UNIVERSIDAD SUDAMERICANA - UNISUDA DIRECCION DE POSTGRADOS CONCORDÂNCIA NOMINAL - UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO CRISTINA EMÍLIA DOS SANTOS PARRELA TESIS DOCTORADO EN CIENCIAS DE LA EDUCACION BUENOS AIRES - ARGENTINA 2014 UNIVERSIDAD SUDAMERICANA - UNISUDA DIRECCION DE POSTGRADOS CONCORDÂNCIA NOMINAL - UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO CRISTINA EMÍLIA DOS SANTOS PARRELA Tesis presentada como requisito para la obtención del Título de Doctor en Ciencias de la Educación. BUENOS AIRES - ARGENTINA 2014 OBSERVACION “Ni la Universidad, ni la Mesa Examinadora serán responsables de las ideas expuestas por el estudiante en el presente trabajo”. Reglamento de Trabajo de Post-grado, Universidad Sudamericana - UNISUDA MESA EXAMINADORA Firma. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Aclaración. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Firma. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Aclaración. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Firma. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Aclaración. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Firma. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Aclaración. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Firma. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Aclaración. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Profesor Orientador DEDICATÓRIA Dedico este Doutorado aos meus pais Elpidio e Geralda (in memoriam), que no passado as suas palavras serviram-me de luz, incentivo e apoio, as quais hoje reafirmam as minhas escolhas e decisões. Bem como aos meus filhos Samuel e Eros por terem permanecido ao meu lado, me incentivando a percorrer este caminho, por compartilharem angústias e dúvidas estendendo suas mãos amiga em momentos difíceis. Por isso, a vitória desta conquista dedico com todo meu amor e carinho eterno, unicamente, a vocês! O meu muito obrigado por tudo! AGRADECIMENTOS A Deus, pela vida e a possibilidade de empreender esse caminho evolutivo, por ampliar conhecimentos e por colocar pessoas amigas e preciosas em meu caminho. A minha família, aos meus irmãos que mantiveram incansáveis em suas manifestações de apoio e carinho. Em especial ao meu irmão Elpidio que ensinoume a ser forte, mesmo nos momentos de fraqueza, ter coragem para buscar um novo caminho quando tudo era tão obscuro e agir com segurança. Você foi o porto seguro, quando tudo parecia estar a deriva. O meu muito obrigada . Ao meu orientador Dr. Edmar Jacintho por ter sempre acreditado em mim e no potencial desse Projeto de Pesquisa, além de sua dedicação, competência e especial atenção nas revisões e sugestões, fatores fundamentais para a conclusão deste trabalho. A Drª. Marta, um agradecimento carinhoso por todos os momentos de paciência compreensão e competência. Obrigada! A Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho, pela participação indispensável nesse estudo, cumprimento a todos, em especial a diretora Siney, o Vice Pedro, Ailton, Magda, e a professora Rita. A todos os participantes desse estudo, a professora Margareth Aparecida Magalhães Lopes , a professora Cristiany Aparecida Bechelene da Cruz e os alunos do Ensino Fundamental, pela disposição em ajudar no que dependesse para a conclusão da pesquisa, embora muitas vezes se encontrassem assoberbados pelo trabalho a realizar. A Equipe da SEMED, pelo apoio e compreensão de todos. As minhas amigas supervisoras Kátia Mônica, Edna, Bruna e Renata, que sempre estiveram do meu lado dando força e apoio. Aos amigos de Doutorado, que compartilharam comigo esses momentos de aprendizado especialmente Karine e Valdir. Que muitas vezes rimos, lamentamos e nos ajudamos. Ao Marquinhos pela competência no suporte técnico de nossas necessidades acadêmicas. Ao Carlos Parrela que sempre acreditou no meu sucesso. A Deusangela, por cuidar dos meus filhos com muito zelo e carinho suprimindo as minhas ausências. Enfim, a todos aqueles que de uma maneira ou de outra contribuíram para que este percurso pudesse ser concluído. RESUMO Essa pesquisa será um dos instrumentos que irá auxiliar na elaboração de projetos para a prefeitura, por meio da Secretaria de Educação desta cidade. O município de Buritizeiro, grande parte de sua extensão abrange a área rural, além de tratar-se também de um município de baixa renda.Fala-se que a escola é efetivamente boa se conseguir o aprendizado do maior grupo possível de alunos, atendendo às diferenças de cada um sem os exageros da educação individualista. Os alunos do Ensino Fundamental da Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho de 1º e 2º graus não assimilam o estudo da concordância nominal, devido a linguagem formal ser predominante em suas vidas, além da falta de informação cultural da família e por não possuírem os meios de cultura (revista, jornais, livros) para manusearem em suas rotinas diárias. Verificar o uso padrão culto da Língua Portuguesa na modalidade escrita dos alunos do Ensino Fundamental da Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho. Portanto, o objetivo desta pesquisa, à luz da Linguística Aplicada, bem como o apoio da Linguística Textual e na Gramática Funcional, é analisar como se tem viabilizado o ensino de gramática para que o aluno venha a dominar as modalidades linguísticas de expressão. E, ainda, entender qual é a concepção de linguagem que orienta esse aprendizado, atualmente, em sala de aula. RESUMEN Esta investigación será una de las herramientas que ayudarán en la preparación de proyectos para la ciudad, a través del Departamento de Educación de esta ciudad. El municipio de Buritizeiro, gran parte de su extensión cubre el área rural, y que es también una ciudad de renda.Fala bajo que la escuela es efectivamente lograr un buen aprendizaje el mayor número posible de alumnos, reunidos en el diferencias en cada uno de los estudios sin las exageraciones individualistas. Los alumnos de 6 º grado Escuela Primaria Escuela Estatal de Maestros Elisa Teixeira de Carvalho 1 º y 2 º grados no asimilan el estudio de la consistencia nominal porque el lenguaje formal de ser predominante en sus vidas, y la falta de información cultural de la familia y no tienen cultura de los medios (revistas, periódicos, libros) para montar en sus rutinas diarias. Comprobar el uso predeterminado de la adoración idioma portugués en la forma escrita de los estudiantes del 6 º de Educación Primaria Maestro de Escuela Estatal Elisa Teixeira de Carvalho. Por lo tanto, el objetivo de esta investigación a la luz de Linguística Aplicada, así como el apoyo de la linguística textual y la gramática funcional, es analizar cómo se ha permitido a la enseñanza de la gramática para que el estudiante dominará las formas linguísticas de expresión. Y, sin embargo, entender cuál es la concepción del lenguaje que guía este aprendizaje en la actualidad en el aula. SUMÁRIO CAPÍTULO I. ............................................................................................................. 13 QUESTÕES INTRODUTÓRIAS ................................................................................ 13 1.1 - TEMA: CONCORDÂNCIA NOMINAL - UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO .................................................................. 13 1.2 - DELIMITAÇÃO: CONCORDÂNCIA NOMINAL - UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO DA ESCOLA ESTADUAL PROFESSORA ELISA TEIXEIRA DE CARVALHO NO PERÍODO DE FEVEREIRO A OUTUBRO DE 2012. ................................................................................................ 13 1.3 - PROBLEMATIZAÇÃO: ..................................................................................... 13 1.5 - HIPÓTESE ........................................................................................................ 14 1.6 - OBJETIVO GERAL........................................................................................... 14 1.7 - OBJETIVOS ESPECÍFICOS............................................................................. 14 1.8 - MARCO TEÓRICO ........................................................................................... 14 1.8.1 A LÓGICA DAS CONCEPÇÕES ..................................................................... 23 1.9 - MARCO METODOLÓGICO:............................................................................. 30 CAPÍTULO II. ............................................................................................................ 33 ESTRATÉGIAS DE ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA ...................................... 33 2.1 OS RECURSOS A OUTROS TIPOS DE CONHECIMENTO, ALÉM DO CONHECIMENTO GRAMATICAL ............................................................................ 54 2.1.1. O CONHECIMENTO DO REAL OU DO MUNDO ........................................... 54 2.1.2. O CONHECIMENTO DOS RECURSOS DE TEXTUALIZAÇÃO .................... 57 2.2.1. O CONHECIMENTO DAS NORMAS SOCIAIS DE USO DA LÍNGUA........... 61 2.2 IMPLICAÇÕES PARA O ENSINO ...................................................................... 63 2.3. O TEMPO PARA A AVALIAÇÃO ...................................................................... 66 2.4 FENOMENOLOGIA DA LINGUAGEM ................................................................ 69 CAPÍTULO III ............................................................................................................ 84 ANÁLISE DE DADOS E RESULTADOS DA PESQUISA .......................................... 84 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 115 13 CAPÍTULO I. QUESTÕES INTRODUTÓRIAS 1.1 - TEMA: concordância nominal - um desafio da escola face à diversidade cultural do aluno 1.2 - DELIMITAÇÃO: concordância nominal - um desafio da escola face à diversidade cultural do aluno da Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho no período de Fevereiro a Outubro de 2012. 1.3 - PROBLEMATIZAÇÃO: Por que os alunos do Ensino Fundamental da Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho tem dificuldade em assimilar o padrão culto do Português Brasileiro? 1.4 – JUSTIFICATIVA: Essa pesquisa é de grande relevância porque muito se tem feito nas escolas, estas, que por sua vez, ainda não despertaram em seus educandos o seu interesse neste processo de aquisição do conhecimento. Percebe-se que os nossos educandos possuem uma dificuldade em escrever com clareza as ideias, as quais desejam comunicas (talvez falte mais leitura extraclasse para aumentar o seu vocabulário), dificuldade de organizar seu pensamento, fazendo maior uso de expressões coloquiais ao invés de usarem a forma culta, devido seus costumes e cultura. Portanto, o objetivo desta pesquisa, à luz da Linguística Aplicada, bem como o apoio da Linguística Textual e na Gramática Funcional, é analisar como se tem viabilizado o ensino de gramática para que o aluno venha a dominar as modalidades linguísticas de expressão. E, ainda, entender qual é a concepção de linguagem que orienta esse aprendizado, atualmente, em sala de aula. De acordo com os PCNs (1998), ainda que a reflexão seja constitutiva de atividade discursiva, no espaço escolar reveste-se de maior importância, pois é na 14 prática de reflexão sobre a língua e a linguagem que pode se dar a construção de instrumentos que permitirão ao sujeito o desenvolvimento da competência discursiva para falar, escutar, ler e escrever nas diversas situações de interação. Essa pesquisa será um dos instrumentos que irá auxiliar na elaboração de projetos para a prefeitura, por meio da Secretaria de Educação desta cidade. O município de Buritizeiro, grande parte de sua extensão abrange a área rural, além de tratar-se também de um município de baixa renda. Fala-se que a escola é efetivamente boa se conseguir o aprendizado do maior grupo possível de alunos, atendendo às diferenças de cada um sem os exageros da educação individualista. 1.5 - HIPÓTESE Os alunos do Ensino Fundamental da Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho de 1º e 2º graus não assimilam o estudo da concordância nominal, devido a linguagem formal ser predominante em suas vidas, além da falta de informação cultural da família e por não possuírem os meios de cultura (revista, jornais, livros, TV, internet.) para manusearem em suas rotinas diárias. 1.6 - OBJETIVO GERAL Verificar o uso padrão culto da Língua Portuguesa na modalidade escrita dos alunos do Ensino Fundamental da Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho. 1.7 - OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Investigar a adequação da concordância, da pontuação e da ortografia na redação destes alunos, sob o aporte de vários teóricos; - Compreender as estratégias de ensino de produção de texto, avaliação da aprendizagem, de planejamento de ensino da Língua Portuguesa em sala de aula; - Analisar por meio de pesquisa de campo os resultados e as contribuições do trabalho dissertativo; 1.8 - MARCO TEÓRICO A base deste estudo terá como suporte os gramáticos Cegala, Cunha, LDB (1996) e PCNs (1998), Koch (1999) entre outros pesquisadores e gramáticos. Eles 15 apontam e discutem métodos de como efetivar, de maneira prazerosa e desmassificante, o aprendizado da língua materna. Para Travaglia (1999), o ensino da língua materna (Português) se apresenta assim dividido: ensino da gramática (quase sempre como ensino de teoria linguística), ensino de redação (ou expressão escrita), ensino de expressão oral, ensino de leitura e ensino de vocabulário. O mais frequente é a ênfase no ensino de gramática e de leitura, constituindo a integração destas cinco áreas um problema crucial e até intransponível. A visão de Koch (1999) e Travaglia (1999) é que a adução de uma perspectiva textual-interativa, já que os textos são o meio pelo qual a língua funciona, não só resolveria o problema de integração entre os diferentes aspectos do funcionamento da língua não interação comunicativa, mas também libertaria o professor da tradição metodológica em que ele se deixa aprisionar pelo ensino de gramática como um fim em si mesmo, esquecendo-se de que, provavelmente, seria mais pertinente para o aluno aperfeiçoar a capacidade de interação pela língua que ele já tem ao chegar à escola, entendendo que precisa, em termos sociais, ser capaz de interagir com variedades de língua, inclusive a norma chamada de culta que, pelas regras de nossa sociedade e cultura, considera-se adequada em determinadas situações. Tomando por base a Lei de Diretrizes e Bases nº 9394/96, bem como o instrumento que norteia a operacionalização desta lei, ou seja, os Parâmetros Curriculares Nacionais, aborda como objetivo geral de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental no processo de ensino-aprendizagem, esperando que o aluno amplie o domínio ativo do discurso nas diversas situações comunicativas, sobretudo, nas instâncias públicas do uso da linguagem, de modo a possibilitar sua inserção efetiva no mundo da escrita, ampliando suas possiblidades de participação social no exercício da cidadania. Desta forma, o ensino de língua que se propõe na escola hoje é o da pluralidade cultural e linguística. Trata-se de uma postura apoiada no reconhecimento de que, da mesma forma que nosso país apresenta enormes desigualdades regionais, sociais e culturais, a língua apresenta muitas variações que se originam de situações históricas, culturais, regionais e sociais. Este texto nasceu da análise do problema de pesquisa, proposto pela pesquisadora e abordara aspectos que dele fazem parte na seguinte ordem: 16 características dos alunos que fazem parte da pesquisa, características da escola onde a pesquisa foi realizada, o sentido, o significado e conceito de dificuldade de aprendizagem em Língua Portuguesa. E em especial o de assinalar o padrão culto do Português Brasileiro, no que se refere as concordâncias nominais e verbais dos referidos alunos. Os alunos da pesquisa são oriundos de escola pública, alguns de família tradicional (pai e mãe), outros têm apenas mãe, os avos, os tios ou até mesmo as instituições de abrigo como referência de família. Estes dados foram obtidos por meio da secretaria da escola, em registro da ficha individual do aluno. A escola em questão, localiza na parte central da cidade, sendo a primeira escola da cidade de Buritizeiro, criada pelo decreto Nº 5.396/58. Atende o ensino fundamental e médio, e também com os projetos: Educação de Jovens e Adultos, Programa Acelerar para Vencer e o Programa Escola Tempo Integral. Seu funcionamento ocorre nos turnos (matutino, vespertino e noturno). Esta escola por ser tradicional, na cidade atende uma clientela bastante diversificada desde alunos do centro da cidade, dos bairros mais afastados e até das comunidades rurais. Como foi mencionado, a escola possui uma clientela muito diversificada pois sua abrangência de atendimento se faz por toda diversidade e pluralidade cultura, uma vez que a sua clientela é muito diversificado. Por isso, nesta escola se encontra o “celeiro” de enumeras “peias da educação”. O texto a seguir irá apontar uma das “peias” da educação ou seja a dificuldade de aprendizagem em uma abordagem histórica entre passado e presente. Segundo Fonseca (1995, p. 09): Nos séculos XVIII e XIV, a entrada para a escola se dava por volta dos 13 anos. No século XVI, os Jesuítas estabeleceram a entrada para a escola aos sete anos e criaram as “classes de nível” que podiam ter criança de 24 anos. No século XVII, nos reinados de Luis XIII e Luis XVI, a entrada para a escola é criada aos nove anos e aos cinco, respectivamente. Em pleno século XVIII, as mudanças de atitude decorrentes da filosofia de Rousseau e Diderot levam ao “ensino para todos e na base da diversidade”. Mais tarde, já no século XIX e XX, as ideias de Montessori, Decrely, Froebel, Dewey, Makarenko, Mendel, Freinet e tantos outros reforçam a necessidade de escola estar aberta à vida, ao mesmo tempo que devia ser obrigatória para todos e não para os filhos dos favorecidos ou privilegiados. 17 De acordo com o autor essa abordagem, chega-se a conclusão de que a escola foi imponto exigências, ao mesmo tempo que se foi abrindo a um maior número de crianças aumentando as taxas de escolarização. Para o autor, esse aumento de taxa de escolarização teve como consequência, implicações em inúmeros processos de inadaptação da escola. Quando os métodos que eram eficazes para a maioria não serviam, rapidamente se criavam (e criam ainda hoje) processos de seleções e segregações para outras crianças. O autor ainda afirma que a escola pode humilhar, ameaçar e desencorajar, mais do que reforçar e ou, libertar ou encorajar a criança. Mencionar que, temos o hábito de dizer que mandamos as crianças para aprenderem. O que se faz tradicionalmente é ensinar a pensar erradamente, perdendo as crianças e a sua espontaneidade e curiosidade, submetendo-se as vezes a normas de rendimento e eficácia ou a métodos e correntes pedagógica que estão na moda. Conforme Pagliaro (2010, pagina 281 a 282) o valor da gramatica nasceu, pois, sobre o duplo signo didático normativo e logico cognoscitivo. Os fatores normativos e lógicos informaram todo seu desenvolvimento e é precisamente o descredito em que hoje, no geral, caiu a norma que do campo do pensamento e da ação, vem refletir-se na gramatica, tornando a vida desta obscura e difícil. Considera-se hoje que só podemos pensar nas regras gramaticais como numa espécie de bastões invisíveis do falante, semelhantes na sua função, a bengalinha com que o citadino elegante a flora as calçadas da cidade. Ora para sermos precisos, esses objetos ornamentais já não se vêm na rua onde, quando muito, encontramos a bengala funcional, com ponteira de borracha a qual se apoia o velho ou o invalido caminhando no seu passo incerto: em suma, o instrumento aparece apenas na sua real funcionalidade. Quanto à lógica, foi, como se sabe, banida da sociedade civil e ate da escola, desde que as delicadezas estéticas foram dadas como alimento vitaminado mais próprio para todas as categorias, desde as mentes de sã e robusta constituição, às crianças, aos fracos e aos convalescentes. Na base de MC tudo isto há certamente um pequeno equivoco que temos que reconhecer deriva das disposições inicial que subordinou explicitamente o estudo da gramatica a finalidade didáticas e logico – cognitivas. Eram estes, por assim dizer, os fins oficiais e expressos da gramatica. Mas por de baixo destes, uma outra força 18 se manteve sempre, viva e operante na investigação levada a cabo a cerca das formas linguísticas: foi a necessidade desinteressada de conhecer a estrutura e a urdidura do sistema de sinais de que nos servimos para objetivarmos e tornarmos claro, a nos e aos outros, o conteúdo da nossa consciência. Esta necessidade, mais ainda que o próprio interesse didático ou gnosiológico, esta presente na sistematização teórica e descritiva da língua que os gregos procuram erguer e cujos fundamentos estabeleceram. Por isso a gramatica merece, a final, o nome de episteme, cujo significado abrange conjuntamente o saber teorético e o saber pratico, e não o de téchne (Snell). Corno em todas as ciências, o valor humano da gramatica, antes de ser didático e normativo, é formativo. Ele leva a mente refletir sobre uma das criações mais importantes e humanamente mais vinculadas, de cuja constituição, de outro modo, nos não preocuparíamos mais do que com mecanismo da circulação do sangue ou da respiração (pelo menos enquanto funcionam bem ! ). Com tudo a palavra é uma atividade consciente e a adesão a um sistema linguístico diferente daquele a que poderíamos chamar natural, como a aquisição de uma língua comum em rivalidade, com os dialetos, é, em substancia, um fato de ordem volitiva. A reflexão sobre a constituição e os valores desse sistema desenvolve e aperfeiçoa a consciência linguística que é também uma consciência estética; simultaneamente e por meio da analise das correlações e das oposições que constituem o seu caráter funcional, habitua a mente a descobrir no pensamento discursivo as formas que foram elevadas a uma função cognoscitiva mais alta no pensamento racional. (A Vida do Sinal, págs. 299-301). Segundo Bechara (2010, pagina 283 a 287) a gramatica no contexto nas disciplinas linguísticas, longe de recolher-se a um ostracismo pelo peso de seu passado de mais de dois mil ano no cenário dos estudos relativos a pesquisa e ao ensino de língua , a gramatica, pelo esforço e arte de seus melhores cultores, tem procurado, nesses últimos anos acompanhar e beneficiar-se do progresso que vêm experimentando antigas e novas disciplinas envolvidas direta e indiretamente com o complexo fenômeno da linguagem. Muitas vezes tem sobrado negativamente para responsabilidade da gramatica, estendida como método analítico de descrição e analise do objeto língua, 19 as justas críticas que fazem ao método didático de transmissão de conhecimento deste mesmo objeto. Nesse sentido, o método didático aplicado ao ensino de línguas estrangeiras, favorecidas pelas suas especificidades, tem logrado mais largos êxitos do que quando aplicado ao ensino da língua materna. Esta interrelação natural entre o método analítico de descrição e analise da língua e o método didático a transmissão de conhecimentos tem criado e favorecido uma onda de descredito altamente prejudicial, que resulta no estabelecimento de um fosso entre a gramatica descritiva, de natureza cientifica e a gramatica prescritiva ou normativa de caráter pedagógicos, vista esta como produto e abusos do conservadorimos elitista, apesar das judiciosas ponderações de bons linguistas e da orientação ditada pelo bom senso. Entre os estudiosos modernos que se destacam pelo equilíbrio na discursão do problema esta o linguista David Crystal que, no capitulo inicial de sua instrutiva e bem elaborada The Cambridge encyclopedia of language, assim se manifesta, numa citação do linguista brasileiro Francisco Gomes de Matos, da Universidade Federal de Pernambuco, ele mesmo campeão entre nós dos direitos linguísticos individuais. Diz Crystal com tal propriedade, que suas palavras deveriam ser a pá de cal nessa falsa dicotomia que tem servido de bandeira desfraldada em livros e artigos de nossa imprensa: Se deixarmos de lado estes estereótipos, podemos ver que ambos os enfoques são importantes e têm mais coisas em comum do que as que habitualmente se reconhecem, entre as quais se inclui um interesse mutuo por questões como a adaptabilidade, a ambiguidade e a inteligibilidade. O enfoque descritivo é essencial porque constitui a única maneira de reconciliar as pretensões discordantes de modelos diferentes; quando conhecemos os fatos do uso da linguagem, encontramo-nos em melhor posição para evitar as idiossincrasias das opiniões particulares e para aconselhar de forma realista sobre questões de ensino ou de estilo. O enfoque normativo proporciona uma maneira de orientar o sentido do valor linguístico que todos nos temos e que, fundo, faz parte do nossa visão de estrutura social e de nosso lugar dentro dela. Seria quiçá ingênuo esperar que, depois de 200 anos de disputa se consiga uma entendimento imediato dos contrários, mas existem razoes para sermos otimistas, depois que os sociolinguistas estão começando a 20 examinar mais seriamente o prescritivismo em determinados contextos, como o de explicar as atividades, usos e crenças linguistas. Também por parte dos teóricos da linguagem de língua portuguesa já era corrente, desde a metade do século 20, a boa lição que pregava os laços íntimos entre os dois enfoques. Assim, Herculano de Carvalho, em Portugal, já preceituava: “O ponto de partida, não apenas o melhor, mas verdadeiramente essencial, para que o ensino da língua materna seja de fato o que deve ser plenamente eficiente, residente numa exata compreensão do fenômeno linguístico em geral” (Estudos linguísticos, 2º volume, “Sobre o ensino da língua materna”, pág.221).”. Nesta mesma trilha orientou-nos J.Mattoso Câmara Jr.: A gramatica descritiva (...). Faz parte da linguística pura. Ora, como toda ciência pura e desinteressada, a linguística tem a seu lado uma disciplina normativa, que faz parte do que podemos chamar a linguística aplicada a um fim de comportamento social. Há assim, por exemplo, os preceitos básicos da higiene, que é independente da biologia. Ao lado a sociologia, há o direito que prescreve regras de conduta nas relações entre os membros de uma sociedade (...). Assim, a gramatica normativa tem o seu lugar e não se anula diante da gramatica descritiva. Mas é um lugar à parte, imposto por injunções de ordem pratica dentro da sociedade. É um erro profundamente perturbador misturas as duas disciplinas e, pior ainda, fazer linguística sincrônica com preocupações normativas” (Estrutura da língua portuguesa, pág.5). Armou-se a gramatica de numerosas noções do aparato teórico desenvolvido por notáveis linguistas modernos que lher permitiu, sem favor, caminhar pari passu com disciplinas modernas amparadas por forte requisito de cientificidade. A primeira extraordinária orientação renovadora foi compreender a linguagem nas suas três dimensões: a universal, a histórica e a particular (ou circunstancial), o que lhe permitiu estar ciente de que não se comunica e não se expressa só mediante a língua, mas com a competência do falar em geral (plano ou dimensão universal) e com a competência textual (plano ou dimensão particular). A dimensão universal da linguagem se manifesta no saber elocutivo, pressuposto para todas as línguas que consiste no conhecimento dos princípios mais gerais do pensamento, um conhecimento geral das coisas do mundo objetivo e um conhecimento que elege uma interpretação dentre varias interpretações possíveis que uma língua particular oferece. Atender as normas do saber elocutivo diz-se falar com coerência, falar com sentido. Dessarte, a coerência não é propriedade de uma língua particular, mas do manifesta o pensamento mediante a língua. 