UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO ATUALIZA ASSOCIAÇÃO CULTURAL ENFERMAGEM EM EMERGÊNCIA ANA PAULA OLIVEIRA GUERRIERI COMPLICAÇÃO HIPERGLICÊMICA AGUDA NO DIABETES MELLITUS TIPO 1 NOS JOVENS Salvador 2011 ANA PAULA OLIVEIRA GUERRIERI COMPLICAÇÃO HIPERGLICÊMICA AGUDA NO DIABETES MELLITUS TIPO 1 NOS JOVENS Monografia apresentada à Universidade Castelo Branco/ Atualiza Associação Cultural como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Enfermagem em Emergência, sobe orientação do professor Fernando Reis do Espírito Santo. Salvador 2011 G935c Guerrieri, Ana Paula Oliveira Complicação Hiperglicêmica Aguda no Diabetes Mellitus Tipo 1 nos Jovens / Ana Paula Oliveira Guerrieri . – Salvador, 2011. 45f.; 30 cm. Orientador: Prof. Dr. Fernando Reis do Espírito Santo Monografia (pós-graduação) – Especialização em Enfermagem em Emergência, Universidade Castelo Branco, Atualiza Associação Cultural, 2011. 1. Enfermagem em emergência 2. Diabetes mellitus 3. Cetoacidose diabética 4. Jovens I. Espírito Santo, Fernando Reis II. Universidade Castelo Branco III. Atualiza Associação Cultural IV. Título. CDU 616-083 Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Adriana Sena Gomes CRB 5/ 1568 Dedico esta monografia, aos meus pais, Antônio Renato e Edinilsa e em especial a minha querida e amada irmã Renata por todo o incentivo. AGRADECIMENTOS Inicialmente, quero agradecer a Deus, porque sem a imensa fé que tenho na sua existência, jamais conseguiria colocar em prática meus objetivos. Agradeço à Universidade Castelo Branco e Atualiza Associação Cultural por proporcionar meios para concluir este trabalho. Agradeço também, a amiga e companheira de profissão Flávia Abreu pelo incentivo para concluir essa especialização. “Quase sempre fazemos algo por obrigação, mas o mais importante é fazer porque queremos”. (LEGRAND) RESUMO Este trabalho aborda sobre a Diabetes Mellitus que é uma doença crônica metabólica caracterizada por um aumento anormal da glicose no sangue. Quando não tratada adequadamente, podem desencadear complicações agudas como a cetoacidose diabética, síndrome não cetótica hiperglicêmica hiperosmolar e hipoglicemia; ou complicações crônicas como doença macrovascular; doença microvascular e neuropatia. A principal complicação hiperglicêmica no diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é a cetoacidose diabética (CAD). A CAD é uma situação grave, caracterizada por desregulação metabólica secundária a falta ou diminuição de insulina corporal e se não for diagnosticada e iniciada o tratamento o mais precoce, pode levar a morte. CAD é uma complicação grave da DM1 na qual uma das principais causas é a falta ou diminuição de insulina exógena. Como a fase em que esses jovens pacientes, estão vivendo há uma vulnerabilidade física e emocional é provável que haja uma maior dificuldade para a incorporação de comportamentos de adesão ao tratamento e, consequentemente, para que o controle metabólico se deteriore. Tem como objetivo descrever a partir da literatura a complicação hiperglicêmica aguda no DM1 nos pacientes jovens. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica descritiva com abordagem qualitativa, na qual foram utilizados artigos científicos e obras livros didáticos. Os resultados desse estudo apontam que por estarem em uma fase da vida vulnerável, marcada de intensas transformações, fazse necessário o apoio da família, mudanças nos hábitos de vida, bem como, um acompanhamento multiprofissional qualificado e acima de tudo a conscientização do próprio jovem. Palavras –chave: Diabetes Mellitus; Cetoacidose Diabética; Jovens ABSTRACT This work approaches about subject Diabetes Mellitus which is a metabolic chronic disease characterized by an unusual raise of the blood glucose. When not treated accordingly it may unleash a series of acute complications such as diabetic ketoacidosis, non-ketotic hyperglycemic hyperosmolar syndrome and hypoglycemia; or chronic complications as macrovascular and microvascular diseases and neuropathy. The main hyperglycemic complication on a Diabetes Mellitus type 1 (DM1) is the diabetic ketoacidosis (CAD). CAD is a serious situation characterized by metabolic desregulation secondary to the lack or body insulin decrease and if not diagnosed and initiated treatment as soon as possible, may lead to death. CAD is a serious complication of DM1 of which one of the main causes is the lack or decreasing of exogenous insulin. As the phase that these young patients are living there is a physical and emotional vulnerability it is likely that there is a greater difficulty in the incorporation of the adhesion behavior to the treatment and, consequently, so that the metabolic control degrade. It has the objective of describing from literature acute hyperglycemic complication on a DM1 in young patients. It´s about a descriptive bibliographic research with qualitative approaches in which scientific articles, books and didactic material were utilized. The results of this study point to the fact that as they are in a vulnerable phase of their life which is marked by intense transformations, it is made necessary the family support, changes on life habits as well as a qualified multi-professional attendance and above all the young one awareness. Keywords: Diabetes Mellitus; Diabetic Ketoacidosis; Young SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................07 2 REVISÃO DE LITERATURA..................................................................................10 2.1 DIABETES MELLITUS ...............................................................................10 2.1.1 Conceito ...................................................................................................10 2.1.2 Classificação ............................................................................................10 2.1.3 Fisiopatologia ...........................................................................................13 2.1.4 Sinais e sintomas .....................................................................................14 2.1.5 Diagnóstico ..............................................................................................15 2.1.6 Tratamento................................................................................................15 2.1.7 Complicações...........................................................................................16 2.1.7.1 Complicações crônicas..........................................................................16 2.1.7.2 Complicações agudas............................................................................19 2.1.7.2.1 Hipoglicemia.......................................................................................19 2.1.7.2.2 Síndrome Não Cetótica Hiperglicêmica Hiperosmolar........................21 2.2 CETOACIDOSE DIABÉTICA......................................................................21 2.2.1 Conceito ...................................................................................................21 2.2.2 Fisiopatologia ...........................................................................................22 2.2.3 Fatores precipitantes ..............................................................................25 2.2.4 Sinais e sintomas .....................................................................................26 2.2.5 Tratamento ...............................................................................................29 2.2.5.1 Administração de Fluidos ......................................................................30 2.2.5.2 Insulinoterapia .......................................................................................31 2.2.5.3 Reposição de Eletrólitos ......................................................................33 2.2.6 Complicações ..........................................................................................34 2.3 DIABETES NOS JOVENS ........................................................................35 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................42 4 REFERÊNCIAS .....................................................................................................43 7 1. INTRODUÇÃO Apresentação do objeto de estudo Diabetes mellitus (DM), segundo Brunner & Suddarth (2005), é uma doença crônica caracterizada por um grupo de distúrbios heterogêneos com níveis elevados de glicose devido a diminuição da capacidade do corpo em responder a insulina. A insulina que é um hormônio anabólico (hormônio de reserva), produzido nas células beta nas ilhotas de Langerhans do pâncreas, tendo como funções transportar a glicose para os órgãos e inibir a degradação da glicose de reserva, proteínas e gorduras. O Ministério da Saúde (2006), descreve os dois tipos de diabetes mais frequentes o Diabetes Tipo 1 (DM1), anteriormente conhecido com diabetes juvenil, que compromete cerca de 10 % do total de casos, e o Diabetes Tipo 2 (DM2), anteriormente conhecido como diabetes do adulto, que compromete cerca de 90% do total de casos. A principal causa de mortalidade no diabetes mellitus é a Cetoacidose Diabética (CAD), que é considerada a principal complicação aguda da DM. A CAD é caracterizada como uma desordem