Estudo da Prevalência de Óbitos de Pacientes com Doença Renal

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Artigo Original
Estudo da Prevalência de Óbitos de Pacientes com Doença Renal
Crônica Associada à Doença Mineral Óssea
The Prevalence of Death in Patients with Chronic Kidney Disease
Associated with Bone Mineral Disease
Adelita Lehmkuhl1, Alfredo José Moreira Maia2, Marcos de Oliveira Machado3
1
Acadêmica do Curso de Farmácia da Universidade do Sul de Santa Catarina-Unisul, Tubarão, SC - Brasil; 2 Diretor Geral da
Clínica de Doenças Renais de Tubarão, SC - Brasil; 3 Professor Doutor do Curso de Farmácia da Universidade do Sul de Santa
Catarina-Unisul, Tubarão, SC - Brasil
RESUMO
Introdução: Os distúrbios na homeostase do cálcio, do fósforo e do paratormônio (PTH) ocorrem precocemente nos pacientes com
doença renal crônica (DRC) e desempenham papel fundamental na fisiopatologia das doenças ósseas que acometem esses pacientes.
As desordens do metabolismo mineral e ósseo são modificáveis e podem reduzir os fatores de risco associados a essas alterações que
aumentam o risco de mortalidade em pacientes sob diálise. Objetivo: identificar e quantificar casos de distúrbio mineral e ósseo (DMO)
em pacientes com DRC que vieram a óbito no período de janeiro de 2004 a julho de 2008. Método: foram revisados 87 prontuários
médicos dos pacientes que faziam hemodiálise e foram a óbito durante esse período. Foi realizado um registro retrospectivo de dados
pessoais, laboratoriais, de morbidade e mortalidade. Resultados: a taxa de mortalidade anual média dos pacientes com DRC,
atendidos no período estudado, foi de aproximadamente 16,7%. Do total de óbitos, a prevalência de DMO-DRC foi de 67,8%. A principal
causa de óbito foi a doença cardiovascular (26,4%) e a doença de base, com 52,9%, foi a nefropatia diabética. Dos pacientes que foram
a óbito, 45% se apresentaram com os valores de fósforo acima de 5,5mg/dL, 38% com valores de PTH acima de 300pg/mL, 40% com
valores de albumina inferior a 3,5g/L e 40,2% com valores de fosfatase alcalina acima de 126U/L. Conclusão: Os marcadores
bioquímicos são úteis para avaliar não apenas o risco de mortalidade na população com DRC, mas também o uso adequado do tipo de
tratamento para esse grupo distinto de pacientes.
Descritores: DMO-DRC. Hemodiálise. Mortalidade.
ABSTRACT
Introduction: Chronic kidney disease (CKD) is accompanied by disturbances in mineral and hormonal homeostasis that play an
important role in the pathophysiology of renal mineral and bone disease and are an important cause of morbidity. Mineral and bone
disease are modifiable and can reduce risk factors associated with these amendments which increase the risk of mortality in patients on
dialysis. Objective: to identify and quantify cases of mineral and bone disturbances (MBD) in patients with CKD that died during the
period of January 2004 to July 2008. Methods: We reviewed 87 medical records of patients on hemodialysis and who died in the period
mentioned above. A retrospective record was created to collect personal data, laboratory data, morbidity, and mortality. Results: the
average annual rate of mortality of CKD patients was 16.7%. The prevalence of MDB among the CKD patients was 67.8%. The main
cause of death was cardiovascular disease (26%) and the initial diagnosis was diabetic nephropathy with 52.9%. Of the deceased
patients, 45% presented a serum phosphorus concentration above 5.5 mg/dL, 38% with a serum PTH concentration above 300 pg/mL,
40% with serum albumin concentrations less than 5 g/L and 40.2% with serum alkaline phosphatase concentrations above 126 U/L.
Conclusion: The biological markers are useful not only to assess the risk of mortality in a CKD population, but also to select the
appropriate type of treatment for this distinct group of patients.