21 A dimensão particular ou circunstância da linguagem se manifesta no saber expressivo ou competência textual que consiste em saber estruturas textos em situações determinadas. Atender as normas do saber expressivo diz-se expressarse com adequação. e. se levar em conta o objeto representado ou o tema, será considerado adequado; se o destinatário, será apropriado e se a situação ou circunstancia, será oportuno. A dimensão histórica da linguagem se manifesta no saber idiomático, isto é, no conhecimento de uma língua particular. Atender as normas do saber idiomático diz-se correção: expressar-se com correção é saber falar de acordo com a tradição linguística de uma comunidade historicamente determinada. Como uma língua histórica, concebida em toda sua dimensão no tempo, no espaço, nos extratos sociais nos níveis de estilo, como uma língua histórica, dizíamos, reúne um conjunto de línguas funcionais, entendidas como uma variedade que funciona efetivamente em cada comunidade linguística, fácil-se conclui que cada uma dessas variedades possui a sua palta da correção, a sua norma historicamente determinada. Tal concepção representa uma revolução não só no conceito de correção idiomática, mas também nos juízos de valor dos saberes elocutivo e expressivo, isto é, como já vimos, na congruência e na expressividade textual. Ate a bem pouco – e infelizmente ainda hoje persiste em alguns estudiosos – chamava-se correção a qualquer conformidade de norma relativa às três dimensões da linguagem aqui referida; assim, considerava-se incorreto qualquer mau uso no plano do saber elocutivo (congruência) e do saber idiomático (correção) e do saber expressivo (adequação textual).Correção só se aplica a rigor, ao saber idiomático. Com esta mudança de conceitos, ficou a gramatica – tanto no enfoque descritivo quanto no enfoque normativo – habilitada a entender que nem todos os fatos de linguagem pertencem ao seu objeto de estudo, isto é, à língua particular. Ora, o perfeito reconhecimento de seu objeto de estudo representa a primeira consideração necessária indispensável a uma investigação adequada e coerente. Assim, a dimensão da tradição vinda dos lógicos sobre a pertinência ou não de frases do tipo A mesa quadrada é redonda extrapola a competência do saber idiomático para inserir-se no domínio do saber elocutivo, salvo se o falante tiver mesmo a intenção de falar incongruentemente e ser compreendido pelo seu interlocutor, dado o entorno que envolve a circunstância do discurso. 22 Assim também fica a gramatica habilitada a compreender que em construções do tipo do português amor de mãe ou do latim amor matris, isto é, os empregos dos chamados genitivos subjetivo (=a mãe ama) e genitivo objetivo (= o filho ama a mãe), as duas línguas não apresentam manifestação linguística para tais distinções, ao que se pode chegar por uma adequada compreensão do sentido textual mediante o curso do saber elocutivo e do saber expressivo, além, naturalmente do condicionamento lexical e sintático das unidades envolvidas. Diante de diversas pautas de correção relativas a cada língua funcional, sobreleva a necessidade da conceituação da norma a que Eugenio Coseriu chamou exemplar que, diferentemente da natureza da correção que reflete uma tradição linguística da comunidade historicamente determinada, resulta a exemplaridade de uma eleição de fatos linguísticos (mais no campo da morfossintaxe do que da fonologia) ditada por injunções sociais e culturais: o exemplar, por tanto não será correto nem incorreto, mas sim integrante de uma etiqueta sócio cultural. E dela só dará conta a gramatica normativa. A gramatica sem adjetivos (comparada, contrastiva, etc.) de uma língua não é a gramatica de toda a língua, mas de uma variedade dela. Isto esta longe de significar que o professor de língua não reconheça a existência de fatos de variedades outras da competência linguística de seus alunos, para os quais não deve olhar como prejuízos ou como juízos preconceituosos. Tais diversidades devem ser aproveitadas inteligente e habilmente pelo professor como fatores que façam dos alunos poliglotas da própria língua, fatores decisivos no cultivo e extensão da competência linguística que lhes permitira passar do conhecimento intuitivo ao conhecimento reflexivo do idioma para que eles possam estimular a criatividade linguística como lembra Coseriu(1999) a atitude e o empenho de preservar os alunos a mesmice idiomática, negando-lhes o acesso a lingua exemplar, sobre o pretexto, alias distorcido, de que uma imposição das classes dominante e da elite resulta de uma falsa noção de democracia que repercutira negativamente no percurso do destino desses alunos no seio da sociedade. Para Antunes (1998), no processo de ensino-aprendizagem escolar, o ensino e a avaliação se interdependem. Não teria sentido avaliar o que não foi objeto de ensino, como não teria sentido também avaliar sem que os resultados dessa avaliação se refletissem nas próximas atuações de ensino. Assim, um alimenta o 23 outro – tudo, é claro, em função de se conseguir realizar o objetivo maior que é desenvolver competências nos campos que elegemos. Na rotina de nossas atividades escolares, o fio dessa interdependência parece ter-se rompido e, desse modo, avaliação e ensino nem sempre guardam essa reciprocidade. Com grandes prejuízos para o ensino, pois, em muitos casos, a avaliação passou a ser uma espécie de finalidade: a aula é dada para preparar aprova; o livro é lido porque “é pra nota”; a literatura é consultada porque “cai no vestibular”, e assim por diante. Estuda-se para... “uma prestação de contas”, que pode ser mensal, trimestral, anual, no final do ciclo etc. Daí ser o termo “cobrar” uma expressão bem corrente no discurso da escola, o que bem claramente denuncia esse lado mercadológico do ensino. É mais do que oportuno, pois, perguntar-se sobre os “descaminhos” da avaliação e decidir por uma mudança de rumo, mudança que tem suas origens na revisão de nossas concepções. Sim, porque mudar, seja o que for, tem que começar pela revisão de nossos fundamentos conceituais. Se não, muda apenas o palavreado, muda apenas a fachada... 1.8.1 A lógica das concepções Se o ensino da língua merece uma reorientação, não é diferente quando se trata da avaliação dos resultados desse mesmo ensino. Por muitas razões, razões disciplinares inclusive, o processo de avaliação escolar converteu-se num instrumento de seleção dos alunos, apenas conforme os graus (traduzidos numericamente) de seus desempenhos. Com matéria e data marcadas, os “testes”, as “provas” acontecem, exatamente para isso: para que se teste, para que se prove; normalmente, com honrosas exceções, para que se prove o que ficou na memória. Tudo de acordo com a política assumida na hora da aula “dada”: “passa-se” uma informação que é “devolvida” no dia da prova, por vezes, literalmente desenvolvida. Recentemente, um comercial transmitido pelas emissoras nacionais de televisão me chamou a atenção, pelo modelo de aprendizagem escolar que estava lá sutilmente embutido, inclusive o modelo de professor também. O comercial constava da seguinte cena: um menino está sentado, estudando; a campainha toca e uma voz lá de dentro diz que “deve ser a professora” do filho. De fato, o pai abre a porta, e entra a professora que logo se dirige ao menino, perguntando se ele “aprendeu direitinha a lição”, conforme ela ensinou. O menino diz que sim, e aí a 24 professora começa a interrogá-lo. O menino vai respondendo às perguntas, uma a uma, sem hesitação, com uma certeza dogmática de quem afasta qualquer possibilidade de hesitação, de dúvida ou de questionamento. Tudo transparente, tudo posto, tudo certo, acabado, resolvido, estabilizado. Eu me perguntava sobre que concepções de escola, de aprendizagem, da intervenção do professor passam (naturalmente) pelas peças desse jogo, que de inocente não tem nada. Que concepções de avaliação estão aí implicadas nesse pingue-pongue de perguntas e respostas? Onde é que está o professor que faz pensar, que leva o aluno a perguntar, a contestar, a acrescentar? Que tipo de cidadãos estamos querendo formar com esse procedimento simplista da aceitação pacífica e mnemônica do que a autoridade nos diz? Mesmo que digamos o contrário, essas encenações, as reais e as fictícias, falam da nossa visão distorcida do que seja ensinar e do que seja verificar ou avaliar se o aluno conseguiu assimilar o que lhe propomos. Falta rever nossas concepções de avaliação, a fim de desgrudá-las de uma finalidade puramente seletiva – quem passa, quem não passa de ano – e instituir uma avaliação em função da aprendizagem. Uma avaliação, portanto, que seja uma busca dos indícios, dos sinais da trajetória que o aluno percorreu, o que, por outro lado, serve também de sinal para o professor de como ele tem que fazer e por onde tem que continuar. Na verdade, pela avaliação deveria ficar evidente para o professor que coisas ele ainda precisa trazer para a sala de aula como matéria de análise, reflexão e estudo. O professor avalia o aluno para também, de certa forma, avaliar seu trabalho e projetar os jeitos de continuar. Daí que a avaliação não é apenas um evento isolado, previsto no calendário da escola, depois do qual tudo é retomado tal como estava pensado, sem que os resultados alcançados sirvam de algum suporte para futuras decisões. Felizmente, algumas escolas já têm descoberto novos padrões de avaliação a serviço da regulação das aprendizagens, como propõe Perrenoud (1999:10) e a “tortura” dos dias de prova tem dado lugar a muitas oportunidades para que o aluno se observe e reveja o que pode alcançar em seu desenvolvimento e o que o impediu de fazê-lo com maior êxito. Restringindo-se às atividades de produção de texto, a avaliação atual das produções dos alunos não tem se afastado muito das praticas tradicionais de destacar (quase sempre em vermelho) os erros (que erros se destacam?) 25 cometidos, com o acréscimo da alternativa correta ao lado. O aluno, sem ser levado a pensar a inadequação de sua escolha ou o porquê da substituição apontada, recebe passivamente esta interferência do professor e parte para a próxima experiência, sem ter ampliado sua própria capacidade de avaliar o que lê, o que diz ou o que escreve. Em decorrência do conjunto de princípios apresentados e das implicações que eles guardam, parece razoável admitir que, de saída, a avaliação deve deixar os limites estreitos da mera indicação dos erros, ou da mera atribuição de notas, para fins de marcar a transição dos alunos para as series seguintes. Deve, na verdade, proporcionar ao aluno a consciência de seu percursor, de seu desenvolvimento, na apreensão gradativa das competências propostas. Deve indicar ao professor as hipóteses que os alunos têm cerca do uso falado e escrito da língua, para que, quando necessário, eles reformulem essa hipótese, sem a experiência amarga e desencorajadora de se sentirem incompetentes, “em erro” e linguisticamente diminuídos. Nessa perspectiva, é bom que o professor se apoie nos resultados apresentados pelos alunos, seja em leitura seja em escrita, para decidir o que vai selecionar como próximo objeto de estudo, para que não fique ensinando aquilo que os alunos já sabem ou deixe de ensinar aquilo que eles precisam saber. Por exemplo, nenhum aluno tem duvida quanto ao gênero gramatical de palavras como “livro”, “lápis”, “casa” etc. daí o motivo por que parece perda de tempo estar exercitando os alunos no simples reconhecimento, pela anteposição do artigo, do gênero gramatical de palavras como estas. Convém ainda que o professor converta cada momento de avaliação num tempo de reflexão, de pesquisa, ou seja, de ensino e aprendizagem, de reorientação do saber anteriormente adquirido. Sem o ranço das atitudes puramente “corretivas”, de “caça aos erros”, como se o professor só tivesse olhos para enxergar “o que não está certo”. Sempre que lhe parecer oportuno (e tomara que pareça muitas vezes!), o professor deve mostrar a flexibilidade dos usos da língua, deve mostrar que existem diferentes maneiras de dizer (e de dizer bem!) a mesma coisa; ainda que dentro do mesmo contexto ou, mais ainda, em contextos diferentes. Essa flexibilidade desfaria a ideia equivocada de que “só existe uma maneira certa de dizer as coisas”. Na 26 verdade, a maneira certa de dizer as coisas depende da situação: depende de quem diz, onde e para quê. Convém lembrar ainda que, neste trabalho de avaliação, o professor deve valorizar, deve estimular cada tentativa, cada conquista do aluno, favorecendo, em todo momento, a formação de uma autoestima elevada, responsável, agora e sempre pela disposição de tentar falar e escrever, mesmo sob o risco da incompletude e da imperfeição. Aprender não pode interessar a ninguém se é visto como um castigo, como uma coisa penosa, da qual a gente deseja ardentemente se livrar o mais cedo possível. Rubem Alves lembra que “sabe” e “sabor” têm a mesma raiz etimológica e o mesmo núcleo semântico. Aprender tem que ser uma coisa de gosto bom, uma coisa gostosa, saborosa, como se diz. Nesse sentido é que se poderia enquadrar qualquer atividade de ensino e, sobretudo, de avaliação das coisas que os alunos falam e escrevem. O mais é expressão do autoritarismo e do desrespeito da escola frente à produção do aluno. Parece-me de grande relevância que o professor de português reafirme a consciência de que o perfil ideal para cada etapa-série é parcial, na medida das aptidões e limitações dos alunos, em cada período da escolaridade. É norma que, numa certa altura de sua escolaridade, o aluno ainda demonstre inabilidades para compor um texto escrito, por exemplo, em que muitos apagamentos poderiam ter sido efetuados. Como é também normal que ele vacile quanto à escolha da palavra adequada ou da grafia padronizada. Normalíssimo seria ainda que ele tivesse uma pessoa que, nesses momentos de hesitação ou de equivoco, se propusesse a intervir, a propor outras opções de dizer. Este é o papel do professor: estimular, em cada momento, a tentativa de produção do aluno e orientá-lo na aquisição dos padrões adequados. Em suma, o fundamental é que o professor garanta ao aluno a oportunidade de enfrentar o desafio da leitura, da escrita, da escuta, da fala (do conversacional cotidiano à fala formal), com todos os gostos e riscos que isso pode trazer. Só assim ele há de chegar à experiência comunicativa inteiramente assumida, com a autoconfiança de que somos capazes de exercer, também pelo linguístico, a cidadania que nos cabe por pleno direito. De acordo com Geraldi ( ),provavelmente o leitor procurará obter aqui alguns critérios que lhe permitam melhorar seu desempenho de professor na “correção” e 27 “avaliação” de redações de seus alunos. Uma das questões mais frequente é precisamente esta: “como avaliar redações?”. O titulo deste texto justifica esta expectativa. Revertamo-la de imediato. De fato minha preocupação será pôr em questão precisamente a questão “como avaliar redações?”, tentando recuperar alguns dos problemas prévios a esta questão, e que, como tais, podem iluminar as causas que não só levam a respostas diferenciadas, mas também produzir a própria questão. Como espero poder demonstrar, a pergunta é bem colocada: avaliar redações, porque a ninguém ocorre avaliar o editorial de um jornal, uma conversação informal ou discursiva de um politico. Normalmente, discordamos ou concordamos com um editorial; acrescentamos argumentos a favor ou contra uma ideia defendida num discurso; questionamos a oportunidade de tratar de um assunto ou ainda nos perguntarmos pela validade ou efeitos concretos de uma conversação, etc. sei que, neste momento, o leitor está se perguntando: e isto não é avaliar? Eu responderia que sim. Mas há uma diferença fundamental: quando nós, professores, nos perguntamos como avaliar redações? temos em mente precisamente o exercíciosimulado da produção de textos, de discursos, de conversações: a redação. Isto por que na escola não se produzem textos em que um sujeito diz sua palavra, mas simula-se o uso da modalidade escrita, para de fato usa-la no futuro. É a velha historia da preparação para a vida, encarando-se hoje como não-vida. É o exercício. Assumindo que qualquer proposta metodológica é a articulação de uma concepção de mundo e de educação – e por isso uma concepção de ato politico – e uma concepção epistemológica do objeto de reflexão – no nosso caso, a linguagem – com as atividades desenvolvidas em sala de aula, o primeiro deslocamento a fazer, de um lado, é o da função-aluno que escreve uma redação para uma função-professor que a avalia e, de outro lado, o próprio ato de produção escolar de textos. Por quê? Porque é impossível manter uma escrita da linguagem, já que esta, nas palavras de Benveniste, “é profundamente marcada pela expressão da subjetividade que nós perguntamos se, construídas de outro modo, poderia ainda funcionar e chamar-se linguagem”. Ao descaracterizar o aluno como sujeito, impossibilita-se-lhe o uso da linguagem. Na redação, não há um sujeito que diz, mas um que devolve ao professor a palavra que lhe foi dita pela escola. Percival Leme Brito, estudando as 28 condições de produção do texto, o professor conclui que esta “é marcada, em sua origem, por uma situação muito particular, onde são negadas à língua algumas de suas características básicas de emprego, a saber, a sua funcionalidade, a subjetividade de seus locutores e interlocutores e o seu papel mediador na situação homem-mundo. O caráter artificial desta situação dominado pelo processo de produção da redação, sendo fator determinante do seu resultado final”. Para mantermos uma coerência entre uma concepção de linguagem como interação e uma concepção de educação, esta nos conduz a mudança de atitude enquanto professores - ante o aluno: precisamos nos tornar interlocutores que, respeitando a palavra como parceiro, agimos como reais parceiros: concordando, discordando, acrescentando, questionando, perguntando, etc. Note-se que, avaliação está se aproximando de outro sentido: aquele que falamos em relação ao uso que efetivamente fora da escola, se faz a modalidade escrita. Feitas estas breves considerações, tomo-as como pontos de parceiros a reflexão sobre dois textos (ou um texto e uma redação?) Bancas ¹: I. ”A casa é bonita. A casa é do menino. A casa é do pai. A casa tem uma sala. A casa é amarela.” II. “Era uma vez um pionho o Que roi o cabelo de um emnino Dai um meninopinneto dapasou um Umenino lipo enei pionnho aí passou Um emnino pionheto daí omenino Pegoupionho da amunhér pegoupionho Da todomundosaiogritãdo todomundo pegou Pionho di até sofinho begoupionho.” Ambos os textos são de crianças em seu segundo ano de experiência escolar. Que dizer de tais textos? Os dados a proposito dos alunos nos mostram, no mínimo, um critério de avaliação da escrota, tal como ela se dá, em termos gerais, 29 na escola. O autor do texto I foi aprovado no ano anterior; o autor do texto II está repetindo a primeira série e foi, portanto, considerado como não alfabetizado. À luz das considerações que vínhamos fazendo, o autor do primeiro texto entendeu o jogo da escola: seu texto não representa o produto de uma reflexão ou uma tentativa de, usando a modalidade escrita, estabelecer uma interlocução com um leitor possível. Ao contrário, trata-se do preenchimento de um arcabouço ou esquema, baseado em fragmentos de reflexões, observações ou evocação desarticuladas². Ele está devolvendo, por escrito, o que a escola lhe disse na forma como a escola lhe disse. Anula-se, pois o sujeito. Nasce o aluno-função. Eis a redação. O autor do segundo texto, ao contrário , usa a modalidade escrita para contar uma história. Ainda que no outro pólo do processo de interlocução, a leitura possa ser prejudicada por problemas ortográficos e estruturais, há aqui de fato um texto, e não mera redação. Na verdade, o autor ainda não aprendeu o jogo da escola: insiste em dizer a sua palavra. Foi reprovado e repete a primeira série. O fator de considerarmos a sequência I como redação e a sequencia I como redação e a sequencia II como texto, e, portanto avaliarmos positivamente este e negativamente aquele, não quer dizer que tal texto não apresente problemas. Que fazer com eles? O problema mais óbvio é o relativo à ortografia oficial, e a prática da produção e da leitura de outros textos ajudará ao aluno a ultrapassar suas dificuldades. Apenas para facilitar, faço uma “tradução em ortografia oficial” do texto: Era uma vez um piolho que roía o cabelo de um menino piolhento dai passou um menino limpo sem piolho aí um menino piolhento daí o menino pegou piolho daí a mulher pegou piolho daí todo mundo saiu gritando todo mundo pegou piolho daí até seu filhinho pegou piolho. Mais interessantes do que os problemas ortográficos, neste texto, são as influencias da oralidade na escrita, repetições, uso de conectivos como “daí”, estruturação da narrativa, etc. É claro que entre este texto, tal como produzido, e um texto na modalidade escrita, variedade padrão, há um caminho a percorrer. Isto se aceitarmos a hipóteses de que o compromisso politico da aula de língua portuguesa é oportunizar o domínio também desta variedade padrão, como uma das formas de acesso a bens que, sendo de todos, são de uso de alguns. Para percorrer este caminho, no entanto, não é necessário anular o sujeito, ao contrario, é brindo-lhe o espaço fechado da escola que nele ele possa dizer a sua 30 palavra, o seu mundo, que mais facilmente se poderá percorrer o caminho, não pela destruição de sua linguagem, para que surja a linguagem da escola, mas pelo respeito a esta linguagem, a seu falante e ao seu mundo, conscientes de que também aqui, na linguagem, se revelam as diferentes realidades das diferentes classes sociais. É devolvendo o direito à palavra – e na nossa sociedade isto inclui o direito à palavra escrita – que talvez possamos um dia ler a história contida, e não contada, da grande maioria que hoje ocupa os bancos das escolas públicas. E tal atitude, parece-me, dá novo significado à questão “como avaliar redações?” apontando, no mínimo, para critérios diferentes daqueles que reprovaram o autor do texto, e aprovaram o “ (1) O primeiro texto é de um aluno que em 1983 frequentava a segunda serie do primeiro grau; o segundo texto é do aluno que está, em 1984, repetindo a 1ª. Os textos foram motivos de reflexão dos professores envolvidos nos projetos “Estratégias de leitura e produção de textos” (1983) e “Desenvolvimento de pratica de leitura e produção de texto “(1984) o Programa de Integração do ensino de primeiro grau e 3º grau. UNICAMP-IEL/MEC –Sesu. (observação: revisão) era. (2) Cfe. Cláudia Lemos. Neste artigo a autora considera e analisa as “estratégias de preenchimento” utilizadas por vestibulandos em suas redações. 1.9 - MARCO METODOLÓGICO: O trabalho será baseado na pesquisa bibliográfica, qualitativa e estudo de campo, a fim de que possamos descobrir os obstáculos enfrentados pelos alunos que frequentam a escola. Sendo estes do Ensino Fundamental, turma composta por alunos da faixa etária convencional, ou seja, 10 a 18 anos. Esta pesquisa dará apoio ao estudo de campo realizado com professores, alunos e suas respectivas famílias, sendo que o pesquisador fará visita usando a técnica de entrevista, pois é aplicável a uma número maior de pessoas, inclusive aquelas que não sabem ler e escrever, para obter as informações necessárias a fim de solucionar ou não o problema apontado, ou seja, porque os alunos do Ensino Fundamental não assimilam o estudo da Concordância Nominal. Caracterização da Pesquisa 31 Para atingir os objetivos proposto nesta investigação, o presente estudo é de natureza quantiqualitativa, utilizando a pesquisa de campo. Segundo Moreira (2007, p. 16), “ no estudo de campo o investigador observa (coleta de dados) a situação social ou institucional sem a manipulação de qualquer variável para poder estudar as relações entre atitudes, crenças, valores, percepções e condutas dos indivíduos e dos grupos.” E para a realização da coleta de dados, foi utilizado o método quantiqualitativo. Para Moreira (2007), os estudos de campo quantitativos guiam-se pelo modelo de pesquisa conhecido como hipotético dedutivo. Ao lançar mão deste modelo, o pesquisado parte de quadro conceituais de referência tão bem estruturados quando possível, a partir dos quais formula hipóteses sobre os fenômenos e situações que se quer estudar. Uma lista de consequências e, então deduzida das hipóteses. A coleta de dados enfatiza números (ou informações conversíveis em números) que permitem verificar a ocorrência o não das consequências, confirmando ou não, mesmo que de forma provisória, as hipóteses. Campo de investigação A pesquisa será realizada na Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho de Buritizeiro, Minas Gerais. População:A população deste estudo será constituída por alunos de 10 a 12 anos da Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho de Buritizeiro – MG, formando um total de 65 estudantes. Critérios de Inclusão: Será preciso ter a idade pré-estabelecida, autorização dos pais ou responsáveis, estar no local da pesquisa no momento da aplicação do questionário aceitar, participar da pesquisa. Amostra: Segundo Barros, Lehfelo (2000), geralmente as pesquisas são realizadas por meio de amostras. Isto se justifica porque nem sempre é possível obter informações de dados e elementos que compões a pesquisa, o universo ou a população que se deseja estudar. A mostra desta pesquisa será selecionada aleatoriamente, respeitando os critérios de inclusão. 32 Procedimentos A pesquisa será realizada no segundo semestre de 2012. No primeiro momento, será solicitado á Diretora Pedagógica da Escola uma autorização para a realização desta. Os questionários serão aplicados por critérios de acessibilidade, ou seja, participarão da pesquisa os sujeitos que estarão presentes no momento da coleta. Instrumentos Como instrumento de coleta de dados será utilizado o questionário com 10 questões, elaboradas pelo pesquisador, tendo em vista compreender a não assimilação do estudo da concordância Nominal. Pelos estudantes entre 10 a 12 anos, da Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho em Buritizeiro, Minas Gerais. Análise de Dados Os dados serão coletados, tabulados e analisados, considerando o referencial teórico pesquisado, que compõem a revisão de literatura. 