RACIONALIDADE E IMPULSOS COMO DETERMINANTES DAS DECISÕES DE CONSUMO Juliana Oliveira ESAG- UDESC [email protected] Patricia Bonini ESAG-UDESC [email protected] RESUMO Este artigoobjetiva comparar a construção conceitual lógica da teoria neoclássica do consumidor com algumas abordagens modernas que surgem a partir do desenvolvimento da neurologia aplicada à economia. O fio condutor da comparação é a hipótese de racionalidade individual. Enquanto a abordagem econômica tradicionalpressupõecomportamento racional para descrever o processo de escolha do consumiodor, os recentes desenvolvimentos da economia experimental e da neuroeconomiabuscam exclarecer em que medida as inclinações imediatistas das sociedades modernas determinam suas decisões de consumo e apontam que grande parte dessas decisões resultam de impulsos e inclinações que vão além da racionalidade. Nossa comparação passa pela contextualização histórica da noção de utilidade e do papel da hipótese de racionalidade individualna estrutura lógica da teoria do consumidor tradicional, segundo a qual a utilidade corresponde ao benefício ou satisfação proporcionada pelo consumo dos bens e na noção de racionalidade requer que se busque o máximo do prazer a partir do consumo. Já as pesquisas recentes na área de neuroeconomia sugerem que muitas escolhas são inconsistentes e sentimentalistas, uma vez que derivam de processos de comportamento que acionam outras partes do cérebro, não associadas à racionalidade. Palavras-chave: Comportamento; consumo; indivíduo; utilidade; escolhas. I. Introdução Esse trabalho procura explicar como a utilidade foi sendo desvendada com o passar do século. Até pouco tempo o indivíduo era considerado um ser racional e calculista que pauta suas escolhas em um trade-off entre prazer e sofrimento. Freud demosntrou que o ser humano é atormentado por outras condições e opções além da razão. Percebido o acontecimento sobre as escolhas e pensamento do ser humano, a neurociência buscou respostas que esbarraram na economia, pois desmistificam as escolhas do consumidor. As pesquisas no ramo da neurologia demonstram que o cérebro possui várias partes, algumas ainda desconhecidas, que são acionadas de diferentes maneiras em diferentes ocasiões, ou até nas mesmas circunstâncias. Ao substituir a abordagem cardinal pela abordagem ordinal da utilidade, a revolução marginalista da década de 1870 lançou as bases da teoria econômica neoclássica sobre econsumo. Ao descrever a utilidade em termos de ordenamento das preferências, a revolução marginalista permitiu que se formalizasse a análise das escolhas individuais em mercados sofisticados a partir do homo economicus, agente racional e egoísta. Porém, modernos desenvolvimentos na área da psicologia experimental e neurologia, demonstram que a tomada de decisão é um processo de escolha dentre várias alternativas disponíveis. Teoricamente, o processo das escolhas funcionaria para o indivíduo de maneira lógica, fazendo com que a decisão seja independente do contexto. Embora a Teoria da Utilidade tenha assumido que a tomada de decisão seja racional, quando integrados à economia, tem apontado que as escolhas não são baseadas somente na racionalidade e nas motivações individuais-egoístas, tornando assim, a teoria econômica neoclássica da escolha incompleta. Ogrande avanço teórico da abordagem ordinal da utilidade ocorrido na década de 1870 cosistiu em superar a necessidade de postular sentimentos. Os consumidores passam a ser agrupados de forma genérica e supostamente se comportam de forma consistente, com base no trade-off entre prazer e sofrimento, buscando sempre o maior nível de utilidade, que nada mais é do que prazer ou felicidade: “É difícil até mesmo conceber uma unidade de prazer ou de sofrimento; mas é o montante desses sentimentos que está nos induzindo a comprar e vender, tomar emprestado e emprestar, trabalhar e repousar, produzir e consumir; e é a partir dos efeitos