Keywords: CKD-MBD. Hemodialysis. Mortality.
Recebido em 12/12/08 / Aprovado em 03/02/09
Endereço para correspondência:
Marcos de Oliveira Machado
Rua: Paula Ramos 1.342, Coqueiros
88080-400, Florianópolis, Brasil
E-mail: [email protected]
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INTRODUÇÃO
MÉTODOS
A doença renal crônica (DRC) é considerada uma
doença de elevada morbidade e mortalidade, e sua incidência e prevalência em estágio avançado têm aumentado
no Brasil e em todo mundo1. A DRC vem se tornando uma
epidemia e o Sistema Único de Saúde (SUS) é responsável
por 87,2% do custo total da terapia de substituição renal
(TSR)2.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), no Brasil, existem 684 centros de tratamento
dialítico e, destes, 150 (21,9%) estão localizados na região
Sul. Entretanto, somente 310 centros responderam ao
censo, identificando apenas 41.614 pacientes, dos quais,
89,4% estão em hemodiálise e 10,6% em diálise peritoneal.
A taxa de mortalidade anual desses pacientes é de 15,2%2.
Os pacientes em tratamento dialítico apresentam
muitas comorbidades associadas, destacando-se as doenças
cardiovasculares, hipertensão arterial, anemia, suscetibilidade à infecção, grande prevalência pelo vírus da hepatite
B e C, desnutrição, doenças ósseas e outras3. Dentre as
doenças ósseas, há destaque para o Distúrbio Mineral e
Ósseo (DMO) da DRC, uma das complicações que se
desenvolve muitas vezes já no início da doença renal. Caracteriza-se como uma síndrome, que engloba as alterações clínicas, bioquímicas e ósseas, além das calcificações extraósseas presentes na patologia4,5. Essas complicações estão diretamente relacionadas com o impacto na
morbimortalidade desses pacientes, além do impacto negativo que apresentam sobre a qualidade de vida6,7. As
lesões ósseas que aparecem podem variar muito entre
estes, devido a fatores como idade, etiologia da doença,
dieta, tratamento instituído e duração do tratamento
dialítico8. O tratamento consiste basicamente em dieta,
medicamentos como quelantes de fósforo, além de outros
que estão relacionados com as outras comorbidades9,10. A
dieta e ou o tratamento medicamentoso à base de vitamina
D são (é) essenciais (essencial) para reduzir ou prevenir o
hiperparatireoidismo secundário (HPTs), assim como o
acometimento de fraturas11.
O trabalho teve como principal objetivo analisar os
prontuários e levantar os dados clínicos e laboratoriais de
pacientes com DRC sob tratamento dialítico que foram a
óbito para verificar a prevalência da DMO-DRC por meio
de marcadores bioquímicos, com o intuito de auxiliar os
clínicos na identificação de fatores de riscos dessa população, os quais devem estar comprometendo o tratamento
e/ou determinando o óbito. Este estudo pode possibilitar o
direcionamento dos pacientes com esse perfil em vida, para
um tratamento mais adequado, uma vez que a reeducação
alimentar e a intervenção farmacológica, para estes, pode
aumentar a qualidade e a expectativa de vida.
Foi realizado um estudo de coorte retrospectivo dos
prontuários de pacientes atendidos pela Clínica de Doenças
Renais de Tubarão que vieram a óbito no período de janeiro de
2004 a julho de 2008. A clínica de Doenças Renais de Tubarão
é um centro de diálise que faz parte da Associação de
Municípios da Região de Laguna (AMUREL), sendo, então, a
única clínica de diálise na região. Todos os pacientes estavam
em tratamento dialítico e realizavam três sessões por semana.