33 CAPÍTULO II. ESTRATÉGIAS DE ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA Segundo Kleiman (1995, págs. 45 a 64.) a reflexão em torno da compreensão de textos não pode deixar de passar por uma reflexão sobre o componente textual desse processo. A materialização de uma intensão do autor se dá através de elementos tanto linguísticos como gráficos, cabendo ao leitor a recuperação dessa intensão através do formal. (...) Graças a essa sequencia virtuosa, o déficit publico seria eliminado, o juros cairiam, e o excesso de demanda na economia seria contido, brecando a inflação e ajudando o pais a exportar mais e importar menos. O saldo comercial também seria reforçado pela desregulamentação, redução de impostos, liberdade econômica, menor presença no governo na economia e a puritana dedicação individual e coletiva ao trabalho, que melhorariam a competitividade e a eficiência na economia . A materialização formal de categoria de significação de interessão pragmática deve ser reconstruída, então, para a compreensão. Veremos nesse capitulo dois aspectos importantes dessa materialização: a coesão e a estrutura do texto. Primeiramente consideremos, através da analise de um texto muito simples, quais seriam alguns elementos formais que concretizam um significado nesse texto; devemos lembrar, contudo, que o texto sugere, aproxima-se de um significado relevante, mas é o leitor quem deve construí-lo. O exemplo é o texto (3), a seguir, (3) CACHORRO Escrito num aviso na porteira de um sitio. Entre os elementos gráficos paratextuais que entram em jogo estão o tamanho da letra, que deve ser legível a distancia; o fato de a palavra estar numa placa e não num quadro negro em sala de aula, por exemplo. Entre os elementos linguísticos, podemos citar a forma sintática, pois trata de uma afirmativa (em vez da interrogativa CACHORRO? , que não teria a mesma força no contexto), sem estrutura sintaxe, pois trata de apenas uma palavra, sendo essa palavra melhor sucessiva do que uma mensagem do tipo “Avisamos aos que passam por aqui que existe no sitio onde se encontra este aviso um cachorro que poderá atacar as pessoas que entrarem sem autorização dos donos do sitio”). Um outro elemento linguístico que contribui para o sentido do texto é o seguinificado 34 convencional do item lexical cachorro; note-se por exemplo, a diferença que a mudança de item lexical produziriam: CAVALOS já não é mais um aviso para não entrar num lugar sem permissão. Tratando-se de textos mais extensos, os elementos que relacionam as diversas partes do texto são também instrumentais na construção de um significado global para o texto. O conjunto desses elementos que formam as ligações no texto é chamado de coesão. A fim de ilustrar o significado de coesão de examinemos o seguinte texto, de Bransford e McCarrell, bastante conhecido por ser ele um exemplo de texto com abundantes laços coesivos que poderiam servir de pistas para construção do significado, deixando, entretanto, a impressão no leitor de ser um texto vago (com muitas possíveis interpretações) ou obscuro (sem nenhuma interpretação possível): “O procedimento é muito simples. Primeiro você separa as coisas em grupos diferentes. É claro que uma pilha pode ser suficiente, dependendo de quanto há por fazer. Se você precisar ir a outro lugar por falta de equipamento, então esse será o segundo passo. Se não precisar pode começar. É importante não exagerar. Isto é, é melhor fazer umas poucas coisas de cada vez do que muitas. Isto pode não parecer importante imediatamente, mas as complicações podem começar a surgir. Um erro pode custar caro. No inicio o procedimento poderá parecer complicado. Logo, porem, ele sera simplesmente mais um fato da vida. É difícil prever algum fim para a necessidade desta tarefa no futuro imediato, mas nunca se sabe. Depois de o procedimento ter sido completado, você devera agrupar os materiais em diferentes pilhas novamente. Em seguida eles podem ser guardados nos lugares apropriados. Um dia eles serão usados, mas uma vez e os ciclo então terá que ser repetido. Com tudo, isso faz parte da vida” (Trad. De Bransford e McCarrel, op, cit.). São vários os elementos formais que contribuem para a formação de relações coesivas no texto a cima: a palavra procedimento é repetida três vezes, indicando, graças a convenções que examinaremos logo, que se trata de um mesmo fato; também a palavra coisa é repetida duas vezes no pequeno trecho; o uso do artigo definido na frase os materiais indica que não é um elemento pela primeira vez referido no texto, fazendo com que o leitor tente procurar algum outro lemento ao qual estaria ligado; assim, essa frase pode ser interpretada como substituindo as coisas porque ambas estariam se referindo a um mesmo objeto; também o uso da frase esta tarefa, com o uso do pronome dêitico esta, leva o leitor a procurar, no contexto imediato, um elemento ao qual o dêitico se refere, (“a tarefa de que estamos falando”) e sugere a substituição de tarefa por procedimento, pela 35 semelhança no significado de ambos os itens e pelo fato de ser esse o tópico do trecho. O mesmo acontece com o uso do dêitico esse, que também remete ao contexto imediatamente anterior (... precisar ir ao outro lugar). O uso dos pronomes ele e eles, palavras que substituem nomes, faz com que o leitor procure palavras que poderiam servir de antecedente para estes pronomes, sendo as mais prováveis procedimentos e materiais respectivamente, pois o tópico é a descrição de um procedimento havendo então uma tendência a interpretar os elementos anafóricos (pronomes, dêiticos) como se referindo ao tópico. Podemos dizer ainda que há elementos elípticos cuja ausência também ajuda a formar laços coesivos. Consideremos o seguinte extrato: “se não precisar pode começar”. Ao perguntamo-nos “se não precisar o quê?” a resposta vem também do contexto imediato, com o qual, mediante a reconstituição da frase elíptica, “se não precisar ir a outro lugar por falta de equipamento”, é formada uma ligação. Podemos afirmar que o texto abunda em ligações coesivas isto é, repetições, substituição, pronominalizações, uso de dêiticos, elementos internos ao texto que permitem construir, com base na leitura, um cenário enxuto, com poucos elementos, devido à expectativa de que se trata dos mesmo objetos, ou eventos, ou fatos referidos varias vezes mediante léxico diversificado. Nesse procedimento de construção do cenário de leitura estaríamos guiados por um principio de economia, chamado de principio de parcimônia, que estabelece que o leitor tende a reduzir ao mínimo o numero de personagem, objetos, processos, eventos desse quadro mental que ele vai construindo a medida que vai lendo. O texto que permite, graças a abundantes marcas formais, essa redução é um texto coeso e, portanto, o texto a cima pode ser considerado um texto coeso. Isto não implica necessariamente que ele seja um texto coerente: muitas vezes conseguem construir um significado para ele (lavar roupas, lavar pratos, tirar xerox, trabalho burocrático etc.) mas também muitas outras não conseguem achar um significado global que o tornem coerente. Às vezes, a presença de um item lexical pode fazer a diferença entre um texto coerente ou incoerente. O elemento formal funciona aí como o ele que permite ligar as diferentes partes do texto, que antes eram uma sequencia de informações que não faziam sentido, pois não estavam relacionadas entre si. Consideremos um exemplo: (5) “O homem estava preocupado. Seu carro parrou, por fim, e ele estava 36 completamente só. Estava muito frio e escuro. O homem tirou o seu casaco, abaixou o vidro da janela e saiu do carro tão rapidamente quanto foi possível.Em seguida usou toda sua força para se movimentar o mais rapidamente que podia. Sentiu-se mais calmo quando por fim conseguiu ver as luzes da cidade, embora ainda estivessem muito distantes” ( Trad. De Bransford e McCarrell, op. Cit.). Na experiência que Bransford e McCarrell realizaram, utilizando o texto a cima, os leitores deviam responder rapidamente duas perguntas após a leitura do texto: “ Por que o homem tirou o casaco” ? “Por que ele abriu o vidro da janela” ?. Os leitores demonstram confusão e incerteza nas repostas, pois não há no texto elementos formais que permitam inferir uma única resposta certa: há elementos coisivos suficientes para a construção de um cenário unificado, mas o esquema que vem à mente (quebra do carro) não permite ligar as informações sobre o caso e a janela do carro num todo coerente. Já quando a informação adicional de que o carro estava submergido (“seu carro submergido por fim parou...”) é introduzida, temos a pista formal que permite ligar todos os dados para formar o contexto adequado. O processo através do qual utilizamos elementos formais do texto para fazer as ligações necessárias à construção de um contexto é um processo inferencial de natureza inconsciente, sendo, então, considerada uma estratégia cognitiva da leitura. As estratégias cognitivas regem os comportamentos automáticos, inconscientes do leitor, e o seu conjunto serve essencialmente para construir a coerência local do texto, isto é, aquelas relações coesivas que se estabelecem entre elementos sucessivos, sequenciais no texto. Há vários princípios que modulam e guiam esse processo inferencial automático: já citamos o principio de economia, ou de parcimônia, que é um principio geral que por sua vez determinaria varias regras: a regra da recorrência, por exemplo, serviria para explicar a expectativa de que o cenário textual apresente um numero limeto de objetos, ou personagens, ou eventos, pois espera-se que estes recorram no texto e que essa recorrência seja marcada mediante vários mecanismo, como repetições, substituição, pronominalizações, uso de dêiticos e de frases definidas. Vejamos como essa regra determina a ligação de um texto: consideremos a fabula que já discutimos no capitulo um e que agora transcrevemos na sua totalidade, chamada “o veado e a moita”: 37 (6) “Perseguido pelos caçadores um pobre veado escondeu se bem quietinho dentro da serrada moita.O abrigo era tão seguro que nem os cães o viram. E o veado salvou-se. Mas, ingrato e imprudente passado o perigo, esqueceu o beneficio e pastou a bem feitora. Comeu toda a folhagem. Fez e pagou. Dias depois voltaram os caçadores. O veado correu à procura da moita, mas a pobre moita, sem folhas, não pode mais escondê-lo, e o triste animalzinho acabou estraçalhado pelos dentes dos cães impiedosos” Os pronomes (“nem os cães o viram”, “a moita não pode mais escondê-lo”) são elementos que ajuda o leitor a ligar diferentes partes do texto através da procura de possíveis antecedentes desses pronomes que permitam achar, para esse antecedente e seu pronome, uma referencia única (“o veado”, neste caso). Haveria assim a recorrência de um mesmo elemento através do uso do pronome, em vez da introdução de um novo elemento. Também é possível interpretar a ocorrência de diversos nomes, que às vezes não são sinônimos nem relacionados no significado (num mesmo campo semântico), por exemplo, como sendo substituições de um pelo outro, devido ao principio de recorrência. Assim, no texto encontramos a substituição de “veado” por “animalzinho”, nome de categoria à qual o veado pertence é, portanto, semanticamente próximo e consequentemente fácil para o leitor reconstruir? A fim de compreender a moral da historia, mas também encontramos outras substituições, menos transparentes, pois precisam de uma inferência que não se apoia na semelhança de significado: a substituição de “moita” por “bem feitora” depende do leitor inferir que “ a moita fez um beneficio ao veado ao salvá-lo, dai a moita ser a bem feitora”. No texto, também há repetições que o torna coeso : as repetições do item lexical já definido mediante o uso do artigo (“E o veado salvou-se”) contribuem para a formação desse cenário enxuto: interpretamos a segunda ocorrência da palavra “veado” como se referindo a um mesmo animal. A regra de continuidade temática é outra regra que regula os comportamentos automáticos, inconscientes do leitor na procura de ligações no texto. Ela oermite a interpretação de elementos sequenciais, separados, como estando relacionados por um mesmo tema: a expectativa de que se um tema é abandonado para a introdução 38 de um novo tema, eles devem estar relacionados, e a relação deve ser inferivel ou materializada formalmente, ou ambos. Considera-se novamente o exemplo (6) acima. Se a historia terminasse da seguinte forma: “dias depois voltaram os caçadores. O animalzinho voou à procura da moita”, ao invés de inferir que um novo tema está sendo introduzido ( a caça de pássaros ou animais que voam ) os leitores tendem a interpretar “voar” no sentido metafórico, “correr muito rapidamente”, estratégia esta determinada pela regra de continuidade temática. O esquema de conhecimento ativado (vide capitulo 1) permite que elementos desconexos sejam interpretados como pertencentes a um universo unificado, continuo, que esse esquema representa. Sem essa representação, as marcas do papel seriam desconexas e descontínuas. Veja-se por exemplo, que a leitura da palavra “folhagem”, com artigo definido, não causa surpresa uma vez que a referencia anterior à “cerrada moita” implica uma série de componentes desse objeto, mação dada, permitindo assim a inferência. Há outros princípios que regem as estratégias cognitivas já não relacionados à economia, mas à ordem natural. O chamado princípio de canonicidade agrupa vários princípios vários princípios sobre como essa ordem se reflete na linguagem: por exemplo, que a causa antecede o efeito, que a ação antecede o resultado. Conjuga-se este principio a uma regra de linearidade que pressupõe que a materialização linear (no papel) dos elementos formais reflete essa ordem natural. Pressupomos, então, que o antecedente precede o pronome, que o indefinido passa a ser informação sobre o tópico. Quanto mais o texto se conforma a essa expectativas, mais automáticas serão as inferências que permitem as ligações de elementos; quando o texto não se conforma a essa expectativas, haverá necessidade de desautomatização para compreender, e o texto pode se tornar às vezes mais difícil. A estória do exemplo 96) acima é uma estória aresentada na ordem canônica: a sequencia de eventos é apresentada linearmente numa sequencia natural, as causas (perseguição, por exemplo) precedem as consequências (procurar esconderijo). A regra de linearidade (às vezes também chamada de máxima de antecedêrcia) também orienta as estratégias através das quais o leitor constrói laços coesivos, pois através dela o leitor poderá estabelecer relações entre pronomes anafóricos, dêiticos, e seus antecedentes. Quando a ordem não é linear sequencial, 39 então a leitura pode se tornar mais complexa, pois faz-se necessário procurar conscientemente o nome ao qual o pronome se refere; um exemplo de ordem linear não canônica seria se a historia discutida constasse o seguinte trecho: “ele correu à procura da moita, mas a pobre moita, sem folhas, não pôde mais esconder o veado”. As regras que regem as estratégias cognitivas funcionam não só a nível semântico, mas também a nível sintático, orientando o processo de segmentação. A regra de distancia mínima, (também chamado principio de distancia mínima), por exemplo, funciona nesse nível, pois trata-se de uma regra de base perceptual que diz que quando há mais de um possível antecedente de um pronome ou de um deitico, aquele mais próximo será interpretado como o antecedente. Assim, num exemplo como a seguir, extraído do jornal folha de São Paulo, “prefere agarrar-se à hipótese de que a midança introduzida na economia pelo novo plano econômico é de tal forma inédita que as pessoas ainda não a assimilaram completamente” ( 1989 ). O pronome a será interpretado como correferencial de a mudança, o nome antecede mais próximo, e não como correferencial de a hipótese, mais distante linearmente. Quando há informação de outro nível, como do nível semântico , ou informação de caráter extralinguístico que determina uma interpretação contraria, é esse ultimo tipo de informação o decisivo. Há um principio mais geral, o principio de coerência que diz que quando há interpretações conflitantes devemos escolher que torne o texto coerente. Outro principio de ordemgeral, o princípio da relevância, que em caso de informações conflitantes devemos escolher aquele mais relevante ao desenvolvimento do tema, também substitui princípios locais. Assim, por exemplo numa sequencia como no exemplo , a seguir, “mais uma pérola da sabedoria nacional para o samba do crioulo doido: o plano de retirada da população de Angra, em caso de acidente, é segredo militar. Também, ele não será mais necessário, pois, o problema do pânico já está resolvido: o alarme foi desligado” (R. M. U. Hebling, painel do leitor, folha de São Paulo, 12/2/89). Interpretaremos o pronome ele como correferencial de plano de retirada, apesar da proximidade de segredo militar, pois vários princípios de relevância e de coerência, tanto a nível local, como a nível temático, determinam uma outra regra, já mencionada, referente à manutenção do tópico, que diz que os pronomes como mais de um possível antecedente são interpretados como sendo correferencial do 40 tópico discursivo que, no exemplo em questão, é “plano de retirada” e “não segredo militar ”. A regra de não contradição é também uma regra determinada pelo principio de coerência. A nível local, por exemplo, ela orienta uma leitura do trecho a seguir “Mesmo em um programa de silvio santos, candidato a sua sucessão”, determinando que o fecho dessa frase seja suspenso até achar para o pronome sua um antecedente mais adequado do que Silvio Santos que tornaria a frase contraditória, inconsistente como o nosso conhecimento de mundo. A continuação da sequencia, “Sarney costa haveria de ser reprovado, se revelasse o mesmo desconhecimento de noções primarias demonstrado na ultima entrevista concedida a esse jornal” (Newton Rodrigues, um sábio no poder, folha de São Paulo, 12/2/89). Fornece os elementos necessários para tornar o trecho ao mesmo tempo coeso e coerente, não contraditório. Na leitura há uma constante interpretação de divisões níveis de conhecimento, de nível sintático, semântico e extralinguístico a fim de construir a coerência tanto local (mediante a construção de laçõs coesivos entre as sequencias) como temática (mediante a construção de um sentido único para essa sequencia de elementos). O processamento do texto, isto é, o arupamento e transformação de unidades de um nível (por exemplo, letras) em unidades significativas de outro nível (por exemplo, palavras)se faz tanto a partir do conhecimento prévio e das expectativas e objetivos do leitor (chama-se esse tipo de processamento descendente ou de-cimapara-baixo) quando a partir de elementos formais do texto a medida que o leitor os vai percebendo (chama-se esse tipo de processamento ascendente, ou de-baixopara-cima). Neste breve incursão no processamento do texto e no papel das estratégias cognitivas, examinamos aquelas que funcionavam a nível local, nível este também chamado de microestrutura. Isto é, examinamos aqueles princípios e regras que orientam os processos inconscientes do leitor na reconstrução de laços coesivos entre elementos contíguos, sequenciais no texto. No entanto, os princípios discutidos, como os princípios de parcimônia, de canonicidade, de coerência, funcionam também a nível temático ou da macroestrutura do texto, isto é, a nível de sequencias maiores, como períodos e parágrafos, que avançam o desenvolvimento 41 do tema global. De fato, as regras discutidas, excetuando apenas as regras de segmentação (como a regra de distancia mínima) funcionam também no nível da macroestrutura: As regras de recorrência, de linearidade, de continuidade temática, de não contradição são todas regras cujo funcionamento se dá também a nível macroestrutural, permitindo assim o estabelecimento de relações entre unidades não contiguas no texto. Também as relações da macroestrutura podem ser marcadas formalmente no texto. No texto acima, sobre a série de passos para a realização de uma tarefa, tínhamos o procedimento dividido em quatro etapas, a saber: separação dos materiais, procura e uso do equipamento, reagrupamento dos materiais e armazenamento dos mesmos, etapas estas marcadas formalmente pelas expressões primeiro: segundo (passo), depois, e em seguida. Essa materialização auxilia na reconstrução do tema, a saber a descrição dos diversos passos de um procedimento. A marcação formal do tema ajuda na reconstrução do mesmo. No exemplo a seguir, os marcadores formais tornam transparente o desenvolvimento, que começa anunciando o tema, que será a apresentação da teoria do autor no momento de produção do texto: “atualmente penso que minha teoria de leitura é uma teoria que se aplica não somente ao inglês, mas à leitura em todas as línguas. Neste trabalho defendo o ponto de vista da leitura sob uma perspectiva universal, multilíngue, e levando em consideração o desenvolvimento”. Continua, então anunciando, também claramente através de elementos formais (“entretanto”, “antes”...) uma digressão: “entretanto, antes de fazê-lo, pode ser útil expor meu ponto de vista teórico dentro do contexto histórico da educação norteamericana...” Após uma extensa apresentação desse contexto histórico, anuncia-se no texto o fim da digressão, e o inicio da apresentação da teoria: “podemos resumir isso, dizendo que foi havendo um incremento de uma tecnologia sistemática para ensinar a ler, baseada em um vocabulário controlado e no desenvolvimento de uma hierarquia de habilidades...” (Goodman, K. “O processo de leitura: considerações a respeito das línguas e do desenvolvimento”, em Ferreiro, E. e Palacio, M. G. ( comps.) Os processo de leitura e escrita, porto alegre, Ed. Artes Médicas, 1988, 11-12) 42 É claro que os mecanismos formais para a manutenção e para a progressão temáticos não são uma exigência de boa formação textual; no entanto, a leitura pode se tornar mais fácil, sem que haja necessidade de desautomatização de estratégias, quando há elementos linguísticos que materializam esse desenvolvimento; de outroa maneira, pode ser o caso, especialmente tratando-se de leitores menos proficientes, que estes encontrem dificuldades para relacionar os parágrafos. De crucial importância para esta ligação é a depreensão do tema: se o leitor não conseguir formular uma hipótese flexível sobre o tema, então a construção de ligações textuais torna-se difícil, ou até impossível. Consideremos, para exemplificação, os três textos a seguir, que foram apresentados a diversos leitores proficientes: “para não carregar nas tintas do péssimo, dizendo que este País é, ou está, inteiramente desacreditado, convém dizer, simplesmente, que se trata de um País incrível. Em termos freudianos, o oswaldiano país sem pecado deliberou reger-se pelo principio do prazer, arredando a todo custo e preço as interferências do principio da realidade. O único mal é que há limite para esse bovarismo, para a abertura do ângulo entre o sonho e a realidade: além dele, corre-se o risco de mergulhar nos terrores da esquizofrenia e da alienação”. “é uma miniatura urbanística: a rua, a praça, os edifícios. Rígida ossada alvacenta de concreto, ruinas cenográficas construídas para o presente, certamente servirá de cenário para muito filme. D. W. Griffith o teria adorado, para ele rodar, de um balão cativo, as cenas babilônicas de seu “intolerância”; e Wyler não teria hesitado em transformá-lo naquele Circo Máximo romano, onde Charlton Heston/Bem Hur se celebrizou numa emocionante corrida de quadrigas”. “trata-se de uma arquitetura nostálgica, dos anos 50, especialmente o seu repuxo congelado, de gosto duvidoso, nascido dos muitos arcos que naquele período enfeitaram, ou enfeiaram, cidades e feiras internacionais. Uma obra cuja concepção estática de espaço atual, estruturado mais segundo vetores de natureza eletrônica, do que segundo nervuramentos sólidos”. Os leitores deviam responder à pergunta: Você acha que os trechos são de um mermo texto, de dois textos diferentes ou de três textos diferentes?” A maioria dos leitores optou por dois ou três textos diferentes, pois ou achavam que não havia relação entre os trechos, ou achavam que os trechos em (11) e (12) versavam sobre um mesmo assunto, isto é, cenários para o cinema. 43 Entretanto, trata-se dos três parágrafos iniciais de um texto, de D. Pignatari, publicado na folha de São Paulo quando da inauguração do Sambódromo do Rio de Janeiro, texto que na época argumentava contra essa construção. Sem a reconstrução do tema permite construir, os blocos de informação parecem desconexos, e a organização e hierarquização entre as diversas informações fica menos acessível. Há evidencias de que a organização que dos parágrafos e importante para determinar o sucesso ou insucesso na compreensão de um texto, tratando-se de alunos com problemas na área de leitura. Os leitores procuram a coerência, mas têm regras inadequadas, no nível cognitivo, que regem essa procura. Assim, encontramos evidencias de que os alunos trem regras inflexíveis para a depreensão do tema, que interferem negativamente na compreensão do texto quando este não corresponde à hipótese inicial do leitor. Alguns autores apontam que parágrafos que não começam com o tema ou tópico central são mais difíceis de ser compreendidos por crianças com problemas de leitura. Assim, por exemplo, dado um paragrafo que começa como em a seguir, “Durante muito tempo as estórias em quadrinhos foram tidas e havidas cp,p i,a subliteratura prejudicial ao desenvolvimento intelectual das crianças. Sociólogos apontavam-nas como uma das principais causas da delinquência juvenil. Aos poucos, porém, foi se verificando a fragilidade dos argumentos daqueles que investiam contra os quadrinhos...” (M. Cirne, A explosão criativa dos quadrinhos, Ed. Vozes, 1974). Os escolares tenderiam a organizar suas respostas referentes ao tema como se este fosse constituído por informação negativa sobre as estórias em quadrinhos, ignorando a informação posterior que esclarece que a tese do autor é favorável aos quadrinhos. Um parágrafo organizado dedutivamente, com a informação temática, ou principal, no seu inicio, como no exemplo , a seguir; “Existe um tipo de experiência vital – experiência de tempo es espaço, de si mesmo e dos outros, das possibilidades e perigos da vida – que é compartilhada por homens e mulheres em todo o mundo, hoje. Designarei esse conjunto de experiências como “modernidade”. Ser moderno é encontrar- se em um ambiente que promete aventura, poder, alegria, crescimento, autotransformação e transformação das coisas em redor – mas ao mesmo tempo 44 ameaça destruir tudo o que temos, tudo o que somos...” (M. Berman, Tudo que é solido desmancha no ar:a aventura da modernidade, S.P.: Companhia das Letras, 1986.) causaria menos problemas para esses leitores, que não conseguem reformular uma hipótese inicial adequada, baseada num tipo de regra de antecedência: a de precedência do tópico. Outro caso desta regra, que leva o leitor a equacionar a informação principal ou temática com o primeiro bloco de informação do parágrafo, é a identificação do titulo com o tema do texto. Isto faz com que textos cujos títulos não correspondem ao tema não sejam compreendidos, ou sejam distorcidos, pois o leitor considerará como temática ou subtemática apenas aquelas informações relativas a sua primeira hipótese, com base no titulo, e tendera a ignorar aquilo que para ele é mero detalhe. Como, de fato, e comum tento nos livros didáticos como em outros textos, fornecer títulos que para o interesse do leitor, sem que reflitam necessariamente a informação mais alta na macroestrutura, há então inúmeras possibilidades de o leitor menos eficiente fracassar na depreensão do tema. A depressão da linha temática e a construção de laços coesivos enetre elementos descontínuos no texto tornam-se possíveis graças ao conjunto de regras orientadas pelos principais de coerência temática, de parcimônia, de relevância, de canonicidade discutidos anteriormente. O processo é essencialmente um processo de nível cognitivo, que funciona sem o nosso controle consciente quando o texto atende às nossas expectativas; já quando o texto não corresponde às expecativas e crenças, quando ele é inesperado, é necessário, às vezes, que o leitor faça a monitoração consciente e a desautomatização de suas estratégias cognitivas para assim compreendê-lo. Numa discussão sobre marcação formal no texto não poderíamos deixar de incursionar brevemente na marcação da estrutura abstrata do texto, também chamada de superestrutura, que já descrevemos no Capitulo 2. No exemplo a seguir, extraído de um conto chamado “Matando cobra” de Landi e Siqueira, as categorias da estrutura narrativa estão materializadas em diversos momentos da história: (15ª) “(...) Em 1975, estávamos na aldeia Sagarana no meio dos índios Pakaa Nova e por onde andávamos ia um bando de crianças atrás. Pouco sabíamos de índios ainda, esávamos aprendendo, tentando nos livrar da vida da cidade frande 45 um dos meus maiores medos na ocasião, que ainda hoje persiste embora em menor dose, era ser picado por cobra. (...) Na aldeia havia um chiqueirinho onde eu criava um leitãp, presente do chefe de posto que eu havia substituído. Como na aldeia só havia alimentos resultantes da caça e da pesca, quase sempre antas e porcos-domato, eu vivia sonhando com meu leitãozinho assado, com um pernil bem tostado.” O cenário, uma das categorias da narrativa, é construído através de um quadro referencial em que tempo e espaço são identificados, primeiros grosseiramente (em 1975, na aldeia de Sagarana); logo depois o espalho é especificado mais precisamente (na aldeia havia um chiqueirinho...); outros dados relevantes sobre as personagens (era recém chegada, e por isso ignorante, sonhava com comer carne de porco) São ai introduzidos, e identificados como informações de fundo pelo uso constante do pretérito imperfeito. A história continua da seguinte forma: Certa manhã, fui levar umas cascas de mandioca para o leitão e me deparei com uma cobra perto do chiqueiro. Era uma “papa amarela”, venenosíssima (pelo menos foi o que eu deduzi na hora). Não tive dúvidas: pelo leitão eu faria qualquer coisa, ate enfrentar cobra. Como minha coragem tinha limite, fui apahar o revólver...” Também o inicio da complicação é claramente marcada, através do uso de uma expressão temporal que marca um ponto no tempo (“certa manhã”) e através do relato de uma série de ações no pretérito. Depois de várias ações serem relatadas, até o momento da resolução da história. “...uma das crianças se desgarrou do grupo, se aproximou por trás da cobra, apanhou-a pelo rabo e bateu forte com a cabeça dela numa pedra. A cobra morreu na hora e o garoto, sorridente, entregou-a para mim.” Os autores ainda fazem uma avaliação final, ou “coda” também marcada formalmente: o texto fornece informação de pano de fundo sobre a reação do relator, no pretérito imperfeito, e já mais uma ação, no perfeito, que constitui o fecho: “Depois dessa não me faltava nada, pensei. Mas estava enganado. Alguns dias depois uma sucuri jantou meu leitãozinho” (Landi, O. e Siqueira, E. Coisa de índio, Ed. Icone, 1985). Na ausência de elementos formais que permitam a ativação de conhecimento de mundo, como no exemplo que apresentamos no Capitulo 1, versando sobre a 46 descoberta da América por Colombo, são as pistas formais da macroestrutura as que fornecem grande parte das informações relevantes para uma interpretação. Numa experiência realizada por nossos alunos com crianças de 8.