quantitativos dos sentimentos que devemos estimar seus montantes comparativos. ’’(Jevons, 1996;cap.I, p.52)1 Na década de 1940, Sigmund Freud (1923), dentre outros psicanalistas alertaram sobre a importância das forças inconscientes e pré-conscientes que determinariam o 1 Publicado originalmente em 1871. comportamento, o que implicaria que parte das decisões individuais não resultam dos processos de racionalidade.Subsequentes avanços na metodologia utilizada pela neurociência (neurofisiologia e neuropsicologia) permitem dividir o cérebro humano muitas partes, que devem estar relacionadas a diferentes processos. Verifica-se que o processo de escolha pode resultar da ativação de diferentes partes do cérebro, que podem ou não ser aquelas associadas à racionalidade. Esses resultados colocam em questão o modelo de teoria da escolha racional neoclássico que parte do princípio de racionalidade e gera resultados de que as escolhas são consistentes. Esse trabalho mostra como o conceito de utilidade faz parte da construção da figura do agente racional e egoísta, que é a base do modelo neoclássico da teoria do consumidor.Sendo assim, o afrouxamento das hipóteses de racionalidade e de invidualismo egoísta é o ponto de partida da neuroeconomia que aborda o problema da escolha do consumidor aproveitando os benefícios dos desenvolvimentos posteriores nos campos da neurociência e da psicologia. O melhor entendimento do funcionamento do cérebro humano aplicado à economia e administração resulta no questionamento do modelo de escolha racional tradicional, requerendo que seja reformulado o conceito de utilidade proposto pela economia neoclássica.De fato, a neuroeconomia tem construído a noção de utilidade a partir do processo através do qual o cérebro participa das escolhas de consumo,procurandoavaliar em que medida o que os psicólogos chamam de inclinações imediatistas determina as decisões de consumo. O artigo se organiza da seguinte forma. Na próxima seção descrevem-se os momentos na histórica econômica em que houve a busca pelo entendimento acerca da utilidade do indivíduo e as formulações teóricas desenvolvidas com esse objetivo, enfocando o papel fundamental da hipótese de racionalidade individual. Na seção 3 apresenta-se a abordagem da neuroeconomia para explicar o consumo a partir de uma nova explicação para utilidade e como a Neuroeconomia avalia a influência dos sentimentos e impulsos cognitivos sobre o processo de decisão de consumo. Por fim, a seção 4 apresenta as principais conclusões. II. A UTILIDADE E OHOMO ECONOMICUS QUE FUNDAMENTA A MODELO NEOCLÁSSICO DA ESCOLHA A formulação do conceito de utilidade ocorre em meados do século XIX, quando o científico científico é incorporado à economia e quando a economia de mercado se consolida como forma de organização da produção, consumo e alocação das rendas.Nesse ambiente o grande desafio intelectual era explicar o que determina o valor de troca das mercadorias a partir de uma abordagem científica da atividade econômica. O advento do mercado transformou as relações sócio-econômicas na medida que são as taxas de trocas que determinam o volume da produção, a alocação das rendas e a efetivação do consumo. Dai a importância de se entender como são determinadas as taxas de trocas. Ao se dissociarem os laços produtivos dos sociais, as trocas - que são na verdade, a materialização do mercado – passam a ser feitas de modo impessoal e motivadas por objetivos individuais. Assim, os mercados permitem que a produção de bens e serviços sejamaximizada como resultado dos objetivos individuais dos produtores de obter o máximo lucro. A busca recorrente por lucros induziu à implantação da divisão do trabalho e especialização da produção, o que por sua vez, levaou à maior interdependência entre os atores e entre as instituições econômicas, sem que houvesse qualquer domínio pessoal sobre o ambiente de trocas. Assim, o determinante das taxas de trocas–ou preços relativos