0 UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS Departamento de Ciência dos Alimentos Curso de Bacharelado em Química de Alimentos Disciplina de Seminários em Alimentos Alimentos transgênicos Marcela Bromberger Soquetta Pelotas, 2009 1 MARCELA BROMBERGER SOQUETTA ALIMENTOS TRANSGÊNICOS Trabalho acadêmico apresentado ao Curso de Bacharelado em Química de Alimentos da Universidade Federal de Pelotas como requisito parcial Disciplina de Seminários em alimentos. Orientador: Profa. Dra. Rosane da Silva Rodrigues Pelotas, 2009 da 2 Agradecimentos Agradeço a minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Rosane da Silva Rodrigues, pela orientação e atenção para o desenvolvimento deste trabalho. Meus pais e minha irmã, que estão sempre me auxiliando e incentivando. Aos amigos, colegas, em especial a Isadora Rubin e Priscila Ferreira por ter me fornecido materiais sobre o assunto, e aos professores. Muito Obrigada. 3 Alguns homens lutam um dia e são bons; Outros lutam um ano e são melhores; Os que lutam vários anos são ótimos; Mas os que lutam a vida toda... Esses são imprescindíveis. (Bertolt Brecht) 4 SOQUETTA, M.B. Alimentos transgênicos. 2009. 39f. Seminário (Disciplina de Seminários em Alimentos) – Departamento de Ciência dos Alimentos, Curso de Bacharelado em Química de Alimentos, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas. Resumo Com o desenvolvimento da biotecnologia, a melhoria genética passou a ser feita de forma científica, em laboratório, através de técnicas de identificação, manipulação e multiplicação de genes dos organismos vivos, surgindo os organismos geneticamente modificados (OGMs) ou transgênicos, cujo princípio é a transferência de genes geralmente de bactérias, vírus ou animais para as espécies desejadas. Em relação aos produtos agrícolas, têm sido observados acentuados aumentos no cultivo e na comercialização de produtos geneticamente modificados, e também nas discussões científicas, éticas, econômicas e políticas a respeito dos potenciais riscos e benefícios decorrentes dessa moderna tecnologia. Os favoráveis garantem a comprovação científica da segurança dos transgênicos, desenvolvimento de organismos mais nutritivos, resistentes a agrotóxicos, pragas e doenças, sementes com maior durabilidade no mercado, melhora das características físicas e químicas. Os contrários à transgenia afirmam que os OGMs podem causar impactos no meio ambiente e na saúde de pessoas e animais: como alergias, toxicidade, intolerância, poluição genética, efeitos prejudiciais a organismos não-alvo, criação de super pragas. A legislação e a rotulagem desses alimentos ainda vêm sendo discutidas no fórum internacional organizado pelo Codex Alimentarium da FAO. No Brasil a Comissão técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), exige a informação no rótulo, de alimentos e ingredientes que contenham mais de 1% de componentes transgênicos. Este estudo teve como objetivo revisar a literatura sobre alimentos transgênicos, buscando esclarecer alguns pontos favoráveis e desfavoráveis, para que as pessoas decidam conscientemente o que querem defender e acrescentar em sua alimentação. Palavras chave: Engenharia genética, Alimentos transgênicos, geneticamente modificados. organismos 5 Lista de Figuras Figura 1: Área global de lavouras geneticamente modificadas..................................11 Figura 2: Área das lavouras geneticamente modificadas...........................................12 Figura 3: Obtenção de plantas transgênicas..............................................................15 Figura 4: Obtenção de plantas transgênicas pelo método Agrobacterium tumefaciens................................................................................................................17 Figura 5: Esquema de um aparelho de biobalística sob alta pressão com suas partes constituintes................................................................................................................18 Figura 6: Tomate geneticamente modificado denominado FLAVR SAVR.................23 Figura 7: Símbolo escolhido para identificar presença de OMGs nos alimentos.......35 6 Sumário 1. Introdução..........................................................................................................7 2. Histórico...........................................................................................................19 3. Alimentos Transgênicos..................................................................................13 3.1. Conceitos básicos..........................................................................................13 3.2. Engenharia genética......................................................................................14 4. Aplicações da manipulação genética nos alimentos.......................................21 4.1. Soja................................................................................................................21 4.2. Tomate...........................................................................................................22 4.2.1. Tomate FLAVR SAVR.................................................................................22 4.2.2. Tomate cereja.............................................................................................23 4.3. Milho...............................................................................................................24 4.4. Arroz...............................................................................................................25 4.5. Leite...............................................................................................................25 5. Alimentos geneticamente modificados que vêm sendo pesquisados.............26 6. Estudos favoráveis e desfavoráveis aos alimentos transgênicos....................27 6.1. Estudos favoráveis.........................................................................................27 6.2. Estudos desfavoráveis...................................................................................28 7. Legislação........................................................................................................30 7.1. Legislação Nacional.......................................................................................30 7.2. Legislação Internacional................................................................................31 8. Rotulagem.......................................................................................................33 9. Conclusão........................................................................................................36 10. Referências Bibliográficas..............................................................................37 