APONTAMENTOS CONCEITUAIS Na atualização da Política Nacional de Alimentação e Nutrição, através da Portaria nº 2.715/GM/MS, de 17 de novembro de 2011, o Ministério da Saúde determinou a readequação dos planos, projetos, programas e atividades dos seus órgãos e entidades relacionados ao tema. Bem por isso, essa Secretaria se debruçou na atualização do Guia Alimentar para a População Brasileira. Indubitavelmente, este Guia é o principal instrumento de aplicação da Política estabelecida por esse Governo, entretanto, infelizmente o que se constata do conteúdo submetido à consulta pública é uma total desassociação dos seus propósitos, princípios e diretrizes. A nova proposta de Guia Alimentar põe no centro de suas recomendações a preferência pelo consumo de alimentos preferencialmente “in natura” e preparações culinárias ao invés de produtos prontos para o consumo e indicação para evitar-se os produtos ultraprocessados. A nosso ver, esta não deveria ser a abordagem principal, mas sim a correta orientação à população sobre dieta equilibrada, independentemente se composta por alimento, produto pronto para o consumo ou produto ultraprocessado. Um alimento individualmente considerado, seja ele industrializado ou não, não é determinante para um regime alimentar inadequado, não podendo ser taxado de per si, de produto nutricionalmente desequilibrado. Fossem a obesidade, as doenças cardíacas, o diabetes, as cáries dentárias e a pressão alta, riscos inerentes ao consumo somente de alimentos e bebidas industrializados, a utilização do sal nas preparações alimentícias domésticas e de restaurantes não representaria 70% da produção total deste nutriente, tampouco, se justificaria a prevalência desses males enquanto mais de dois terços da alimentação dos brasileiros é de alimentos e preparações culinárias, conforme pesquisa do IBGE 2008-2009, mencionada na pág. 35 da proposta de Guia. Não se vê ainda na proposta o reconhecimento das causas diversificadas da obesidade e consequentes doenças crônicas não transmissíveis. O consumo normal de tais alimentos industrializados, não causa esses males, e mesmo o consumo excessivo e anormal não os causará necessariamente, já que tais agravos são determinados por causas multifatoriais. É consenso geral na comunidade científica que as causas da obesidade são múltiplas, pesando em sua formação uma série de concausas, tais como: 1 fatores genéticos, a dieta regularmente adotada, o estilo de vida sedentário e uma série de influências do meio em que se insere o indivíduo – como, por exemplo, nível sócio-econômico, hábitos alimentares da família, ambiente de aprendizado social, estrutura familiar e psicológica, dentre muitos outros elementos individuais. O ponto foi examinado pela Professora Dra. Silvia Cozzolino do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP em parecer específico sobre a Consulta Pública nº71/06 que resultou na Resolução RDC/ANVISA nº 24/10 - Dispõe sobre a oferta, propaganda, publicidade, informação e outras práticas correlatas, cujo objetivo seja a divulgação e a promoção comercial de alimentos considerados com quantidades elevadas de açúcar, de gordura saturada, de gordura trans, de sódio, e de bebidas com baixo teor nutricional, nos termos desta Resolução (vide link: http://www.abia.org.br/ftp/Parecer_Silvia_Cozzolino.pdf), onde esclareceu que não é próprio associar o consumo excessivo de substâncias a determinados alimentos: qualquer avaliação nesse sentido dependerá do consumo diário total de cada indivíduo e de suas necessidades, que igualmente variam ao longo da vida e de acordo com características pessoais. A latente falta da abordagem sobre a equação consumo x gasto energético desatende inclusive, a diretriz 4.2 “Promoção da Alimentação Adequada e Saudável” da Política que norteia esse Guia, que contemplou “a melhora da qualidade de vida da população, por meio de ações intersetoriais, voltadas ao coletivo, aos indivíduos e aos ambientes (físico, social, político, econômico e cultural), de caráter amplo e que possam responder às necessidades de saúde da população”, recomendando que: “A responsabilidade das equipes de saúde com relação à PAAS deve transcender os limites das unidades de saúde, inserindo-se nos demais equipamentos sociais como espaços comunitários de atividade física e práticas corporais, escolas e creches, associações comunitárias, redes de assistência social e ambientes de trabalho, entre outros.” Também é inadequada a associação de prejuízos relativos a obesidade exclusivamente ao consumo de produtos prontos para o consumo. O favorecimento da obesidade se dá em razão de dieta inadequada. Não existe alimento bom ou ruim, existem sim dietas adequadas ou não, levando-se em conta a quantidade de ingestão de cada alimento (processado ou não). Ou seja, não se pode avaliar um produto isoladamente, sem inseri-lo no contexto da alimentação diária. O ser humano necessita dos nutrientes em quantidade e qualidade adequadas para atender todas as suas necessidades nutricionais. 