Os critérios de inclusão foram: 1) ser portador de doença
renal crônica terminal (DRCT); 2) não ter se submetido a
transplante renal no passado e 3) ter idade superior a 18 anos. A
população total era de 89 pacientes, sendo que houve a exclusão
de dois pacientes, um com diagnóstico inicial de rejeição de
transplante e outro com idade inferior a 18 anos, restaram,
assim, 87 pacientes.
Após consentimento por escrito do Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL),
foram revisados os prontuários médicos dos pacientes sem que
estes fossem identificados por nome ou qualquer número
relacionado (Ex. RG ou CPF), bem como compilados dados
sociodemográficos como sexo, idade, tempo de hemodiálise,
diagnóstico inicial, causa de óbito, medicamentos relacionados
com DMO-DRC e dados laboratoriais.
De acordo com a Resolução nº. 154, de 15 de junho de
200412, o monitoramento da evolução das condições clínicas do
paciente requer determinações de parâmetros laboratoriais
mensais, trimestrais, semestrais e anuais. Entre estes, alguns
estão relacionados com o metabolismo ósseo, como paratormônio (PTH) (VR = 7 a 53pg/mL), o cálcio (VR = 8,4 a
10,2mg/dL), o fósforo (VR = 2,6 a 4,5mg/dL), o produto cálcio
e fósforo (VR = 49,6 a 55mg2/dL2), a fosfatase alcalina (VR =
38 a 126U/L) e a albumina (VR = 3,5 a 5g/L). Os pacientes com
DMO-DRC foram identificados por alterações clínicas,
bioquímicas (relativas ao PTH com valores abaixo ou acima de
200 e 300pg/mL, cálcio com valores acima de 9,7mg/dL e
fósforo com valores acima de 5,5mg/dL) e ósseas (relativo à
fosfatase alcalina acima de 126U/L) segundo as Diretrizes
Brasileiras de Prática Clínica para DMO-DRC5.
Quanto às principais causas de óbito, a tabela 1 mostra a
forma como foram categorizadas13.
Os dados foram compilados em planilhas do Microsoft
Excel®, utilizando o programa estatístico SPSS® para analisar a
distribuição percentual das variáveis qualitativas e quantitativas
da população estudada. Os resultados estão apresentados como
média ± desvio padrão para as variáveis quantitativas com
distribuição simétrica.
RESULTADOS
Os dados demográficos, as variáveis laboratoriais e
as causas de óbitos da população estudada estão expressos
na tabela 2. Os 87 pacientes estudados apresentaram idade
média de 64,7 ± 12,4 anos, com a população predominante
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Estudo da Prevalência de Óbitos de Pacientes com DRC Associada à DMO
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Tabela1. Caracterização das causas de óbito
Categoria
Causa de Óbito
Doenças Cardiovasculares
Infarto agudo do miocárdio
Insuficiência cardíaca
Arritmia cardíaca
Choque hipovolêmico
Choque cardiogênico
Cerebrovasculares
Acidente vascular cerebral
Hemorragia cerebral
Encefalopatia hipertensiva
Morte Súbita
Infecção
Septicemia
Infecção respiratória
Infecção coronariana
Choque séptico
Pneumonia
Metabólica
Hiperpotassemia
Doença Renal Crônica
Neoplasias
Outros
Hemorragia digestiva
Falência múltipla dos órgãos
Gangrena diabética
Insuficiência hepática
Desconhecido
Causas desconhecidas
Fonte: Ganesh SK et al (2001)13.
do sexo masculino (52,9%). Os principais diagnósticos de
base da doença foram nefropatia diabética, com 52,9% dos
casos, e nefroesclerose hipertensiva, com 37,9%, sendo os
demais por glomerulonefrite crônica (2,3%), outros e/ou
desconhecidos (6,9%). Verificou-se que o tempo médio de
tratamento dos pacientes no período estudado que foram a
óbito foi de 23,4 (± 34,5) meses. As doenças cardiovasculares foram as principais causas de óbito, atingindo
uma prevalência de 26,4% entre os pacientes.
