Temperatura do solo em função da densidade de plantas em mandioca Flávia Kaufmann Samboranha1*, Nereu Augusto Streck2, Diego G. Pinheiro³, Alencar J. Zanon¹, André Trevisan de Souza¹, Fábio Hunsche³ e Michel Rocha da Silva³ 1 Aluno de Pós-Graduação, Centro de Ciências Rurais (CCR), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail: [email protected]. *Autor para correspondência. 2 Departamento de Fitotecnia. CCR, UFSM - Avenida Roraima, 1000, 97105-900, Santa Maria, RS, Brasil. 3 Curso de Graduação em Agronomia, CCR, UFSM. Abstract The objective of this study was to quantify the soil temperature at different plant densities in cassava. The hypothesis was that it is possible to detect the closing of the canopy through the soil temperature. The experiment was conducted during the 2009/2010 agricultural year in the experimental area of Departamento de Fitotecnia, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). The experimental was completely randomized design with four treatments and one repetition. The treatments consisted by equidistant spacing of 0.8 x 0.8 x 1.0 1.0, 1.2 and 1.5 x 1.2 x 1.5 m. Geothermometers were installed in the treatments to observat the soil temperature. In plants, the expanded area of each leaf (cm2) was measured and the leaf area index calculated. The effect of solar radiation on the soil temperature reduction, from 40 to 60 days of the vegetative cycle of plants, is justified by the intense leaf emission and leaf area index increase of plants. Key words: plant density, leaf area index, soil temperature, Manihot esculenta. 1. Introdução A mandioca (Manihot esculenta Crantz) é utilizada na composição de vários alimentos, podendo ser substituta do trigo na indústria. Além da sua importância social a mandioca também faz parte do grupo das culturas agroenergéticas devido a elevada acumulação de amido nas raízes tuberosas. A planta caracteriza-se pela sua rusticidade e desempenho satisfatório em condições de solos de baixa fertilidade e em diferentes condições climáticas. A temperatura do ar e do solo são fatores ambientais que afetam o crescimento e o desenvolvimento da cultura de mandioca. A partir disso, pode-se inferir que a temperatura do solo, juntamente com a umidade do solo, constitui-se nos primeiros elementos meteorológicos que afetam a cultura durante seu estabelecimento inicial, uma vez que a brotação das manivas e a velocidade de emergência das plantas dependem da disponibilidade térmica na profundidade em que a maniva foi plantada. Após a emergência das plantas até o final do ciclo de desenvolvimento, a temperatura do solo continua sendo um elemento meteorológico importante, pois o crescimento radicular e a acumulação de amido nas raízes tuberosas são dependentes do regime térmico do ambiente solo. A temperatura do solo é uma função da disponibilidade de radiação solar na superfície do solo e das suas propriedades térmicas. A partir da emergência da cultura, uma parte da radiação solar incidente é interceptada pelo dossel vegetativo (MOTA, 1975). Assim, à medida que o índice de área foliar (IAF) da cultura aumenta, reduz-se a disponibilidade de energia solar na superfície do solo e a variação diária da temperatura do solo. Portanto, técnicas de manejo que afetam o IAF da cultura alteram também o regime térmico do solo. Uma técnica de manejo das culturas que afeta o IAF é a densidade de plantas, ou seja, o número de plantas por unidade de área do terreno. O adensamento de plantas acelera o recobrimento do solo e a interceptação de radiação solar pelo dossel vegetal, enquanto que baixas densidades de plantas recobrem o solo mais lentamente. Quanto ao tempo de fechamento do dossel, Irolivea et al., (1998) observaram que há um efeito direto dos espaçamentos menores sobre a redução do tempo de fechamento, tanto na linha como na entrelinha. Tais resultados estão de acordo com os obtidos por Conceição e Sampaio (1981), onde o uso de menores espaçamentos favoreceu a cobertura precoce do terreno. No cultivo de mandioca no Rio Grande do Sul, o adensamento de plantas mais usual é de 0,8 x 0,8 m, correspondendo a uma população de 16000 plantas ha-1 (SCHONS et al., 2009). Em compensação o tamanho de raízes tuberosas pode não ser o mais apropriado para mandioca de mesa. Assim, o uso de menores