metabólica grave, devido a severa deficiência de insulina provocando hiperglicemia, desidratação, produção excessiva de corpos cetônicos e acidose. Tendo como fator precipitante a falta de insulina absoluta ou relativa induzida ou por outros fatores. (LOTTENBERG, 2007) Tendo em vista que os pacientes portadores de DM1 são as crianças e os jovens, e a CAD ser mais freqüente, quase que exclusivamente para os portadores de DM1, requer um comportamento especial de auto-cuidado ao longo da vida. O início repentino da doença e o tratamento exigido para controlar a glicemia, causam mudanças abruptas no estilo de vida do jovem e da criança, interferindo em sua auto-imagem e qualidade de vida, dificultando a 8 adesão ao tratamento e aumentando as chances de novas ocorrências de CAD. (GROSS & PRADO, 1993) Justificativa A escolha desse tema para estudo surgiu a partir da necessidade de abordar a doença crônica de conhecimento popular, que é DM e sua principal complicação aguda, a cetoacidose diabética. Mostrando seus riscos e agravos à saúde, sendo sua complicação uma situação de emergência sendo necessário atendimento especializado e integral. Problema Qual a complicação hiperglicêmica aguda no diabetes mellitus tipo 1 nos jovens? Objetivo Descrever a complicação hiperglicêmica aguda no diabetes mellitus tipo 1 nos pacientes jovens. Metodologia Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, descritiva e qualitativa que pretende descrever a complicação hiperglicêmica aguda no DM1 nos pacientes jovens. Para Marconi e Lakatos (1999), a pesquisa bibliográfica pode propiciar um exame do tema sob um novo enfoque e chegando a novas conclusões, não sendo dessa forma a repetição do que foi dito e escrito. A principal vantagem desse tipo de estudo, segundo Gil (2002), é permitir uma ampla cobertura sobre o assunto pesquisado. 9 A abordagem qualitativa, segundo Minayo (2002) “[...] é aquela que aprofundase no mundo dos significados das ações das relações humanas. Este método de pesquisa é holístico, pois preocupa-se com indivíduos e seu meio, visto que o pesquisador não impõe limites”. Além disso, os estudos descritivos proporcionam a identificação das várias formas dos fenômenos, sua ordem e classificação, podendo segundo Oliveira (1999, p.114) dar “[“...] margem também à explicação das relações de causa e efeitos dos fenômenos”, “ portanto dar ao pesquisador melhor compreensão de fatos e fatores que influenciam um dado fenômeno”, sendo a pesquisa aplicada aquela que pretende utilizar, imediatamente, os resultados para intervir na realidade. (MARCONI e LAKATOS, 1999). Estrutura do Trabalho Este trabalho está constituído de três momentos. Primeiro, aborda amplamente a Diabetes Mellitus trazendo sua definição, classificações, diagnóstico, tratamento e complicações. No segundo momento, fala sobre a CAD, que é a complicação aguda hiperglicêmica mais grave do diabetes tipo 1 e uma das mais comuns, principalmente nos jovens, sendo de extrema importância o tratamento rápido e eficaz. No terceiro momento, relata sobre a diabetes nos pacientes jovens, ressaltando as principais dificuldades encontradas por eles, uma vez que, trata-se de uma fase da vida vulnerável, com muitas mudanças psicológicas e juntamente a isso, a descoberta de uma doença crônica. 10 2. REVISÃO DE LITERATURA 2.1 DIABETES MELLITUS 2.1.1 Conceito A Diabetes Mellitus, segundo a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolia (1997) é o conjunto de situações resultantes da incapacidade do organismo em manter o nível de glicose no sangue dentro de limites normais, por deficiência ou por ausência total de insulina, manifestando-se por anormalidades no metabolismo dos carboidratos, proteínas e lipídios, como também por complicações macrovasculares, microvasculares e neuropatia. Para o Ministério da Saúde (2006) a diabetes é comum e de incidência crescente. Estima-se que, em 1995, atingia 4,0% da população adulta mundial e que, em 2025, alcançará a cifra de 5,4%. A maior parte desse aumento se dará em países em desenvolvimento, acentuando-se, nesses países, o padrão atual de concentração de casos na faixa etária de 45-64 anos. 2.1.2 Classificação Os tipos de diabetes mais frequentes são a diabetes tipo 1, anteriormente conhecido como diabetes juvenil, que compreende cerca de 10% do total de casos, e a diabetes tipo 2, anteriormente conhecido como diabetes do adulto, que compreende cerca de 90% do total de casos. Outro tipo de diabetes encontrado com maior freqüência e cuja etiologia ainda não está esclarecida é o diabetes gestacional, que, em geral, é um estágio pré-clínico de diabetes, detectado no rastreamento pré-natal (BRASIL, 2006). A diabetes tipo 1 (DM1) é caracterizada pela destruição das células beta pancreáticas. Acredita-se que uma combinação de fatores genéticos, 11 imunológicos e possivelmente ambientais (por exemplo, virais) contribua para a destruição de células beta (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). O Ministério da Saúde (2006) aborda que o desenvolvimento do diabetes tipo 1 pode ocorrer de forma rápida e progressiva, principalmente, em crianças e adolescentes (pico de incidência entre 10 e 14 anos), ou de forma lenta e progressiva, geralmente em adultos, (LADA, latent autoimmune diabetes in adults; doença auto-imune latente em adultos). Esse último tipo de diabetes, embora assemelhando-se clinicamente ao diabetes tipo 1 auto-imune, muitas vezes é erroneamente classificado como tipo 2 pelo seu aparecimento tardio. Estima-se que 5-10% dos pacientes inicialmente considerados como tendo diabetes tipo 2 podem, de fato, ter LADA. Diabetes tipo 2 (DM2) para Brunner & Suddarth (2005) está relacionada a dois problemas: a resistência à insulina e a secreção prejudicada da insulina. Na resistência a insulina ocorre uma diminuição da sensibilidade dos tecidos à insulina, tornando-se menos efetiva a captação de glicose pelos tecidos. A despeito da secreção prejudicada ocorre caracteristicamente na DM2, uma vez que, há suficiente insulina presente para evitar a degradação de gordura e a subsequente produção de corpos cetônicos. A causas das diabetes tipo 1 e 2 ainda não são bem conhecidas. Fatores genéticos podem infundir no desenvolvimento desses dois tipos de doença. Distúrbios auto-imunes e infecções virais podem ser fatores para o a diabetes tipo 1 (BOUNDY; 2004). Conforme o autor acima citado, alguns fatores podem ser considerados de risco para o aparecimento da diabetes tais como: obesidade que contribui para a resistência à insulina endógena; estresse fisiológico ou emocional, que pode causar elevação prolongada dos níveis dos hormônios do estresse (cortisol, epinefrina, glucagon e hormônio do crescimento) e em seguida, aumentar a glicose sanguínea e acentuas as demandas impostas ao pâncreas; gravidez, 12 que causa ganho ponderal e aumenta os níveis do estrogênio e dos hormônios placentários; e alguns fármacos, incluindo os diuréticos tiazídicos, corticóides supra-renais e anticoncepcionais orais, que antagonizam os efeitos da insulina. Brunner & Suddarth (2005) descrevem que a diabetes mellitus gestacional (DMG) ocorre em mulheres que não tinham diabetes antes da gestação. Desenvolve-se hiperglicemia durante a gestação devido à secreção de hormônios placentários. Todas as mulheres grávidas devem ser triadas quanto ao diabetes antes da 24ª e 27ª semanas de gestação. O tratamento inicial inclui modificações dietéticas e monitoramento da glicose. Caso a hiperglicemia persista, é prescrita a insulina, pois os agentes hipoglicemiantes não devem ser usados durante a gestação. As metas para a glicose sanguínea durante a gravidez são de 70 a 100 mg/dl antes das refeições, e menos de 165 mg/dl 2 horas após as refeições. A diabetes mellitus gestacional ocorre em cerca de 2% a 7% de todas as gravidezes. Ela é temporária e completamente tratável mas, se não tratada, pode causar problemas com a gravidez, incluindo macrossomia fetal (peso elevado do bebê ao nascer), malformações fetais e doença cardíaca congênita. Ela requer supervisão médica cuidadosa durante a gravidez. Os riscos fetais/neonatais associados à DMG incluem anomalias congênitas como malformações cardíacas, do sistema nervoso central e de músculos esqueléticos. A insulina fetal aumentada pode inibir a produção de surfactante fetal e pode causar problemas respiratórios. A hiperbilirrubinemia pode causar a destruição de hemácias. Em muitos casos, a morte perinatal pode ocorrer, mais comumente como um resultado da má profusão placentária devido a um prejuízo vascular (WIKIPEDIA, 2011). Após o parto da criança, os níveis de glicose sanguínea na mulher com diabetes gestacional retornam ao normal. Entretanto, muitas mulheres que tiveram diabetes gestacional desenvolvem diabetes tipo 2 mais tarde na vida. Portanto, todas as mulheres que tiveram diabetes gestacional devem ser aconselhadas a manter seu peso corpóreo ideal e a se exercitarem 13 regularmente para tentar evitar o inicio da diabetes tipo 2 (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). 