Deslocamento de dunas costeiras: uma análise através de

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GRAVEL
ISSN 1678-5975
Setembro - 2015
V. 13 – nº 1
15-25
Porto Alegre
Deslocamento de dunas costeiras: uma análise através de dados de
sensoriamento remoto orbital na Lagoa do Peixe, RS
Scottá, F.C.1,2; Rockett, G.C.1,2; Portz, L.3 & Cardia, V.C.4
1
Departamento de Geodésia/IGEO/UFRGS,
Programa de Pós-Graduação em Geociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS,
3
Laboratório de Gerenciamento Costeiro – LABGERCO/CECO/IGEO/UFRGS,
4
Profill Engenharia e Ambiente.
2
E-mails: [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected].
Recebido em 11 de maio de 2015; aceito em 10 de setembro de 2015.
RESUMO
A utilização de produtos de sensoriamento remoto aliados a técnicas de
geoprocessamento estão sendo cada vez mais utilizados para análise da superfície em
regiões costeiras, inclusive para a aquisição de parâmetros morfológicos e de migração
de dunas. Neste contexto, este estudo tem por objetivo avaliar o deslocamento do
campo de dunas na linha de contato com a Lagoa do Peixe, Rio Grande do Sul (RS),
durante o período de 1986 até 2014, através de dados de sensoriamento remoto orbital.
Utilizou-se imagens oriundas de sensores a bordo dos satélites LANDSAT 5, 7 e 8.
As imagens foram inseridas em um projeto em Sistema de Informações Geográficas
(SIG) após o processamento e registro. A análise visual das imagens possibilitou a
identificação da área de dunas dentro do Parque Nacional da Lagoa do Peixe nos
diferentes anos e, de acordo com o comportamento do mesmo ao longo dos anos, a
área foi seccionada em 7 setores distintos. A diferença de área de dunas foi calculada
para os sete setores analisados. Ao sul da desembocadura da Lagoa foi verificada uma
maior movimentação do campo de dunas, quando comparado com as áreas ao norte da
Lagoa. Tal fato se deve à presença de vegetação exótica Pinus sp. (introduzida pelo
homem) entre a margem leste da lagoa e o campo de dunas, influenciando na dinâmica
do campo de dunas, e consequentemente da lagoa.
ABSTRACT
The use of remote sensing products combined with geoprocessing techniques
are increasingly being used to analyze the surface in coastal regions, including the
acquisition of dunes morphological and migration parameters. This study aims to
evaluate the mobility of the dunefield in contact with the “Lagoa do Peixe” lagoon,
Rio Grande do Sul (RS), during the period 1986 to 2014, through orbital remote
sensing data. Images from sensors on board satellites Landsat 5, 7 and 8 were used in
this research. After processing and register, images were added into a Geographic
Information System (GIS) project. Visual image analysis allowed the identification of
the dunefield area inside the “Lagoa do Peixe” National Park in the different years
and, according to its behavior during the years, the study area was divided into 7
different sectors. Difference in the dunes area was calculated for each sector. In the
southern part of the study area, a larger mobility of the dune field has been verified,
when compared to the northern part of the study area (north of the lagoon outfall). This
is due to the presence of exotic vegetation Pinus sp. (introduced by man) between the
east margin of the lagoon and the dunefield, influencing the dunefield and consequent
lagoon’s dynamics.
Palavras chave: Dunas, Sensoriamento Remoto, Sistema de Informações Geográficas.
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Deslocamento de dunas costeiras: uma análise através de dados de sensoriamento remoto orbital na Lagoa do Peixe, RS
INTRODUÇÃO
A Planície Costeira do Rio Grande do Sul
(PCRS) é constituída por quatro sistemas lagunabarreira que se desenvolveram nos últimos 400
ka, durante o Quaternário (Villwock &
Tomazelli, 1995). Sua área total é de 33.000 km2,
sendo a mais ampla planície costeira do território
brasileiro, e sua linha de costa se estende desde
Torres até o Chuí, totalizando 620 km de
extensão. O último sistema laguna-barreira
(Sistema IV) começou a se formar há cerca de 18
ka, no Holoceno, e encontra-se ativo atualmente.
