Epidemia adormecida 1989 Só neste ano foi identificado o vírus da hepatite C (VHC). Em Portugal há 100 a 150 mil pessoas infetadas. SANGUE As suspeitas de contágio com hepatite C só são confirmadas através de análise sanguínea. hepatite C tratamento a que preço? Só os doentes mais graves estão a ter acesso ao sofosbuvir, o novo medicamento para tratar a hepatite C, elevando a taxa de cura para perto dos 90 por cento. O presidente do Infarmed confirma à TESTE SAÚDE que o valor pedido pela Gilead Sciences por cada tratamento é incomportável para o SNS e que as negociações vão continuar S ão 48 mil euros. Foi esta a primeira proposta da Gilead Sciences para o preço a cobrar a Portugal por cada tratamento para a hepatite C com sofosbuvir. Este antivírico de ação direta apresenta dados de estudos clínicos bastante promissores no tratamento da doença, quando combinado com outros medicamentos, atingindo taxas de cura definitiva que rondam os 90 por cento. Mas o seu preço não permite ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) assegurar a sua comparticipação a todos os doentes que poderiam dele beneficiar. Em Portugal há mais de 12 mil doentes diagnosticados com a infeção pelo vírus da hepatite C (VHC) e estima-se que o número de pessoas infetadas no país seja superior a 100 mil. Este é um vírus recentemente conhecido (só foi identificado em 1989) e, por não causar sintomas nas primeiras fases de evolução da doença, dificilmente é detetado em toda a população infetada. Também por isso, o contágio pode ocorrer sem que o transmissor da doença se aperceba, já que nem o próprio poderá ter conhecimento de que está infetado, só detetando o vírus em análises sanguíneas específicas. A hepatite C é uma inflamação do fígado provocada pelo VHC. Quando crónica, pode conduzir à cirrose, insuficiência hepática e cancro. A novidade introduzida > 113 testesaúde 31 Prevenir > pelos antivíricos de ação direta foi a interferência no ciclo replicativo do vírus, anulando o seu efeito multiplicativo e, logo, impedindo o agravamento da doença. Em Portugal, o Infarmed reconhece a eficácia e até a relação custo-benefício do sofosbuvir, mas o Serviço Nacional de Saúde apenas o comparticipa em casos excecionais, em função do risco de mortalidade e de progressão da doença. Entre os doentes prioritários estão aqueles que padecem de cirrose hepática ou cujo funcionamento do fígado está claramente comprometido, prevendo-se que o tratamento contribua significativamente para a sobrevivência e para o aumento da sua qualidade de vida. Os pedidos de autorização excecional para utilização do sofosbuvir são da responsabilidade do médico que acompanha o doente e cabe ao Infarmed dar ou não luz verde ao processo. De acordo com este instituto, cada decisão demora, em média, 19 dias a ser "70 doentes já receberam tratamento com o sofosbuvir em Portugal" tomada, depois de esclarecidas todas as questões processuais junto do hospital que emitiu o pedido. Até ao final de 2014, 91% dos pedidos apresentados tinham sido aprovados. Desta forma, 70 doentes puderam usufruir do novo medicamento. Negociação conjunta Enquanto o Infarmed aguarda uma proposta da farmacêutica Gilead Sciences para o fornecimento do sofosbuvir a um preço comportável para o Serviço Nacional de Saúde, Portugal lidera e apoia todas as iniciativas conducentes a uma abordagem europeia do problema. "É importante deixar uma mensagem muito clara à indústria farmacêutica no que diz respeito ao necessário equilíbrio entre o acesso a medicamentos inovadores e a sustentabilidade dos sistemas de saúde, evidenciando a concertação e coordenação entre autoridades europeias", alega Eurico Castro Alves, presidente do Infarmed. Infeção nem sempre leva à doença 20 Pelo menos um em cada cinco infetados com o vírus da hepatite C fica curado de forma espontânea. Nos restantes, a evolução da doença é geralmente lenta, afetando progressivamente o funcionamento do fígado. CURA ESPONTÂNEA 5% 2 a 75 a 80 % INFEÇÃO AGUDA FIBROSE HEPÁTICA 10 a 20 % 1 a 5% por ano CIRROSE HEPÁTICA 20-40 anos CANCRO DO FÍGADO Não sendo a solução recomendada para todos os casos de hepatite C, o sofosbuvir é utilizado prioritariamente em doentes que dele efetivamente precisem e que estejam em situação mais grave. Assim, cada Estado-membro da União Europeia definiu os critérios de eleição de doentes que devem ser submetidos ao tratamento. Em França, cada tratamento com sofosbuvir custa