ª série, que consistia na leitura do texto sobre Colombo, tantas vezes quantas fossem necessárias, seguida de uma paráfase do mesmo, os alunos melhor sucedidos (pois conseguiram impor algum sentido unitário, global à pará frase), foram aqueles que, perceberam primeiramente os grandes componentes estruturais do texto, e, segundo, conseguiram reproduzir os três componentes do texto em sua paráfrase: por exemplo primeiro, o trecho em que constava a introdução do personagem (“Nosso herói”) e de seu problema; segundo, o momento em que a aventura, ou complicação,começa, marcada pela palavra então, e, terceiro, o momento de resolução da complicação, com o desfecho da aventura, marcado pelo advérbio finalmente. Essas três partes foram reproduzidas nas estórias dos escolares, divididas estas também em três momentos, ainda que com conteúdo totalmente divergentes (como, por exemplo, um cunho social que interpretou que o herói era um padre religioso que sustentava a tese de que o alimento (“o ovo”) era mais importante do que o objeto material (“a mesa”) dada a fome do mundo). Em relação à estrutura expositiva, déssemos que ela consta de diversas categorias, tais como: explicação (que seria formada por categorias de tese e evidência), analogia, contraste e comparação (que seria formada por categorias de tese e evidência), analogia, contraste e comparação (que seriam formadas pelos termos comparados ou contrastados), causa (que teria o par causa e efeito) avaliação (que teria uma tese e um comentário sobre essa tese), prova informal (que teria uma premissa e uma conclusão); estas categorias podem ser recursivas, isto é, elas recorrem várias vezes no texto, como se se tratasse de círculos concêntricos, onde cada círculo forma uma nova categoria para um círculo maior, o maior de todos sendo o tema do texto. Também há evidencias de que categorias abstratas que são materializadas no texto são percebidas mais facilmente pelo leitor: numa experiência com alunos, em que eram comparados trechos com marcadores explícitos versus trechos sem esses marcadores, mas nos quais havia marcadores implícitos, pois eles articulavam um contraste temático (a saber, “a energia nuclear pode ser letal, mas também pdoe ser usada para fins pacíficos”), os leitores que leram a versão apresentada em , com 47 os marcadores explícitos mas, também perceberam muito melhor o contraste temático e conseguiram reproduzi-lo “... Mas a energia nuclear pode também ser usada para fins pacíficos ? Algumas indicações nesse sentido já foram percebidas nos resultados das primeiras experiências com essa fonte de energia que pdoe tornar a vida humana fantasticamente mais confortável.” Muito mais facilmente do que leitores que leram um texto que continha um trecho como em a seguir, uma versão sem o contraste explicito: “A energia nuclear pode ser usada para fins pacíficos? Algumas indicações nesse sentido já foram percebidas nos resultados das primeiras experiências com essa fonte de energia que pode tornar a vida humana fantasticamente mais confortável...” A exploração de elementos formais na reconstrução de relações lógicas é, também, uma característica do leitor proficiente. Na ausência desses elementos, no entanto, esse leitor é capaz de perceber a organização textual abstrata, ou superestrutura, componente este que, junto com a informação sequencial ou microestrutura (ou estrutura de conteúdos, também conhecida como estrutura temática), fornece ao leitor os dados necessários para a leitura que, como explicávamos anteriormente, se faz a partir de elementos que o leitor traz à tarefa, por um lado, num processamento descendente e, por outro a partir de elementos formais do texto, (elementos estres parcialmente discutidos neste capítulo), num processamento é essencialmente de caráter cognitivo, mas quanto mais complexo for o texto, mais se faz necessário o de manutenção de objetivos e monitoração e desautomatização do processo de compreensão. 2-Investigar a adequação da concordância, da pontuação e da ortografia nas redações desses alunos, sob o aporte de vários teóricos. Conforme Travaglia (2009), todos aqueles que dão aula de Português como língua materna têm uma ideia clara sobre como tem sido o ensino de gramática em nossas escolas tanto no ensino fundamental quanto no médio. Aqui são fundamentais duas questões: para que se ensina e o que se ensina, de que naturalmente vai derivar o como se ensina. Neves (1990) fez um levantamento sobre estas duas questões, que aproveitamos aqui ao lado de alguns elementos extraídos de nossa experiência com o ensino de gramática. 48 O ensino de gramática em nossas escolas tem sido primordialmente prescritivo, apegando-se a regras de gramática normativa que, como vimos, são estabelecidas de acordo com a tradição literária clássica, da qual é tirada a maioria dos exemplos. Tais regras exemplos são repetidas anos a fio como formas “corretas” e “boas” a serem imitadas na expressão do pensamento. Nas aulas há uma ausência quase total de atividades de produção e compreensão de textos (o que talvez atendesse mais o objetivo proposto no capítulo 1 de desenvolver a competência comunicativa). Observa-se também uma concentração muito grande no uso de metalinguagem no ensino de gramática teórica para a identificação e classificação de categorias, relações e funções dos elementos linguísticos, o que caracterizaria um ensino descritivo, embora baseado, com frequência, em descrição de qualidade questionável. A maior parte do tempo das aulas é gasta no aprendizado e utilização dessa metalinguagem, que não avança pois, ano após ano, se insiste na repetição dos mesmos tópicos gramaticais: classificação de palavras e sua flexão, análise sintática do período simples e composto a que se acrescentam ainda noções de processos de formação de palavra e regras de regência e concordância, bem como regras de acentuação e pontuação. Alguns professores ainda realizam estudos de acentuação e pontuação. Alguns professores ainda realizam estudos de figuras de linguagem e bem menos frequentemente de versificação. Como bem registra Neder (1992: 56), a gramática é dada “para se cumprir um programa previamente estabelecido sem se levar em conta as dificuldades ou não dos alunos no emprego que fazem efetivamente da linguagem, nessa ou naquela ocasião, num processo de interação verbal”. O estudo de Neves (1990), em pesquisa feita com 170 professores de ensino fundamental (5ª a 8ª séries) e ensino médio no estado de São Paulo, deixa bem clara a situação do ensino de gramática em nossas escolas, pois, embora seja uma pesquisa o âmbito de um estado, todos hão de concordar que a situação é mais ou menos a mesma em todo o país. Quanto ao objetivo de ensino de gramática, no levantamento feito junto aos professores Neves (1990: 10 e 11) registra que, em resposta à pergunta “para que se ensine à gramática?”, quase 50% dos professores fazem indicações que se refere ao bom desempenho, com destaque ao desempenho ativo (melhor 49 expressão, melhor comunicação, melhor compreensão); cerca de 30% das indicações referem-se a questões normativas (maior correção, conhecimento de regras ou de normas, conhecimento do padrão culto) e cerca de 20% de ligam a uma finalidade teórica (aquisição das estruturas da língua/melhor conhecimento da língua/conhecimento sistemático da língua/apreensão dos padrões da língua/sistematização do conhecimento da língua) e menos de 1% dis orifessires declarou que só dá aulas de gramática para cumprir o programa, embora os passos ulteriores da pesquisa tenham mostrado que a desvalorização da gramática ocorre numa porcentagem bem maior do que a declarada. Quanto à pergunta “Para que se usa a gramática que é ensinada?”, Neves regista que a maioria das indicações se liga ao melhor desempenho linguístico, registrado como “falar e escrever melhor” e ligado a sucesso na vida prática. O melhor conhecimento da língua vem traduzido em sucesso em concurso e bom desempenho social e profissional e como instrumento de ascensão social e segurança, embora também venha apontado como utilizável “para nada”. O ensino de gramática (teoria) aparece como algo desligado de qualquer utilidade ou utilização prática, tendo objetivo em si mesmo; já a finalidade de cumprir o programa vem ligada ao sucesso na própria sala de aula, ou seja, apenas acertar exercícios. Tudo isto aponta para o fato de que para a maioria dos professores não há uma real necessidade para o ensino de teoria gramatical. Por que, então, a insistência nesse tipo de atividade em sala de aula? Talvez comodismo, desconhecimento de alternativas e outras razões alegadas como: exigência do currículo, dos pais, da sociedade em seus concursos. No que diz respeito ao que é ensinado, Neves (1990: 12-14) registra que as áreas do programa de Língua Portuguesa que mais são trabalhadas por ordem de frequência são as seguintes: 1 – Classes de palavras............................................................. 39,71% 2 – Sintaxe.................................................................................35,85% 3 – Morfologia...........................................................................10,85% 4 – Semântica............................................................................3,37% 5 – Acentuação..........................................................................2,41% 6 – Silabação.............................................................................2,25% 7 – Texto...................................................................................1,44% 8 – Redação..............................................................................1,44% 50 9 – Fonética e Fonologia............................................................0,96% 10 – Ortografia..........................................................................0,80% 11 – Estilística...........................................................................0,32% 12 – Níveis de linguagem...........................................................0,32% 13 - Versificação.......................................................................0,16% Os exercícios de reconhecimento e classificação de classes de palavras e de funções sintáticas correspondem a mais de 70% (75,56%) das atividades de ensino de gramática, aparecendo em todos os grupos de professores pesquisados. Confirma-se, pois, a afirmação inicial de que os mesmo tópicos gramaticais são repisados ano após ano, no ensino fundamental e médio. Ainda quanto ao que se deve ensinar Soares (1979) afirma que não há consenso a respeito do ensino de gramática: há escolas e professores cujo programa de Língua Portuguesa é só uma lista de tópicos gramaticais, escolas e professores que sistematicamente não ensinam gramáticas (teoria) com a justificativa de que o papel do professor cujos programas contêm basicamente “atividades”, mas contêm também tópicos gramaticais (normalmente os que aparecem no livro didático adotado). Essa diversidade de posições seria consequência das diversas orientações emanadas das secretarias de educação e delegacias e ensino, de diferentes formações dos professores (dentro de teorias linguísticas mais tradicionais ou mais modernas) e da influência do livro didático adotado. Neves (1990) também registra como é ensinada a gramática dizendo que mais de 50% dos professores declara que partem de texto (muitas vezes dos próprios alunos) para a exercitação gramatical, cerca de 40% declara partir da teoria e cerca de 5%, declara privilegiar a exercitação como ponto de partida das lições. Verificou-se que o partir do texto signigica “retirar de textos” unidades (frases ou exemplos) para análise e catalogação. No como se ensina tem papel relevante o livro didático, que, infelizmente, aparece como a única fonte de consulta e informação da grande maioria dos professores no que diz respeito a fatos da língua. Soares (1979) diz que há três orientações metodológicas naus frequentes para o ensino de gramática. Na primeira, que ela chama da gramática ao uso da língua, ensina-se gramática (entenda-se teoria gramatical) para que os alunos usem a língua com eficiência, a partir do entendimento da organização desta. Aqui, partindo de uma 51 concepção normativa de gramática, pressupõe que adquirindo conhecimentos a respeito da língua e normas a respeito de seu uso o aluno aprenda a usar a língua. Acredita-se, pois, que “o aluno é capaz de fazer automaticamente a transferência de conhecimentos para comportamentos (escrever, falar, ler, ouvir)”. Neste caso devese questionar se esse tipo de gramática realmente descreve o funcionamento da língua e se os alunos realmente conseguem transferir o conhecimento sobre a língua para seu uso. Vários autores estão de acordo sobre o fato de que a resposta para as duas questões é não. Na segunda orientação, que Soares chama de do uso da língua à gramática, parte-se da distinção ente “ensino da língua” e “ensino a respeito da língua” e, questionando a eficácia das regras da gramática normativa e das atividades de análise sintática e morfológica para ensinar a falar, escrever/ouvir, ler, valoriza-se a proposta de que se aprende a fazer, fazendo. Todavia, essa orientação não teria levado a uma real modificação, pois, nas atividades de sala de aula, a gramática (teoria) continuou prestigiada, pois apenas passou-se a partir dos exemplos para a teoria em vez do que se fazia antes: da teoria para os exemplos. O texto passou a ser usado apenas como pretexto. Além disso, não se parte do uso efetivo da língua pelos alunos, mas de texto quase sempre literários dos quais são tirados elementos a serem analisados e modelos a serem seguidos. Para Soares essa opção causa uma mudança para pior uma vez que o que se tem observado é um esfacelamento do ensino, porque trabalha-se com um amontoado aleatório de tópicos gramaticais, perdendo-se a ideia de sistema, de gradação de dificuldades e de progressão da aprendizagem. Na terceira orientação, que Soares chama de gramática do uso, busca-se, pelo uso do método estrutural e de exercícios estruturais, o desenvolvimento de automatismo que possibilitem o uso efetivo de novos recursos da língua consequente ao treinamento feito. Essa postura representa uma real inovação por valorização realmente o uso, a produção linguística, e não a descrição da língua (usando uma teoria linguística). Todavia, essa orientação tem apresentado problemas em virtude de se escolherem as estruturas em função dos textos estudados e não das dificuldades e necessidades dos alunos, de suas habilidades linguísticas, fazendo-se um planejamento com ordenação adequada dos exercícios. Os exercícios estruturais, segundo Soares (1979), têm sido usados de três formas distintas: 52 a) Dar teoria gramatical normativa e trabalhar com exercícios estruturais, sem relacionar os dois procedimentos; b) Dar exercícios estruturais e tirar deles a “teoria” e/ou normais de gramática tradicional, ou seja, ensinar gramática a partir dos exercícios estruturais; c) Só trabalhar com exercícios estruturais e nçao ensinar teoria gramatical. Soares registra que os resultados com qualquer uma dessas três posições têm deixado a desejar porque o que se tem normalmente são alunos incapazes de usar a língua para resolver seus problemas de comunicação em toda e qualquer situação em que tenham de atuar usando a língua. Em um balanço geral da questão, Neves (1990) registra que os professores: a) “em geral acreditam que a função do ensino da gramática é levar a escrever melhor”; b) “foram despertados para uma crítica dos valores da gramática tradicional”; 44. Sobre a utilização dos exercícios estruturais no ensino de língua materna, sugerimos a leitura de Travaglia, Araujo e Pinto (1984). c) “têm procurado dar aulas de gramática não normativa”; d) “verificam que essa gramática ‘não está servindo par nada’”; e) “apesar disso, mantêm as aulas sistemáticas de gramática como um ritual imprescindível à legitimação de seu papel”. Ou seja, embora reconheça problemas básicos no fato de se gastar por volta de 80% do tempo das aulas com o ensino de teoria gramatical, o professor não consegue mudar fundamentalmente de atitude e passar a fazer um ensino diferente daquele que se te, desenvolvido desde há muito em nossas escolas. Talvez essa resistência obstinada à mudança se deva, sobretudo ao que bem lembraram Possenti e (1987) a imagem que a sociedade tem do ensino de língua materna e de como deve ser o professor leva cada professor a repetir um modelo recebido, buscando mais legitimar o seu papel (como acabamos de registrar nas observações de Neves) do que fazer algo que represente um ensino significativo para a vida de seus alunos. 53 Diante disso tudo fica sempre a pergunta (senão a angústia) do que fazer. Nos capítulos seguintes buscamos fazer a proposta que anunciamos na introdução, pretendendo esclarecer um pouco mais a relação entre os objetivos do ensino de língua materna, as concepções de linguagem, os tipos de gramátia, os tipos de ensino de língua e as atividades de ensino, buscando um grau de consciência sobre a que cada tipo de atividade serve e como um certo conjunto de tipos de atividades poderiam constituir um ensino de gramática que realmente seja pertinente e presente uma ajuda e não um obstáculo para que o aluno possa desenvolver sua competência comunicativa. Esperamos cumprir a promessa de aplacar um pouco as angústias e não fazer exatamente o contrário. Todavia, fica a certeza de qe o arranjo possibilitará a crítica mais organizada e a estruturação ou reestruturação mais consciente das atividades de ensino de gramática. De acordo com Antunes (2007) se língua e gramática não se equivalem, saber gramática não é suficiente para uma atuação verbal eficaz. De fato, um dos maiores equívocos consiste em se acreditar que o conhecimento da gramatica é suficiente para se conseguir ler e escrever com sucesso os mais diferentes gêneros de texto, conforme as exigências da escrita formal e socialmente prestigiada. Somente com base nesse equivoco é que se pode justificar o apego dos professores (e de toda a comunidade escolar, os pais, inclusivamente): a) À detalhada explanação de cada uma das classes gramaticais, com suas respectivas subdivisões; b) E às intrincadas veredas da analise sintática. Mais do que apego a esse tipo de ensino, constata-se até mesmo certa impaciência para que, ainda cedo, ele seja devidamente iniciado. Se isso acontece, acalmam-se os ânimos: o sucesso, julgam, está garantido. Ledo engano... como se diz, mais propriamente, em paginas da literatura. Compreender ou fazer um texto – um relatório, um artigo, um editorial, uma carta, um requerimento, por exemplo – exigem muito mais que conhecimentos de gramatica. Este é apenas parte do saber que se precisa dominar para o desempenho satisfatório dessas atividades, como se verá nos tópicos a seguir. 54 2.1 OS RECURSOS A OUTROS TIPOS DE CONHECIMENTO, ALÉM DO CONHECIMENTO GRAMATICAL A concepção simplista de que basta saber gramatica para falar, ler e escrever bem funda-se na esteira daquele primeiro equívoco: o de que a gramática equivale à língua. Com efeito, a concentração dos programas em questões puramente gramaticais e o afã dos pais junto às escolas para que essas deem aulas de gramatica, passem tarefas de gramática – mesmo que pareçam irrelevantes – somente se justificam pela crença de que o conhecimento da gramática basta. Basta para assegurar o sucesso na elaboração de textos escritos e falados, em situação da interação publica e conforme as regras da linguagem formal e do dialeto de prestigio. “Um conhecedor de gramática é, sem duvida, bom leitor e bom produtor de textos?” – alguém perguntou. O uso da língua, além da gramática, comporta um léxico (em línguas como a nossa, com cerca de 500 mil palavras) e supõem ainda regras de textualização e regras de interação, decorrentes das situações em que acontece a atividade verbal. Esses componentes têm ainda seus múltiplos desdobramentos, sobretudo os dois últimos, que abarcam tudo o que se deve saber para se fazer ou entender um texto e tudo o que se deve saber para realizar uma atividade de interação verbal. Fica sem fundamento, portanto, reduzir a condição para o uso da língua, apenas, a uma competência de ordem gramatical. Ninguém fala, ouve, lê ou escreve sem gramática, é claro; mas a gramática sozinha é absolutamente insuficiente. Na verdade, a gramática é insuficiente, pois a interação verbal requer ainda: O conhecimento do real ou do mundo; O conhecimento das normas de textualização; O conhecimento das normas sociais de uso da língua. Desdobraremos um pouco cada um desses pontos. 2.1.1. O conhecimento do real ou do mundo Naturalmente, se falamos para estabelecer relações entre nós e o mundo, nada mais evidente que precisemos conhecer esse mundo do qual falamos ou, pelo menos, imaginar um outro, com base no que já conhecemos. Quer dizer, a linguagem tem como objeto de significação as coisas que compõem a realidade, 55 seja ela a realidade experimentada externamente, seja a outra sentida internamente, desejada, imaginada, projetada, simulada. Não importa: falamos das coisas que têm qualquer tipo de existência. Daí por que, em todos os nossos textos, é desnecessário dizer absolutamente tudo, pois nossos interlocutores partilham conosco muito do conhecimento adquirido. Ouvir os outros, ler o que eles escreveram são atividades que mobilizam esse saber já partilhado. Portanto, não é apenas o material linguístico que dá sentido àquilo que ouvimos ou lemos. Noutras palavras, o sentido não está totalmente expresso ou explicito no texto, sobretudo quando o interlocutor tem a competência de dizer apenas o que ele supõe que o outro ainda não sabe. Por exemplo, diante de um letreiro em que está escrito: NARIZ, OUVIDO, GARGANTA, e de um outro em questão os dizeres: FRANGO, FRUTAS, VERDURA, qualquer pessoa vai entender que, somente na segunda situação, alguns produtos estão postos à venda. Ninguém vai entender, por outro lado, que, naquele primeiro estabelecimento, estão vendendo o nariz, ouvido e garganta. Mas essas interpretações são feitas corretamente devido a quê? Certamente, não é, apenas, por conta dos elementos linguísticos que lá estão expressos. É, na verdade, com o apoio que se tem do conhecimento de como as coisas se organizam, se distribuem no mundo de experiência. É por esse conhecimento que rejeitamos a hipótese interpretativa de que nariz, ouvido e garganta são produtos à venda e que aceitamos a outra de que frango, frutas e verduras podem ser comprados no lugar onde consta o letreiro. Em um texto maior do que os letreiros referidos acima, esse principio ainda se torna mais complexo, pois muito mais conhecimentos de mundo são necessários para que sejam feitas com êxito interpretações coerentes. Nenhum texto traz explicitas todas as informações que transmite. Nenhum texto é absolutamente completo. Muito do que é dito está implícito, apenas pressuposto ou subentendido. O que acontece é que essas estratégias interpretativas são tão comuns, tão corriqueiras, no dia a dia das pessoas, que nem as percebemos ou paramos para analisa-las. Parecem naturais. Pensar, portanto, que agente faz e interpreta textos usando apenas os conhecimentos linguísticos (que já são mais do que aqueles puramente gramaticais) é falsear a autêntica atividade da interação verbal. 56 Esse princípio pode ser corroborado em um outro exemplo: em artigo sobre “as oscilações da ciência”, o autor usou a expressão “o movimento pendular”, exatamente para significar o vaivém das descobertas cientificas. Se a gente não sabe o que é um pêndulo e que movimento ele faz, como entender esse trecho? A mesma insuficiência do conhecimento linguístico se poderia comprovar a partida de verso do já citado poema de Drummond: Professor Carlos Góis, ele é quem sabe E vai desmatando O amazonas da minha ignorância. Se a gente não sabe a que se refere a expressão “o amazonas”, se a gente desconhece certas particularidades do objeto designado – por exemplo, sua imensa extensão – como interpretar o verso: “o amazonas de minha ignorância”? Somente o conhecimento de mundo que compartilharemos permite uma interpretação correta. E como entender a manchete de um jornal que diz: “ A rede não balançou para o São Paulo neste final de semana”?¹ E como entender a referencia a” uma grande manifestação emplumada” sem que sejam conhecidas as particularidades dos grupos indígenas ? E como entender a afirmação de que alguém “tucanou”? Os exemplos podiam se multiplicar à exaustão. Cremos, no entanto, que esses são suficientes para provar que a interação verbal mobiliza muito mais que o conhecimento linguístico. Quantas vezes as escolas já presenciaram a ansiedade dos pais em pedir aulas de gramatica, em apressá-las, mesmo nos primeiros ciclos do ensino fundamental, como se o conhecimento da gramática fosse suficiente para garantir o desenvolvimento satisfatório do bom desempenho das crianças! Já sabemos que não é; muito menos o conhecimento da gramatica a que as escolas têm concedido primazia: o da introdução ás classes de palavras com sua multiplicas classificações e subdivisões. Seria tão bom que a pressa dos pais se orientasse para a exigência da leitura de bons textos, para o acesso a literatura, para a experiência da troca verbal: fluente, funcional, bem ordenada, clara e relevante, em textos orais e em textos escritos! Ponhamos nessa meta nossas maiores aspirações. E vamos adiante, na reflexão do que precisamos saber para interagir verbalmente. 57 1.Muito acrescenta a leitura do livro texto e coerência, indicado na bibliografia. Questões como essa do “conhecimento de mundo”, do “conhecimento partilhado”, base para as muitas inferências que são feitas na atividade de compreender um texto, atestam a insuficiência do conhecimento linguístico, tal como temos demonstrado aqui. Outra leitura bastante produtiva poderia ser feita em Koch & Elias (2006), onde muitas das questões textuais brevemente referidas aqui recebem um desenvolvimento maior, inclusivamente com o apoio de textos de diferentes gêneros e propósitos comunicativos. 