Com relação às comorbidades, verificou-se que o
diabetes mellitus prevaleceu com 52,9% dos casos, no
entanto, outras doenças merecem destaque; como as
doenças cardiovasculares, cerebrovasculares, as infecções
e as neoplasias. Quanto à faixa etária dos pacientes,
observa-se que 69% dos pacientes tinham idade superior
a 60 anos, como mostra a figura 1.
Na população total obituária que estava fazendo
hemodiálise, a média dos valores dos minerais cálcio e
fósforo, produto cálcio e fósforo foi de 9,1mg/dL (± 1,1),
6,1mg/dL (± 2,1) e 56mg/dL (± 21), respectivamente,
sendo que os valores médios de cálcio estavam dentro da
faixa de referência da normalidade, enquanto que o fósforo e o produto cálcio e fósforo estavam acima dos
valores de referência da faixa de normalidade. A média
dos valores da fosfatase alcalina 145mg/dL (± 111) e do
PTH 317pg/mL (± 428) se encontrava acima dos valores
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Tabela 2. Características demográficas, laboratoriais e causas
de óbito da população estudada (n=87).
Características dos Pacientes
Demográficas
Idade
Sexo (%masculino)
Causa de DRCT
Nefropatia diabética
Nefroesclerose hipertensiva
Tempo de hemodiálise (meses)
Dados Laboratoriais
Cálcio sérico
Fósforo sérico
Produto Ca x P
Fosfatase alcalina
PTH
Albumina sérica
Causas de óbito
Doenças cardiovasculares
Infecção
Cerebrovascular
Insuficiência renal crônica
Metabólica
Neoplasias
Morte súbita
Outros
Desconhecida
Média ± Desvio Padrão
ou %
64,7 ± 12,4
52,9
52,9
37,9
23,4 ± 34,5
9,1 ± 1,1
6,1 ± 2,1
56 ± 21
145 ± 111
317 ± 428
4 ± 0,5
26,4
20,7
11,5
4,6
3,45
3,45
2,3
10,3
17,3
de referência e o da albumina 4g/dL (± 0,5), dentro da
faixa de normalidade.
Sobre o número de pacientes cujos valores dos
exames não se encontravam em conformidade com os
recomendados pelas Diretrizes Brasileiras de Prática
Clínica para o DMO-DRC, 45% apresentaram valores de
fósforo acima de 5,5mg/dL; 38%, valores de PTH acima
de 300pg/mL; 40% com valores de albumina inferiores a
3,5g/L e 40,2% dos pacientes apresentaram fosfatase
alcalina acima de 126U/L, como mostra figura 2.
A prevalência de DMO entre os pacientes que
foram a óbito foi, em média, 11,3% ao ano, sendo que o
maior índice ocorreu nos anos de 2004 e 2005, com 12,6%
A taxa média de mortalidade do período estudado foi de
16,7%, tendo sido maior no ano de 2004, diminuindo gradativamente até o ano de 2008. No entanto, no ano de 2008,
só foram analisados os prontuários até julho e já apresentava uma taxa de mortalidade de 12,4% (Figura 3). A
proporção de óbitos associados à DMO em relação ao número total de óbitos variou de 61% no ano de 2004 a 80%
no ano de 2008 (média de 68%).
A taxa de mortalidade anual foi calculada com
base no número de pacientes atendidos mensalmente pela
clínica, visto que estes apresentaram uma sobrevida maior
e outros eram transferidos. O total de atendidos durante o
período apresentou uma média mensal de 106 pacientes.
13
Figura 1. Distribuição percentual da prevalência de óbito por
faixa etária (anos) nos pacientes com DRC atendidos pela Clínica
de Doenças Renais de Tubarão - SC no período de janeiro de
2004 a julho de 2008.
Figura 2. Percentagem de pacientes com exames em não
conformidade com os valores recomendados2.