As feições geomorfológicas mais comuns na
PCRS são os cordões litorâneos (beach ridges e
foredune ridges) e os campos de dunas
transgressivos
(transgressive
dunefields)
(Villwock, 1984; Villwock & Tomazelli, 1995,
Hesp et al., 2005; 2007). Estes ambientes
possuem grande valor paisagístico, constituem
áreas de proteção permanente (APPs) e são
protegidas por lei nacional (Código Florestal
Brasileiro – Lei 12.651/2012; Resolução nº
303/2002 do Conselho Nacional do Meio
Ambiente – CONAMA), sendo importantes
redutos ecológicos.
Os campos de dunas, apesar de extensos e
presentes em toda a extensão da PCRS,
apresentam poucos estudos para a sua
compreensão
evolutiva,
morfológica
e
morfodinâmica; alguns exemplos encontram-se
nos trabalhos de Tomazelli (1990; 1994) e
Martinho et al. (2008; 2010).
O monitoramento e/ou estimativa do
deslocamento de dunas na Planície Costeira (PC)
já foram realizados no território brasileiro,
utilizando-se diferentes métodos de investigação,
com aquisição de dados diretos e/ou indiretos.
Alguns exemplos são os estudos de Tomazelli
(1990; 1993 e 1994), Guimarães (2005) e
Martinho et al. (2008, 2009 e 2010) na PCRS;
Giannini & Santos (1994) e Martinho (2004) na
Planície Costeira de Santa Catarina; Castro
(2004) e Meireles (2011) na PC do Ceará;
Carneiros et al. (2012) e Fernandes & Amaral
(2013) na Planície Costeira do Rio Grande do
Norte, entre outros.
A utilização de produtos de sensoriamento
remoto aliados a técnicas de geoprocessamento
estão sendo cada vez mais utilizados para análise
da superfície em regiões costeiras. Com a
disponibilização
gratuita
das
imagens
LANDSAT (TM e ETM+) ao público, estas estão
sendo utilizadas em diversos estudos, para a
aquisição de parâmetros morfológicos e de
migração de dunas (Parker Gay, 1999; Levin et
al., 2004; Yao et al., 2007; Mohamed &
Verstraeten, 2012).
Este estudo tem por objetivo avaliar o
deslocamento do campo de dunas na linha de
contato com a Lagoa do Peixe, RS, durante o
período de 1986 até 2014, através de dados de
sensoriamento remoto orbital.
ÁREA DE ESTUDO
GEOLÓGICO
E
CONTEXTO
O Parque Nacional da Lagoa do Peixe
(PNLP), localizado no litoral médio do Rio
Grande do Sul, possui área total de 36.721,71
hectares (ICMBIO, 2013), abrange a porção
litorânea dos municípios de Tavares e Mostardas
(Fig. 1). O PNLP foi criado em 1986, pelo
Decreto nº 93.546, tendo como objetivo proteger
as espécies de aves migratórias e os ecossistemas
litorâneos do Rio Grande do Sul (PNLP, 2013).
A Lagoa do Peixe é o principal corpo de água
do PNLP, sendo esta uma feição geomorfológica
do tipo laguna que possui ligação direta e sazonal
com o Oceano Atlântico, apresentando variação
espacial da área alagada relacionada com a
variação da precipitação pluvial presente no local
(Portz et al., 2011a). O Parque compreende
também áreas de campo de dunas, de mata de
restinga e de banhados (PNLP, 2013).
As dunas recobrem cerca de 45% da área do
Parque (Moraes, 2009) e constituem depósitos de
areia quartzosas inconsolidadas, formando uma
faixa contínua ao longo de toda a restinga do
PNLP. Estas dunas são bastante salientes e estão
melhor representadas ao norte da barra da Lagoa
do Peixe. Estão presentes nesta área dunas
barcanas com alturas superiores a 15 m e
orientadas perpendicularmente à direção do vento
NE (PNLP, 2013).
A formação dos campos de dunas nesta região
é favorecida pelo alto aporte de sedimentos
ocasionados pela erosão da linha de costa e a
consequente
retrogradação
da
barreira,
juntamente com a baixa umidade e o alto
potencial de deriva eólica, observados nesta
região (Martinho, 2008).
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Scottá et al.
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Figura 1. Localização da área de estudo junto a Lagoa do Peixe e a área de delimitação do parque nacional.
O clima da região é do tipo C (subtropical
úmido) na classificação de Köppen, caracterizado
por uma temperatura média anual de 17,5ºC,
apresentando os meses de janeiro e fevereiro
como os meses mais quentes e junho e julho
como os mais frios. A precipitação varia entre
1150 e 1450 mm, bem distribuídas ao longo do
ano (Tagliani, 1995).
