O movimento trovadoresco

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PORTAL DE HISTÓRIA DO TEATRO MUNDIAL E BRASILEIRO
PRATA DA CASA - ENTREVISTA
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Título: O movimento trovadoresco: Contextualização histórica,
características e sua influência nos movimentos posteriores
Autora: Gabriela Maciel Anibali
Arquivo: 09.PCES.00005
Portal de História do Teatro Mundial e Brasileiro
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movimentos posteriores - Autora: Gabriela Maciel Anibali
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Título: O movimento trovadoresco: Contextualização histórica, características e sua
influência nos movimentos posteriores
Autora: Gabriela Maciel Anibali
Data: Nov/2011
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA SOBRE A IDADE MÉDIA
Para termos um panorama geral e simplificado dos acontecimentos histórico-sociais
referentes ao período denominado Idade Média, nos daremos certa liberdade ao tratar de
quase um milênio de história como um grande bloco homogêneo – perspectiva positivista de
história – para facilitar a situação no tempo e espaço.
A Idade Média corresponde ao período de tempo entre 476 e 1453. O marco histórico
escolhido como inicial do período é a tomada de Roma pelos bárbaros germânicos e o final, a
tomada de Constantinopla pelos turcos. É importante ressaltar que na parte ocidental da
Europa, que foi alvo das invasões bárbaras, houve uma fusão da sociedade romana com as
germânicas, e que a igreja romana foi o órgão centralizador de poder enquanto na Europa
oriental ainda havia muito de influência grega e o poder da igreja era menos significante a
princípio. Para este trabalho interessa o concernente à Europa Ocidental.
Há ainda a subdivisão deste período em Alta Idade Média (séc. V a X) e Baixa Idade
Média (séc. XI a XV). A primeira corresponderia à retração da economia e ruralização da
sociedade, o que foi a base para formação e consolidação do feudalismo; e a segunda como
uma fase de expansão do sistema feudal e sua posterior crise.
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SOUZA LIMA (2004) define feudalismo como um sistema tipicamente europeu no qual o
feudo – um bem, que poderia ser um ou mais senhorios (unidade territorial básica de produção
do sistema feudal) – é o fundamento das relações socioeconômicas e políticas. Seu
desenvolvimento se dá nos séc. X e XI, o auge no séc. XII e o início de decadência a partir do
séc. XIII. A agricultura era a atividade econômica preponderante e o senhorio produzia o que
era necessário para se manter, sendo portanto auto-suficiente.
Em termos sociais, o feudalismo se caracteriza pela estratificação – não-mobilidade das classes sociais e a posição dos grupos era determinada pela relação com a terra. Assim
sendo, eram três as camadas fixas e incontestáveis - já que sua divisão era um desejo divino
(não à toa a classe dominante que era responsável pela ligação dos homens com Deus era o
Clero): o Clero, como representante da hegemonia da igreja, que foi o grande poder político,
artístico, social e religioso da Idade Média; os guerreiros, senhores de terras armados e
preparados para defender suas terras contras invasores ou, no caso das Cruzadas, “defender a
igreja de seus inimigos” (pretexto para matança e saques generalizados, visando à conquista
de terras e a “conversão” de fiéis para a igreja); e, por fim, os trabalhadores que sustentavam o
sistema.
As relações eram baseadas em dois eixos: relações feudo-vassálicas – entre membros
da aristocracia militar e territorial – baseadas no feudo, na fidelidade e na reciprocidade; e as
relações servis de produção – entre senhor da terra e trabalhador – baseadas na desigualdade
de condições e na exploração do trabalho.
O estado feudal era um estado enfraquecido justamente por causa da autonomia dos
feudos e o poder político era fragmento entre os senhores de terra. A cavalaria, que era um
privilégio dos nobres, tinha a função de garantir e ampliar os domínios dos senhores, reprimir
rebeliões camponesas, e massacrar os inimigos da cristandade (muçulmanos) para garantir a
conquista de mais terras.
A igreja como grande poder centralizador era não só a maior dona de terras, mas
também a detentora do saber. Monopolizava a cultura, o que possibilitava grande controle à
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seus representantes – clero - que davam sermões baseados na divisão desigual de classes,
alegando ser esta divisão uma imposição divina e inquestionável.