2 Um dos pontos fundamentais, para o entendimento da ciência da Nutrição, é a aplicação dos conceitos científicos na prática da escolha dos alimentos, para compor uma alimentação adequada. Além da seleção do alimento, deve-se considerar a quantidade a ser ingerida, de modo a suprir o organismo de todos os nutrientes que ele precisa para funcionar adequadamente. Ter uma alimentação saudável significa comer com moderação todos os tipos de alimentos. Nenhum alimento ou grupo de alimentos é mais importante que o outro. Cada alimento tem sua contribuição dentro da alimentação diária. Bem por isso, a ABIA acredita e defende a promoção da educação alimentar e o incentivo ao combate do sedentarismo. E nesse sentido, ressentiu-se do Guia pela ausência de esclarecimento à população das informações nutricionais, que permitam a avaliação da porção adequada a ser consumida, disponíveis nos rótulos dos alimentos à venda no Brasil (inclusive a do valor energético), estabelecidas pela ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Não é produto processado que causa a obesidade, mas a desinformação acerca de uma alimentação equilibrada associada à falta de atividade física. Uma correta política pública que visa promover uma alimentação adequada não pode se furtar de promover a educação e hábitos saudáveis. A educação alimentar, juntamente com hábitos saudáveis de vida constitui ferramenta indispensável do poder público na preservação da saúde e redução dos riscos de doenças da coletividade. O aforismo, hoje enunciado no início do artigo 196 da Constituição Federal: “a saúde é direito de todos e dever do Estado”, representa consenso da sociedade e sua implementação depende de políticas corretas direcionadas às causas mediatas e imediatas, que dão origem aos problemas, com soluções reais e não diversionistas, protelatórias ou dissociadas da realidade. A obesidade origina-se no hábito incorreto de alimentar-se, aliado, no mais das vezes, a uma vida sedentária, distante de exercícios físicos, que até algumas décadas atrás o homem obrigava-se como resultado de sua interação com o meio ambiente. Hoje, a tecnologia e maior disponibilidade de alimentos, propiciam menor interação física e maior possibilidade de consumo, sem a percepção clara das consequências desse novo estilo de vida. Somente a educação e o aculturamento do povo sobre hábitos corretos, corrigirá agravos à saúde pública e respectivos prejuízos a toda coletividade. 3 A educação é a chave para que as atividades humanas sejam corretamente desenvolvidas. No momento em que a tecnologia propicia a sobrevivência humana com menor dispêndio de energia física e a abundância oferece maior quantidade de alimentos, o homem deve ser educado no uso desses benefícios para que os mesmos não se convertam em males. A sociedade deve aprender a conviver com suas carências e com suas abundâncias. Entretanto, é espantosa a solução contemplada no Guia em comento, que, além da ausência de orientações à população para a compreensão das informações no rótulo e conhecimento das porções contempladas em sua edição anterior, perfila mudanças sociais e culturais (com retorno as condições já inviabilizadas de consumo e estilo de vida), ao invés de fornecer instrumentos adequados ao atual status da população, ajudando-a no aprendizado desta nova situação de abundância de consumo e carência de tempo. A educação alimentar alinhada com hábitos saudáveis de vida, especialmente exercícios físicos adequados, propiciam saúde, com evidente diminuição do risco de doenças. O importante é que a população saiba disso através de campanhas educativas bem construídas e direcionadas. Ao arrepio desta importante investida em educação a que melhor se prestaria o Guia, lamentavelmente nos deparamos com um conteúdo ideológico e pouco prático em descompasso com o