A análise do padrão de ventos, com base em
dados do banco nacional de dados oceanográficos
da Diretoria de Hidrografia e Navegação da
Marinha do Brasil para a estação de
Mostardas/RS, período de março de 1957 a maio
de 2000 – mostra uma variabilidade na direção
dos ventos incidentes, embora os ventos de NE-E
e S-SW sejam os mais importantes (Martinho,
2008) (Fig. 2). Ventos de NE são os mais
frequentes (17,3%), seguidos dos ventos de S
(10,7%) e de E (10,4%) – os quais, juntos,
produzem uma deriva resultante para W. Ainda,
em comparação com dados de outras estações
meteorológicas localizadas ao longo da costa do
Rio Grande do Sul, Mostardas é região vais
“ventosa”, com altas frequências de ventos com
velocidades superiores a 14 m/s e com o menor
número de calmarias (Martinho, 2008).
MATERIAIS E MÉTODOS
Para o desenvolvimento deste estudo foram
utilizadas imagens orbitais multiespectrais de
média resolução espacial, da série de satélites
LANDSAT. As imagens utilizadas são
provenientes de sensores a bordo dos satélites
LANDSAT 5, 7 e 8, os quais possuem
características distintas (Tab. 1).
O sensor TM (Thematic Mapper) esteve a
bordo do satélite LANDSAT 5 imageando a
superfície terrestre desde seu lançamento em
01/03/1984 até novembro de 2011, quando a
degradação de componentes eletrônicos do
sistema impediu o fornecimento de imagens a
partir de então (USGS, 2014). Sete bandas
espectrais deste sensor estão disponíveis: bandas
1-5 e 7 com resolução espacial de 30 m e banda 6
com resolução espacial de 120 m. O sensor
ETM+ (Enhanced Thematic Mapper Plus) está a
bordo do satélite LANDSAT 7, lançado em
GRAVEL
18
Deslocamento de dunas costeiras: uma análise através de dados de sensoriamento remoto orbital na Lagoa do Peixe, RS
15/04/1999. Oito bandas espectrais deste sensor
estão disponíveis: bandas 1-5 e 7 com resolução
espacial de 30 m, banda 6 com resolução espacial
de 60 m e banda 8 com resolução espacial de 15
m (USGS, 2014). O sensor OLI (Operational
Land Imager) está a bordo do satélite LANDSAT
8, lançado em 11/02/2013. Nove bandas
espectrais são disponibilizadas por este satélite,
sendo as bandas 1-7 e 9 com resolução espacial
de 30 m e a banda 8 (pancromática) com
resolução de 15 m.
Norte
20 %
16 %
12 %
8%
Velocidade
do Vento (m/s)
4%
Leste
Oeste
>= 17,5
14,4 – 17,5
11,1 – 14,4
8,8 – 11,1
5,7 – 8,8
3,6 – 5,7
2,1 – 3,6
0,5 - 2,1
0,1 - 0,5
Sul
Calmarias 1,83 %
Figura 2. Rosa dos ventos (direção, frequência e velocidade dos ventos) para a estação meteorológica de
Mostardas-RS para o período de março de 1957 à maio de 2000 (Martinho, 2008).
Tabela 1. Informações sobre os Sensores TM, ETM+ e OLI dos satélites LANDSAT (USGS, 2014).
Sensor
Bandas Espectrais
ETM+
TM
ETM+
OLI
Banda 1
Banda 2
Banda 3
Banda 4
Banda 5
Banda 6
Banda 7
Banda 6
Banda 8
Banda 1
Banda 2
Banda 3
Banda 4
Banda 5
Banda 6
Banda 7
Banda 8
Banda 9
Resolução
Espectral
0.45-0.52 μm
0.52-0.60 μm
0.63-0.69 μm
0.76-0.90 μm
1.55-1.75 μm
10.4-12.5 μm
2.08-2.35 μm
10.4-12.5 μm
0.52-0.9 μm
0.43-0.45 μm
0.45-0.51 μm
0.53-0.59 μm
0.64-0.67 μm
0.85-0.88 μm
1.57-1.65 μm
2.11-2.29 μm
0.50-0.68 μm
1.36-1.38 μm
Para a análise temporal da área de estudo, fezse a seleção de quatro imagens orbitais da órbitaponto 221-82, com intervalo aproximado de 10
anos entre elas, a partir do ano de 1986 (Tab. 2).