das mercadorias transacionáveis – ficava sendo uma incógnita ao analista. Em outras palavras, no ambiente impessoal e complexo do mercado, como eram determinados os preços? Como aponta, por exemplo, Hunt e Sherman (1985), além da impessoalidade e da perspectiva individualista das ações econômicas, o mercado apresenta outras características fundamentais que ajudam a determinar o modo como a teoria econômica neoclássica se constrói. O caráter individualista das ações econômicas leva ao argumento de que tais ações são motivadas pelo máximo prazer com o mínimo de dor, noção esta que é a base para a teoria do valor-utilidade e,subsequentemente, para a teoria neoclássica. Já a interdependência entre os indivíduos e entre as instituições econômicas leva à noção de que existe uma “mão invisível” coordenando as trocas e caracterizando um ambiente de harmonia social, onde as trocas são justas por resultarem de livre escolha e ao mesmo tempo, as trocas determinam a alocação de recursos na economia. Por fim, esse modo de agir, enquanto agente econômico, passou a ser visto pelos pensadores utilitaristas como sendo ocomportamento humano habitual e a base do processo decisório humano. Assim, como, por exemplo, Hunt e Sherman (1985) resume, a teoria neoclássica foi fundamentada no utilitarismo egoísta, no individualismo, na dependência dos mercados, no financiamento da industrializaçãocom acúmulo de capital e o racionalismo que fomenta a harmonia social do século XIX. À medida que os mercados cresciam e sua lógica se difundia, a concorrência entre os agentes produtivos aumentava e a busca do lucro tornava-se mais estressante e requeria cada vez maior domínio sobre o processo produtivo, o que , por sua vez, exigia um cálculo racional. Observando esse novo cenário produtivo, os pensadores utilitaristas consideraram que o comportamento racional e calculista seria a base de todos os processos decisórios do indivíduo, passando a descrver o comportamento humano a partir do homo economicus: racional e egoísta. II.1A Busca pela descrição da utilidade O pensamento de Bentham tornou-se a base filosófica da teoria utilitarista.Bentham (1870) que a dor e o prazer governam as atitudes e pensamento humano e defendeu a ideia de que as pessoas buscam a maximização do poder, independentemente de sua ou motivação.Com o objetivo de tanto o prazer quanto a dor, Bentham chegou a propor uma maneira de quantificar o prazer a partir de sete circunstâncias:a intensidade,a duração, certeza ou incerteza, proximidade ou afastamento, fecundidade, sua pureza e sua extensão. Essas ideias foram necessárias para a formação da Teoria valor-utilidade e outras posteriores. Também buscando entender como era determinado o valor de troca das mercadorias, Jean Baptiste Say é considerado um dos mais importantes precursores da tradição neoclássica. Say (1863) introduziu a noção de utilidade de forma metodológica, renunciou a abordagem sobre a teoria do valor-trabalho e assegurou a possibilidade de diferentes agentes produtivos atuarem em sinergia para resultar na produção de bens. Ele argumentouque somente a utilidade gera valor, de modo que o valor de uso seria o determinante do valor de troca das mercadorias, sem que houvesse diferença qualitativa na criação da utilidade. Ao comparar o trabalho e o capital, Say conclui que tanto os trabalhadores quanto os proprietários do capital tinham motivos morais parecidos para auferir suas rendas, pois para ambos havia sacrifícios. Bastiat (1964) começou a dar coerência ao modelo utilitarista da economia a partir da noção de que todas as interações políticas e sociais resultariam em atos de troca e que, portanto, não haveria sociedade sem trocas. Sendo assim,as trocas são proveitosas para as partes envolvidas, o que confirmaria um padrão social harmonioso, resultante dos impulsos individuaise motivados pelos interesses próprios. Um argumento fundamental que já está em Bentham é o de que os