186 Dissertações MÓNICA DE FREITAS E SILVA GUTIERREZ, A Felicidade na Ética de Kant, Dissertação de Mestrado em Filosofia, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1998, 177 pp. Esta dissertação consiste num estudo sobre o tema da felicidade na filosofia de Kant e, por conseguinte, inscreve-se no contexto do pensamento ético deste autor. Embora não tenha escrito qualquer texto exclusivamente dedicado à análise do conceito de felicidade, a obra onde Kant o trata do modo mais completo e mais sistemático é a Crítica da Razão Prática (1788), a qual constitui, por isso, o objecto privilegiado do nosso trabalho. Todavia, uma vez que o tratamento do conceito de felicidade sofre poucas oscilações no conjunto das obras deste filósofo, é este o âmbito da investigação feita. O tema da felicidade não tem constituído grande motivo de análise entre os comentadores de Kant. De qualquer forma, é possível surpreender, grosso modo, duas diferentes linhas interpretativas sobre esta matéria: por um lado, distinguem-se aqueles comentadores para quem a felicidade não desempenha qualquer papel na ética de Kant, considerada esta, sobretudo, como uma ética pura do dever; por outro lado, destacam-se aqueles para quem a felicidade ocupa um lugar central na ética de Kant, considerada esta, fundamentalmente, como uma ética teleológica. Ora, nesta dissertação mostramos que a irrelevância ou a relevância da temática da felicidade na moral kantiana depende, mais precisamente, dos diferentes pontos de vista sob os quais a avaliamos: se do ponto de vista de uma reflexão sobre os alicerces fundamentais que devem sustentar um sistema moral ou se do ponto de vista de uma reflexão sobre as consequências a que um tal sistema deve conduzir. A nossa investigação estrutura-se, deste modo, em dois momentos fundamentais. Primeiramente, procedemos ao estudo da recusa kantiana do eudemonismo, entendendo-se por eudemonista toda e qualquer doutrina da moralidade segundo a qual a felicidade, ou o prazer, é o verdadeiro motivo da acção virtuosa. Começamos este estudo com uma análise da razão na sua relação com o desejo e terminamo-lo com a apresentação e a discussão da argumentação dirigida por Kant contra a possibilidade de a felicidade constituir o fundamento da moralidade. Nesta primeira parte da investigação demonstramos, então, a impossibilidade de a nossa felicidade constituir positivamente um dever e, mais do que isso, o princípio de todo o dever e, paralelamente, estabelecemos a tese segundo a quai a lei moral é o único fundamento legítimo de determinação da vontade capaz de garantir a moralidade do agir humano. O segundo momento desta dissertação incide sobre o tratamento kantiano do problema da possibilidade do soberano bem (isto é, do problema da possibilidade de um justo acordo entre a felicidade do ser racional e a moralidade que esse mesmo ser põe em exercício) enquanto fim final que à vontade se impõe realizar como exigência prescrita pela lei moral. O estudo que fazemos neste último momento da dissertação compreende duas etapas, competindo à primeira uma apresentação do referido problema, da sua solução e, ainda, das consequências da solução encontrada, e competindo à segunda a determinação do significado fundamental do problema da possibilidade do soberano bem. Demonstramos, desta forma,finalmente,que a felicidade, ao integrar ofimfinalda razão prática, ocupa um lugar bem definido na moral de Kant e na Dissertações 187 filosofia deste autor em geral: na moral, precisamente porque é contida pelo fim prático supremo como um dos seus elementos constitutivos; na filosofia kantiana em geral, porque a necessidade de se resolver o problema da possibilidade do soberano bem representa também a necessidade de se estabelecer a unidade da dupla legislação da razão a favor da construção de um sistema definsda razão pura. Em suma: os dois momentos principais que estruturam esta investigação permitem compreender que, se do ponto de vista de uma reflexão sobre os fundamentos da moralidade, a felicidade se manifesta como sendo um elemento a excluir ou, pelo menos, a não considerar, diferentemente, do ponto de vista de uma reflexão sobre a destinação da existência humana, a felicidade surge clara e positivamente recuperada. ANDRÉ BARATA, Metáforas da Consciência. Da Ontologia Especular de Jean¬ -Paul Sartre a uma Metafísica da Ressonância, Dissertação de Mestrado em Filosofia defendida em Junho de 1999. I Com a presente dissertação foi nosso objectivo contribuir para a elucidação do problema sobre o que seja esse acontecimento extraordinário que designamos por "ter consciência", ou ainda, "ser consciência", problema que não poderia ser enunciado a não ser num contexto já problemático, em que nos confrontamos com a consciência já a sendo. As nossas respostas a este problema, respostas apenas esboçadas e não mais do que isso, surgiram no quadro de uma discussão das respostas (e das opções básicas que as assistiram) que ofilósofofrancês Jean-Paul Sartre apresentou para o mesmo problema. Discordámos de Sartre em pontos fundamentais do seu pensamento, discordância que procurámos justificar de maneira consistente e através de diversas vias de argumentação. Foi também neste registo de discussão e objecção ao pensamento do existencialista que procurámos formular um ponto de vista distinto, o qual, não obstante a divergência, muito lhe deve, De facto, teses como a da transcendência do Ego (face à consciência) ou a da má fé (como conduta de fuga de uma consciência relativamente à angústia e, consequentemente, como tentativa votada ao malogro de uma consciência se negar a sua própria liberdade) são resultados com os quais mostrámos relativo acordo e que, nessa medida, reinterpretámos à luz do nosso ponto de vista. Mesmo o nosso trabalho de critica pode ser entendido como resultado de uma radicalização do pensamento de Sartre, de modo relativamente semelhante ao IOSÍCÍOnamento de Sartre perante a fenomenologia de Husserl. Em concreto, o ponto de vista que defendemos é o de que estamos condenados a uma ilusão ontológica: a ilusão de que somos uma espontaneidade, ou seja, de que somos de determinada maneira sem que nada, para além do que precisamente somos, esteja por detrás disso que somos. E a ilusão de que o nosso ser não é um ser recebido, pois então, se fosse um ser recebido, tudo cairia no nada. E entre a espontaneidade do nosso ser e tudo cair no nada a decisão parece evidente, absolutamente evidente: vivemos efectivamente como se fôssemos uma espontaneidade, como se o nosso ser estivesse no que nos somos. Fazer cair tudo no nada consistiria, portanto, num absurdo que vem contrariar evidências tão elementares como a de que somos o