Durante a Baixa Idade Média houve um aumento considerável da população: no séc. X
a população era de cerca de 20 milhões de pessoas já no séc. XIV esse número subiu para 51
milhões. Ao crescimento populacional decorreu um crescimento comercial e um processo de
urbanização, o que originou as feiras que eram realizadas dentro das fortificações (cenário
onde ocorriam as apresentações dos menestréis e jograis).
Devido à exploração agrícola predatória as terras tornaram-se improdutivas, o que
impossibilitou a colheita e ocasionou a estagnação da produção agrícola. Com a paralisação do
mercado agrícola e o esgotamento das minas de ouro e prata, estava instalada a crise no
sistema. A peste negra que atingiu a Europa por volta de 1348 dizimou mais de 30% da
população, acelerando o processo de desagregação do feudalismo, devido à escassez de mãode-obra e a morte de grande parte da nobreza. Com o declínio do antigo sistema surge uma
nova classe que desloca o eixo da economia para as atividades urbanas: a burguesia.
MOVIMENTO TROVADORESCO: ANTECEDENTES E CARACTERÍSTICAS
Para entendermos a dimensão cultural e social do movimento trovadoresco faz-se
necessária uma diferenciação entre cultura sacra e cultura secular. A cultura sacra é aquela
aceita oficialmente por uma dada religião ou prática religiosa, neste caso específico, seria o
correspondente a cultura litúrgica da igreja católica. A cultura secular, que é o foco do presente
trabalho, pode ser dividida em profana e religiosa. A cultura profana não está ligada, mesmo
informalmente, à igreja e aborda as mais diferentes facetas da vida e sentimentos humanos. A
cultura secular religiosa expressa de forma não-oficial valores e preceitos de uma dada religião,
sendo seus textos não-litúrgicos, mas sobre valores religiosos.
Num período em que a igreja domina a cultura e coopta as práticas seculares,
apropriando-se delas e registrando-as (enquanto as atividades seculares não eram registradas
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e, sim, transmitidas pela tradição oral), quase tudo que restou em termos de documentação
passou pelo crivo desta instituição. Sobre o processo de absorção da cultura secular pela
igreja, RAYNOR (1981) escreve que:
“[...]é razoável supor que muito do que hoje podemos relacionar apenas ao
seu emprego na Igreja fosse adotado da prática secular. A irrupção de ampla
variedade de instrumentos na música litúrgica, por exemplo, sugere a adoção pelos
músicos da Igreja do que se fazia fora dela – aparentemente com muita certeza
quanto à sua técnica e efeito.”
Mas apesar dos esforços da igreja para suprimir as formas de expressão secular, a
Idade Média abriga um dos maiores movimentos poético-musical, e, portanto secular, da
história: o trovadorismo.
Ironicamente, as primeiras manifestações dos cancioneiros populares (que darão
origem a atividade dos menestréis e posteriormente ao trovadorismo) surgem no séc. XI entre
clérigos errantes e estudantes, denominados Goliardos, que migravam de escola em escola,
nos tempos que precederam a fundação das universidades, levando uma vida vagabunda e
mal vista que era o cerne de suas canções de caráter mordaz e extremamente informal. Seus
temas preferidos eram vinho, mulheres e sátiras.
Os herdeiros dos Goliardos foram os Jongleurs ou Ménestrels, uma nova categoria de
músicos profissionais que surge no séc. X. Eles antecedem o movimento trovadoresco, não
sendo de forma alguma uma espécie primitiva do mesmo e, sim, um movimento com bases
sociais diferentes que irá ser cooptado pela classe dominante e coexistirá ao “novo estilo”.
