Álgebra linear e o problema das quatro retas do cálculo de Schubert

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Artigo
Álgebra linear e o problema
das quatro retas do cálculo de
Schubert
Jacqueline Rojas (UFPB)
mosa lista proposta por Hilbert, em 1900, no Congresso
Ramón Mendoza (UFPE)
Internacional de Matemáticos, realizado em Paris. No
século XX, a geometria enumerativa foi reconceitualizada e definida de maneira mais rigorosa em termos de
D
ado um sistema de equações algébricas que possui um número finito de soluções, podemos di-
teoria de intersecção sobre espaço de parâmetros. Um
clássico neste assunto é o livro de Fulton ([2])2 .
zer que contar o número destas soluções é o objetivo
O objetivo deste trabalho é apresentar e resolver, no
da geometria enumerativa. De fato, um problema típico
contexto da álgebra linear, um dos problemas enumera-
em geometria enumerativa é determinar o número de
tivos clássicos do cálculo de Schubert, que chamaremos
objetos geométricos de um determinado tipo que satis-
de problema das quatro retas:
fazem a um dado conjunto de condições. Por exemplo,
dados dois pontos distintos no plano projetivo, quantas
Dadas quatro retas disjuntas duas a duas no es-
retas passam por esses dois pontos?
paço projetivo complexo tridimensional (denotado
por P3 ), determinar o número de retas que as in-
Em 1870, Hermann Cäsar Hannibal Schubert obteve
tersectam simultaneamente.
seu grau de Doutor na Universidade de Halle com uma
tese em geometria enumerativa intitulada “Zur Theorie der Charakteristiken”. Apesar disto, nunca lecionou
A figura 1 ilustra uma solução genérica deste pro-
numa universidade, dedicando sua vida ao magisté-
blema, num desenho em R3 . As quatro retas dadas
rio no Andreanum Gymnasium em Hildesheim (1872–
são 1 , 2 , 3 , 4 , e as retas encontradas como solução são
1876) e no Johanneum (uma famosa escola humanista),
m1 e m2 . O hiperboloide serve como ilustração de um
em Hamburgo (1877–1908). Schubert introduziu o que
passo importante da solução, que é o estudo da relação
hoje chamamos, em sua homenagem, cálculo de Schu-
entre as retas e as superfícies quádricas em P3 .
bert1 . A estratégia deste cálculo consistia em transfor-
Evidentemente, a compreensão do problema envolve
mar um dado sistema de equações algébricas em um
o conhecimento do que vem a ser uma reta em P3 e do
novo sistema, cujas soluções seriam mais fáceis de se
próprio P3 . Tudo isso será explicado ao longo deste ar-
determinar. Segundo Schubert, deveria ser possível efe-
tigo. Para tanto, é recomendável ter, principalmente,
tuar esta transformação fazendo uma mudança contí-
conhecimentos básicos de álgebra linear e, ainda, um
nua das constantes envolvidas de modo que a quan-
pouco de álgebra em nível introdutório (ver, por exem-
tidade de soluções fosse preservada, processo que ele
plo, [6] e [4], respectivamente). Uma ótima referência
chamava de princípio de conservação do número.
para iniciar uma exploração pela geometria algébrica
O método de Schubert não possuía uma fundamentação teórica rigorosa, mas funcionava muito bem. Jus-
é o livro “Introdução às curvas algébricas planas”, de
Vainsencher ([9]).
o
tificar seus resultados foi o tema do 15 Problema da fa1
Ver, por exemplo, [5].
2
Recomendamos ver [10] para uma apresentação mais acessı́vel de
[2].
Matemática Universitária nº45
1
55
{Artigo}
Figura 1:
m1
1
2
m2
4
3
Uma das fontes de inspiração deste trabalho foi o ar-
tores e arquitetos. Desargues aparece, em 1639, como o
tigo de Ronga ([7]), onde é apresentada uma justifica-
primeiro a considerar as ideias que expomos a seguir,
tiva do cálculo de Schubert seguindo os resultados ex-
para motivar as definições e o desenvolvimento deste
postos por Schubert em [8].
texto.
Tome Π o plano de equação z = 1 no espaço tridi-
O plano projetivo real: motivação
A partir desta seção serão introduzidos conceitos e resultados necessários para a compreensão e a solução do
problema das quatro retas.
A ideia de espaço projetivo está relacionada à de
perspectiva (do latim perspicere, percepção visual) num
desenho gráfico, numa pintura etc. Uma das modalidades mais utilizadas é a perspectiva linear, tipicamente
usada no desenho de estradas e trilhos de trens que pa-
mensional real. Observe que
1. Cada ponto p no plano Π determina uma reta U p
passando pela origem e por p, ou seja, um subespaço unidimensional que contém p; no entanto, nem
todo subespaço unidimensional intersecta o plano
Π: esse é o caso (exatamente) dos subespaços contidos no plano {z = 0}.
2. Cada reta  ⊂ Π é a intersecção de um plano W
que passa pela origem, isto é, um subespaço bidi-
recem, relativamente a um observador nelas situado,
mensional, com o plano Π; o único subespaço bidi-
convergir para um único ponto, denominado ponto de
mensional que não intersecta Π é o plano {z = 0}.
fuga.
Como no plano real R2 (ou complexo C2 ) duas retas
distintas se encontram num único ponto ou são paralelas, surgiu a necessidade de se construir um objeto matemático em que quaisquer duas retas se intersectem,
como tentativa de se dar uma fundamentação matemática aos métodos de perspectiva empregados pelos pin-
2
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3. Se as retas 1 , 2 ⊂ Π se intersectam no ponto p,
então os subespaços bidimensionais W1 e W2 têm
por intersecção o subespaço unidimensional U p .
4. Se as retas 1 , 2 ⊂ Π são disjuntas (neste caso, paralelas, pois estão no mesmo plano) então a intersecção dos subespaços bidimensionais W1 e W2
{Artigo}
é um subespaço unidimensional contido no plano
{ z = 0}.
O plano projetivo real é definido como sendo o conjunto
dos subespaços unidimensionais de R3 . Veja que, pelo exposto acima, o plano Π se identifica naturalmente com
um subconjunto do plano projetivo real pela aplicação
injetiva Π  p → U p . No entanto, essa aplicação não é
Espaços projetivos
Essas definições em tom coloquial servem como motivação para o tratamento mais cuidadoso que faremos a
seguir. No entanto, daremos ênfase ao caso complexo
(em vez de real) e, posteriormente, ao caso tridimensional (em vez de bidimensional), pois é aí que se insere o
problema que queremos resolver.
sobrejetiva, pois não atinge os subespaços horizontais.
Para passar ao caso complexo sem mudar a dimen-
Tudo funciona como se o plano projetivo real fosse um
são, observe primeiro que toda reta que passa pela ori-
plano real (no caso, Π), “acrescido” de outros elementos
gem em C3 é um subespaço vetorial de dimensão 1 de
(os subespaços horizontais), que podem ser interpreta-
C3 , isto é, é o subconjunto [v], onde [v] denota o su-
dos como “pontos no infinito do plano Π”.
bespaço vetorial gerado pelo vetor v. Então define-se o
Essa interpretação faz mais sentido quando defini-
plano projetivo complexo por


