Panorama da geodiversidade brasileira e suas áreas de relevante interesse mineral Cássio Roberto da Silva1 Valter Jose Marques2 Vitório Orlandi Filho3 Cíntia Itokazu Coutinho4 1. Introdução A Terra é um sistema vivo que abriga milhões de organismos, incluindo os humanos, e apresenta delicado equilíbrio para manter a vida. A Geologia é a ciência que estuda a Terra: sua origem, evolução, funcionamento e o seu conhecimento podem contribuir para preservar os habitats que sustentam a vida. A geodiversidade é a natureza abiótica (meio físico) constituída por uma variedade de ambientes, fenômenos e processos geológicos que dão origem às paisagens, rochas, minerais, solos, águas, fósseis e outros depósitos superficiais que propiciam o desenvolvimento da vida na Terra, tendo como valores intrínsecos à cultura, o estético, o econômico, o científico, o educativo e o turístico. A origem do Universo assim como do Planeta Terra remonta a bilhões de anos. Atualmente, segundo (PRESS et al 2006), a explicação científica mais aceita é a teoria da Grande Explosão (Big Bang), a qual considera que nosso Universo começou entre 13 e 14 bilhões de anos atrás, a partir de uma “explosão” cósmica. Os astrônomos entendem que, a partir deste evento, o Universo expandiu-se e dividiu-se para formar as galáxias e as estrelas. Os geólogos ainda analisam os últimos 4,5 bilhões de anos dessa vasta expansão, um tempo durante o qual nosso sistema solar – estrela que nós chamamos de Sol e os planetas que em torno dela orbitam - formou-se e evoluiu. Os geólogos estudam a origem do sistema solar para entender a formação da Terra. Embora a Terra tenha se esfriado após um período incandescente, ela continua um planeta inquieto, mudando continuamente por meio de atividades geológicas, tais como terremotos, vulcões e glaciações. Essas atividades são governadas por dois mecanismos térmicos: um interno e outro externo. Mecanismos de tal tipo – como, por exemplo, o motor a gasolina de um automóvel – transformam calor em movimento mecânico ou trabalho. O mecanismo interno da Terra é governado pela energia térmica aprisionada durante a origem cataclísmica do planeta, e gerada pela radioatividade em seus níveis mais profundos. O calor interior controla os movimentos no manto e no núcleo, suprindo energia para fundir rochas, mover continentes e soerguer montanhas. O mecanismo externo da Terra é controlado pela energia solar – calor da superfície terrestre proveniente do Sol. O calor do Sol energiza a atmosfera e os oceanos e é responsável pelo nosso clima e condições meteorológicas do tempo. Chuva, vento e gelo erodem montanhas e modelam a paisagem e, por sua vez, a forma da superfície da Terra é capaz de provocar mudanças climáticas. Os principais componentes do Sistema Terra são os internos: Litosfera, Astenosfera, Manto inferior, Núcleo externo e Núcleo interno – o calor interno da Terra energiza estes componentes – e os externos: Atmosfera, Hidrosfera e Biosfera – a energia solar energiza estes componentes. 1 Geólogo, Mestre em Geologia Econômica, CPRM – Serviço Geológico do Brasil. Geólogo, especialista em Engenharia do Meio Ambiente.– CPRM Serviço Geológico do Brasil. 3 Geólogo, especialista em geologia ambiental, CPRM – Serviço Geológico do Brasil. 4 Engenheira Civil, Mestre em Engenharia Ambiental, ANP – Agêcia Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. 2 1 Embora pensemos a Terra como sendo um único sistema, é um desafio estudá-la por inteiro, de uma só vez. Ao invés disso, se focarmos nossa atenção em partes do sistema, estaremos avançando no seu entendimento. Por exemplo, nas discussões sobre mudanças climáticas recentes, consideraremos primeiramente as interações entre atmosfera, hidrosfera e biosfera, as quais são controladas pela energia solar. Nossa abordagem sobre a formação dos continentes enfocará as interações entre a crosta e as porções mais profundas do manto, que são controladas pela energia interna da Terra. Os subsistemas específicos que encerram elementos característicos da dinâmica terrestre são chamados de geossistemas (PRESS op.cit). O Sistema Terra pode ser pensado como uma coleção desses geossistemas abertos e interativos (que freqüentemente se sobrepõem). Os geossistemas que operam em escala global são o clima, placas tectônicas e o geodínamo, o qual é responsável pelo campo magnético terrestre (Figura 1). 