Sobre a música e a função dos menestréis, RAYNOR em seu História Social da Música– da
Idade Média a Beethoven (1981):
“Originariamente, ela [a música] era parte das funções dos comediantes
palacianos, que eram também jograis, acrobatas, dançarinos, domadores de animais
de circo e anunciantes cômicos; a palavra juggler em inglês (saltimbanco,
prestidigitador) tem a mesma raiz que o termo jongleur medieval que é o nome às
vezes dado ao menestrel da baixa Idade Média, quer fosse ele membro da criadagem
inferior de uma residência aristocrática ou membro do que, atualmente, chamaríamos
de teatro burlesco. Sobreviveram as regulamentações redigidas para orientação dos
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músicos ambulantes de entretenimento na Alemanha medieval; o menestrel tinha de
“saber inventar, fazer ritmos, e ser bom espadachim; tocar bem tambor, címbalos e o
Bauernleier (realejo); jogar pequenas maçãs para cima e apará-las na ponta de uma
faca; imitar o canto de pássaros, fazer truques com cartas de baralho e saltar através
de argolas; tocar cítara e bandolim, cravo e guitarra, viola de sete cordas,
acompanhar bem com a rabeca, falar e cantar agradavelmente”. Um jogral a serviço
da aristocracia devia entreter seu patrão e os hóspedes dele em tudo o que
desejassem, assim como um comediante ambulante para ganhar a vida tinha de ser
contador de histórias, cantor, instrumentista, acrobata, prestidigitador e tudo o mais
que pretendesse convincentemente ser.”
Os jograis ou menestréis eram, portanto, homens e mulheres que vagavam isolados ou
em pequenos grupos de aldeia em aldeia (castelo em castelo), ganhando precariamente a vida.
Eram marginais à sociedade, párias a quem foi negada à proteção da lei e os sacramentos da
Igreja. Nos séc. XI e XII, com o crescimento das cidades anteriormente detalhado, melhora a
condição desses menestréis, embora só passado muito tempo as pessoas tenham abandonado
a repulsa por eles. Neste mesmo período começam a organizar-se em confrarias que darão
origem a corporações de músicos e a formação à maneira dos atuais conservatórios. Não eram
poetas nem compositores no sentido atual, mas realizadores de performances das cantigas
compostas por outros ou extraídas do domínio popular, alterando ou criando as próprias
versões à medida que andavam de terra em terra.
A partir do séc. XI, a aristocracia transforma seus comediantes palacianos em músicos
especialistas e passa a compor para que os servos possam interpretar. É o surgimento dos
trovadores.
O trovadorismo é, portanto, um movimento profano poético-musical de elite (ser
trovador era um símbolo de poder político) e um termo que generaliza e unifica várias
manifestações regionais diversas entre si.
Os troubadours (feminino, trobairitz) originários do sul da França e os trouvères, do
norte eram quem escrevia ou compunha quaisquer tipos de peça, sendo a definição moderna
que os define como dois grupos específicos de músicos, historicamente incorreta. Os
trovadores (troubadour) eram poetas-compositores que se multiplicaram na Provença (sul da
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França) e escreviam em langue d’oc (provençal). Os troveiros (trouvères), que surgem
posteriormente aos trovadores no séc. XIII, populavam as províncias de Champagne e Artésia
e escreviam em langue d’oil, dialeto que deu origem ao francês moderno. Não eram um grupo
bem definido, sendo em geral formado por aristocratas, alguns reis e, em casos raros, plebeus.
Ressaltamos aqui a diferença social entre os menestréis e os trovadores. O termo
menestrel por si só é rigoroso e designa um músico que fosse cantor e executante apenas, um
servo que acompanha o canto e atua também como bagageiro (quase um animal de carga) e
que não era socialmente aceito e tinha por parte da igreja a mais fria tolerância, enquanto os
trovadores eram membros da aristocracia que viam na música um potencial de enaltecer seu
nome e glória - como uma mercadoria a ser comercializada para seu próprio proveito, única e
exclusivamente - e compunham canções sobre seus feitos para os menestréis cantarem
enquanto percorriam as rotas comerciais e também as rotas dos cruzados.
As cantigas trovadorescas foram conservadas em coletâneas, financiadas pelos
membros do movimento, denominadas cancioneiros. Sobreviveram aos dias de hoje 2600
poemas e 260 melodias dos trovadores e 2130 poemas e 1420 melodias dos troveiros. Não há
quase nenhuma documentação remanescente sobre os menestréis.