As imagens foram adquiridas gratuitamente no
Resolução
Espacial
Resolução
Temporal
Faixa Imageada
16 dias
185 x 172 km
30 m
120 m
30 m
60 m
15 m
30 m
15 m
30 m
endereço eletrônico do Instituto Nacional de
Pesquisas
Espaciais-INPE
(http://www.dgi.inpe.br/CDSR/).
As bandas 8 (dos sensores ETM+ e OLI)
permitem a realização de um processamento de
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Scottá et al.
melhoramento de resolução espacial nas demais
imagens, denominado fusão de imagens. Assim,
este procedimento foi realizado nas imagens dos
anos de 2002 e 2014, visando o aumento da
resolução espacial das cenas para 15 m. Na
imagem de 2002, a fusão da banda pancromática
19
(banda 8) com as bandas 2, 3, e 4 foi realizada.
Para a imagem de 2014, a banda pancromática
(banda 8) foi fusionada com as bandas 3, 4, e 5.
A fusão das bandas gerou composições coloridas,
que auxiliaram na posterior etapa de análise
visual.
Tabela 2. Imagens orbitais utilizadas neste estudo.
Ano
1986
1995
2002
2014
Data de aquisição
da imagem
10/12/1986
19/12/1995
12/11/2002
21/01/2014
Satélite-Sensor
LANDSAT 5 – TM
LANDSAT 5 – TM
LANDSAT 7 - ETM+
LANDSAT 8 – OLI
Todas as imagens foram registradas na
projeção UTM 22 Sul, com a cena de 2002 sendo
escolhida como base para registrar as outras
cenas. Os pontos de controle utilizados e o erro
médio quadrático de cada registro são
apresentados na Tabela 3.
Tabela 3. Número de pontos e erro médio quadrático
de cada imagem.
Data de aquisição
da imagem
10/12/1986
19/12/1995
21/01/2014
Nº de pontos
20
15
15
Erro médio
quadrático
0,61
0,59
0,71
Após o processamento das imagens orbitais e
registro, as mesmas foram inseridas em um
projeto em Sistema de Informações Geográficas
(SIG). A análise visual das imagens possibilitou
Resolução
espacial
30 m
30 m
15 m
15 m
Bandas espectrais
utilizadas
RGB432
RGB432
RGB432
RGB543
a identificação da área de dunas dentro do Parque
nos diferentes anos, e, em ambiente SIG, foram
gerados arquivos vetoriais (do tipo “linha” e
“polígono”) para a classificação manual destes
limites. Para cada imagem, foi gerado um Plano
de Informação (PI) referente à área de dunas
livres dentro dos limites do PNLP.
Os descolamentos do campo de dunas, foram
medidos manualmente no aplicativo ArcGIS™
10, considerando-se o limite entre a Lagoa do
Peixe e campo de dunas. Com os polígonos
gerados, fez-se o cálculo da área do campo de
dunas em km² para cada PI. Por fim, foi realizada
a análise quantitativa e qualitativa dos resultados
obtidos. Por apresentarem comportamentos
diferentes, sete setores do campo de dunas do
PNLP foram analisados separadamente (Fig. 3).
As etapas do estudo constam na Figura 4.
Figura 3. Divisão do campo de dunas em setores.
GRAVEL
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Deslocamento de dunas costeiras: uma análise através de dados de sensoriamento remoto orbital na Lagoa do Peixe, RS
Figura 4. Etapas do estudo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados encontrados neste estudo
demonstram diferentes comportamentos do
campo de dunas ao longo da área analisada.
Comportamentos
diferenciados
na
movimentação do campo de dunas são
encontrados nos setores 1 a 5, estando estes
setores localizados ao sul da desembocadura da
Lagoa do Peixe. Os setores 1, 3 e 5 apresentaram
deslocamento no sentido sudoeste (Fig. 5),
atingindo a área alagada da Lagoa do Peixe. É
possível observar nas imagens mais recentes que
a largura da Lagoa do Peixe nesses setores foi
reduzida devido ao avanço do campo de dunas
sobre a área alagada. Esses setores respondem ao
regime predominante de ventos de nordeste na
região, conforme mostrado por Tomazelli (1993),
provocando a movimentação do campo de dunas
em direção oeste e sudoeste. Esses resultados são
consistentes com os de Arejano (2006), que
apresenta como provável cenário futuro o
desaparecimento do sistema lagunar, causado
pela colmatação das areias eólicas. Analisando as
áreas de deslocamento de dunas (Tab. 4), o setor
3 apresentou o maior avanço sobre a área da
Lagoa, com 1,46 km² entre os anos de 1986-2014.