2 Figura 1- Geossistemas que operam em escala global. Fonte: Modificado de Press et al 2006). De acordo com a notável teoria da tectônica de placas, a litosfera não é uma casca contínua; ela é quebrada em cerca de 12 grandes placas que se movem sobre a superfície terrestre com taxas de alguns centímetros por ano. O movimento das placas é a manifestação superficial da convecção do manto, e nos referimos a todo esse conjunto como o sistema das placas tectônicas. Controlado pelo calor interno da Terra, o material quente do manto sobe onde as placas se separam, e então começa a endurecer a litosfera. À medida que se move para longe desse limite divergente, a litosfera esfria e torna-se mais rígida. Porém, ela pode eventualmente afundar na astenosfera e arrastar material de volta para o manto, nos bordos onde as placas convergem, num processo contínuo de criação e destruição. Segundo Press (op. cit.), o habitat humano é uma delgada interface entre a Terra e o céu, onde grandes forças interagem para moldar a face do nosso planeta. As forças tectônicas dentro da litosfera, controladas pelo calor interno das profundezas, geram terremotos, erupções vulcânicas e soerguimento de montanhas. As forças meteorológicas dentro da atmosfera e da hidrosfera, controladas pelo calor do sol, produzem tempestades, inundações, geleiras e outros agentes de erosão. As interações entre os geossistemas globais da tectônica de placas e do clima mantêm um equilibrado ambiente na superfície terrestre e, segundo o qual, a sociedade humana pode prosperar e crescer. Na verdade, nossos números e atividades estão se multiplicando em taxas fenomenais. De 1930 a 2000, a população mundial cresceu 300%, de 2 para 6 bilhões de habitantes. Nos próximos 30 anos, estima-se que esse total exceda a 8 bilhões. Entretanto, a energia total utilizada aumentou em 1.000% durante os últimos 70 anos e está, agora, subindo duas vezes mais rápido que a taxa de crescimento da população. Ao longo de toda sua história, o homem tem modificado o meio ambiente através do desmatamento, da agricultura, bem como por outros tipos de uso do solo. Entretanto, os efeitos dessas transformações nos tempos antigos eram, comumente, restritos ao habitat local ou regional. A sociedade atual afeta o meio ambiente numa escala inteiramente nova: nossas atividades podem ter conseqüências globais. A magnitude das atuais atividades humanas em relação aos sistemas das placas tectônicas e do clima, que governam a superfície terrestre, pode ser ilustrada por alguns simples dados estatísticos, (PRESS et al, 2006): • Na maioria dos países desenvolvidos, obras de engenharia civil removem maior volume de solos e rocha a cada ano, do que todos os processos naturais de erosão combinados. • Os reservatórios construídos pelo homem retêm cerca de 30% dos sedimentos transportados pelos rios. • Nos 50 anos após a invenção da refrigeração com gás freon, cloro-flúor-carbonos fabricados pelo homem vazaram de refrigeradores e condicionadores de ar para a estratosfera em quantidade suficiente para danificar a camada de ozônio que protege a superfície terrestre. • Desde o começo da Revolução Industrial, no início do século XIX, o desmatamento e a queima de combustíveis fósseis aumentaram a quantidade de dióxido de carbono na atmosfera em mais de 30%. O dióxido de carbono atmosférico está aumentando numa taxa sem precedentes de 4% por década e, provavelmente, causará expressivo 3 aquecimento global em futuro próximo, provavelmente quando nossos filhos estiverem em idade adulta. Essas questões são relevantes, e os geocientistas podem contribuir significativamente com informações do meio físico para que políticos, planejadores e gestores do território tomem decisões acertadas quanto ao uso adequado dos espaços geográficos. 