2.1.2. O conhecimento dos recursos de textualização Nas atividades de linguagem, além do conhecimento do mundo, é necessário também que conheçamos as muitas regras ( ou regularidades) que especificam o que devemos fazer para organizar um texto, para lhe dar uma sequencia, para lhe atribuir uma continuidade e uma progressão, para lhe conferir algum tipo de sentido e coerência. E mais: que tipo de texto (ninguém pode compor uma narrativa e um comentário opinativo usando os mesmos padrões de sequências) e que gênero devemos escolher (uma carta, um comentário, um aviso, um anuncio) e como vamos dividi-lo e partes (blocos ou parágrafos, se for o caso, ou em tópicos e subtópicos); que estratégias de interação com nosso interlocutor preferimos adotar (se direta ou indiretamente; se de forma categórica, precisa ou de forma reservada, cautelosa e reticente; se numa linguagem comum e informal, se fora dos padrões corriqueiros); que precauções convém tomar para evitar mal entendidos; o que vamos explicitar e o que vamos deixar implícito, já que o contexto ou os saberes do interlocutor podem suprir o que não está dito; se devemos parafrasear, fazer alusão ou mesmo citar outro texto etc. Enfim, tudo o que é necessário para se entender ou para se fazer um relatório, um aviso, um convite, um artigo, um resumo, uma resenha, por exemplo, vai além da gramatica e do léxico da língua. Ou seja, conhecimentos relativos á composição dos diferentes gêneros textuais são imprescindíveis para que possamos 58 ser eficazes comunicativamente, até mesmo na hora da escolha dos padrões ou das regras tipicamente gramaticais. Não basta saber, insisto, que o pronome é uma palavra que substitui o nome, ou que uma elipse é a omissão de um termo recuperável pelo contexto precedente. Não basta ainda saber que existe um artigo que é definido, e outro que é indefinido. É preciso saber que efeitos o uso de um ou de outro provoca na sequência do texto. É preciso saber em que pontos do texto convém usar um pronome em lugar de uma expressão normal ou recorrer a uma elipse em vez de usar a forma explicitada. A título de ilustração, vejamos uma proposta de atividade, copiada de um livro didático, que tinha como objetivo levar os alunos a exercitarem o emprego dos pronomes. A proposta era a seguinte: Reescreva no seu caderno o trecho da historia a seguir, substituindo as palavras sublinhadas por: Ele-ela-eles-elas Pedro estava arranjando o carro, enquanto Lígia fazia as malas. Julinho queria ajudar na arrumação da bagagem de Lígia, pois tudo estava atrasado. Pedro conseguiu arrumar o carro, porque Fátima, Inês e Marcos também vieram ajudar. Bernardo, porem, não pode participar do passeio, porque estava adoentado e cheio de preguiça. Pois bem: caso o aluno siga à risca a proposta feita pelo livro, o texto resultará no seguinte: Ele estava arranjando o carro, enquanto ela fazia as malas. Ele queria ajudar na arrumação da bagagem dela, pois tudo estava atrasado. Ele conseguiu arrumar o carro, porque eles também vieram ajudar. Ele, porém, não pôde participar do passeio, porque estava doente e cheio de preguiça. Como ficaria o entendimento deste texto? Como identificar de quem se está falando, quem fez o quê? Basta, então, empregar os pronomes, como as devidas flexões de gênero e de número? E se qualquer um de nós falasse dessa maneira, contasse uma historia assim? 59 A verdade é que ninguém conta uma historia simplesmente para mostrar como se empregam determinadas palavras. A gente conta uma historia para divertir, para ilustrar uma ideia, para reforçar ou refutar uma opinião etc. isto é, as pessoas falam movidas por intenções comunicativas diversas. Sempre. E não para treinar o emprego de elementos gramaticais². Numa outra atividade, foi solicitado ao aluno que procurassem em jornais e revistas palavras que se escrevem com s, ss, ç,sc e, depois, fizesse com essas palavras uma historinha. Ora, essa atividade mostra claramente a falta de entendimento do que é fundamento em um texto, ou seja, a sua unidade de sentido. É muito provável que essa historinha saia troncha e artificial, pois suas condições de produção contrariam substancialmente os princípios basilares da formação de textos. De novo, afirmo: a gente conta uma historia para fazer um relato de alguns fatos que nos interessa contar. Que palavra que vai se escolher, quem leva a isso é o conteúdo da historia, as coisas de que ela fala; isto é, aquilo que se tem a dizer; as letras que devem aparecer nas palavras do texto vêm como consequência. Como podemos ver, certas atividades escolares, supostamente atividades para se ensinar gramatica, acabam por descaracterizar o que é fundamental na linguagem, que é permitir uma interação, com a troca de sentido e de intenções. Não surpreende, assim que os alunos submetidos a esse tipo de atividade retraíram não só o gosto por escrever como ainda a necessária competência para escrever bem.(que pelo menos tivéssemos a capacidade de analise suficiente para encontrar a totalidade das causas desse insucesso: não jogaríamos, então, sobre os ombros dos alunos toda a responsabilidade por escreverem textos “cravejados de pérolas”, exibíveis jocosamente em programas nacionais de humor!) Quando um aluno, dissertando sobre questões de mudanças nas relações homem x mulher, escreve: Percebemos que nossa sociedade é composta de ambos os sexos. Ou Sabemos que o homem é um ser masculino e a mulher um ser feminino, está exatamente demonstrando que o conhecimento gramatical é insuficiente. Esses dois trechos não apresentam nenhum problema de gramatica. Do ponto de vista 60 Em sua pesquisa de mestrado Izabel pinheiro demonstrou que a escrita da escola, muitas vezes objetiva não a interação, mas o mero treinamento de alguma noção gramatical aprendida (ver bibliografia). morfossintático, tudo está bem; não há inadequação de espécie alguma. Entretanto, a obviedade com que as coisas são ditas leva uma total irrelevância e deixa o que é dito sem a menor graça e interesse. Falamos para dizer relevantes, que implicam qualquer tipo de novidade ou de interesse. Dizer, no contexto de um comentário, que o homem é um ser masculino e a mulher é um ser feminino é, no mínimo, desconcertante. Como se pode concluir, as noções gramaticais são apenas parte dos saberes indispensáveis às atividades da interação verbal. Mas a escola, por muitas vezes parece desconhecer isso. E os pais, cheios de boas intenções (mas carente de relevantes conhecimentos sobre a teoria da linguagem) acabam por jogar lenha seca nas brasas dessa fogueira fatal. É preciso, reitero, que os estudos mais recentes da teoria da teoria linguística – estudos que privilegiam as leis do discurso, as estratégias de textualização, os componentes da cena comunicativa -cheguem, de fato, aos programas de ensino das salas de aula. Falta chegar ainda a muitas escolas o sopro desses novos ventos; e, sem eles, tudo continua exatamente como se nada de diferente tivesse sido descoberto. É bom que os pais (e até mesmo os alunos) saibam também dessas coisas. Saibam que a gramática é insuficiente para preencher todas as nossas necessidades comunicativas e garantir a preparação que precisamos ter para enfrentar as solicitações do mercado de trabalho. É bom, portanto, que eles percam a inocência, para não creditarem todas as condições de êxito à gramática. Assim, não se deixarão persuadir pelo discurso fácil de quem vende ou dá, em “bons pacotes”, dicas rápidas de “salvação”, por aprenderem a “não errar mais”; ou hão de se defender quando a eles, alunos, é atribuída toda a causa do fracasso de seus textos inusitadamente hilariantes. A pretensão de escrever um livro para os pais se justifica, sobretudo, por esse desejo de querer adverti-los contra esses equívocos em torno da compreensão do que é uma língua, do que é uma gramática, em suas funções e em seus limites, e de como deve ser seu ensino. Se justifica ainda pela pretensão menos imediata de 61 podermos ter uma ideia mais clara de como deve ser a formação acadêmica dos professores de línguas. É bom, afinal, que se procure divulgar –deixar acessíveis ao publico em geral –as descobertas de uma ciência que se ocupa da linguagem e tenta explicar seu funcionamento, sem o viés da redução ou do simplismo que certos interesses menores emprestaram ao uso da linguagem. Em suma, no âmbito das regras de textualização –sem as quais a comunicação não poderia existir e que aqui foram apenas parcialmente enumeradas –muito precisa ser sabido para que nossos textos –orais e escritos –sejam considerados amostras significativas de atividades de linguagem. É sinal de muito atraso cientifico –como frisei –pensar que basta saber gramática ou mesmo basta conhecer a lingua para exercer as atividades de linguagem. A escola, por vezes com a ajuda dos pais e dos alunos, ainda muito colabora para alimentar esse atraso! 2.2.1. O conhecimento das normas sociais de uso da língua Efetivamente –podemos já concluir -, a atividade da linguagem é muito complexa, pois mobiliza tipos bem diferentes de saberes e de competências. Nada, portanto, daquele simplismo com que fomos introduzidos ao estudo das línguas. Somado ao conjunto das regras linguísticas (gramaticais e lexicais) e das regras textuais, existe um terceiro: aquele relativo às normas sociais que regulam o comportamento das pessoas em situações de interação verbal. Em termos bem gerais, podíamos começar lembrando que ninguém fala o que quer, do jeito que quer, em qualquer lugar. Existem também os bemcomportados e os malcomportados comunicativamente. Isto é, em toda cultura, prevalece um conjunto de normas que especificam quem pode falar, o quê, como, com quem e quando. Falar em voz alta, por exemplo, é permitido, apenas, em certas ocasiões. Interromper o outro também tem suas restrições. Dizer tudo o que vem à cabeça, sem discrição, é sinal de incompetência comunicativa (por exemplo, tornar publica as dividas de um morto na cerimonia de seu sepultamento –como jocosamente foi apresentado na cena de um comercial, há pouco veiculado na tv). Usar expressões que demonstram atitudes de polidez ou usar de tolerância frente a determinados tipos de interlocutores é comportamento social prestigiado. 62 Por exemplo, não em qual quer oportunidade se pode fazer a alguém qualquer tipo de pergunta: é preciso avaliar se a privacidade do outro está ou não sendo respeitada; não em qualquer oportunidade se pode interromper o outro; existem verdadeiros rituais que estipulam como começar e como finalizar um discurso. Ou seja: qualquer atividade de linguagem é uma atividade socialmente normatizada e, assim, regulada. Portanto, ser comunicativamente bem-sucedido é mais que uma questão de saber gramatica, de saber analisar frases e reconhecer as funções sintáticas de seus termos. (Ah! Se fosse apenas isso! Seria bem mais fácil ampliar a competência das pessoas para atuarem comunicativamente.) O segundo equívoco me parece, assim, desfeito: para o sucesso da interação verbal, o conhecimento linguístico não basta; não é suficiente. São princípios como o da insuficiência dos conhecimentos linguísticos que se mostram cada vez mais claros quando se estuda a língua numa perspectiva de atividade discursiva. A linguística de texto, por exemplo, vem explicitando aspectos altamente relevantes do funcionamento das línguas, desde o inicio da década de 1960, e vem mostrando que a recepção e a emissão de texto se fazem graças a recursos linguísticos e a recursos extralinguísticos também. É pena que, mais de quarenta anos depois, ainda haja tantas escolas “ enganchadas” no estudo da gramática, como se ela sozinha, bastasse. Parece haver por ai certa propaganda enganosa acerca dos benefícios de se estudar apenas gramatica. As descobertas da linguística não têm repercutido suficientemente. Seria altamente relevante para todos os cidadãos e altamente gratificante para professor e aluno poderem reconhecer, no final da trajetória escolar, que o trabalho da escola teve grande êxito, pois foram ensinadas e aprendidas lições de programas amplos, que recebem a valorização da sociedade letrada, como o gosto pela literatura, a prática da leitura e da analise plural e crítica, da produção oral e escrita de textos adequados e relevantes, e a simpatia indiscriminada pela condição variada e mutável das manifestações linguísticas. 63 2.2 IMPLICAÇÕES PARA O ENSINO Admitir o conjunto de princípios apresentados neste capitulo leva a que sejam selecionados determinados conteúdos curriculares, que sejam definidas certas prioridades e escolhida uma serie de atividades pedagógicas. Por outro lado, o mesmo conjunto implica que uma série de pontos seja rejeitada ou, pelo menos, não ganhe prioridade ou destaque. Vejamos: Em termos bem gerais, podemos dizer que estudar mais que gramatica leva a procurar explorar o conhecimento de outras áreas, de outros domínios e assumir a certeza de que, ao lado do conhecimento da gramática, outros são necessários, imprescindíveis e pertinentes. Portanto, não tem fundamento a orientação de que “não é para ensinar gramática.” Repito: não é para ensinar apenas gramática. Em termos mais específicos, lembramos que, para ir além da gramatica, a escola deve empenhar-se também no estudo do léxico, do vocabulário da língua. Esse estudo pode contemplar as inter-relações internas, de uma palavra com outras – relações de sinonímia, de antonímia, de hiperonímia, de partonímia – e interrelações externas, das palavras com as coisas, os eventos, os fatos, os valores culturais que povoam os mundos em que vivemos. Podemos explorar ainda o sentido metonímico ou metafórico de uma palavra, de uma expressão, inclusive, em contextos da linguagem não literária. Da palavra casa, por exemplo, podemos chegar à palavra teto – passando por muitas outras – e explorar todas as ressignificações que as pessoas vão introduzindo na língua. Podemos “chafurdar” no repertorio lexical da língua, para fazer levantamentos de séries de palavras que compreendem certa área ou envolvem determinada categoria (casa, residência, domicílio, vivenda, lar, moradia, teto, chão etc.). É bom lembrar que é possível estabelecer uma vinculação muito grande entre o léxico e a gramatica,pois qualquer uma das classes de palavras podem ser objeto de uma pesquisa que envolva o conhecimento do léxico. Por exemplo, 64 pede-se propor aos alunos uma pesquisa que resulte num levantamento das expressões adverbiais que denotam temporalidade e sua ligação com a categoria do aspecto expressa pelos verbos. Em pesquisas assim, além de se favorecer um conhecimento mais amplo e relacional dos elementos linguísticos, se estaria mudando o foco de estudo da língua, pois o núcleo das considerações feitas deixaria de ser o contraste entre o certo e o errado. Ocorre-me ainda lembrar a relevância de se explorar a questão dos neologismos e dos estrangeirismos, naquelas perspectivas que ligam a lingua à capacidade dos sujeitos de nela interferirem e naquela outra, das repercussões interculturais que a adoção de palavras e de valores estrangeiros envolve. Merece destaque ainda o estudo do léxico na perspectiva da composição do texto, no sentido, portanto, de como as unidades do léxico são recursos da coesão do texto. Basta lembrar a função coesiva que desempenha a associação entre palavras de sentidos afins ou contíguos. Em suma, muito tempo poderia ser destinado à exploração das possibilidades lexicais da língua. Certamente, com mais entusiasmo e mais encantamento para os alunos, que estariam, assim, desbravando o idioma que usam, para soltarem a língua e se fazerem bons falantes. Certamente, com muito mais crescimento para os professores, inclusive, que precisariam esta por dentro de muitas outras noções além daquelas incluídas na morfologia e na sintaxe de frases. Outra implicação de se avançar além da gramatica seriam os interesses: -- por ampliar o rol das competências a serem desenvolvidas e, assim, estimular, paralelamente à leitura e à escrita, a exploração da oralidade. Nesse âmbito, vale a pena lembrar quanto poderia ser útil a analise das “máximas da conversação”, isto é, daqueles princípios que devem estar presentes para o sucesso da conversação;--por ampliar, ainda, o repertorio de informação dos alunos sobre assuntos e temas diferentes, em leituras, debates e reflexões orientadas; -- por explorar, enfim as chances advindas do estudo de outras disciplinas. Nesse âmbito, vale ressaltar a importância desse estudo, para se conseguir êxito 65 nas atividades de linguagem –cuja relevância depende, antes de tudo, daquilo que se tem a dizer, pois a linguagem é uma atividade de expressão, quer dizer de pôr para fora. É fundamental, portanto, que haja o que expressar ou seja, o que dizer evidentemente, insisto, não é a gramatica que vai suspirar essa função. A irrelevância de certos discursos, por exemplo, não deriva do pouco conhecimento gramatical; deriva, em principio, de não se ter o que dizer; deriva daquilo que comumente chamamos de pobreza de informação. Portanto, informações, dados, ideias, princípios, temas, visões, perspectivas, hipóteses são a pólvora que dá efeito ao gatilho da interação verbal. A gramatica é apenas um dos componentes que tornam a pólvora inflamável. As regras de textualização (ou regularidades, como querem alguns) também comporiam um programa avançado de estudo da língua; isto é, a exploração das propriedades do texto –incluindo, é claro, os recursos de intertextualidade, coesão e coerência, o que, naturalmente, retiraria do foco a formação e a analise de frases soltas. Essas regras compreendem tudo o que é exigido para que se elabore um texto conforme as determinações de seu tipo (narrativo, descritivo, dissertativo) e de seu gênero: fazer um editorial não é o mesmo que dar uma noticia; fazer um anúncio é bem diferente de redigir um requerimento, um convite, por exemplo. Essas regras compreendem também o conhecimento de como dosar a informação (entre o já sabido e o ainda desconhecido), de onde distribuí-la e de como optar por determinada sequencia e divisão do texto. Compreendem ainda o conhecimento dos padrões de apresentação do texto, conforme o suporte escolhido (livro, jornal, revista, mural, cartaz, faixa, outdoor etc.). A adequação do gênero às circunstâncias da interação, às condições do interlocutor também tem suas regras. Em suma, como propõe Beaugrande: “O trabalho com textos mudaria a paisagem teórica e prática da linguística”; ao que Neves (2006,p.31) acrescenta: “É, com certeza, a visão da gramatica”. Ou seja, um programa de estudo da lingua que incluísse as regras de textualização seria bem mais amplo –e bem mais relevante –do que aqueles que perpassam (em todas as gramaticas) a série das classes gramaticais e de suas sintaxes, culminando, numa espécie de apêndice de concessão, com as figuras de linguagem. 66 A exploração do comportamento linguístico, que as convenções sociais estipulam como adequado a determinada situação, também preencheria um programa mais que gramatical de estudo da língua. Essa exploração teria como objeto tanto as atividades do enunciador quando aquelas do parceiro da interação, sobretudo aquelas que acontecem em contextos públicos formais. Fazem parte dessas convenções, por exemplo, as normas de como participar de uma conferencia, de uma reunião, de um debate, de como interpelar alguém hierarquicamente superior; enfim, que expressões ou praticas de polidez são convenientes para essa ou aquela situação. Enfim, a um programa de estudo da língua poderiam ser somadas muitas atividades de exploração e análise das condições cognitivas, textuais e sociais que tornam as atividades de linguagem funcionais e relevantes. Efetivamente, seria bem mais produtivo pensar a linguagem; pensar sobre a linguagem; tentar vê-la por dentro; tentar entender o encaixe das peças que fazem seu funcionamento interativo. 2.3. O tempo para a avaliação A avaliação, em função mesmo de sua finalidade, deve acontecer em cada dia do período letivo, pois a aprendizagem, também, está acontecendo todo dia. Evidentemente, não pretendo propor a ingenuidade permissiva e simplista de aceitar qualquer resultado. Ou seja, não se quer simplesmente aceitar qualquer coisa que o aluno escreve, ou qualquer interpretação para um determinado texto. Não é isso. O que pretendo ressaltar, isto sim, é uma atitude positiva, respeitosa, esclarecida e estimuladora do professor que sabe estar promovendo um desenvolvimento que só pode acontecer gradualmente e que, para acontecer, precisa de sua intervenção, que é imensamente significativa. É bom que o professor esteja atento também para o fato de que há escolhas inadequadas (“erros”, na literatura escolar) que são “normais” dentro da perspectiva deste desenvolvimento em processo e, por isso, podem funcionar como indícios das etapas vivenciadas e podem ser pistas para a decisão do que fazer mas próximas aulas. 67 Insisto em dizer que a avaliação centrada na “caça aos erros”, como prova do que não se conseguiu fazer, inibe a expressão do aluno e condiciona, de certa forma, bloqueio com que, mais tarde, as pessoas encaram a pratica social da escrita. Esta pratica da “caça aos erros”, repito, fez com que o professor de português, ao longo do tempo, se especializasse apenas em procurar o “errado” e, sem muita reflexão, discernir sobre os erros. Parece que ele não é capaz de perceber outra coisa e, de fato, acaba não sendo, pois, como adverte Millôr Fernandes, “tudo é erro na vida do revisor” (p.165). O fato de o professor, diante dos trabalhos dos alunos, ter apenas que procurar os erros tornou-se uma coisa tão natural que o termo consagrado para a leitura do professor é “corrigir”. A pergunta que os alunos nos fazem é sempre: professor (a), o (a) senhor (a) já corrigiu as provas? Por que não perguntam se já vimos, se já lemos seus trabalhos, seus textos? Uma analise semântica revela: “corrigir” é uma palavra que implica naturalmente outra: “erro”. Na verdade, o professor “corrige” porque, como revisor, só tem olhos para erros. Nem vê as coisas interessantes que os alunos escreveram ou os progressos que eles revelaram alcançar. Valia a pena não esquecer que há uma “correção” preventiva que a escola pode adotar com sucesso: a exposição do aluno a bons textos orais e escritos, ainda assim, com o devido cuidado para que esses textos funcionem para todos nós como “horizontes” (Geraldi, 1997) e não como provas de uma excelência que até inibe a expectativa de quem está começando. Assim, a leitura constante –diária, mesmo- de textos interessantes e variados, a opção pela escrita funcional (escrita de textos reais, com leitores reais), ou seja, a exposição ativa do aluno à compreensão e produção de textos constitui um exercício naturalmente ativado da fluência e da adequação comunicativa que o professor deve estimular e promover. Como referi acima, a avaliação deve realizar-se como exercício de aprendizagem. Neste sentido, o procedimento básico deve ser discutir com o aluno em que e por que seu texto não está adequado e, na mesma dimensão, descobrir como ele as alternativas de reconstrução de seu dizer. Tal pratica tem, inclusive a vantagem de iniciar o aluno na tarefa de ser ele mesmo o primeiro revisor de seu texto. Dessa forma, ele vai aprendendo a refazer sua primeira redação até chegar 68 aquela definitiva que chegara às mãos do leitor. E vai vivendo a experiência de perceber a imensa versatilidade da língua. A revisão do texto –conforme vimos, uma das etapas previstas na produção adequada de textos- deve constituir-se numa rotina escolar –escreveu, vai revisar!para se desfazer a ideia equivoca de que a avalição só existe em função da nota e dos resultados finais. A revisão do texto pode realizar-se também em exercícios coletivos de analise, nos quais o grupo discute o que poderia ser alterado em função dos objetivos e dos leitores pretendidos para aquele ato específico de comunicação. As discursões e os acertos seriam valiosos, pois percorreriam os vários estratos linguísticos: o sintático, semântico, o lexical (a escolha adequada das palavras), o pragmático, o ortográfico, o da pontuação, o da paragrafação, o da apresentação formal do texto, sempre, é claro, tendo em conta os aspectos da situação que o texto vai circular. Evidentemente, nesses aspectos, se inclui a adequação do texto às especificidades de seu gênero textual. Nessa perspectiva bem mais ampla, portanto, professor e aluno teriam muito mais coisas a ver e coisas muito mais relevantes a aprender. O trabalho do professor com a produção individual do aluno também deve aproximar-se de tais padrões. (e, em função disso, todos devíamos lutar –“por pensamentos, palavras e obras” - para que o professor tenha menos alunos em sala de aula e mais tempo disponível para orientar os alunos em suas produções textuais!). O que parece inaceitável é deixar que se instale no aluno a postura alienante de transferir para o professor o poder absoluto de revisar, julgar, avaliar e reformular seu texto. Assim, não se desenvolve no aluno a autonomia, que requer procurar critica, autoavalição, levantamento de hipótese, busca da melhor alternativa, atitudes essenciais para quem empreende qualquer aprendizagem não mecanicista. 4.3 O objeto da avaliação No âmbito dessas concepções, cabe ainda perguntar: rever, no texto, o que ? os princípios atrás afirmados implicam que se estabeleça u a hierarquia na identificação dos elementos a revisar, nem todo desvio à norma-padrão tem a mesma relevância para a qualidade global do texto, a falta de clareza, a imprecisão (quando não dá para saber o que a pessoa esta querendo dizer), a escolha indevida as unidades lexicais e das unidades gramaticais, a desordenação na sequencia das ideais (quando o texto não tem um fio de ideias condutor), a desconexão entre os 69 vários segmentos do texto a obviedade e irrelevância do que se diz, tudo isso é mais significativo para a qualidade comunicativa do texto do que os acertos ortográficos, por exemplo (o que não quer dizer que a ortografia não precise ser ensinada!). O que se quer ressaltar é a conveniência de o professor levar o aluno a perceber que o sentido do que ele diz, a clareza com que o diz são elementos prioritariamente relevantes, e é preciso pensar neles em primeiro lugar. A correção ortográfia virá como exigência da própria coerência do texto, que, em certas situações, para estar adequado, precisa estar ortograficamente correto. Como disse, é evidente que as normas ortográficas também devem ser objeto de ensino, de exercício (vale a pena consultar Morais, 1998; 2000); mas não de um jeito que desvie a atenção dos alunos daquelas habilidades realmente importantes para o êxito de qualquer interação verbal. Certa vez, vi um exercício de redação de uma criança da 4ª série, sob o tema “Meu amigo”. A criança começou seu texto dizendo: “Meu amigo é muito amigável” e o único ajuste que a professora apontou, marcando em vermelho, foi a falta de acento sobre a sílaba tônica da palavra “amigável”. Pode-se perguntar que tipo de competência estar professora está privilegiando? Além de indicar o erro ortográfico, ela não deveria, antes de tudo, levar o aluno aperceber que, neste contexto, a palavra “amigável” não costuma ocorrer? Não deveria, ainda, fazer um levantamento com os alunos dos contextos em que se usa esta palavra? (Por exemplo: “amigo amigável”, não; mas, “contrato amigável”, “separação amigável”, sim). A avaliação, como tudo o mais, é antes de tudo uma questão de concepção e não uma questão de técnica. Daí a conveniência de o professor pensar, observar, descobrir, em cada momento, a maneira mais adequada de contribuir para que seu aluno cresça na aquisição de sua competência comunicativa; de, sobretudo, estimular, encorajar, deixar os alunos com uma vontade grande de aprender, sentindo-se para isso perfeitamente capacitado e, por isso, inteiramente gratificado. 2.4 FENOMENOLOGIA DA LINGUAGEM I. Husserl e o problema da linguagem O texto a seguir apresenta a posição fenomenológica de Merleau-Ponty no domínio da linguagem. 