Filosofia do direito 3. bimestre

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Profº Antonio Babeto Spinelli
APRESENTAÇÃO
Apresento aos acadêmicos do primeiro ano do Curso de Direito da Unidade
Campus de Paranavaí, para uso na Disciplina Ética e Filosofia Geral e do Direito a
presente cartilha do conteúdo do terceiro bimestre do ano 2013.
Este material, de originalidade só possui o aspecto didático, pois na realidade é
uma montagem, onde lancei mão de material já publicado, seja em livro, artigo ou site,
cujo prestigio é inconteste.
O meu intuito foi de colocar nas mãos do discente um material básico, onde
teria ele algo que o colocasse in moto, e com este objetivo recorri aos bons autores,
emprestando a produção e transformando-a em linguagem de fácil compreensão. Há
também trechos do conteúdo que traduzi da língua italiana, e ao fazer a tradução a
coloquei, se assim posso dizer em linguagem jornalística. Enfim, o intuito foi e é
didático.
Fiz na realidade uma miscelânea, e os grandes autores foram e continuam sendo
os fornecedores da real matéria prima. Mesmo, e sem autorização dos mesmos,
continuam eles sendo "o sal que está a dar o real condimento" à formação, aos novéis
profissionais da área do direito naquilo que concerne à Ontognoseologia Jurídica. Ao
agradecê-los, lanço mão do recurso que milhões de meus compatriotas fizeram no
passado e ainda no presente: Que Deus lhes pague!
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ONTOGNOSEOLOGIA JURÍDICA
1 - Filosofia do Direito: conceito e finalidade
Conceituar a filosofia do direito não é nada diferente e complicado de dar um
conceito para o saber filosófico; a única coisa de diferente é que se canaliza a definição
para uma determinada área, a saber, do direito.
Assim se pode dizer que o conceito da filosofia do direito é saber crítico
concernente as construções jurídicas, e que se buscam seus fundamentos mediante
uma investigação sistemática.
Quanto à finalidade da filosofia do direito, de forma bem esquemática se pode
apresentar o seguinte:
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Proceder à crítica das práticas, das atitudes e atividades dos operadores do
direito;
Avaliar e questionar a atividade legiferante, bem como oferecer suporte ao
legislador;
Proceder à avaliação do papel desempenhado pela ciência jurídica e o
comportamento do jurista diante dela;
Investigar as causas de desestruturação, enfraquecimento ou extinção de um
sistema jurídico;
Depurar a linguagem jurídica, os conceitos filosóficos e científicos do direito,
bem como analisar sua estrutura lógica;
Investigar a eficácia dos institutos jurídicos, sua atuação e seus compromissos
com as questões sociais;
Esclarecer e definir a teleologia do direito, seu aspecto valorativo e suas relações
com a sociedade e sua cultura;
Resgatar origens e valores fundamentais dos processos e institutos jurídicos;
Criticar o conceito institucional, valorativo, político e procedimental, auxiliando
o juiz no processo decisório;
Insculpir a mentalidade da justiça como fundamento e finalidade das práticas
jurídicas;
Estudar, discutir e avaliar criticamente a dimensão aplicativa dos direitos
humanos;
Aperfeiçoar e atualizar os conceitos, hábitos e práticas habituais, objetivando a
melhoria do sistema jurídico;
Desmascarar as ideologias que orientam a cultura dos juristas, seus
preconceitos e atitudes, desenvolver as críticas necessárias para reorientação da
função de responsabilidade ético-social das profissões jurídicas.
Podendo acrescentar ainda como finalidade: Proceder à crítica do direito, das atitudes e
atividades dos operadores do Direito; Avaliar e questionar atividades, oferecendo
suporte reflexivo ao legislador; proceder à avaliação do papel desempenhado pela
ciência jurídica e o comportamento do jurista; Investigar as causas da
desestruturalização do enfraquecimento ou da ruína de um sistema jurídico; Depurar a
linguajem jurídica, os conceitos filosóficos e científicos a estrutura lógica das
proposições jurídicas; Investigar a eficácia aos institutos jurídicos.
A filosofia do direito busca o conhecimento das questões básicas ou últimas do
direito. Que quer isso dizer? Uma olhada sobre o que os mestres contemporâneos – a
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propósito de definição da filosofia do direito têm dito sobre os seu objetivo de estudo,
facilitará a compreensão do tema.
No que tange ao objetivo, função ou atribuição da filosofia do direito, surge
diversidades de teorias, sendo uma desenvolvida por Eduardo Bittar e Guilherme Assis,
na qual á filosofia do direito deve ocupar-se do justo e do injusto, sendo este seu objeto;
Para outros o justo e o injusto estão fora do alcance do jurista sendo objeto de estudo
da ética; Para outros, ainda, a filosofia do direito deve ser um estudo combatido
politicamente, uma vezes que inata é sua função de lutar contra a tirania; Existem
propostas que enfatizam que a tarefa filosófica deve consistir na escavação conceitual
do direito. Muitas vezes, autores atribuem à filosofia do direito, tarefas de fazer derivar
da razão pura a estrutura do próprio direito, tantos outros participam de toda
especulação filosófica como necessidade crítico-valorativa das instituições jurídicas.
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2 - Fenomenologia da ação e da conduta
Ato e Valor
Neste ponto será analisado a fenomenologia da ação e da conduta e verificar que
espécie de conduta é a que se denomina conduta jurídica. Parece fora de dúvida que o
Direito não se refere ao homem na totalidade, ou na integralidade de seu agir, mas tão
somente ao homem enquanto ser que, agindo em sociedade, assume dadas posições
perante os demais homens, suscetíveis de gerar pretensões recíprocas ou pelo menos
correlatas.
O Direito não cuida do homem em todas as suas manifestações, enquanto
apenas contempla ou se projeta no mundo dos valores estéticos, científicos ou
religiosos, a não ser para tornar possíveis e garantidas essas atividades, sem envolver o
conteúdo mesmo dos valores visados.
Sem fazer, por ora, qualquer discriminação entre as várias espécies de fatos
jurídicos, pode-se, em suma, reconhecer que, onde quer que exista o Direito, há uma
ação positiva ou uma omissão (ação negativa) do homem, algo de redutível ou de
relacionável a uma modalidade de ação.
Em que sentido e em que condições a ação humana é suscetível de ser vista
como "ação jurídica" ou momento dotado de "qualificação jurídica"?
De modo geral, as atividades instintivas repetem-se, não se transmitem. Um
"joão-de-barro", ao fazer sua casa, constrói-a repetindo um sistema de movimentos
comuns a todos os demais, reproduzindo sempre os mesmos processos, como algo já
causado em seu ser e não escolhido por ele. O "joão-de-barro", por outro lado, não
ensina a fazer o seu abrigo maravilhoso. É próprio da cultura humana a transmissão
dos valores, o que demonstra a ligação fundamental que existe entre cultura e
pedagogia, cultura e educação.
Só o homem educa, porque só o homem se conduz. O problema de educar ligase ao problema da autodeterminação. Eu educo, porque me conduzo. Educo, porque
sou capaz de conduzir-me. Se eu fosse meramente conduzido, sem consciência dos
motivos determinantes de meu agir, não teria título para transferir ou transmitir
valores a outrem. O homem, enquanto é meramente causado, não se distingue dos
outros animais, a não ser pela consciência de sua determinação, porquanto realiza os
mesmos atos de que participam todos os seres do mesmo gênero.
O específico do homem é conduzir-se, é escolher fins e pôr em correspondência
meios a fins. A ação dirigida finalisticamente (o ato propriamente dito ou a ação em
seu sentido próprio e específico) é algo que só pertence ao homem. Não se pode falar, a
não ser por metáfora, de ação ou de ato de um cão ou de um cavalo. O "ato" é algo
pertinente, exclusivamente, ao ser humano. Os outros animais movem-se; só o homem
atua. A atuação pressupõe consciência de fins, possibilidade de opção, projeção
singular no seio da espécie, aprimoramento de atitudes, aperfeiçoamento nos modos de
ser e de agir. Seu problema liga-se ao da cultura, e, como esta, tem sua raiz na
liberdade, no poder de síntese que permite ao homem instaurar novos processos, tendo
consciência de estar integrado na natureza e no complexo vital condicionado por ela.
A ação e seus elementos constitutivos.
