CONSTRUTIVISMO NO ENSINO DE FUNÇÕES TRIGONOMÉTRICAS: LIMITES E POSSIBILIDADES Luciane Santos Rosenbaum Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Brasil [email protected] RESUMO Este artigo é resultado de nossa pesquisa de mestrado, intitulada “Uma trajetória hipotética de aprendizagem sobre funções trigonométricas numa perspectiva construtivista”. Para fundamentar nossa pesquisa, utilizamos autores como Coll e Solé (2009) que defendem a perspectiva construtivista, e a formulações de Martin Simon (1995), que retoma aspectos da perspectiva construtivista de aprendizagem para apresentar a(s) Trajetória(s) Hipotética(s) de Aprendizagem (THA). Apoiamo-nos nas ideias de Pedro Gómez e José Luis Lupiáñez (2007), sobre o interesse de diferentes pesquisadores no uso de THA e inspirados pelas concepções de Zeichner (1998) que faz crítica à distância das pesquisas desenvolvidas na academia e o uso dos seus resultados nas salas de aula. A investigação teve como objetivos: discutir como compatibilizar perspectivas construtivistas de aprendizagem com o planejamento do ensino de Funções Trigonométricas; propor estratégias de articular os resultados obtidos com as pesquisas na área de Educação Matemática com a atuação do atuação do professor. Os resultados obtidos indicaram que o uso de pesquisas contribuiu para a organização do ensino; porém a sequência de ensino não é suficiente para garantir que a postura construtivista seja adotada pelo docente, pois a atuação do professor tem papel decisivo na construção do conhecimento dos seus alunos. Palavras-chave: Ensino Médio, Perspectiva Construtivista, Desenvolvimento Curricular, Funções Trigonométricas. V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil ABSTRACT This article is a product of our Master thesis, entitled "A hypothetical learning trajectory on trigonometric functions in a constructivist perspective". To supportour research, the authors use as Coll and Solé (2009) argue that the constructivist perspective, formulations and Simon Martin (1995), which incorporates aspects of the constructivist perspective of learning to present(s) Path (s) Hypothetical(s) Learning (THA). We rely on the ideas of Pedro Gomez and Jose Luis Lupiáñez (2007), about the interest of different researchers in the use of THA and designs inspired by Zeichner (1998) which is critical to the distance from the research carried out at the gym and use their results in classrooms. The research aimed to discuss how to reconcile constructivist perspectives of learning with the planning of the teaching of Trigonometric Functions; propose strategies to articulate the results of the research in mathematics education with the role of teacher performance. The results indicated that the use of research contributed to the organization of teaching, but the sequence of instruction is not sufficient to ensure that the constructivist approach is adopted by the teacher because the teacher performance has a decisive role in the knowledge construction of their students. Keywords: High School, Constructivist Perspective, Curriculum Development, Trigonometric Functions. 1 Introdução Este artigo é resultado de uma pesquisa realizada com dois professores de Matemática e 70 alunos do segundo ano do Ensino Médio em uma escola pública paulista. A investigação integrou o projeto “Construção de trajetórias hipotéticas de aprendizagem e implementação de inovações curriculares em Matemática no Ensino Médio: uma pesquisa colaborativa entre pesquisadores e professores”. Desenvolvido na PUC-SP com a participação de mestrandos e doutorandos sob a coordenação da professora Dra. Célia Maria Carolino Pires. 2 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil A pesquisa realizada, de natureza qualitativa (BOGDAN, R.; BIKLEN, S. K, 1994), em sua dinâmica conta com coleta de dados por meio de observações das aulas, entrevistas com professores parceiros e alunos participantes do projeto e protocolos realizados pelos estudantes. Foi desenvolvida em três etapas: a primeira teve inicio com a análise de documentos curriculares e revisão bibliográfica. A partir daí, embasados no quadro teórico e nos resultados das pesquisas, foram elaboradas as atividades que constituem a THA. Finalmente, a THA desenvolvida foi apresentada aos professores parceiros para possíveis discussões e propostas de alterações na THA. O objetivo da investigação foi: construir, analisar e avaliar uma trajetória hipotética de aprendizagem (THA) sobre Funções