atualmente 41 mil euros. Em Inglaterra, o preço sobe para os 44 mil euros. Mas, no Egito, o mesmo tratamento custa 800 euros. Um facto que levou os ministros da Saúde europeus a discutir, em setembro de 2014, uma proposta de compra conjunta do medicamento. Eurico Castro Alves explica que "a solução pressupõe que a compra do fármaco seja realizada por todos os Estados-membros e por um valor que tenha como referência o preço praticado no Egito". A ideia subjacente, detalha o presidente do Infarmed, é "indexar o valor do medicamento ao Produto Interno Bruto da zona euro, o que permitiria que o fármaco passasse a custar, sensivelmente, dez vezes menos do que o valor proposto atualmente". Taxa de cura é o maior benefício A introdução do sofosbuvir no tratamento para a hepatite C trouxe aos doentes alguns benefícios relevantes. Desde logo porque a terapêutica convencional, que deverá continuar a ser utilizada nas primeiras fases da doença, conjuga injeções e comprimidos e prolonga-se durante 48 semanas. No tipo de vírus mais frequente em Portugal, a sua taxa de eficácia ronda os 50% e há relatos de muitas reações adversas, que se assemelham aos sintomas da gripe, mas podem incluir também problemas de pele e até depressão. Já o novo medicamento, que pode ser combinado de várias formas com a terapêutica convencional, é tomado oralmente durante 12 a 24 semanas. Ao impedir a evolução da doença, o sofosbuvir está também a reduzir o risco de ocorrência de cancro do fígado, um dos cancros mais mortais. NÃO HÁ VACINA Evite o contágio A principal forma de transmissão do VHC ocorre quando sangue infetado entra na corrente sanguínea de outra pessoa. A melhor forma de prevenir o contágio passa pela eliminação de práticas pouco seguras que envolvam o contacto de sangue com sangue. Tome nota dos principais cuidados a manter. Transfusões Se vive ou vai viajar para países em vias de desenvolvimento, evite transfusões de sangue não urgentes que não tenham sido sujeitas a despiste do VHC. Dentista Rejeite procedimentos médicos ou dentários em estabelecimentos onde claramente faltem condições sanitárias. Tatuagens Certifique-se de que o desenho de tatuagens ou a aplicação de body piercings obedece a todas as normas de esterilização e de desinfeção do material utilizado. Seringas Não partilhe seringas. Esterilização Recuse sessões de acupuntura ou a aplicação de injeções com agulhas não esterilizadas ou com recurso a instrumentos que possam estar contaminados. Contágio sexual Use preservativo, prevenindo o contágio caso ocorram lesões. Higiene pessoal Não partilhe lâminas de barbear ou escovas de dentes. Modere o consumo de álcool Por razões que a ciência ainda desconhece, uma em cada cinco pessoas com doença hepática alcoólica crónica desenvolve o VHC, mesmo na ausência de outros fatores de risco. Ao contrário do que acontece com a hepatite B, não há ainda vacina que evite o contágio da hepatite C. A taxa de cura definitiva da nova terapêutica ronda os 90 por cento. Contágio através do sangue Nem todas as pessoas infetadas com o vírus da hepatite C desenvolvem a doença. Em cerca de 20 a 25% dos infetados, a cura ocorre de forma espontânea. Nos restantes, a evolução da doença é geralmente lenta, com alterações progressivas da função hepática. Alguns doentes, sobretudo com cirrose, podem necessitar mesmo de um transplante de fígado. Os casos mais graves podem evoluir para cancro. O contágio por VHC ocorre sobretudo por contacto sanguíneo. É mais frequente em pessoas que partilharam seringas, mas há também casos de doentes infetados através de equipamento médico mal esterilizado ou na sequência de transfusões de sangue (antes de 1992 não se fazia o despiste do vírus). As mulheres infetadas correm ainda risco, embora reduzido, de transmitir o vírus aos filhos durante a gravidez ou no parto. Em dois terços dos casos, a infeção aguda, na fase inicial da doença, não apresenta sintomas. À medida que a doença progride, podem surgir náuseas e dores abdominais, sobretudo do lado direito, icterícia (pele de cor amarelada), urina escura, febres baixas, fadiga e perturbações da digestão. Ainda durante o ano passado, o Ministério da Saúde anunciou o lançamento de um programa a cinco anos de combate à hepatite C em Portugal. Até 2019, o ministério estima gastar 100 milhões de euros e tratar anualmente 1200 doentes. Para este ano estão já alocados 20 milhões de euros para o combate à doença. 113 testesaúde 33