A ação, em seu sentido rigoroso, ou o ato, é energia dirigida para algo, que é
sempre um valor. O valor, portanto, é aquilo a que a ação humana tende, porque se
reconhece, em um determinado momento, ser motivo, positivo ou negativo da ação
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mesma. Não se indaga aqui da natureza ou das espécies de valores, mas apenas se
verifica que, toda vez que o homem atua, objetiva ou contraria algo de valioso. Atuar
sem motivo é próprio do alienado. Alienado é aquele que está alheio ao seu conduzir-se.
É o que perdeu o sentido de sua direção e de sua dignidade.
Põe-se aqui o problema grave da alienação, do estado do homem que se
encontra divorciado de sua essência, alheio ou estranho a si mesmo, com todas as
conseqüências que vêm sendo apontadas desde Hegel e Marx até Gabriel Marcel, e que
deveriam estar sempre presentes ao espírito do jurista e do político, cuja dificuldade
primordial consiste em conceber e realizar uma ordem de convivência, na qual os
homens, os grupos e as classes não se alienem.
Dizer que o homem é um ser racional é o mesmo que dizer que é um ser que se
dirige. A atuação, portanto, implica sempre uma valoração. Todo valor, por
conseguinte, é uma abertura para o dever ser. Quando se fala em valor, fala-se sempre
em solicitação de comportamento ou em direção para atuá-lo.
Valor e dever ser implicam-se e exigem-se reciprocamente. Sem a idéia de valor, não
temos a compreensão do dever ser. Quando o dever ser se origina do valor, e é recebido
e reconhecido racionalmente como motivo da atuação ou do ato, temos aquilo que se
chama um fim.
Fim é o dever ser do valor reconhecido racionalmente como motivo de agir.
No pensamento clássico, não se faz precisamente esta discriminação entre valor e fim,
de maneira que muitas vezes se fala apenas em fim, mas toda doutrina finalística oculta
em seu seio uma teoria axiológica.
A noção de fim é decorrência da de valor. O fim é valor enquanto racionalmente
pode ser captado e reconhecido como motivo do agir. Já vimos que ao mundo dos
valores ascendemos por vias emocionais, e que o valor transcende sempre às nossas
formas de compreensão racional. A beleza, a justiça e todos os demais valores não se
esgotam em fórmulas ou esquemas racionais. O que declaramos fim não é senão um
momento de valor abrangido por nossa racionalidade limitada, implicando um
problema de meio adequado à sua realização.
O nexo ou relação de meio a fim é, e não pode deixar de ser, de natureza
racional; mas a referibilidade ou imantação a um valor pode ser ditada por motivos que
a razão não explica. A História humana é um processo dramático de conversão de
valores em fins e de crises culturais resultantes da perda de força axiológica, verificada
em fins que uma nova geração se recusa a "reconhecer".
Fins e Categorias do Agir
Como diversos são os valores e, de consequência, os fins que o homem se propõe, a
ação teleologicamente determinada ou o ato, pode ser discriminado segundo tenha por
fim:
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Conhecer ou realizar algo, sem visar direta e necessariamente a outras ações
possíveis (ações de natureza teorética, ou de natureza estética).
Conhecer ou realizar algo, visando direta e necessariamente a outras ações
possíveis (ações de natureza prática: ou econômicas, ou éticas).
Na primeira categoria, as ações de tipo teorético têm como elementos conclusivos
juízos, cujas expressões mais altas são princípios e leis; enquanto que as de tipo
estético se resolvem em formas. No primeiro caso, graças a princípios e a leis,
explicam-se os múltiplos aspectos do "ser", como o fazem a Matemática, a Física, a
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Biologia, a Sociologia etc. (atividades teoréticas); ao passo que, pelas formas, se
objetivam os sentimentos e os impulsos, os motivos de beleza, sendo tanto mais
perfeitas quanto maior a riqueza dos fins (atividade estética).
A distinção que aqui fazemos entre a atividade que tem por fim formular leis ou
realizar formas, e a atividade ética, que se converte necessariamente em normas,
encontra parcial correspondência no ensinamento aristotélico da Ética a Nicômaco (VI,
7, 1.141-b, 9 e segs.), onde se distingue "deliberação" de "cognição", a primeira relativa
às coisas humanas que postulam fins e exigem "prudência"; a segunda concernente ao
conhecimento objetivo daquilo que não pode ser de outro modo: no primeiro caso, o
conhecer é pressuposto do agir (e a lei se converte em norma); no segundo, o conhecer
basta-se a si mesmo.
Se a ação humana se subordina a um fim ou a um alvo, há direção, ou pauta
assinalando a via ou a linha de desenvolvimento do ato. A expressão dessa pauta de
comportamento é o que nós chamamos de norma ou de regra. Não existe possibilidade
de "comportamento social" sem norma ou pauta que não lhe corresponda.
A cada forma de conduta corresponde a norma que lhe é própria. A conduta
religiosa implica normas ou regras religiosas, assim como a conduta moral implica
regras ou normas de ordem moral. Em geral, somos levados a confundir a conduta com
a sua norma, tão difícil é separar o problema do comportamento ético do de sua
medida.
Comportar-se, de certa forma, é proporcionar-se a uma regra; é integrar, no
processo da ação, aquela pauta que marca a sua razão de ser. É por tais motivos que
não podemos compreender o estudo das regras jurídicas ou morais como simples
entidades lógicas, como meras noções, sem a referência necessária ao problema da
ação, ao problema da realidade social.
Elucidada a correspondência entre norma e conduta, podemos esclarecer que a Ética
não é a doutrina da ação em geral, mas propriamente a doutrina da conduta enquanto
inseparável de sua razão ou critério de medida, de sua norma, mediante a qual se
expressa teleologicamente um valor. A Ética é, em suma, a ordenação da conduta, o que
equivale a dizer: a teoria normativa da ação.
Quando o homem age, desloca-se em relação a outros homens: toma uma
posição nova perante os demais, assume uma "dimensão" no plano social e histórico, e
o faz sempre na dependência de suas circunstâncias.
Todo o fazer humano se refere a homens. Mesmo quando o fazer humano tem
como fim a feitura ou a posse de uma coisa, esta é mera condição de uma relação interhomines. A conduta, portanto, é sempre um fato social e humano, um acontecer no
"habitat" natural do homem, que é a sociedade, embora, como vimos, nem toda ação
seja "conduta"
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3 - As compreensões unilaterais (empirismo e apriorismo) e
reducionistas da realidade jurídica (sociologismo, normativismo e
moralismo)
As Compreensões Unilaterais
1. O que é Empirismo?
A palavra empirismo vem do grego empeiria, que significa "experiência". É uma
doutrina filosófica que admite, quanto à origem do conhecimento, que este provenha
unicamente da experiência sensorial, em vez da razão. Para o empirismo a experiência
é fundamental, e o trabalho posterior da razão subordina-se a ela. Questiona o caráter
absoluto da verdade, posto que o conhecimento parte de uma realidade em constante
transformação, sendo tudo relativo ao espaço, ao tempo, ao humano.
Surgimento da Doutrina Filosófica
Com o Renascimento, no século XVII, iniciou-se um processo de transformação,
quando a classe burguesa procurava novas respostas e dentre elas, a própria busca do
conhecimento, ocorrendo assim uma mudança na cultura, formadora e definidora das
verdades sociais. Surgiram então, duas correntes filosóficas opostas, o inatismo e o
empirismo, sendo esta última o objeto de nosso estudo. O inatismo afirma que
nascemos com inteligência trazendo princípios racionais e idéias verdadeiras. Platão
defendia a tese do inatismo, indagando se não fosse à razão das idéias verdadeira, como
saberíamos distinguir o verdadeiro do falso. Para Descartes o inatismo possui três tipos
de idéias em nosso espírito que diferenciam com sua origem e qualidade. Idéias vindas
"de fora" aquilo que vemos e acreditamos, até que se prove o contrário, idéias fictícias
são aquelas que criamos em nossa imaginação e as idéias inatas são aquelas colocadas
por Deus em nosso espírito, correspondentes à verdade.
O empirismo tem suas controvérsias. Afirma que a razão, a verdade e as idéias
racionais são adquiridas através da experiência. Que já crescemos com os sentidos, a
visão, a audição, o olfato, o paladar e o tato, e é através desses sentidos e com a
experiência que desenvolvemos a nossa razão.
Cumpre ressaltar que o pensamento medieval não levava em consideração a
"natureza" porque estava totalmente voltado às questões de ordem religiosa. A
referência à natureza era apenas a citação das posições de Aristóteles, que eram
comentadas e raras vezes criticadas. O apelo maciço de Bacon à experiência somente
faz sentido tendo em vista esta peculiaridade do pensamento medieval como pano de
fundo. Aliás, este movimento verifica-se também nas artes plásticas, que no
Renascimento redescobrem a natureza, perdida na idade das trevas, pelos gregos e
romanos.