Os temas das cantigas trovadorescas eram adaptações aristocráticas de materiais
populares ou propriamente aristocráticos. O amor era o principal deles. Isto se deve ao fato de
no séc. XII em Provença o catarismo1 ser a religião dominante, antes de ser atacado e
eliminado pela inquisição, e para o povo cátaro o conceito de amor – na visão disseminada
pelos trovadores - ser de suma importância. É neste período que ocorre o redimensionamento
do conceito de amor como o entendemos hoje e que é a base da cultura de massa atual.
1
Nos meados do século XII, iniciou-se na Itália um movimento religioso denominado Catarismo
(Albigenses). A doutrina dos cátaros era nitidamente diferente uma reação à Igreja Católica e suas
práticas, como a venda de indulgências, e a soberba vida dos padres e bispos da época. Na idade média
o Catarismo chocou-se frontalmente com o dogmatismo da Igreja. A religião cátara propunha, como
aspectos básicos, a reencarnação do espírito, a concepção da terra como materialização do Mal, por
encher a alma de desejos e prende-la às coisas efêmeras do mundo, e do céu como a do Bem, numa
concepção dualista do mundo. Mas o principal ponto de discordância, e talvez o mais original, tenha sido
a de que os cátaros não admitiam qualquer tipo de intermediação entre o homem e Deus.
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Os temas do movimento trovadoresco eram:
- O amor cortês – cantiga de amor: eu lírico masculino se referindo a uma mulher;
cantiga de amigo: eu lírico feminino, mas muitas vezes escrita por homens, se referindo a um
homem (sujeitas as regras da elite feudal)
-Louvor à Virgem Maria: Cantigas de Santa Maria (representação de cultura secular
religiosa)
-Provocações: cantiga de escárnio (críticas de forma velada); cantiga de mal-dizer
(linguagem direta que insultava abertamente, sem preocupações morais).
As cantigas de amor cortês ocultam a sensualidade e se preocupam com os preceitos
morais já que o objeto de amor é uma mulher real, geralmente esposa de outro homem
pertencente à aristocracia. Como recurso de distanciamento a mulher é adorada de longe, com
discrição, respeito e humildade, assemelhando-se a uma divindade. Já as pastorelas e baladas
tratavam de sexo abertamente, sendo a mulher-alvo não pertencente à elite. As cantigas em
louvor à virgem Maria (trouvères) adotam o mesmo estilo, mesmo vocabulário e, às vezes, as
mesmas melodias utilizadas para celebrar o amor terreno.
MOVIMENTOS POSTERIORES COM BASES NO TROVADORISMO
Na Alemanha, surge uma escola de poetas-compositores nobres no séc. XIV - que teve
por modelo o movimento trovadoresco - denominada Minnesinger.
O amor (Minne) que cantavam nos seus Minnelieder (canções de amor) era mais
abstrato do que o amor dos trovadores e tinha um matiz claramente religioso, devoção
inspirada pelas Cruzadas. A música era mais sóbria, algumas compostas mesmo nos modos
eclesiásticos. As cantigas de alvorada ou de vigília eram características do movimento e
contavam a história do amigo fiel que ficava de sentinela e avisava aos amantes quando a
alvorada se aproximava.
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Nos séc. XV a XVI, na própria Alemanha, a tradição dos Minnesinger é apropriada por
um grupo de mercadores e artesãos burgueses que se denominam Meistersinger. São
descendentes da arte dos troveiros, que, a partir do séc. XIII, passa a ser cultivada por
burgueses e não pela nobreza. Os Meistersinger são um grupo de longa duração histórica,
dissolvendo-se somente no séc. XIX.
Referências bibliográficas:
GROUT, Donald J.; PALISCA, Claude V. História da Música Ocidental, Lisboa: Ed.
Gradiva, 2007, p. 83 - 93.
RAYNOR, Henry. História Social da Música – da Idade Média a Beethoven, Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1981, p. 56 – 68.
SOUZA LIMA, Antonio Pedro Lizânias de. História da Civilização Ocidental, São
Paulo:Editora FTD, 2004, p.88 - 109.
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