estágio social e cultural da população brasileira, sem utilidade para o público alvo, divorciado do necessário dinamismo e flexibilidade do mundo atual. Mas não é só. O Guia proposto ignora que o processamento industrial de alimentos é crucial para o abastecimento da população brasileira e para a economia do país. Como o próprio Guia descreve, o processamento industrial é importante para aumentar a duração de alimentos e torná-los mais agradáveis ao paladar, além de aumentar seu alcance com sua produção em massa. Se as dietas restringirem-se aos alimentos minimamente processados, de acordo com a classificação adotada no Guia, evitando-se os produtos processados e ultraprocessados, conforme recomendado, o abastecimento da alimentação da população brasileira seria gravemente afetada. Mais surpreendente ainda é a apresentação de classificação inexistente e sem respaldo científico de produto pronto para consumo e produto ultraprocessado dissociado do conceito de alimento. A definição adotada pela proposta do Guia desconsidera a legislação nacional que trata o produto alimentício como alimento. 4 Como nos apontamentos disponibilizados em links pela ABIA para os demais itens da proposta deste Guia Alimentar se verá, a começar pelo Decreto-Lei nº 986/69 - Institui normas básicas sobre alimentos (em vigor), o ordenamento jurídico caracteriza os alimentos como sendo aquilo que for hábil a fornecer ao organismo humano, os elementos normais a sua formação, manutenção e desenvolvimento, distinguindo-o apenas quanto a sua forma de apresentação e consumo, como se verifica no artigo 2º, incisos I, III e X do referido DecretoLei, abaixo transcritos: Art 2º Para os efeitos dêste Decreto-lei considera-se: I - Alimento: tôda substância ou mistura de substâncias, no estado sólido, líquido, pastoso ou qualquer outra forma adequada, destinadas a fornecer ao organismo humano os elementos normais à sua formação, manutenção e desenvolvimento; (...) III - Alimento in natura: todo alimento de origem vegetal ou animal, para cujo consumo imediato se exija apenas, a remoção da parte não comestível e os tratamentos indicados para a sua perfeita higienização e conservação; (...) X - Produto alimentício: todo alimento derivado de matéria-prima alimentar ou de alimento in natura, ou não, de outras substâncias permitidas, obtido por processo tecnológico adequado; Não se vê também na Política orientativa deste Guia, a classificação por ele adotada. Ainda que o alimento industrializado não estivesse contemplado na legislação pátria como alimento – que não é o caso – a classificação apresentada no Guia colocado em consulta pública demanda respaldo científico. Desconhece-se o fundamento científico que fez os autores do Guia lançarem mão da classificação proposta e as respectivas definições. Incoerente ver-se que, segundo as definições adotadas pelo Guia, algumas indústrias de alimentos produzem alimentos minimamente processados, quando, por exemplo há a moagem, a pasteurização. Outras indústrias de alimentos fabricam produtos prontos para oconsumo processados – quando adicionam sal ou açúcar para torna-los duráveis, palatáveis e atraentes, sendo esses produtos derivados de alimentos e reconhecidos como versões dos alimentos originais-, ou produtos prontos para consumo ultraprocessados - quando se originarem de formulações com várias substâncias derivadas de alimentos, ressaltado aqui também a sua durabilidade. 5 Ora, a indústria de cosméticos e de produtos de limpeza ou ainda de eletrônicos também produzem produtos prontos para o consumo. Na maioria deles, a industrialização tem o condão de dar durabilidade aos produtos. Daí ser incompreensível porquê o produto pronto para consumo produzido a partir de um alimento, deixou de ser um alimento? Há uma justificativa científica para tanto? Não é possível ainda a compreensão por esta Entidade de orientação contemplada pelo Guia em consulta que restringe a alimentação diária a três refeições, contrariamente as recomendações para obtenção de dieta equilibrada predominante ou senão unânimes. Além disso, as recomendações de consumo de água também divergem das indicações cientificas, como bem detalhado nos demais documentos apresentados pela ABIA através de links. Não se pode ainda deixar de ressaltar que as orientações da proposta de Guia estão absolutamente desassociadas da legislação sanitária em vigor que regulamenta os alimentos