P2 = [v] ⊂ C3 | v ∈ C3 , v = 0 .
mos o que é uma reta no plano projetivo real. Veja que
qualquer reta  contida no plano Π é a intersecção de
Π com um subespaço bidimensional W . Esse subespaço bidimensional é, por sua vez, formado pela coleção de subespaços unidimensionais, que são elementos
do plano projetivo. Então pode-se associar a  ⊂ Π um
subconjunto do plano projetivo real que é a coleção dos
De maneira análoga, se V é um espaço vetorial qualquer sobre C (poderia também ser sobre R), podemos
definir a projetivização de V ou espaço projetivo determinado por V, que denotaremos por P (V ), por
subespaços unidimensionais contidos em W . Essa as-
P (V ) = {[v] ⊂ V | v ∈ V, v = 0} .
sociação motiva a seguinte definição: um subconjunto
do plano projetivo é uma reta se e somente se a união de
seus elementos é um subespaço bidimensional de R3 .
Por simplicidade, denotaremos P n = P (C n+1 ). Veja
que P0 = {[1]} consiste de um único ponto, pois
Note que as retas  em Π “ganham” um elemento a
C = [1] é o único subespaço de C de dimensão 1. Veja
mais no plano projetivo: a cada ponto p ∈  se associa
também que P1 = {[(1, t)] | t ∈ C } ∪ {[(0, 1)]} (a
ainda um subespaço unidimensional em W contido em
finito”), pois todo subespaço de dimensão 1 de C2 é
{z = 0} que não vem de nenhum ponto de . Esse é o
gerado por um vetor não nulo v = ( a, b) ∈ C2 , e
de retas do plano projetivo tem um elemento a mais do
[v] = [(0, b)] = [(0, 1)].
o subespaço unidimensional U p contido em W , mas há
“ponto no infinito” da reta . Além disso, o conjunto
que as retas do plano π: é a “reta no infinito”, que é o
subconjunto do plano projetivo real formado por todos
os subespaços unidimensionais contidos em {z = 0}.
reta complexa, i.e. C, acrescida de um ponto, o “in-
[v] = [( a, b)] = [(1, b/a)] se a = 0, caso contrário
A definição de espaço projetivo é, de fato, um caso
particular de grassmaniana. A k-grassmaniana de V, denotada por G (k, V ), é simplesmente o conjunto dos su-
Veja também que se 1 , 2 ⊂ Π são paralelas, ainda
bespaços vetoriais de dimensão k de V. Assim, todo es-
assim W1 e W2 têm um elemento em comum, que é
paço projetivo é uma 1-grassmanniana, já que P (V ) =
um subespaço unidimensional contido no plano {z =
G (1, V ). Neste trabalho, a definição de G (k, V ) nos será
0}. Então, no plano projetivo, as retas supostamente
paralelas se intersectam no infinito.
útil apenas por uma questão de simplicidade da notação.
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{Artigo}
Retas, planos, . . . , e hiperplanos
Fato 2 (Hiperplanos em P (V )). Sejam H1 = P (W1 ) e
Na notação que apresentamos (com R como corpo
H2 = P (W2 ) hiperplanos em P (V ) com dim V = n + 1 ≥
de escalares), o plano projetivo real é definido como
P (R3 ). Fica mais simples, além disso, definir as retas
do plano projetivo real:  é uma reta em P (R3 ) se existe
3. Então H1 ∩ H2 é um (n − 2)–plano ou H1 = H2 .
Superfícies e conjuntos algébricos
um subespaço W ⊂ R3 de dimensão 2 tal que  = P (W )
Seja Sd , com d ≥ 0, o espaço vetorial sobre C dos po-
sionais contidos em W). É exatamente dessa forma que
variáveis x, y, z, w. Esses são os polinômios que têm to-
são definidos retas, planos, k-planos e hiperplanos em
dos os termos de grau exatamente d, isto é, todo F ∈ Sd
(isto é,  é a coleção de todos os subespaços unidimen-
qualquer espaço projetivo P (V ).
linômios homogêneos de grau d (ou formas de grau d) nas
pode ser escrito na forma
Sejam V um espaço vetorial sobre C de dimensão
F =
n + 1 e k um inteiro, com 0 ≤ k ≤ n. Diremos que
é um k–plano se existir W ∈ G (k + 1, V ) tal que π =
P (W ). Os 0–planos são pontos e os 1–planos são retas em P (V ). Os 2–planos e (n − 1)–planos serão chamados simplesmente de planos e hiperplanos, respectiva-
mente.
Na geometria dos espaços projetivos, duas retas contidas num plano sempre se intersectam, como justificaremos a seguir. Usaremos agora e mais adiante que
a dimensão da intersecção de dois subespaços V, W é
dada pela fórmula
dim V ∩ W = dim V + dim W − dim(V + W ) .
(1)
Fato 1 (Retas num plano). Seja o plano π = P (W ) ⊂
P (V ), com W ∈ G (3, V ), e sejam 1 = P (W1 ) e 2 =
P (W2 ) retas contidas em π. Então ou 1 ∩ 2 consiste de um
único ponto ou 1 = 2 .
Demonstração. Note que a condição 1 = 2 se traduz
em W1 + W2 = W. Como dim W1 = dim W2 = 2 e
dim W = 3, então dim(W1 ∩ W2 ) = 1, pela equação (1).
Portanto, 1 ∩ 2 consiste de um único ponto, porque
1 ∩ 2 = P (W1 ∩ W2 ).
f i,j,k,l xi y j zk wl ,
i, j, k, l ≥ 0
 ⊂ P (V ) é uma reta se existir W ∈ G (2, V ) tal que
 = P (W ). Mais geralmente, diremos que π ⊂ P (V )
∑
i+j+k+l = d
com f i,j,k,l ∈ C. Em particular, esse espaço tem como
base o conjunto de monômios

xi y j zk wl | i, j, k, l ≥ 0, i + j + k + l = d

.
Por simplicidade, pensaremos em todo polinômio de
Sd como função de C4 em C, quando for conveniente.
Em particular, S1 se identifica naturalmente com o espaço dos funcionais lineares de C4 .
Note também que se F ∈ Sd então F (λv) = λd F (v),
para quaisquer λ ∈ C e v ∈ C4 . Em particular, se
F (v) = 0 então F (λv) = 0, para todo λ ∈ C. Isto mos-
tra que se v é raiz de F então todo vetor de [v] é também
raiz de F. Portanto está bem definido o conjunto