7 1. Introdução Há séculos a humanidade vem fazendo cruzamento de plantas e animais com a finalidade de melhorar sua utilização para o consumo. Tratavam-se na verdade de experiências genéticas realizadas de maneira rudimentar e natural. Com o desenvolvimento da biotecnologia a melhoria genética passou a ser feita de forma científica, em laboratório, através da engenharia genética, que compreende o conjunto de técnicas que permite a identificação, manipulação e multiplicação de genes dos organismos vivos (LEITE, 2003). Em todo o mundo têm sido observados acentuados aumentos no cultivo e na comercialização de produtos agrícolas geneticamente modificados, ou seja, alimentos transgênicos. No entanto, devido ao fato desses produtos possuírem materiais genéticos introduzidos, de forma artificial, a partir de outros organismos vivos, ampliaram-se também as discussões científicas, éticas, econômicas e políticas revestindo-se de interesses e conflitos a respeito dos potenciais riscos e benefícios decorrentes dessa moderna tecnologia empregada na agricultura (MACHADO, 2000). Essas técnicas da engenharia genética permitem que esses genes quebrem a seqüência de DNA – que contém as características básicas de um ser vivo – do organismo receptor, que sofre uma espécie de reprogramação, a partir de genes de outras espécies, geralmente vírus ou bactérias, visando à obtenção de atributos favoráveis às necessidades de diferentes segmentos da cadeia agroalimentar: indústrias, agricultores, distribuidores e consumidores. O objetivo dessa engenharia genética é o desenvolvimento de organismos mais nutritivos, resistentes a agrotóxicos, pragas, doenças, sementes de maior durabilidade no mercado, melhora das características físicas e químicas, entre outras (LAVÍNIA; JOHN, 2003). Porém os efeitos sobre a vida, o patrimônio genético e o meio ambiente, advindos dos experimentos desta nova ciência, ainda não são totalmente 8 conhecidos, segundo os pesquisadores desfavoráveis dos alimentos transgênicos, os riscos à saúde humana incluem aqueles inesperados como alergias, toxicidade e intolerância. No ambiente, as conseqüências são a transferência lateral de genes, a poluição genética e os efeitos prejudiciais a organismos não-alvo (NODARI; GUERRA, 2003). Esses riscos acarretam uma compreensível insegurança e consequentemente, uma necessidade de conscientização ética e legal de seus operadores para a sua manipulação e utilização (LEITE, 2003). As discussões se estendem para a rotulagem dos alimentos transgênicos, como o posicionamento dos consumidores tende a resistência à adoção deste tipo de alimento, há uma maior necessidade de instrumentos legais e mecanismos que garantam autenticidade das informações contidas nos rótulos (SANTOS, 2000). Internacionalmente ainda existem quatro posições, os que defendem ausência de qualquer tipo de rotulagem, os que defendem a rotulagem simplificada, outros a rotulagem exaustiva, e os que defendem a não obrigatoriedade de rotulagem (PEREIRA, 1999). No Brasil, desde 2003 foi aceita a lei n° 4.680, pelo órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia (CTNBio), que exige a informação no rótulo de alimentos e ingredientes que contenham mais de 1% de componentes transgênicos (VASCONCELOS, 2006). Devido as controvérsias que ainda envolvem este assunto, o presente estudo teve como objetivo de revisar a literatura sobre os Organismos Geneticamente Modificados (OMGs), buscando esclarecer alguns conceitos básicos e aplicações da transgenia, mostrar os estudos favoráveis e desfavoráveis a esses alimentos, contribuindo para que as pessoas decidam conscientemente o que querem defender e acrescentar em sua alimentação. 9 2. Histórico O cientista que deu início a genética foi Mendel ao fazer experimentos com ervilhas. Seus estudos ficaram abandonados por 35 anos após a publicação de um artigo em 1865, na Sociedade de História Natural de Brün, só sendo retomados em 4 de maio de 1900 por Willian Bateson, que os encontrou por acaso na ocasião em que ia apresentar as suas próprias pesquisas, coincidentes com as de Mendel. Somente em 28 de fevereiro de 1953 é que foi descoberta a estrutura do DNA, por Francis Crick e James Watson que publicaram em 25 de abril do mesmo ano, na Revista inglesa Nature, um artigo no qual foi evidenciada uma possível forma de duplicação do material genético ao concluírem que a estrutura era uma dupla hélice e que os degraus dessa espiral poderiam ser conectados. A partir daí, palavras e expressões como engenharia genética, transgenia, teste de DNA, se tornaram habituais no dia-a-dia (NOGUEIRA, 2004/2005). Em 1972, o bioquímico Paul Berg realizou um experimento que mudou a sua história: juntou duas moléculas de DNA em laboratório. Com isso estava aberto o caminho para a criação dos Organismos Geneticamente Modificados (OGMs). O processo era o seguinte: inserindo um trecho do DNA do vírus SV40 causador de tumores no da Escherichia coli, uma bactéria bastante usada em pesquisas, criou o primeiro transgênico de que se tem notícia. Esta experiência deu a Paul Berg o Prêmio Nobel de Química em 1980. Mas, em 1973, Herbert Boyer e Stanley N. Chen já haviam dado início à era do DNA recombinante que dava margem à produção de OGMs. Em 1974, Berg, preocupado, publicou na revista "Science" uma solicitação para a suspensão dessas experiências até que fossem criadas diretrizes para essas pesquisas. Cientistas, advogados, oficiais dos governos de todo o mundo se reuniram, em 1975, na Conferência de Asilomar, nos Estados Unidos, com a finalidade de debater o assunto (NOGUEIRA, 2004/2005). 10 Como consequência, foram criadas em 1976 diretrizes para experiências com recombinantes. Nesse mesmo ano, Robert Swanson e Herbert Boyer concluíram que a técnica poderia ser usada para produzir compostos em escala industrial e fundaram a Genentch (BEI, 2005). Os primeiros experimentos de campo foram desenvolvidos em 1986 nos Estados Unidos e na França (FAO, 2000). Em 1987, a empresa norteamericana Monsanto apresentou a primeira planta transgênica alimentícia, a soja Roundup Ready, resistente ao herbicida Roundup. Em 1994, surgiu o primeiro produto alimentício transgênico no comércio mundial, o denominado tomate Flavr Savr, da empresa Calgene, que apresenta um processo de maturação mais lento, tornando-o mais vermelho. Cerca de 72% de todos os experimentos foram realizados nos EUA e Canadá, seguidos em ordem decrescente pela Europa, América Latina e Ásia, com poucos na África, limitados à África do Sul. As culturas mais frequentemente testadas foram: soja, milho, tomate, canola, batata e algodão e as características mais freqüentes: tolerância a herbicida, resistência a insetos, qualidade do produto e resistência a vírus (JAMES, 2003). O Brasil começou a discutir a temática envolvendo os alimentos transgênicos em 1995, quando entrou em vigor a Lei de Biossegurança, sancionada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso. Naquela oportunidade, o então presidente vetou os artigos da Lei que previam a criação de um órgão responsável pela avaliação dos transgênicos e pôr emitir pareceres recomendando ou não sua liberação no país. Um ano depois, entretanto, através de um decreto, criou no Ministério da Ciência e Tecnologia a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (OLIVEIRA, 2003). Em julgamento ocorrido em primeira instância, em 1998, as Organizações Não Governamentais (ONGs) contrárias à liberação, obtiveram sucesso com a exigência do juiz de que qualquer liberação de transgênicos no Brasil seja precedida de estudo prévio de impacto ambiental, avaliação de riscos à saúde humana e rotulagem plena dos produtos contendo transgênicos e derivados, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor (OLIVEIRA, 2003). 11 Em 2006 no Brasil já estava autorizado o plantio de dois tipos de transgênicos, ambos desenvolvidos pela empresa norteamericana Monsanto: a soja tolerante ao herbicida Roundup Ready (soja RR) e o Algodão Bollgard Evento 531, resistente a insetos. A Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) estimava que a área total de cultivo no país aumentasse de 840 mil hectares, na safra 2005/2006, para 970 mil hectares, em 2006/2007 - mas não puderam estimar a parcela dessa produção obtida de sementes geneticamente modificadas (VASCONCELOS, 2006). O cultivo de produtos agropecuários geneticamente modificados já é uma realidade irreversível no planeta. A área ocupada por plantações com sementes alteradas aumentou mais de cinqüenta vezes em uma década. Saltou de 1, 7 milhão de hectares em seis países, em 1996, para 90 milhões de hectares em 21 países, em 2005 (Fig. 1) (VASCONCELOS,2006). Figura 1: Área global de lavouras de organismos geneticamente modificados. Fonte: Revista Desafios do desenvolvimento de Janeiro, 2006. 12 Figura 2: Área das lavouras geneticamente modificadas. Fonte: Revista Desafios do desenvolvimento de Janeiro (Lia Vasconcelos, 2006). A Fig 2. mostra o Brasil como terceiro maior produtor de alimentos transgênicos do planeta - perdendo apenas dos Estados Unidos e da Argentina. A área de plantio de soja geneticamente modificada aumentou 88%. Foram cultivados cerca de 22 milhões de hectares que resultaram na colheita de 53,4 milhões de toneladas de grãos. As estimativas do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento indicam que a taxa de grãos geneticamente modificados gire em torno dos 17% no país. E trata-se, aí, da soja, o grão transgênico mais disseminado no planeta. A soja tolerante aos herbicidas ocupa 60% da área plantada no mundo. Catorze dos 21 países produtores, entre eles Estados Unidos, Argentina, Brasil, Canadá, China, Paraguai, Índia, África do Sul, Uruguai, México e Espanha, são os maiores produtores: cultivaram 50 mil hectares ou mais em 2005, de acordo com o Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações em Agrobiotecnologia (ISAAA, na sigla em inglês), instituição formada por centros de monitoramento e avaliação do uso da biotecnologia para a promoção do desenvolvimento da agricultura. Outra informação do Serviço: o valor das colheitas transgênicas deve atingir 5,5 bilhões de dólares em 2006 (VASCONCELOS, 2006). 13 3. Alimentos Transgênicos 3.1. Conceitos Básicos Todos os seres vivos do planeta são constituídos de órgãos, tecidos e células formados pelos mesmos tipos de moléculas, combinadas por meia dúzia de elementos comuns: carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, fósforo e enxofre. O código genético do ser humano, dos animais, das plantas e dos microrganismos é o mesmo. Esse código universal permite que os genes que comandam a síntese química sejam transferidos e se expressem em outras espécies totalmente diferentes. Célula é a unidade fundamental de tudo o que é vivente em nível molecular, e se constitui de membrana, citoplasma e núcleo. Uma das descobertas científicas mais surpreendentes do século XX é exatamente o que torna possível a engenharia genética (TASCA, 2001). O núcleo da célula contém os cromossomos que são constituídos do DNA (acido desoxirribonucléico), precedido do RNA (acido ribonucléico). Essas biomoléculas são estruturas químicas que contêm as instruções genéticas que coordenam o desenvolvimento e funcionamento de todos os seres vivos e alguns vírus. A pelicular estrutura do DNA confere a molécula duas propriedades realmente extraordinárias: a capacidade de copiar-se, reproduzir-se e a capacidade de armazenar e transmitir a informação genética. Um segmento de DNA que contém as informações para fabricar uma proteína é o gene. As proteínas formam uma classe importante de moléculas, porque são constituíntes fundamentais da matéria viva e desempenham todo o tipo de funções no organismo, podem ser estruturais, reguladoras, catalíticas, transportadoras ou defensivas (NOGUEIRA; SANTOS, 2004/2005). 14 As proteínas são compostos orgânicos de estrutura complexa e massa molecular elevada (de 5.000 a 1.000.000 ou mais unidades de massa atômica) e sintetizadas pelos organismos vivos através da condensação de um grande número de moléculas de alfa-aminoácidos, através de ligações denominadas ligações peptídicas. Uma proteína é um conjunto de no mínimo 100 aminoácidos, mas sabemos que uma proteína possui muito mais que essa quantidade, sendo os conjuntos menores denominados polipeptídeos. A proteína que catalisa as reações nos organismos vivos é chamada de enzima (RIECHMANN, 2002). O conjunto de todo o material genético de um organismo é chamado genoma. Este comanda a construção, manutenção, reprodução, adaptação e sobrevivência de todos os seres vivos. Biotecnologia é a técnica que usa organismos vivos ou parte destes para produzir ou modificar produtos, melhorar geneticamente as plantas ou animais ou desenvolver microrganismos para fins específicos. Essas técnicas servem-se da engenharia genética, biologia molecular e outras (RIECHMANN, 2002). 