Reflexão: Empirismo x Direito
O empirismo é uma doutrina filosófica que tem por fundamento o
conhecimento adquirido através da experiência sensível, analisando suas duas formas
principais que são a sensação e a percepção, ou seja, segundo o pensamento empírico a
percepção é a única fonte de conhecimento constituindo a origem das idéias abstratas
formuladas pelo pensamento.
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A sensação apreende impressões vindas do mundo externo. Então se pode dizer
que todas as idéias tem origem na experiência sensível e a partir de dados da
experiência que, por abstração, o entendimento, ou o intelecto produz idéias.
E qual a relação entre a doutrina empirista e o direito? O direito é uma ordem
jurídica que rege o próprio Estado, enquanto comunidade e enquanto poder. Este
nasceu da necessidade das pessoas em resolver os conflitos, portanto suas regras são
baseadas e aplicadas conforme a necessidade e a experiência anterior de uma
sociedade. Essa experiência adquirida e não ensinada está presente no direito
consuetudinário, que se refere ao conjunto de regras baseadas em leis esparsas,
costumes, jurisprudência e convenções (Constituição Inglesa), também é uma
constituição histórica, fruto da lenta e contínua síntese da história e das tradições e um
determinado povo.
Consequentemente, esses costumes, essas experiências adquiridas, no decorrer
da história, e partindo deste conhecimento empírico, essa experiência adquirida,
começa-se aplicar o lado racional até chegar ao conhecimento através da ciência.
Nota-se também essa experiência sendo aplicada nos julgamentos pelos juízes
cujo dever é cumprir a lei de uma forma rígida e técnica, porém há o princípio da
persuasão o julgamento "secundum conscientiam" o juiz por sua vez regula a
apreciação e a avaliação das provas existentes nos autos, indicando a forma livre de sua
convicção. Tal princípio é notado, embora com certa atenuação, pelos tribunais do júri
compostos por pessoas comuns.
A partir do século XVI, começou a delinear-se o sistema intermediário do livre
convencimento do juiz, que se consolidou, sobretudo com a Revolução Francesa. Essa
liberdade de convicção, porém não equivale a sua formação arbitrária, o convencimento
deve ser motivado, podendo o juiz desprezar as regras legais que porventura existentes
e as máximas da experiência. Isto quer dizer que o juiz apesar de ser um técnico e ter
por dever proceder como tal, ele não conseguirá se abstiver de sua experiência sensível
adquirida ao longo do tempo.
O empirismo sempre vai estar presente em todas as ciências, pois através dele,
ou melhor, partindo dele é que existem condições de se chegar ao conhecimento
racional para daí se poder atingir a ciência.
As Compreensões Reducionistas
1. O Sociologismo Jurídico
Sob a expressão sociologismo jurídico fazem parte todas aquelas correntes que
procuram compreender o direito a partir do fato social e estudos segundo os nexos de
causalidade do mundo físico.
O sociologismo jurídico é um exagero da sociologia jurídica, esta, quando se
atem aos seus limites não pretende explicar o mundo jurídico, mas, ao contrário, é uma
arte de auxílio no bem decidir aos estudiosos baseado no conhecimento da realidade
coletiva.
Inegavelmente no fenômeno jurídico existe sempre uma certa condicionalidade
histórico-social. Caso observado for, o direito de propriedade, notar-se-á
imediatamente ao longo da história o quanto o fator econômico exerceu influência.
Se todo e qualquer sistema de normas jurídicas for condicionado por fatores
psicológicos, racial, demográficos, religiosos, econômicos etc. Deve-se evitar o
simplismo de explicações unilaterais de apresentar uma única raiz de fonte do direito.
Há doutrinas que exageram certos fatos sociais atribuindo-lhes a primazia, quando não
a exclusividade do surgimento do fenômeno jurídico.
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O fator econômico exerce uma influência decisiva no político e no direito , mas
por sua vez é também influenciado pelo direito. Deve-se examinar profundamente a
concepção da história ou a interpretação marxista da gênese do fenômeno jurídico.
Se Marx e Engels aponta o fato econômico como pivô do fenômeno jurídico;
Ratzel e Desmoulins e outros antopogeógrafos subordinam-no ao meio geográfico.
Glumpowicz e Lapouge o faz orbitar em misteriosas reservas étnicas. O certo é que no
sociologismo jurídico o fenômeno direito está sempre na dependência de variados
fatores sociais, e o erro consiste em atribuir um relevo excepecional e desmedido a um
deles.
O crerscente estudo dos fatos sociais levou tantos juristas a ver uma
oportunidade de lebertar o direito das garras de um ordenamento legal e estático diante
de uma conjuntura social e coletiva em constante mutação.
No Brasil, tal orientação já encontrava singnificativas representações, como
Tobias Barreto, Sílvio Romero, Pedro Lessas, João Arruda, Pontes de Miranda. /este
colocava que o direito sempre pressupõe no jurista o sociólogo, que fundamentalmente
deve primar pelo dever-ser. O legislador como o juíz não deveriam usar outros meios a
não ser o da sociologia, pois seria garia objetiva do direito. O ponto alto é a objetividade
fática, a verdade ( o ser) e não o dever. Ali está, o que importa não é a norma jurídica
como imperativo de comando, e nem como valor a realizar, mas sim os fatos sociais em
seus nexos de causalidade expressos em regras de caráter técnico.
Ao empirista a norma resulta das condições do momento da circunstância, ao
apriorista a norma advém das condições lógicas possíveis, é bom estar alerta que tanto
para um como para outro facilmente pode descambar em normativismo exacerbado.
Sociologistas há que alegam que o juíz deve ficar diante dos fatos concretos e ter
a liberdade de discipliná-los cientificamente, tendo consequentemente a liberdade de
criar a norma jurídica que o caso exige. Esta postura alcançou seu pponto alto no
chamdo “Direito livre”, e isto se chegou por ação de autores alemães e franceses que
levaram as últimas consequências alguns pontos de vistas dos juristas Ehrlich e Gény.
No final do século XIX e inícios do Século XX apareceu uma postura que
defendia o seguinte: O fato é o elemento predominante e essencial, e é nele que está a
regra de explicitação não na lei, logo ficaria totalmente dispensado a figura do
legislador já que o fato se autoesclarecia. O juíz deveria ser profundo conhecedor de
ciências sociais, logo seria capaz de operar com segurança toda ciência do direito a
partir daquilo que tivesse diante dos olhos.
Passado tantas décadas daquele instante, a coisa serenou; o juíz não se encontra
mais rigidamente subordinado ao ordenamento legal e as normas técnicos- formais,
logo não está alheio ao mundo das realidades humanas. Ele não age acima da lei
positiva e nem alheio as realidades circunstanciais. A verdade está no meio termo.
2. Positivismo jurídico: o normativismo de Hans Kelsen
Reflexo do positivismo científico do século XIX, o positivismo jurídico, como
movimento de pensamento antagônico a qualquer teoria naturalista, metafísica,
sociológica, histórica, antropológica etc. adentrou de tal forma nos meandros jurídicos,
que suas concepções se tornaram estudo indispensável e obrigatório para a melhor
compreensão lógico-sistemática do Direito.
Sua contribuição é notória no sentido de que fornece uma dimensão integrada e
científica do Direito, porém a metodologia do positivismo jurídico identifica que o que
não pode ser provado racionalmente não pode ser conhecido, ao estilo da exatidão
matemática; retira os fundamentos e as finalidades, contentando-se com o que ictu
oculi (passada de olhos) satisfaz às exigências da observação e da experimentação, daí
restringir-se ao posto (positum – ius positivum).
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É a colocação da realidade fática como único objeto merecedor de consideração
por parte da Ciência Jurídica que faz com que a razão de ser do positivismo jurídico
reduza-se à compreensão da norma e do sistema jurídico no qual ela está inserida. De
fato, será o reducionismo uma característica fundamental dos positivistas.
Com os pilares teóricos fixados no método positivista é que Hans Kelsen
procurou delinear uma Ciência do Direito desprovida de qualquer outra influência que
lhe fosse externa. Assim, alhear o fenômeno jurídico de contaminações exteriores a sua
ontologia seria conferir-lhe cientificidade e autonomia. Dessa forma, por meio das
ambições de sua teoria, ter-se-ia uma descrição do Direito que correspondesse apenas a
uma descrição pura do Direito.