industrializados, especialmente no que diz respeito aos aditivos e ingredientes. A comparação com o conteúdo de outros Guias também nos leva à constatação de que ao conteúdo desta proposta faltou: - Indicação de Porções dos Grupos Alimentares O Guia Alimentar proposto afirma: “Finalmente, o leitor desse guia notará que não há destaque nas refeições apresentadas para a quantidade absoluta de cada alimento ou para a quantidade total de calorias das refeições. Esta omissão é proposital uma vez que as necessidades nutricionais das pessoas, particularmente em energia, são muito variáveis, dependendo, como já dissemos, de sua idade, sexo, tamanho (peso, altura) e nível de atividade física.” (Pág. 37). As porções existem para direcionar a população, independente da necessidade energética, para que esta compreenda a quantidade de alimentos de cada grupo alimentar que deve consumir de modo a atingir as recomendações diárias de ingestão de macro e micronutrientes. O Guia Alimentar de 2006 apresentava em detalhes essas classificações e o Guia Atual não torna prática a identificação dessa informação, fazendo com que a população recorra a outras orientações não tão seguras quanto as que poderiam ser apresentadas no Guia. 6 A literatura evidencia as recomendações atuais com base em grupos alimentares, quantidades de porções desses grupos alimentares e quais seriam as quantidades de alimentos que correspondem às quantidades dessas porções. Desta forma, sugere-se fortalecer a publicação anterior do Guia Alimentar (versão de 2006) e esclarecer as informações acerca das porções de alimentos. Guia Alimentar para a População Brasileira, 2006: “As recomendações deste guia são baseadas na noção de alimentos e não de nutrientes. Atualmente, os cientistas, profissionais de saúde pública e formuladores de políticas em alimentação e nutrição estimulam o desenvolvimento de recomendações para uma alimentação saudável baseada em alimentos e não em nutrientes (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1998), mesmo porque os alimentos são compostos por nutrientes; mas, para definir e recomendar uma alimentação saudável, os parâmetros nutricionais são considerados e, com bases neles, são estabelecidas as orientações para consumo dos alimentos organizados em grupos, de acordo com seus nutrientes principais.” (Pág. 149). “O tamanho em que os alimentos são oferecidos aumentou, ou seja, as porções oferecidas ficaram maiores. Neste guia, para garantir que as pessoas saibam a quantidade correta de alimento a ser consumida, de acordo com o grupo do alimento, adotaremos o conceito de porção de alimento. “Porção” é aqui utilizado como “a quantidade de alimento em sua forma usual de consumo expressa em medida caseira, unidade ou forma de consumo (fatia, xícara, unidade, colher de sopa, etc.)" (PHILIPPI, 2003), considerando também a “quantidade média do alimento que deve ser usualmente consumida por pessoas sadias, para compor uma alimentação saudável” (BRASIL, 2003b). Essas duas definições têm o objetivo de controlar os casos em que o padrão usual de consumo origina porções de alimentos que não permitem alcançar ou que extrapolem as quantidades que poderiam ser saudáveis no conjunto da alimentação. Porções de diferentes alimentos estão apresentadas no Anexo C deste guia.” (Pág. 156). Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição. Guia alimentar para a população brasileira: promovendo a alimentação saudável / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. Dietary Guidelines for Americans, 2010: “The Institute of Medicine has established ranges for the percentage of calories in the diet that should come from carbohydrate, protein, and fat. These Acceptable Macronutrient Distribution Ranges (AMDR) take into account both chronic disease risk reduction and intake of essential nutrientes. To manage body weight, Americans should consume a diet that has an appropriate total number of calories and that is within the AMDR. Strong evidence shows that there is no 7 optimal proportion of macronutrients that can facilitate weight loss or assist with maintaining weight loss.” (Pág. 15). U.S. Department of Agriculture and U.S. Department of Health and Human Services. Dietary Guidelines for Americans, 2010. 