3.2. Engenharia genética Engenharia genética refere-se ao conjunto de técnicas e métodos para modificação do genótipo através da manipulação de seus genes e construção de moléculas de DNA recombinante (sequência nova de DNA, criada no laboratório mediante a união de segmentos de DNA de diferentes origens) introduzindo-as depois nas células receptoras (TASCA, 2001). A identificação e a localização de genes para características importantes na agricultura geralmente é o passo de maior limitação na obtenção de transgênicos. Ainda se conhece pouco sobre os genes que são requeridos para melhorar as características de uma planta com o objetivo de torná-la resistente ao estresse ou a algum pesticida ou ainda melhorar suas características nutricionais. Para a obtenção de plantas transgênicas deve-se extrair o DNA do organismo que possui o gene de interesse. A seguir o gene de interesse é isolado e 15 inserido em bactérias para a obtenção de várias cópias deste gene. O gene de interesse, antes de ser inserido no genoma da célula vegetal, sofre transformação, com a associação de um promotor, de uma seqüência terminadora e ainda de um gene marcado com seu respectivo promotor, originando o transgene. O transgene (gene modificado) é então inserido em massas de células indiferenciadas, o tecido caloso da planta, visto que é impossível a inserção do transgene em cada uma das células da planta. Essas massas apresentam a propriedade de originar diferentes órgãos de uma planta, como raiz, caule e folha, gerando uma planta completa e fértil. A fig. 3 mostra o principio básico da obtenção de plantas transgênicas (TUTIDA; FOGAÇA, 2009). Figura 3: Obtenção de plantas transgênicas. Fonte: Artigo como funcionam os Alimentos Transgênicos (TUTIDA; FOGAÇA, 2009). Existem vários métodos para a inserção do transgene na célula, os mais utilizados são: sistema agrobacterium tumefaciens, bombardeamento com micropartículas revestidas de DNA, transferência por electroporação de protoplastos e microinjeção de DNA. Citados abaixo: Sistema Agrobacterium tumefaciens - método biológico, pelo qual é inserido um gene de característica desejada, no genótipo de uma bactéria de solo, que ao se associar a uma planta retransmite a mesma característica. 16 A Agrobacterium tumefaciens é responsável pela formação de tumores (galls) num largo número de dicotiledóneas. Esta doença toma o nome de crown gall. Durante a infecção a bactéria transfere parte do seu DNA para a planta, DNA este que é integrado no genoma da hospedeira, causando a produção de tumores e mudanças associadas ao metabolismo da planta. O modo peculiar de atuação desta bactéria permite que esta seja usada como forma de construção de plantas (plant breeding). Qualquer gene desejado, como por exemplo: genes inseticidas, ou genes que causam resistência a herbicidas, podem ser colocados no DNA bacteriano e, através deste, inseridos no genoma da planta. O uso desta técnica não só encurta o convencional processo de plant breeding, como também permite a incorporação de genes completamente novos nas culturas (HANDEL; MILACH, 2009) A A. Tumefaciens é uma bactéria gram negativa, que não produz esporos, dotada de mobilidade, estreitamente relacionada com a Rhizobium (a qual forma nódulos fixadores de azoto nas leguminosas). Encontra-se geralmente nas e à volta das superfícies das raízes numa região chamada de rizosfera – onde sobrevive usando nutrientes que escapam dos tecidos radiculares. Porém, ela infecta as plantas apenas em locais onde estas estejam lesionadas (NOGUEIRA, 2004/2005). A figura abaixo mostra o processo pelo método Agrobacterium tumefaciens (Fig. 4). 17 Figura 4: Obtenção de plantas transgênicas pelo método Agrobacterium tumefaciens. Fonte: Artigo como funcionam os Alimentos Transgênicos (TUTIDA; FOGAÇA, 2009). Bombardeamento com micropartículas revestidas de DNA : método físico, conhecido como biolística ou biobalística, nesse sistema o DNA é revestido em micro esferas de tungstênio, sob altas pressões de gás hélio, e transferido para dentro do tecido da planta. Ou seja, o gene é como um fio que pode ser quimicamente enrolado nas micropartículas e que, com pressão de gás hélio, é bombardeado para dentro da célula e o novo gene é incorporado (Fig 5). 18 Figura 5: Esquema de um aparelho de biobalística sob alta pressão com suas partes constituintes. Fonte: Artigo como funcionam os Alimentos Transgênicos (TUTIDA; FOGAÇA, 2009). Transferência por electroporação de protoplastos - introdução de DNA em células expostas a um campo elétrico. Nesta técnica, retira-se a parede celular das células vegetais, tornando-as mais permeáveis (estas células, desprovidas de parede celular, são designadas de protoplastos). Posteriormente, os protoplastos são incubados em soluções que contêm os genes que irão ser transferidos e, em seguida, um choque elétrico de alta voltagem é aplicado por curtíssimo tempo. O choque causa uma alteração da membrana celular, promovendo a abertura temporária de poros o que permite a penetração e eventual integração dos genes de interesse no genoma do protoplasto. O mesmo princípio 19 também pode ser aplicado para células vegetais, porém, a taxa de transformação é mais baixa (NOGUEIRA, 2004/2005). Microinjeção de DNA - consiste numa injeção de DNA na célula em questão através de uma micropipeta (NOGUEIRA, 2004/2005). Cada um desses métodos objetiva introduzir o transgene no núcleo da célula, local onde se encontra o material genético, sem lesionar a célula. A planta, então, se desenvolve e suas células apresentarão o transgene de interesse podendo transmitilo à sua descendência. O método de inserção preferivelmente utilizado é o sistema Agrobacterium tumefaciens. Seguindo o processo de inserção do(s) gene (s) de interesse, os tecidos das plantas são transferidos para um meio específico contendo antibiótico ou herbicida, dependendo do marcador utilizado. Apenas as plantas que expressarem o gene marcador favorável ao meio irão sobreviver. Assume-se que as plantas que sobreviverem neste meio irão expressar o transgene de interesse. Todos os passos seguintes irão utilizar apenas as plantas sobreviventes. Para a obtenção de plantas completas a partir dos tecidos transgênicos, estes devem ser submetidos a condições ambientais favoráveis ao seu crescimento e colocados em uma série de meios, contendo hormônios e nutrientes, em um processo chamado de cultivo celular. Uma vez que as plantas são geradas e estejam produzindo sementes, começa a avaliação da progênie. Um processo de avaliação rigoroso deve estar aliado às técnicas de produção de transgênicos para verificar se o gene inserido está incorporado com estabilidade para não causar efeitos deletérios a outras funções da planta, à qualidade do produto ou ao ecossistema agrícola. A avaliação inicial do processo inclui: verificação da atividade do gene, da estabilidade do gene nas gerações seguintes e não exercer efeitos no crescimento, produção e qualidade da planta. Se a planta passar por estes testes, ela não será usada diretamente na produção, mas antes será cruzada com variedades melhoradas da cultura. O 20 objetivo é incorporar a maior quantidade do genoma melhorado e adicionar o transgene na variedade da cultura. O próximo passo do processo é realizar avaliações experimentais a campo e em estufa, em vários locais e durante vários anos, para analisar os efeitos do transgene e o seu desempenho por completo. Esta fase inclui também avaliação dos efeitos no ambiente e da segurança alimentar (TUTIDA; FOGAÇA, 2009). Existem dois tipos de teste para a identificação da presença de OGMs. Um deles, conhecido como teste da fita, é simples e rápido. Realizado em folhas, indica se elas são transgênicas em poucos minutos, mas não especifica variedade e quantidade dos organismos que contêm e, portanto, não satisfaz os requisitos firmados no Protocolo. O segundo exige trabalho em laboratório, combina análise de DNA com uma série de ensaios de reação que indicam a quantidade e os tipos de OGM presentes numa amostra (de folhas, grãos ou produtos industrializados) (VASCONCELOS, 2006). 