As categorias do ser e do dever-ser são os pólos com os quais lida Hans Kelsen,
para distinguir realidade e Direito, que caminham em flagrante dissintonia, em sua
teoria. Mais precisamente, é com a quebra da relação ser/dever-ser que pretende Hans
Kelsen operar para diferir o que é jurídico (fenômeno jurídico puro) do que não é
jurídico (cultural, sociológico, antropológico, ético, metafísico, religioso).
A atitude do jurista, segundo Kelsen, deve consistir num partir da norma
jurídica dada, para chegar à própria norma jurídica dada. Para o positivismo
kelseniano, a norma jurídica é o alfa (α) e o ômega (Ω) do sistema normativo, ou seja, o
princípio e fim de todo o sistema.
Kelsen termina por afirmar que a “ciência jurídica não tem espaço para os juízos
de justiça”, mas somente para os juízos de Direito. O que se pode reconhecer é que
existe um consentimento de todas as pessoas em aceitar a Constituição, e é a partir
desse simples dado que deve raciocinar o jurista.
Kelsen esclareceu repetidamente que a sua teoria é uma teoria pura do direito
positivo e não uma teoria do direito puro, ou seja, de um direito desligado da realidade.
A ciência do Direito não tem a ver com a conduta efetiva do homem, mas só com o
prescrito juridicamente. Não é uma ciência de fatos, mas de normas; o seu objeto não é
o que é ou acontece, mas sim um complexo de normas.
O que a Teoria Pura procura identificar como relevante para a pesquisa jurídica
é o estudo da validade (existência de uma norma jurídica), a vigência (a produção de
efeitos de uma norma jurídica), a eficácia (condutas obedientes e observantes a uma
norma jurídica). Toda pesquisa da Teoria Pura se resume e se baseia no estudo da
norma jurídica.
Discutir sobre justiça é discutir sobre normas morais. Para Kelsen, porém,
discutir sobre justiça não é discutir sobre Direito, e vice-versa, porque toda ordem
jurídica é definida pelas normas jurídicas que possui. A doutrina da justiça não é objeto
de conhecimento do jurista, que deve estar afeito a compreender a mecânica das
normas jurídicas.
Justiça e injustiça nada têm a ver com validade de determinado direito positivo;
é essa a nota distintiva entre Direito e Ética. A validade de uma ordem jurídica não vem
contrariada pelo simples fato de que o Direito se tenha construído contra a moral. O
que é válido prepondera sobre o que é justo, pois o que á válido está de acordo com os
modos de existência normativa de dado ordenamento jurídico; o que é justo, por sua
vez, está no plano das especulações, dos valores etc. e aceitar que o justo prepondera
com relação ao válido é trocar o certo pelo dúbio.
Uma teoria sobre justiça responde por concepções acerca do justo e do injusto, e
o que é justo e injusto nem sempre é claro e unânime. Contudo, que há um justo e que
esse justo é um justo relativo, isso Kelsen admite.
O relativismo da justiça é, na teoria kelsiana, fruto do positivismo jurídico. Em
síntese, as idéias de que a ciência pura é a ciência a-valorativa, a-histórica, a-ética etc.
refletem o entendimento de que é possível, em ciências humanas, não só extrair do
fenômeno jurídico o que é não-jurídico, mas também compreender o fenômeno jurídico
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como mecânica dotada de certeza, rigorismo e especificidade; tudo isso é feito com
sacrifício de valores.
3. Moralismo jurídico
Neojusnaturalismo defendido por Cathein e Coing não sustenta mais a
tradicional ideia do sistema de normas eternas e imutáveis, mas as situalizam em um
determinado momento histórico. O direito possui ainda um conteúdo ético, do qual se
deduzem as normas, mas tais normas são condicionadas em um determinado período
histórico, e que os membros da sociedade do momento interpretam os valores. Os
valores, mesmo sendo absolutos, são descobertos progressivamente e podem também
ser esquecidos.
Radbruch defende que uma lei só é válida se justa; se ela viola a justiça (por
exemplo, se nega os direito humanos fundamentais) lhe deve ser negado o caráter
jurídico. Existe um direito supra legal que justifica a desobediência às leis injustas (por
exemplo: aquelas do Terceiro Reich). É uma questão de limite, seguindo assim a
chamada "fórmula de Radbruch", quando a injustiça do direito positivo alcança tal
limite que a certeza do direito não conta mais, então o direito positivo injusto deve
ceder diante da injustiça.
O jusnaturalismo contemporâneo se insere no sulco do assim chamado
moralismo jurídico (ou perfeccionismo), segundo o qual, em contraposição ao
liberalismo, os indivíduos não deveriam ser deixados livres para escolher qualquer
valor ou fim, porque a conservação da moralidade condividida por uma sociedade é um
valor que é perseguida com o instrumento coercitivo do direito. Do jusnaturalismo tais
valores são inseridos como verdade ética objetiva.
Fuller por sua vez afirma que no direito existe uma moralidade interna
constituída de uma série de princípios, cujas normas são gerais, cognoscíveis, não
retroativas, não conflitantes, de adimplemento não impossíveis, de mutação não muito
rápida, de aplicação não excessivamente infiel, às quais cada direito positivo deveria
adeguar-se. Processual e não substancial, porque Fuller não indica os conteúdos das
normas 9se devesse fazê-lo indicaria um, o princípio mais importante: conservar a
comunicação com os princípios similares. A transmissão de um homem a outro das
consciências é à base da vida.
Finnis em sua postura neoclássica do direito natural, isto é, retomando Tomás
de Aquino, ele individualiza sete bens fundamentais: a sabedoria, a vida, o jogo, a
experiência estética, a amizade, a religião e a razão prática (aplicação da própria
inteligência à realidade, como escolha de açã0). Estas alcançadas somente através da
introspecção e reflexão (autoevidente), não através da observação empírica e nem
demonstrável, são as condições para o desenvolvimento e a realização dos indivíduos. O
direito deve garantir a realização dos planos de vida dos homens inspirados naqueles
sete bens; podem fazer isto traduzindo em normas jurídicas algumas normas morais
inderrogáveis, como aquelas contra o matar, mas também aquelas que vetam o suicídio,
o adultério, a contracepção etc. Isto se apoia sobre uma sólida tradição que tem bases
coagente seja na fé seja na razão, e defendem o ideal perfeccionista de uma vida boa,
válida para todos.
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4 – Teoria Tridimensional do Direito
A Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale é uma concepção integral
do fenômeno jurídico. O autor da Teoria Tridimensional definiu o Direito como
"realidade histórico-cultural tridimensional, ordenada de forma bilateral atributiva,
segundo valores de convivência".
Miguel Reale demonstra, situando o direito na região ôntonica dos objetos
culturais, que, pela análise fenomenológica da experiência jurídica, confirmada pelos
dados históricos, a estrutura do direito é tridimensional, visto como elemento
normativo, que disciplina os comportamentos individuais e coletivos, pressupõe
sempre uma dada situação de fato, referida a determinados valores.
Antes do surgimento da "Teoria Tridimensional do Direto" por Miguel Reale em
1940, outros juristas já expunham suas "teorias" em âmbito internacional; Hans
Kelsen, Wilhelm Sauer dentre outros.
Para Kelsen, o Direito compreendia somente em norma, as demais concepções
como fato e valor não entravam em seu conceito. Por sua vez, Wilhelm Sauer, expunha
sua teoria de "Trilateralidade Estática" que tinha como mérito repudiar as concepções
unilaterais ou reducionistas da experiência jurídica, mas não logram preservar a
unidade do Direito, limitando-se quando muito, a uma combinação extrínseca de
perspectivas.
Criticando a tridimensionalidade de Sauer, Reale expõe que:
Não nos explica, com efeito, como é que os três elementos se integram em
unidade, nem qual o sentido de sua interdependência no todo. Falta a seu trialismo,
talvez em virtude de uma referibilidade fragmentada ao mundo infinito das "mônadas
de valor", falta-lhe o senso de desenvolvimento integrante que a experiência jurídica
reclama.
Ainda, dando um apanhado geral a cerca de todas as teorias ao contrario da
Tridimensionalista o jusfilósofo brasileiro Miguel Reale dispõe: (...) a norma é a
indicação de um caminho, porém, para percorrer um caminho, devo partir de
determinado ponto e ser guiado por certa direção: o ponto de partida da norma é o fato,
rumo a determinado valor. Desse modo, pela primeira vez, em meu livro Fundamentos
do Direito, comecei a elaborar a tridimensionalidade. Direito não é só norma, como
quer Kelsen, Direito, não é só fato como rezam os marxistas ou economistas do Direito,
porque Direito não é economia. Direito não é produção econômica, mas envolve a
produção econômica e nela interfere; O Direito não é principalmente valor, como
pensam os adeptos do Direito Natural tomista, por exemplo, pois o Direito ao mesmo
tempo é norma, é fato e é valor.