7th Edition, Washington, DC: U.S. Government Printing Office, December 2010. Pirâmide alimentar adaptada: guia para escolha dos alimentos, 1999: “Os guias alimentares são instrumentos de orientação e informação à população visando promover saúde e hábitos alimentares saudáveis. Os guias devem ser representados por grupos de alimentos, e são baseados na variedade de informações incluindo a relação existente entre os alimentos e a saúde dos indivíduos. Com um guia alimentar adequado à população os objetivos propostos podem ser alcançados (Spiller, 1993).” (Pág. 67). PHILIPPI, Sonia Tucunduva et al . Pirâmide alimentar adaptada: guia para escolha dos alimentos. Rev. Nutr., Campinas , v. 12, n. 1, p.65-80, Apr. 1999. Outras referências: SICHIERI, Rosely et al . Recomendações de alimentação e nutrição saudável para a população brasileira. Arq Bras Endocrinol Metab, São Paulo, v. 44, n. 3, June 2000. National Academy of Sciences. Institute of Medicine. Food and Nutrition Board. Dietary Reference Intakes The Essential Guide to Nutrient Requirements. DRI Reports. Carne Vermelha e Câncer de Intestino O Guia alimentar proposto destaca: “Além disso, há evidências convincentes de que o consumo excessivo de carnes vermelhas pode aumentar o risco de câncer de intestino.” (Pág. 54). Ainda, o artigo original do qual o texto acima é citado, faz referência à quantidade de carne ideal que um indivíduo adulto deve consumir para poder prevenir o surgimento de câncer de intestino. “The evidence that red meats and processed meats are a cause of colorectal cancer is convincing.” (Pág. 116). “PUBLIC HEALTH GOAL - Population average consumption of red meat to be no more than 300g (11 oz) a week, very little if any of which to be processed. PERSONAL RECOMMENDATION People who eat red meat to consume less than 500g (18 oz) a week, very little if any to be processed.” (Pág. 382). 8 Esse dado, portanto, evidencia a necessidade de explicitar a quantidade de alimento de que cada grupo alimentar deva ser consumido de modo a prevenir o surgimento de doenças, como o câncer, e ainda promover a saúde. World Cancer Research Fund/American Institute for Cancer Research. Food, Nutrition, Physical Activity, and the Prevention of Cancer: a Global Perspective. Washington DC: AICR, 2007. Disponível em: <http://www.dietandcancerreport.org/cancer_resource_center/downloads/Second_Expert_Repor t_full.pdf> . Acesso em 06 fev. 2014. - Construção de Hábito Alimentar O Guia Alimentar proposto não destaca a importância do Aleitamento Materno na saúde infantil. Além disso, o mesmo não sugere como deve ser a alimentação na infância, alimentação escolar, nem como deve ser evoluído o hábito alimentar até a idade adulta e velhice. Consideramos que tais informações devam constar no Guia Alimentar para População Brasileira, mesmo que citando a leitura de outros manuais lançados pelo Ministério da Saúde. O Ministério da Saúde, através da PNAN, escrita em 2012, destaca diversos tópicos sobre a construção do hábito alimentar. O texto destaca a importância do aleitamento materno e da transição entre lactação e a alimentação da regular da família. O Guia Alimentar deveria abordar esses tópicos de modo a promover a alimentação adequada já na primeira infância. Política Nacional de Alimentação e Nutrição, 2012: “O aleitamento materno, que deve ser a primeira prática alimentar dos indivíduos, é necessário para a garantia da saúde e do desenvolvimento adequado das crianças.” (Pág. 12). “A transição do aleitamento materno para os alimentos consumidos pela família é o período denominado como alimentação complementar, que deve ser iniciada aos seis meses de idade e concluída aos 24 meses. A introdução de alimentos deve ser feita em tempo oportuno, em quantidade e qualidade adequadas a cada fase do desenvolvimento infantil. Esse é o momento em que os primeiros hábitos são adquiridos e formados e a correta inserção dos alimentos tem o papel de promoção a saúde e hábitos saudáveis, além de proteger a criança de deficiências de micronutrientes e doenças crônicas na idade adulta.” (Pág. 13). Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília, Ministério da Saúde, 2012. 