Os “serial dieters” são como dependentes químicos Prof. Dr. Jair Rodrigues Garcia Júnior Dieta hipocalórica (restrição de calorias) é a melhor terapia para combater o excesso de peso e obesidade. Para quem duvida basta observar o efeito da gastroplastia (a cirurgia bariátrica) na perda de peso. As modificações no estômago e intestino nada mais fazem do que “impor” que a pessoa submeta-se a uma “dieta hipocalórica severa”, ou seja, o que emagrece não é a cirurgia em si, mas sim a dietoterapia que se segue a ela. Pessoas submetidas à cirurgia, devido à limitação de volume do estômago, permanecem sob dieta hipocalórica pelo restante de sua vida, sob pena de provocar complicações pós-cirúrgicas ou, simplesmente, ganhar peso novamente. Vários exemplos de pessoas obesas que perderam 30 Kg ou mais apenas submetendo-se à dieta também vêm a comprovar a eficiência das dietas. Medicamentos, cápsulas e preparações com fibras, enzimas, suplementos “queimadores” de gordura etc, podem funcionar como auxiliares no processo de emagrecimento, mas nunca como agentes principais. Até mesmo o exercício físico, apesar de aumentar o gasto energético e de todos seus benefícios para a saúde, não proporciona emagrecimento relevante se não estiver combinado com dieta. Inclusive, ressalta-se que a combinação de dieta e exercício é a melhor entre todas as possíveis. Porém, mesmo para as pessoas convencidas sobre a eficiência de dietas, submeter-se à dieta restritiva não é fácil, principalmente por períodos de vários meses, como é necessário em muitos casos. Dieta hipocalórica tem duas características básicas: diminuição do volume total de alimentos consumidos e restrição total aos alimentos ricos em gordura e açúcar (os mais ricos em calorias). A diminuição do volume tem implicações psicológicas e fisiológicas que incomodam a pessoa. Ao servir-se de um volume menor de alimentos em cada refeição a pessoa já tem a perspectiva que a “porçãozinha” não será suficiente para “matar sua fome”. Fisiologicamente, o volume de uma refeição e o preenchimento do estômago (suporta cerca de 1,5 L em pessoas normais, porém volumes maiores em pessoas com excesso de peso) é um dos fatores que causa saciedade. Com o preenchimento apenas parcial do estômago (pela “porçãozinha”) esse sinal de saciedade para o sistema nervoso é muito fraco e a pessoa fica impelida a servir-se novamente. Por seu lado, a restrição total aos alimentos ricos em gordura e açúcar tira “doses de prazer” da vida da pessoa. A gordura e o açúcar aumentam intensamente a palatabilidade dos alimentos e aguçam as papilas gustativas (os receptores químicos que detectam sabor) na boca. Compare as diferentes sensações de saborear um biscoito água-e-sal (ou cream cracker) e um biscoito amanteigado. Além disso, as pessoas sempre têm um ou mais alimentos preferidos (chocolate, torta, bolo, doces etc) que devem ser excluídos da dieta. Daí a pessoa sofre de uma síndrome de abstinência parecida àquela vivida pelos dependentes de drogas. Essa síndrome de abstinência tem uma explicação fisiológica que já havia sido relacionada com o vício em cigarros/nicotina em 2007 [Proceedings of National Academiy of Sciences, 104(43), 17198-17203). No final de 2009, em matéria publicada na ScienceNOW Daily News (versão online da prestigiosa revista científica Science], a jornalista Cassandra Willyard coloca o título “Chocolate cake: the new heroin”? numa referência à possibilidade de comparar alimentos saborosos como um bolo de chocolate a uma droga em termos de dependência que pode causar. Daí emerge a explicação para os “serial dieters”, as pessoas com sobrepeso ou obesidade que se submetem à dietas, porém as abandonam após um período porque a restrição às guloseimas torna-se insuportável (a síndrome da abstinência). Depois de algum tempo e de ter recuperado o peso perdido na última dieta, repete a tentativa com outra dieta e também acaba por desistir, fazendo isso em sequência (série). O que as pessoas (principalmente as que têm o peso corporal sob controle) normalmente entendem como um sinal de fraqueza ou falta de motivação, na verdade é consequência de mecanismos fisiológicos que atuam justamente para preservar os estoques de energia. Basicamente, o sistema nervoso entende que os estoques de energia são necessários para o corpo e a dieta com suas restrições está rompendo o equilíbrio. Em artigo também publicado na revista científica Proceedings of National Academiy of Sciences [106(47):20016-20020, 2009], Pietro Cottone e colegas explicam que a retirada de alimentos palatáveis da dieta faz aumentar em até cinco vezes a concentração do fator liberador de corticotrofina (CRF), um hormônio relacionado com situação de estresse, envolvido nos mecanismos de fome e saciedade e também com estados emocionais negativos, como a ansiedade. Eles demonstraram que a retirada dos alimentos palatáveis, além de aumentar a ansiedade, provoca a compulsão por esses alimentos em detrimento de opções mais saudáveis. O papel do CRF foi comprovado com a utilização de um agente químico (R121919) que causava o bloqueio dos receptores do CRF, diminuindo a ansiedade e a compulsão. Ante essas informações, pode-se entender que os “serial dieters” são dependentes de alguns alimentos específicos (cada um com suas preferências) e, muitas vezes abandonam a dieta porque não podem subjugar os próprios mecanismos fisiológicos de preservação de energia que se manifestam até mesmo na forma de estados emocionais negativos. Prof. Dr. Jair Rodrigues Garcia Junior Docente do Curso de Educação Física da UNOESTE Coordenador científico da CCPq e-mail: [email protected]