2. Recursos minerais e energéticos: análise ambiental estratégica Por suas dimensões continentais e sua diversificada geologia, o Brasil constitui-se em um país com enorme vocação mineral e um grande produtor de insumos básicos provenientes da mineração. Atualmente, figura no cenário internacional, ao lado de paises com tradicional vocação mineira tais como o Canadá, Austrália, África do Sul e Estados Unidos. A produção mineral brasileira tem sido crescente nas últimas décadas devendo-se este fato, pelo menos parcialmente, aos enormes investimentos realizados pelas empresas de mineração em prospecção mineral aliado ao esforço realizado pelo governo federal na execução de extensos programas de levantamentos geológicos sistemáticos levados a efeito, principalmente, nas décadas de 60 e 70, e retomados nas décadas de 80, 90 e 00, pelo Serviço Geológico do Brasil - CPRM, juntamente com o Departamento Nacional da Produção Mineral - DNPM e Universidades. Este esforço conjunto, governo e iniciativa privada, resultou na descoberta de centenas de novas jazidas de minérios metálicos e não metálicos, gemas e minerais energéticos, sendo que muitas delas estão pleno processo de explotação, gerando riqueza para o país. Como conseqüência, a produção mineral do país tem crescido sistematicamente nos últimos anos atingindo em 2005 um total de R$ 85 bilhões, o que corresponde em torno de 5% do PIB, demonstrando o enorme crescimento alcançado pelo setor mineral brasileiro. Os bens minerais constituem-se em um dos grandes patrimônios não renováveis da Geodiversidade, sendo um importante fator de desenvolvimento sustentável e da melhoria da qualidade de vida dos brasileiros. A industria extrativa é uma das mais importantes fontes de emprego e desenvolvimento regional, já que as jazidas muitas vezes situam-se em regiões isoladas carentes de investimentos econômicos e sociais. Assim, a ampla distribuição das jazidas no território nacional, que promove a interiorização de empregos evitando a emigração de mão de obra para centros urbanos já altamente populosos, aliada a investimentos governamentais e privados, constituem-se em fator importante para o desenvolvimento do nosso país. A crescente produção mineral do Brasil, motivada pelo o aumento de preço e da demanda de países emergentes como China e Índia, tem permitido um significativo aumento do setor mineral no desenvolvimento do país permitindo antever uma boa perspectiva para o setor mineral do país no curto e médio prazo. Entretanto, contrapondo-se a este cenário otimista, verifica-se que nos últimos anos, muitas das áreas potencialmente favoráveis a existência de jazidas minerais, estão sendo objeto de implantação de áreas protegidas, inibindo de maneira preocupante a atual e futura atividade mineira tão necessária ao desenvolvimento nacional. Este conflito de uso está extremamente acentuado na região norte do Brasil, onde jazidas importantes estão situadas em terras indígenas e unidades de conservação, em proporções cada vez maiores. Assim, em nome da preservação da biodiversidade, importantes riquezas minerais tornar-se-ão intocáveis. Por outro lado, é importante que se ressalte que os bens minerais, quando extraídos da natureza com tecnologia adequada, transformam-se em riquezas, com o menor impacto 4 possível. Normalmente é atribuído a esta atividade um papel poluidor de grande dimensão, embora seja reconhecida que a degradação, quando inevitável, normalmente é pontual e de pequena dimensão. Felizmente, nos últimos anos, com a divulgação na mídia dos cuidados que as empresas de mineração estão tendo com o meio ambiente, esta imagem poluidora está diminuindo quando comparadas como outras atividades econômicas. Além de toda a potencialidade mineral do território continental do Brasil, recentemente, estudos geológicos realizados na plataforma marinha, também conhecida como a Amazônia Azul, revelaram que além do potencial petrolífero, existem animadores indícios de depósitos de fosforitas, diamante, calcário e ouro entre outros. Os recursos minerais desta parte do território brasileiro são também uma nova fronteira de recursos naturais para o