Z ( F ) = [v] ∈ P3 | F (v) = 0 ,
que será chamado de superfície algébrica de grau d em P3 ,
se F for não nulo.
No caso d = 0, se F é não nulo então Z ( F ) = ∅. Por-
tanto o conjunto vazio é (a única) superfície algébrica
de grau zero. Na seção seguinte veremos, em particular, que as superfícies algébricas de grau 1 são os planos
de P3 . As superfícies algébricas de grau 2, 3, 4, 5, etc.
são chamadas de superfícies quádricas, cúbicas, quárticas, quínticas etc., respectivamente.
De maneira mais geral, dois hiperplanos distintos se
Um subconjunto Y de P3 é um conjunto algébrico se Y
intersectam em um (n − 2)–plano. A justificativa é aná-
for uma intersecção finita de superfícies algébricas, ou
loga ao caso anterior.
4
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o próprio P3 . Note que P3 não é superfície algébrica
{Artigo}
porque não permitimos que F fosse um polinômio nulo
Proposição 2 (Retas).  é uma reta em P3 se e somente
na definição. Usaremos a notação
se  = Z ( L1 , L2 ) para algum { L1 , L2 } ⊂ S1 linearmente
independente.
Z ( F1 , . . . , Fk ) = Z ( F1 ) ∩ . . . ∩ Z ( Fk )
para denotar um conjunto algébrico em que se conhecem as superfícies algébricas que o geram por intersecção.
Entre os exemplos mais simples de conjuntos algébricos, podemos citar os pontos, retas e planos, também
Proposição 3 (Pontos). Se { L1 , L2 , L3 } ⊂ S1 é linear-
mente independente então Z ( L1 , L2 , L3 ) é formado por um
único ponto de P3 . Reciprocamente, para todo p ∈ P3
existe { L1 , L2 , L3 } ⊂ S1 linearmente independente tal que
{ p } = Z ( L1 , L2 , L3 ).
chamados conjuntos algébricos lineares pois, como vere-
Antes de demonstrarmos essas proposições, enunci-
mos a seguir, são determinados pela intersecção de su-
aremos e demonstraremos o lema seguinte, que trata
perfícies algébricas de grau 1.
da intersecção de núcleos de formas de grau 1 em C4 .
Daqui em diante, denotaremos por [u1 , . . . , uk ] o subes-
Observação. Pode-se também mostrar que a união finita e a intersecção arbitrária de conjuntos algébricos é
um conjunto algébrico. Para intersecções finitas é a própria definição e para uniões finitas é um exercício. Já
para intersecções arbitrárias, a demonstração envolve
paço gerado pelos vetores u1 , . . . , uk .
Lema 1. Seja { Li }4i=1 uma base de S1 .
Sejam Wi =
ker( Li ), Wij = Wi ∩ Wj e Wijk = Wi ∩ Wj ∩ Wk , para
1 ≤ i < j < k ≤ 4, e W1234 = ∩4i=1 Wi . Denotando por | I |
generalizar o conceito de conjunto algébrico para ideais
o comprimento da sequência I, então dim WI = 4 − | I |.
de C [ x, y, z, w] e usar o fato de que C [ x, y, z, w] é um anel
Demonstração. A prova será feita em quatro etapas, de
noetheriano, isto é, todo ideal contido em C [ x, y, z, w] é
acordo com o valor assumido por | I |.
gerado por um número finito de polinômios.
| I | = 1: Como Li ∈ S1 , 1 ≤ i ≤ 4, é uma aplica-
ção linear de C4 em C e, por hipótese, é não nula, então
Conjuntos algébricos lineares
sua imagem tem ao menos dimensão 1. Mas o contradomínio tem dimensão 1, então a imagem de Li tem
Aqui vamos explorar um pouco mais a identificação de
S1
com o conjunto de funcionais lineares de C4 ,
conjunto de aplicações lineares de
C4
isto é, o
em C, para carac-
terizar os conjuntos algébricos lineares de
P3 .
Veja que
se L ∈ S1 então
exatamente dimensão 1. Pelo Teorema do Núcleo e da
Imagem, ker( Li ) é um subespaço de dimensão 3.
| I | = 2: Sem perda de generalidade, vamos verifi-
car apenas que dim(W1 ∩ W2 ) = 2. Primeiro vamos
mostrar que W1 = W2 . Se fossem iguais, e já que
Z ( L) = P (ker( L)) ,
dim W1 = 3, fixada uma base de W1 poderíamos ob-
(2)
ter uma base de C4 acrescentado um vetor, digamos
diretamente da definição de Z ( L), onde ker( L) denota
w. Assim teríamos Lr (w) = λr = 0 para r = 1, 2, de
o núcleo de L, isto é, o subespaço vetorial de vetores de
C4 que têm imagem nula por L.
As três proposições seguintes caracterizam planos,
retas e pontos em P3 como conjuntos algébricos gerados por superfícies algébricas de grau 1.
Proposição 1 (Planos). π é um plano em P3 se e somente
se π = Z ( L) para alguma L ∈ S1 não nula.
onde concluiríamos que L1 =
λ1
λ2 L 2 ,
isto é, L1 e L2 se-
riam linearmente dependentes, contradizendo a hipótese. Mas W1 = W2 implica W1 + W2 = C4 , e assim, por
(1), dim W1 ∩ W2 = 3 + 3 − 4 = 2.
| I | = 3: Fixe I = 123, sem perda de generalidade.
Bastará mostrarmos que W12 + W3 = C4 , pois aí, por
(1), dim W123 = dim W12 + dim W3 − dim[W12 + W3 ] =
2 + 3 − 4 = 1.
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{Artigo}
Suponha, por absurdo, que W12 + W3 = C4 . Então
W12 + W3 = W3 , pois dim W3 = 3. Segue que W12 ⊂ Wi ,
L1 (v1 ) = 1, e ker( L2 ) = [u1 , u2 , v1 ] e L2 (v2 ) = 1. Essa
definição implica que L1 e L2 são linearmente indepen-
para 1 ≤ i ≤ 3. Como W12 tem dimensão 2 e Wi tem
dentes e que ker( L1 ) ∩ ker( L2 ) = [u1 , u2 ]. Logo Z ( L1 ) ∩
Wi para 1 ≤ i ≤ 3, de maneira que W12 = [u, v].
ker( L2 )) = P ([u1 , u2 ]) = .
dimensão 3, podemos escolher uma base {u, v, wi } de
Agora tome i, j distintos entre 1 e 3. Se Li (w j ) fosse
nulo, teríamos w j ∈ Wi = ker( Li ) e aí Wj = [u, v, w j ] ⊂
Wi . Como ambos têm dimensão 3, teríamos Wi = Wj .
Mas isso implicaria, como no parágrafo anterior, que Li
Z ( L2 ) = P (ker( L1 )) ∩ P (ker( L2 )) = P (ker( L1 ) ∩
Demonstração da Proposição 3. Se L1 , L2 , L3 ∈ S1 são
linearmente independentes segue diretamente do
Lema 1, como nos casos anteriores, que ker( L1 ) ∩
e L j são linearmente dependentes, o que é uma contra-
ker( L2 ) ∩ ker( L3 ) é um subespaço de dimensão 1 e, por-
dição com a hipótese. Portanto Li (w j ) = λij = 0, se
Pode-se também usar um argumento análogo ao
i = j e i, j ∈ {1, 2, 3} (de fato, só iremos precisar de λ12
e λ21 não nulos).
Observe também que {u, v, w1 , w2 } é uma base de
C4
(pois w2 ∈ W1 = [u, v, w1 ]). Usando-se essa base,
verifica-se sem dificuldade que L3 =
λ32
λ12 L1
+
λ31
λ21 L2 ,
de
onde se conclui que { Li }3i=1 são linearmente dependentes, o que é mais uma vez uma contradição.
| I | = 4: Por raciocínio análogo aos casos anteriores,
tanto, que Z ( L1 , L2 , L3 ) é um ponto.
acima utilizado para planos e retas, para concluir que
um ponto em P3 é determinado pela intersecção de três
planos em P3 . Outra maneira é assumir, sem perda
de generalidade, que p = [( a1 , a2 , a3 , a4 )] com a1 = 0,
e verificar que { p} = Z ( a1 y − a2 x ) ∩ Z ( a1 z − a3 x ) ∩
Z ( a1 w − a4 x ).
Essa outra maneira de demonstrar a Proposição 3
pode-se concluir que dim W1234 = 0.
é um caso particular de um fato mais geral.
Demonstração da Proposição 1. Se L ∈ S1 for uma forma
a3 x, a1 w − a4 x } é uma base do subespaço
linear não nula, então segue do Lema 1 (para | I | = 1)
que ker( L) é um subespaço de dimensão 3 de C4 . Por-
tanto Z ( L) é um plano em P3 .
Reciprocamente, se π = P ([v1 , v2 , v3 ]) for um plano
Note
que, sendo p = [( a1 , a2 , a3 , a4 )], então { a1 y − a2 x, a1 z −
S1 ( p) = { F ∈ S1 | F (v) = 0, se [v] = p} .
De maneira mais geral, podemos definir o subespaço
de formas de um dado grau que se anulam num de-
em P3 , então seja L ∈ S1 a forma de grau 1 definida
terminado conjunto de pontos no espaço projetivo. Por
é um vetor de C4 tal que {v, v1 , v2 , v3 } é uma base de
anulam em três pontos dados, não colineares? Se os três
Z ( L ).
de não colinearidade implica que {v1 , v2 , v3 } são linear-
por L(vi ) = 0, para 1 ≤ i ≤ 3, e L(v) = 1, em que v
exemplo, quem é o conjunto de formas de grau 1 que se
C4 . Assim, ker( L) = [v1 , v2 , v3 ] e π = P (ker( L)) =
pontos são p1 = [v1 ], p2 = [v2 ] e p3 = [v3 ], a hipótese
mente independentes e que P ([v1 , v2 , v3 ]) é um plano,
Demonstração da Proposição 2. Sejam L1 , L2 ∈ S1 linear-
contendo os três pontos. Esse plano é também, como
mente independentes e Wi = ker( Li ), i = 1, 2. Pelas
vimos, o conjunto de anulamento de um subespaço uni-
definições, Z ( L1 , L2 ) = Z ( L1 ) ∩ Z ( L2 ) = P (W1 ) ∩
dimensional de formas lineares.
Lema 1, segue que Z ( L1 , L2 ) é uma reta em P3 .
Sd ( p1 , ..., pk ) o subespaço vetorial de Sd definido por
P (W2 ) = P (W1 ∩ W2 ). Como dim W1 ∩ W2 = 2, pelo
Agora vamos verificar que toda reta em P3
é determi-
nada pela intersecção de dois planos distintos. De fato,
seja  = P ([u1 , u2 ]) uma reta em P3 . Estenda {u1 , u2 }
para uma base de C4 , digamos {u1 , u2 , v1 , v2 }. Defina
L1 e L2 em S1 de forma que ker( L1 ) = [u1 , u2 , v2 ] e
6
60
Matemática Universitária nº45
Fixemos os pontos p1 , ..., pk em P3 e denotemos por
Sd ( p1 , ..., pk ) = { F ∈ Sd | F (vi ) = 0, se pi = [vi ], ∀i } .
Seja nd = dim Sd (que, pode-se mostrar, é igual a (3+d d),
ou seja, n0 = 1, n1 = 4, n2 = 10 etc.). Observe que
dim Sd ( p1 , ..., pk ) ≥ nd − k,
(3)
{Artigo}
porque, para cada v = ( x1 , x2 , x3 , x4 ) ∈ C4 não
A seguir verificaremos que uma superfície irredutível
nulo, a condição F (v) = 0, ou mais precisamente
de grau maior que 1 em P3 não pode conter nenhum
F ( x1 , x2 , x3 , x4 ) = 0 = ∑ f i,j,k,l x1 i x2 j x3 k x4 l , impõe exa-
plano.
tamente uma condição linear sobre F.
Proposição 4. Sejam F ∈ Sd um polinômio irredutível de
Observação. A igualdade em (3) admite a seguinte caracterização. Seja Sd∗ o dual de Sd , isto é, o espaço ve-
grau d ≥ 2 e π = Z ( L) um plano em P3 . Então π ⊂ Z ( F ).
Demonstração. Sem perda de generalidade, iremos su-
torial de funcionais lineares de Sd em C. Para cada v ∈
por que o coeficiente de z em L é não nulo, de forma
defi-
que L pode ser escrita sob a forma L = ax + by + z + cw.
nida por Ev ( F ) = F (v). Seja Hv = { F ∈ Sd | F (v) = 0}
Note que L é um polinômio mônico de grau 1 no anel
o núcleo de Ev , e observe que a imagem de Ev é igual
A[z], com A = C [ x, y, w]. Assim, segue-se do algo-
a C (como v = ( a1 , a2 , a3 , a4 ) é um vetor não nulo em
ritmo da divisão que existem G, R ∈ A[z] tais que
C4 ,
C4 ,
não nulo, considere a aplicação linear Ev ∈
Sd∗
podemos assumir que a1 = 0, logo G (v) = 1 para
G=
1 d
x ).
a1d
Então temos que dim Hv = nd − 1. Levando
em consideração que Sd ( p1 , ..., pk ) = ∩ik=1 Hvi (pi = [vi ],
1 ≤ i ≤ k), pode-se verificar que dim Sd ( p1 , ..., pk ) =
nd − k se e somente se
{ Evi }ik=1
é um conjunto linear-
mente independente no espaço dual
Sd∗ .
Superfícies irredutíveis
Uma superfície algébrica Z ( F ) ⊂ P3 definida por um
F = LG + R, com G ∈ A[z] necessariamente homo-
gêneo de grau 1, e R ∈ A[z] nulo ou constante, isto é, R
homogêneo de grau 2 nas variáveis x, y, w.
Agora mostraremos que π = Z ( L) ⊂ Z ( F ) impli-
caria em R = 0, o que seria uma contradição com a
hipótese de que F é irredutível. De fato, Z ( L) ⊂ Z ( F )
implica que F ([(v1 , v2 , − av1 − bv2 − cv4 , v4 )]) = 0, para
todo [(v1 , v2 , v4 )] ∈ P2 . Logo, avaliando a igualdade
F = LG + R nos pontos [(v1 , v2 , − av1 − bv2 − cv4 , v4 )] ∈
Z ( L), obtemos que R([(v1 , v2 , v4 )]) = 0, para todo
polinômio F ∈ C [ x, y, z, w] homogêneo de grau d ≥ 1
[(v1 , v2 , v4 )] ∈ P2 . Então R(v1 , v2 , v4 ) = 0 para todo
vel sobre C (um polinômio F é irredutível sobre C se só
mogêneo, também R(0, 0, 0) = 0, o que nos faz concluir
admite fatorações triviais, ou seja, em qualquer fatora-
que R é nulo.
é chamada de irredutível se F é um polinômio irredutí-
(v1 , v2 , v4 ) ∈ C3 não nulo. Sendo R um polinômio ho-
ção de F um dos fatores é um polinômio constante). Do
contrário a superfície é chamada redutível.
Superfícies singulares e não singulares
Como todo polinômio de grau 1 é irredutível, então
os planos são superfícies algébricas irredutíveis.
Já se F tem grau 2 há duas opções: ou F é irredutível
sobre C (por exemplo, as superfícies definidas por F3 e
F4 no Exemplo 1 mais abaixo) ou F = L1 L2 com L1 e L2
Seja H = Z ( F ) uma superfície de grau d ≥ 1 em P3 .
Denotemos por Fξ a derivada parcial de F em relação
a ξ, ξ ∈ { x, y, z, w} (note que Fξ é um polinômio ho-
mogêneo de grau d − 1). H é chamada de superfície