indivíduos procuram aumentar sua satisfação perante seu esforço e isso implica que a obtenção de utilidade exige esforço ou dor.Sendo o esforço produtivo penoso, as pessoas suportavam a dor para que houvesse produção. Seguindo essa linha de argumentação, Bastiat tentou separar tipos diferentes de utilidade para demonstrar que os preços são dependentes das utilidades.Bastiat sustentava a ideia de que o esforço produtivo era penoso, sendo esse esforço produtivo, igualado ao serviço, ou seja, as pessoas suportavam as dores para que houvesse produção. II.2 A noção de utilidade marginal e a formalização do modelo de teoria da escolha neoclássica A década de 1870 é considerada um marco teórico em economia por ter ocorrido uma revolução no campo da teoria do valor com as obras de Jevons (1871), Menger (1963) e Walras (1874) num primeiro momento e depois Marshall (1890). Essas obras constituem uma reformulação da teoria do valor utilidade que até hoje é o cerne da teoria neoclássica da escolha do consumidor. Jevons, Menger e Walras introduziram o conceito de margem a partir do cálculo diferencial e a noção de utilidade marginal decrescente lhes permitu demonstrar como a utilidade determina o valor. Marshall, a partir da noção de utilidade marginal decrescente, conseguiu deduzir a teoria da demanda do consumidor Assim, era formalizado o comportamento supostamente utilitarista dos indivíduos. Jevons argumentou que os indivíduos possuem duas características econômicas, uma seriao empenho em obter utilidade do consumo da mercadoria e a outra seria a racionalidade. As duas juntas implicam que os indivíduos maximizam a utilidade do consumo. As partes mais importantes da teoria circulam sobre a igualdade precisa, do prazer provindo da posse de um objeto e do sofrimento com que alguém encontra para sua aquisição. Mas o enfoque da teoria se coloca sobre o grau final de utilidade de um indivíduo, ou utilidade marginal, uma vez que a mensuração da utilidade não é operacionalizável. A ideia de que a utilidade marginal é decrescente explica a lei de variação da utilidade e deriva da racionalidade individual. Esta implica que a utilidade aumenta com o aumento de determinado produto que se deseja, mas esse aumento é decrescente. Essa noção de utilidade marginal se tornou a base para o utilitarismo da nova economia neoclássica e permitiu que se descrevesse formalmente o comportamento da demanda do consumidor. Jevons quantificou a utilidade marginal. “Se a utilidade total extraída do consumo de uma mercadoria dependia da quantidade consumida, isso podia ser expresso por uma função matemática, UT=F(Q), que simplesmente dizia que a utilidade total (UT) tinha alguma relação matemática concreta com a quantidade consumida (Q).” (Jevons, 1996. P.240) Jevons defendeu que a maximização era conseguida a partir do momento em que o agente consumisse até ficar saciado, onde haveria um ponto de equilíbrio, onde a utilidade marginal do indivíduo seria zero. “... só existe uma regra que pode ser estabelecida com segurança de que ninguém compra, a não ser que espere obter uma vantagem com essa compra; portanto; a perfeita liberdade de troca tende a maximizar a utilidade” (Jevons, 1996. p.242) Menger (1963) demonstrou que a relação entre utilidade total e marginal poderia ser ilustrada graficamente de acordo com a Figura 1 abaixo Figura 1: Relação entre Utilidade Total e Marginal Menger observou que a oferta e a demanda definiam os preços, sendo a demanda determinada pela utilidade. A partir do princípio da utilidade decrescente, Menger (1963) deduziu a lei da demanda, segundo a qual a quantidade de uma mercadoria que as pessoas estavam dispostas a comprar dependenegativamente do seu preço. Walras criou uma estrutura conceitual e teórica para as relações diferentes dos mercados. Identificou a influência dos preços vigentes num dado mercado sobre os preços de outros mercados. “..a condição de maximização da utilidade mostrava