9 A prática do aleitamento materno nas capitais brasileiras e Distrito Federal, 2010: “O aleitamento materno (AM) é a estratégia que mais previne mortes infantis, alem de promover a saúde física, mental e psíquica da criança. (...) A promoção do AM, portanto, deve ser incluída entre as ações prioritárias da saúde.” (Pág. 318). VENANCIO, Sonia I. et al . A prática do aleitamento materno nas capitais brasileiras e Distrito Federal: situação atual e avanços. J. Pediatr. (Rio J.), Porto Alegre, v. 86, n. 4, p.317-324, Aug. 2010. Individual and contextual determinants of exclusive breast-feeding in São Paulo, Brazil: a multilevel analysis, 2006: Venancio destaca que à minoria das crianças recebem amamentação exclusiva até os 6 meses de idade conforme orientação da WHO, mesmo sendo esta a melhor intervenção de saúde existente. Desta forma, como ação prioritária de saúde, deve ser orientada e estimulada no Guia Alimentar, documento central acerca de alimentação e nutrição no país. “Promoting breast-feeding is one of the most advantageous health interventions available. (...) only a minority of children receive breast milk exclusively during the first 6 months of life, as recommended by the World Health Organization (WHO).” (Pág. 40). VENANCIO S. I., MONTEIRO C. Individual and contextual determinants of exclusive breastfeeding in São Paulo, Brazil: a multilevel analysis. Public Health Nutrition (Wallingford), v.9, p.40-46, 2006. Guia Alimentar para a População Brasileira, 2006: O próprio Guia Alimentar em vigor desde 2006, na página 124 e ao longo do documento, destacava a importância da amamentação infantil no desenvolvimento de hábitos alimentares saudáveis. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Guia alimentar para a população brasileira: promovendo a alimentação saudável / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. – Brasília: Ministério da Saúde, 2005. Influência do apoio à amamentação nas tendências das taxas de aleitamento materno na cidade de Pelotas (RS), 1982-2004, 2008: “Tendo em vista a importância da amamentação na redução da morbimortalidade infantil, a promoção dessa prática deveria fazer parte das prioridades de saúde de uma nação, principalmente daquelas cujos índices de AM estão aquém do recomendado, como é o caso do Brasil.” (Pág. 563). Albernaz E, Araújo CL, Tomasi E, Mintem G, Giugliani E, Matijasevich A, et al. Influence of breastfeeding support on the tendencies of breastfeeding rates in the city of Pelotas (RS), Brazil, from 1982 to 2004. J Pediatr (Rio J). 2008;84(6):560-564. 10 - Rotulagem de Alimentos Em nenhum momento do Guia Alimentar proposto, é destacada a importância da leitura e interpretação de rótulos alimentares, tampouco como esta deve ser feita. Destacamos a importância dessa ferramenta de educação nutricional de modo a possibilitar o conhecimento do que está contido em um determinado produto alimentício e assim, promover as escolhas alimentares mais saudáveis. Rotulagem Nutricional Obrigatória – Manual de Orientação aos Consumidores – Educação para o Consumo Saudável, 2001: O Ministério da Saúde em 2001 cria e veicula um documento referente a orientação quanto leitura e interpretação dos rótulos alimentares. Desta forma, o Ministério explicita a importância da interpretação dos rótulos alimentares nas escolhas alimentares mais adequadas. O Guia Alimentar para a População Brasileira deveria seguir as orientações iniciais propostas pelo Manual de Rotulagem e deve orientar a população quanto à leitura dos rótulos ou ao menos indicar a leitura do Manual proposto em 2001. “Facilitar a escolha de alimentos saudáveis a partir das informações contidas nos rótulos de alimentos foi umas das estratégias desenhadas pela Política Nacional de Alimentação para a redução dos índices de sobrepeso, obesidade e doenças crônico degenerativas associadas aos hábitos alimentares da população.” (Pág. 05). Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Gerência Geral de Alimentos. Rotulagem Nutricional Obrigatória – Manual de Orientação aos Consumidores – Educação para o Consumo Saudável. Brasília, Ministério da Saúde, 2001. Utilização da informação nutricional de rótulos por consumidores de Natal, Brasil, 2011: Um estudo publicado na Revista Panamericana de Saúde Pública em 2011 destaca ainda que apesar de considerarem a informação nutricional dos rótulos importante, as pessoas em sua grande maioria, não sabem interpretar a declaração nutricional, sendo importante que o Guia Alimentar oriente quanto essa interpretação de modo a favorecer a Segurança Alimentar e Nutricional. “A educação alimentar e nutricional está vinculada à produção de informações que possam subsidiar a tomada de decisões por parte dos indivíduos, dando a eles o direito de optar por alimentos mais saudáveis (2). A atual Política Nacional de Alimentação e Nutrição