trigonométricas. Segundo Simon (1995), as THAs consistem de objetivos para a aprendizagem dos estudantes de tarefas matemáticas que serão usadas para promover a aprendizagem e do levantamento de hipóteses sobre o processo de aprendizagem dos alunos. Resultados de estudos como de Brito e Morey (2004) evidenciam que a formação dos professores é insuficiente quanto aos conhecimentos, competências e habilidades para o desenvolvimento do tema Funções trigonométricas. Resultados obtidos pelos pesquisadores apontam que a abordagem é superficial e não prioriza a construção de conceitos relacionados ao tema e encerrando o assunto sem a discussão de questões como: Por que é melhor utilizar o círculo trigonométrico com o raio unitário? Por que o número de voltas no círculo pode ser infinito? No que implica a alteração da posição dos parâmetros na representação da função, como por exemplo, f(x)=2 +sen(x), f(x) = 2sen(x) e f(x) = sen(2x)? Diversos estudos como de Lindegger (2000), Nascimento (2005), Costa (1997), Briguenti (1994, 1998), Klein (2009), Brito e Morey (2004), Martins (2009), Barbosa (2009) e Borges (2009) recomendam o uso de situações problema significativo a partir de aplicações na vida cotidiana; a configuração de trabalho em equipe de modo a permitir a troca de experiências entre os alunos e o uso de recursos tecnológicos como softwares matemáticos para visualização e compreensão das funções trigonométricas. 2 Trajetória(s) hipotética(s) de aprendizagem, segundo Simon. Pesquisadores como Simon (1995) e Pires (2009) argumentam que vários estudos realizados comprovam a eficácia do uso da abordagem construtivista no ensino de Matemática. Porém, destacam que mesmo com os resultados de pesquisa em mãos pouco havia sido feito para a reconstrução de uma Pedagogia da Matemática. 3 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil Os resultados dessas pesquisas, contudo, não têm influência direta na elaboração ou ressignificação de propostas de ensino compatíveis com as informações que as pesquisas indicam a respeito das formas de aprendizagem dos alunos. (PIRES, 2009, p. 149) A perspectiva construtivista adotada nesta investigação teve como objetivo fazer uso das preciosas contribuições acerca de como se processam as aprendizagens de Funções trigonométricas e como devem ser utilizadas para promover mudanças na Pedagogia da Matemática tal como proposto por Martim Simon (1995). O Ciclo de Ensino de Matemática (Figura 1) apresentado por Simon propõe a THA como um dos componentes do ciclo que compreende itens que não se esgotam na atuação do professor e aborda temas como currículo na práxis, construído em sala de aula, o desenvolvimento de materiais didáticos e a elaboração de pesquisas na área educacional. A dinâmica proposta pelo Ciclo de Ensino de Matemática auxilia o reconhecimento das relações intrínsecas entre os conhecimentos do professor, seus pensamentos e a tomada de atitudes ao propor a formulação de modelos de ensino que devem ser constantemente adaptados e alterados para melhor atender aos objetivos dos aprendizes. De todo modo, o professor deve apresentar uma postura reflexiva e investigativa que permita fazer alterações nas atividades caso perceba que algum aspecto não foi contemplado ou deva ser aprofundado com determinado grupo de alunos. O conceito de ciclo foi adotado por Simon (1995) para indicar que qualquer alteração na atividade inicialmente planejada faz com que o ciclo se reinicie e novas reflexões são feitas após esta reconfiguração. Para compreensão da elaboração da THA, apresentamos o Ciclo de Ensino de Matemática proposto por Simon (1995) que compreende conhecimentos específicos como o tema de matemática a ser desenvolvido; conhecimentos acerca de como ensinar tal tema (provindo de sua formação inicial, livros, pesquisas ou da própria experiência docente que compreende, também, o conhecimento de materiais e recursos disponíveis para o desenvolvimento do tema e conhecimento de variadas atividades que permitem melhor compreensão do assunto. O ciclo apresenta as hipóteses do professor sobre o conhecimento dos alunos sobre o tema (inclusive conhecimentos prévios) e sobre como ocorre o processo de aprendizagem dos alunos. Somente com clareza em todos os itens do ciclo o professor consegue elaborar uma THA. Outro conceito utilizado por Simon, o de trajetória, indica que caminhos são esperados que os alunos sigam na construção dos conhecimentos pretendidos. 