O setor 2 não apresentou uma direção
predominante de deslocamento, variando de
acordo com o período analisado para leste e oeste,
com valor resultante final de 0,059 km², sendo
uma variação pequena em área, e condicionado
também pelos bancos vegetados. O setor 4
apresentou deslocamento no sentido leste durante
1986-2014, ocorrendo uma retração no campo de
dunas. Observou-se pelas imagens de satélite
uma drenagem (sangradouro) que faz contato
com a área alagada da Lagoa do Peixe, sendo a
possível razão do transporte dos sedimentos do
campo de dunas o interior da lagoa. Esse setor
apresenta uma área de deslocamento no sentido
leste maior quando comparado com o setor 2,
tendo valor resultante final de 0,618 km².
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Scottá et al.
21
Figura 5. Comportamento da linha de contato entre o campo de dunas nos diferentes setores da margem leste da
Lagoa do Peixe, entre 1986-2014. Linhas tracejadas representam os limites dos setores (apenas nos
setores 2, 4, 5 e 6).
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Deslocamento de dunas costeiras: uma análise através de dados de sensoriamento remoto orbital na Lagoa do Peixe, RS
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Tabela 4. Resultante da área de avanço e direção predominante entre 1986 a 2014.
Período
Área de deslocamento das dunas (km²)
Sul da desembocadura
3
4
5
Norte da desembocadura
6
7
Setor
1
2
1986-1995
0,411 SW
0,122 W
0,711 SW
0,076 W
0,504 SW
0,11 SW
0,455 E
1995-2002
0,084 SW
0,289 E
0,273 SW
0,655 E
0,37 SW
0,431 SW
0
2002-2014
0,386 SW
0,108 W
0,476 SW
0,039 E
0,041 SW
0,37 SW
0
TOTAL
0,811 SW
0,059 E
1,46 SW
0,618 E
0,915 SW
0,691 SW
0,455 E
No setor 6, localizado ao norte da
desembocadura da Lagoa do Peixe, foi registrado
uma variação de 0,691 km². Entende-se que o
setor 6 também responde aos ventos
predominantes de nordeste, tendo como
resultante uma migração a sudoeste. As
oscilações na área de dunas neste setor também
estão condicionadas a abertura sazonal da
desembocadura da lagoa, podendo ser
encontradas maiores informações sobre esse
tópico em Schossler (2011).
No setor 7, uma área de 0,455 km² foi
registrada durante o período 1986-1995 com
deslocamento no sentido leste, registrando
redução do campo de dunas, porém não foi
registrada nenhuma variação em área para os
períodos 1995-2014. Como já salientado em
estudos anteriores (Portz et al., 2011a; 2011b;
Scottá et al., 2013), neste setor são registradas a
presença de espécies Pinus sp. entre a margem
leste da lagoa e o campo de dunas, atuando como
uma barreira para o avanço do campo de dunas,
conforme pôde-se verificar nas imagens durante
o período avaliado. Documentos oficiais indicam
que a atividade de silvicultura, em especial o
cultivo de Pinus sp., é realizado desde o ano de
1973 na região, e já constitui uma atividade
consolidada nos municípios de Tavares,
Mostardas e São José do Norte (Ofício nº 001/06PNLP-IBAMA, apud Portz et al., 2011b). Além
de interferir nos ecossistemas, a introdução dos
pinus sp. no Parque pode comprometer o
potencial turístico da região (Portz et al., 2011b),
bem como alterar a dinâmica sedimentar eólica.
Os deslocamentos de dunas foram calculados
para os setores 1, 3, 5 e 6 (Tab. 5). Apenas esses
setores foram analisados por apresentar
deslocamento preferencialmente em um sentido.
Observa-se uma grande variação dos
deslocamentos das dunas conforme o período de
análise, com valor mínimo de zero metros (no
setor 5, entre 2002 e 2014) e máximo de 1.074 m
(no setor 3, entre 2002-2014). Estas variações
estão atreladas principalmente a dinâmica do
contato entre a lagoa e o campo de dunas, sendo
influenciado pela dinâmica de ventos, pela erosão
das margens ocasionado pela abertura sazonal da
barra da lagoa e possivelmente pela estrutura dos
bancos vegetados presentes no seu interior.
