Mielomalacia hemorrágica em bovino com leucose Mari, C., Bassuino, D. M., Gomes, D. C., Mello, L. S., Guimarães, L. L. B., Driemeier D., Pavarini S. P. Autor Correspondente: [email protected] (Pavarini, S.P.). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Setor de Patologia Veterinária, Av. Bento Gonçalves, 9090, Prédio 42505, Bairro Agronomia, Porto Alegre, RS, CEP 91540-000 PALAVRAS-CHAVES: Neuropatologia, Bovinos de leite, Linfossarcoma. INTRODUÇÃO: A leucose enzoótica bovina é uma doença infectocontagiosa associada à proliferação neoplásica de linfócitos em bovinos adultos. É ocasionada pelo vírus da leucemia bovina, o qual pertence a família Retroviridae, e que está presente em todas as regiões do Brasil [2]. A maioria dos bovinos infectados permanecem assintomáticos por um longo período de tempo, atuando assim como fonte de infecção para o rebanho. Em média 30% dos infectados podem apresentar aumento no número de linfócitos B circulantes, caracterizando um quadro de linfocitose persistente, enquanto 2 a 5% podem desenvolver linfossarcoma. A doença ocorre com maior frequência em bovinos de leite, entre quatro e oito anos de idade e, geralmente, é fatal [4]. A mielomalacia hemorrágica é uma desordem neurovascular caracterizada por uma necrose aguda isquêmica, hemorrágica e progressiva da medula espinhal com liquefação da mesma. Sua formação esta relacionada a pressões na medula espinhal, que podem ser oriundas de traumas na coluna vertebral e medula espinhal, protrusões de discos intervertebrais, neoplasias do canal medular e migração parasitária pela medula espinhal [8]. Este trabalho tem por objetivo relatar um caso de mielomalacia hemorrágica em um bovino com leucose, devido a formação de um linfossarcoma extradural. MATERIAL E MÉTODOS: Um bovino fêmea, da raça holandesa, de três anos de idade, proveniente do município de Eldorado do Sul, Rio Grande do Sul, foi encaminhado para necropsia ao Setor de Patologia Veterinária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (SPV-UFRGS). Os dados da evolução da doença e sinais clínicos foram obtidos com o veterinário responsável. Fragmentos de diversos órgãos foram coletados, fixados em solução de formalina a 10% e processados rotineiramente para preparação de lâminas histológicas, que posteriormente foram coradas com hematoxilina e eosina. RESULTADOS: O bovino pertencia a uma propriedade produtora de leite, com aproximadamente 100 vacas em lactação. Há uma semana, essa vaca iniciou um quadro de paraparesia dos membros pélvicos com evolução para paraplegia nos dias subsequentes e, além disso, apresentava exoftalmia bilateral moderada. Nos últimos três dias o bovino permaneceu em decúbito esternal evoluindo para lateral no quarto dia, vindo a óbito. Ao exame macroscópico foram observadas na medula espinhal múltiplas massas disformes levemente amareladas envolvendo externamente a dura-máter, na região lombar e sacral. A medula espinhal, caudal a intumescência lombar, estava amolecida e de coloração cinza entremeada de vermelho ao corte, principalmente em região de substância cinzenta. Observou-se também lesões tumorais com a mesma aparência nos linfonodos mamários, coração, cornos uterinos, abomaso e em região retrobulbar. Histologicamente, havia sobre a dura-máter, proliferação neoplásica maligna de linfócitos, caracterizada por células mesenquimais arredondadas, arranjadas em manto com pouco estroma de sustentação. Seu citoplasma era escasso, bem delimitado e os núcleos eram arredondado, frequentemente, hipercromático. As células exibiam discreta anisocitose e anisocariose. Essas mesmas células neoplásica foram identificadas no abomaso, linfonodo mamário, coração, útero e dorsal e caudalmente aos olhos. Na medula espinhal, caudal a intumescia lombar, havia acentuada malacia e hemorragia, com inúmeras células de gitter, microcavitação, discreto infiltrado multifocal de neutrófilos e degeneração Walleriana de substância branca adjacente. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO: O diagnostico de mielomalacia hemorrágica associada à linfossarcoma extradural no bovino desse relato baseou-se nos achados clínicos e patológicos. A mielomalacia hemorrágica é descrita, principalmente, em cães e ocorre como consequência de trauma medular agudo e sua causa mais frequente é protusão/extrusão de disco intervertebral na coluna tóraco-lombar [1]. A associação entre o linfossarcoma extradural e a mielomalacia também já foi descrita em cães [8], em um equino [6] e um felino [5]. A mielomalacia hemorrágica inicia-se no local da lesão ou trauma inicial e pode progredir em direção ascendente e descendente. Sua etiologia não esta totalmente elucidada, todavia sugere-se que a compressão da medula espinhal pode resultar em vasoespasmo e hemorragia no espaço subaracnóidea, com falha na circulação colateral. Adicionalmente, catecolaminas liberadas pelo tecido nervoso podem atuar nos vasos intramedulares (vasoconstrição) ou mesmo haver liberação de substâncias como glutamato, histamina, serotonina, dopamina e norepinefrina [3], que pode ser deflagrado pela hemorragia no momento da lesão inicial [7]. O linfossarcoma é um dos neoplasmas mais frequentes em bovinos, especialmente nos de aptidão leiteira pelo fato de apresentar uma origem viral e pela criação intensiva que esses animais normalmente são submetidos. Dessa forma, esse relato registra a ocorrência de mielomalacia hemorrágica em um bovino com leucose devido a compressão da medula espinhal por um linfossarcoma extradural. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Brisson B.A. Intervertebral Disc Disease in Dogs. Vet. Clin. North Am. Small Anim. Pract. 40(5): 829-858, 2010. 2. D’Angelino R.H.R. et al. Detection of bovine leukemia virus in brains of cattle with a neurological syndrome: pathological and molecular Studies. Biomed. Res Int. 2013:1-6, 2013. 3. De Lahunta A., Glass E. Veterinary Neuroanatomy and Clinical Neurology. In: De Lahunta A., & Glass E. Lower motor neuron: spinal nerve, general somatic efferent system. 3. Ed. V.1. St Louis: W. B. Saunders, 2009. p.119-120. 4. Junior L.A.L. et al. Leucose enzoótica bovina e vírus da leucemia bovina. Semina: Ci. Agrárias. 22(2): 211221, 2001. 5. Northington J.W., Juliana M.M. Extradural lymphosarcoma in six cats. J. Small Anim. Pract. 19(7): 409416, 1978. 6. Rousseaux C.G. et al. Epidural lymphosarcoma with myelomalacia in a seven-year-old Arabian gelding. Can. Vet. J. 30(9): 751-753, 1989. 7. Summers B.A. et al. Veterinary Neuropathology. In: Summers B. A. et al. Injuries to the central nervous system. St Louis: Mosby, 1995. p.189-207. 8. Zilio D.M., Arias M.V.B. Mielomalacia hemorrágica progressiva em 14 cães. Pesq. Vet. Bras. 33(2): 219228, 2013.