enfatiza a necessidade de desenvolver um processo de educação permanente acerca das questões concernentes à alimentação e à nutrição, preconizando que deverão ser buscados consensos 11 sobre métodos, conteúdos e técnicas educativas, sendo considerados os diferentes espaços geográficos, econômicos e culturais (3).” (Pág. 337). “Ao serem indagados sobre a importância da declaração nutricional, 96,8% dos entrevistados responderam ser importante e muito importante. No entanto, 46,6% dos consumidores referiram compreendê-la apenas parcialmente, enquanto que somente 3,8% declararam que compreendiam totalmente a declaração nutricional.” (Pág. 339). Souza SMFC, Lima KC, Miranda HF, Cavalcanti FID. Utilização da informação nutricional de rótulos por consumidores de Natal, Brasil. Rev Panam Salud Publica. 2011; 29(5):337–43. Consulta aos rótulos de alimentos e bebidas por frequentadores de supermercados em Brasília, Brasil, 2005: O estudo de Monteiro (2005) destaca a importância da rotulagem como processo educativo nas escolhas alimentares mais saudáveis. O estudo ainda aponta a real necessidade de saber ler e interpretar os rótulos por conta de doenças que os consumidores venham a ter: “A rotulagem nutricional é essencial para permitir aos consumidores escolhas alimentares mais saudáveis.” (Pág. 173). “Um entrevistado mencionou o uso da informação nutricional devido ao seu estado patológico específico: “Eu sou diabético, eu preciso disso...” (Pág. 174). “A rotulagem nutricional, como qualquer outra fonte de informação, faz parte de um processo educativo, não sendo um fim em si mesma, devendo ser trabalhada de modo a servir como instrumento para a educação em saúde. Por sua vez, a intenção da educação é a mudança da condição humana do indivíduo que adquire o conhecimento (15). Para isso, é importante que o saber faça sentido na realidade do indivíduo, e que o conhecimento possa ser adaptado à sua bagagem sociocultural, visando à melhoria das condições de vida e de saúde do mesmo.” (Pág. 175). MONTEIRO, Renata Alves; COUTINHO, Janine Giuberti; RECINE, Elisabetta. Consulta aos rótulos de alimentos e bebidas por freqüentadores de supermercados em Brasília, Brasil. Rev Panam Salud Publica, Washington , v. 18, n. 3, Sept. 2005 . Avaliação do hábito de leitura e entendimento dos rótulos dos alimentos: um estudo em um supermercado na cidade de santa fé do sul-São Paulo, 2013: Esse estudo recente também destaca que falta esclarecimento acerca da leitura e interpretação de rótulos alimentares, ainda que considerem uma importante ferramenta na educação nutricional para melhores escolhas alimentares. “O rótulo dos alimentos é uma forma de comunicação entre os produtos e os consumidores que permitem a estes selecionar melhor a sua dieta do ponto de vista nutricional e que indiquem a forma correta de conservação e preparo do produto. (Pág. 1) (...) No estudo feito por Souza et 12 al. (2005), 48% não leem o rótulo dos alimentos por não ter informação ou compreensão sobre o assunto (...).” (Pág. 6). MACHADO C.B., NOGUEIRA S.E., BRIANCINI T.P., TOBAL T.M.. Avaliação do hábito de leitura e entendimento dos rótulos dos alimentos: um estudo em um supermercado na cidade de santa fé do sul-São Paulo. Revista Funec Científica – Nutrição, Santa Fé do Sul (SP), v. 1, n. 1, jul./dez. 2013. - Noções de Composição Corporal Saber se o peso está dentro dos padrões aceitáveis é uma premissa para a alimentação adequada. O Guia Alimentar de Bolso do Ministério da Saúde (2008) ensina de forma prática e, com exemplo, como o cálculo deve ser feito. É imprescindível que o Guia Alimentar atualizado contemple essa informação de modo a proporcionar melhor conhecimento sobre o próprio corpo e permitir a auto avaliação de seu peso baseado na altura. “Se você tem entre 20 e 60 anos, veja no quadro abaixo o seu IMC (Índice de Massa Corporal), que mostra se o peso está adequado para a altura. Para calcular, divida o seu peso, em quilogramas, pela sua altura, em metros, elevada ao quadrado. Crianças, adolescentes e idosos têm IMC diferentes. Peça orientação de um profissional de saúde sobre o peso saudável dessas pessoas.” (Pág. 25). Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Guia alimentar de Bolso para a População Brasileira: promovendo a alimentação saudável / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. – Brasília: Ministério da Saúde, 2008. - Recomendações sobre Alimentação Saudável O Guia Alimentar em vigor desde 2006, enfatiza as premissas abaixo para o sistema alimentar. Assim, é importante que em sua atualização seja contemplado esse conceito de modo a proporcionar melhores recomendações de como compor uma dieta equilibrada para manutenção da saúde: “...é pressuposto da promoção da alimentação saudável ampliar e fomentar a autonomia decisória dos indivíduos e grupos, por meio do acesso à informação para a escolha e adoção de práticas alimentares (e de vida) saudáveis.” (Pág. 23) “As proibições ou limitações impostas devem ser evitadas, a não ser que façam parte de orientações individualizadas e particularizadas do aconselhamento nutricional de pessoas portadoras de doenças ou distúrbios nutricionais específicos, devidamente fundamentadas e 13 esclarecidas. Por outro lado, supervalorizar ou mistificar determinados alimentos em função de suas características nutricionais ou funcionais também não deve constituir a prática da promoção da alimentação saudável” (Pág.23) “De acordo com os princípios de uma alimentação saudável, todos os grupos de alimentos devem compor a dieta diária. A alimentação saudável deve fornecer água, carboidratos, proteínas, lipídios, vitaminas, fibras e minerais, os quais são insubstituíveis e indispensáveis ao bom funcionamento do organismo. A diversidade dietética que fundamenta o conceito de alimentação saudável pressupõe que nenhum alimento específico ou grupo deles isoladamente, é suficiente para fornecer todos os nutrientes necessários a uma boa nutrição e consequente manutenção da saúde.” (Pág.23). “A ciência comprova aquilo que ao longo do tempo a sabedoria popular e alguns estudiosos, há séculos, apregoavam: a alimentação saudável é a base para a saúde. A natureza e a qualidade daquilo que se come e se bebe é de importância fundamental para a saúde e para as possibilidades de se desfrutar todas as fases da vida de forma produtiva e ativa, longa e saudável. Salienta-se ainda que a prática de atividade física é igualmente estratégica para redução de peso. Não é possível dissociar o consumo alimentar do gasto energético.”(Pág.23) - Diretrizes sobre Atividade Física A estratégia Global da OMS recomenda que os indivíduos adotem níveis adequados de atividade física durante toda a vida (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE, 2004). Porém, não observamos no Guia Alimentar proposto, as diretrizes anteriormente constantes da versão anterior (2006) quanto a importância desta ferramenta, entendendo-a como elemento potencializador dos resultados esperados pela adoção de práticas alimentares adequadas e, portanto, modos de vida saudáveis. “A atividade física adotada ao longo do curso da vida contribui para a prevenção e para a reversão de limitações funcionais. Isso é particularmente importante ao considerar-se o aumento da expectativa de vida e, conseqüentemente, o crescimento da população idosa no Brasil. A maior expectativa de vida da população, se não acompanhada de investimento na promoção da saúde dos indivíduos, pode resultar em aumento de anos vividos com doenças crônicas não transmissíveis e incapacidades, comprometendo a qualidade de vida das pessoas. Estudos epidemiológicos prospectivos demonstram que tanto um estilo de vida ativo como um condicionamento aeróbico moderado estão associados de forma independente à diminuição da incidência de DCNT e da mortalidade geral e por doenças cardiovasculares” (Pág. 24) 14 “...a promoção de modos de vida saudáveis - em especial conjugando e articulando alimentação saudável e atividade física - deve ser enfatizada ao longo do curso da vida: da infância à velhice, permitindo uma vida longa, produtiva e saudável.” (Pág.31) “A Diretriz Especial 1 trata da atividade física regular ao longo da vida, que, aliada à alimentação saudável, resulta em um impacto positivo e protetor à saúde. Embora este seja um guia alimentar, as evidências científicas mostram, inequivocamente, que a alimentação saudável e a prática de atividade física são importantes e indissociáveis para a promoção de modos de vida saudáveis e para a qualidade de vida, justificando-se esta recomendação no guia alimentar.” (Pág 37; 91-94) Encerram os nossos apontamentos conceituais a constatação da fragilidade, e em algumas situações a inexistência de fundamentação científica para as afirmações e recomendações inseridas na proposta, com bibliografia manifestamente deficitária. 15