21 4. Aplicações da manipulação genética nos alimentos Em um primeiro momento os OGMs foram desenvolvidos com o objetivo principal de reduzir os custos de produção na agricultura e ampliar os ganhos na agroindústria mediante o desenvolvimento de vegetais resistentes a pragas ou tolerantes a agrotóxicos. Sua comercialização envolveu grandes polêmicas, principalmente na Europa, por parte de ambientalistas (preocupados com o impacto decorrente da introdução destes produtos no meio ambiente), agricultores e esquerdistas, que viam os OGMs como a concretização de interesses estritamente econômicos, pelo monopólio da produção de grãos. Já em uma segunda fase, os laboratórios progrediram para genes que aumentam o valor nutricional dos alimentos, programados para serem menos nocivos à saúde humana. Simultaneamente, uma terceira geração surge a fim de combater doenças infecciosas, com plantas que produzirão alimentos vacina, munidos de antígenos capazes de combater várias doenças. Em geral os alimentos trangênicos visam à produção de novos alimentos, que sejam mais resistentes à variação de temperatura, a pragas e doenças, que tolerem agrotóxicos, estejam isentos de certas toxinas ou alergênicos, incorporem valor agregado (contendo modificação em proteínas, vitaminas, óleos, amido, entre outras), aumentem o rendimento e tenham custos menores na armazenagem e transporte. Os que vêm sendo mais produzidos e mais polêmicos são: soja, milho, tomate, mamão, feijão, canola, batata entre outros (JORGE RIECHAMANN, 2002). Abaixo alguns exemplos de alimentos geneticamente modificados comercializados: 4.1. Soja A soja Roundup Ready é uma semente tolerante a herbicida, devido à substância glifosato (usado para dessecação pré e pós-plantio), a tolerância ao herbicida foi obtida pela inserção de um gene (AroA) oriundo do genoma 22 da Agrobacterium sp., estirpe CP4, a qual codifica uma variante da EPSPs (CP4 EPSPS), especialmente tolerante à inibição pelo glifosato. Sob tratamento com esse herbicida, as plantas de soja não são afetadas, em virtude da ação continuada e sistemática dessa enzima alternativa, insensível ao produto (SANTOS, 2007). Esta soja foi desenvolvida pela empresa norteamericana Monsanto nos primórdios da década de 80, facilitou a vida dos agricultores, proporcionando lucratividade com menores custos, pois reduz o número de aplicações do herbicida sobre a soja (MORAIS, 2000). Porém há relatos sobre possíveis efeitos do glifosato afetando negativamente o desenvolvimento inicial de plantas de soja, para a qual esse produto é recomendado. Esse efeito pode estar relacionado ao aumento demasiado da dose aplicada, à aplicação de outras formulações de glifosato não recomendadas para a cultura, ou ao efeito de outras substâncias químicas naturais ou sintéticas, como aleloquímicos ou surfactantes, respectivamente. Atualmente são disponibilizadas no mercado diversas formulações de glifosato, que, apesar de apresentarem o mesmo mecanismo de ação, possuem na sua composição diferentes sais, sendo os principais: sal potássico, de isopropilamina e de amônio (RODRIGUES; ALMEIDA, 2005). Os efeitos favoráveis ou desfavoráveis ainda não foram cientificamente comprovados. 4.2. Tomate 4.2.1 Tomate FLAVR SAVR O tomate FLAVR SAVR (fig. 6), produzido pela empresa Calgene, EUA, foi modificado geneticamente para apresentar um processo de maturação mais lento (fig. 4). Assim, em vez de colher os frutos verdes, esses poderiam permanecer na planta para maturar até ficarem vermelhos. Isso melhoraria a qualidade dos frutos sem implicarem perdas na colheita, no transporte e no armazenamento, uma vez que os frutos vermelhos e firmes em sua consistência assemelham-se aos que são colhidos verdes. Variedades de tomate que produzam frutos firmes podem ser obtidas também pelos métodos tradicionais de melhoramento. Porém, até o momento, não foi possível transferir o gene de plantas silvestres para a cultura sem 23 que houvesse também a transferência de inúmeros caracteres indesejáveis (BINSFELD; PEDRO, 2004). Figura 6: Tomate geneticamente modificado denominado FLAVR SAVR. Fonte: OPEN SALON, 2009. A segurança do tomate transgênico, bem como sua equivalência com as variedades produzidas por métodos de melhoramento convencional, tem sido questionada. Na prática, no tomate transgênico tem-se somente o gene nptII e o seu produto gênico, a enzima NPT II, como novo componente, pois o gene da enzima poligalacturonase (PG) foi isolado do próprio tomate e depois inserido novamente em sentido contrário. Mesmo assim, a transformação e a introdução de genes no genoma receptor podem provocar alterações genotípicas e fenotípicas inesperadas, pois podem ocorrer mutações pela integração de novos genes, já que a integração de genes pode ocorrer em regiões codificadoras, podendo-se esperar que genes da planta receptora sejam desativados (silenciados) ou outros ativados pela inativação de genes supressores. Mutações e efeitos pleiotrópicos, causados pela integração gênica, podem ser esperados quando se usa o vetor Agrobacterium. No entanto, não são exclusivamente causados pelo evento da transformação, mas também são verificados em plantas criadas pelos métodos convencionais de melhoramento (KLEINMANN,1998). 4.2.2. Tomate cereja O professor Schuyler Korban, da Universidade de Illinois (EUA), desenvolveu o tomate cereja que tem a propriedade de produzir antígenos do vírus respiratório sincicial, agente de uma infecção fatal em crianças e idosos. A doença é causa da maioria das 2.000 mortes que ocorrem anualmente no Estado de São Paulo entre 24 crianças com menos de 5 anos. Korban inseriu no genoma do tomate cereja uma proteína encontrada na membrana do próprio vírus, obtendo a vacina para a enfermidade. Porém as pesquisas continuam em andamento e ainda não existem conclusões cientificas comprovadas sobre sua eficiência (MORAIS, 2000). 