasileira, o comunicado final do encontro trouxe referência explícita à necessidade de manutenção ou reformulação de instrumentos de prevenção de crises, como a Contingency Credit Line do FMI, que está prestes a expirar-se. Como lembrou o Alexandre, o Brasil tem sempre se manifestado favoravelmente a mecanismos de prevenção de crises, desde que condicionados à adoção de políticas consistentes. A posição do G-20 pode representar uma mudança histórica na estrutura do sistema financeiro internacional. Senhoras e senhores, Aproveito esta oportunidade para fazer outro anúncio relevante na área externa: a do resultado da operação de recompra de títulos da dívida externa. Desde a autorização do Programa de Recompra de Títulos da Dívida Externa, o Banco Central já readquiriu US$ 3,2 bilhões, em valor de face, de títulos da dívida externa brasileira. A recompra não implica cancelamento dos títulos, que são de emissão do Tesouro Nacional. Mas, na data de liquidação, o pagamento dos papéis recomprados não exige desembolso pelo país. Para 2003, a operação de recompra já permitiu a redução de US$ 638 milhões no pagamento da dívida externa. Além disso, haverá reduções de desembolso de US$ 1,56 bilhão, US$ 751 milhões e US$ 323 milhões em 2004, 2005 e 2006. Até o final de 2006, a economia de divisas obtida com a recompra será de cerca de US$ 1,2 bilhão. Esse valor equivale à diferença entre o valor gasto na aquisição dos títulos e seu valor de face, mais os valores nominais dos juros recebidos. Senhoras e senhores, O Banco Central lançou ontem a Rede de Informações de Capitais Estrangeiros e Câmbio (Redecec), que permitirá o registro via internet de operações de comércio exterior. O principal objetivo da rede é facilitar o registro e a solução de pendências para mais de 120 mil empresas que atuam em comércio exterior. Tenho a certeza de que o Redecec vai constituir importante ferramenta para o aumento do comércio exterior. Na verdade, esse projeto faz parte de um item maior da agenda do Banco Central a ser implementado em futuro próximo: a reformulação, simplificação e modernização da legislação cambial brasileira. A conclusão dos projetos nesse sentido, já em curso no banco, deverá constituir um dos principais desafios do Alexandre à frente da diretoria de Assuntos Internacionais. 3 Falei antes em balanço e esperança. O balanço do passado recente nos dá razões sólidas para a esperança em um futuro melhor. Nossa principal tarefa é dar continuidade ao processo de construção responsável das condições que nos levarão ao crescimento sustentado, com justiça social e distribuição de renda. Ao Beny, registro os agradecimentos pela contribuição dada a esse esforço e pela demonstração de lealdade. Ao Alexandre, as boas-vindas a um novo companheiro de jornada. Brasília, 04 de novembro de 2003. 4