A Tridimensionalidade do Direito como: Fato, Valor e Norma.
Antes de compreender especificamente cada fator determinante da
Tridimensionalidade do Direito, se deve verificar o que Miguel Reale afirma acerca do
conjunto tridimensional; fato, valor e norma: Fato, valor e norma estão sempre
presentes e correlacionados em qualquer expressão de vida jurídica, seja ela estudada
pelo filósofo ou sociólogo do direito, ou pelo jurista como tal, ao passo que, na
tridimensionalidade genérica ou abstrata, caberia ao filósofo apenas o estudo do valor,
ao sociólogo a do fato e ao jurista o da norma (tridimensionalidade como requisito ao
direito).
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Por sua vez, Maria Helena Diniz, o complementa quando cita que “se o direito é a
integração normativa de fatos e valores, ante a triplicidade dos aspectos do jurídico:
fato, valor e norma, não há como separar o fato da conduta, nem o valor ou finalidade a
que a conduta está relacionada, nem a norma que incide sobre ela".
•
Fato
Em relação ao fato, Reale, acentua, que um fato nunca é isolado, mas um "conjunto
de circunstancias" . Conforme a concepção de Paulo Nader, que concorda e explana a
respeito deste veremos que : O fato - uma dimensão do Direito - é o acontecimento
social referido pelo Direito objetivo. È o fato interindividual que envolve interesses
básicos para o homem e que por isso enquadra-se dentro dos assuntos regulados pela
ordem jurídica.
•
Valor
Visto fato, ainda por Paulo Nader, valor nada mais é que o elemento moral do
Direito e ainda: (...) é o ponto de vista sobre a justiça. Toda obra humana é empregada
de sentido ou valor, bem como o direito.
Com o mesmo ponto de vista, o Prof. Dr. Silvio Venosa relata-nos a cerca do valor
da seguinte forma: A medida de valor que se atribui ao fato transporta-se inteiramente
para a norma. Exemplo: suponha que exista número grande de indivíduos em uma
sociedade que necessitem alugar prédios para suas moradas. Os edifícios são poucos e,
havendo muita demanda, é certo que pela lei da oferta e da procura os preços dos
imóveis a serem locados elevem-se. O legislador, apercebendo-se desse fato social,
atribui valor preponderante à necessidade dos inquilinos, protegendo-os com uma Lei
do Inquilinato, que lhes dá maior proteção em detrimento do proprietário. Há aqui um
fato social devidamente valorado que se transmutou em norma.[...]
•
Norma
Diante do exposto, Maria Helena Diniz afirma sobre norma: A norma deve ser
concebida como um modelo jurídico, de estrutura tridimensional compreensiva ou
concreta, em que fatos e valores se integram segundo normas postas em virtude de uma
ato concomitante de escolha e de prescrição (ato decisório) emanado do legislador ou
do juiz, ou resultante das opções costumeiras ou de estipulações fundadas a autonomia
da vontade das particulares.
Concluindo
Diante de todo o exposto, o Direito para Reale é fruto da experiência e localizase no mundo da cultura. Constituído por três fatores, o Direito forma-se da seguinte
maneira: Um valor- podendo ser mais de uma- incide sobre um prisma (área dos fatos
sociais) e se refrata em um leque de normas possíveis que compete ao poder estatal
escolher apenas uma capaz de alcanças os fins procurados
E após termos analisado todos os vértices da Teoria Tridimensional do Direito,
que surgiu na década de 40 pelo jus - filósofo Miguel Reale, mudando toda a visão
retrograda a muito implantada nos operados do direito, podemos compreender como a
estrutura tridimensional rejeita o tridimensionalismo abstrato, auxiliando-nos a operar
um direito, mas justo e eficaz.
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5 – A Tríplice Perspectiva da Palavra Direito
Atribuir conceituação ao direito torna-se tarefa difícil ao verificarmos a gama de
significados que podem ser atribuídos à palavra, tratando-se de um vocábulo
polissêmico cujo emprego se manifesta de variadas formas.
Neste sentido podemos entender o direito como um conjunto de normas que
regulamentam as relações sociais, bem como, podemos compreendê-lo como um ramo
do conhecimento humano que estuda estas normas. Nestes casos, a mesma palavra é
utilizada para designar uma ciência (ao lado da Psicologia, Medicina etc.) como o
objeto por ela estudado (regras e princípios jurídicos).
Muitas vezes, também emprega-se a palavra "direito", como sinônimo de
justiça, quando, por exemplo, escutamos alguém dizer: "não é direito que a mãe não
fique com a guarda de seu filho". Aqui, verificamos uma atribuição de valor a um dado
acontecido.
Outro sentido do vocábulo "direito" pode ser verificado como sinônimo de poder
individual, quando, por exemplo, alguém diz: "tenho o direito a meu voto". Neste caso,
a palavra está denotando uma subjetividade: um direito subjetivo.
Por fim, quando falamos, por exemplo, que "o direito há cinquenta anos, devido
às descobertas e pesquisas da biomedicina, não é o mesmo de hoje", estamos nos
referindo a um direito como fato social, isto é, como uma efetividade histórica, cultural
e social.
Miguel Reale, ao demonstrar este amplo espectro semântico em uma mesma palavra
nos ensina: Uma análise em profundidade dos diversos sentidos da palavra direito veio
demonstrar que eles correspondem a três aspectos básicos, discerníveis em todo e
qualquer momento da vida jurídica: um aspecto (o direito como ordenamento e sua
respectiva ciência); um aspecto fático (o direito como fato, ou em sua efetividade social
e histórica) e um aspecto axiológico (o direito como valor de justiça).
Deste modo, podemos observar o fenômeno jurídico sob três perspectivas,
integradas entre si, que são refletidas nos múltiplos significados do próprio termo
"direito" e em toda experiência jurídica, aglutinadas na proposição: fato, valor e norma.
Ou seja, o direito pode ser observado como realidade histórica e social; como uma
ponderação valorativa que as pessoas impetram a esta realidade; e, por sucedâneo,
como um conjunto de normas e sua respectiva ciência, criadas e aplicadas conforme
esta valoração.
Assim, o direito não seria apenas "normas e nada mais do que normas" como
pontificava Hans Kelsen, compreendendo o direito como uma ciência do dever-ser que,
para uma delimitação precisa de seu objeto, deveria não se ater aos estudos sociais ou à
compreensão da ideia de justiça, assuntos estes, que seriam de competência, tão
somente, de outras ciências como a sociologia e a filosofia. Ora, a norma jurídica não
tem sentido se desligada das exigências fáticas e de uma dimensão axiológica
necessária.
Também, não podemos reduzir o direito ao plano meramente fático,
entendendo-o somente como um fenômeno social, como entendia Durkheim, ou
apenas como uma produção econômica como rezava os marxistas e economistas.
Definitivamente, direito não é sociologia e não é economia, mas sim, uma ciência
autônoma, que interfere na realidade estudada por estes e demais ramos do
conhecimento.
Do mesmo modo, direito não é só valor, isto é, ele não se reduz apenas à noção
de bom senso e ideia de justiça, como pensavam os adeptos do Direito Natural tomista.
Apesar de balizada por preceitos éticos e morais é cediço, que o direito nem sempre se
coaduna com estes valores.
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Em verdade, segundo a tridimensionalidade de Miguel Reale, direito é tudo isto
junto. Os fatos sociais são normatizados segundo um juízo de valor dominante no corpo
social, por isto, a clássica fórmula realeana: "O direito é uma integração normativa de
fatos segundo valores".
Para todos os fatos sócias existem um determinado valor atribuído a eles, em
maior ou menor grau, sendo que esta gradação é que culmina na existência ou não de
uma normatização é, caso existindo, em sua intensidade e aplicação. Ou seja, a criação
de uma norma (normogênese) ocorre (ou deveria ocorrer) conforme a gradatividade do
valor que as pessoas atribuem a um determinado fato, bem como, é este valor que será
considerado no momento de sua aplicação. Assim, não só a elaboração das normas que
deve ser pautada nesta integração tríplice, como uma experiência axiológica concreta e
não apenas como um ato lógico redutível a um silogismo.