4.3. Milho No milho Bt são introduzidos genes da bactéria Bacillus thuringiensis que já haviam sido identificados como responsáveis pela capacidade dessa bactéria em controlar insetos. Bacillus thuringiensis possui diversas “famílias” de genes que produzem toxinas. Uma dessas famílias de genes é denominada de Cry, que está presente em um grande número de variedades de milho transgênico cultivadas no mundo. Esse gene codifica uma proteína na planta que mata os insetos que consomem as folhas do milho. Existem variedades de milho Bt que produzem diferentes proteínas tóxicas. Algumas possuem ação contra lagartas que consomem as folhas da planta de milho. Outras são ativas contra larvas de besouros que atacam o caule da planta de milho. Essas pragas são responsáveis por perdas enormes na produção do milho e praticamente obrigam os agricultores a usarem inseticidas, caso contrário eles perderiam toda sua produção. O milho Bt diminui, ou até elimina, a necessidade de uso de inseticidas. Isto significa menor gasto de recursos para os produtores, alimento de melhor qualidade para o consumidor, e o meio ambiente fica preservado da contaminação com inseticidas (SILVA, 2004). As características nutricionais do milho convencional e do milho Bt são equivalentes, pois a única alteração que ocorre é a introdução do gene Bt. As variações nutricionais que ocorrem entre plantas de milho de uma mesma variedade são muito mais frequentes em função da mudança de clima e do tipo de solo do que pela presença ou não de um determinado gene, como o Bt. Foram realizados vários estudos sobre a segurança alimentar em termos de toxicidade e alergenicidade da proteína Bt. Os grãos do milho Bt também foram submetidos a uma rigorosa avaliação de seu uso como alimento; além disso, esse milho vem sendo consumido há 10 anos em diversos países sem registro de problemas. Somente após estudos rigorosos uma variedade de milho Bt é liberada para plantio e uso na alimentação (SILVA, 2004) 25 4.4. Arroz O arroz dourado, ou Golden rice, desenvolvido através de uma parceria entre pesquisadores de instituições da Suíça e Alemanha, destaca-se entre os OGMs pelo elevado teor de beta-caroteno, que é convertido no organismo em vitamina A. Foi resultado da introdução de genes de uma planta ornamental (narciso), uma erva nativa do mediterrâneo e da bactéria Erwinia sp, no genoma do arroz (Oryza sativa). A vitamina A fortalece o organismo humano contra doenças infecciosas e previne contra a cegueira noturna, mal que aflige atualmente mais de 350.000 crianças subnutridas do mundo. Prover vitamina A em abundância em um único cereal poderia ser o caminho mais curto para minimizar esta deficiência em famílias carentes da África, da Ásia e da América Latina a médio prazo. A importância deste fato reside em que o arroz representa entre 50% e 80% da ingestão diária de calorias no mundo e, entre todos os grãos comestíveis, é o que possui o código genético mais curto. Seu genoma é 37 vezes menor que o do trigo e seis vezes menor que o do milho – portanto, bem mais fácil de ser estudado, entendido e modificado (MORAIS, 2000). 4.5. Leite O leite geneticamente modificado é o leite dietético, que apresenta 30% a menos de gordura e 10% a mais de proteína, qualidades proporcionadas pela inclusão na ração das vacas de moléculas modificadas de ácido linoléico conjugado (CLA), composto graxo que atua na formação de lipídios. A molécula transgênica altera a síntese de gordura na glândula mamária dos animais (JOMAR MORAIS, 2000). 26 5. Outros alimentos geneticamente modificados que vêm sendo pesquisados Alface adicionada da proteína Lack 1, que dará à hortaliça a propriedade de imunizar contra a leishmaniose, doença que acomete cerca de 200 milhões de pessoas no mundo (Embrapa, 2000) Soja com insulina e o hormônio do crescimento humano (MORAIS, 2000). Tomate com mais licopeno, antioxidante que ajuda a prevenir o câncer de doenças do coração (FABIANA BERTOTTI, 2008). Grãos com mais vitamina E, antioxidante que fortalece o sistema imunológico. Alface enriquecida com um composto que ajuda a diminuir o LDL-colesterol e estimula o aumento do HDL-colesterol. Arroz, trigo e feijão com mais ferro, importante no combate à anemia. Frutas com maior teor de vitamina C. Alimentos com menor nível de micotoxinas, substâncias tóxicas produzidas por bolores que podem provocar doenças como câncer, diminuir a resistência do corpo e dar origem a hemorragias (FABIANA BERTOTTI, 2008) 27 6. Estudos favoráveis e desfavoráveis aos alimentos transgênicos Ainda sem conclusões cientificas sobre os efeitos dos OGMs, há muita polêmica em torno do assunto. Os contrários à agricultura transgênica afirmam que os OGMs podem causar impactos no meio ambiente e na saúde de pessoas e animais. Os favoráveis garantem a comprovação científica da segurança dos transgênicos. As discussões têm dois enfoques, um basicamente econômico e o outro ideológico que reflete diferentes visões de mundo e concepções acerca do papel e do processo do desenvolvimento científico e tecnológico (OLIVEIRA, 2003). 6.1. Estudos favoráveis O principal argumento para os técnicos favoráveis aos alimentos geneticamente modificados, é que ainda não existem provas de que esse tipo de alimento faça mal ao ser humano (BERTOTTI, 2008). Os alimentos geneticamente modificado pode ter a função de prevenir, reduzir ou evitar riscos de doenças, com sua capacidade de produzir nutrientes e medicamentos através de bactérias ou plantas modificadas geneticamente, para produzirem OGMs que estimulem o sistema imunológico. Um feijão com a inserção de um gene da castanha do Pará, por exemplo, passa a produzir metionina, um aminoácido essencial (TUTIDA; FOGAÇA, 2009). Outros fatores favoráveis são a criação de plantas resistentes a pragas, que necessitam de menos inseticidas, preservando o meio ambiente e a saúde humana; ou de frutos com amadurecimento controlado e, portanto, de melhor conservação e qualidade; ou ainda de sementes de plantas como soja, milho, canola e arroz, com seu valor nutricional melhorado. Assim haveria aumento da produção de alimentos e a consequente erradicação da fome no planeta. Nesse contexto, podemos observar que a grande maioria das sementes transgênicas cultivadas atualmente, possuem a característica de resistência aos herbicidas (venenos para plantas daninhas), é o casa o soja Roundup Ready. Possibilitando ao produtor agrícola, que antes pulverizava o herbicida com cautela, a fim de não provocar danos a sua plantação, a 28 utilização indiscriminada desses produtos, posto que devido à resistência da lavoura ao veneno, somente as plantas prejudiciais à lavoura morrerão. Outro ponto é o aumento de produção de alimentos, que alguns especialistas afirmam poder reduzir o problema da fome. Esse aumento ainda poderia reduzir os custos de produção, facilitando assim a vida do agricultor (TUTIDA; FOGAÇA, 2009). 