2.1.3 Fisiopatologia A insulina (um hormônio produzido pelo pâncreas) transporta a glicose para dentro das células para ser usada como energia ou armazenada em forma de glicogênio. Além disso, a insulina estimula a síntese protéica e o armazenamento dos ácidos graxos livres nos tecidos adiposos. A deficiência dificulta o acesso dos tecidos do organismo aos nutrientes essenciais usados como combustível e reserva (BOUNDY, 2004). A insulina é secretada pelas células beta, que representam um dos tipos de células das Ilhotas de Langerhans do pâncreas. Quando uma refeição é ingerida, a secreção de insulina aumenta e move a glicose do sangue para os músculos, fígado e células gordurosas. Nestas células a insulina tem os efeitos de estimular a reserva de glicose no fígado e músculos, sob forma de glicogênio; aumentar a reserva de gordura dietética no tecido adiposo; acelerar o transporte de aminoácidos para as células; além de inibir a reserva da glicose reserva, proteínas e gorduras (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). Nos períodos de jejum o pâncreas libera continuamente uma pequena quantidade de insulina juntamente com outro hormônio pancreático, o glucagon (secretado pelas células alfa das Ilhotas de Langerhans). Neste período, a insulina e o glucagon mantêm um nível constante de glicose no sangue. Inicialmente, o fígado produz glicose pela degradação de glicogênio (glicogenólise). Após 8 a 12 horas sem alimentos, o fígado forma glicose a partir da degradação de substancias não carboidratos, incluindo aminoácidos (gliconeogênese) (BOUNDY, 2004). No diabetes tipo 1 há uma incapacidade em produzir insulina porque as células beta pancreáticas foram destruídas. A hiperglicemia de jejum ocorre como 14 resultado de uma produção não controlada de glicose pelo fígado, além do que, a glicose derivado dos alimentos não pode ser estocada no fígado, permanecendo na corrente sanguínea contribuindo para hiperglicemia pósprandial (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). Segundo o autor acima citado, normalmente, a insulina liga-se a receptores especiais nas superfícies das células, tendo como resultado uma série de reações envolvidas no metabolismo de glicose dentro da célula. No DM2 está associada a uma diminuição destas reações intracelulares, tornando-se menos efetiva na captação da glicose. Para superar essa resistência a insulina deve haver um aumento da quantidade de insulina secretada. Entretanto, se as células beta são incapazes de manter a demanda aumentada de insulina, o nível de glicose sobe desencadeando a DM2. 2.1.4 Sinais e sintomas De acordo com Brunner & Suddarth (2005), os sinais e sintomas aparecem se a concentração de glicose no sangue for suficientemente alta. Não ocorrendo toda reabsorção pelos rins da glicose filtrada aparece a glicosúria, acarretando na perda excessiva de líquidos e eletrólitos pela urina chamada de diurese osmótica. Com o aumento da perda de liquido ocorre também o aumento de urina (poliúria) como conseqüência o aumento da sede que é a polidpsia. Pela deficiência de insulina o metabolismo de proteínas e gorduras fica prejudicado levando a perda de peso devido a reserva diminuída de calorias, mesmo com aumento do apetite (polifagia). Outros sintomas tais como fraqueza e fadiga estão presentes. O quadro clínico do DM1 depende da idade em que a doença incide: a apresentação mais típica, com poliúria, polidípsia, polifagia e perda de peso é mais comum em crianças maiores. Em crianças de baixa idade (abaixo de 3 anos), muitas vezes os sintomas não são tão claros ou são difíceis de serem avaliados. Uma criança que ainda usa fralda pode ter poliúria, mas é difícil 15 avaliá-la ou detectá-la. Em crianças no primeiro ano de vida, irritabilidade, desconforto, agitação, podendo progredir a torpor e coma podem ser detectados e o diagnóstico de DM pode não ficar evidente em um primeiro momento. Sempre que uma criança já tenha controle esfincteriano, mas volta a apresentar diurese, a suspeita de DM deve ser levantada. Muitas vezes, tal sintoma é atribuído a distúrbios emocionais e o quadro segue sem diagnóstico até a instalação de uma CAD. Infecções de pele (piodermites) repetidas, monilíase vaginal e/ou vulvar também devem chamar a atenção para o diagnóstico (DAMIANI & DAMIANI, 2007). 2.1.5 Diagnóstico Os sintomas clássicos de diabetes são: poliúria, polidipsia, polifagia e perda involuntária de peso (os “4 Ps”). Outros sintomas que levantam a suspeita clínica são: fadiga, fraqueza, letargia, prurido cutâneo e vulvar, balanopostite e infecções de repetição. Algumas vezes o diagnóstico é feito a partir de complicações crônicas como neuropatia, retinopatia ou doença cardiovascular aterosclerótica, e complicações agudas (BRASIL, 2006). Brunner & Suddarth (2005) abordam que a presença de níveis de glicose anormalmente altos é o critério que orienta o diagnostico de diabetes. Níveis de glicose plasmática em jejum acima de 140 mg/dl ou níveis aleatórios de glicose plasmática acima de 200 mg/dl em mais de uma ocasião são diagnósticos de diabetes. Se os níveis de glicose em jejum forem normais ou quase normais, o diagnóstico deve ser baseado em um teste de tolerância a glicose. 2.1.6 Tratamento O principal objetivo do tratamento da diabetes é tentar normalizar a atividade de insulina e os níveis sanguíneos de glicose numa tentativa de reduzir o desenvolvimento das complicações vasculares e neurológicas. A meta terapêutica década tipo de diabetes é atingir níveis normais de glicose 16 sanguínea (euglicemia) sem hipoglicemia e sem perturbar gravemente os padrões usuais de atividade do paciente (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). Para Boundy (2004) no tratamento no diabetes tipo 1 esses objetivos são alcançados com a reposição de insulina, dieta e exercícios. Os protocolos atuais para o tratamento de reposição da insulina incluem esquemas com dose única, doses mistas, doses mistas fracionadas, e doses múltiplas. Sendo que o esquema de doses múltiplas podem ser implementados com uma bomba de insulina. Mantendo o autor acima citado, a diabetes tipo 2 pode necessitar de hipoglicemiantes orais para estimular a produção de insulina endógena, aumentar a sensibilidade à insulina no nível celular, suprir a gliconeogênese hepática e retardar a absorção da glicose dos carboidratos. O tratamento dos dois tipos de diabetes também requer uma dieta planejada para atender às necessidades nutricionais, controlar os níveis sanguíneos de glicose e alcançar e manter o peso corporal adequado (BRASIL, 2006). 2.1.7 Complicações 2.1.7.1 Complicações crônicas Segundo Brunner & Suddarth (2005) tem ocorrido acentuada diminuição nas mortes de pacientes diabéticos atribuíveis a cetoacidose e infecções, mas um alarmante aumento das mortes por complicações renais e cardiovasculares. As complicações a longo prazo estão se tornando mais comuns à medida que aumenta o número de pessoas que vivem mais com diabetes. O diabetes apresenta alta morbi-mortalidade, com perda importante na qualidade de vida. É uma das principais causas de mortalidade, insuficiência renal, amputação de membros inferiores, cegueira e doença cardiovascular. A 17 Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou em 1997 que, após 15 anos de doença, 2% dos indivíduos acometidos estarão cegos e 10% terão deficiência visual grave. Além disso, estimou que, no mesmo período de doença, 30 a 45% terão algum grau de retinopatia, 10 a 20%, de nefropatia, 20 a 35%, de neuropatia e 10 a 25% terão desenvolvido doença cardiovascular. As complicações crônicas da diabetes podem afetar quase todos os sistemas orgânicos do corpo. São vistas tanto do DM1 quanto no DM2, geralmente não ocorrendo dentro dos primeiros cinco a dez anos do diagnóstico. A doença renal é mais prevalente entre pacientes diabéticos tipo 1, e as complicações cardiovasculares são mais prevalentes entre pacientes mais idosos com diabetes tipo 2. As categorias gerais de complicações do diabetes crônico são: doença macrovascular; doença microvascular e neuropatia (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). Para a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolia (S.B.E.M) (1997) as complicações macrovasculares estão inclusas a doença arterial coronariana; doença vascular cerebral e periférica. As alterações ateroscleróticas nos grandes vasos sanguíneos ocorrem no diabetes com maior frequência. Dependendo da localização das lesões ateroscleróticas, podem resultar diferentes tipos de doenças macrovasculares. Mantendo a referência anterior, para evitar a estenose (secundária a aterosclerose) de órgãos vitais é necessário um bom controle glicêmico, atividade física e uso correto dos medicamentos. Se a oclusão for de uma artéria coronária, a consequência será um infarto do miocárdio. Se for de uma artéria que irriga o cérebro, ocorrerá um derrame ou acidente vascular cerebral. Se a oclusão acometer uma das artérias da perna e não for tratada a tempo, pode ocorrer dor durante a deambulação, sensação de frio nas extremidades e, às vezes, até uma amputação por gangrena. 