4 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil Figura 1: Ciclo de Ensino da Matemática, THA – adaptado (SIMON, 1995, p, 56). Um dos objetivos do projeto ao construir THAs foi promover uma pesquisa colaborativa entre pesquisadores e professores. Para tal pretendíamos diminuir a distância entre os resultados das pesquisas e o chão da sala de aula. Pesquisadores como Passos (2007) e Zeichner (1998) apontam que a linguagem acadêmica usada nas pesquisas pode justificar o afastamento dos professores junto com a falta de identificação dos professores com as pesquisas educacionais. Isto é, mesmo que tenham acesso a resultados de pesquisas, os professores vêm como uma prática descontextualizada, que não permite implantação em salas comuns da educação básica. 2.1 A THA sobre Funções Trigonométricas Na elaboração da THA sobre funções trigonométricas, procuramos criar atividades que visavam atender aos resultados de pesquisas desenvolvidas sobre o tema e os pressupostos teóricos que nortearam nosso trabalho. Entre as dificuldades cometidas pelos alunos destacamos: a simplificação de notação, o uso de instrumentos, o conhecimento de funções e a construção dos gráficos das funções trigonométricas. A partir do Ciclo de Aprendizagem de Matemática proposto por Simon (1995) 5 6 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil elencamos as seguintes hipóteses sobre o processo de aprendizagem dos alunos em Funções Trigonométricas: Despertar os conhecimentos já existentes nos alunos de razões trigonométricas nos ângulos agudos para facilitar a transição para o círculo trigonométrico; Utilizar instrumentos de construção e medição para que o aluno associe as representações gráfica, algébrica e figural das funções trigonométricas e potencializar a construção do conhecimento do aluno referente ao objeto matemático Funções Trigonométricas; Reconhecer propriedades das funções trigonométricas a partir do círculo trigonométrico e da representação gráfica; Identificar gráficos que descrevem funções trigonométricas e reconhecer uma função trigonométrica a partir do seu gráfico; Resolver situações de aprendizagem contextualizadas e interdisciplinares; Utilizar recursos tecnológicos (software Geogebra e calculadora científica) e materiais manipulativos a fim de contribuir para a formulação de conjecturas e validação de respostas. A THA iniciou com uma atividade de transição das razões trigonométricas de ângulos agudos para o círculo trigonométrico seguida de uma atividade que fez uso de material manipulativo para apresentar aos alunos a razão. A atividade seguinte teve como objetivo utilizar projeções no ciclo trigonométrico e nos eixos das funções para obter as razões trigonométricas o seno, o cosseno e tangente. Uma das atividades teve como foco o uso de calculadoras científicas para efetuar o cálculo das funções trigonométricas. As últimas atividades tiveram como objetivo o estudo das funções seno, cosseno e tangente. Para a construção dos gráficos que representavam as funções os alunos usaram material manipulativo e o software Geogebra. Finalmente, na oitava atividade apresentamos as equações e inequações trigonométricas. 2.2 A postura do professor e as limitações à perspectiva construtivista A concepção construtivista teve auge nas décadas de 1980 e 1990. Depois, possivelmente pela simplificação e reducionismo de tal perspectiva muitos professores e pesquisadores optaram por não mencionarem tal estratégia em seus trabalhos com V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil receios de serem rechaçados no meio acadêmico. Porém, pesquisadores como Coll e Solé (2009) recomendam a concepção construtivista como um instrumento para análise de situações educativas que também pode ser utilizado para a tomada de decisões referentes ao planejamento, aplicação e avaliação do ensino. Um importante alerta apresentado pelos autores sobre a concepção construtivista: esta não deve ser utilizada como um manual a ser seguido, uma vez que as diretrizes apenas auxiliam na tomada de decisões sobre o ensino e devem ser adequadas às metas de aprendizagem e ao contexto em que será aplicada. Optamos pelo termo reducionismo que se assemelha a critica de autores como Pires (2009) e Simon (1995) acerca da interpretação errada, simplista e vaga da concepção construtivista: de que o professor deve deixar os alunos à vontade, para interagirem e aprenderem. Para combater tal equívoco, Coll e Solé (2009) argumentam que o aluno aprende e constrói seu conhecimento a partir da ajuda do professor, que conduz os aprendizes no