país. Na análise estratégica, com base em 8 encartes denominados “Áreas de Relevante Interesse Mineral, Áreas Protegidas e Áreas Especiais”, as ocorrências, depósitos e jazidas cadastradas, representando mais de 160 substâncias minerais, foram agrupadas em: Insumos para a Agricultura, Materiais Energéticos (carvão, turfa, gás e óleo), Gemas Preciosas, Minerais Metálicos, Minerais Industriais Não Metálicos, Água Mineral e Potável, Rochas Ornamentais e Materiais para Uso na Construção Civil. A localização destes bens minerais em relação às Áreas Protegidas e Áreas Especiais esta sintetizada na Figura 2. Neste trabalho buscou-se um conjunto de informações capazes de traduzir a dimensão ecológico-econômica e social das atividades mineiras, bem como o potencial geológico do país. No mesmo mapa, citado acima, tem-se um quadro onde foram analisados os capitais econômico e humano envolvidos nas atividades setoriais, ao qual se comparam os impactos ambientais, para finalmente sumariar-se uma visão estratégica que inclui as relações custobenefício e a essencialidade dos recursos minerais para o desenvolvimento e segurança nacional. Ressalta-se, por exemplo, que as atividades minerárias de uma série de insumos, sobretudo materiais de construção, são tanto mais abundantes quanto mais populosas forem as regiões do país. Destaca-se, também, a má distribuição de alguns recursos essenciais para o desenvolvimento econômico, como é o caso dos calcários para corretivos de solos, raros ou até mesmo inexistentes em algumas unidades da federação, como é o caso de Roraima. No que diz respeito aos impactos ambientais decorrentes da mineração, deve-se pinçar algumas constatações provenientes da experiência adquirida ao longo de décadas. A primeira é que a mineração organizada causa menos impactos negativos e é muito mais facilmente controlada pelo setor público. Por outro lado, o extrativismo mineral informal utilizando-se de métodos rudimentares, sem planejamento e controle, constitui-se em grande fonte de passivos ambientais. Seu controle é muito problemático, sobretudo porque envolve parcelas da população (garimpeira) que se valem dessa atividade como último recurso para a sua sobrevivência e privadas dessa fonte, caem na marginalidade. Uma outra questão importante diz respeito à mineração em áreas urbanas que, sendo feita de modo geral sem um adequado planejamento e inserção nos planos diretores, vem gerando imensos conflitos de uso da terra, além de múltiplos impactos ambientais. Tratando-se de uma atividade que comumente causa impacta as áreas de preservação permanente, é imperioso que se promova o aperfeiçoamento dos métodos de lavra e a reutilização dos espaços minerados. Em áreas urbanas as principais lavras são para minerais para de uso na construção civil, importante bem social, cujo custo é muito sensível em relação ao transporte, sendo assim, é 5 preciso proteger os depósitos minerais para a construção civil, de forma que à urbanização não os inviabilizem. A análise estratégica aponta, também, no sentido de que o país poderia melhor aproveitar seu potencial em rochas ornamentais e água mineral, propiciando recursos expressivos (divisas) decorrentes da exportação dessas commodities. Um outro aspecto relaciona-se à necessidade de planejamento territorial integrado, por exemplo, com respeito à infra-estrutura, evitando-se custos desnecessários para viabilizar depósitos minerais que às vezes são marginalizados, tornando-se antieconômicos, o que é sobremaneira grave, principalmente em regiões economicamente deprimidas, carentes de bases para arranjos produtivos. Com respeito aos recursos minerais existentes na Amazônia, além dos já conhecidos mamutes geológicos e o potencial para que se encontrem outros, pode-se prognosticar o grau de importância dos calcários dolomíticos e o sal-gema, que não somente são raros como mal distribuídos, do óleo leve e do gás natural, requerendo-se cuidadoso planejamento de forma a evitar o engessamento de áreas de relevante interesse para esses minerais, tornando indisponíveis matérias-primas fundamentais para a