18 O Ministério da Saúde (2006) relata as complicações microvasculares do diabetes estão presentes a retinopatia e a nefropatia. A retinopatia diabética é causada por alterações nos pequenos vasos sanguíneos dos olhos. São lesões que aparecem na retina, podendo causar pequenos sangramentos e, como conseqüência, a perda da acuidade visual. Na nefropatia diabética ocorrem alterações nos vasos dos rins desencadeando perda da capacidade de filtrar adequadamente as substâncias, entre elas a albumina. Se não tratada precocemente pode levar a uma insuficiência rena aguda ou crônica. A neuropatia diabética refere-se a um grupo de doenças que afetam todos os nervos, incluindo os nervos periféricos (sensoriais), autônomos e espinhais. Os distúrbios são clinicamente diversos e dependem da localização das células nervosas afetadas. Os dois tipos mais comuns são a polineuropatia sensoriomotora e a neuropatia autônoma. A sensoriomotora afeta mais comumente as partes distais dos nervos, principalmente as extremidades inferiores, causando sensação de parestesias e sensação de queimadura (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). Já a neuropatia autônoma, conforme o autor acima descrito é subdividida em seis categorias: cardiovasculares com batimentos cardíacos levemente taquicárdico, hipotensão postural e infarto do miocárdio silencioso; gastrointestinais com demora do esvaziamento gástrico, náuseas, vômitos, saciedade precoce, mudanças nos níveis de glicose relacionada a absorção incompleta dos alimentos; urinários com retenção urinaria, sensação diminuída de enchimento da bexiga e bexiga neurogênica; glândula adrenal provocando o desconhecimento da hipoglicemia por não sentir mais os sintomas típicos dessa estado; sudomotora provocando a diminuição ou ausência de suor e a disfunção sexual especialmente a impotência nos homens. A S. B. E.M. (1997) alerta para um cuidado muito importante para o diabético é o cuidado com os pés, como são vulneráveis a ferimentos, é preciso examinálos todos os dias. Esse deve ser um hábito, principalmente para aqueles que 19 sofrem de neuropatia. Essa vigilância é necessária porque, não raro, surge um calo em nos pés, mesmo sem sentir dor, quando se usa sapatos. 2.1.7.2 Complicações agudas Segundo Brunner & Suddarth (2005) existem três complicações agudas importantes do diabetes relacionados aos desequilíbrios de curto prazo na glicose sanguínea: hipoglicemia, síndrome não cetótica hiperglicêmica hiperosmolar (SNHH) e a cetoacidose diabética. 2.1.7.2.1 Hipoglicemia A hipoglicemia para Lottenberg (2007) do ponto de vista clínico pode ser definido pela presença de três características: glicemia baixa (40mg/dl), sinais e sintomas de hipoglicemia e reversibilidade. Na ausência da glicose, os metabólitos intracelures têm sua energia desviada para as células nervosas, e ocorrem importantes alterações nas funções do transporte das membranas, na biossíntese dos lipídios e das proteínas, na concentração dos compostos de fosfato de alta energia, e na secreção dos transmissores nervosos (GROSS, 1990). Conforme o autor acima citado, a sensibilidade das várias áreas do cérebro a falta de glicose parece estar relacionada com o seu consumo de oxigênio. O córtex é a área mais sensível à hipoglicemia, seguido pelas áreas subcortical, diencefálica e outras mais primitivas. Embora a hipoglicemia seja arbitrariamente definida como uma concentração de glicose abaixo de 50mg/dl, os sintomas relacionam-se também com a velocidade de queda dos seus níveis 20 Brunner & Suddarth (2005) agrupam os sintomas da hipoglicemia em duas categorias: sintomas adrenérgicos e sintomas do sistema nervoso central: Na hipoglicemia branda à medida que o nível de glicose cai, o sistema nervoso simpático é estimulado, provocando suor, tremor, taquicardia, palpitação, nervosismo e fome. Na hipoglicemia moderada o nível de glicose sanguínea priva as células do cérebro de combustível necessário para o seu funcionamento, desencadeado incapacidade de se concentrar, dor de cabeça, tontura, confusão, lapsos de memória, parestesia nos lábios e na língua, fala confusa, descoordenação, alterações emocionais e comportamentais, visão dupla e sonolência. Já na hipoglicemia grave o funcionamento do sistema nervoso central está tão prejudicado que o paciente precisa de ajuda de outra pessoa para o tratamento da hipoglicemia. Os sintomas podem incluir a desorientação, convulsões e dificuldade de acordar do sono ou perda da consciência. Lottenberg (2007) relata que a glicemia baixa, geralmente, é devido a uma falta de produção hepática de glicose, ou por utilização periférica exagerada da glicose. Em circunstancias habituais, a hipoglicemia é prevenida por meio de um mecanismo neuro-hormonal complexo e muito bem integrado. Portanto mesmo em jejum prolongado, em indivíduos saudáveis, não ocorre hipoglicemia. Várias são as causas da hipoglicemia entre elas estão: por drogas medicamentosas; distúrbios hepáticos; insuficiência hormonal; tumores e distúrbios relativos (sensibilidade a leucemia; pós cirurgia gástrica e hipoglicemia funcional) (GROSS, 1990). Para Brunner & Suddarth (2005) o tratamento para hipoglicemia se o paciente estiver acordado deve ser a ingesta de 10 a 15g de um açúcar oral de ação rápida. Se os sintomas persistirem por mais de 10 a 15 minutos o tratamento é repetido. Para os pacientes com alterações neurológicas deve-se fazer uso de glicose hipertônica de 50% venosa. 21 2.1.7.2.1 Síndrome Não Cetótica Hiperglicêmica Hiperosmolar (SNHH). Para Gross & Prado (2001) a SNHH é uma situação caracterizada por hiperosmolalidade, desidratação profunda e ausência de cetoacidose significativa. Brunner & Suddarth (2005) completa que o defeito bioquímico básico é falta a de insulina efetiva. A hiperglicemia persistente do paciente causa diurese osmótica, resultando em perdas de água e eletrólitos. Para manter o equilíbrio osmótico, a água passa do espaço intracelular para o espaço extracelular. Uma diferença importante entre a SNHH e a CAD é que na SNHH não ocorre cetose e acidose. As diferenças na quantidade de insulina presentes em cada condição são ditas como parcialmente responsáveis por isso. Como na CAD não há nenhuma insulina presente ocorre a degradação dos estoques de glicose, proteínas e lipídios, levando a produção de corpos cetônicos e consequentemente cetoacidose. Já na SNHH o nível de insulina não é tão baixo, sendo suficiente para evitar a quebra dos lipídios (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). Gross & Prado (2001) relatam que no tratamento da SNHH são empregados os mesmos princípios terapêuticos da CAD, inclusive no que diz respeito à reposição de líquidos. 2.2 CETOACIDOSE DIABÉTICA 2.2.1 Conceito A CAD, de acordo com Chagas & Silva (2006), é um distúrbio metabólico grave que decorre fundamentalmente da falta relativa ou absoluta de insulina. A glicemia normalmente está acima de 300 mg/dl e o pH plasmático abaixo de 7,3. A concentração de cetoácidos plasmáticos encontra-se acima de 3 mmol/l. O estado de consciência dos pacientes varia do normal ao coma e, nesse caso, 22 a concentração de plasmática de bicarbonato é igual ou inferior a 9mEq/l. A cetoacidose decorre da necessidade de mobilização rápida de energia dos depósitos do músculo estriado e tecido adiposo e alterações metabólicas também no fígado Para Farhat (2008) a cetoacidose diabética é uma complicação grave da diabetes mellitus, com elevado risco de morte. A CAD, com manifestação inicial, é mais observada em crianças menores de 5 anos e em famílias que não tem acesso rápido aos serviços de saúde por questões sociais e econômicas. Gross & Prado (2001) acrescentam que mesmo quando o tratamento é realizado em centros especializados, a mortalidade associada à CAD é de 5 a 15%. Lottenberg (2007) destaca que a CAD pode ser a forma de manifestação inicial de um quadro recém instalado de DM1 ou um episodio recorrente pacientes previamente tratados. É considerada a principal causa de mortalidade em pacientes diabéticos com idade inferior a 20 anos, responsável por cerca de 15% da mortalidade em diabéticos abaixo de 50 anos. Damiani & Daimiani (2008) alertam que o não reconhecimento da DM promove progressiva deterioração metabólica que pode levar a uma série de sequeles ou mesmo ao óbito. Apesar de ser uma complicação inicial relativamente freqüente no DM1, ela não é exclusiva dessa forma de DM, pois pacientes portadores de diabetes mellitus tipo 2 também podem abrir seu quadro com CAD. No entanto, Brunner & Suddarth (2005) expõe que depois de diagnosticado e iniciado o tratamento o DM2 não ocorre mais a CAD, pois há quantidade de insulina suficiente para evitar a produção de corpos cetônicos. 