que o consumidor compraria o bem até a razão entre sua utilidade marginal e seu preço igualar-se a mesma razão de todos os outros bens de consumo” . (Hunt e Sherman, 1985. pg. 253). Vale notar que o desenvolvimento do modelo neoclássico ocorreu num período em que não havia instrumental técnico disponível que possibilitasse individualizar os consumidores. A teoria se constói com base na observação da economia como um todo, e a partir da descrição de um comportamento médio dos indivíduos. III. ALÉM DA RACIONALIDADE INDIVIDUAL A escola Institucionalista, que teve como seu precursor Thorstein Bunde Veblen (2009)publicado inicialmente no início final do século XIX negou que o comportamento econômico pudesse ser entendido mediante a ação racional, em que as pessoas enfrentariam constantemente um trade-off prazer versus dor. Edgeworth (1877) discute a falta de determinação entre o egoísmo e o altruísmo. Ele acreditava que o cálculo utilitarista para medir a utilidade só pode ser feito com indivíduos homogêneos, o que não é o caso dos seres humanos. Todavia, Edgeworth considerava possível no futuro, uma tecnologia possibilitasse a mensuração da utilidade dos agentes. O primeiro pensador a questionar a racionalidade das escolhas foi Sigmund Feud, ao pesquisar e demonstrar que o inconsciente humano, até então desconhecido pelas pessoas em geral, podia ser responsável pelas motivações e escolhas. Freud verificou que impulsos irracionais habilitam os pensamentos, determinas as ações e até mesmo os sonhos. Tais impulsos podem trazer à tona necessidades básicas do ser humano que foram oprimidas. Freud sugeriu que essas necessidades ocultas vêm à tona através de inúmeros comportamentos distintos, e os indivíduos não têm consciência desses anseios, que são reprimidos. Os estudos de Freud abriram caminho para os questionamentos acerca da racionalidade e do papel da utilidade na determinação das escolhas individuais. A teoria de Freud abalou a fé na racionalidade individual porque sugere que os indivíduos não têm plena consciência de seus verdadeiros desejos, posto que há vários mecanismo de avaliação sinalizando aqueles que podem e os que não podem se tornar conscientes. A interpretação econômica dos achados de Freud sugeriria que o consumo pode ser uma manifestação do comportamento emergente dos conteúdos inconscientes, ou seja, o comportamento do consumo seria uma das formas de satisfazer desejos inconscientes. Por exemplo, um carro é um bem de consumo que em princípio tem a finalidade de transportar pessoas, mas pode ser um objeto que traz uma companhia feminina ou masculina atraente, que, por sua vez, consiste num desejo inconsciente e a compra do carro tradeuz esta manifestação, não apenas o objetivo de transporte. Desse modo, o comportamento do consumidor não está ligado somente à racionalidade ou à utilidade do modo direto como é elaborado pela teoria econômica tradicional. III.a Neuroeconomia: a neurociência aplicada à economia A tomada de decisão é um processo de escolha dentre várias alternativas disponíveis e, teoricamente, esse processo funciona de maneira lógica e independente do contexto em que ocorre. Embora a teoria da utilidade tenha assumido que a tomada de decisão é racional, as pesquisas que se seguiram aos trabalhos de Freud levam ao argumento de que essa abordagem da teoria da escolha deixa a desejar quando o propósito é entender a realidade de um indivíduo e suas escolhas verdadeiras. O comportamento humano sujeito ao estudo da economia teve início a partir de indagações acerca da própria classe de estudiosos econômicos buscando explicações para comportamentos observados no dia-a-dia. Essas perguntas trouxeram possíveis respostas em áreas como psicologia, biologia, neurociência, que a princípio são disciplinas que não têm ligação direta com a economia.. Para entender o comportamento econômico individual se faz necessário uma sinergia entre a genética, endocrinologia, neurologia, psicologia, biologia