sustentabilidade social e econômica e, por conseqüência, ecológica de toda a região. Dentro dessa visão, os recursos minerais devem ser considerados como parte da infraestrutura territorial, salientando-se, ainda mais, a sua rigidez locacional, diferentemente de estradas, redes de energia e outros componentes do desenvolvimento econômico e social. Aliás, é justamente na Amazônia que despontam os principais conflitos de uso e ocupação, haja vista a dualidade extremada entre conservação e exploração dos recursos naturais. Um dos principais óbices à tomada de decisões no momento é a falta de conhecimento científico sobre o território, sobre a sua composição e funcionamento dos geossistemas, de sorte que se possam embasar decisões seguras, passíveis de serem consensuadas. Em relação aos materiais energéticos, o referido mapa mostra as bacias sedimentares com relevante potencial para a pesquisa de carvão, turfa, petróleo e gás natural e os poços com hidrocarbonetos constatados. Além das áreas atualmente em produção, as bacias sedimentares brasileiras, tanto em terra como em mar, apresentam grande potencial para petróleo e gás, considerando-se que condições geológicas similares no mundo proporcionam produção relevante. Finalmente, com respeito à exploração de petróleo e gás salienta-se a importância desses recursos tanto para a economia e a segurança nacional, como pelo papel que desempenham impulsionando uma série de indústrias, com destaque para a indústria naval, além da petroquímica, naturalmente. A produção bruta de petróleo e a capacidade de refino e transporte dão uma dimensão do gigantismo do setor e sua importância para a vida nacional. 6 IINSUMOS PARA A AGRICULTURA MINERAIS METÁLICOS MINERAIS INDUSTRIAIS NÃO-METÁLICOS MATERIAIS ENERGÉTICOS ÁGUA MINERAL E POTÁVEL ROCHAS ORNAMENTAIS GEMAS E PEDRAS PRECIOSAS MATERIAIS DE USO NA CONSTRUÇÃO CIVIL Figura 2 – Localização das Áreas de Relevante Interesse Mineral e das Áreas Protegidas (parques, reservas, APAs, reservas indígenas) e Especiais (Forças Armadas). 3. Domínios e unidades geológico-ambientais: adequabilidades e limitações frente ao uso e ocupação Para disponibilizar informações geológicas a serem utilizadas no planejamento, uso, gestão e ordenamento dos espaços geográficos, o território brasileiro foi dividido em 23 domínios e 108 unidades geológico ambientais (Mapa Geodiversidade do Brasil, em anexo), utilizando-se para classificar os geossistemas (unidades/polígonos de análise) o agrupamento de rochas que apresentassem os mesmos comportamentos frente ao uso e ocupação. 7 Os critérios utilizados foram: posicionamento tectônico, nível crustal, classe da rocha (se ígnea, sedimentar ou metamórfica), grau de coesão, textura, composição, tipos e graus de deformação, expressividade do corpo rochoso, tipos de metamorfismo, expressão geomorfológica e ou litótipos especiais. Se por um lado agrupou-se, por exemplo, quartzitos friáveis e arenitos friáveis, por outro lado foram separados pacotes sedimentares muito semelhantes em sua composição, estrutura e textura, quando a geometria do corpo rochoso apontava no sentido da importância em distinguir, por exemplo, uma situação de extensa cobertura, de uma situação de pacote restrito, limitado em riftes (corpos sedimentares alongados delimitados por falhas). Esses foram os critérios considerados para interpretar a influência da geologia dos grandes Geossistemas do Brasil nas adequabilidades e limitações dos terrenos frente à execução de obras de superfície e subterrâneas, agricultura, comportamento fontes potencialmente poluidoras e nos potenciais hidrogeológico e mineral, aspectos ambientais e turístico. Apresentamos abaixo como exemplo a descrição do Domínio 9 e as Unidades Geológico Ambientais 9.1 e 9.2, 3.1. Domínio 9 - Espessos pacotes de sedimentos quartzo-arenosos mesozóicos de deposição eólica (transportados pela ação dos ventos). Adequabilidades, Limitações, Potencialidades e Recomendações a) Frente à execução de Obras i) Limitações: • Sedimentos à base de quartzo: bastante abrasivos; problemáticos de serem perfurados com sondas rotativas (as brocas desgastam-se rápido); • Geralmente portadores de alta densidade de fraturas abertas verticalizadas e horizontalizadas: bastante percolativos; soltam blocos e placas com facilidade em taludes de corte; 8 • alteram-se para solos excessivamente arenosos, friáveis, permeáveis e erosivos (figura 73) e que se desmoronam com facilidade em taludes de corte; • Compostos por grãos de quartzo com elevada esferecidade: solos residuais sujeitos ao fenômeno da liquefação (tipo areia movediça); • Existência de raras intercalações de sedimentos síltico-argilosos pouco permeáveis: constituem-se em descontinuidades geomecânicas e hidráulicas que facilitam as desestabilizações e o aparecimento de surgências d´água em taludes de corte; • Possibilidades de existirem pequenas ou grandes cavidades subterrâneas formadas pela erosão dos arenitos pelas águas do lençol freático. Figura 73 - Vossoroca em arenitos ortoquartzíticos da Formação Rio Ávila, diferenciada como Unidade D9.2. Colorado D’oeste, RO. ii) Adequabilidades: • Camadas horizontalizadas, espessas e extensas de sedimentos com boa homogeneidade geomecânica e hidráulica lateral e vertical. b) frente à agricultura i) Limitações: • Predomínio de sedimentos que se alteram para solos excessivamente arenosos: bastante erosivos; sujeitos à arenização e à formação de grandes vossorocas (figura 73); de fertilidade natural muito baixa; excessivamente permeáveis; de baixa capacidade hídrica; perdem água rápido assim que passam as chuvas; de muito baixa capacidade de reter e fixar nutrientes e de assimilar matéria orgânica; respondem muito mal à adubação; bastante ácidos; • Solos residuais inadequados para a agricultura de ciclo curto o que exige a mecanização freqüente e para o cultivo de plantas de raízes curtas. c) frente a fontes poluidoras i) Limitações: 9 • Sedimentos bastante porosos e permeáveis e que se alteram para solos, também bastante permeáveis e de muito baixa capacidade de reter, fixar e eliminar poluentes: poluentes podem chegar rápido até às águas subterrâneas sem sofrer nenhuma depuração; • Cuidados especiais devem ser tomados com todas as fontes potencialmente poluidoras (figura 74). Figura 74 - Uma prática que se costuma fazer é depositar lixo nas vossorocas que existem na periferia das cidades localizadas nos terrenos diferenciados como Domínio 9, a exemplo desse local, área de exposição da Formação Botucatu, região de Cajuru, SP. Destaca-se que esses terrenos são áreas de recarga de um dos maiores e melhores aqüíferos do mundo, o Aqüífero Guarani, e são sustentados por solos e sedimentos altamente permeáveis e de muito baixa capacidade de reter e depurar poluentes. d) recursos hídricos subterrâneos i) Limitações: • Aqüíferos porosos de muito alta vulnerabilidade à contaminação; • Em algumas regiões a permeabilidade e a porosidade dos arenitos podem estar reduzidas pela silicificação acentuada ou pela diagênese avançada. ii) Adequabilidades: • Sedimentos à base de quartzo, com granulometria entre areia e silte, com boa seleção granulométrica, pronunciado grau de arredondamento e freqüente bimodalidade de tamanho dos grãos: características hidrodinâmicas bastante favoráveis para se constituírem em excelentes aqüíferos subterrâneos; • Aqüíferos porosos bastante espessos, de grande expressividade areal e boa homogeneidade hidrodinâmica lateral e vertical. e) Potencial mineral • Predomínio de sedimentos à base de quartzo: de alta resistência ao intemperismo físico-químico; quando não-intemperizados são bem endurecidos e adequados para serem usados como pedra de revestimento e refratários; • Manto de alteração parcial quartzo-arenoso: bom para ser usado como anti-pó, areia e saibro. f) Aspectos ambientais e potencial turístico 10 • Terrenos naturalmente suscetíveis à erosão, à arenização e a vossorocamentos; • Fonte de alta carga de detritos arenosos que assoream os cursos d´água; • Bastante permeáveis, importantes para a recarga das águas subterrâneas; • Ocorrências fossilíferas de crocodilos, quelônios e dinossauros. 