70 “A abordagem em questão refere-se em um texto de 1951, sobre a fenomenologia da linguagem”, publicado em Signes, em 1960, Maurice MerleauPonty (1908-1961) em uma exposição sobre a maneira como Edmund Husserl concebia o problema da linguagem. Neste contexto, exatamente pelo fato do problema da linguagem não pertencer a tradição filosófica, a filosofia primaria, Husserl aborda-o com mais liberdade que os problemas da percepção ou do conhecimento. Leva-o a posição central, e o pouco que diz a seu respeito é original e enigmático. Logo, esse problema permite melhor do que qualquer outro interrogar a fenomenologia, e não só repetir Husserl, mas também recomeçar seu esforço, retomar, mais do que suas teses, o movimento de sua reflexão. É impressionante o contraste entre certos textos antigos e os recentes. Na 4ª. das Logische Untersuchungen*, Husserl propõe a idéia de uma eidética da linguagem e de uma gramática universal que fixaram as formas de significação indispensáveis a qualquer linguagem, se ela for realmente linguagem, e permitiriam pensar com toda a clareza as línguas empíricas como realizações “embaralhadas” da linguagem essencial. Tal projeto supõe que a linguagem seja um dos objetos que a consciência constitui soberanamente, e as línguas atuais casos muitos particulares de uma linguagem possível cujo segredo a consciência detém – sistemas de signos ligados à significação deles por relações unívocas e suscetíveis, tanto em sua estrutura como em seu funcionamento, de uma explicação total. Assim colocada como um objeto diante do pensamento, a linguagem não poderia desempenhar com relação a ele senão o papel de acompanhante, de substituto, de auxiliar ou meio secundário de comunicação. Em contrapartida, em textos mais recentes a linguagem aparece como uma maneira original de visitar certos objetos como o corpo do pensamento (Formale und Transzendentale Logik²) ou mesmo como a operação pela qual pensamentos, que sem ela permaneceriam fenômenos privados, adquiriram valor intersubjetivo e finalmente existência ideal (Ursprung der Geometrie³). O pensamento filosófico que reflete sobre a linguagem seria consequentemente beneficiário da linguagem, envolvido e situado nela. H.Pos (“Phenoménoloie et linguistique”, Revue Internationale de Philosophie, 1939) define a fenomenologia da linguagem não como um esforço para substituir as línguas existentes no contexto de uma eidética de todas as linguagens possíveis, ou seja, para objetivá-las perante uma consciência 71 constituinte universal e intemporal, mas como volta ao sujeito falante, ao meu contato com a língua que falo. O cientista, o observador veêm a linguagem no passado. Consideram a longa história de uma língua, com todos os acasos, todas as evoluções de sentido que finalmente a converteram no que é hoje. Resultado de tantos incidentes torna-se incompreensível que a língua possa significar seja o que for sem equivoco. Considerando a linguagem como fato consumado, resíduo de atos de significação passados, o cientista deixa escapar a clareza própria da fala, a fecundidade da expressão. Do ponto de vista fenomenológico, ou seja, para o sujeito falante que utiliza sua língua como meio de comunicação com uma comunidade viva, a língua reencontra a sua unidade: já não é o resultado de um passado caótico de fatos linguísticos independentes, e sim um sistema cujos elementos concorrem todos para um esforço de expressão único voltado para o presente ou para o futuro, e assim governado por uma lógica atual. Sendo estes o ponto de partida e o ponto de chegada de Husserl no tocante à linguagem, gostaríamos de submeter à discussão algumas proposições relativas primeiras ao fenômeno da linguagem, e depois à concepção da intersubjetividade, da racionalidade e da filosofia que é implicada por essa fenomenologia. II O fenômeno da linguagem 1. A língua e a palavra Poderemos simplesmente justapor as duas perspectivas sobre a linguagem que acabamos de distinguir – a linguagem como objeto de pensamento e a linguagem como minha? Era isso que fazia Saussure, por exemplo, quando distinguia uma linguística sincrônica da palavra e uma linguística diacrônica da língua, irredutíveis uma à outra porque uma visão pancrônica inevitavelmente apagaria a originalidade do presente. Do mesmo modo. H. Pos limita-se a descrever sucessivamente a atitude objetiva e a atitude fenomenológica sem se pronunciar sobre a relação entre ambas. Mas então poderíamos acreditar que a fenomenologia apenas se distingue da linguística como a psicologia se distingue da ciência da linguagem: a fenomenologia acrescentaria ao conhecimento da língua a experiência da língua em nós, como a pedagogia acrescenta ao conhecimento dos conceitos matemáticos a experiência daquilo que estes se tornam no espírito de quem os aprende. Então a experiência da palavra nada teria para nos ensinar sobre o ser da linguagem, não teria alcance ontológico. 72 É isso que é impossível. Assim que distinguimos, ao lado da ciência objetiva da linguagem, uma fenomenologia da palavra, pomos em andamento uma dialética pela qual as duas disciplinas entram em comunicação. Em primeiro lugar, o ponto de vista “subjetivo” envolve o ponto de vista “objetivo”; a sincronia envolve a diacronia. O passado da linguagem começou por estar presente, a série de fatos linguísticos fortuitos que a perspectiva objetiva evidencia incorporou-se numa linguagem que, a cada momento que, era um sistema dotado de uma logica interna. Se a linguagem portanto, considerada segundo um corte transversal, é sistema, também é preciso que o seja em seu desenvolvimento. Por mais que Saussure tenha tentado manter a dualidade das perspectivas, seus sucessores foram obrigados a conceber com o esquema sublinguístico (Gustave Guillaume) um principio mediador. Num outro aspecto, a diacronia envolve a sincronia. Se, considerada segundo um corte longitudinal, a linguagem comporta acasos, é preciso que o sistema da sincronia comporte a cada momento fissuras onde o acontecimento bruto possa vir inserir-se. Portanto, uma dupla tarefa se nos impõe. a) Temos de encontrar um sentido no devir da linguagem, concebê-la como um equilíbrio em movimento. Por exemplo, com certas formas de expressão entrando em decadência unicamente porque foram empregadas e perderam a “expressividade”, mostraremos como as lacunas ou as somas de fraquezas assim criadas suscitam, da parte dos sujeitos falantes que querem comunicar-se, uma retomada dos remanescentes linguísticos deixados pelo sistema em vias de regressão e a utilização deles de acordo com um novo principio. É assim que se forma na língua um novo meio de expressão e que uma logica obstinada vence os efeitos de desgaste e a própria volubilidade da língua. E assim que o sistema de expressão do latim, baseado na declinação e nas mudanças flexionais é substituído pelo sistema de expressão do francês, baseado na preposição. b) Mas, correlativamente, devemos compreender que, sendo a sincronia apenas um corte transversal sobre a diacronia, o sistema que é realizado nela nunca está inteiramente em ato, comporta sempre mudanças latentes ou em incubação, nunca é feito de significações absolutamente unívocas que se possam explicitar integralmente ao olhar de uma consciência constituinte transparente. Tratar-se-á não de um sistema de formas de significação claramente articuladas umas com as 73 outras, não de um edifício de ideias linguísticas construído segundo um plano rigoroso, mas de um conjunto de gestos linguísticos convergentes, definidos mais por um valor de emprego do que por uma significação. Longe de as línguas particulares aparecem como a realização “embaralhada” de certas formas de significação de ideais e universais, a possibilidade de tal síntese torna-se problemática. A universalidade se for atingida, não será por uma língua universal que, voltando atrás da diversidade das línguas, nos forneceria os fundamentos de qual quer língua possível, e sim por uma passagem obliqua desta língua que falo e que me inicia no fenômeno da expressão àquela outra que aprendo a falar e que pratica o ato de expressão segundo um estilo completamente diferente, pois as duas línguas, e finalmente todas as línguas dadas são eventualmente comparáveis apenas na chegada e como totalidade, sem que se possam reconhecer nelas os elementos comuns de uma estrutura categorial única. Portanto, longe de podermos justapor uma psicologia da linguagem a uma ciência da linguagem, reservando à primeira a linguagem no presente e a segunda a linguagem no passado, o presente difunde-se no passado, na medida em que este for presente, a historia é a historia das sincronias sucessivas - e a continência do passado linguístico invade ate os sistema sincrônico. O que me é ensinado pela fenomenologia da linguagem não é somente uma curiosidade psicológica - a língua dos linguistas em mim, com as particularidades que lhe acrescento -, é uma nova concepção do ser da linguagem, que é agora logica na contingencia, sistema orientado, e que, entretanto elabora sempre os acasos, prosseguimento do fortuito na totalidade que tem um sentido, lógica encarnada. 2. Quase-corporalidade do significante Retornando à língua falada ou viva, descobrimos que seu valor expressivo não é soma dos valores expressivos que pertenceriam independentemente a cada elemento da “cadeia verbal”. Pelo contrário, estes constituem sistema na sincronia, no sentido em que cada um deles significa apenas a sua diferença com relação aos outros - os signos, como diz Saussure, são essencialmente “diacríticos”- e, como isso é verdade para todos, não há na língua se não diferenças de significação. Se finalmente ela quer dizer e diz algo, não é porque cada signo veicule má significação que lhe pertenceria, é porque fazem todos os juntos alusão a uma significação sempre protelada quando os consideramos um a um, e na direção da qual os ultrapasso sem que eles nunca a contenha. Cada um deles expressa apenas por 74 referencia a uma certa aparelhagem mental, a uma certa disposição de nossos utensílios culturais, e todos juntos são como um formulário em branco que ainda não preenchemos, como os gestos de um outro que visam e circunscrevem um objeto do mundo que não vejo. A potencia falante que a criança assimila ao aprender sua língua não é a soma das significações morfológicas, sintáticas e lexicais: tais conhecimentos não são necessários nem suficientes para adquirir uma língua, e o ato de falar, uma vez adquirido, não pressupõe nenhuma comparação entre o que quero expressar e o arranjo nocional dos meios de expressão que emprego. As palavras, os torneios necessários para conduzir minha intenção significativa à expressão, não são recomendadas a mim, quando falo, senão por aquilo a que Humboldt chamava de innere Sprachform (forma de falar interior) e que os modernos chamam de Wortbegriff (noção da palavra), ou seja, por um certo estilo de linguagem de que provêm e segundo o qual se organizam sem que eu tenha necessidade de mas representar. Há uma significação “linguageira” da linguagem que realiza a mediação entre a minha intenção ainda muda e as palavras, de tal modo que minhas palavras me surpreendem a mim mesmo e me ensinam o meu pensamento. Os signos organizados possuem seu sentido imanente, que não se prende ao “penso”, mas ao “posso”. Essa ação à distancia da linguagem, que vai ao encontro das significações sem as tocar, essa eloquência que as designa de maneira peremptória sem jamais as transformar em palavras nem fazer cessar o silencio da consciência, são um caso eminente da intencionalidade corporal. Tenho rigorosa consciência do alcance de meus gestos ou da espacialidade de meu corpo, que me permite manter relações com o mundo sem me representar tematicamente os objetos que vou segurar ou as relações de grandezas entre meu corpo e os rumos que me oferece o mundo. Contanto que eu não reflita expressamente nele, a consciência que tenho de meu corpo é imediatamente significativa de uma certa paisagem ao meu redor, a que tenho de meus dedos é significativa de um certo estilo fibroso ou granuloso do objeto. É da mesma maneira que a palavra, a que profiro ou a que ouço, é pregnante de uma significação que é legível na própria textura do gesto linguístico, a ponto de uma hesitação, uma alteração da voz, a escolha de certa sintaxe bastarem para modifica-la, sem jamais estarem contidas nela, pois toda expressão me aparece sempre como um vestígio, todas as idéias me são dadas apenas em 75 transparência, e todo esforço para pegar na mão o pensamento que habita a palavra não deixa entre os dedos senão um pouco material verbal. 3. Relaçao entre o significante e o significado. A sedimentação Se a palavra é comparável a um gesto, o que ela está encarregada de expressar terá com ela a mesma relação que o alvo tem com o gesto que o visa, e nossas observações sobre o funcionamento do aparelho significante já envolverão uma certa teoria da significação que a palavra expressa. Meu enfoque corporal dos objetos que me rodeiam é implícito, e não supõe tematização alguma, “representação” alguma de meu corpo nem do meio. A significação anima a palavra como o mundo anima meu corpo: por uma surda presença que desperta minhas intenções sem se mostrar abertamente diante delas. A intenção significativa em mim (assim como no ouvinte que a reencontra ao ouvir-me) não é, no momento em que ocorre – mesmo que depois venha a frutificar em “pensamentos” - , senão um vazio determinado a ser preenchido por palavras; o excesso daquilo que quero dizer sobre o que é ou o que já foi dito. Isto significa: a) que as significações da palavra são sempre idéias no sentido kantiano, os pólos, de certo número de atos de expressão convergentes que magnetizam o discurso sem serem propriamente dados isoladamente; b) que, por conseguinte, a expressão nunca é total. Como observa Saussure, temos a impressão de que nossa língua expressa totalmente. Mas não é por expressar totalmente que é nossa, é por ser nossa que acreditamos que expressa totalmente. “the man I Love” é, para um inglês, uma expressão tão completa como, para um francês, “I” homme que j’aime” (o homem que amo). E “j’aime cet homme (amo este homem) é, para um alemão que pode mediante a declinação marcar expressamente a função do objeto direto, uma maneira extremamente alusiva de expressar-se. Logo, há sempre algum subentendido na expressão – ou melhor, a noção de subentendido deve ser rejeitada: só tem sentido se tomarmos por modelo e por absoluto da expressão uma língua (geralmente a nossa) que, na verdade, como todas as outras, nunca pode conduzir-nos “como pela mão” até a significação, até as próprias coisas. Não digamos, pois, que toda expressão é imperfeita porque subentende, digamos que toda expressão é perfeita nada medida em que é compreendida sem equívoco, e admitamos como fato fundamental da expressão uma superação do significante pelo significado que é tornada possível pela virtude própria do significante; c) que esse ato de expressão, essa junção entre a palavra e a significação mediante a transcendência do sentido 76 lingüístico que ela visa não é para nós, sujeios falantes, uma operação secundária, a qual recorreríamos apenas para comunicar ao outro os nossos pensamentos, e sim a tomada de posse por nos, a aquisição de significações que, de outro modo, só se fazem presentes surdamente. Se a tematização do significado não precede a palavra, é porque ela é seu resultado. Insistamos nesta terceira conseqüência. Expressar, para o sujeito falante, é tomar consciência; ele não expressa somente para os outros, expressa para saber ele mesmo o que visa. Se a palavra quer encarnar uma intenção significativa que não passa de um certo vazio, não é só para recriar no outro a mesma carência, a mesma privação, mas também para saber de que há carência e privação. Como o consegue? A intenção significativa cria um corpo para si e conhece a si mesma ao procurar um equivalente seu no sistema de significações disponíveis, representado pela língua que falo e pelo conjunto dos escritos e da cultura de que sou o herdeiro. Trata-se, para esse desejo mudo que é a interação significativa de realizar, um certo arranjo dos instrumentos já significantes ou das significações já falantes (instrumentos morfológicos, sintáticos, lexicais, gêneros literários, tipos de narrativa, modos de apresentação do acontecimento etc.) que suscite no ouvinte o pressentimento de uma significação diferente e nova, e inversamente realize naquele que fala ou escreve a fixação da significação inédita nas significações já disponíveis. Mas por que, como, em que sentido, estão estas disponíveis? Tornaram-se disponíveis quando, a seu tempo, foram itálico- instituídas como significações às quais posso recorrer, significações que possuo – por uma operação expressiva da mesma espécie. É esta portanto que devo descrever se quero compreender a virtude da palavra. Compreendo ou julgo compreender as palavras e as formas do Frances; tenho certa experiência dos modos de expressão literários e filosóficos que a cultura dada me oferece. Eu expresso quando, utilizando todos esses instrumentos já falantes, faço-os dizer algo que nunca disseram. Começamos a ler o filósofo dando as palavras que emprega o seu sentido “comum”, e pouco a pouco, por uma inversão de inicio insensível, a sua palavra vai dominando a sua linguagem, e é o emprego que lhe dá que acaba por revesti-la de uma significação nova e característica dele. Nesse momento, ele se fez compreender e sua significação instalou-se em mim. Diz-se que um pensamento é expresso quando as palavras convergentes que o visam são bastante numerosas e bastante eloqüentes para designá-lo sem equivoco a mim, autor, ou aos outros, e para que tenhamos todos a experiência de sua presença carnal na palavra. Embora 77 apenas uma Abschattungen (silhuetas) da significação sejam tematicamente dadas, a verdade é que, passado um certo ponto do discurso, as Abschattungen, consideradas em seu movimento, fora do qual nada são, contraem-se repentinamente numa única significação, sentimos que algo foi dito, assim como, acima de um mínimo de mensagens sensoriais, percebemos uma coisa, conquanto a explicitação da coisa vá por principio ao infinito – ou assim como, espectadores de um certo numero de condutas, acabamos por perceber alguém, Conquanto, perante a reflexão, nenhum outro além de mim mesmo possa ser verdadeiramente, e no mesmo sentido, ego... As conseqüências das palavra, como as da percepção (e da percepção do outro em particular), ultrapassam sempre as suas premissas. Nós mesmos, que falamos, não sabemos necessariamente melhor o que expressamos do que quem nos escuta. Digo que sei uma idéia quando se instituiu em mim o poder de organizar em torno dela discursos que fazem sentido coerente, e mesmo esse poder não se deve ao fato de eu a possuir dentro de mim e de contempla-la face a face, mas ao fato de eu ter adquirido certo estilo de pensamento. Digo que uma significação está adquirida e daí em diante disponível quando consegui fazê-la habitar num aparelho de palavra que inicialmente não lhe era destinado. Claro, os elementos desse aparelho expressivo não a continham realmente: a língua francesa, logo que foi instituída, não continha a literatura francesa – foi preciso que eu os descentralizasse e os centralizasse novamente para fazê-los significar aquilo que eu visava. É precisamente essa “deformação coerente” (A.Malraux) das significações disponíveis que as ordena num sentido novo e faz com que os ouvintes, mas também o sujeito falante, dêem um passo decisivo. Pois doravante as operações preparatórias da expressão – as primeiras paginas do livro – são retomadas no sentindo final do conjunto e se apresentam imediatamente como derivadas desse sentido, agora instalado na cultura. Será permitido ao sujeito falante (e aos outros) ir direto ao todo, não lhe será necessário reativar todo o processo, ele o possuirá eminentemente em seu resultado, terá sido fundada uma tradição pessoal e interpessoal. O Nachvollzu (reexecução), liberto dos tateamentos do Vollzug (execução), contrai as suas operações numa visão única, há sendimentação, e poderei pensar mais além. A palavra, enquanto distinta da lingua, é esse momento em que a intenção significativa ainda muda e inteiramente em ato mostra-se capaz de incorporar-se na cultura, a minha e a do outro, de formar-me e de formá-lo ao transformar o sentido dos instrumentos culturais. Torna-se “disponível”, por sua vez, 78 porque nos dá posteriormente a ilusão de que estava contida nas significações já disponíveis, quando na verdade só as adotou por uma espécie ardil, para lhes infundir uma nova vida. III. Conseqüências relativas à filosofia fenomenológica Que alcance filosófico deve-se reconhecer nessas descrições? A relação entre as análises fenomenológicas e a filosofia propriamente dita não é clara. Consideram-nas frequentemente preparatórias e o próprio Husserl sempre distinguiu as “Pesquisas fenomenológicas” em sentido lato e a “filosofia” que devia coroá-las. Entretanto é difícil sustentar que o problema filosófico permaneça intacto depois da exploração fenomenológica do Lebenswelt (mundo vivido). Se, nos derradeiros escritos de Husserl, a volta ao “mundo vivido” é considerada um primeiro procedimento absolutamente indispensável, e decerto por indispensável, e decerto porque não deixa de ter conseqüências para o trabalho de constituição universal que deve prosseguir, porque em certos aspectos permanece algo do primeiro procedimento no segundo, porque ele é aí conservado de alguma maneira e portanto nunca está totalmente superado, e porque a fenomenologia já é filosofia. Se o sujeito filosófico fosse uma consciência constituinte transparente, perante a qual o mundo e a linguagem fossem inteiramente explícitos como suas significações e seus objetos, qualquer experiência que fosse, fenomenológica ou não, bastaria para motivar a passagem à filosofia, e a exploração sistemática do Lebenswelt não seria necessária. Se a volta ao Lebenswelt, e em particular a volta da linguagem objetivada à palavra, é considerada absolutamente necessária isso quer dizer que a filosofia deve refletir sobre o modo de presença do objeto ao sujeito, sobre a concepção do objeto e a concepção do sujeito tais como se mostram na revelação fenomenológica, em vez de substitui-los pela relação do objeto com o sujeito tal como e concebida numa filosofia idealista da reflexão total. Por conseguinte, a fenomenologia é envolvente com relação à filosofia, que não pode vir pura e simplesmente agregar-se a ela. Isso fica particularmente claro quando se trata da fenomenologia da linguagem. Esse problema, com mais evidencia do que qualquer outro, obriga-nos a tomar uma decisão no tocante às relações entre a fenomenologia e a filosofia ou a metafísica. Pois, mais claramente do que qualquer outro, mostra-se ao mesmo tempo como um problema especial e como um problema que contém todos os outros. Inclusive o da filosofia. Se a palavra é isso que dissemos, como haveria uma 79 ideação que permitisse dominar essa práxis, como a fenomenologia da palavra não seria também filosofia da palavra, como, depois dela, haveria lugar para uma elucidação de grau superior? É-nos absolutamente necessária salientar o sentido filosófico da volta à palavra. A descrição que demos da potencia significante da palavra, e em geral do corpo como mediador de nossa relação com o objeto, não forneceria nenhuma indicação filosófica se pudéssemos considerá-la como questão de pitoresco psicológica. Admitiríamos então que na verdade o corpo, tal como vivemos, parecenos implicar o mundo, e a palavra uma paisagem de pensamento. Mas isso seria mera aparência: ante o pensamento sério, meu corpo permaneceria objeto, minha consciência permaneceria consciência pura, e a coexistência de ambos o objeto de uma apercepção da qual, como pura consciência, eu permaneceria o sujeito (é mais ou menos assim que as coisas se apresentam nos escritos antigos de Husserl). Assim também, se a minha palavra ou aquela que ouço são ultrapassadas na direção de uma significação, e visto essa relação, como toda relação, só poder ser colocada por mim como consciência, a autonomia radical do pensamento se encontraria restabelecida no instante mesmo em que parecia controvertida... Entretanto em nenhum dos dois casos posso remeter à simples aparência psicológica o fenômeno da encarnação, e, se estivesse tentado a fazê-lo, seria impedido pela percepção do outro. Pois, na experiência do outro, mais claramente (mas não diferentemente) do que na da palavra ou do mundo percebido, apreendo inevitavelmente meu corpo como uma (espontaneidade que me ensina aquilo que não poderia saber a não ser por ela). A posição do outro como um outro eu mesmo não é realmente possível se for a (consciência) que deve efetuá-la: ter consciência é constituir, logo não posso ter consciência do outro, já que isso seria constitui-lo como constituinte, e como constituinte com relação ao próprio ato pelo qual o constituo. Essa dificuldade de principio, colocada com um marco no inicio da quinta Meditação cartesiana, não foi removida em parte alguma. Husserl passa adiante: uma vez que tenho a idéia do outro, É porque, de alguma maneira, a dificuldade mencionada foi, de fato, superada. Só pode sê-lo se aquele que, em mim, percebe o outro é capaz de ignorar a contradição radical que torna impossível a concepção teórica do outro, ou melhor (pois se a ignorasse já não seria com o outro que teria relações), capaz de viver essa contradição como a própria definição de presença do outro. Esse sujeito, que se sente constituído no momento em que funciona como 80 constituinte, é o meu corpo. Lembramos como Husserl acaba por fundar sobre aquilo a que a chama “fenômeno de emparelhamento” e “transgressão intencional” minha percepção de uma conduta (Gebaren) no espaço que me circunda. Ocorre que, em certos espetáculos- os outros corpos humanos e, por extensão, animais -, meu olhar esbarra, é seduzido. Sou investido por eles enquanto julgava investi-los, e vejo desenhar-se no espaço uma figura que desperta e convoca as possibilidades do meu próprio corpo como se se tratasse de gestos ou de comportamentos meus. Tudo se passa como se as funções da intencionalidade e do objeto intencional se encontrassem paradoxalmente trocadas. O espetáculo convida-me a tornar-me seu espectador adequado, como se um outro espírito que não o meu viesse repentinamente habitar meu corpo, ou antes, como se meu espírito fosse atraído para lá e emigrasse para o espetáculo que estava concedendo a si mesmo, sou apanhado por um segundo eu mesmo fora de mim, percebo o outro... Ora, a palavra é evidentemente um caso eminente dessas “condutas” que invertem a minha relação comum com os objetos e dão a alguns deles valor de sujeitos. E se, quanto ao corpo vivo, o meu ou o do outro, a objetivação não faz sentido, deve-se também considerar fenômeno último, e constitutivo do outro, a encarnação daquilo a que chamo seu pensamento na sua palavra total, se realmente a fenomenologia não envolvesse já a nossa concepção do ser e a nossa filosofia, nos defrontaríamos novamente, ao chegar ao problema filosófico com as mesmas dificuldades que suscitaram a fenomenologia. Num sentido, a fenomenologia é tudo ou nada. Essa ordem da espontaneidade ensinante – o “eu posso” do corpo, a “transgressão intencional” que da o outro, a “palavra” que dá a idéia de uma significação pura ou absoluta - não pode ser depois recolocada sob a jurisdição de uma consciência acósmica e pancosmica sob pena de voltar a não ter sentido, ela deve ensinar-me a conhecer o que nenhuma consciência constituinte pode saber: o fato de eu pertencer a um mundo “pré-constituido”. Como é, objetarão, que o corpo e a palavra podem me dar mais do que coloquei neles? Evidentemente não é meu corpo como organismo que me ensina a ver, numa conduta de que sou espectador, a emergência de um outro eu mesmo: quando muito ele poderia refletir-se e reconhecer-se num outro organismo. Para que o alter ego e o outro pensamento me apareçam, é preciso que eu seja eu de esse corpo meu, pensamento de essa vida encarnada. O sujeito que realiza a transgressão intencional só o poderia fazer na medida em que está situado. 