Miguel Reale está inter-relação tripartite analisando como grandes filósofos
como Vanni, Del Vecchio e Adolfo Ravá dividiam, didaticamente, a filosofia do direito
em três partes: "uma destinada à teoria dos fenômenos jurídicos, outra cuidando dos
interesses e valores que atuam na experiência jurídica e, finalmente, uma terceira
relativa à teoria da norma jurídica" (REALE, 1994, p. 177). Seriam respectivamente, o
culturalismo jurídico, a deontologia e a epistemologia jurídica.
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6 – Tridimensionalismo abstrato e concreto
A análise fenomenológica do direito, e confirmada pelos dados históricos,
demonstra que o direito tem uma estrutura tridimensional. Há uma correlação
essencial entre os aspectos fáticos, sociológico e prescritivo, que não foi logo percebida
pelos juristas, mas que foram antes vistos ou compreendidos por um destes três
aspectos, dando assim origem as teorias reducionistas. Aqueles que defendiam a inteira
separação desses três aspectos e apesar de usarem métodos apropriados em suas
pesquisas sempre se descortinavam diante deles a questão da interdependência desses
elementos.
As doutrinas que se aperceberam do problema fizeram-no de modo abstrato,
isto é, sabiam que havia um vínculo, mas continuaram a tratar o assunto de forma
desvinculada.
Há outros autores que concluíram e reconheceram que uma visão integral do
direito só seria obtida mediante a consideração dos três aspectos (fato, valor, norma),
entendendo ser tarefa do jusfilósofo realizar a síntese final das análises feitas
anteriormente pelos especialistas que estudam o direito como fato (sociólogos,
etnólogos, psicólogos e historiadores); dos que estudam o direito como valor (axiólogos
e politicólogos do direito); e dos que estudam o direito como norma (juristas e lógicos
do direito). O jusfilósofo tomaria o resultado do estudo dos destas três áreas e comporia
uma “enciclopédia”; e a isso se poderia chamar de tridimensionalismo genérico.
A seguir breve análise do pensamento de Gustav Radbruch da corrente
germânica e também uma breve palavra da corrente anglo-saxônica representada pelos
pensadores Roscoe Pound e Julius Stone.
O Trilogismo – Posição Relativista de Gustav Radbruch
Expressiva é sua teoria, pois renova a distinção entre realidade e valor, entre
ser e dever-ser. Acrescenta ainda que entre a categoria de “juízo de existência” e “juízo
de valor” é necessário estabelecer uma categoria intermédia, ou seja, a dos juízos
referidos a juízos referidos a valores, assim como entre as categorias de natureza e de
ideal, é preciso dar um lugar à categoria da cultura, isto é, a ideia de direito é sem
dúvida um valor; o direito, porém, não é um valor, mas uma realidade referida a
valores, ou seja, um fato cultural.
As pesquisas do filósofo, do jurista e do sociólogo se desenvolvem em planos
distintos, obedecem a estruturas e princípios metodológicos diversos, e no final há três
tipos de validades entre si antinômicas, a saber: a validade jurídica, que alguns querem
explicar por si mesma; a validade social, que o sociologismo alicerça em processos de
eficácia; e a validade ética, cuja fundamentação em vão se tem procurado alicerçar.
É com grande sutileza que Radbruch distingue as teorias jurídica, sociológica e
filosófica do direito, apontando as suas contradições rigorosamente seguidas. Por
exemplo: O jurista que validasse uma norma tão somente em critérios técnico-formais,
jamais poderia negar validez aos imperativos baixados por um paranóico que viesse a
se tornar rei. Outro exemplo: Aquele que repousasse o direito em razões históricas ou
sociológicas deveria avaliar o grau de obrigatoriedade do direito pelo grau de sua real
eficácia. E por fim ainda um exemplo: Quem identificasse o direito com justo se veria
obrigado a rejeitar qualquer lei positiva contrária aos seus anseios de justiça, e isto
levaria a realidade ao caos, pois não há meios científicos de determinar esse valor
supremo do direito.
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O tríplice aspecto da validade corresponde ao tríplice problema dos valores do
direito: justiça, certeza jurídica, fim; e nisso tudo se revelam contradições e incertezas,
e não cabe a filosofia tornar a vida fácil, mas problematizá-la.
O Trialismo de Roscoe Pound e Julius Stone
Nos países anglo-saxônicos, o trialismo se desenvolveu em maior contato com a
experiência sociológica, tendo maior contato com pesquisas positivas que com posturas
filosóficas.
Desde Roscoe Pound começou a ser percebidas as insuficiências as explicações
unilaterais do direito, e começa a nascer uma preocupação com uma explicação mais
orgânica; explicação que tenham as contribuições alcançadas pelo sociólogo, pelo
filósofo e pelo jurista. Roscoe chega à conclusão que as diferentes escolas de juristas do
século XIX observaram elementos distintamente do mesmo agregado que se chama
direito. Aqueles adeptos da corrente analítica observaram acentuadamente os
preceitos; os da tendência historicistas se fixaram nos costumes como condicionadores
da vida; e os ligados à filosofia mais aos fins éticos. Termina por concluir que estes três
pontos de vista se complementam.
Julius Stone, por sua vez, afirma que há três componentes na Jurisprudência, a
saber: Jurisprudência Analítica, Jurisprudência Sociológica, Teoria da Justiça; com isso
ele discorda de Kelsen que exclui as duas últimas. O que Stone pretende é assegurar um
lugar a estas duas últimas enquanto que Kelsen pretende desacreditá-las, isto porque
não tem o seu nascedouro no campo jurídico.
Stone afirma que a Jurisprudência Analítica é uma lógica do direito que analisa
termos jurídicos. A Jurisprudência Sociológica visa observar e interpretar os efeitos do
direito sobre o homem e do homem sobre o direito e finalmente a Teoria da Justiça visa
valorar em termos de dever-ser os conteúdos, os objetos e os efeitos do direito.
A postura stoneana não chega a reconhecer que o direito é sempre
tridimensional em sua estrutura, no entanto é perceptível uma sutil ligação entre as
três dimensões.
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7 – Normatividade e Historicidade do Direito
Normatividade do Direito
Sendo a norma jurídica a solução superadora de conflitos de interesses, surge
como algo destinado a durar, dependendo sua maior ou menor duração de um conjunto
de fatores políticos, econômicos, éticos,... Em linhas gerais, o êxito de um dispositivo
legal depende da correspondência existente entre a sua vigência e as estruturas sociais,
como condição sine qua non de sua eficácia.
A norma já é um dado de referência pré-constituído, um "querer já manifestado
genericamente" e posto por ato de autoridade, torna-se necessário interpretá-la à luz
das circunstâncias histórico-sociais em que ela se situa, bem como verificar qual a sua
significação real a partir de sua vigência.
Dizemos que a norma jurídica deve ser concebida como uma ponte elástica,
dada as variações semânticas que ela sofre em virtude da intercorrência de novos
fatores, condicionando o trabalho de exegese e de aplicação dos preceitos. Quando a
norma não mais se ajusta à experiência fático-axiológica, a via que se abre
juridicamente è a da revogação ou da ab-rogação.
É necessário aprofundar o estudo dessa "experiência normativa", para que não
ocorram cogitações abstratas, julgando erroneamente que a vida do Direito seja
reduzida a uma simples inferência de Lógica formal, como se uma decisão judicial, por
exemplo, fosse equiparável a um silogismo, cuja conclusão resulta da simples posição
das duas premissas. Nada mais ilusório do que reduzir o Direito a uma geometria de
axiomas, teoremas e postulados normativos, perdendo-se de vista os valores que
determinam os preceitos jurídicos e os fatos que os condicionam, tanto na sua gênese
como na sua ulterior aplicação.
Ocorre, todavia, que, quando uma regra de Direito entra em vigor, a sua
vigência necessariamente se correlaciona com a vigência das normas preexistentes, o
sentido de umas podendo influir sobre o sentido de outras. Assim como os valores são
entre si solidários, as normas jurídicas também se correlacionam e se implicam,
distribuindo-se e ordenando-se em institutos e sistemas, cujo conjunto compõe o
"ordenamento jurídico".
Costuma-se dizer que uma lei só pode ser revogada por outra lei de igual ou
superior categoria, e esta é uma verdade no plano da vigência, não o sendo, porém, no
plano de sua correlação com a eficácia. Há, com efeito, leis que só possuem existência
formal, sem qualquer conseqüência ou reflexo no campo das relações humanas (são as
chamadas leis do papel) até ao ponto do legislador se esquecer de revogá-las. Se não se
opera, salvo casos especiais, a revogação das leis pelo continuado desuso, este as
esvazia de força cogente, levando o intérprete, ao ser surpreendido com a sua
imprevista invocação, a encapsulá-las no bojo de outras normas, de modo a atenuarlhes o ruinoso efeito.