processo de aprender. A ajuda do professor deve variar em quantidade, tipo e qualidade para atender às necessidades dos alunos. Para desempenhar o papel de medidor das aprendizagens dos alunos o professor deve reconhecer a capacidade do aluno de aprender na interação com as atividades e outros alunos. Quando a concepção do professor não condiz com esta perspectiva ele compromete o sucesso do aluno. Solé (2009) discorre que muitos professores apresentam uma visão da sala de aula que subestima a capacidade dos aprendizes no julgamento que não estejam aptos a realizar determinadas tarefas. Para a autora [...] não existe qualquer dúvida sobre o fato de que as expectativas dos professores sobre o rendimento de seus alunos podem chegar a modificar seu rendimento real. (SOLÉ, 2009, p. 46). Em nossa investigação conseguimos inferir a importância da perspectiva defendida por Mauri (2009) acerca do professor deve ensinar o aluno a aprender a aprender. Um dos professores parceiros apresentou resistência ao método construtivista e vários comentários feitos durante o desenvolvimento das atividades ou em entrevista realizada ao término trazem indicativos da concepção do professor sobre o processo de aprendizagem: A postura do professor em “abandonar os alunos a própria sorte” por terem receio de “ajudarem dando dicas” é criticada por Mauri (2009) que recomenda ao professor atenção para perceber em que momento deve intervir e como para não perder o 7 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil momento de aprendizagem. Um dos objetivos da investigação era apresentar uma THA concebida sob uma perspectiva construtivista. Porém não é possível investigar as atividades sem levam em conta o papel dos atores no cenário educacional onde tais atividades foram desenvolvidas. A coleta dos dados foi realizada antes, durante e após o desenvolvimento da THA, por meio de observações das aulas, gravações em áudio, protocolos dos alunos e entrevistas realizadas com os professores parceiros e alunos. Elencamos neste artigo apenas algumas categorias que foram utilizadas para a análise da THA: 2.3 Resultados alcançados O caráter do professor como mediador de aprendizagens foi fundamental no desenvolvimento da THA. O professor parceiro I administrava a aula apresentando as instruções iniciais aos alunos e intervindo apenas nas duplas de alunos que necessitavam de ajuda. A maneira de provocar questionamentos e conjecturas com algumas mediações durante a atividade. Quando o professor adotava uma postura construtivista, os alunos apresentavam maior interesse e autonomia na realização das atividades. Com a professora não era assim. Era muito chegou a isso ponto final. Abriu um espaço melhor para o aluno interagir na aula. Eu vi muito aluno participando, ta quietinho, não fala, mas ta absorvendo. Coisas que muitas vezes o professor não percebe. Depoimento de aluno. Nos assuntos em que os professores apresentavam domínio no conteúdo matemático, apresentavam autonomia para desenvolvê-lo e propiciavam maior autonomia aos alunos. Em contrapartida, nos assuntos que apresentavam maior fragilidade conceitual, resgatavam a postura tradicional. Foi diferente. Ela foi passando atividade por atividade, como nós fazíamos. Não explicando e façam! Mas lendo o enunciado e falando: Gente, o que vocês acham? O que quer dizer isso? O que quer dizer aquilo? Essa interação foi feita hoje. Depoimento de aluno. O professor parceiro II deixava os alunos resolvendo as atividades por um tempo excessivo, e como não explicava para todos da sala, percebemos que ele repetia a mesma instrução várias vezes. A sala era indisciplinada e extremamente dependente do professor, e tal atitude do docente causava mais desinteresse e os alunos na maioria das vezes só aguardavam que o professor apresentasse a resposta. Em diversos momentos o professor relatou que não conseguia ter uma postura 8 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil construtivista, se declarava “tradicional”. Afirmou não conseguir mediar os questionamentos, normalmente dava as respostas mesmo sem ser solicitado. Quando eu tô começando a entender ele fala a resposta. Não culpo ele, porque tem bastante alunos. Depoimento de aluno. Em depoimentos capturados nas entrevistas foi possível inferir que os alunos perceberam que o professor não se adaptou ao método construtivista e que apresentava dificuldades em conteúdo matemático: O professor mesmo não tem dom de falar e você entender na hora. Eu não sei se ele não