densidades de plantas pode melhorar a qualidade de raízes tuberosas, pois há uma redução na competição intraespecífica. O objetivo deste trabalho foi quantificar a temperatura do solo em diferentes densidades de plantas na cultura da mandioca. A hipótese foi de que é possível detectar o fechamento do dossel através da temperatura do solo. 2. Material e métodos O experimento foi realizado durante o ano agrícola 2009/2010 na área experimental do Departamento de Fitotecnia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) (latitude: 29°43’S, longitude: 53°43’W e altitude: 95 m). O clima da região, segundo a classificação de Köppen, é Cfa, que significa subtropical úmido sem estação seca definida e com verões quentes (MORENO,1961). O solo do local é uma transição entre a Unidade de Mapeamento São Pedro (Argissolo Vermelho distrófico arênico) e a Unidade de Mapeamento Santa Maria (Argissolo Bruno-Acinzentado alítico umbrico) (STRECK et al., 2008). O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, com quatro tratamentos e uma repetição. Os tratamentos foram constituídos por espaçamentos equidistantes de 0,8 x 0,8 m, 1,0 x 1,0 m, 1,2 x 1,2 m e 1,5 x 1,5 m. As densidades de plantas obtida nos tratamentos foram de 15625 mil plantas ha-1, 10000 mil plantas ha-1, 6945 mil plantas ha-1 e 4445 mil plantas ha-1. O preparo do solo foi realizado com gradagens. O plantio foi realizado em 24/09/2009. A adubação seguiu a recomendação técnica para a cultura da mandioca. Como propágulos vegetativos usaram-se manivas-semente de 20 cm de comprimento e o plantio foi realizado manualmente em covas de 20 cm de profundidade. As manivas-semente foram da variedade RS 13 da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Sul (FEPAGRO/RS). O controle de plantas daninhas foi realizado com capina manual, evitando assim, a interferência sobre o crescimento e desenvolvimento da cultura. A data de emergência da mandioca foi considerada quando 50% das plântulas estavam visíveis acima do nível do solo, identificada no dia 24 de outubro de 2009. Em cada tratamento foi instalado um geotermômetro no dia 20 de outubro e, a partir dessa data, foi coletada a temperatura do solo em um horário no período entre 11h30min e 12h30min. Esse período é considerado de maior temperatura do solo, devido a maior incidência direta de radiação solar. Após a emergência, uma planta por parcela foi marcada com arame colorido, onde se avaliou a cada quinze dias a variável de crescimento comprimento do maior lóbulo das folhas expandidas na haste principal (HP) e nas ramificações simpodiais de primeira (RS1) e segunda ordem (RS2). Com os valores do comprimento do maior lóbulo das folhas foi calculada a área expandida de cada folha (cm2) pela equação (SCHONS et al., 2009): AF=3, 2792(x) + 0, 1607(x)2 + 0, 0402(x)3 (1) sendo x o comprimento do maior lóbulo (cm). Através dos valores de área expandida foi obtido o índice de área foliar (IAF). 3. Resultados e Discussão Na Figura 1 apresenta-se a relação da temperatura do solo em dias límpidos, nublados e parcialmente nublados com os dias após a emergência da mandioca (DAE), nos diferentes tratamentos e no solo desnudo. As médias de temperatura para T 1,5, T 1,2, T 1,0, T 0,8 e solo desnudo durante o período avaliado foram 27,6, 29,1, 27,6, 27,4 e 31,5 ºC para os dias límpidos e 27, 27,9, 27, 26,7 e 29,2 ºC para dias nublados e parcialmente nublados, respectivamente. É considerável o efeito da radiação solar incidente na temperatura do solo no início do ciclo vegetativo das plantas (Figura 1a e b), independente do tratamento em ambas as condições da atmosfera. Esse comportamento pode ser justificado pelo fato de que as primeiras folhas da planta de mandioca surgem a partir do décimo dia do ciclo (CONCEIÇÃO, 1983). No período entre emergência e 60 DAE, as plantas não haviam coberto o solo com a área foliar, a exceção dos tratamentos mais adensados (T 0,8 e 1,0), os quais aos 46 DAE, aproximadamente, já apresentavam diferenças na temperatura do solo em relação aos demais tratamentos e ao solo desnudo (Figura 1a). Em T 1,0 e 1,5 as diferenças na temperatura do solo em relação ao solo desnudo, foram destacadas a partir dos 64 DAE (Figura 1a e b). Os períodos sequentes do ciclo da cultura são caracterizados por intensa emissão de folhas, elevadas