e economia. Os economistas neoclássicos possivelmente estão certos quando retratam o agente como egoísta, individualista e maximizador do prazer, entretanto, todos esses sentimentos são inconscientes, quando tratamos do comportamento humano. Esse novo viés cognitivo do comportamento econômico despertou interesse pelas motivações não diretamente observáveis que levam ao consumo. Os avanços da neurologia permitem aos economistas mensurar os sentimentos e pensamentos, o que os primeiros pensadores, formuladores da teoria convencional não conseguiam. De fato, a neurociência ajuda a economia a descrever o processo de escolha do consumidor, contribuindo em dois fronts, nas abordagens incrementais e abordagens radicais. A primeira acrecenta mais opções à tomada de decisão ou sugere específicas formas funcionais, onde, anteriormente, as análises empíricas nunca conseguiram explicar assertivamente. Atualmente, pesquisas sobre a neurobiologia da dependência, por exemplo, demonstram como o consumo de drogas limita o prazer de consumo futuro de outros bens. ( Camerer, 2005) . Já abordagem radical sugere que a teoria econômica convencional poderia ter sido consideravelmente mais assertiva, se tivesse domíno do conhecimento sobre o funcionamento do cérebro humano. Segundo Camerer, Loewenstein e Prelec (2005), a neurociência pode informatizar a neuroeconomia, principalmente, dentro de 4 tópicos: a escolha de decisão intertemporal, decisão sob risco, teoria dos jogos e a discriminação dos processos de trabalho. Utilizando essa ciência aliada para desvendar a tomada de decisão individual. Quando há desequilibrio dos neurotransmissores, seja por algum acidente, drogas, ou “calor do momento” o sistema lógico não funciona adequadamente. Gerando processos automáticos, onde o indivíduo está pouco consciente. “Psicopatologia e danos cerebrais em humanos, gerando transtornos mentais crônicos (por exemplo, esquizofrenia), distúrbios do desenvolvimento (por exemplo, o autismo), doenças degenerativas do sistema nervoso, e acidentes e derrames ocaisonando danos localizados em regiões do cérebro, ajuda-nos a entender como funciona o do cérebro. Por Exemplo, quando os pacientes com dano conhecido para um X na área executar uma tarefa especial mais mal que o "normal" pacientes, e realizar outras tarefas igualmente bem, pode-se inferir que X área é utilizada para fazer a tarefa especial. Pacientes que têm submetidos a procedimentos neurocirúrgicos, tais como lobotomia (utilizado no passado para tratar a depressão) ou bissecção radical do cérebro (um remédio extremo para a epilepsia, agora raramente utilizado) também forneceu dados valiosos”. (Camerer,2005.p10) Compreender sobre a especialização funcional permite que se identifique regiões específicas do cérebro associadas às ações diferentes. A figura 2 abaixo, ilustra três grandes regiões do cérebro. Figura 2: As partes do Cérebro Fonte: http://medicoanimosico.blogspot.com.br/2012/08/matrix-lunar-e- manipulacao-da-raca.html Silva (2006), por exemplo, ilustra que cérebro possui uma incógnita de partes, para conseguir estudar e mensurar o sistema neural, são separadas três partes. Na estrutura inferior há o cérebro reptiliano associado as funções mais básicas, similares a dos répteis, reprodução e sobrevivência, sendo esta um sistema binário, sem sentir ou pensar. Quando a parte reptiliana do cérebro é acionada as duas outras, mamária e hominídea não funcionam. A parte do meio é chamada mamária ou sistema límbico, ela é associada à afetividade e humor, que ligado à evolução das glândulas endócrinas, concedem mais do que meras ações reflexas e involuntárias. No topo da estrutura cerebral há a parte hominídea, única em humanos, incluindo o córtex, que é a camada mais externa, onde opera o raciocínio responsável por funções “superiores”: linguagem, consciência, planejamento de longo prazo. Essas estruturas cerebrais demonstradas na figura 