1. Os lipossomas

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1.Os lipossomas
Nereide Estela Santos Magalhães
Em meados da década de 1960, no decorrer de pesquisas sobre os efeitos dos
íons em membranas sintéticas, os cientistas notaram que diversos lipídios se
organizavam em estruturas em forma de vesícula quando dispersos em água.
Essas estruturas microscópicas foram denominadas lipossomas, que significa
corpos lipídicos (do grego soma=corpo e lipo=lipídios). Os lipossomas são
formados de camadas concêntricas de gorduras e encerram internamente um
compartimento aquoso.
O comportamento adequado de um medicamento no organismo se relaciona
à forma como é administrado. Atualmente, o principal objetivo da pesquisa
tecnológica farmacêutica é o desenvolvimento de novas formas de administração
de medicamentos que possam melhorar sua eficácia e reduzir seus efeitos
tóxicos. Nas últimas décadas, numerosos estudos demonstraram que a
distribuição de um fármaco pode ser modificada pelo uso associado de
substâncias "carreadoras", colóides administrados por via oral, tópica ou
parenteral que controlam a liberação do fármaco ou de sua substância ativa no
organismo, produzindo ação rápida ou prolongada. O uso de lipossomas para
controlar a liberação dos fármacos apresenta muitas vantagens com relação às
formas clássicas de administração de medicamentos. Eles proporcionam a
liberação do fármaco no lugar desejado (órgão, tecido ou célula), podem
melhorar significativamente a eficácia terapêutica do medicamento, como
também proporcionar uma redução na quantidade de droga a ser administrada
para a obtenção da resposta biológica, eliminando ou minimizando os efeitos
colaterais que freqüentemente acompanham a terapêutica convencional. Os
lipossomas são atóxicos, biodegradáveis e não provocam a formação de
anticorpos. São biologicamente compatíveis, ou seja, quimicamente similares às
células que normalmente circulam no sangue. A encapsulação do fármaco em
lipossomas assegura a proteção de certas substâncias ativas que sofrem
degradação no organismo (protetores gástricos para fármacos lábeis). Os
lipossomas têm uma tendência natural a se ligarem a determinadas células ou
tecidos, e por isso podem ser direcionados ao local onde se pretende que o
medicamento associado a ele atue. Os lipossomas podem ser liofilizados, ou
seja, desidratados, preservando sua integridade ao serem reidratados antes do
uso.
Os lipossomas tornaram-se conhecidos do grande público através da
propaganda maravilhosa e miraculosa de produtos dermatológicos e cosméticos,
tais como hidratantes, anti-radicais livres, vitaminas A e E, retinóides, protetores
solares, produtos pós-barba, promotores de crescimento capilar e substâncias
rejuvenescedoras. Nas últimas décadas tem-se presenciado uma verdadeira
revolução no emprego de lipossomas nas áreas de farmacologia, biotecnologia e
medicina, conduzindo a produtos de uso clínico e veterinário, além de outras
aplicações incluindo produtos alimentícios, suavizantes para roupas, toners para
fotocopiadoras, reprodução de plantas com novas propriedades através do
transporte de material genético, entre inúmeras novas aplicações.
Recentemente, pesquisadores do Instituto Pasteur atribuíram o envelhecimento
ao acúmulo de colesterol nas células. Os lipossomas serviriam, portanto, para o
tratamento de rejuvenescimento retirando das células o excesso de colesterol.
Os lipossomas têm sido utilizados na administração de antibióticos em
infecções provocadas por fungos; na produção de antivenenos; em doenças
virais (como herpes); na fabricação de vacinas para uso veterinário; nas
infecções intracelulares por protozoários (leishmânias, tripanossomas,
toxoplasmas etc.) e bactérias; na administração de hormônios esteróides
(testosterona, estradiol etc.); na administração de agentes antineoplásicos
(tratamento do câncer de fígado); em produtos oftálmicos; como carreadores de
enzimas e no transporte de material genético.
Os lipossomas fusogênicos, que se fundem com a membrana celular, liberam
seu conteúdo diretamente no interior das células. Esses lipossomas são ideais
para veicularem ADN, ARN, proteínas e antibióticos. São, portanto, de grande
interesse no tratamento de infecções por parasitas e bactérias e na terapia
gênica.
A enorme versatilidade dos lipossomas no transporte efetivo de fármacos e
princípios ativos tem permitido a encapsulação de uma grande variedade de
moléculas medicamentosas, de macromoléculas tais como proteínas, peptídios,
ADN etc. A indústria farmacêutica, incluindo companhias como L'Oréal, Ciba
Geigy, Squibb, Christian Dior, Upjohn, Liposome Technology Inc. (USA,CA),
Liposome Company (USA,NJ), Pentapharm (Suíça), Gessy Lever, Lancôme,
entre outras, tem desenvolvido sistematicamente aplicações envolvendo
lipossomas.
Atualmente estão disponíveis comercialmente lipossomas liofilizados
contendo anfotericina B, um potente antifúngico para o tratamento de infecções
generalizadas. A encapsulação da anfotericina B nos lipossomas diminui
consideravelmente sua toxicidade. Anticancerígenos como a doxorrubina e
tensoativos pulmonares são outros exemplos de fármacos encapsulados em
lipossomas já disponíveis no mercado.
Nereide Estela Santos Magalhães é doutora em ciências farmacêuticas
pela Universidade de Paris Sul XI, 1991, e professora-adjunta do
Departamento de Bioquímica da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE).
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