Z ( Fξ ) = ∅.
formas de grau 1 não nulas. No segundo caso, há ainda
não singular se e somente se
duas possibilidades: { L1 , L2 } pode ser linearmente de-
Do contrário, diremos que H é singular e os pontos de
pendente ou linearmente independente. No primeiro
Z ( L2 )

ξ ∈{ x,y,z,w}
ξ ∈{ x,y,z,w}
Z ( Fξ ) serão chamados de pontos singulares.
= Z ( L), com L = L1 = λL2 para
Em outras palavras, os pontos singulares são os pontos
segundo caso, Z ( F ) = Z ( L1 L2 ) = Z ( L1 ) ∪ Z ( L2 ), em
Veja que não é preciso pedir que os pontos singulares
caso, Z ( F ) =
algum λ ∈ C não nulo; isto é, Z ( F ) é um plano. No
onde o gradiente de F se anula.
que Z ( L1 ) e Z ( L2 ) são planos distintos (que se inter-
estejam em H, porque todo vetor em que o gradiente de
sectam em uma reta, pela Proposição 2).
F se anula tem que ser um vetor onde F se anula. Basta
Matemática Universitária nº45
7
61
{Artigo}
usar o fato de que F é polinômio homogêneo de grau d
e mostrar que
F=
Note que F2 = x2 + y2 = ( x + iy)( x − iy), logo Z ( F2 )
é a união dos planos Z ( x ± iy) = P ([±ie1 + e2 , e3 , e4 ])
onde os ei ’s denotam os vetores da base canônica de
1
( xFx + yFy + zFz + wFw ) .
d
C4 . Como

ξ ∈{ x,y,z,w}
Z ( F2ξ ) = Z ( x ) ∩ Z (y), Z ( F2 ) é
Note que o conceito de superfície algébrica singular
uma superfície quádrica singular, cujos pontos singula-
fica mal definido se olharmos apenas para o conjunto
res são os pontos da reta de intersecção dos planos que
Z ( F ). A singularidade é, de fato, uma propriedade de
determinam Z ( F2 ).
F.
A título de exemplo, os planos em P3 são superfícies (de grau 1) não singulares.
Ao contrário de F1 e F2 , os polinômios F3 e F4 são irre-
dutíveis. Para ver isso, observa-se primeiro que se eles
A partir de grau
fossem redutíveis então F3 = G3 H3 e F4 = G4 H4 , com
d ≥ 2 temos muitos exemplos de superfícies singulares
G3 , G4 , H3 , H4 polinômios homogêneos de grau 1 (ou-
(por exemplo, Z ( x d )) e não singulares (por exemplo,
Z ( x d + yd + zd + wd )).
Exemplo 1. Seja Z ( Fk ) a superfície quádrica definida por

x2
se k = 1




 x 2 + y2
se k = 2
Fk =
2
2
2

x +y +z
se k = 3



 2
2
2
2
se k = 4 .
x +y +z +w
Observe que, do ponto de vista de conjuntos, Z ( F1 )
é igual ao plano Z ( x ) = {[( x1 , x2 , x3 , x4 )] ∈
P3
| x1 =
0} = P ([e2 , e3 , e4 ]). No entanto, F1 define uma superfí-
cie quádrica singular, pois

ξ ∈{ x,y,z,w}
Z ( F1ξ ) = Z ( x ).
Assim todo ponto da superfície quádrica Z ( F1 ) é singular.
tras possibilidades são descartadas pelo fato de F3 e F4
serem homogêneos). Em seguida, deve-se comparar os
coeficientes das igualdades polinomiais e, após alguma
manipulação, chegar-se a uma contradição entre essas
igualdades.
Então as superfícies quádricas Z ( F3 ) e Z ( F4 ) são
irredutíveis.
A diferença fundamental entre elas
é o fato de que Z ( F4 ) é uma quádrica não sin-
gular, pois

ζ ∈{ x,y,z,w}
Z ( F4ζ ) = ∅, enquanto que
Z ( F3 ) possui um (único) ponto singular, posto que

