Departamento de Filosofia SCHOPENHAUER, KANT E VEDĀNTA Aluno: Daniel Rodrigues Braz Orientador: Pedro Duarte de Andrade Introdução A motivação principal desta pesquisa é a investigação, em Arthur Schopenhauer, da convergência de duas das influências que foram explicitamente determinantes na constituição de sua filosofia madura: o Idealismo Transcendental de Immanuel Kant [3] [4] e a doutrina esotérica das Upaniṣad’s, escrituras sagradas do povo Hindu que constituem as bases “filosóficas” dos Vedas. Partindo do reconhecimento, na Alemanha do século XIX na qual viveu Schopenhauer, de um contexto histórico no qual nasce um vasto campo de estudos sobre sânscrito e cultura indiana, tornou-se para nós matéria de interesse entender quais poderiam ter sido as reais influências que a Índia desbravada por este ainda insipiente empreendimento intelectual da academia teria exercido na releitura schopenhauriana das teses kantianas incorporadas a seu próprio sistema filosófico. Ora, de modo surpreendente, no prefácio à primeira edição de sua obra capital O Mundo Como Vontade e Representação, após exaltar a importância da leitura prévia de Platão e Kant – além de, se possível, dos Vedas – para o entendimento do conteúdo a ser ali exposto, Schopenhauer confessa: “Gostaria até de afirmar, caso não soe muito orgulhoso, que cada aforismo isolado e disperso que constitui as Upaniṣad pode ser deduzido como consequência do pensamento comunicado por mim, embora este, inversamente, não esteja lá de modo algum contido”. Não seria prudente, pois, ignorar o peso de tal alegação, endossada de diversos modos e em variados momentos ao longo de toda sua obra. Cumpre, assim, para nós, tentar responder a perguntas importantes que daí surgem, tais como: (i) até onde uma tal harmonia entre pensamentos é possível?; (ii) dadas todas as dificuldades hermenêuticas que se podem depreender dos ainda rarefeitos estudos e traduções existentes, no século XIX, das escrituras indianas, que Índia é esta com a qual Schopenhauer dialoga? Objetivos Este projeto visa à análise dos conceitos, em Schopenhauer, de “representação” e “Vontade” como os dois aspectos do mundo, considerando suas alegadas correspondências com os conceitos de “fenômeno” e “coisa-em-si” kantianos e tendo em vista mudanças em sua abordagem ocorridas, notavelmente, após o período de familiarização com pensamento oriental, especificamente aquele contido nas Upaniṣad’s. Metodologia Teremos como paradigma da discussão dois conceitos fundadores do Idealismo Transcendental de Kant [1] [2] – fenômeno (Erscheinnung) e coisa-em-si (Ding an Sich) – e seu desenvolvimento correspondente em Schopenhauer – Representação (Vorstellung) e Vontade (Wille) [3]. Investigaremos, em seguida, em que medida o acolhimento dos conceitos vedantinos de mayā (“ilusão”) e Brahman (“Absoluto”) por Schopenhauer teria sido responsável por algumas rupturas em sua leitura kantiana de mundo desde 1814 [4]. Como ponte, aproveitaremos de seu discípulo Dr. Paul Deussen [5] – como meio para descobrirmos até onde poderia chegar a harmonia entre essas duas tradições indicada com entusiasmo por Schopenhauer em sua obra –, as articulações arrojadas que este faz entre e Vedānta e Idealismo. Contudo, de forma a não explorarmos o tema a partir de um só lado, estudos tradicionais das Upaniṣads e de outros textos de Vedānta (dentro da linha advaita fundada por Śri Śaṇkarācārya) [6] [7], e também da língua sânscrita, também nos servirão de critério para analisar a interpretação que Deussen faz destes textos, e mesmo até que ponto a influência de Schopenhauer poderia ter de algum modo condicionado sua leitura. O processo de pesquisa, pois, incluirá uma leitura atenta das obras dos autores acima mencionados e de uma seleta bibliografia complementar sobre assunto (escrita tanto por autores nacionais, quanto por autores estrangeiros); além disso, é claro, faremos a articulação comparada entre os textos estudados, buscando também contextualizar histórica e geograficamente nossas fontes de textos orientais, a fim de evitar más interpretações. Referências 1 - KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. Trad. Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Morujão. 7 ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010. 692 p. 2 - KANT, Immanuel. Prolegômenos a Qualquer Metafísica Futura que Possa Apresentar-se Como Ciência. Trad. José Oscar de Almeida Marques. 1 ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2014. 171 p. 3 - SCHOPENHAUER, Arthur. O Mundo Como Vontade e Como Representação. Trad. Jair Barboza. 1 ed. São Paulo: Ed. Unesp, 2005. 690 p. 4 - SCHOPENHAUER, Arthur. On The Fourfold Root of the Principle of Sufficient Reason. Trad. E. F. J. Payne. La Salle: Open Court Publishing Company, 1997. 260 p. 5 - DEUSSEN, Paul. The Elements of Metaphysics. Trad. C. M. Duff. New York: MacMillan’s Colonial Library, 1894. 337 p. 6 - CHĀNDOGYA UPANIṢAD, Sânscrito e Inglês. Chāndogya Upaniṣad – With the Commentary of Śaṇkarācārya. Trad. Swami Gambhīrānanda. 9 ed. Kolkata: Advaita Ashrama, 2009. 728 p. 7 - BṚHADĀRAṆYAKA UPANIṢAD, Sânscrito e Inglês. Bṛhadāraṇyaka Upaniṣad – With commentary of Sri Sankaracharya. Trad. Swami Madhavananda. Kolkata: Advaita Ashrama. 696 p.