Figura 3. Comparação da taxa de mortalidade (x100) de pacientes
com DRC e com DMO-DRC atendidos pela Clínica de Doenças
Renais de Tubarão - SC no período de janeiro de 2008 a julho de
2008.
Todos os pacientes passavam por controle dietético, assim como faziam uso de medicações para regulação do metabolismo mineral, entre estes, incluíam-se os
quelantes de fósforo, como o carbonato de cálcio e o
cloridrato de sevelamer, e o calcitriol. Além dessas medicações, algumas outras drogas eram utilizadas para a prevenção e o controle das doenças primárias e secundárias.
DISCUSSÃO
Em nosso estudo, observamos que a maioria da
população analisada pertencia ao sexo masculino. Morsch
et al (2008)14 observaram que havia um predomínio de
homens em uma população de 1.307 pacientes nos centros de diálise das cidades do Rio Grande do Sul e Santa
Catarina. Santos (2005)15 também verificou essa prevalência em seu estudo com 139 indivíduos da unidade de
diálise da Santa Casa de Sobral no Ceará. Esses dados
também estão de acordo com o último censo da SBN
20082, no qual se identificou o sexo masculino como
prevalente na população com DRCT. Um maior número
de homens em hemodiálise aumenta as chances de haver
um predomínio destes sobre as mulheres em relação à
taxa de mortalidade, como foi constatado em nosso
estudo e por Barbosa et al (2006)3.
O maior número de pacientes na faixa etária acima
dos 60 anos de idade, na população obituária com DRCT
identificada por esse estudo, também foi observado pelo
último censo realizado pela SBN (2008)2, segundo o qual,
59% dos pacientes atendidos por 300 centros de tratamento espalhados pelo Brasil eram maiores de 60 anos.
O estudo de Gomes et al (2005)16, realizado com
131 pacientes do Hospital Pedro Ernesto da Divisão de
Nefrologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
e o de Schwarz et al (2006)17, realizado Salem Veterans
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14
Estudo da Prevalência de Óbitos de Pacientes com DRC Associada à DMO
Affairs Medical Center em Virgínia, também apresentaram uma população mais idosa. Já a média de idade
dos pacientes que foram a óbito no estudo de Barbosa et
al (2006)3, no Estado de São Paulo, foi de 39 anos. Essa
característica pode estar relacionada com uma maior aceitação de idosos em diálise ou à melhor expectativa de
vida que o Estado de Santa Catarina apresenta em comparação a esse último estudo14,18. Contudo vale ressaltar
que o envelhecimento, por si só, é um fator de risco para
a DRC e doenças com forte associação com a DRCT,
como as doenças cardiovasculares, hipertensão arterial e
o diabetes mellitus19.
A principal causa de óbito dos pacientes em nosso
estudo foram as doenças cardiovasculares, seguidas por
infecções. Isso corrobora com resultados do censo da SBN
20082, em que 37% da população geral em hemodiálise
apresentaram as doenças cardiovasculares como causa de
óbito e, em segundo lugar, com 26%, as infecções. Barbosa
et al (2006)3 identificaram que 63,6% da amostra de 103
pacientes da unidade de diálise do Hospital São Paulo
foram a óbito por infecção. Supõe-se que um dos fatores de
risco que levaram a óbito esses pacientes foi o diabetes
mellitus. Quanto às infecções, estão relacionadas com o
acesso vascular, além das condições de higiene dos
pacientes e da imunossupressão associada à uremia3.
Quando analisamos o diagnóstico inicial, verificamos que a nefropatia diabética, uma complicação do
diabetes mellitus, foi a principal causa da DRCT em nosso
estudo, obrigando os pacientes à TSR. Ganesh et al
(2005)13 verificaram, em uma população de 12.833 pacientes, que o diabetes foi a causa primária da DRCT.
Block et al (2004)20 observaram, em uma população de
40.538 pacientes provenientes da Fresenius Medical Care
North América, que o diabetes também foi a principal
causa que levou os pacientes à TSR.