81 A experiência do outro é possível na exata medida em que a situação faz parte do Cogito. Mas então também devemos tomar ao pé da letra o que a fenomenologia nos ensinou sobre a relação entre o significante e o significado. Se o fenômeno central da linguagem é realmente o ato comum do significante e do significado, suprimiríamos sua virtude realizando de antemão céu das ideias o resultado das operações expressivas, perderíamos de vista o passo que elas dão das significações já disponíveis para aquelas que estamos construindo ou adquirindo. E o duplo inteligível sobre o qual tentaríamos fundá-las não nos dispensaria de compreender como o nosso aparelho de conhecimento se dilata até compreender o que não contém. Não faríamos a economia de nossa transcendência ordenando-a num transcendente de fato. O lugar da verdade continuaria a ser de qualquer modo essa antecipação ( Vorhabe) pela qual cada palavra ou cada verdade adquirida abre um campo de conhecimento, e a retomada simétrica (Nachvollzug) pela qual concluímos esse devir do conhecimento ou essa relação com o outro e os contraímos numa nova visão. As operações expressivas atuais, em vez de expulsarem as precedentes, de as sucederem e de simplismente as anularem, salvam-nas, conservam-nas, retomam-nas na medida em que estas continham alguma verdade, e o mesmo fenômeno ocorre relativamente às operações expressivas do outro, sejam elas antigas ou contemporâneas. Nosso presente mantém as promessas de nosso passado, nós mantemos as promessas dos outros. Todo ato de expressão literária ou filosófica contribuiu para cumprir o voto de recuperação do mundo foi pronunciado com o aparecimento de uma língua, isto é, de um sistema finito de signos que em princípio se pretendia capaz de captar qualquer ser que se apresentasse. No que lhe concerne, realiza uma parte desse projeto e prorroga o pacto que acaba de chegar ao vencimento abrindo um novo campo de verdades. Isso só é possível mediante a mesma “transgressão intencional” que dá o outro, e, como ela, o fenômeno da verdade, teoricamente impossível, apenas é conhecido pela práxis que a faz. Dizer que há uma verdade é dizer que, quando por nossa vez reencontramos o projeto antigo ou alheio e a expressão bem-sucedida liberta o que estava cativo no ser desde sempre, estabelece-se na espessura do tempo pessoal e interpessoal uma comunicação interior pela qual o nosso presente torna-se a verdade de todos os outros acontecimentos cognoscentes. É como uma cunha que cravamos no presente, um 82 marco que atesta que nesse momento ocorreu algo que desde sempre o ser esperava ou “queria dizer”, e que nunca deixará, quando não de ser verdadeiro, ao menos de significar e de excitar o nosso aparelho pensante, se preciso for extraindolhe verdades mais compreensivas do que aquela. Nesse momento algo foi fundado em significação, uma experiência foi transformada em seu sentido, tornou-se verdade. A verdade é um outro nome da sedimentação, que por sua vez é a presença de todos os presentes no nosso. É dizer que, mesmo e sobretudo para o sujeito filosófico ultimo, não existe objetividade que explique a nosa relação superobjetiva com todos os tempos, não há luz que exceda aquela do presente vivo. No texto tardio que citávamos no inicio, Husserl escreve que a palavra realiza uma “localização” e uma “temporalização” de um sentido ideal que, “segundo o seu sentido de ser”, não é nem local nem temporal – e acrescenta mais adiante que a palavra também objetiva e abre à pluralidade dos sujeitos, a titulo de conceito ou de preposição, o que antes não passava de uma formação interior a um sujeito. Haveria portanto um movimento pelo qual a existência ideal desce a localidade e a temporalidade – e um movimento inverso, pelo qual o ato da palavra aqui e agora funda a idealidade do verdadeiro. Esses dois movimentos seriam contraditórios se ocorressem entre os próprios termos extremos e parece-nos necessário conceber aqui um circuito da reflexão: ela reconhece numa primeira aproximação a existência ideal como nem local, nem temporal – a seguir repara numa localidade e numa temporalidade da palavra que não podemos derivar daqueles do mundo objetivo, nem aliás suspender a um mundo das idéias, e finalmente faz o modo de ser das formações ideais repousar na palavra. A existência ideal é fundamentada no documento, não decerto como objeto físico, nem sequer como portador das significações uma a uma que lhe destinam as convenções da língua em que é escrito, mas na medida em que ele, ainda por uma “transgressão intencional”, solicita e faz convergir todas as vias cognoscentes, e sob esse aspecto instaura e restaura um “logos” do mundo cultural. Parece-nos, pois que a peculiaridade de um filosofia fenomenologica é estabelecerse a titulo definitivo na ordem da espontaneidade ensinante que é inacessível ao psicologismo e ao historicismo, assim como às metafísicas dogmáticas. Tal ordem, a fenomenologia da palavra é a mais apta de todas para nos revelar. Quando falo ou quando compreendo, experimento a presença do outro em mim ou de mim no outro que é o obstáculo da teoria da intersubjetividade, a presença do representado que é 83 o obstáculo da teoria do tempo, e compreendo afinal o que quer dizer a enigmática proposição de Husserl: “ A subjetividade transcendental é intersubjetividade.” Na medida em que o que digo tem sentido, sou para mim mesmo, quando falo, um do outro “outro”, e, na medida em que compreendo, já não sei quem fala e quem ouve. A ultima operação filosófica é reconhecer o que Kant chama de “afinidade transcendental” dos momentos do tempo e das temporalidades. Por certo é isso que Husserl procura fazer quando retoma o vocabulário finalista dos metafísicos, falando de “mônadas”, “enteléquias”, “teleologia”. Mas esses termos são amiúde postos entre aspas para significar que ele não pretende introduzir com eles algum agente que asseguraria do exterior a conexão dos termos postos em relação. A finalidade para o sentido dogmático seria um compromisso: deixaria frente a frente os termos por ligar e o principio de ligação. Ora, é no âmago do meu presente que encontro o sentido daqueles que o precederam, que encontro o modo de compreeder a presença do outro no mesmo mundo, e é no próprio exercício da palavra que aprendo a compreender. Não há finalidade senão no sentido em que Heidegger a definia quando dizia aproximadamente, que ela é o tremor de uma unidade exposta à contingência e que se recria infatigavelmente. E era à mesma espontaneidade não-deliberdada, inesgotável, que Sartre aludia quando dizia que estamos ”condenados à liberdade”. 84 CAPÍTULO III ANÁLISE DE DADOS E RESULTADOS DA PESQUISA Neste trabalho pretendemos discutir alguns aspectos do processo inicial de incorporação dos modos de organização de enunciados requeridos na produção da linguagem escrita. Apesar de diferenças importantes existentes entre fala e escrita, esta implica, tanto quanto aquelas possibilidades e demandas de um jogo interativo. Nas palavras de Geraldi (1991), para produção de um texto escrito ou oral, é necessário que: a) Se tenha algo a dizer; b) Se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer; c) Se tenha para quem dizer o que se tem a dizer; d) O locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que diz o que diz para quem diz (ou, na imagem wittgensteiniana, seja um jogador no jogo); e) Se escolham as estratégias para realizar (a),(b),(c) e (d). (p.137) Esse mesmo autor afirma que, na produção de um texto o locutor faz “uma proposta de compreensão” ao interlocutor e, no processo de produção, desenvolve ações com a linguagem e sobre a linguagem. O que nos interessa, no presente trabalho, é o desenvolvimento, na criança, da capacidade de fazer “proposta de compreensão” e a emergência de ações sobre a linguagem na produção de escrita. A complexa coordenação de operações implicadas no escrever é dominada num longo processo. A analise de indicadores da capacidade da criança para planejar a escrita mostra que seu esforço de antecipar o texto se desenvolve através de decisões tomadas unidade a unidade ; de inicio, a unidade corresponde a aproximadamente a sentença e só gradualmente se amplia para blocos de sentença (kress, 1982). Num caso, o escritor conta com o que sabe ou quer dizer sobre um tópico, conforme se lembra, sem considerar deliberadamente princípios de discurso ou a perspectiva do leitor. No outro caso essas exigências são atendidas e o escrever é assumido como uma situação problema de envolve aspectos retóricos e de conhecimento. 85 No tratamento desses aspectos, o escritor examina a adequação dos enunciados, identifica inconsistências, descobre novas relações e, assim, transforma seu pensamento. As indicações da pesquisa sobre o escritor iniciante são certamente uteis para caracterizar suas capacidades e limitações. Contudo, é necessário recordar que não se trata de características que devem inevitavelmente perdurar ate que uma nova etapa de um processo abstrato de maturação se instale o percurso de crescimento se faz tanto pela atividade do sujeito, fundada em estratégias e conhecimentos já construídos, quanto pela participação de agentes mediadores, em especial aqueles presentes no contexto escolar. A ação reflexiva pode ser entendida como aquela que é tomada como objeto de atenção pelo próprio sujeito. Trata-se não só de saber fazer, mas também de pensar sobre o que e como se faz. Abordando a reflexividade na esfera mais geral da conceptualização, Vygotsky (1987) argumentava que as concepções espontâneas infantis são por longo tempo não reflexivo, ou não consciente, porque a atenção da criança está centrada no objeto a que o conceito se refere e não no ato de conceitualizar o objeto. Transpondo esse argumento para o âmbito das ações discursivas podemos dizer que a atenção da criança está inicialmente centrada mais no objeto do dizer – naquilo sobre o que se diz – do que no próprio dizer – no que e no como se diz. Com a expansão da experiência comunicativa, independendo da qualidade das trocas sociais vão surgindo num longo processo, níveis crescentes de reflexividade (revelados, por exemplo, pela capacidade de julgar a adequação de enunciados ou pela auto-correção da linguagem). Nosso interesse está voltado aqui, para dimensão reflexiva inicial. Julgamos que a escrita é uma instancia propicia para a emergência e elevação dos níveis de reflexividade na esfera da linguagem e, por decorrência, da atividade mental. A veiculação que buscamos estabelecer entre a escrita e a reflexividade é derivada, em parte, de estudos (antes mencionados) sobre planejamento e revisão, os quais mostram uma transformação evolutiva das estratégias na relação que o sujeito mantem com o seu texto. Além disso, aquela vinculação se justifica por considerações mais gerais sobre as funções da linguagem no desenvolvimento psicológico, como proposta na perspectiva histórico-cultural. Vygotsky (1984,1987) argumentava que a linguagem se constitui primariamente do plano do funcionamento comunicativo, envolvendo regulações 86 reciprocas entre crianças e outros, e desse processo diferencia-se o funcionamento individual, pelo qual a linguagem passa a ser orientada para si, servindo à autoorganização e auto-regulação. Expandido essa proposição para a linguagem escrita podemos dizer que, também nesta, o duplo funcionamento se faz presente: da interação enunciadorenunciatario, que caracteriza a função comunicativa, nasce uma relação do sujeito com sua própria escrita. Não se trata, apenas, de situações em que o sujeito lê para recordar-se do que escreveu, ou em que escreve para se organizar (por exemplo, ao fazer uma lista de compras). O funcionamento individual implica, sobretudo, que a escrita se transforma em meio de ação reflexiva, permitindo ao sujeito formular enunciados deliberadamente e tomá-los como objeto de analise em termos de adequação, consistência, logica etc. Não estamos presumindo que o trabalho de escritura se torne uma atividade reflexiva de modo pleno e constante, mesmo entre escritores experientes; na alternância de planejar, escrever analisar e reescrever segmentos de texto, as operações reflexivas podem ter um caráter fugas, episódico, irregulares. Entretanto, apesar desse caráter, vemos a emergência de novas formas de relação com a própria linguagem como um processo muito relevante para o desenvolvimento do sujeito. Tal expansão do funcionamento da escrita não é, em geral, explorada no contexto escolar, configurando uma omissão que cria, ao lado do problema social do analfabetismo propriamente dito e do analfabetismo funcional, a questão do “analfabetismo restrito”, que afeta a muitos dos que conseguem superar o mecanismo da exclusão da escola (Góes, 1990). Esta ultima condição caracteriza o sujeito que registra interpreta a escrita, mas que mostra uma limitada capacidade para atender ao caráter comunicativo da produção e, mais importante, uma reduzida disposição a tratar a escrita como instancia de ação sobre a linguagem e de organização ou transformação do pensamento. A diferenciação funcional da escrita pode ou não avançar dependendo da qualidade das experiências sobre tudo as escolares, com a produção e análise de textos. O desencadeamento desse processo requer que o escritor comece a considerar as implicações do caráter dialógico do ato de escrever, tomando, ao 87 mesmo tempo, o dizer do texto como objeto de atenção e o leitor como um sujeito que constrói sentidos a partir de pistas do texto. Supomos que dentre outras condições para esse refinamento está a possibilidade de interação com um “representante do leitor”, um interlocutor imediato que aponte para o sujeito as exigências de compreensão do leitor, visto ser fundamental a participação de outros, no jogo de relações face-a-face que se dão em torno do texto. Nessa interlocução sobre o caráter significativo e comunicativo da escrita, pode-se configurar o leitor, primeiro representado (ou personificado) pelo interlocutor imediato que negocia sentidos, analisando e operando com a criança sobre o texto. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. 88 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Dos alunos questionado 85% afirmaram gostar de estudar. A revisão parece especialmente difícil para criança pequena porque, como sugeriu Daiute (1985), envolve o julgamento sobre o processo de criação do texto, o 89 que implica assumir um ponto de vista objetivo sobre os próprios pensamentos e sentenças FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. A maioria dos alunos, ou seja, 82% são novatos. Também quanto a revisão, os estudos indicam a existência de esrategias muito limitadas em crianças e ate em escrtores de mais idade (Graves, 1979; Scardamalia e Bereiter, 1987, 1987). A tendência que aparece é a de limitar a tarefa de revisar, privilegiando mudanças de superfícies, que não afeta o significado dos enunciados e que, frequentemente, se resumem a questões de palavras isoladas ou correção ortográfica. Mudanças de base que afetam o significado do texto, não são em geral abordadas (Sommers, 1980; Hayes et al., 1987). 90 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Dos entrevistados, 79% afirmaram que durante as aulas de língua portuguesa você tem facilidade em compreender as explicações do seu professor :Scardamalia & Bereiter (1987) sugere a existência de abordagens distintas na elaboração de textos por escritores iniciantes e experientes. Para os primeiros, o escrever seria uma instancia de relato de conhecimento, enquanto que, para os segundos, envolveria uma transformação do conhecimento. 91 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. A leitura é um dos principais instrumentos de aquisição dos conhecimentos transmitidos no contexto educativo. Quando um aluno manifesta problemas de aprendizagem com certeza que haverá factores que contribuem para o fracasso escolar. Estes factores podem ser exteriores ao indivíduo ou ambientais, como sejam desvantagens económicas, sociais, culturais, falta de oportunidades, abandono escolar ou mesmo ensino inadequado. Mas os factores também podem ser intrínsecos, próprios do indivíduo, como deficiência mental, problemas sensoriais, alterações emocionais, dificuldades de aprendizagem específicas. Estes problemas de aprendizagem situam-se ao nível cognitivo e neurológico não existindo uma explicação evidente. Certos autores referem que as dificuldades de aprendizagem específicas resultam de uma condição patológica, outros de um atraso ou distúrbio de desenvolvimento de alguns centros cerebrais e ainda podem advir de disfunções cerebrais mínimas (Correia, 2008; Cruz, 2007). 92 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. A leitura e a função da leitura compreendem papéis distintos, isto é, enquanto a leitura tem a ver com a descodificação ou a identificação de palavras, a função da leitura diz respeito à compreensão. Para Gough, Juel & Griffith (1992, in Linuesa & Gutiérrez, 1999) citados por Cruz (2007), a leitura “é igual ao produto da descodificação e da compreensão, incluindo assim tanto o domínio das habilidades de reconhecimento das palavras como o domínio das estratégias de compreensão”. Para se compreender o que se lê é preciso descodificar e para que a descodificação se realize é necessária a identificação das palavras escritas se processe de um modo automático. Assim, se o leitor estiver preocupado em descodificar e em alcançar o significado lexical das palavras utilizará a maior parte da sua capacidade cognitiva e de atenção neste processo em prejuízo dos processos de interpretação do texto. Como tal as duas componentes principais envolvidas na leitura (descodificação e compreensão) estão relacionadas com os elementos do sistema de linguagem. 93 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Também Sim-Sim (2006, p.19) reforça esta ideia referindo que “ler com fluência implica possuir uma rápida capacidade de descodificação e um domínio das estruturas semântico-sintácticas que possibilitem a compreensão do texto escrito”. 94 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Bechara (2005, p. 50) A gramática tenta codificar e fixar o chamado uso idiomático. Desta maneira, ela assumi um papel originariamente didático, entretanto como pretende fixar esse mesmo uso a gramatica passa a ser dogmática, na medida em que se reveste da prerrogativa de ser uma gramatica acadêmica ou de autoridade. E ai, ao agasalhar certos usos e ao repudiar outros, ela se na contingencia de dar os porquês, de oferecer explicações: assim, aspira ser cientifica. E é ai nesse momento que ela assume um terceiro papel, aquele que, pelos interesses teóricos, a faz aproximar-se, às vezes invadir e outras tantas confundir-se com a gramatica 95 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Para Cruz, 2007, a leitura é uma atividade linguística secundaria, pois segundo ele depende da fala e os processo fonológicos são determinantes para eficiência da leitura. Neste modelo falta a explicação a cerca dos processos estratégicos criança utiliza para selecionar um caminho e fornecer uma determinada resposta. 96 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Podemos, com Wagner e Pinchon, dizer que o ensino dessa gramática normativa pertence mais à educação que à instrução: ele pretende mostrar ao falante como dizer isso e repelir aquilo para atender aos usos e seleções esperados de uma pessoa culta. É uma atitude modelar diante da língua, igual à que deve assumir ao se dirigir aos mais velhos ou ao sair de um elevador, por exemplo, entre outras “boas maneiras”. 97 QUESTIONARIO APLICADO AOS PROFESSORES: FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. 98 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Antes do período formal de alfabetização, a criança faz uso da estratégia logográfica, marcada pelo uso de pistas contextuais, como cor, fundo e forma das 99 palavras. Sem essas pistas o reconhecimento não é possível, uma vez que o leitor relaciona a palavra com seu contexto específico. Um exemplo de uso da estratégia logográfica é a leitura dos rótulos mais comuns no dia-a-dia do leitor. Marsh e Frith propõem que na fase inicial de aprendizagem da leitura a criança ainda não dispõe de conhecimento fonológico pelo que lê de uma forma visual e semântica. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Justifica-se conforme Bechara que a língua funcional na modalidade familiar ou coloquial como fator de manifestação da liberdade de expressão do homem. Liberdade que abarca diversas realidades de dialetos, nível social e estilo de língua. 100 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Em síntese, podemos afirmar que na aquisição da leitura existem diversas fases que se pode distinguir por diferentes estratégias que as crianças utilizam para ler. Assim, para aprender a criança tem de adquirir duas competências básicas: a capacidade de tratar o código alfabético de tratar conceptualmente o texto. A aprendizagem da leitura começa muito antes da instrução formal, ela tem início logo que a criança entra em contato, ainda que informal, com os mate escritos existentes no contexto em que está inserida, o que irá posteriormente influencia a prendizagem formal. Estas influências são visíveis no que se refere às competência fonológicas. 101 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Muito pouco se sabe sobre as práticas de ensino de leitura desenvolvidas dentro da sala de aula ao longo da educação básica. A aprendizagem formal da leitura numa língua de escrita alfabética requer que os futuros leitores tomem consciência de que a escrita é conduzida pelo princípio da correspondência entre unidades sonoras e unidades gráficas. Além disso, ler implica saber reconhecer e nomear as letras, juntá-las e combiná-las com a finalidade de praticar a recodificação fonética, ou seja, a leitura é uma competência que não se desenvolve espontaneamente, ela requer motivação, esforço e muita prática, visto tratar-se de uma aprendizagem consciente.. 102 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Ao se tratar do taquipsiquismo, quando ocorre a aceleração de todas as funções psíquicas (pensamento, psicomotricidade, linguagem, etc). A maioria dos entrevistados,, disse nunca ter ouvido falar dessa patologia que é observada ,principalmente, em estados maníacos. Um estado afetivo comumente encontrado na hipomania ou mania, ou seja, na euforia. Seria como se a eloquência na produção de ideias superasse a capacidade de verbalizá-las. Os chistes também são descritos como “contraste de ideias”, “o sentido do nonsense”, “desconcetro e esclarecimento”. Mais ainda, “o chiste é a conexão ou ligação arbitrária, por meio de uma associação verbal, de duas ideias que, de algum modo, cotrastam entre si”(Kraepelin apud Longo, 2006, p. 27). O contraste persiste porque atribuímos às palavras um significado que, entretanto, não lhes podemos garantir. Ou seja, aquilo que num certo momento nos pareceu ter um significado, verificamos, depois do chiste feito, que é completamente destituído de sentido. Eis o processo psicológico, sobre o qual repousa o cômico, que o comentário chistoso provoca: a transição imediata de atribuição de sentido, dessa descoberta da verdade e de suas consequências, a consciência ou impressão de nulidade. O fator de desconcerto seguido de esclarecimento leva à relação entre o chiste e o cômico. Kant afirma que o cômico tem a notável característica de ser capaz de nos enganar por uns instantes. Um exemplo que Freud cita , e Lacan comenta mais tarde, é um chiste que o poeta alemão Heinrich Heine coloca na fala de um de seus 103 personagens: o pobre agente de loteria diz que foi tratado “familionariamente”(“familiar + “milionário”) pelo barão Rothschild. O efeito cômico é produzido após o desconcerto de pensar que o agente de loteria estava errado ao pronunciar a palavra. O esclarecimento advém da compreensão de que ele estava certo! Outra característica essencial do chiste é a brevidade. O chiste diz o que tem a dizer com um mínimo de palavras; pode-se mesmo ser chistoso sem dizer nada. Não custa lembrar a fala do falastrão Polônio(em Hamlet): “Já que a brevidade é a alma do chiste... serei breve”. Para Freud, os chistes têm mais conexão com a caricatura, que se interessa mais pelo que é feio, do que com o cômico, apesar de Fischer tê-los situado entre uma e outro, se o que é feio foi ocultado (e os chistes devem trazer algo escondido),deve vir à luz pelo modo cômico de olhar as coisas. Se algo é pouco notado, deve sera presentado e tornado óbvio. Dái nasce a caricatura. Ao desvendar a técnica dos chistes, Freud observa que ela está diretamente relacionada com o inconsciente. A analogia baseia-se fundamentalmente no processo da elaboração onírica, quando o material dos pensamento dos sonhos é submetido a uma extraordinária compressão ou condensação, uma característica dos sonhos facilmente reconhecível: basta comparar o texto de um sonho anotado com o registro de pensamento oníricos. O texto é longo e o registro é sumário. Quanto ao deslocamento, no sonho significa que o material periférico pouco importante pode ocupar posição central e vice-versa. Os chistes têm conexão com formas de expressão ou técnicas entre as quais a condensação, o deslocamento e a representação indireta são as mais surpreendentes. Sua analogia com a elaboração onívira é a seguinte: a regressão está ausente nos chistes, mas os outros dois estágios da formação onírica, o mergulho de um pensamento pré-consciente no inconsciente e sua revisão inconsciente, podem ocorrer na formaçao dos chistes. Hipoteticamente, um chiste é formado assim: um pensamento pré-consciente, e o resultado disso é imediatamente capturado pela percepção consciente. Além disso, apesar da expressão “fazer um chiste”, sabe-se que ele nos ocorre involuntariamente; não sabemos, nem um segundo antes, que chiste vamos fazer ou com que palavras vamos vestí-lo. Antes do chiste, nos ocorre um sentimento de “ausência”, de repentino relaxamento da tensão intelectual e, então, imediatamente, lá está o chiste, já vestido com as palavras certas! Um processo bem 104 diferente ocorre com a técnica da analogia ou da alusão: ambas são decisões de liberadas do pensamento. Finalmente, o chiste é um triunfo público do sujeito do inconsciente em relação ao recalcamento, o qual fica suspenso por alguns segundos. Diferente das outras formações do inconsciente (atos falhos, sonhos, sintomas), que são privativas do sujeito, o chiste é partilhado socialmente, é a única expressão social do sujeito do inconsciente. Sem mencionar o momento de relaxamento e enorme prazer que ochiste provoca em todos; um prazer compartilhado pelo riso e pelo alívio das tensõespor parte de quem faz e de quem ouve e entende. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2010 a 2014. Não existem erros nem em leitura, nem em escrita que se possam considerar como típicos dos disléxicos; os erros que cometem esses alunos são os mesmos dos que estão aprendendo a ler ou dos que já lêem corrido, diferenciando-seu nicamente pelo fato de perdurarem por mais tempo e serem cometidos em maior quantidade, se compararmos o mau leitor com o leitor corrente. (FERREIRO, 1990,p. 55)Dentre essas dificuldades, pode-se destacar: demora a aprender a falar, a amarrar os cadarços, a reconhecer as horas; dificuldade em escrever números; dificuldade em ordenar as letras do alfabeto, os meses do ano; dificuldade em distinguir esquerda e direita; a compreensão da leitura se faz de forma mais lenta do que o esperado para a idade; a aprendizagem das quatro operações também élenta; 105 insegurança e baixa apreciação de si mesma; atrapalha-se ao pronunciar palavras longas. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. A maioria dos investigadores concorda que para o aluno ser um bom leitor tem que dominar os principais blocos de construção da linguagem escrita, ou seja, a linguagem escrita representa a linguagem falada, as palavras podem ser dividida sem sons e que as letras representam esses sons (Hallahan, Kaufman & Lloyd, 1999citados por Cruz, 2007). Nesta abordagem fica claro que as crianças têm que perceber o princípio alfabético, que a cada letra está associado um som. Nestes métodos, os procedimentos de ensino de leitura têm como ponto de partida as letras(grafemas) e sons (fonemas). A criança começa por aprender o abecedário e associar cada nome de letras a um símbolo verificando que existe uma correspondência entre o oral e o escrito. Seguidamente, aprende a juntar consoante com vogal e a formar sílabas, para chegar a estruturas mais complexas: as frases e os textos. 106 FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. A investigação no que diz respeito às diferentes abordagens do ensino da leitura têm evidenciado que, segundo Hallahan, Kaufman & Lloyd, (1999), citados por Cruz, (2007, p. 148) “o método de ensino da leitura usado tem influência no modo como as pessoas lêem, sendo mesmo sugerido que é quase certo que os erros que as crianças cometem quando lêem diferem em função do modo como foram ensinadas a ler”. Em relação à opção de escolha sobre o melhor método de ensino da leitura e dado que as duas abordagens têm vantagens e desvantagens, alguns autores alegam que o melhor é “um equilíbrio entre os diferentes métodos, que incorpore tanto a instrução direta do principio alfabético, como uma abordagem baseada nos ignificado, ou seja, os educadores e professores devem incluir a exposição de várias abordagens práticas, integrando diferentes tipos de instrução” (Cruz, 2007, p.150). Domínio da leitura. A consciência fonológica é uma competência difícil de adquirir, pois na linguagem oral não é perceptível a audição separada dos diferentes fonemas (por exemplo quando ouvimos a palavra “pai” ouvimos os três sons conjuntamente e não três sons individualizados). Estas atividades de processamento fonológico (consciência fonémica, consciência 107 fonológica e domínio do princípio alfabético) são denominadas de próximas. Porém, tendo em conta que a compreensão de um texto lido envolve a coordenação de um conjunto de processos cognitivos, que vão da consciência fonológica à descodificação e leitura de palavras, é necessário perspectivar outros processos denominados de distais. Estes são mais gerais e há cada vez mais evidências de que existem fatores cognitivos não fonológicos que se manifestam na eficácia da aprendizagem e uso da leitura (Cruz,2007). FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. Para Nunes, (2001), expressar sentimentos, partilhar informação, dizer piadas, interagir com os outros, enfim comunicar, faz parte da essência do ser humano. A comunicação é de enorme importância para a vida de e uma pessoa, pois contribui para a sua autoconfiança e a sua autoestima e para se divertir na vida. A comunicação humana implica interações e envolve ações, palavras, sons, gestos, posturas, expressões corporais, é o modo como o Homem se exprime, trabalha, se diverte e ama. Partindo desta perspectiva, comunicar é vital para o desenvolvimento da pessoa, para a manutenção da sua saúde e do seu bem-estar. A maior parte dos conhecimentos aprendidos pelas crianças durante a infância surgem através da relação com os outros (adultos ou crianças), do que estes lhe contam e explicam, mas também vendo e ouvindo o que os outros dizem e fazem. Através dessas interações aprendem a comunicar; aprendem o significado dos objetos, das 108 expressões faciais, dos gestos, dos movimentos e da fala. Desta forma, a criança adquire os conceitos e apropria-se de conhecimentos. A autora refere ainda (Downing, 1999) .