Quando o ser humano, segundo prismas valorativos, aprecia uma porção da
realidade humana, e essa estimativa é comum a outros homens, abre-se a possibilidade
de uma exigência social consubstanciada no que chamamos norma, que pode ter a força
específica de uma norma jurídica quando, pela intersubjetividade dos fins visados, o
processo normativo é garantido pelo Poder.
Para o jurista, em suma, o Direito não é só norma, mas culmina sempre em
sentido de normatividade, sendo impossível reduzi-lo à mera conduta.
Nenhuma expressão de beleza é toda a beleza. Uma estátua ou um quadro, por
mais belos que sejam, não exaurem as infinitas possibilidades do belo. Assim, no
mundo jurídico, nenhuma sentença é a Justiça, mas um momento de Justiça. Se o valor
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e o fato se mantêm distintos, exigindo-se reciprocamente, em condicionalidade
recíproca, podemos dizer que há entre eles um nexo ou laço de polaridade e de
implicação. Como, por outro lado, cada esforço humano de realização de valores é
sempre uma tentativa, nunca uma conclusão, nasce dos dois elementos um processo,
que denominamos "processo dialético de implicação e polaridade", ou, mais
amplamente, "processo dialético de complementaridade", peculiar tão somente à região
ôntica que denominamos cultura.
O juiz ou o advogado, que tem diante de si um sistema de Direito, não o pode
receber apenas como concatenação lógica de proposições. Deve sentir que nesse
sistema existe algo de subjacente, que são os fatos sociais aos quais está ligado um
sentido ou um significado que resulta dos valores, em um processo de integração
dialética, que implica ir do fato à norma e da norma ao fato.
O Direito, visto na totalidade de seu processo, é uma sucessão de culminantes
momentos normativos, nos quais os fatos e os valores se integram dinamicamente.
As normas não são todo o fenômeno jurídico, mas apenas os momentos culminantes de
um processo.
Historicidade do Direito
O direito é um fenômeno histórico. Afirmar isso significa, primeiramente, que
não existe “o” direito, enquanto conceito absoluto, eterno e imutável. Buscar-se uma
definição universal para o direito, válida em todos os momentos e em todas as
sociedades humanas, seria esforço inútil e pouco produtivo.
Na Grécia Antiga, o direito possuía caracteres muito peculiares, ligando-se ao
exercício da cidadania e à delimitação do espaço político por meio das normas. Não era
um campo autônomo, pois pressupunha a política e concretizava a ética. Durante o
Império Romano, o direito torna-se um mecanismo de resolução de disputas, com
rituais próprios e relativa autonomia dos outros campos.
Avançando para a Idade Média, o direito passa a confundir-se como os poderes
dos nobres, ligados à propriedade privada da terra. No Absolutismo, o direito
transforma-se em uma decorrência do poder divino dos reis, derivando da vontade real.
Apenas no capitalismo recente o direito é identificado com a norma jurídica, em
especial a lei, o contrato e a sentença. O direito de um povo passa a ser entendido como
o conjunto de normas jurídicas criado ou reconhecido pelo Estado que o representa.
Mais precisamente, passamos a chamar direito ao processo contínuo de criação de
normas jurídicas. Algo, portanto, bem diferente daquilo o que já foi o fenômeno
jurídico.
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8 – Fundamento, eficácia e vigência
A questão do fundamento, eficácia e vigência do direito se coloca no âmago de todas
as formas de pesquisa da juridicidade. Isto corresponder a estas perguntas:
a) Que é que torna eticamente legítima a obrigatoriedade doa direito?
b) Que é que condiciona logicamente a validade das regras jurídicas?
c) Que é que torna uma norma jurídica socialmente existente?
É a filosofia do direito que indaga soabre as condições primeiras da validade do
direito, ou seja, sobre a “validade da validade” em seus três aspectos: o ético, o técnicojurídico e o histórico-social. A filosofia do direito é a ciência das condições
transcendentais da validade jurídica.
I – Problema do fundamento
Indagar o fundamento do direito é estudar os valores enquanto resultam fins,
assim tal indagação não se perde em abstração formal, tendo Omo pano de fundo uma
sociedade justa. Ao contrário põe-se no plano histórico das formas possíveis de
convivência.
Ao que se consta a verdade está na história da experiência axioló0gia. É que há
bens ou formas de atuar valores que sofrem a corrosão do tempo, assim que podem ser
chamados de invariantes axiológicos.
Mesmo cientes das mutações da dinâmica histórica, a vida do direito pressupõe
um núcleo resistente, uma “constante axiológica do direito”, que esteja a salvo de
transformações políticas, técnicas ou econômicas.
A existência de uma constante axiológica é que possibilita a compreensão do
fenômeno jurídico Omo universal. O fenômeno jurídico traduz oi que há de universal
no espírito humano, aquilo que é comum entre o ego e o alter.
Assim como hoje somos diferentes do que éramos dias atrás, no interno não perdemos
a nossa essência, isto é, uma constante psíquica e moral que nos individualiza. Do
mesmo modo os fatos jurídicos sofrem alterações, mas persiste dele o “eu jurídico”. A
questão do fundamento está ligado ao direito natural.
Entende-se por fundamento, no plano filosófico, o valor ou o complexo de
valores que legitima uma ordem jurídica, dando a razão de sua obrigatoriedade. Uma
regra tem fundamento quando visa realizar ou tutelar um valor reconhecido necessário
à coletividade.
II – O problema da vigência
Em uma concepção puramente normativista, o problema da vigência se confunde
com os requisitos formais indispensáveis para que uma regra de direito adquira ou pêra
vigor. Ei-los:
•
•
•
•
Legitimidade do órgão emanador;
Compatibilidade com outros de maior hierarquia;
Sanção;
Promulgação e publicação.
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Profº Antonio Babeto Spinelli
Ao contrário disso abe ver a referência aos valores que determinaram o
aparecimento da regra jurídica, assim como às condições fáticas capazes de assegurar a
sua eficácia social. Cabe estudar duas correlações:
•
•
Fundamento com vigência: Há uma força nos valores que os inclina a se
realizarem e atualizar-se mediante a vigência. Os valores são como os deuses
pagãos que só viúvem bem entre os mortais.
Vigência com eficácia: Aqui é uma síntese dialética, uma se completa na outra.
III – O problema da eficácia
Max Ernst Mayer diz: “Validez ou vigência equivale à influência social, a
eficácia”. Assim a medula de toda a legislação, considerada do ponto de vista da
filosofia do direito é o reconhecimento de normas por uma sociedade organizada,
notadamente por um estado, e a sua validez aparece como sendo “a forma “psicológicosocial do objetivamente do justo”.
Todo código é um conjunto de preceitos lógicos e que tem a pretensão de ser
pleno, de se bastar para explicar todos os pontos da vida.
É bom lembrar que o direito foi feito para a vida e não o contrário. O hábito de
se viver vai influindo nas óticas da vida, por isso quando se chega ao ponto do
insuportável deve se atualizar, para ter uma ressonância no seio da comunidade.
Pontos do direito natural não se desgastam.
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9. A teoria crítica do direito
A Teoria Crítica é comumente associada ao que convencionou-se chamar de
“Escola de Frankfurt”. No entanto, não se trata especificamente de uma escola de
pensamento, uma vez que seu grupo de pensadores originários (Horkheimer, Adorno,
Pollock, Marcuse, Benjamin, Fromm, Habermas) possuíam diferenças teóricas, sem
mencionar no posterior rompimento de Habermas com os fundamentos do grupo (por
exemplo, quanto à centralidade do trabalho enquanto mecanismo de emancipação
humana).
De fato, como expõe Freitag, inexiste na Escola de Frankfurt e na Teoria Crítica
um “consenso epistemológico”, ou seja, não é uma visão única do mundo. Enquanto
teoria social, a Teoria Crítica pretende “denunciar a repressão e o controle social a
partir da constatação de que uma sociedade sem exploração é a única alternativa para
que se estabeleçam os fundamentos da justiça, da liberdade e da democracia” (Faria, 2004,
p. 25).
Sem dúvida, essa constatação a que se refere Faria é de fundamental
importância para a compreensão da necessidade de instituir-se uma efetiva crítica do
Direito, tendo em vista a existência de abordagens jurídicas fundamentadas (apenas no
plano do discurso) em uma teoria crítica, mas que adotam uma postura meramente
reformista, ao limitar-se a atuar dentro do sistema econômico vigente sem questionar o
modelo e sem preocupar-se em estabelecer raízes para uma verdadeira emancipação do
sujeito.