interagiu com a atividade ou a atividade não interagiu com ele.. Não sei então, ele não sabia muito dizer. A gente ia mais pelo enunciado. Ele só concordava. Depoimento de aluno. Os alunos do professor parceiro I inicialmente resolviam as atividades individualmente, e antes de solicitar a intervenção do professor, validavam ou refutavam os resultados com os colegas. A interação entre os alunos do professor I é consequência de dois fatores: o respeito que eles apresentam uns com os outros e a gestão da sala pelo professor. O professor constantemente socializava comentários dos alunos com a sala. Em atividades individuais, os alunos do professor I realizavam cada um no seu protocolo, mas se preocupavam em verificar com os colegas os resultados. Mas a gente aprendeu a respeitar mais o professor, saber a hora de falar, saber a hora de interagir. E dar espaço tanto para o professor, quanto para os colegas. Depoimento de aluno. Foi um avanço, um aprendizado. A gente não aprendeu só que é tangente, o que é cosseno. A gente aprendeu a respeitar, a ouvir e a falar. Depoimento de aluno. Durante o desenvolvimento das atividades os alunos do professor II não apresentaram o mesmo empenho. A maioria dos alunos se interessou pelas atividades no início da trajetória. Porém, como eram extremamente dependentes do professor, chamavam o professor, que às vezes esclarecia as dúvidas resolvendo a atividade. Os alunos do professor II apresentaram graves problemas de relacionamento. A interação não ocorreu como o esperado e percebemos que foi um dos fatos responsáveis pelo professor não terminar o desenvolvimento de toda THA. Os alunos carregam outros alunos nas costas. Eu estava com uma dupla, vi que estava fazendo tudo sozinha e mudei a dupla. Com a aluna A foi mais ou menos. Ela é uma pessoa inteligente. Depoimento 9 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil de aluno. A partir da observação das aulas, pudemos perceber que o professor II apresentou grande dificuldade na adaptação ao método. Não estava acostumado a administrar a aprendizagem dos alunos. Fazia poucos questionamentos e não fazia uso das intervenções e conjecturas dos alunos para enriquecer a discussão coletiva. Nas questões que exigiam experimentação ou testar hipóteses, os alunos ficavam apenas em discussões superficiais, aguardando o professor “dar a resposta”. Há indícios da contribuição da THA para a aprendizagem dos alunos, o depoimento a seguir demonstra a mudança no relacionamento entre professor e alunos. Podemos perceber que os objetivos que almejávamos com o trabalho em equipe foram alcançados. Eu gostei porque se eu tenho uma dúvida à gente discute sobre aquilo e consegue ver como o colega conseguiu desenvolver a atividade. Outro jeito de fazer a atividade e consegue entender melhor. Não tinha trabalhado assim em matemática. Se eu tivesse alguma dúvida eu perguntava para o colega, ia trocando informações. Formas de resolver determinada questão. Não era cola. Formas que o meu colega desenvolvia e eu desenvolvi de outro. Mas olhando aquela forma poderia ser melhor para mim. Depoimento de aluno. Foi possível observar o movimento do Ciclo de Ensino de Matemática de cada professor participante da pesquisa: os professores parceiros e a pesquisadora. Após o desenvolvimento da THA os professores parceiros foram entrevistados para que pudéssemos obter suas impressões sobre o desenvolvimento das atividades. A análise do depoimento do professor parceiro I nos permite inferir que fez uma reflexão sobre a sua atuação. Na entrevista, o professor declarou que dominava o conteúdo matemático, porém fez alterações na didática. Para o professor, a perspectiva construtivista contribuiu na melhora da participação e da aprendizagem dos alunos. Me ajudou muito a pensar sobre a minha didática em sala de aula sobre como transmitir conhecimento. Porque na verdade a gente não tem que transmitir o conhecimento a gente tem que pegar o conhecimento do aluno e amadurecer, transformá-lo. Então aprendi bastante. Entendi bem mais o construtivismo. Depoimento do professor I. Alunos construindo conhecimento, fez com que melhorasse a aprendizagem. De acordo com o passar dos exercícios, das atividades comparando a aprendizagem com anos anteriores do mesmo tema. A construção dos gráficos. A diferença entre um e outro. Depoimento do professor I. 10 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil Podemos inferir que um dos objetivos propostos pela investigação, levar os resultados de pesquisa a