“As crianças começam a comunicar através de formas muito simples e depois com o crescimento vão desenvolvendo formas mais complexas, de acordo com assuas capacidades motoras e cognitivas. Cada uma desenvolve um sistema de comunicação único, baseado nas suas necessidades individuais e nas suas capacidades para interagir com as pessoas e os objetos do seu ambiente. Uma vez que consigam comunicar com sucesso terão a base para poder adquirir sistemas mais complicados para enviar mensagens (SKI-HI Institute, 1997). A linguagem não constitui a única forma de expressão, de comunicar, o que se quer ou o que se sente, pois as pessoas comunicam de diferentes formas, através de expressões corporais e faciais, de movimentos, de objetos, de gestos. Comunicar não se trata de um ato solitário, nem apenas de transmissão de ideias, sentimentos, conhecimentos, desejos e necessidades. Transmitir e receber requer capacidade de atenção e concentração, a partilha de informação, trata-se de uma partilha entre emissor e receptor. É uma dinâmica de comunicação expressiva/receptiva, não apenas falar e ouvir mas falar e compreender o conteúdo da mensagem transmitida, saber descodificar e consequentemente conhecer e utilizar o código comum. Nunes C.-2001-Ministério da Educação Aprendizagem Ativa na Criança com Multideficiência. Implica ao mesmo tempo a utilização correta do aparelho fonador, necessário para uma boa articulação dos músculos da laringe, da língua, entre outros como o bom funcionamento de todo este conjunto, complexo física e mentalmente. Cada criança ou adulto pode ter maior ou menor capacidade para cada uma, ou ambas as vertentes desta dinâmica (receber e emitir) consoante as suas características e o seu historial (genético, ambiental…). Como podemos ver em Vygotsky compreender as palavras dos outros requer de nós que compreendamos também os seus pensamentos, o que implica um conhecimento que vai para além do que é dito. E até mesmo esta compreensão é insuficiente se não compreendermos assuas motivações ou porque exprimem eles os seus pensamentos. É precisamente neste sentido que só completamos a análise psicológica de um qualquer enunciado 109 quando atingimos o plano interno mais secreto do pensamento verbal – ou seja, a sua motivação. Comunicar é um ato físico, mental, social e emocional. Ao reconhecer a semelhança entre o comportamento verbal humano e a sua réplica a nível sub - humano, pode ainda afirmar-se que existe uma diferença fundamental entre ambos (…). Mais impressionante ainda do que a capacidade de usar palavras abstratas é a facilidade com que usamos palavras (…). Deste modo, como tem sido proposto, a linguagem humana é qualitativamente diversa de qualquer sistema de comunicação entre os animais inferiores, quer no aspeto semântico (significação), quer no sintático (regras de ordenação de palavras). Nunes (2001) Para Descartes: é coisa digna de nota que não há ninguém tão embrutecido e tão estúpido… que não seja capaz de combinar diversas palavras e de compor com elas um discurso, pelo qual exprima os seus pensamentos; isto não acontece com qualquer outro animal, por muito perfeito ou afortunado que tenha sido. Temos frequentemente conhecimento através de diversas fontes de informação, programas de estudos científicos onde são feitas experiências com chimpanzés onde estes são submetidos a treinos intensivos de forma a desenvolvera comunicação entre estes e o homem. Apesar de alguns resultados positivos em termos de compreensão de determinados códigos não há indícios de desenvolvimento da linguagem verbal, por maior que seja a semelhança genética. Pensamento e Linguagem, Lev Vygotsky – Relógio D’ Água Editores – 2007Embora de início pareça existir um desenvolvimento idêntico nos primeiros meses deidade, é a partir da altura em que a linguagem começa a desenvolver-se na criança que surge a grande discrepância entre estes dois seres, onde podemos verificar que o ser humano é realmente dotado de uma capacidade única entre o reino animal. Também Chomsky (1968), o linguista moderno de maior prestígio, afirma: …apenas o ser humano tem capacidade inata para a linguagem; qualquer tentativa para ensinar ao macaco a linguagem humana caminhara inevitavelmente para o 110 fracasso. Embora a convicção de Chomsky se baseie na sua teoria do desenvolvimento linguístico, há provas a favor da sua opinião (…). É dito por Sousa Lopes (2008), que a comunicação é uma atividade universal e que desde que o mundo existe houve necessidade de os seres comunicarem entre si, tratando-se de um processo ativo de troca de informação que envolve codificação(ou formulação) e descodificação (ou compreensão) de uma mensagem entre dois intervenientes que quanto mais alargada e diversificada for a sua experiência mais elaborada será a sua mestria linguística e maior será a possibilidade de discutir, apreciar e obter significado do que lhe é DITO. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. A criança com dificuldade na aprendizagem pode desenvolver sentimentos de baixa autoestima e inferioridade (Erikson, 1971 citado por Santos e Marturano, 1999), frequentemente acompanhadas de déficits em habilidades sociais e problemas emocionais ou de comportamento (Elias, 2003; Motta, 2003). Assim, as dificuldades de aprendizagem, quando persistentes e associadas a fatores de risco presentes no ambiente familiar e social mais amplo, podem afetar negativamente o desenvolvimento do indivíduo e seu ajustamento em etapas subsequentes (Santos e Marturano, 1999). E, de acordo com Sapienzal e Pedromônico (2005), os próprios 111 problemas de aprendizagem são considerados como fator de risco, pois desencadeiam uma série de consequências negativas na vida das crianças. Os problemas escolares são frequentemente associados aos problemas de comportamento de crianças e adolescentes. Ferreira e Marturano (2002) pesquisaram associações entre contextos de risco e problemas de comportamento em crianças com baixo desempenho escolar. Concluíram que as dificuldades acadêmicas tendem a aumentar a vulnerabilidade para a inadaptação psicossocial, quando o ambiente familiar está repleto de adversidades, como problemas nos relacionamentos interpessoais, falhas parentais quanto à supervisão, monitoramento e suporte, menor investimento dos pais no desenvolvimento da criança, práticas punitivas e modelos adultos agressivos. E enfatizam a importância de ações preventivas que envolvam a criança e seu ambiente familiar. Elias (2003) aponta que o baixo desempenho escolar aparece frequentemente associado a problemas sócio emocionais, o que constitui um fator de risco para distúrbios psicossociais na adolescência e que indivíduos com problemas dessa natureza apresentam déficits em habilidades de solução de problemas interpessoais e problemas de comportamento. Motta (2003) também aponta que a associação entre dificuldade de aprendizagem e problemas de comportamento tem sido objeto de estudo por constituir fator de risco ao desenvolvimento das crianças. Segundo Bianchi (2005), a manifestação simultânea de dificuldades comportamentais e escolares amplia a possibilidade de problemas nos contextos social e acadêmico, com prejuízo nos relacionamentos interpessoais e interferência no ajustamento social, favorecendo a tendência ao isolamento social, com risco de comportamento antissocial. Além disso, as dificuldades de aprendizagem e a percepção de limitações quando comparadas ao grupo de iguais leva as crianças a apresentarem sentimentos de menos valia e impotência. O trabalho de Barrera e Maluf (2003) aponta correlações significativas entre os níveis iniciais de consciência fonológica e o desempenho acadêmico de crianças. A consciência fonológica refere-se à capacidade da criança em reconhecer que o que ela escreve é aquilo que verbaliza. Constitui uma capacidade que é adquirida normalmente pela criança ao longo de seu desenvolvimento. Porém, a literatura mostra que a não aquisição da consciência fonológica contribui para o desenvolvimento de dificuldades na leitura e escrita (Barrera e Maluf, 2003; 112 Capovilla e Capovilla, 2000; Santos, 1996), ou seja, ela pode ser considerada como um fator de risco. Carneiro, Martinelli e Sisto (2003) buscaram verificar diferenças significativas entre os níveis de dificuldade de aprendizagem na escrita e o autoconceito geral, escolar, social, familiar e pessoal de crianças no Ensino Fundamental. Os resultados evidenciaram que a dificuldade de aprendizagem na escrita está significativamente relacionada com o autoconceito geral e com o escolar, verificando-se que conforme aumenta o nível de dificuldade de aprendizagem na escrita diminui o autoconceito. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. No contexto escolar, é comum encontrar, em crianças que têm dificuldades em aprender, a sobreposição de diversos fatores de risco, como pobreza, conflitos familiares, violência, maus tratos familiares, dentre outros. Pesquisas mostram que crianças com dificuldades acadêmicas manifestam paralelamente prejuízos de ordem emocional e comportamental (Graminha e Coelho, 1994; Medeiros, 2000). São frequentes dificuldades intra e interpessoais como solidão, depressão, suicídio e delinquência, que coexistem com as dificuldades de aprendizagem, potencializando os efeitos das mesmas, conduzindo a resultados negativos na vida adulta (Weller, Watteyne, Herbert e Crelly, 1994; Bender e Wall, 1994). A literatura ainda aponta correlações entre dificuldades de aprendizagem, autoconceito e senso de autoeficácia (Bianchi, 2005; Okano, Loureiro, Linhares e 113 Marturano, 2004; Medeiros, Loureiro e Marturano, 2003; Carneiro, Martinelli e Sisto, 2003; Jacob, 2001; Loureiro, 2000; Medeiros, 2000; Bandura, 1989). Bianchi (2005) traz que o prejuízo no autoconceito torna-se maior diante da sobreposição de dificuldades de aprendizagem e de comportamento, isso porque a criança que apresenta essa combinação de fatores tem mais dificuldade em construir confiança em si mesma. Giurlane (2004) afirma que a influência do ambiente familiar é significativa tanto sobre problemas de comportamento como sobre dificuldades no aprendizado acadêmico. As crianças que não vão bem na escola sofrem uma pressão criada por uma rede de pessoas significativas em suas vidas e da sociedade em geral. FONTE: Pesquisa realizada pela doutoranda Cristina Emília dos Santos Parrela. CONCORDANCIA NOMINAL-UM DESAFIO DA ESCOLA FACE À DIVERSIDADE CULTURAL DO ALUNO, no período de 2012 a 2014. A abordagem teórica-conceitual escolhida para pensar os problemas de aprendizagem neste trabalho diz respeito aos fatores de risco e proteção que estão presentes na vida de um indivíduo. Segundo essa abordagem, é a interação entre os fatores que vão determinar se um indivíduo vai ou não desenvolver um problema psicossocial ou uma patologia no futuro. Sendo assim, é importante que se conheçam esses fatores para que se possam adotar medidas preventivas para os problemas que atingem a infância e a adolescência. Por definição, fatores de risco compreendem eventos negativos que ocorrem na vida de um indivíduo e que, quando estão presentes, aumentam a probabilidade 114 de que ele venha a apresentar problemas de ordem física, social ou emocional (Yunes e Szymansky, 2001), podendo prejudicar sua adaptação e gerar uma organização patológica de seus sistemas biológico, emocional, cognitivo, linguístico, interpessoal e representacional (Cicchetti, Rogosh e Toth citados por Cicchetti e Toth, 1997). Contudo, a presença de fatores de risco na vida de um indivíduo não significa, necessariamente, que ele vá apresentar algum problema no seu desenvolvimento, uma vez que a vulnerabilidade varia de um indivíduo para outro, sendo também importante considerar a extensão em que cada pessoa experiência os fatores de risco em função de sua história pregressa (Yunes e Szymansky, 2001; Rutter, 1999). Análises mais sofisticadas sugerem que o risco é um processo, e que o número total de fatores de risco a que uma pessoa foi exposta, o período de tempo, o momento da exposição ao risco e o contexto são mais importantes do que uma única exposição grave (Engle, Castle e Menon, 1996). No entanto, deve-se levar em conta não apenas o número de eventos de adversidades, mas como o evento afetou o indivíduo. Em contraposição ao risco, existem os fatores de proteção que são influências ambientais e das características do indivíduo que provocam uma modificação da resposta aos processos de risco. As funções dos fatores de proteção são: reduzir o impacto dos riscos; reduzir as reações negativas em cadeia que seguem a exposição do indivíduo à situação de risco; estabelecer e manter a autoestima e autoeficácia, através de estabelecimento de relações de apego seguras e o cumprimento de tarefas com sucesso; criar oportunidades para reverter os efeitos do estresse (Rutter, 1987). Tendo em conta a diversidade de trabalhos encontrados, eles serão agrupados em trabalhos que abordam as dificuldades de aprendizagem como fatores de risco para desenvolvimentos de problemas psicossociais, trabalhos que apontam fatores de risco para desenvolvimentos das dificuldades de aprendizagem e os que não fazem essa diferenciação, apenas associando a dificuldade de aprendizagem a alguma condição. 115 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho de investigação foi uma reflexão, um repensar sobre a importância da aplicação de metodologias e estratégias de ensino baseadas na investigação. O ato de ler e de escrever é um processo complexo que implica um conjunto de conhecimentos que a pessoa adquire ao longo da sua vida antes e durante o seu ingresso no contexto escolar. É uma atividade cognitiva e não uma capacidade sensorial e auditiva que se pensava ser necessária para aprender a ler e a escrever. É uma descodificação e compreensão de representações gráficas e auditivas. Assim, de um modo simples e direto, o desenvolvimento das habilidades de leitura e de escrita funcionam como as fundações para todas as aprendizagens escolares, pois sem a habilidade para ler e para escrever as oportunidades para o sucesso académico e ocupacional são limitadas. Mais ainda, as dificuldades na aprendizagem da leitura e da escrita bloqueiam o prazer e o entusiasmo pela aprendizagem, manifestados pela maioria das crianças que entram na escola (Lyon, 2003 citado por Cruz, 2005). A leitura é uma competência cultural específica que se baseia no conhecimento da linguagem oral, é contudo uma competência com um grau de dificuldade muito superior à da linguagem oral. Os processos cognitivos envolvidos na produção e compreensão da linguagem falada diferem significativamente dos processos cognitivos envolvidos na leitura e na escrita (Cruz, 2007; Shaywitz, 2008). Tal como refere Cruz (2005) e Shaywitz (2008), a investigação no âmbito da leitura deve ter presentes três preocupações: a identificação precoce, a prevenção e a reeducação, pois é absolutamente necessário ter em consideração que as crianças em risco de manifestarem problemas na aprendizagem da leitura e as crianças com dificuldades na leitura podem aprender a ler desde que sejam identificadas cedo e lhes sejam providenciadas instruções adequadas, sistemáticas, explícitas e intensivas. A procura de uma explicação neurocientífica cognitiva para a leitura tem sido objeto de uma imensa quantidade de estudos. Para aprender a ler é necessário ter uma boa consciência fonológica, isto é, o conhecimento consciente de que a linguagem é formada por palavras, as palavras por sílabas, as sílabas por fonemas e que os caracteres do alfabeto representam esses fonemas (Shaywitz, 2008). 116 A consciência fonológica é uma competência difícil de adquirir, porque na linguagem oral não é perceptível a audição separada dos diferentes fonemas (por exemplo, quando ouvimos a palavra “pai” ouvimos os três sons conjuntamente e não três sons individualizados). Para ler é necessário conhecer o princípio alfabético, saber que as letras do alfabeto têm um nome e representam um som da linguagem, saber encontrar as correspondências grafemas-fonemas, saber analisar e segmentar as palavras em sílabas e fonemas, saber realizar as fusões fonêmicas e silábicas e encontrar a pronúncia correta para aceder ao significado das palavras. Para realizar uma leitura fluente e compreensiva é ainda necessário realizar automaticamente estas operações, isto é, sem atenção consciente e sem esforço. A capacidade de compreensão leitora está fortemente relacionada com a compreensão da linguagem oral, com o possuir um vocabulário oral rico e com a fluência e correção leitora (Cruz, 2007; Shaywitz, 2008). Aprender a ler não é então um processo natural. Contrariamente à linguagem oral, a leitura não emerge naturalmente da interação com os pais e os outros adultos, por mais estimulante que seja o meio a nível cultural. Há pois uma necessidade imperiosa de estimular o desenvolvimento cognitivo na criança, os cientistas que debruçaram as suas investigações nesta área dão-nos a conhecer que o cérebro necessita de informação que favoreça o seu próprio desenvolvimento e quanto mais estruturada se encontrar a informação mais completo será esse desenvolvimento. O exercício constante e corretamente, para que a compreensão (habilidade para perceber e retirar significado do que é lido) seja possível. O conjunto das palavras que a criança deve conhecer para comunicar de modo efetivo, o seu vocabulário, será mais ou menos rico consoante a quantidade que já apreendeu (Cruz, 2005; Shaywitz 2008). Tal como refere Cruz (2005) e Shaywitz (2008), a investigação no âmbito da leitura deve ter presentes três preocupações: a identificação precoce, a prevenção e a reeducação, pois é absolutamente necessário ter em consideração que as crianças em risco de manifestarem problemas na aprendizagem da leitura e as crianças com dificuldades na leitura podem aprender a ler desde que sejam identificadas cedo e lhes sejam providenciadas instruções adequadas, sistemáticas, explícitas e intensivas. A questão levantada inicialmente (No início do percurso escolar, fase crucial da aquisição da leitura e altura em que os alunos entram em contato com os 117 grafemas e fonemas, será que as orientações preconizadas pela investigação com práticas educativas compostas por técnicas e estratégias, quando aplicadas a alunos com DAE produzem progressos educativos significativos?) obtém uma resposta coerente e consentânea, uma vez que realizei um estudo quaseexperimental com dois grupos de alunos com condições académicas semelhantes (alunos retidos no 2º ano com funcionamento intelectual idênticos). Um grupo serviu de controlo e no outro operei a experiência. A minha intervenção teve as suas repercussões no desenvolvimento da leitura destes alunos quando foram comparados com os outros dois que não tiveram nenhuma intervenção especializada. Foi notória a evolução na leitura de palavras destes alunos, tal como os gráficos apresentados no quarto capítulo o demonstram. Estas conclusões, relativas a esta investigação, apenas servem para corroborar as propostas pragmáticas dos autores presentes na minha consulta bibliográfica e assim aferir que as práticas são mais eficazes quando aplicadas em tempo oportuno e fundamentadas na investigação. Mesmo sendo a intervenção com tempo reduzido, é sempre mais produtiva uma vez que se aplica automaticamente um ensino de qualidade que já comprovou os efeitos que produz nos alunos. Há ainda a referir, no que diz respeito aos resultados desta investigação, que há certos fatores que, de um modo ou de outro, enviesaram a experiência e que têm a ver com a intervenção dos professores titulares de turma. Como eles sabiam que eu regressaria para reavaliar os alunos, tiveram o cuidado de intensificar as práticas educativas, apoiando mais estes alunos, de modo a que os resultados não diferissem com os alunos da intervenção. Aconteceu mesmo que uma professora afirmou: “vamos trabalhar mais para quando a professora voltar tu conseguires ler o texto”. Por um lado é positivo, pois os alunos saíram beneficiados, contudo ficamos relativizados em saber se estes resultados seriam os mesmos se não se perspectivasse uma reavaliação da minha parte. 118 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, L. S., Freire, T. (2003). Metodologia da investigação em psicologia e educação.Braga: Psiquilibrios. BAUTISTA, R. et al. (1997). Necessidades Educativas Especiais. Lisboa: Dinalivro. BECHARA, Evanildo (2005). Ensino da Gramática. Opressão? Liberdade?. ABDR Editora Afiliada. 11 Ed. BELL, Judith (1997), Como realizar um projecto de investigação (1ª ed.). Lisboa, Gradiva. CARMO H., Ferreira M. M. (1998). Metodologia da investigação: Guia para autoaprendizagem. Lisboa: Universidade Aberta. CITOLER, S. D. & Sanz, R. O.(1997). A Leitura e a escrita: processos e dificuldades na sua aquisição. In R. 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Sei que participo dessa pesquisa de forma voluntária, tendo liberdade para recusar ou retirar meu consentimento de participação da pesquisa a qualquer momento do processo de construção da mesma, sem que haja nenhum prejuízo a minha pessoa. Fui esclarecida de que minha identidade se manterá no anonimato e as informações serão confidenciais sendo utilizadas somente com o propósito científico, obedecendo a Resolução do Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde Nº 196/96 que regulamenta a pesquisa com seres humanos. ___________________, __________________________ 2011. ___________________________ ___________________________ Assinatura do Entrevistado Assinatura do mestrando 124 Este questionário deverá ser respondido pelo professor e servirá de instrumento de pesquisa, como parte dos requisitos para o trabalho de conclusão de doutorado intitulado “concordância nominal: desafio da escola face a diversidade cultural do aluno”. A pesquisa esta sendo desenvolvida pela doutoranda em ciências da educação com ênfase na psicanalise, Cristina Emília dos Santos Parrela, sob a orientação do professor Dr. Edmar Jacinto Diretor Geral do Centro de Orientação e Organização Psicanalítica Corpo, responsável pelo programa de mestrado em convênio interinstitucional com a Universidad Sudamericana. Os dados serão resguardados na sua identificação, não apresentando nome dos respectivos pesquisados somente o nome da instituição de ensino. Instrumento de Pesquisa - 01 – (Dados do Aluno Respondido pelo Professor) Nome da Escola: Escola Estadual Professora Elisa Teixeira de Carvalho Nome do Aluno: Idade: Serie: Turma: Data: Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino 01) Ao transmitir o conhecimento gramatical ao seus alunos você enfatiza: ( )A diversidade cultural a qual está inserida ( ) A linguagem padrão culta ( ) Constrói esse conhecimento ao longo do ano letivo 02) Em qual contexto você considera apropriado o uso da linguagem coloquial ( ) Por questões de afinidade ( ) Por impedimento ao ambiente de trabalho ( ) Por considerar a bagagem informal do aluno ( ) Por influencia dos meios de comunicação social/virtual (msn, facebook, twitter etc) 03) Com relação a norma culta como está o nível de conhecimento dos alunos no inicio do ano letivo ( ) bom conhecimento ( ) pouco conhecimento ( ) conhecimento insatisfatório 04) Considerando a oralidade dos alunos, qual aspecto você, professor, julga mais importante: ( ) espontaneidade ( ) fluência ( ) entonação ( ) vocalização 05) Quais dessas dificuldades você tem detectado em sala de aula: ( ) disfalia ( ) disfemia 125 ( ) taquipsiquismo ( ) disortográfia 06) Com relação as dificuldades implícitas na leitura, você tem observado: ( ) timidez ( ) introversão ( ) dislexia 07) Qual desses elementos você julga mais importante na produção textual: ( ) vocabulário ( ) coesão e coerência ( ) concordância e regência ( ) ortografia ( ) pontuação 08) Você ensina gramatica para que: ( ) os alunos conheçam a estrutura da língua ( ) você cumpra o programa curricular proposto ( ) conheça o padrão culto da língua ( ) o aluno melhore sua interpretação 09) Como você percebe o aprendizado do seu aluno com relação a concordância nominal: ( ) não corresponde ( ) tem interesse mais não totalmente ( ) trata a língua materna como se fosse uma língua estrangeira ( ) desconhece os pré-requisitos gramaticais 10) Você acredita que, a constante evolução da língua tem contribuído para o não aprendizado efetivo da gramatica em especial a concordância nominal: ( ) sim ( ) não 11) Em qual ambiente se faz necessário o uso padrão da norma culta da língua portuguesa: ( ) na família ( ) na escola ( ) no trabalho ( ) em todo o processo de aquisição do conhecimento 12) Quanto ao comportamento de seus alunos, você considera: ( ) apático ( ) agressivo ( ) indisciplinado ( ) desatento ( ) desmotivado ( ) individualista 13) Para melhor aquisição do conhecimento você considera que seus alunos: ( ) não participam das aulas ( ) não possuem interesse/atenção pelas aulas ( ) falta constantemente as aulas 126 ( ) falta comprometimento dos pais ( ) não faz as atividades em classe ( ) não faz as atividades extra classe 14) Considerando a vida externa a escola o seu aluno aponta: ( ) falta da presença dos pais ( ) violência em casa ( ) falta de emprego de seus pais ( ) tem como responsáveis os avos e outros 15) Você considera que quem desconhece a norma culta tem pouco acesso as obras literárias, artigos de jornal, discursos políticos, obras teóricas e cientificas: ( ) sim ( ) não 127 Instrumento de Pesquisa - 02 – (Dados Respondido pelo Aluno) Nome da Escola: Escola Estadual Professora Eliza Teixeira de Carvalho Nome do Aluno: Idade: Serie: Turma: Data: Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino 01) Você gosta de estudar: ( ) sim ( ) não 02) Você gosta da escola em que estuda: ( ) sim ( ) não 03) Na serie em que estuda, você é: ( ) novato ( ) repetente 04) Durante as aulas de língua portuguesa você tem facilidade em compreender as explicações do seu professor : ( ) sempre ( ) as vezes ( ) de vez em quando ( ) nunca 05) Que tipo de leitura você faz em sua casa: ( ) jornal ( ) revista ( ) bula de remédio ( ) panfletos de supermercado ( ) conta de água ( ) rótulos de alimentos ( ) livros ( ) gibis ( ) nenhum dos itens acima ( ) outros 06) Na disciplina de língua portuguesa o que você mais gosta de estudar ? ( ) texto ( ) gramatica 07) Você sabe o que é concordância nominal ? ( ) sim ( ) não Se sim, dê exemplos. 08) Você já estudou em gramatica concordância nominal ? 128 ( ) sim ( ) não 09)Para comunicar você acha que é preciso ter domínio das regras gramaticais ( ) sim ( ) não ( ) as vezes ( ) sempre 10)Você compreendeu bem essa matéria ? ( ) sim ( ) não Material aprovado, para a consequente aplicação, com indicação de alguns itens, devidamente anotados pela Mestranda Cristina Parrela, no dia 14 de setembro de 2012, na cidade de Montes Claros, MG. Dr. Antonio Edmar J. Silva Orientador