Tabela 5. Deslocamento do campo de dunas entre 1986
a 2014.
Período
1986-1995
1995-2002
2002-2014
Total
1
161
154
339
654
Deslocamento (metros)
3
5
339
275
113
405
1074
0
1526
680
6
96
30
221
347
Apesar da variação, os resultados médios para
o período de 28 anos de estudo indicam
deslocamento superiores a 23,4 m/ano nas áreas
ao sul da desembocadura da lagoa, sendo
resultados semelhantes aos encontrados por
Tomazelli (1993) com medições de campo na
área de Balneário Pinhal. O setor 6, no norte da
desembocadura, apresenta deslocamento menor
que os setores 1, 3 e 5, com deslocamento total de
348,2 m.
Simulando cenários futuros com os valores de
deslocamento constantes, estima-se que a Lagoa
do Peixe será totalmente interrompida nos
próximos 25 anos, em 2039, com a ocorrência da
interrupção nos setores 3 e 5. O setor 1 apresenta
cenário de interrupção nos próximos 49 anos,
enquanto que o setor 6 em 249 anos. Para reduzir
e evitar os deslocamentos de dunas e a
colmatação da Lagoa do Peixe, a plantação de
espécies vegetais nativas de grande porte entre o
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Scottá et al.
campo de dunas e a lagoa pode servir como
barreira ao avanço do campo de dunas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo analisou o deslocamento do
campo de dunas no contato entre o campo de
dunas da margem leste da Lagoa do Peixe com o
corpo lagunar utilizando imagens orbitais de
sensoriamento remoto. Através do uso das
imagens de sensores remotos orbitais foi possível
o monitoramento decenal do deslocamento do
campo de dunas do Parque Nacional da Lagoa do
Peixe, entre o período de 1985 a 2014. Na área ao
sul da desembocadura da Lagoa, foi verificado
um deslocamento considerável do campo de
dunas, o qual avança muitos metros sobre a
Lagoa do Peixe, enquanto que na área a norte da
desembocadura o deslocamento verificado foi
mínimo.
Ao sul da embocadura da Lagoa foi verificada
uma maior movimentação do campo de dunas,
quando comparado com as áreas ao norte da
Lagoa, em função da presença de espécies Pinus
sp. entre a margem leste da lagoa e o campo de
dunas, servindo como uma barreira para o
deslocamento do campo de dunas. A exceção está
no setor 6 deste estudo, que, por não apresentar
espécies de Pinus sp. entre o leste da lagoa e o
campo de dunas, possui migração resultante para
sudoeste.
A introdução do cultivo da espécie de Pinus
sp. na região, além de interferir nos ecossistemas
altera a dinâmica sedimentar eólica na região. Os
resultados demonstram que a dinâmica de
campos de dunas sofreu interferência com a
introdução de uma barreira física (neste caso o
Pinus sp.), a qual aparentemente está auxiliando
no “retardo” da colmatação do sistema lagunar
pelas areias eólicas.
Este estudo realizou uma análise espacial do
deslocamento dos corpos sedimentares eólicos da
margem leste da Lagoa do Peixe, para quantificar
o avanço/retração dos mesmos na área. Os
produtos de sensoriamento remoto utilizados
neste estudo possuem resolução espacial
suficiente para a caracterização geomorfológica
mais detalhada das feições eólicas presentes no
local. Dessa forma, os dados de deslocamento do
campo de dunas como um todo, obtidos através
da série temporal de imagens LANDSAT, dão
subsídios ao planejamento de novos estudos e
23
ações, focando em áreas de maior ou menor
interesse tomando como base os valores obtidos.
A realização da fusão de imagens com o
sensor ETM+ e OLI aprimoraram a resolução
espacial das cenas de 25/09/2002 e 21/01/2014,
facilitando a identificação do limite do campo de
dunas. A utilização de sensores de alta resolução
espacial, como imagens de satélite IKONOS e
QuickBird ou de Laser Scanner, possibilitará
monitorar com maior facilidade o deslocamento
de campos de dunas na PCRS, bem como a
caracterização geomorfológica das feições
eólicas presentes nas áreas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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