sala de aula, foi atingido a partir do comentário do professor parceiro I: Se eu for pensar como as pesquisas de matemática, nunca chega nada a mim. Nunca chega nada na escola. Então como eu posso dizer se contribui comigo ou não, se não chega na escola. E agora ajudou bastante e fiquei até curiosa para pesquisar. Só que tem que ir até lá (na PUC) para folhear? Depoimento do professor I. É possível detectar indícios de mudança no professor parceiro II no que tange à visão a respeito do Construtivismo. Segundo declaração do docente, a abordagem torna mais fácil que o aluno “trabalhe a própria construção do conhecimento.” A gente tem o construtivismo meio que deixa fazer, mas num é deixa fazer. É mostrar um caminho. Eu gostei de trabalhar. Você percebeu que eu não sei trabalhar desse jeito do projeto... O professor deve instigar os alunos. A gente que é da geração tradicional, como professor peca muito nesse sentido de querer dar respostas. Nesse sentido cresci um pouquinho. Depoimento do professor II. Podemos inferir que o professor II mudou não apenas a concepção acerca da perspectiva construtivista como também sobre os próprios alunos no seguinte trecho: O aluno é capaz. Muitas vezes a gente acha que não é. Nesse ímpeto a gente dá a resposta, não tem paciência. No tradicional eu não percebia isso. Depoimento do professor II. 3 Considerações finais Neste artigo apresentam os o relato da nossa investigação de Mestrado. Ao elaborar a THA de Funções Trigonométricas utilizamos o Ciclo de Ensino de Matemática, proposto por Martim Simon (1995) sob uma perspectiva construtivista. Simon faz uso do conceito hipotético para explicar que a THA deve ter uma característica de imprevisibilidade uma vez que depende de diversos fatores como conhecimentos prévios dos alunos, interesse despertado pelas atividades, das interações entre alunos, entre outras. A proposta de Simon de relação hipotética pode ser utilizada também para a atuação do professor. Com nossa investigação pudemos inferir o desempenho da THA depende diretamente das concepções do professor. Isso não inviabiliza a elaboração da THA porém, como preconizado pelos próprios pesquisadores construtivistas, não se 11 V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil trata de modelos de aula a serem seguidos, mas roteiros eficazes que devem servir para nortear as situações de ensino. O conhecimento matemático do professor sobre o tema é outra variável a ser considerada. Simon, em artigo publicado em 1995 já havia preconizado que apenas com o conhecimento matemático é possível interpretar a linguagem, as dúvidas, as conjecturas e as ações dos alunos. Em vários momentos, durante o desenvolvimento da THA, foi possível inferir que é essencial que o professor reconheça os objetivos de aprendizagem que espera alcançar para que consiga modificar a THA quando uma determinada atividade não for adequada aos alunos. Para que o professor adote uma postura construtivista de ensino é preciso que a concepção do professor sobre a aprendizagem seja condizente a esta perspectiva. A atuação do professor como mediador entre o conhecimento e o aluno deve ser amparada por uma concepção convergente com a postura construtivista. Neste artigo gostaríamos de ressaltar que a postura construtivista não é a única maneira de ensinar. Há outras maneiras que são utilizadas em contextos diferentes ou por diferentes atores. Porém tal postura exige que o professor se aproprie desta perspectiva e utilize tal estratégia seguindo as prerrogativas de mediar as dúvidas dos alunos e intervir quando e quanto for necessário. Caso contrário, melhor opção é continuar com a postura adotada anteriormente a utilizar um simulacro de postura construtivista. Referências BARBOSA, A. A. Trajetórias Hipotéticas de Aprendizagem relacionadas às razões e às Funções Trigonométricas, visando uma perspectiva construtivista. Dissertação (mestrado em Ensino de Matemática), PUC/SP, 2009. BOGDAN, R.; BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em educação: uma introdução as teoria e aos métodos. Tradução de Maria J. Álvares, Sara B. dos Santos e Telmo M. Batista. Porto: Porto Editora, 1994. BORGES, C. F. Transição das razões trigonométricas do triângulo retângulo para o círculo trigonométrico: uma sequência para ensino. Dissertação (mestrado em Ensino de Matemática), PUC/SP, 2009. BRIGUENTI, M. J. L. Ensino e aprendizagem da trigonometria: novas perspectivas da educação matemática. 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