6.2. Estudos desfavoráveis O principal argumento dos desfavoráveis aos OMGs é que sendo os produtos transgênicos oriundos de investimentos e pesquisas de grandes indústrias multinacionais, não possuem qualquer outro caráter (social, filantrópico, etc.) que não seja o financeiro-econômico. Sendo assim, pelo menos por enquanto, não possuem os atributos necessários para a erradicação da fome no planeta. Some-se a isso o fato das sementes transgênicas serem patenteadas por essas empresas, inserindo o agricultor num processo de dependência mais rígido do que o sistema convencional. Portanto, é nítido o objetivo estritamente comercial das empresas produtoras de produtos GMs, visando à difusão em âmbito mundial de sementes de alto custo, patenteadas e dependentes de sistemas intensivos de produção (OLIVEIRA, 2003). Portanto, no aspecto socioeconômico à principal preocupação é de enfraquecer o oligopólio criado pelas empresas produtoras de sementes transgênicas, através de uma regulação eficaz para a questão da propriedade intelectual, visando controlar a concentração do conhecimento sem desestimular os investimentos em novas pesquisas (OLIVEIRA, 2003). No meio ambiente à preocupação refere-se sobre os possíveis meios de controle de concepções inesperadas de novas plantas e de plantas daninhas, pois ao colocar genes resistentes aos agrotóxicos em certos produtos transgênicos, as pragas e as ervas-daninhas tenderão a desenvolver a mesma resistência, tornandose superpragas. As sementes chamadas cultivos Bt, que são produzidas a partir da inserção dos genes da bactéria Bacillus thuringiensis (que produz toxinas inseticidas) no código genético da planta a qual adquire uma característica inseticida, matando os insetos que venham a se alimentar de suas folhas. 29 Na segurança alimentar há uma preocupação sobre o comportamento das toxinas ou das substâncias alérgicas nos produtos transgênicos, ao potencial efeito destas substâncias em longo prazo e como podem vir a afetar a cadeia alimentar. Em virtude de tal incerteza científica, não é descartado o risco de eventuais processos alérgicos em massa, além do surgimento de bactérias resistentes aos antibióticos, visto que algumas plantas GMs recebem um gene de resistência a antibióticos que pode ser absorvido pelas bactérias do intestino humano, tornandoas imunes aos antibióticos. Com a inserção em alimentos do gene dessas plantas ou desses microrganismos, é provável que essas toxinas alcancem níveis intoleráveis, causando mal a pessoas, insetos benéficos e a outros animais. 30 7. Legislação 7.1. Legislação nacional A Lei da biossegurança nacional, lei nº 11.105/2005 estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados, criou o conselho nacional de biossegurança (CNBS), reestruturou a comissão técnica nacional de biossegurança (CTNBio), e dispõe sobre a política nacional de biossegurança (SILVA, 2004). A liberação dos alimentos transgênicos vem sendo condicionada á observância dessa lei, que exige além do conhecimento cientifico acerca das características, riscos e propriedades de tais produtos, a observância de todo o procedimento previsto e avaliação prévia da comissão técnica de biossegurança nacional, isto é, a realização do estudo prévio do impacto ambiental (EPIA) e apresentação de relatório do impacto no meio ambiente (Rima) visando desta maneira regulamentar o disposto no artigo 225 § 1º da Constituição Federal. Com a ratificação pelo Brasil da convenção da biodiversidade, a observância do princípio da precaução deve ser plena, pois não haveria outro caminho na ausência de segurança em relação ao meio ambiente senão ser cauteloso (ANES, 2005). A resolução nº 17/2004 da Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no controle sanitário dos alimentos, visando proteger a saúde da população, estabelece as diretrizes básicas para a avaliação do risco e segurança dos alimentos. O risco é a probabilidade de um determinado evento indesejável ocorrer (ANES, 2005). A legislação brasileira de biossegurança estabelece que a análise de risco seja feita caso a caso. A Anvisa deve atribuir-se da responsabilidade de levar em conta as implicações do consumo dos alimentos transgênicos sobre a saúde humana, estabelecendo normas e regras sobre o consumo desses alimentos (ANES, 2005). 31 7.2. Legislação internacional A regulamentação dos transgênicos na União Européia foi feita de modo comunitário no inicio de 1990, visando proteção à saúde de seus cidadãos e ao meio ambiente perante o mercado da biotecnologia que começava a se desenvolver. A normatização européia é composta por: Regulamento nº 1.829/2003; Regulamento nº 1.830/2003; Regulamento nº 18/2001; Regulamento nº 178/2002; Diretiva nº 18/2001; e Regulamento nº 172/2002 (ANES, 2005). Segundo esta regulamentação, antes da colocação no mercado os produtos que contenham OGMs é necessária uma notificação à autoridade competente do Estado-membro, onde o OGMs foi inserido pela primeira vez. É necessária também a autorização da autoridade estatal. No seu artigo 21, afirma que os estados membros devem tomar as devidas medidas para assegurar a rotulagem de OGMs e de produtos que os contenham. Objetivando elevar o nível de proteção da vida e da saúde dos seres humanos e proteger os interesses dos consumidores, através da garantia de boas práticas comerciais no setor de alimentos, criou a Autoridade Européia para a segurança dos alimentos e estabeleceu as diretrizes gerais que regem a legislação alimentar no âmbito europeu. Para alcançar seus objetivos, a autoridade emitira pareceres científicos que serão elaborados por seus painéis e comitês, dentre os quais encontra-se o painel dos OGMs que tem competência para se manifestar sobre o assunto no âmbito da União Européia. Portanto, encontra-se vinculada á aprovação e a liberação dos OGMs (ANES, 2005). Nos Estados Unidos da América, a legislação e regulamentação da utilização de técnicas para a elaboração de OGMs e o consumo destes produtos é a mais flexível que existe no mundo. Os componentes transgênicos em alimentos são considerados neste país como aditivos, não precisando passar sequer pela aprovação do FDA (Food and Drug Administration), órgão responsável pela realização de testes de segurança em produtos geneticamente modificados a serem colocados no mercado de consumo (ANES, 2005). 32 As empresas norte americanas de biotecnologia persuadiram a FDA a considerar que os alimentos transgênicos não passam de substâncias equivalentes aos alimentos tradicionais, o que exime os produtores de alimentos de submeter seus produtos aos testes normais da FDA e da Agencia de Proteção Ambiental (EPA) e deixa a critério das empresas rotular ou não seus produtos como transgênicos. Assim, a população não é informada sobre a rápida disseminação de alimentos transgênicos e os cientistas têm muito mais dificuldade para identificar os possíveis efeitos nocivos. 