2.2.2 Fisiopatologia Os eventos metabólicos da CAD assemelham-se ao estado de jejum prolongado. A deficiência de insulina altera o metabolismo das três principais 23 classes de nutrientes (carboidratos, lipídios e proteínas) e dos três principais sítios de armazenamento de energia e de atividade metabólica (fígado, músculo esquelético e tecido adiposo) (LOTTENBERG, 2007). Brunner & Suddarth (2005) descrevem a glicogenólise como a produção de glicose pelo fígado através da degradação de glicogênio e após 8 a 12 horas de jejum, o fígado passa a formar glicose a partir da degradação de substâncias não carboidratos, sendo essa a gliconeogênse. De acordo com Gross (1990), a ação insuficiente de insulina leva a diminuição do transporte da glicose do sangue para os tecidos, e ao aumento da produção hepática da glicose (causada pela aceleração da glicogenólise e da gliconeogênese), provocando a hiperglicemia. Chagas & Silva (2006) complementam o exposto pelo autor acima que além da falta de insulina, que limita a capacitação de glicose pelas células, levando ao aumento da glicemia, tem fundamental importância os hormônios chamados contra reguladores. A liberação desses hormônios – glucagon, catecolaminas, cortisol e hormônio do crescimento – aumenta em resposta a estresse físico e emocional. Como consequência, induzem glicogenólise e gliconeogênese máximas e prejudicam a utilização periférica de glicose, promovendo hiperglicemia; ativando o processo de cetogênese, iniciando o desenvolvimento de acidose metabólica. O acelerado estado de catobolismo associado a ausência de insulina gera aumento da lipólise e, em conseqüência, elevação da oxidação hepática dos ácidos graxos livres em corpos cetônicos, os quais são responsáveis, em grande parte, pelo estado de acidose da CAD (FARHAT, 2008). Lottenberg (2007) acrescenta que uma das alterações causadas pela extrema falta de atividade insulínica e o aumento da lipólise com liberação excessiva de ácidos graxos livres, os quais são convertidos em cetonas pelo fígado, 24 ocasionando a hipercetonemia (beta-hidroxibutirato e acetoacetato). Para Chagas & Silva (2006) nas concentrações plasmáticas muito elevadas de ácidos graxos, a captação hepática leva a saturação das vias de oxidação e esterificação, resultando em fígado gorduroso, hipertrigliceridemia e cetonemia. Gross (1990) diz que o metabolismo das proteínas é também anormal quando há insuficiência de insulina, transformando a proteína do músculo em aminoácidos, com muita rapidez, provocando aminoacidemia e perda de potássio pelos tecidos. Esse aumento de aminoácidos do fígado provoca o aumento da gliconeogênese, levando a hiperglicemia. Lottenberg, (2007) acrescenta que a diminuição da síntese protéica leva a transferência catabólica de aminoácidos, potássio, fósforo e magnésio do espaço intracelular para o extracelular, como consequência a perda de nitrogênio e eletrólitos pela urina. Sabe-se, para Chagas & Silva (2006), que os triglicerídeos, no tecido adiposo, são compostos neutros, mas os ácidos graxos livres e os corpos cetônicos produzidos a partir dos mesmos são carregados negativamente numa reação que libera íons H+. Desta forma, em associação ao acúmulo de corpos cetônicos, aumentam, também, os níveis de H+. Conforme o autor descrito anteriormente, a acidose produzida pela Cetose é parte reversível, mediante a reconversão dos corpos cetônicos a triglicerídeos ou pela complexa oxidação de íons H+. Após a aplicação da insulina, os corpos cetônicos deixarão de ser produzidos e passarão a ser oxidados, resultando em consumo de íons H+. Desse modo, o cetoacetato e o beta-hidroxibutirato circulantes, na cetoacidose, serão fontes potenciais de bases. No entanto, parte da acidose resulta da excreção de cetoacetato e o beta-hidroxibutirato na urina, como ácido livre ou sob forma de sal, acompanhados de sódio ou potássio. Deste modo, os corpos cetônicos são eliminados, mas o íon H+ não, resultando em acidose. Os mecanismos fisiológicos de eliminação de ácido, por meio da excreção de íons H+ pelos tampões renais, como fosfato ou amônia, e a hiperventilação pulmonar, como compensação respiratória para tentar eliminar o CO2 excessivo, também são desencadeados. 25 Quando a glicose no sangue ultrapassa o limiar renal, há glicosúria causando a diurese osmótica, com perda de água e eletrólitos. Não sendo contida, segue com desidratação, diminuição da função renal e colapso vascular (choque) (GROSS, 1990). Para Gross (1990) o comprometimento da função renal, causado pela desidratação, é também importante na formação de cetoacidose. Farhat (2008) complementa que a hipovolemia leva a perfusão periférica inadequada e a formação de acido lático que contribui, em menor escala, para a acidose metabólica. Lottenberg (2007) de forma mais ampla relata que a hiperglicemia provoca diurese osmótica com perda de água (cerca de 10% do peso corporal), sódio, cloro, potássio, magnésio e fósforo, induzindo a hipovolemia e diminuição da taxa de filtração glomerular. Os vômitos e a perda insensível de água induzida pela hiperventilação contribuem pra desidratação, e a hipercetonemia causa acidose metabólica e agrava ainda mais a perda urinária de eletrólitos. A acidose também provoca a depleção do potássio total do organismo. Como o acúmulo de íons H+, este substituirá, em parte, o potássio como íon intracelular, saindo das células para o espaço vascular e é eliminado pelos rins. Essa depleção agrava-se pelas perdas ocasionadas pela desidratação intracelular, quebra das proteínas e pelos vômitos. A depleção corporal de K+ é frequentemente acompanhada de níveis séricos normais ou menos elevada antes do tratamento, mas a hipopotassemia será quase que inevitável, se o potássio não for administrado precocemente, ainda na fase de reparação e correção da acidose. Os mesmos fatores aumentarão a excreção renal de fosfato resultando em hipofosfatemia (CHAGAS & SILVA, 2006). 2.2.3 Fatores Precipitantes Descartando-se a primeira descompensação de um paciente portador de DM, praticamente sempre que houver CAD, haverá um fator precipitante, resultará 26 da falta de insulina absoluta (interrupção de uso) ou relativa por aumento da necessidade induzida por outros fatores (infecção, trauma, drogas, doenças agudas etc). É importante ressaltar que erros dietéticos não provocam CAD (LOTTENBERG, 2007). Diferentemente do descrito pelo autor acima, Chagas & Silva (2006), apontam que erros ou excessos dietéticos e estresse emocional podem facilitar a descompensação e desencadear uma cetoacidose diabética. Para Brunner & Suddarth (2005), as três principais causas de CAD são a dose diminuída ou omitida de insulina, doença ou infecção, e o diabetes não diagnosticado e não tratado. Um déficit de insulina pode resultar de uma dosagem insuficiente de insulina prescrita ou da insulina insuficiente que está sendo administrada pelo paciente. Os erros na dosagem de insulina podem ser feitos pelos pacientes doentes, quando se supõem estarem ingerindo menos ou vomitando, diminuindo as doses de insulina. Conforme o autor acima citado, as doenças infecciosas estão associadas à resistência à insulina. Em resposta aos estresses físicos e emocionais, há um aumento no nível de hormônios de estresse, glucagon, adrenalina, noradrenalina, cortisol e hormônio de crescimento. Estes hormônios promovem a produção de glicose pelo fígado e interferem no uso de glicose pelos músculos e tecidos gordurosos, contrabalançando o efeito da insulina. Se os níveis de insulina não aumentarem durante a s crises de doença e infecção, a hiperglicemia pode progredir para CAD. 2.2.4 Sinais e Sintomas Como o quadro clínico de CAD não é específico, o diagnóstico diferencial é fundamental em qualquer paciente com quadro compatível. Tais sinais como poliúria, polidipsia, perda de peso e desidratação são ditos como inespecíficos (LOTTENBERG, 2007). 27 Dimiani & Diminani (2007) abordam que algumas situações clínicas podem levar a quadro clínico semelhante ao de uma CAD. Quando se atende um paciente com história prévia de DM a suspeita da descompensação em cetoacidose torna-se mais clara, mas, em um paciente até então hígido, alguns diferenciais devem ser salientados. Em termos do desarranjo metabólico, as hipoglicemias, a encefalopatia hepática ou urêmica, os erros inatos do metabolismo, o desequilíbrio hidroeletrolítico (doença de Addison, diabetes insípido, intoxicação hídrica), a acidose lática (intoxicação por salicilato), as drogas ilícitas, a hipóxia (CO, cianeto) ou os quadros pós-ictais podem confundir o diagnóstico. Quando ocorre alteração de sensório e mesmo coma, lembrar de meningite, encefalite, trauma/concussão, hemorragia (extradural, subdural, subaracnóide ou intracerebral), tumor cerebral, abscesso cerebral ou trombose cerebral. Exames de imagem e bioquímicos ajudam a elucidar o processo e conduzir a condutas adequadas a cada caso. Em consequência aos distúrbios metabólicos subjacentes o quadro clínico apresenta hiperglicemia (diurese osmótica, desidratação, hiponatremia e hipocalemia), acúmulo de corpos cetônicos (cetose, náuseas, vômito, dor abdominal, anorexia e hálito cetônico) e acidose (taquipneia e hipocalemia) (GROSS & PRADO, 1993). A dor abdominal e os achados físicos ao exame podem ser tão intensos que simulam um processo passível de cirurgia. Os pacientes podem ter hálito de acetona (odor de frutas), que ocorre com níveis elevados de corpos cetônicos. A hiperventilação pode ocorrer, essas respirações de Kussumaul (respirações muito profundas, mas, não trabalhadas) representam a tentativa do corpo em diminuir a acidose, contrabalançando o efeito do acúmulo de cetonas (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). A pressão sanguínea pode se apresentar baixa. O choque é uma complicação séria, associada a um prognóstico pessimista, e exige tratamento imediato e 28 vigoroso. Há sempre indícios de desidratação como pele quente e seca com turgescência e mucosas secas (GROSS, 1990). Os níveis de glicose sanguínea podem variar de 300 a 800mg/dl. Em alguns casos podem variar de valores mais baixos até valores altos como de 1000mg/dl ou mais, geralmente depende do grau de desidratação. É importante