1 funcionam simultaneamente, mas o cérebro aciona primeiro as decisões simples e depois as que têm mais opções de escolha. A razão e a emoção travam uma batalha dentro do nosso cérebro, onde predominantemente a emoção toma à frente. Acima observamos uma imagem que demonstra o cérebro com muitas partes, além disso, cada uma delas possui muitas subáreas que são exploradas, cada uma das quais podem influenciar diretamente o comportamento do indivíduo, inclusve a conduta de compra e consumo. O que se tem descoberto é que, além da total ligação entre esses órgãos com as atitudes dos seres humanos- até porque é ele quem as elabora- muitas vezes o cérebro atua ou manda agir sem nosso conhecimento e até sem nosso consentimento, ou seja, sem que tenhamos consciência dessa tal critério. Percebe-se que há vários mecanismos que podem influenciar em qualquer tipo de escolha do indivíduo, como por exemplo, o cérebro reptiliano, que embora pareça primitivo, garante a sobrevivência e está mais ligado ao comportamento de consumo do que era de se esperar, ou o sistema límbico, que freqüentemente prevalece sobre o córtex, o que significa que as ações são mais resultados das emoções do que da razão. Assim, ficou abalada anoção de que algumas reações humanas têm base cultural e social, já que na maioria das vezes as reações são provocadas por processos cerebrais. Uma vez que tem-se mostrado que a racionalidade está longe de ser a única forma determinante das decisões humanas, a neuroeconomia se ocupa de investigar o modo através do qual as escolhas e a biologia animal afetam o entendimento da utilidade do indivíduo, de que modo a economia poderia tirar vantagem disso dos conhecimentos disponíveis. III.b Os sentimentos e o consumo Mesmo quando o costume de consumir funciona regularmente, ou seja, não há nenhuma anomalia anatômica ou fisiológica, as três áreas - reptiliana, sistema límbico e córtex pré-frontal - apresentadas na sessão 3.a, são usadas separadamente. O sistema reptiliano é usado para proteção, fases mais emotivas e sentimentais são associadas ao sistema límbico enquanto as decisões são controladas pelo córtex préfrontal, utilizado para decisões calculistas. Os procedimentos cerebrais são formulados de maneira inconsciente e estão relacionados ao consumo, mais do que pensávamos. A maioria das informações que o cérebro reserva é inconsciente e a maioria de atividades corriqueiras se encaixa nesse perfil “inconsciente”, por serem automatizadas. Por exemplo, Camargo (2010)relata que há estudos demonstrando o cérebro decide milésimos de segundos antes que se tenha consciência da ação. Portanto, a deliberação de comprar, ou não é um processo físico-químico interno e não externo. Essa “antecipação cerebral” ocorre como um mecanismo de defesa poruqe há situações em que não há tempo de se pensar. Descrever plenamente as motivações do consumo requer que se identifiquem as tomadas de decisão do individuais através de estudos e equipamentos de imagiologia cerebral visto que, apesar da escolha ter sido feita de modo inconsciente a resposta do indivíduo à tomada de decisão é ciente. O começo do sistema de recompensa do ser humano, que chefia as atividades primordiais para sobrevivência é rudimentar e encontrado em outros animais. Acionado através de práticas que impulsionam o âmbito de recompensa, que permite que neurotransmissores provoquem sensações de bem-estar, voltando a impulsionar o mesmo circuito, criando ciclo vicioso. Graças a esse mecanismo surge o vício do consumo, que se dá com inúmeros produtos e serviços. Desde compra de roupas até jogos virtuais. A estrutura do cérebro de aversão à perda está ligada à amígdala cerebral, campo relacionado à sistematização do medo e que determina riscos, controla mecanismos de inibição do comportamento que poderão ser negativos para o organismo. Ter receio quanto ao risco é uma aptidão do homem, assim como dos demais animais e, defato, os indivíduos têm