Já em outro estudo, realizado por Ronqui et al
(2007)21 no ambulatório do Hospital Universitário de Maringá, com 114 prontuários, prevaleceu a hipertensão arterial, assim como no censo da SBN 20082. No estudo de
Romão Júnior et al (2004)19, realizado com 145 pacientes
do ambulatório de uremia do serviço de nefrologia do
Hospital das Clínicas de São Paulo, a nefroesclerose hipertensiva (33 pacientes) e a nefropatia diabética (46 pacientes)
foram as principais causas de doença de base da DRCT.
Existe uma inter-relação causal entre a principal
causa de óbito identificada por esse estudo, as doenças
cardiovasculares e outros fatores de risco como o diabetes
mellitus, além da hipertensão, idade avançada e sedentarismo, tanto na população geral como em doentes renais
terminais19.
Uma grande parte dos pacientes diabéticos desenvolve um tipo de patologia renal bastante associada com
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esse número elevado de mortalidade por DRCT, a chamada
nefropatia diabética. Além da sua alta prevalência, a
nefropatia diabética está associada a uma alta frequência de
mortes de causa cardiovascular. Pacientes portadores de
diabetes mellitus com proteinúria apresentam risco relativo
de morte até cem vezes superior a uma população não
diabética22. No entanto, pacientes com diabetes mellitus
sem nefropatia apresentam taxa de mortalidade apenas duas
vezes superior aos não-diabéticos23.
O nosso estudo revelou que 40% dos pacientes
apresentavam valores de albumina inferiores ao índice
recomendado pelas Diretrizes Brasileiras de Prática Clínica para pacientes com DMO-DRC5. Uma das possíveis
causas dessa redução da albumina sérica poderia ser a
nefropatia diabética prevalente na população ou algum
fator nutricional.
A hipoalbuminemia é marcador de desnutrição em
pacientes em diálise e tem sido relacionada a maior risco de
mortalidade24. A albumina é muito importante na manutenção do volume do líquido no sistema vascular, já que
as paredes dos capilares são impermeáveis à albumina, sua
presença no plasma determina elevação da pressão
oncótica que favorece a manutenção do fluido no espaço
intravascular, contribuindo para elevação do fluido circulante efetivo e, consequentemente, em condições cardíacas adequadas, para a estabilidade hemodinâmica.
A albumina, que é produzida no fígado, tem a
capacidade de ligar-se a inúmeras substâncias presentes
no plasma, funcionando como proteína de transporte para
metais, ácidos graxos, bilirrubinas, drogas, entre outras
substâncias25. Outro estudo evidenciou que a albumina
sérica foi significantemente menor em pacientes que
evoluíram para óbito em até 90 dias do início do tratamento dialítico quando comparados àqueles que morreram mais tardiamente25. Este dado sugere que a mortalidade precoce nos pacientes em início de tratamento
pode estar relacionada a uma deficiência nutricional.
Em uma análise simples, o distúrbio metabólico,
por si só, causado pelo diabetes mellitus é suficiente para
o desenvolvimento das lesões no glomérulo observado na
nefropatia diabética. O controle inadequado dos índices
glicêmicos causa complicações macro e microvasculares
que podem levar ao aparecimento de doenças cardiovasculares associadas à DRC21.
Uma das características dos pacientes que vieram a
óbito na população estudada foram os valores elevados
séricos de fósforo, produto cálcio e fósforo e do PTH. A
hiperfosfatemia é uma característica fortemente presente em
hemodialisados, que, além de contribuir para o desenvolvimento do HPTs, também está associada com a morbidade
e mortalidade desses pacientes, principalmente quando
relacionada aos eventos cardiovasculares20,26.
15
Segundo Schwarz et al (2006)17, o aumento do fósforo sérico e do produto cálcio e fósforo está significativamente associado com a progressão da DRC. Além do
que, o controle inadequado do fósforo está associado com
o risco de morte, principalmente cardíaca27, que foi a
principal causa de óbito do nosso estudo.