perceber que a gravidade da CAD não está necessariamente correlacionada ao nível de glicose sanguínea. Podem ocorrer casos de grave acidose com níveis de glicose entre 100 a 200 mg/dl, enquanto outros casos podem não ter evidência de CAD com glicemia de 400 a 500 mg/dl (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). A glicosúria e a cetonúria são achados laboratoriais fundamentais para diagnosticar a CAD, uma vez que, poucas são a condições, além do DM, que provocam esses dados. A verificação da glicose, cetonas, eletrólitos, uréia, nitrogênio, contagem de glóbulos brancos e cultura através do exame de sangue venoso e do arterial para gasometria e pH. A presença de cetonas no soro sanguíneo sempre indica cetose grave (GROSS, 1990). A evidência de cetoacidose é refletida em baixo bicarbonato sérico (0 a 15 mEq/l ) e baixos valores de pH ( 6,8 a 7,3) Um nível baixo de pCO2 (10 a 30 mmHg) reflete uma compensação respiratória para acidose metabólica (BRUNNER & SUDDARTH, 2005). Para Potter & Perry (1999) os valores normais de sódio sérico é de 135 a 145 mEq/L; potássio 3,5 a5,3 mEq/L; bicarbonato arterial 22 a 26 mEq/L; fosfato 2,5 a 4,5 mg/100ml; pH arterial varia de 7,35 a 7,45, abaixo de 7 é ácido e acima é alcalino. Conforme Brunner & Suddarth (2005) o nível de sódio e potássio pode ser baixo, normal ou alto, dependendo da quantidade de água perdida (desidratação). Gross (1990) salienta que se o sódio apresenta uma taxa alta, 29 na presença de hiperglicemia, é indício de desidratação grave. A taxa de potássio geralmente apresenta-se elevada devido a acidose metabólica, apesar das perdas acentuadas. Uma taxa alta de uréia e hematócrito indicam desidratação. Uma leucocitose de ate 15.000 leuco/mm3, inclusive com desvio à esquerda, é comum em decorrência da acidose e revertida rapidamente com a correção do distúrbio. Aumentos de enzimas séricas, especialmente a amilase, podem ser observadas. Neste caso, sua origem não é pancreática, tornando necessária a avaliação de outros critérios, por exemplo, lípase sérica para o diagnóstico de pancreatite em vigência de cetoacidose diabética (GROSS & PRADO 1993). De acordo com Damiani &Damiani (2007) nunca se deve deixar de procurar um foco infeccioso como causa da descompensação e a alteração mental (obnubilação, torpor e coma) pode decorrer de um quadro meníngeo e não do desequilíbrio metabólico: sempre que o quadro mental não melhora com a volta gradual da criança ao seu estado metabólico normal, suspeite-se de meningite associada ou do desenvolvimento de edema cerebral. Esta possibilidade, uma vez aventada, deve ser imediatamente tratada (manitol), já que a evolução e eventuais seqüelas dependem da intervenção rápida no processo. 2.2.5 Tratamento Farhat (2008) define que o tratamento adequado aos pacientes com CAD é baseado na reposição hídrica, insulinoterapia e correção dos distúrbios eletrolíticos. Esses pacientes devem ser avaliados em centros especializados em emergência, onde possa ser monitorizado e reavaliado constantemente. Chagas & Silva (2006) apontam que o paciente diabético descompensado frequentemente apresenta-se desidratado (terceiro grau), com perda de 10% a 15% de peso. Esta desidratação tende a ser hipertônica, pela elevação da glicemia e retenção de catabólitos (uréia e corpos cetônicos). 30 2.2.5.1 Administração de Fluidos A reposição de fluidos é necessária, uma vez que a deficiência chega a ser de 5 a 6L (aproximadamente 100ml/kg)podendo alcançar até 15 % de peso corporal. A reposição rápida e adequada é essencial para o sucesso do tratamento (GROSS & PRADO, 2001). Brunner & Suddarth (2005), definem que a reidratação é importante para a manutenção da perfusão tissular. Além disso, a reposição de líquidos aumenta a excreção do excesso de glicose pelos rins. Os pacientes podem necessitar de até 6 a 10 litros de liquido venoso para repor a perda causada pela poliúria, hiperventilação, diarréia e vômitos. Em contradição ao dito pelo autor acima, Gross &Prado (2001), relatam que o paciente necessita de 4 a 5 L nas primeiras 6 horas. O esquema sugerido é de 1/L em 30 min; 1/L em 1 hora; 1/L em 2 horas; 1/L em 3 horas. Em pacientes idosos ou com suspeita de comprometimento cardiovascular, a velocidade de reposição deve ser pela pressão de oclusão capilar pulmonar ou, quando essa não estiver disponível, pela pressão venosa central. Inicialmente, para Brunner & suddarth (2005) e Chagas & Silva (2006) a solução de escolha é a fisiológica 0,9% a uma velocidade muita alta, geralmente 500 ml a 1 litro/hora por 2 a 3 horas. Tratando-se da solução salina hipotônica (NaCL 0,45%), Brunner & suddarth (2005) e Gross & Prado (2001) descrevem que só deve ser utiliza para pacientes com hipertensão ou hipernatremia ou para aqueles com risco de insuficiência cardíaca congestiva. Já Chagas & Silva (2006) abordam que essa solução deve ser usada após os primeiros 2 litros de uso da SF 0,9 %, porém em uma infusão mais baixa (250 – 300ml/h). 31 Após a reposição inicial de cerca de 4L de solução fisiológica, a deficiência resídua de líquidos pode ser corrigida ao longo das 24 horas subseqüentes, sob forma de solução glicosada ou por água por via oral (GROSS & PRADO, 2001). Para Brunner & suddarth (2005), a monitorização do volume de líquido envolve a avaliação frequente dos sinais vitais, avaliação pulmonar e monitorização das injetas e excretas. Monitorar ou sinais de sobrecarga de líquidos é especialmente importante para o paciente idoso ou para aqueles com risco de insuficiência cardíaca congestiva. De acordo com Farbat (2008), a dieta será liberada assim que o paciente deixar de apresentar vômitos e aceitar dieta rica em potássio e líquidos, dessa forma, a hidratação completa ocorrerá de forma gradual e contínua por via oral. 2.2.5.2 Insulinoterapia A insulinoterapia é uma das medidas fundamentais no tratamento para reversão do quadro da CAD, devendo ser iniciada na segunda hora de tratamento, após a primeira expansão (FARBAT, 2008). Gross (1990) descreve que apenas a insulina cristalina deve ser usada e diferentemente do passado, hoje em dia, recomenda-se doses baixas de insulina em infusão contínua endovenosa ou por freqüentes injeções intramusculares ou subcutâneas. O uso de altas doses de insulina, recomendada no passado, foi contra indicado pelo fato de pesquisas clinicas terem demonstrado que a rapidez da recuperação da cetoacidose não depende da quantidade de insulina administrada. Para administração de insulina utiliza-se rotineiramente a via endovenosa contínua, com insulina regular. A solução de insulina deve ser preparada com 25 UI de insulina para 250 ml de SF 0,9 %, sendo necessária troca a cada 6 32 horas. Com o início da infusão espera-se uma queda de 75 a 100 mg/dL/h na glicemia. Se após 2 horas de infusão não houver essa redução deve-se dobrar a dose. A velocidade deve ser mantida até reversão da acidose e, posteriormente, reduzi-la à metade do valor inicial até o desaparecimento da cetose. Após atingir glicemia de 300 mg/dl inicia-se infusão de glicose para evitar queda exagerada da glicemia com risco de edema cerebral e hipoglicemia. (GROSS & PRADO, 1993) Segundo Gross (1990) as soluções devem ser trocadas de 4 a 6 horas, pois a insulina diluída em solução deteriora facilmente. Além desse cuidado, Farbat (2008) relata que se deve desprezar os primeiros 50 ml da solução para saturas as ligações da insulina com plástico do frasco e equipo, caso não estejam sendo utilizado frasco de vidro e equipo sem PVC. Colocar soro glicosado 5% em outra via de acesso periférico para manter o esquema da solução até a completa correção da acidose, quando deverá ser iniciada a insulina de ação intermediária (CHAGAS & SILVA, 2006). Alternativamente, Farhat (2008) indica passar para o esquema intermitente de insulina subcutânea (SC), tomando-se cuidado de aguardar cerca de meia hora após a administração da insulina SC para suspensão da infusão continua. Com o tratamento adequado da CAD, a correção da acidose ocorre dentro de 12 horas. A partir de então, a insulina NPH pode ser introduzida. Gross (1990) descreve que as vantagens aparentes desse processo de tratamento com insulina contínua são: menor probabilidade de hipoglicemia; melhor manutenção dos níveis de potássio; queda dos níveis de lactado durante o tratamento; possivelmente recuperação mais rápida da cetoacidose, uma vez que os níveis terapêuticos da insulina no soro são mantidos continuamente, e não de modo flutuante, como acontece na aplicação de injeções intermitentes de grandes doses de insulina. 