mais medo de perder do que vontade de ganhar alguma coisa. Eventualmente acreditamos que fazemos compras racionais, posto que, se o agente analisa as escolhas de maneira oposta, pode resultar exclusivamente em opções instintivas e irracionais, pois existe a incitação da amígdala que age evitando a perda do consumidor. Camargo (2010) aponta que logo que um ganho potencial racional é constatado pela compra de um bem ou serviço, são percebidos – para o cérebro - um aumento da possibilidade de se reproduzir e de sobreviver, assim sendo, o sistema cerebral de busca de recompensa é ativado e, não obstante, no caso em que a tomada de decisão esteja relacionada com eventuais perdas, o sistema de aversão é acionado para proteger o organismo de possíveis estragos. O que modula ou ajusta uma ameaça ou oportunidade é a propaganda e a compreensão do preço do bem. Mas é importante notar que é possível apenas desvendar padrões e não o funcionamento do sistema em cada pessoa. Até aqui tem-se buscado elaborar um cronograma sobre como a utilidade é vista pelo indivíduo e como a tecnologia atualmente disponível aumenta o grau de profundidade com que se pode analisar o comportamento de escolha dos indivíduos.e evidencia que a utilidade é mais complexa que um simples trade-off entre prazer e dor. Ela resulta de diferentes comportamentos, hormônios, diversas disciplinas e uma busca incessante para desvendar partes cerebrais que ainda escondem possibilidades sobre a forma como o ser humano se comporta nas escolhas de consumo. É percebido que o consumo é feito através de inclinações imediatistas, nada calculados, muitas vezes impulsionados pelo sistema límbico ou reptiliano. O córtex - que é o parceiro racional da teoria neoclássicanão é o único responsável pelas ações de consumo. Temos que refletir sobre qual parte do cérebro queremos que nos acompanhe nas compras de natal, e mesmo se refletirmos, será que fará diferença? Será que simplesmente não iremos cair em armadilhas cerebrais? Pensamos estar fazendo a escolha certa, todavia, podemos não estar. IV. CONCLUSÃO O trabalho apresentado contextualiza sobre o significado de utilidade e como no passar do tempo ela foi percebida, pelos pensadores, de diferentes formas. A partir do conceito instituído de utilidade – tanto durante o estabelecimento do sistema de mercado quanto nos dias atuais – começou a busca para compreender como as emoções e sentimentos do indivíduo influenciam nas formas de consumo. Desde o século XIX até os dias atuais, a utilidade é representada pelas afirmações da teoria neoclássica, onde o ser humano racional e calculista busca maximizar sua satisfação restringido por um trade-off entre prazer e dor. A melhor compreensão do cérebro, graças à disponibilidade de modernas tecnologias, e a estudos e pesquisas cognitivo-comportamentais, tem revelado que o indivíduo é muito mais emocional do que racional. O cérebro pode ser dividido em várias áreas responsáveis por distintos processos de comportamento, que acabam influenciando as formas de consumo. V. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Rômulo; STRAUCH, Ottolmy (Org.). OS Economistas: Alfred Marshall Princípios de Economia. São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda., 1996. 368 p. BASTIAT, Nostrand,1964. Fréderic. Economic Harmonies. Princeton,NJ.: D. Van BENTHAM, Jeremy. Uma Introdução aos Princípios da Moral e da Legislação. tradução Luiz João Baraúna. São Paulo: Editora Victor Civita, 1984 CAMARGO, Pedro. Comportamento do Consumidor: a biologia, anatomia e fisiologia do consumo. Ribeirão Preto: Novo Conceito, 2010. 168 p. CAMERER, Colin; LOEWENSTEIN, George; PRELEC, Drazen. Neuroeconomics: How Neuroscience Can Inform Economics. Journal Of Economic Literature, California, p. 9-64. mar. 2005. Disponível em: <http://www.hss.caltech.edu/~camerer/JELfinal.pdf>. Acesso em: 08 ago. 2012. EDGEWORTH, Francis Y. 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