A nossa pesquisa revelou que 45% e 38% dos
pacientes apresentaram índices de fósforo e PTH, respectivamente, superiores aos recomendados pelas Diretrizes Brasileiras de Prática Clínica para pacientes com
DMO-DRC5. No último censo realizado pela SBN nos
centros de diálise de todo o Brasil, foi registrado que
33,6% e 25,9% dos pacientes sob hemodiálise estavam
com os índices séricos de fósforo e PTH, respectivamente, acima do recomendado.
Um estudo recentemente realizado por Morsch et
al (2008)14 em centros de TSR no sul do Brasil revelou
que, em relação ao gerenciamento de doenças ósseas,
avaliadas por meio do fósforo sérico, a maioria dos
centros apresentava aproximadamente 54,7% dos pacientes fora do alvo esperado do fósforo sérico. Apenas
quatro dos 25 centros estudados apresentavam mais de
60% dos pacientes com os valores de fósforo sérico
adequado. Este achado poderia ser atribuído às características da dieta no Sul do país, onde há um maior
consumo de proteínas de origem animal, ricas em fósforo,
o que seria meramente especulativo14. Portanto, há necessidade de estudos mais aprofundados no sentido de avaliar como é feita a orientação nutricional e a utilização de
drogas quelantes de fósforo nestas unidades.
O HPTs desenvolve-se precocemente no curso da
DRC. A deficiência de calcitriol e as anormalidades nos
receptores de cálcio e vitamina D parecem ser os primeiros fatores desencadeantes da hipersecreção de PTH e
da hiperplasia das paratireoides28. Com o avançar da DRC
e principalmente no decorrer do tratamento dialítico, sobrevém a hiperfosfatemia, que passa a ser o principal fator
de manutenção e agravamento do estado de hiperparatireoidismo28.
Para além da morbidade claramente associada à
gravidade do HPTs, recentes estudos epidemiológicos
têm evidenciado uma forte associação entre o HPTs e a
mortalidade dos doentes dialisados29. Os níveis séricos de
PTH intacto, de calcemia, de fosfatemia e do produto
cálcio e fósforo surgem associados com as calcificações
extraesqueléticas (nomeadamente vasculares e valvulares
cardíacas) e com o aumento da morbidade e da mortalidade cardiovascular29.
As alterações na homeostase mineral e óssea eram
conhecidas pelo nome osteodistrofia renal (ODR),
atualmente recebe a denominação DMO-DRC, termo que
reúne as alterações clínicas, bioquímicas e ósseas, além
das calcificações extraósseas, frequentemente observadas
na DRC. O termo ODR ficou reservado para as alterações
na histologia óssea avaliadas por biópsia30.
Alterações do metabolismo mineral e ósseo estão
fortemente associadas com maior taxa de mortalidade nos
pacientes com DRCT31. O acesso a outros parâmetros
bioquímicos da formação óssea (ex: isoforma óssea da
fosfatase alcalina; osteocalcina, pró-peptídeo carboxiterminal do pró-colágeno tipo I–PICP) e da reabsorção óssea
(fosfatase ácida resistente ao ácido tartárico, piridinolina,
desoxypiridinolina, “cross links” do colágeno, telopeptídeo do colágeno tipo I-ICTP) pode ser de grande utilidade
clínica. Estes marcadores permitem, de forma não invasiva, repetida e seriada, obter uma informação dinâmica
da evolução da remodelação óssea e da eficácia de
eventuais intervenções terapêuticas32.
No presente trabalho, verificamos que o índice
sérico médio da fosfatase alcalina se apresentou acima
dos valores normais. Níveis de fosfatase alcalina geralmente possuem boa correlação com a extensão da
reabsorção óssea33. A fração óssea específica da fosfatase
alcalina é altamente correlacionada com a fração total,
embora a de origem não óssea geralmente seja elevada na
DRC34.