33 8. Rótulos Pela ótica de segurança alimentar os OGMs tem enfrentado fortes restrições de consumidores à sua introdução. Se o posicionamento dos consumidores aponta para uma maior resistência à adoção deste tipo de alimento, a necessidade de instrumentos legais e mecanismos que garantam a autenticidade das informações contidas nos rótulos adquirem maior importância (SANTOS, 2007). Existem basicamente quatro posições em discussão no fórum internacional organizado pelo Codex Alimentarium da FAO. A primeira posição é a dos que defendem a ausência de qualquer tipo de rotulagem que distinga alimentos transgênicos de não-trangênicos. A segunda, defendida pelos Estados Unidos e Canadá, é de não obrigatoriedade de rotulagem de alimentos geneticamente modificados que demonstrarem ser idênticos aos seus análogos convencionais no que diz respeito à segurança e às características nutricionais. Entretanto, características específicas que alterem o aspecto nutricional do alimento devem ser mencionadas no rótulo. A terceira posição, defendida pelos países europeus, advoga que qualquer produto produzido com OGM ou dele derivado, contendo DNA/RNA ou proteína geneticamente modificada detectável, deverá ser rotulado de maneira simplificada. Uma quarta posição propunha a rotulagem exaustiva, contendo informações detalhadas sobre todos os componentes e características do produto (PEREIRA, 1999). No Brasil, desde 2003, vigora o Decreto-Lei nº 4.680 pelo órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia (CTNBio), que exige a informação no rótulo de alimentos e ingredientes que contenham mais de 1% de componentes transgênicos. Por outro lado, rótulos dos alimentos sem esses organismos poderão trazer a inscrição “livre de transgênicos”, desde que existam similares transgênicos no mercado brasileiro (VASCONCELOS, 2006). A regulamentação é uma revisão do Decreto-Lei nº 3871 da (CTNBio), para reduzir o índice de incidência de organismos geneticamente modificados a serem assinalados. Antes, a indicação no rótulo era exigida a partir de 4%. (LIA 34 VASCONCELOS, 2006). Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), entretanto, a alteração ainda não é satisfatória. Segundo o Idec "O direito à informação e o direito de escolha, são direitos básicos e irrenunciáveis dos consumidores" (Lei 8.078/90 artigos 6, II e III, 9o e 31). O artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que "as informações devem ser corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa”. Devem conter as características, qualidades, quantidades, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como riscos que apresentam à saúde e à segurança do consumidor". Mas a rotulagem não é tão fácil quanto parece e pode ser feita das mais diversas maneiras. Pode-se indicar no rótulo se o produto tem origem transgênica, por exemplo ou pode-se decidir rotular apenas os produtos que não sejam substancialmente equivalentes (no caso, o óleo da soja Roundup Ready não seria rotulado, por motivos já mencionados anteriormente). É possível ainda uma rotulagem negativa, indicando que o produto não contém e não foi obtido através de organismos transgênicos (BRASIL, 2003). O símbolo dos Alimentos transgênicos foi definido pela Portaria N° 2658, de 22 de dezembro de 2003, pelo Ministro do estado da justiça, onde foi definido que este deverá constar no painel principal, em destaque e em contraste de cores que assegure a correta visibilidade. O triângulo será equilátero. O padrão cromático do símbolo transgênico, na impressão em policromia, conforme apresentado na figura 5, deve obedecer às seguintes proporções: bordas e letras 100% pretas, fundo interno do triangulo 100% amarelo. A tipologia utilizada para grafia da letra T deverá ser baseada na família de tipos "Frutiger", bold, em caixa alta, conforme apresentada na Fig 7 (BRASIL, 2003). 35 Figura 7: Símbolo escolhido para identificar Organismos Geneticamente Modificados nos alimentos. Fonte: BRASIL, 2003. 36 9. Conclusão Com os fatos mencionados, se observa que os alimentos transgênicos já são realidade em todo o mundo. Esses alimentos, produzidos através de tecnologias de modificação genética, tem o objetivo de promover saúde e trazer benefícios para consumidores, tanto em países industrializadas quanto em desenvolvimento. Porém, há hipóteses que eles possam trazer riscos para a saúde e para o meio ambiente. Não há como calcular as eventuais perdas em termos de biodiversidade, nem como controlar a degradação de recursos biológicos, muito menos de prever os efeitos adversos aos vários ecossistemas. Os testes realizados antes de sua liberação não são rigorosos o suficiente para garantir sua segurança. Além disso, a utilização de OGMs na agricultura pode causar o aparecimento de plantas daninhas e pragas resistentes, cuja consequência está no aumento do uso de agrotóxicos, acarretando maior quantidade de resíduos que vão parar na alimentação diária. Os riscos acarretam uma compreensível insegurança e inúmeras discussões econômicas, éticas e políticas. Por isso, é importante que os dados obtidos nos testes a campo com plantas modificadas estejam ao alcance de todas as nações, a fim de aumentar o conhecimento a respeito do comportamento das plantas em condições naturais de cultivo e permitir à sociedade o acesso aos dados científicos numa linguagem clara, didática e sem preconceitos acerca dos transgênicos, para que se forme uma opinião e as pessoas decidam conscientemente sobre o consumo ou não destes produtos. Portanto, somente garantindo segurança dos materiais geneticamente modificados a uma população bem informada sobre esse assunto essa técnica poderá ter o sucesso que se espera, e auxiliar no aumento da produção mundial de alimentos. 37 10. Referências Bibliográficas ABDULKADER, Fernando et al. DNA- Técnicas e aplicações. Instituto de Química da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2002. Disponível em: < http://www.iq.usp.br/disciplinas/dbq/dnata/> Acesso em: 2 de Julho de 2009. ALMEIDA, L; RODRIGUES F. Situação do mercado brasileiro de sementes e o potencial produtivo. Disponível em http://www.coodetec.com.br/artigos.asp?id=124>Acesso em: 1 de Abril de 2009. ANES, T. L.W. Organismos Geneticamente Modificados: Uma Abordagem á Luz do Direito Nacional e Internacional. Revista de Faculdade de Direito da UFPR v.43, Paraná, 2005. BEI. Transgênicos e células-tronco: Duas revoluções cientificas. Ed. Bei comunicações. 94p. 2005. BERTOTTI, F. Alimento transgênico: Vilão ou Herói. Vida e saúde. 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