3.2. Unidade geológico-ambiental D9.1 Espesso e extenso pacote de quartzo-arenito, geralmente bem consolidado, com intercalações subordinadas de sedimentos síltico-argilosos. a) frente à execução de obras i) Limitações: • Predomínio de quartzo-arenitos, em geral, bem consolidados: de moderada a alta resistência ao corte e à penetração. ii) Adequabilidades: • Maior possibilidade de se encontrar arenitos bem endurecidos, de alta resistência ao intemperismo físico-químico e alta resistência à compressão. b) Potencial Mineral • Maior possibilidade de existirem arenitos bastante endurecidos e com boas características para serem usados como pedra de revestimento. c) Aspectos ambientais e potencial turístico • Área de afloramento do aqüífero Guarani, um dos maiores e melhores reservatórios de água doce do mundo; • Configuração morfolitostrutural favorável à existência de relevo escarpado e de morros residuais de belas e curiosas formas (figura 76) e até grutas. Figura 76 - Escarpa sustentada por arenitos da Formação Botucatu, região de Descalvado-Analândia, SP, diferenciada como Unidade D9.1. Essa configuração morfolitostrutural é um importante e frágil ecossistema. No sopé das escarpas costumam existir nascentes d´água. Além disso, é uma frente erosiva, naturalmente instável, recoberta por blocos, matacões de arenito e por solos arenosos que se desprendem das escarpas, material sujeito a se movimentar naturalmente. Além de que, é muito bonita e recoberta por uma vegetação típica, que deve ser preservada. 3.3. Unidade geológico-ambiental D9.2 11 Espesso e extenso pacote de quartzo-arenito, pouco a moderadamente consolidado, com intercalações subordinadas de sedimentos síltico-argilosos. a) frente à execução de obras i) Limitações: • Predomínio de sedimentos com baixo grau de consistência: deficiência de rochas duras para agregados. ii) Adequabilidades: • Predomínio de sedimentos com baixo grau de consolidação: baixa resistência ao corte; podem ser desmontados e escavados apenas com ferramentas e maquinários de corte. c) Aspectos Ambientais e Potencial Turístico • Terrenos com intensa atividade agrossilvopastoril, com alta incidência de imensas vossorocas (figura 73). 4. Considerações finais Os bens minerais desde os primórdios da vida humana têm sido intensivamente utilizados para o bem estar das pessoas, sendo utilizados em nossa vida cotidiana, nas moradias, veículos, utilitários domésticos, materiais de comunicação, etc. Praticamente, tudo que nos rodeia é constituído por minerais e/ou rochas. Também é importante salientar que as rochas após intemperizadas, juntamente com o relevo e clima, contribui para a formação dos solos, disponibilizando nutrientes e micronutrientes, os quais são absorvidos pelas plantas, sustentando e desenvolvendo assim, a vida no planeta terra (biodiversidade). A biodiversidade esta assentada sobre a geodiversidade e, por conseguinte, é dependente direta desta, necessitando ser melhor estudada e considerada nos futuros usos ou proteção dos espaços geográficos. O Mapa Geodiversidade do Brasil na escala 1:2.500.000, apresenta em seu conteúdo informações que vão da escala 1.250.000, no Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste a 1:2.500.000 em grande parte da região Norte. Presta-se para ser utilizado em empreendimentos de grande porte que necessitem de informações do meio físico mas, principalmente, para órgãos de governo federal e estaduais que necessitam planejar, gerenciar e ordenar frente à ocupação e uso dos espaços territoriais. Configura-se como importante ferramenta, juntamente com outras informações setoriais, para elaborar o zoneamento ecológico-econômico e o planejamento estratégico do país. Bibliografia CPRM - Mapa Geodiversidade do Brasil, escala 1:2.500.000, Legenda Expandida, ilustrada, CD-ROM/SIG, Serviço Geológico do Brasil - CPRM, Secretaria de Geologia, 12 Mineração e Transformação Mineral - SGM, Ministério de Minas e Energia - MME, Brasilia, 2006. PRESS, F, SIEVER R.,GROTZINGER, J. & JORDAN, T. H. - Para Entender a Terra, 4ª Edição, Tradução Rualdo Menegat,Trechos; Figs. 1.10 e 2.15. – Porto Alegre: Artmed Editora, 656 p.: il. 2006. 13