ζ ∈{ x,y,z,w}
Z ( F3ζ ) = {[(0, 0, 0, 1)]}.
A figura 2 mostra ilustrações dos quatro casos do
Exemplo 1, com analogias de quádricas do espaço euclidiano tridimensional que têm algumas propriedades
semelhantes.
Figura 2:
Mudanças de coordenadas projetivas
Z ( F1 )
Z ( F2 )
Seja T : V −→ V um isomorfismo linear. É fácil ver que
T preserva subespaços de V, isto é, se W é subespaço
de dimensão k então T (W ) também é. Então T induz
uma bijeção em P (V ), que denotaremos por T e chamaremos de mudança de coordenadas projetivas, definida
por T ([v]) = [ T (v)].
O fato de T preservar subespaços também implica
que um k-plano P (W ) em P (V ) é transformado no k-plano T (P (W )) = P ( T (W )), em P (V ), pela mudança
de coordenadas projetivas T. Ou seja, retas, planos etc.,
são aplicados respectivamente em retas, planos etc., por
Z ( F3 )
8
62
Matemática Universitária nº45
Z ( F4 )
uma mudança de coordenadas projetivas T.
{Artigo}
A seguir continuaremos nossa exploração sobre mu-
De fato, suponha que p = [v]. Então F (v) = G (v) =
danças de coordenadas projetivas no caso específico de
0. Por outro lado, Td1 F (T ( p)) = F ( T −1 (T ( p))) =
P3 (deixando ao leitor interessado a tarefa de fazer as
adaptações para P (V )).
F ( T −1 ( T (v))) = F (v) = 0. Analogamente, concluímos
que Td2 G (T ( p)) = 0.
Mudanças de coordenadas projetivas preservam conjuntos
algébricos. Sejam F ∈ Sd e T :
C4
−→
C4
um isomor-
fismo linear. Então T (Z ( F )) = {[ T (v)] | [v] ∈ Z ( F )} =


{[ T (v)] | F (v) = 0} = [w] | F ( T −1 (w)) = 0 . Essa úl-
O mesmo raciocínio mostra que se Y1 e Y2 são conjuntos algébricos em P3 tais que p ∈ Y1 ∩ Y2 , então
T ( p) ∈ T (Y1 ) ∩ T (Y2 ). Em particular, se duas retas
em P3 se intersectam, então suas imagens sob uma mu-
tima igualdade nos sugere olhar para o isomorfismo li-
dança de coordenadas projetivas também serão retas
near Td : Sd −→ Sd definido por ( Td F )( x, y, z, w) =
que têm um ponto em comum.
corresponde a dizer que o grupo dos isomorfismos li-
ares L1 , L2 e L3 , então sabemos que T ( p) será um ponto
F ( T −1 ( x, y, z, w))
neares de
que
C4
(ver [3], p. 228; a definição de Td ( F )
opera sobre o conjunto Sd ). Assim, temos
T (Z ( F ))
=

[w] | F ( T −1 (w)) = 0
= {[w] | Td F (w) = 0}

Além disso, se p ∈ P3 for definido pelas formas line-
de P3 definido pelas formas lineares T1 L1 , T1 L2 e T1 L3 .
Mudanças de coordenadas projetivas preservam pontos
singulares. É possível mostrar, sem grande dificuldade,
(4)
= Z ( Td F ) .
Isto diz que superfícies algébricas são aplicadas em superfícies algébricas.
Do fato acima podemos também concluir que se X =
∩is=1 Z ( Fi ), em que Fi é homogêneo de grau di para 1 ≤
i ≤ s, então T ( X ) = ∩is=1 Z ( Tdi Fi ), ou seja, conjuntos
algébricos são aplicados em conjuntos algébricos.
Uma das utilidades das mudanças de coordenadas
projetivas é permitir transformar um dado conjunto algébrico em outro, definido por equações mais simples
ou com um determinado padrão. Isso será explicitado
na próxima seção, no caso das superfícies quádricas.
Mudanças de coordenadas projetivas preservam o grau de
superfícies. De fato, sejam H = Z ( F ) ⊂ P3 uma superfície de grau d. Então, segue-se de (4) que T (Z ( F )) =
Z ( Td F ) e, como Td é um isomorfismo linear em Sd , con-
cluímos que T (Z ( F )) é uma superfície de grau d em P3 .
Em particular os planos em P3 são transformados em
planos por qualquer mudança de coordenadas projetivas.
Mudanças de coordenadas projetivas preservam intersecções. Sejam Z ( F ) e Z ( G ), superfícies em P3 de grau
d1 e d2 , respectivamente. Se p ∈ Z ( F ) ∩ Z ( G ), então
T ( p) ∈ T (Z ( F )) ∩ T (Z ( G )) = Z ( Td1 F ) ∩ Z ( Td2 G ).
que se Z ( F ) é uma superfície de grau d em P3 e p ∈
Z ( F ) um ponto singular, então T ( p) é um ponto sin-
gular de T (Z ( F )). Deixamos a demonstração para o
leitor.
Classificação das superfícies quádricas
Iniciamos esta seção apresentado um exemplo da utilização de uma mudança de coordenadas projetivas para
transformar uma superfície quádrica em Z ( F2 ) (ver
Exemplo 1).
Exemplo 2. Seja F = x2 + xy + y2 ∈ S2 . Seja T o isomorfismo linear de C4 definido por T ( x, y, z, w) = ( x +
√
y
3
−1
2 , 2 y, z, w ), cuja inversa é dada por T ( x, y, z, w )
( x − √1 y, √2 y, z, w)). Então T2 F = x2 + y2 e T (Z ( F ))
3
3
=
=
Z ( T2 F ).
O teorema seguinte afirma que em P3 só existem, em
essência, as superfícies quádricas do Exemplo 1. Sua
demonstração é simples e conhecida, mas a colocamos
aqui (no caso geral de superfícies quádricas em P n ) por
completeza desta exposição.
Teorema 1. Se Q for uma superfície quádrica em P n definida pela forma
F=
∑
0≤ i ≤ j ≤ n
aij xi x j ∈ C [ x0 , ..., xn ] ,
Matemática Universitária nº45
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63
{Artigo}
então existe uma mudança de coordenadas projetivas T tal
que T ( Q) = Z ( Fk ), para algum 1 ≤ k ≤ n + 1, em que
Fk = x02 + x12 + · · · + xk2−1 , isto é, Fk é a soma dos quadrados
das primeiras k variáveis.

Resta mostrar que existe um isomorfismo linear T
−
1
 tenha a
tal que o polinômio em (7) composto com T
forma dada em (6). Essa parte da demonstração é feita
por completamento de quadrados.
O polinômio em (7) pode ser escrito na forma


Demonstração. A prova pode ser feita por indução. O
passo indutivo e também o primeiro passo consistem
∑ xl2 + xk2 +
em demonstrar que se F tem a forma
∑ xl2
+
l <k
∑
k≤l ≤ j≤n
l <k
alj xl x j ,
(5)
para algum k = 0, 1, . . . , n, e algum dos alj é não nulo,
então existe um isomorfismo linear T tal que F ◦
T −1
tem a forma
∑ xl2
+
l ≤k
∑
k<l ≤ j≤n
alj xl x j .
(6)
Note que para k = 0 (o primeiro passo da indução) a
primeira soma de (5) é vazia.
Para provar isso, construiremos T como composição
dos seguintes tipos de isomorfismos: (i) T (l,j) , em que
T (l,j) (el ) = e j , T (l,j) (e j ) = el e T (l,j) (ei ) = ei , para todo
i diferente de l ou j (se l = j esse isomorfismo é a identidade); (ii)
( j)
Ta ,
em que a ∈ C \
( j)
{0}, Ta (e j ) = ae j
(l,j) tal que
e (iii) T
n
∑
l = k +1
2bl xl
xk +
∑
k<l ≤ j≤n
alj xl x j ,
com 2bl = akl ; completando quadrados, a expressão fica