33 2.2.5.3 Reposição de Eletrólitos A hipocalemia é uma ocorrência frequente durante o tratamento da CAD e, quando acentuada, pode causar arritmias cardíacas, paralisia e morte. O controle frequente pelo ECG pode alertar para possível risco de hipocalemia, mas os níveis de potássio no soro sanguíneo devem ser verificados com frequencia. (GROSS, 1990) O principal eletrólito de interesse durante o tratamento da CAD é o potássio. Embora a concentração plasmática inicial do potássio possa ser baixa, normal ou alta, há uma grande perda de potássio da reserva corporal. Além disto, o nível de potássio cai durante o curso do tratamento da CAD e, portanto, deve ser frequentemente monitorizada. (BRUNNER & SUDDARTH, 2005) A reposição cautelosa do potássio na hora certa é vital para evitar graves arritmias cardíacas que podem ocorrer com a hipocalemia. Como o nível de potássio cai durante o tratamento de CAD, o potássio deve ser infundido mesmo que sua concentração plasmática seja normal. (BRUNNER & SUDDARTH, 2005) Os pacientes com CAD podem ter uma depleção de fosfato, embora a maioria apresente fosfato sérico normal ou elevado antes do início do tratamento, invariavelmente se desenvolve hipofosfatemia durante o tratamento. (GROSS & PRADO, 1993) Quanto à correção da acidose deve-se levar em consideração que o tratamento adequado para a da CAD conduz ao término da produção da carga ácida. Tal fato ocorre porque a hidratação provoca melhor perfusão periférica e redução da produção de ácido lático e administração de insulina exógena cessa a lipólise com consequente bloqueio da formação de ácidos orgânicos. (FARHAT, 2008) A utilização de bicarbonato pode gerar acidose paradoxal no sistema nervoso central e agravar a hipocalemia. Desta forma, o uso de bicarbonato é restrito aos casos em que a acidose for grave (pH < 6,9), por causa do risco de depressão miocárdica. (FARHAT, 2008) 34 2.2.6 Complicações Além das complicações das alterações metabólicas descritas acima, o edema cerebral é a complicação mais temida e pode acontecer em 0, 5 a 1 % de todos os casos de CAD na infância, surgindo em média, de 14 a 16 horas após o inicio da terapia, acompanhado de altas taxas de morbidade e mortalidade. A rápida redução da glicemia; hidratação excessiva; utilização de fluidos hipotônicos; mudança na pressão oncótica; hipoxemia e hipofluxo cerebral e edema vasogênico são algumas das hipóteses cogitadas para explicar a presença de edema cerebral em associação com CAD. (FARHAT, 2008) Gross (1990) aborda que se deve suspeitar de edema cerebral quando o paciente parece responder ao tratamento a princípio, caindo logo a seguir num coma mais profundo. Damiani &Damiani (2007) complementam que na ocorrência de edema cerebral, o tratamento baseia-se na utilização de manitol. Devem ser evitadas complicações como hipopotassemia e a hipoglicemia, resultantes de avaliação incorreta das perdas ou tratamento muito agressivo. A principal complicação observada durante o tratamento da cetoacidose em crianças é o desencadeamento de hipoglicemia pelo uso intempestivo e excessivo da insulinoterapia, especialmente sem o cuidado de hidratar inicialmente o paciente para avaliação glicêmica adequada (CHAGAS & SILVA, 2006) De acordo com Farbat (2008) muitos episódios de CAD podem ser evitados com adequado treinamento de pacientes portadores de DM1. Chagas & Silva (2006) descrevem que quando se trata do primeiro episódio de cetoacidose, a partir do qual foi feito o diagnóstico do diabetes tipo, é fundamental, a orientação adequada do paciente em relação à doença, seu manuseio e controle no domicílio. A educação do paciente e sua família devem, preferencialmente, ser feita por uma equipe multiprofissional, em que os 35 principais pontos do tratamento (insulinoterapia, alimentação, práticas de atividade física e o autocontrole diário) sejam discutidos com clareza. 2.3 DIABETES NOS JOVENS Atualmente o aumento do número de pessoas com doenças crônicodegenerativas tem se constituído em um desafio para os serviços de saúde e para a sociedade. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o diabetes mellitus tipo 1 é uma das mais importantes doenças crônicas da infância em esfera mundial. Nos Estados Unidos da América dos 65.1000 casos novos diagnosticados a cada ano, 11.000 são em crianças e adolescentes, constituindo-se assim na segunda mais importante doença crônica infantil neste país (ZENETTI & MENDES, 2001). A diabetes mellitus tipo 1 é uma doença crônica que atinge crianças, adolescentes e adultos jovens e que tem aumentado no mundo todo. Seu tratamento exige controle glicêmico intenso para prevenir complicações. Por se tratar de uma doença crônica e exigir muitos cuidados em nome da vida, o diabético tipo 1 sofre repercussões emocionais importantes (MARCELINO; CARVALHO, 2008). Seguindo ao autor acima, a DM1 trata-se de uma doença com maior prevalência na faixa etária jovem, requer comportamentos especiais de autocuidado, ao longo da vida. O início repentino da doença e o tratamento exigido para controlar a glicemia como fatores estresse, causam mudanças abruptas no estilo de vida do jovem e interferem em sua auto-imagem e qualidade de vida. Segundo Thompson & Gustafson (1996 apud SANTOS & ENUMO, 2003) na adolescência, a DM é motivo maior de preocupação, uma vez que a doença pode comprometer o desenvolvimento. O mau controle do diabetes pode conduzir a um quadro de atraso no crescimento, decorrente dos episódios de 36 internação por cetoacidose, gerando também infelicidade, tristeza e desânimo. Podem ocorrer dificuldades escolares e sociais devido a uma redução na autoestima, decorrente dos cuidados exigidos pela doença, que fazem o jovem sentir-se diferente dos demais adolescentes. Devido a isso, neste período de transição entre a infância e a idade adulta, a equipe multiprofissional e a família tendem a estimular a independência do adolescente em relação ao manejo da doença. Porém, esta transição abrupta pode resultar em conflito pessoal e familiar, na medida em que, possivelmente, o adolescente ainda não tem maturidade suficiente para assumir tais responsabilidades. O estresse e a frustração gerados no adolescente, por não conseguir atingir os objetivos esperados pela equipe e família, contribuem para a instabilidade metabólica (Carson (2000 apud NOVATO; GROSSI; KIMURA, 2008)). Os autores acima citados abordam que o estigma de ser portador de uma doença crônica, a necessidade de submeter-se a procedimentos de controle em lugares públicos e o risco da ocorrência de hipoglicemia, a que está exposto pela terapêutica ou descuidos dela, reforçam a condição de diferente e podem gerar, no adolescente, sentimentos de inferioridade. Nesse período de vulnerabilidade física e emocional, é provável que haja maior dificuldade para a incorporação de comportamentos de adesão ao tratamento e, consequentemente, para que o controle metabólico se deteriore. Por isso, a compreensão do impacto da DM1 e o seu manejo no cotidiano dos adolescentes tornam-se cada vez mais fundamentais. Acredita-se que fatores psicossociais possam influenciar na adesão ao tratamento (Delamater et al. (2001apud NOVATO; GROSSI; KIMURA, 2008)). Por a adolescência ser um processo dinâmico entre a infância e a idade adulta: inicia-se com a puberdade e termina com a aquisição da identidade, bem como da elaboração de projetos de vida e de integração na sociedade, instala-se 37 então o que podemos chamar de crise de identidade, o adolescente está em busca de sua identidade, que será movida por uma ampla e profunda desestruturação, com desequilíbrios e instabilidade (IMONIANA, 2008). Para Erikson (1987 apud IMONIANA, 2008) a formação da identidade emprega um processo de reflexão e observação simultânea, um processo que ocorre em todos os níveis de funcionamento mental, pelo qual o individuo se julga a si próprio à luz daquilo que percebe ser a maneira como os outros o julgam. É no período da adolescência que o individuo vai questionar as construções dos períodos anteriores, próprios da infância. O adolescente assediado pelas transformações fisiológicas próprias da puberdade necessita rever suas posições infantis frente à incerteza dos papéis adultos que apresentam a ele. Mantendo autor acima citado, pode-se questionar como fica a mente do jovem ao saber sobre o diagnóstico dessa doença crônica, o diabetes, que ao contrário da doença aguda, frequentemente curável e temporária, ter uma doença crônica significa dizer que a pessoa terá de conviver pelo resto da vida, em um mundo em que se supervaloriza a saúde. Uma doença crônica como diabetes traz consigo um grande impacto, principalmente na fase em que se encontra o adolescente, pode alterar significativamente o seu desenvolvimento tornando-o suscetível a angustia e a ansiedade. Imoniana (2008) aborda que o portador do diabetes sente que tudo mudou e que não será mais o mesmo. O impacto do diagnóstico se deve principalmente ao fato de ser uma doença crônica, isto é, o individuo terá de viver pelo resto da vida com essa doença, o que os adolescentes a vivenciarem uma fase caracterizada por incertezas. Em seu estudo Kovacs (2001 apud IMONIANA, 2008) relata que inúmeras são as limitações vividas pelo diabético, desencadeadoras de vários sentimentos e atitudes, ora de medo e insegurança, ora de conformismo, autocuidados, que 38 provavelmente serão vivenciados por muito tempo pelos portadores do diabetes. As características cronicidade e risco das crises por descompensação da glicemia particularizam de forma especial o cotidiano da doença crônica o diabetes, impactando de forma importante no seu diagnostico. Para Vieira (2001 apud IMONIANA, 2008), desde o inicio dos sintomas até a definição do diagnostico, eles vivenciam uma fase de crise caracterizada por um período de desestruturação e incertezas, precisando aprender a lidar com os sintomas, procedimentos terapêuticos, para assim, reorganizarem suas vidas. E que a prioridade agora para esses