Desta forma, a Teoria Crítica vincula-se a um pensamento marxista sem abdicar
da crítica a certos marxismos e incorporando à análise Freud, Weber e outros
pensadores não marxistas, tornando-a uma concepção interdisciplinar que congrega
contribuições da estética, da lingüística, da cultura, da psicologia social, da psicanálise,
da economia, da ciência política, da psicossociologia, das ciências sociais, da história.
Importante destacar que tal interdisciplinaridade não pode ser confundida com
uma multidisciplinaridade, ou transdisciplinaridade, ou uma abordagem holística ou
ainda pós-moderna, pois que pauta-se pela coerência epistemológica das áreas de
conhecimento que congrega. Porém, em que pese à interdisciplinaridade inerente à
proposta da Teoria Crítica, note-se que, como ressalta Assoun, as duas “pedras
angulares” da Teoria Crítica são de fato o marxismo e a psicanálise.
Ao contrário do que o senso comum estabelece, uma postura crítica, na ótica da
Teoria Crítica, não significa meramente ser crítico de idéias, conceitos, pesquisas,
estudos, correntes de pensamento. Uma postura crítica é aquela que adota uma
abordagem específica no estudo das relações sociais, especialmente no âmbito das
estruturas de controle e poder.
Aqui, é importante ressaltar, novamente, que uma interpretação crítica da
realidade sob uma Teoria Crítica significa, portanto, a denúncia irrestrita e veemente à
exploração econômica do homem pelo homem, exploração essa que sustenta um
sistema econômico baseado na figura do capital.
A Teoria Crítica, em que pese de forma apenas marginal (haja vista seu
potencial revolucionário questionador do status quo), penetrou em vários campos do
saber, como a Administração (por exemplo, na crítica e denúncia do controle e
exploração do trabalho), na Educação (como exemplo, na crítica e denúncia da
ideologia inculcada pelo sistema de ensino) e no Direito.
No campo jurídico, os fundamentos do pensamento crítico seguem (ou
deveriam seguir) os ensinamentos teóricos e (principalmente) epistemológicos da
Escola de Frankfurt, denunciando a exploração e dominação no trabalho próprios do
sistema econômico capitalista, que produz e sobrevive da alienação (econômica e
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psicológica) do sujeito trabalhador e da exclusão das massas. Como explanam Volpe
Filho e Scapim:
A partir do legado da Teoria Crítica desenvolvida na Escola de Frankfurt, que
em resumo sempre sustentou a possibilidade do uso da razão como instrumento de
libertação do homem, é que o pensamento jurídico crítico passou a entender o direito
também como instrumento dessa mesma libertação, em oposição a todas as formas de
injustiça e opressão geradas no seio da sociedade capitalista.
Entre as principais características de uma teoria crítica do Direito ter-se-ia,
conforme relatam Volpe Filho e Scapim, apoiados na valiosa obra de Luiz Fernando
Coelho, Teoria Crítica do Direito:
a. O Direito não é sinônimo de lei: trata-se da noção de que o jurista precisa
inserir-se na sociedade para entender que o Direito não é apenas àquele
originado do Estado. O Direito deve ser identificado com o bem comum, com a
justiça e a igualdade, não devendo ser utilizado como artifício pelas classes
dominantes.
b. O Direito não é uno: a monopolização do Direito pelo Estado é questionada pelo
pensamento crítico, que considera o Estado um ente contraditório indispensável
para a reprodução do sistema capitalista3 e, nesse sentido, seria também um
ente alienador. Tentam, os críticos, substituir o ineficaz legalismo do estado por
outras vias de juridicidade.
c. O Direito não é neutro: a neutralidade, entendida como um distanciamento
absoluto da questão a ser apreciada, pressupõe um jurista isento não somente
das complexidades da subjetividade pessoal, mas também das influências
sociais. Porém, para a epistemologia de uma Teoria Crítica o sujeito é um
sujeito criador da história, ou seja, não se pode isolar sujeito do objeto, e
portanto o Direito não está isolado das relações sociais que o produzem e, por
conseguinte, o jurista não pode ser possuidor de uma neutralidade. Uma
abordagem crítica do Direito exige operadores do direito conscientes de seu
papel contraditório de defesa de interesses de classes ou frações de classe.
d. O objeto do Direito é um problema a ser solucionado: o Direito não pode
considerar-se completamente científico, uma vez é produzido por legislador que
não é – e nem pode ser – neutro, muito menos racional ou dono de uma
“racionalidade limitada”. O Direito se alimenta do social, das experiências
vividas quotidianamente, de forma que o jurista cria e modifica o Direito à
medida que, em o conhecendo, o interpreta e aplica e, desta forma, o objeto é
um problema a ser solucionado e não simplesmente um objeto a ser descrito.
e. O direito não é racional: uma vez que trata-se do produto do emocional, do
afeto, do subjetivo, do intuitivo. Nesse sentido, a forma ou aparência de
racionalidade do Direito é um meio de legitimar as decisões jurídicas, ou seja, o
Direito não pode desligar-se de seus operadores, os quais lhe incutem elementos
de irracionalidade, quando objetivam, através das regras e decisões jurídicas,
suas crenças, emoções, valores e sentimentos inerentes à psique humana.
f. O Direito é um instrumento de transformação social: pois que deve ter por
objetivo a emancipação da sociedade, a partir da noção de que,
contraditoriamente, o mesmo Direito que legitima e reproduz a exploração pode
ser o elemento fundante de uma mudança social, deve criar as condições
jurídicas necessárias para a emancipação do homem.
g. O Direito não é autolegítimo: pois a legitimidade das normas resulta de um
processo ideológico que fundamenta a aceitação das normas pela sociedade por
elas regida. A crítica não pode ser relativa somente à condição existente, mas
crítica em trabalhar na direção de uma nova existência; e, finalmente.
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Profº Antonio Babeto Spinelli
h. O Direito não é dono de uma positividade axiológica do direito: pois não possui
uma característica valorativa apenas positiva (justiça, bem comum, igualdade,
liberdade, etc.), há também valores negativos na experiência jurídica, como a
escravidão, o despotismo e o desprezo pelos direitos humanos. A bondade
essencial do direito não passa de artifício retórico para sua imposição ideológica
ao consenso da macro-sociedade dominada e seu caráter ético está na
dependência de seu uso como instrumento de controle social.
Dessa forma, pode-se elencar como sustentáculos fundamentais na abordagem
crítica ao Direito as seguintes noções: o Direito não pode ser considerado uma instância
a-histórica descolada da realidade: é um produto das relações sociais e de poder que se
instalam no tecido social e, nesse sentido, jamais poderá ser um ente neutro e virtuoso,
interessado unicamente no bem do povo e na justiça social. Igualmente, o Direito não é
uma produção racional, pois que nele estão inseridas as emoções, afetos, prazeres,
angústias, valores daqueles que o produzem. Por fim, tem-se que o Direito, na
concepção de uma Teoria Crítica do Direito, é um ente profundamente contraditório
que, ao mesmo tempo em que serve aos interesses do grande capital, tem em seu cerne
o potencial emancipatório no sentido de ser um elemento que pode instaurar as bases
jurídicas para que o trabalho emancipe-se do capital e, assim, para que o homem crie
uma sociedade emancipada.
Já se trabalha a Teoria Crítica no Direito Civil e no Direito do Trabalho. Mas e
por que não uma Teoria Crítica do Direito Tributário? Com efeito, como já sugerido em
outro texto, no campo do Direito Tributário a Teoria Crítica pode contribuir na
construção de uma Administração Tributária construída sob um modelo de federalismo
fiscal que busque limitar, em vez de reforçar, as políticas pró-capital demandadas pelo
sistema econômico hegemônico e que busque criar espaços para os direitos trabalhistas
e para as economias marginais (organizações sociais, solidárias e do terceiro setor).
Nesse modelo alternativo de federalismo fiscal, um “Direito Tributário Crítico”
pode trabalhar de forma crítica questões como regras de concessão de benefício fiscal,
criação de um sistema tributário efetivamente progressivo, tributação de grandes
fortunas, persecução criminal e divulgação pública de sonegadores de tributos,
instituição de regras anti elisivas, impedimento de anistias fiscais, dentre vários outros
temas que são marginalizados no contexto de um sistema tributário que interessa ao
grande capital, como o atual sistema tributário brasileiro.
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