2
∑ xl2 +
l <k
xk +
n
∑
l = k +1
bl x l
+
∑
k<l ≤ j≤n

alj xl x j ,
em que no último somatório são incorporados os ter�
2
 por T
( el ) = el ,
mos de ∑nl=k+1 bl xl . Então define-se T
(el ) = el + bl ek , para l = k + 1, . . . , n,
para l ≤ k e T
−1 (el ) = el , para l ≤ k, e
que tem inversa dada por T
−1 (el ) = el − bl ek , para l = k + 1, . . . , n. É fácil veriT
−1 fica
ficar que essa última expressão composta com T
na forma (6).
Relações entre retas e superfícies quádricas
O seguinte resultado trata da intersecção entre uma su-
( j)
e Ta (el ) = el , para todo l = j;
(l,j) (ei ) = ei , para todo i = j.
(l,j) (e j ) = e j − el e T
T
Veja que o inverso de T (l,j) é ele próprio, o inverso de
Proposição 5. Sejam F ∈ Sd não nulo, com d ≥ 1, e  =
ei → ei , para todo i = j.
ou  ⊂ Z ( F ) ou Z ( F ) ∩  tem no máximo d pontos.
( j)
Ta
é
( j)
Ta−1
e o inverso de
(l,j)
T
é dado por e j → e j + el e
Suponha que F tenha a forma (5). Se existe l entre k e
n tal que all = 0, então componha F com o inverso de
(l )
T√ a e, depois, componha o resultado disso com T (k,l ) ,
ll
para obter
∑ xl2
l <k
+ xk2
+
∑
k≤l ≤ j≤n
(l,j)=(k,k)
alj xl x j .
perfície de grau d e uma reta em P3 .
P (W ) uma reta em P3 . Então Z ( F ) ∩  = ∅. Além disso,
Demonstração. Se  ⊂ Z ( F ) então podemos escolher
uma base {w1 , w2 } de W tal que [w2 ] ∈
/ Z ( F ) e podemos escrever
 = {[w1 + tw2 ] | t ∈ C } ∪ {[w2 ]} .
(7)
Se não houver all = 0 para l = k, . . . , n então há pelo
menos um alj = 0, com l = j. Então a composição de F
(l,j) conterá o termo
com o inverso de T
alj xl ( xl + x j ) ,
sem que apareça nenhum outro termo em xl2 . Essa ex-
Se escrevermos w1 = ( a1 , a2 , a3 , a4 ), w2 = (b1 , b2 , b3 , b4 )
e
F=
∑
f i,j,k,l xi y j zk wl ,
i, j, k, l ≥ 0
i+j+k+l = d
então [w1 + tw2 ] ∈ Z ( F ) se e somente se
∑ fi,j,k,l (a1 + b1 t)i (a2 + b2 t) j (a3 + b3 t)k (a4 + b4 t)l
pressão recai no caso anterior e, assim, (7) pode ser ob-
é igual a zero. Mas essa expressão pode ser agrupada
tida em qualquer caso.
por potências de t, isto é, pode ser escrita como p(t) =
10
64
Matemática Universitária nº45
{Artigo}
∑dµ=0 f µ tµ , em que cada f µ ∈ C é uma expressão poli-
com f = (1 + a2 ) x2 + (1 + b2 )y2 + 2abxy (a variável z
nomial nos ai ’s e b j ’s, de forma que [w1 + tw2 ] ∈ Z ( F )
foi eliminada de F3 = 0 usando-se H = 0). Observe que
se e somente se p(t) = 0. Como o coeficiente de grau
f é uma forma de grau 2 não nula, porque 1 + a2 , 1 + b2
d de p é exatamente F (w2 ), e F (w2 ) = 0, então p não
e ab não podem ser nulos simultaneamente.
tem pelo menos uma raiz. Isso mostra que a interse-
que π ∩ Z ( F3 ) = Z ( ax + by + z, 2xy) = Z (by + z, x ) ∪
Se a, b ∈ {i, −i } então f = ±2xy, de onde concluímos
é constante e, pelo Teorema Fundamental da Álgebra,
ção de  com Z ( F ) tem que ser não nula. Além disso,
como p tem grau d então há no máximo d raízes, isto é,
Z ( ax + z, y). Como m1 = Z (by + z, x ) e m2 = Z ( ax +
z, y) são retas (distintas), o lema segue neste caso.
Agora suponha que a = ±i e seja λ = 1 + a2 . Neste
d pontos de intersecção.
Agora apresentaremos alguns fatos que dizem res-
caso f pode ser escrita na forma

ab 2
f = λ x + y + µy2 ,
λ
peito à existência de retas disjuntas nas superfícies quádricas Z ( Fk ) apresentadas no Exemplo 1. Essas considerações têm âmbito geral pelo fato de que essas são as
com µ =
únicas superfícies quádricas, a menos de mudanças de
h1 h2 , com
coordenadas projetivas.
Fato 3 (Retas em Z ( F1 ) e Z ( F2 )). As superfícies quádricas
Z ( F1 ) e Z ( F2 ) não podem conter três ou mais retas disjun-
tas.
Demonstração. Como foi comentado logo após o Exemplo 1, Z ( F1 ) é um plano e Z ( F2 ) é a união de dois pla-
nos distintos. Logo, se tivermos três ou mais retas contidas na quádrica Z ( Fi ), para 1 ≤ i ≤ 2, necessariamente
um par estará contido num plano. Assim, decorre do
Fato 1 que estas superfícies quádricas não podem conter três ou mais retas disjuntas.
O lema seguinte entrará na prova do Fato 4, mas é
interessante por si só. Para melhor entender seu enunciado, lembramos que [e4 ] é o único ponto singular de
Z ( F3 ).
Lema 2. Se π é um plano em P3 que contém [e4 ] então π ∩
Z ( F3 ) = m1 ∪ m2 , em que m1 e m2 são retas contendo [e4 ]
1+ a2 + b2
,
λ
que pode ser fatorada na forma f =
λx +
√
λx +
√
h1 =
√
h2 =
√
e
√
λab
+i µ
λ
√
λab
−i µ
λ