taxas de fotossíntese e expansão da área foliar nas plantas (CONCEIÇÃO, 1983). Portanto, a partir dos 90 DAE são evidentes as diferenças entre a temperatura do solo desnudo e as das diferentes densidades de plantas. A diferença de temperatura do solo entre o solo desnudo e tratamentos (Dif) foi calculado como sendo a média de Difs de dias límpidos próximos as datas de medida da área foliar no campo. Dif está relacionado com o fechamento do dossel em função do IAF atingido, proporcionando maior diferença de temperatura, ou seja, indica o quanto a superfície foi sombreada. Dias límpidos Temperatura do solo (ºC) Dias nublados e parcialmente nublados 42 (a) 38 Trat 0.8 Trat 1.0 34 Trat 1.2 30 Trat 1.5 26 Solo Desnudo 22 18 Temperatura do solo (ºC) 42 (b) 38 Trat 0.8 34 Trat 1.0 Trat 1.2 30 Trat 1.5 26 Solo desnudo 22 18 0 10 20 30 40 50 DAE 60 70 80 90 100 110 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 DAE Figura 1. Relação entre temperatura do solo e dias após a emergência da mandioca (DAE) em quatro densidades de plantas e solo desnudo. Temperatura do solo em dias límpidos (a) e temperatura do solo em dias nublados e parcialmente nublados (b). Santa Maria, RS 2009/2010. O IAF no T 0,8 foi maior, já que foi o tratamento mais adensado (Figura 2). Porém, nos demais tratamentos, à medida que o espaçamento aumentou, o IAF foi menor (Figura 2). Este comportamento pode ser explicado pela intensidade da competição intraespecífica entre as plantas de mandioca para cada densidade de plantas. Nesse tratamento as plantas emitiram mais folhas, apresentaram maior comprimento de hastes através da maior elongação dos entrenós, além das hastes serem mais tenras. Esse fato está relacionado com a busca de luz no topo do dossel. Assim, a parcela com este espaçamento fechou o dossel mais rapidamente do que as parcelas menos adensadas, interceptando a radiação solar. A implicação disso foi uma maior diferença de temperaturas entre o solo desnudo e o T 0,8 m, além de uma menor Dif (solo desnudo- tratamentos) duração das folhas nestas plantas, ou seja, maior senescência de folhas nos estratos inferiores da planta. Nos tratamentos T 1,0, T 1,2 e T 1,5 as plantas de mandioca tiveram um espaço físico maior para explorar (Figura 2). Assim, similar ao IAF, a competição intraespecífica também foi menor, resultando na formação de entrenós mais curtos e hastes mais grossas. No entanto, no T 1,5 ocorreu uma maior brotação de gemas axilares na haste principal, interferindo nos valores de Dif. 12 Trat 0.8 9 Trat 1.0 Trat 1.2 6 Trat 1.5 Logaritmo (Trat 0.8) 3 Logaritmo (Trat 1.0) Logaritmo (Trat 1.2) 0 Logaritmo (Trat 1.5) -3 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 IAF Figura 2. Diferença de temperatura do solo entre solo desnudo e quatro densidades de plantas (Dif) em função da evolução do índice de área foliar (IAF) em mandioca. Santa Maria, RS 2009/2010. 4. Conclusões Verificou-se o efeito dos diferentes espaçamentos no IAF em todos os tratamentos. Em função do IAF, ocorreu uma atenuação da temperatura do solo nas maiores densidades de plantas de mandioca e o contrário também foi verificado nas menores densidades. Assim, a hipótese de que é possível detectar o fechamento do dossel a partir da temperatura do solo foi confirmada. 5. Referências bibliográficas CONCEIÇÃO, A. J.; SAMPAIO, C.V. Influência do espaçamento na cultura da mandioca (Manihot esculenta Crantz). In: CONGRESSO BRASILEIRO DA MANDIOCA, 1., Salvador, 1979. Anais... Brasília: EMBRAPA, SBM. 1981. v.1, p.113-122. CONCEIÇÃO, A.J da. A mandioca. São Paulo: Nobel, 1983. 382 p. IROLIVEA, E.A.M. et al. Efeito do espaçamento entre plantas e da arquitetura varietal no comportamento vegetativo e produtivo da mandioca. Scientia Agricola, Piracicaba, v.55, n.2, p. 269-275, 1998. MORENO, J.A. Clima do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Secretaria de Agricultura, Diretoria de Terras e Colonização, Secção de Geografia, 1961. 46p. MOTA, F.S. da. Meteorologia Agrícola. Pelotas: Nobel, 1975. 376 p. SCHONS, A. et al. Arranjos de plantas de mandioca e milho em cultivo solteiro e consorciado: crescimento, desenvolvimento e produtividade. Bragantia, Campinas, v.68, n.1, p.155-167, 2009. STRECK, E.V. et al. Solos do Rio Grande do Sul. 2. ed. Porto Alegre: EMATER/RS, 2008. 222 p.