A taxa de formação óssea é o índice usado para
avaliar o estado da remodelação do tecido nos pacientes
com DRC. A doença óssea de alta remodelação é representada pela osteíte fibrosa, secundária ao hiperparatireoidismo, e a de baixa remodelação, pela osteomalácia
e pela doença óssea adinâmica. Um estado intermediário
entre a alta e a baixa remodelação é conhecido como
doença mista4.
Na década passada, foi demonstrado cada vez mais
que a calcificação extraóssea surge e/ou piora em pacientes em diálise, mesmo na ausência de HPTs grave e
em pacientes com produto cálcio e fósforo reduzido35.
Portanto, em alguns pacientes em diálise, outros fatores,
além de PTH sérico alto e produto cálcio e fósforo alto,
devem ser importantes para o aparecimento da calcificação extraóssea.
Na imensa maioria, os pacientes submetidos à
diálise peritoneal ou à hemodiálise estão com balanço de
cálcio positivo36. Na ausência da função renal, é preciso
incorporar o excesso de cálcio ao osso a fim de evitar
níveis de cálcio sérico elevados. Se o osso não está se remodelando ativamente (ou seja, se tem remodelação
baixa), como ocorre na osteomalácia e na doença óssea
adinâmica ou aplástica, o osso não consegue absorver
esse cálcio37. Supostamente, o cálcio se deposita nos tecidos moles e na vasculatura, juntamente com o fósforo.
Infelizmente, os quelantes de fósforo que contêm
cálcio para reduzir o nível de fósforo podem se somar à
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Estudo da Prevalência de Óbitos de Pacientes com DRC Associada à DMO
16
carga de cálcio. Trata-se de um ponto preocupante, pois a
doença óssea de remodelação baixa aparece com frequência cada vez maior, sendo responsável por mais de
60% dos casos de doença óssea em pacientes submetidos
à diálise peritoneal e por, aproximadamente, 40% dos
casos de pacientes submetidos à hemodiálise38.
Os medicamentos utilizados pelos nefrologistas
para prevenir e controlar o DMO nos pacientes renais são,
principalmente, da classe dos quelantes de fósforo. Esses
são os medicamentos utilizados para reduzir a absorção
intestinal de fósforo, pois a hiperfosfatemia perturba a
interação metabólica entre o cálcio, PTH e vitamina D,
que é crítica para manter a homeostase27. Entre os mais
utilizados, o carbonato de cálcio absorve aproximadamente 40% do cálcio elementar e apresenta alguns efeitos
colaterais, tais como hipercalcemia, devido ao cálcio presente em sua composição, calcificações extraesqueléticas
e sintomas gastrointestinais, como constipação.
Quando há uma restrição de cálcio, é empregado o
cloridrato de sevelamer, pois sua composição não apresenta cálcio e alumínio. No entanto, se deve ter uma atenção para este quando há pacientes em uso de calcitriol, já
que promove a absorção intestinal de cálcio e fósforo,
podendo produzir hipercalcemia, hiperfosfatemia e aumentar o produto cálcio e fósforo. O monitoramento dos
níveis séricos de cálcio, fósforo e PTH, durante o tratamento com calcitriol, é preciso, pois, às vezes, é
necessário ajuste de dose para manter os níveis recomendados5,26,39. A maior parte dos pacientes deste estudo
fazia uso do carbonato de cálcio, seguido pelo cloridrato
de sevelamer e calcitriol.
CONCLUSÕES
A alta prevalência de pacientes com DMO-DRC
verificada em nosso estudo, constatada pelos valores
alterados de fósforo, produto cálcio e fósforo, PTH e
fosfatase alcalina, nos indica que esses marcadores
bioquímicos são úteis para se avaliar não apenas o risco
de mortalidade na população com DRC, mas também o
uso adequado do tipo de tratamento para esse grupo
distinto de pacientes.
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