y
y,
de forma que
π ∩ Z ( F3 ) = Z ( H, h1 h2 ) = Z ( H, h1 ) ∪ Z ( H, h2 ) .
Então definimos mi = Z ( H, hi ), para i = 1, 2, e observa-
mos que mi é, de fato, uma reta, usando a Proposição 2:
como H tem termo em z e hi não tem, H e hi são linearmente independentes. É fácil verificar que as retas m1 e
m2 são iguais se e somente se µ = 0.
Fato 4 (Retas em Z ( F3 )). Na quádrica Z ( F3 ) não existem
retas disjuntas.
Demonstração. Bastará mostrarmos que p = [e4 ], o
único ponto singular de Z ( F3 ), pertence a qualquer reta
(não necessariamente distintas).
contida em Z ( F3 ).
Demonstração. Seja H forma linear não nula em S1 tal
sim, [u, v, e4 ] tem dimensão 3 e π = P ([u, v, e4 ]) é um
que π = Z ( H ). Como [e4 ] ∈ π, então na expressão
de H não aparece a variável w. Logo, sem perda de
generalidade, iremos assumir que o coeficiente de z em
H é não nulo (de fato, igual a 1), de forma que H =
ax + by + z com a, b ∈ C. Assim,
π ∩ Z ( F3 ) = Z ( H, F3 ) = Z ( ax + by + z, f ) ,
/ . AsSuponha  = P ([u, v]) ⊂ Z ( F3 ) e p = [e4 ] ∈
plano, que contém a reta  e o ponto [e4 ]. Então
 ⊂ π ∩ Z ( F3 ) = m1 ∪ m2 ,
pelo Lema 2. Assim,  = ( ∩ m1 ) ∪ ( ∩ m2 ) ⊂ π .
Portanto  = m1 ou  = m2 , pois cada intersecção  ∩ mi
ou é igual a mi ou é igual a um ponto, segundo o Fato 1.
Matemática Universitária nº45
11
65
{Artigo}
Mas o Lema 2 diz que as retas m1 e m2 contêm p, logo
p ∈ , o que é uma contradição.
a1 v1 (b) + a2 v2 (b). Assim [b1 u1 ( a) + b2 u2 ( a)] ∈ L a ∩ Mb ,
isto é, L a e Mb se intersectam para quaisquer a e b.
Em Z ( F4 ), existem duas famílias de retas que jogarão
um papel importante na solução do problema das qua-
tro retas. Para cada a = [( a1 , a2 )] ∈ P1 , sejam as retas
L a = P (Ua ) e Ma = P (Va ), em que Ua = [u1 ( a), u2 ( a)],
Para vermos que esse é o único ponto de intersecção,
verificaremos que Ua = Vb .
Caso 1: Se b1 = 0, então Vb = [(0, 0, −i, 1), (i, −1, 0, 0)].
Logo u1 ( a) ∈
/ Vb , do contrário existiriam α e β ∈ C tais
Va = [v1 ( a), v2 ( a)], u1 ( a) = (ia1 , a1 , ia2 , a2 ), u2 ( a) =
que ia1 = iβ, a1 = − β, ia2 = −iα e a2 = α, de onde
(ia2 , − a2 , −ia1 , a1 ), v1 ( a) = (ia1 , a1 , −ia2 , a2 ) e v2 ( a) =
Caso 2:
(ia2 , − a2 , ia1 , a1 ).
Deixamos ao leitor a verificação de que, para qual-
quer escolha de a = [( a1 , a2 )] ∈ P1 , u1 ( a) não é colinear
com u2 ( a) nem v1 ( a) é colinear com v2 ( a), para garantir
concluímos que a1 = a2 = 0, o que contradiz a ∈ P1 .
sem
de
0, então, supondo b1
generalidade,
temos
=
Vb
1
=
E, neste caso, temos
/ Ub , pois do contrário teríamos que
que u2 ( a) ∈
ia2
sejam realmente retas.
Por exemplo, mostrar
= iα + iβb2
− a2
= α − βb2
a1
= αb2 + β
−ia1
Além disso, é fácil mostrar que L a e Ma estão contidos
em Z ( F4 ), para qualquer a ∈
perda
=
[(i, 1, −ib2 , b2 ), (ib2 , −b2 , i, 1)].
que os subespaços Ua e Va tenham dimensão 2 e L a , Ma
P1 .
Se b1
= −iαb2 + iβ
que L a ⊂ Z ( F4 ) consiste em tomar qualquer u ∈ Ua ,
Multiplicando a segunda equação por i e somando-a à
Nos Fatos 5, 6, 7 e 8 reunimos propriedades dessas
cedimento à terceira e à quarta equações chegamos à
isto é, u = αu1 ( a) + βu2 ( a), e verificar que F4 (u) = 0.
primeira obtemos que α = 0. Aplicando o mesmo pro-
famílias, que nos serão úteis em seguida.
conclusão que β = 0. Mas isso implica a1 = a2 = 0, o
Fato 5. L a ∩ Lb = ∅ e Ma ∩ Mb = ∅, se a = b ∈ P1 .
que é uma contradição novamente.
Demonstração. Seja M a matriz cujas colunas são as co-
Fato 7. Dado q ∈ Z ( F4 ), existem únicas retas L aq e Mbq
ordenadas dos vetores u1 ( a), u2 ( a), u1 (b) e u2 (b), para
a = [( a1 , a2 )], b = [(b1 , b2 )] ∈
P1 .
Verifica-se que o de-
terminante de M é igual a −4( a1 b2 − a2 b1 )2 , de onde se
tais que L aq ∩ Mbq = {q}.
Demonstração. A seguir vamos exibir as retas L aq e Mbq
conclui que os vetores acima formam uma base de C4
tais que L aq ∩ Mbq = {q}. Seja q = [( x1 , x2 , x3 , x4 )] ∈
se, e somente se, a1 b2 − a2 b1 = 0, e essa última desi-
duas possibilidades:
gualdade é equivalente a a = b. Portanto, se a = b en-
Z ( F4 ), o que implica x1 2 + x2 2 + x3 2 + x4 2 = 0. Temos
(I) x1 + ix2 = x3 + ix4 = 0;
tão os subespaços Ua e Ub , que determinam as retas L a
e Lb , respectivamente, só têm como vetor comum o vetor nulo, o que implica L a ∩ Lb = ∅. Usando o mesmo
raciocínio verifica-se que Ma ∩ Mb = ∅ se e somente se
(II) x1 + ix2 = 0 ou x3 + ix4 = 0.
No caso (I), tome aq = [( x4 , − x2 )] e bq = [(0, 1)]. Assim
a = b ∈ P1 .
Uaq = [(ix4 , x4 , −ix2 , − x2 ), (−ix2 , x2 , −ix4 , x4 )]
Fato 6. Para quaisquer a = [( a1 , a2 )], b = [(b1 , b2 )] ∈ P1 ,
e
ponto
Observe que ( x1 , x2 , x3 , x4 ) = (−ix2 , x2 , −ix4 , x4 ), logo
a intersecção de retas L a ∩ Mb é formada pelo, e apenas pelo,
[b1 (ia1 , a1 , ia2 , a2 ) + b2 (ia2 , − a2 , −ia1 , a1 )] .
Demonstração. Note também que [b1 u1 ( a) + b2 u2 ( a)] ∈
L a , [ a1 v1 (b) + a2 v2 (b)] ∈ Mb e que b1 u1 ( a) + b2 u2 ( a) =
12
66
Matemática Universitária nº45
Vbq = [(0, 0, −i, 1), (i, −1, 0, 0)] .
pertence a Uaq . Além disso,
(−ix2 , x2 , −ix4 , x4 )
= x4 (0, 0, −i, 1) − x2 (i, −1, 0, 0) ∈ Vbq ,
{Artigo}
conclui-se que  = L a p ou  = Mb p , como queríamos
de onde concluímos que L aq ∩ Mbq = {q}.
No caso ( I I ), tome aq = [( x1 + ix2 , x3 + ix4 )] e bq =
[( x2 − ix1 , x4 + ix3 )]. Não esquecendo de usar
x32
+
x42
x12 + x22 +
demonstrar.
A intersecção em (8) é o conjunto algébrico Z (h, F4 ),
e z = [(z1 , z2 , z3 , z4 )] ∈ Z (h, F4 ) se e somente se
= 0, observe que

(− x1 − ix2 ) · u1 ( aq ) + ( x3 − ix4 ) · u2 ( aq )
= 2( x2 − ix1 )( x1 , x2 , x3 , x4 ) ∈ Uaq
h (z) = x1 z1 + x2 z2 + x3 z3 + x4 z4 = 0
F4 (z) = z21 + z22 + z23 + z24 = 0.
Como o plano Hx é definido pela forma linear h não
e
nula, podemos supor, sem perda de generalidade, que
( x1 + ix2 ) · v1 (bq ) + ( x3 + ix4 ) · v2 (bq )
x4 = 0. Assim, Hx = Z (h) = Z (h1 ), com h1 = α1 x +
= 2( x1 + ix2 )( x1 , x2 , x3 , x4 ) ∈ Vbq .
Portanto q ∈ L aq ∩ Mbq e, pelo Fato 6, é o único ponto