adolescentes é a doença e eles precisam se adaptar às suas limitações, e estas estão relacionadas às condições físicas, alimentares e de socialização. Infelizmente, pesquisas demonstram que os adolescentes, em geral, têm mais dificuldades para aceitar a doença, quando comparados a crianças, pois, enquanto estas ainda dependem dos cuidados dos pais ou responsáveis, os adolescentes são convocados a responsabilizar-se pela própria saúde. Sua imaturidade pode mostrar-se no momento em que têm que assumir os autocuidados, como a administração de medicamentos e seguimento de uma dieta, por exemplo. Além da imaturidade e das dificuldades na aquisição do autocontrole, também as mudanças hormonais podem fazer com que a incumbência do controle da taxa de glicose no sangue seja ainda mais difícil durante a adolescência (Sarafino (1994 apud SANTOS & ENUMO, 2003). Jovens inseguros sobre si mesmos têm maiores possibilidades de não cumprir as tarefas do tratamento, pois procuram evitar sentir-se diferente de seus companheiros. Alguns adolescentes também tentam tirar proveito da situação de ser diabético, procurando, de alguma maneira, manipular as pessoas e as situações a fim de obter mais atenção para si. De outro lado, jovens com elevados níveis de auto-estima, que se sentem competentes socialmente, e com suporte familiar são mais propensos a aderir ao tratamento (Chipkevitch, 1994; Oliveira, 1999 apud SANTOS & ENUMO, 2003). 39 Podem ocorrer mudanças significativas das estratégias de enfrentamento na medida em que o indivíduo se desenvolve. Nesse sentido, adolescentes, crianças e adultos diferenciam-se em suas maneiras de administrar seus problemas. O fato de estar no início, no meio ou no fim da adolescência também diversifica as estratégias de enfrentamento. Williams & MacGillicuddyDe Lisi (2000 apud SANTOS & ENUMO, 2003) perceberam que os adolescentes mais velhos têm um repertório maior de habilidades cognitivas, o que reduz consideravelmente o nível de estresse por eles experimentado. A Sociedade Brasileira de Diabetes (1999), ressalva que é válido manter o jovem atento à importância da adesão ao tratamento, por meio de educação continuada. A educação é uma das partes fundamentais no tratamento do diabetes. É necessário motivar o indivíduo para adquirir conhecimentos e desenvolver habilidades para as mudanças de hábitos, com o objetivo geral do bom controle metabólico e melhor qualidade de vida. A adaptação a situações adversas, como é o caso da doença crônica, tem como fator importante a capacidade do individuo de responder aos desafios e as dificuldades, frente a situações de riscos e depende de alguns fatores como: características individuais, apoio familiar e social. O envolvimento da família é fundamental nesse processo para promover a reconstrução da vida que foi alterada em função da doença. Constata-se uma relação de dependência e de responsabilidade que os adolescentes colocam sobre os pais a respeito do diabetes (IMONIANA, 2008). Esse novo estilo de vida, com a necessidade de educação alimentar para evitar possíveis complicações com a doença, dificuldade de se adaptar a uma rotina de compromissos sociais (escola, festas e baladas) face às frequentes idas a médicos e postos de saúde para exame, a perda de liberdade de escolha quanto à alimentação e as dificuldades de se manter em dieta estando em companhia de amigos não diabéticos, são comportamentos e atitudes relevantes que impactam na reorganização da vida dos adolescentes. 40 Kovacs e Santos (2001 apud IMONIANA, 2008) entendem que o jovem diabético deve ser encorajado a adaptar seu tratamento médico a sua rotina diária, que inclua, a principio, todas as atividades destinadas a seus pares, tais como: freqüentar aulas, praticar esportes, passeios e viagens, desde que realize os cuidados prescritos para com o diabetes. Salientam que, a fim de mostrar a sua independência e responsabilidade sobre si mesmo, o adolescente pode deixar de usar a medicação a fim de testar o quanto é dependente realmente de insulina. E da mesma maneira desafiadora alguns adolescentes passam a tirar proveito da situação e tentam manipular as pessoas e situações. Imoniana (2008) descreve que a adaptação do adolescente à nova situação depende, em parte, da família. No inicio, os cuidados necessários devem contar com a ajuda dos pais, que posteriormente irão nortear comportamentos e condutas no estabelecimento de conhecimentos e responsabilidade ao adolescente do seu próprio corpo e a doença. O equilíbrio entre independência e dependência da criança doente necessita ser abordado dentro do contexto familiar. Para administrar os cuidados que uma doença crônica exige, tal como o diabetes em crianças e adolescentes, necessita-se de uma abordagem para o cuidado, através de uma equipe multiprofissional tendo a criança, o adolescente e a família como foco central deste cuidado (ZENETTI & MENDES, 2001). Considerando os autores supra cintados, a diversidade de problemas enfrentados pelos pais, com o filho portador da diabetes, pode ter efeito profundo na dinâmica familiar, situação esta observada quando os pais assumem a administração de injeções de insulina e as análises de sangue, pois, estes ficam em conflito e acabam não tendo outra opção a não ser magoar o filho. Problemas conjugais e outras dificuldades familiares poderão resultar da não aceitação do diagnóstico, comprometendo o controle do 41 diabetes na criança. Em relação aos irmãos, estes poderão ter medo de vir a desenvolver a doença, como também, sentir ciúmes da atenção dispensada ao irmão recém-diagnosticado. Chipkevitch (1994 apud SANTOS & ENUMO, 2003) relatam que cada vez mais se admite que aspectos emocionais, afetivos, psicossociais, a dinâmica familiar e até mesmo a relação médico-paciente podem influenciar o controle do diabetes. Nesse sentido, é reconhecida a importância dos fatores psicológicos tanto para o surgimento quanto para o controle metabólico do diabetes. A relação entre auto-cuidado e controle metabólico em crianças e adolescentes diabéticos tipo 1 para Zenetti & Mendes (2001), exige algum grau de envolvimento dos pais no cuidado. As crianças e adolescentes que demonstraram maior independência para as atividades de auto-cuidado não tiveram necessariamente o melhor controle metabólico em relação àquelas cujos pais estiveram mais envolvidos no cuidado diário em relação ao diabetes. As recomendações para o controle domiciliar do diabético incluem automonitorização: da glicemia capilar, de múltiplas doses de insulina, das alterações nos padrões dietéticos a partir de reeducação alimentar e da realização de atividades físicas programadas, a fim de manter os níveis glicêmicos. Estas recomendações implicarão em mudanças de comportamento dos pacientes, profissionais de saúde e familiares (ZANETTI; MENDES; RIBEIRO, 2001). Com correto controle domiciliar do diabético, comprova-se que o tratamento intensivo, com monitorização da glicemia capilar três ou quatro vezes ao dia, múltiplas doses diárias de insulina, dieta e exercícios físicos, além do contato mais frequente com a equipe multiprofissional especialista em diabetes, podem reduzir, de forma significativa, a incidência, progressão e severidade de complicações ao longo prazo da doença (NOVATO; GROSSI; KIMURA, 2008). 42 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Compreende-se a partir desse estudo, que os pacientes diabéticos necessitam de adequadas condutas para lidar com essa patologia crônica, visto que é uma doença que altera diversos órgãos e sistemas do corpo humano, sendo uma comorbidade importante frete a outras doenças. Nessas condutas deve constar em primeiro lugar a conscientização do paciente frente essa doença, mudança no estilo de vida, acompanhamento medico regular com seguimento das orientações. Como dito por Santos & Enumo (2003) a CAD é uma complicação grave da DM1 na qual uma das principais causas é a falta ou diminuição de insulina exógena. Juntamente a essa gravidade da DM está a fase em que esses jovens pacientes, estão vivendo há uma vulnerabilidade física e emocional e provavelmente haja uma maior dificuldade para a incorporação de comportamentos de adesão ao tratamento e, consequentemente, para que o controle metabólico se deteriore. (SANTOS & ENUMO, 2003) Devido à adolescência ser uma fase marcada por intensas transformações biopsicossociais, o adolescente portador de uma doença crônica, como é o caso do DM1, além de lidar com os aspectos próprios dessa fase, tem que enfrentar as demandas oriundas da doença e do tratamento Conclui-se através desse estudo que os adolescentes vivenciam sentimentos e situações complexas que são inerentes a esta fase de vida e aliado a isto a doença crônica o diabetes, parece-nos importante que exista muita compreensão e um grande apoio social família, escola e comunidade. E um efetivo trabalho de educação em relação ao diabetes, incluindo a participação nas associações de diabéticos que podem ter um papel social importante. 43 4. REFERÊNCIAS BOUNDY, Janice et al.. Enfermagem Médico-cirúrgica.Tradução Carlos Henrique Cosendey; revisão Sônia Regina Souza. 3º ed. Rio de Janeiro: Reichmann & Affonso Editores, 2004. BRASIL. Ministério da Saúde. 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