Fato 8. Se  for uma reta contida em Z ( F4 ), então  = L a
ou  = Ma , para algum a ∈ P1 .
Sejam
(y1 , y2 , y3 , y4 ), pontos distintos na reta . Então os vetores x e y são linearmente independentes e  = P (W ),
com W = [x, y].
Seja Hx o plano definido pela forma linear
=
Hx = Z (h)).
x1 x + x2 y + x3 z + x4 w (ou seja,
Primeiro verificamos que  ⊂ Hx .
De fato, se [v] ∈  então v = tx + sy, para certos
t, s ∈ C, e vale
2α1 α2 xy + 2α1 α3 xz + 2α2 α3 yz ∈ C [ x, y, z].
Por outro lado, como p e q pertencem a Z ( F4 ) e [x + y] ∈
 ⊂ Z ( F4 ), então
Portanto
Z (h, F4 ) = Z (h1 , f ).
Os coeficientes 1 + α2i , 1 ≤ i ≤ 3, não podem ser
todos nulos, pois 1 + α2i = 0 para 1 ≤ i ≤ 3 im-
plica α21 + α22 + α23 = −3, o que é uma contradição com
p = [ x ] = [(α1 , α2 , α3 , 1)] ∈ Z ( F4 ), pois isto implica
α21 + α22 + α23 = −1. Assim vamos supor, sem perda de
generalidade, que 1 + α21 = 0. Façamos λ = 1 + α21
e tomemos µ tal que µ2 = λ, para simplificar a notação. É uma simples conta verificar que f = L1 L2 ,
µx +
O primeiro termo da soma é nulo porque p ∈ Z ( F4 ).
( µαλ1 α2
−
µα1 α2
λ
α3
µ )y
+
µα1 α3
α3
− αµ2 )z e L2
µ )y + ( λ
( µαλ1 α3 + αµ2 )z. Então Z (h, F4 )
+
=
=
Z (h1 , f ) = Z (h1 , L1 L2 ) = Z (h1 , L1 ) ∪ Z (h1 , L2 ). Além
disso, L1 e L2 , por não terem termo em w, não são múltiplos de h1 , implicando que 1 = Z (h1 , L1 ) e 2 =
Z (h1 , L2 ) são retas.
=
F4 (x + y)
=
F4 (x) + F4 (y) + 2x1 y1 + 2x2 y2 + 2x3 y3 + 2x4 y4
= 2( x1 y1 + x2 y2 + x3 y3 + x4 y4 ) ,
Sabemos que o ponto p = [x] está contido nas re-
tas L a p e Mb p e, assim como mostramos que  ⊂ Hx ,
mostra-se que L a p e Mb p estão contidas no plano Hx .
Como essas retas também estão em Z ( F4 ),
implicando que h(v) = 0.
Nosso objetivo será mostrar que
Hx ∩ Z ( F4 ) = L a p ∪ Mb p .
f = 0,
com L1 = µx + (
h(v) = tF4 (x) + s( x1 y1 + x2 y2 + x3 y3 + x4 y4 ) .
0
α1 z1 + α2 z2 + α3 z3 + z4 = 0
em que f = (1 + α21 ) x2 + (1 + α22 )y2 + (1 + α23 )z2 +
p = [x] e q = [y], com x = ( x1 , x2 , x3 , x4 ) e y =
h( x, y, z, w)
para 1 ≤ i ≤ 3. Logo z =
(z1 , z2 , z3 , z4 ) ∈ Z (h, F4 ) se, e somente se,
na intersecção.
Demonstração. Tomemos a reta  ⊂ Z ( F4 ).
xi
x4 ,
α2 y + α3 z + w e αi =
(8)
Como  ⊂ Z ( F4 ) (por hipótese) e  ⊂ Hx (pelo pará-
grafo anterior), então  ⊂ L a p ∪ Mb p . Usando o Fato 1,
L a p ∪ Mb p ⊂ Z (h, F4 ) = 1 ∪ 2 .
Assim, L a p ⊂ 1 ∪ 2 e Mb p ⊂ 1 ∪ 2 e, portanto, L a p ⊂
( L a p ∩  1 ) ∪ ( L a p ∩  2 ) e Mb p ⊂ ( Mb p ∩  1 ) ∪ ( Mb p ∩  2 ) .
Como as retas L a p , Mb p , 1 e 2 estão contidas no plano
Matemática Universitária nº45
13
67
{Artigo}
Hx , segue-se do Fato 1 que L a p ∩ 1 consiste de um único
O segundo passo é verificar que uma reta que inter-
ponto ou L a p = 1 . Por outro lado, todas essas retas
secta 1 , 2 , 3 e 4 deve estar contida em Q. Se  é uma
passam pelo ponto p = [x], assim a intersecção de qual-
tal reta, definimos { pi } =  ∩ i , para 1 ≤ i ≤ 3. Como
quer par dessas retas, no caso de serem distintas, será
as retas i , para 1 ≤ i ≤ 3, são duas a duas disjuntas,
o ponto p. Como L a p ⊂ ( L a p ∩ 1 ) ∪ ( L a p ∩ 2 ), en-
e estão contidas na quádrica Q, temos que os pontos
neste caso teríamos que L a p ⊂ ( L a p ∩ 1 ) ∪ ( L a p ∩ 2 ) =
quádrica Q. Logo, da Proposição 5, segue que  ⊂ Q.
tão não pode acontecer que L a p = 1 e L a p = 2 , pois
{ p} ∪ { p} = { p}, o que é um absurdo, pois uma reta
consiste de infinitos pontos. Assim, podemos afirmar
que i = L a p , para i = 1 ou i = 2. Da mesma forma,
pi , para 1 ≤ i ≤ 3, têm que ser distintos e pertencer à
Assim  será necessariamente uma reta contida em Q
que intersecta as retas i ∈ L, para 1 ≤ i ≤ 3. Portanto,
pelos Fatos 5 e 8, será necessariamente da família M.
i = Mb p , para i = 1 ou i = 2. Além disso, i não pode
O passo final é considerar a quarta reta. Usando no-
ser o mesmo nos dois casos, já que L a p e Mb p são retas
vamente a Proposição 5, 4 está contida em Q ou Q ∩ 4
distintas. Portanto 1 ∪ 2 = L a p ∪ Mb p , e isto encerra a
consiste de dois pontos (não necessariamente distintos).
demonstração de (8).
Analisemos esses dois casos.
A solução do problema
Caso 4 ⊂ Q. Como 4 é disjunta de i , para 1 ≤ i ≤ 3,
Sejam 1 , 2 , 3 , 4 quatro retas disjuntas duas a duas em
L. Neste caso todas as retas da família M intersectam 1 ,
então, pelos Fatos 5, 6 e 8, 4 também pertence à família
P3 . O primeiro passo será associar às três primeiras re-
2 , 3 e 4 , simultaneamente. Portanto, as infinitas retas
tas disjuntas uma superfície quádrica que as contenha.
da família M são soluções do problema em questão.
Escolhendo três pontos distintos p1i , p2i e p3i em cada
reta i , para 1 ≤ i ≤ 3, segue-se de (3) que existe pelo
Caso 4 ⊂ Q. Pela Proposição 5, Q ∩ 4 = {q1 } ∪ {q2 },
menos uma superfície quádrica Q = Z ( F ) com F ∈ S2 ,
com q1 e q2 não necessariamente distintos. Sejam Mb1 e
não nulo, contendo esses 9 pontos. Assim, temos que
Mb2 as únicas retas da família M que passam por q1 e q2 ,
{ p1i , p2i , p3i }
respectivamente, pelos Fatos 7 e 5. Então Mb1 e Mb2 in-
⊂ Q ∩ i para 1 ≤ i ≤ 3, e consequente-
mente, da Proposição 5, as três retas estão contidas em
tersectam 1 , 2 , 3 e 4 , simultaneamente, pelo Fato 6.
Q.
Como as soluções que estamos procurando são neces-
Por outro lado, sabemos que existe uma mudança de
sariamente retas da família M, concluímos que Mb1 e
coordenadas projetivas T tal que T ( Q) = Z ( Fk ), para
Mb2 são as únicas soluções. Teremos, então, exatamente
algum 1 ≤ k ≤ 4. Ademais, convém lembrar que uma
mudança de coordenadas projetivas transforma retas
duas soluções se 4 não for uma reta “tangente” a Q,
isto é, q1 = q2 , e, caso contrário, uma única solução.
em retas, e que pares de retas disjuntas são aplicados
em pares de retas disjuntas.
Em resumo, a solução do problema proposto é: dadas
Finalmente, a partir dos Fatos 3 e 4, concluímos que
as quatro retas disjuntas, seja Q uma quádrica contendo
T ( Q) só pode ser Z ( F4 ), em particular, não singular
três delas. Se a quarta reta está contida em Q, então há
(por simplicidade, iremos supor que essa mudança de
infinitas retas que intersectam as retas dadas. Se não,
coordenadas já foi feita e que Q = Z ( F4 )). Já os Fa-
pode haver duas ou uma, dependendo da posição rela-
tos 8 e 6 nos dizem que essas retas são todas de, e
apenas de, uma das famílias L = { L a | a ∈ P1 } ou
M = { Ma | a ∈ P1 }. Iremos supor, sem perda de gene-
ralidade, que i ∈ L, para 1 ≤ i ≤ 3.
14
68
Matemática Universitária nº45
tiva dessa quarta reta com respeito a Q.
Agradecimentos.
Agradecemos ao Prof. Frank Sot-
tile, a gentileza de ter nos fornecido a figura 1, aos pa-
{Artigo}
receristas e editores da Matemática Universitária (em es-
Jacqueline Rojas
pecial ao Prof. Eduardo Colli) e ao Prof. Nelson Nery
CCEN - Departamento de Matemática - UFPB
de Oliveira Castro (DM-UFPB), pela leitura e sugestões,
Cidade Universitária - João Pessoa - PB
que tiveram um papel imprescindível na reformulação
CEP: 58051-900
do texto original. Durante a elaboração do texto o pri-
[email protected]
meiro autor (Jacqueline Rojas) teve o apoio parcial do
CNPq, processo número 620108/2008-8 (Edital Casadi-
Ramón Mendoza
nho).
CCEN - Departamento de Matemática - UFPE
Cidade Universitária - Recife - PE
Referências
CEP: 50740-540
[email protected]
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