422 Revista Brasileira de Ensino de Fsica vol. 20, no. 4, Dezembro, 1998 Problemas Interessantes em Fsica: O Quebra - Molas Vanderlei S. Bagnato Instituto de Fsica de S~ ao Carlos - USP Caixa Postal 369 - CEP 13560 - 970 - S~ ao Carlos / SP. Recebido 26 de abril, 1997 E comum notarmos a exist^encia de quebra-molas ou lombadas em ruas e estradas. Normalmente o quebramolas e constitudo por uma sali^encia com variac~ao contnua que tem por objetivo evitar que carros passem por ela com velocidade excessiva. A tentativa de ultrapassar estas barreiras com grande velocidade podem causar abruptas variac~oes no molejo do veculo, podendo mesmo quebra-lo, dao nome de quebra-molas (gura 1). Esta e, sem duvida, uma situac~ao fsica bastante interessante e, por isto, vamos analisa-la segundo as leis da mec^anica. Dadas as caractersticas do veculo e geometria da lombada, pretendemos determinar o intervalo de velocidade onde a barreira e ultrapassada com seguranca. Se o veculo fosse um sistema rgido (como e o caso da maioria das bicicletas, por exemplo) a passagem rapida por um quebra-molas poderia ter consequ^encias extremamente tragicas. Mas um veculo automotor n~ao pode ser visto desta forma. Nele est~ao presentes o amortecedor e o sistema de molas, agindo em conjunto de modo a evitar que o carro se chacoalhe muito ao enfrentar as irregularidades das vias. O molejo do carro e um elemento elastico que atua em paralelo com o amortecedor, um elemento viscoso para amortecimento. Este ultimo tem a func~ao de limitar as oscilac~oes do veculo que seriam naturais ao molejo. Assim, e natural olharmos a parte oscilatoria do veculo como um sistema massa mola amortecido. A lombada, que apresenta uma variac~ao suave, pode ser vista como tendo uma variac~ao representada por uma porc~ao de uma func~ao senoidal. O modelo que construiremos para o sistema de um veculo passando por um quebra-molas esta mostrado na gura 2. O carro de massa M desloca-se com velocidade v na direc~ao x. O corpo massivo do veculo esta ligado as rodas por um sistema elastico de constante de mola K associado em paralelo a um sistema amortecedor de constante de amortecimento . A lombada e parte de uma func~ao do tipo y = y0 sen(2 Lx ) ou seja: altura y0 e extens~ao L=2, como indicado na gura 2. Ao percorrer a via, encontrando a lombada, o ponto de apoio do auto e forcado a acompanhar o perl mostrado na gura 2, de modo que a mola sofrera uma distens~ao que depende em que posic~ao da lombada o carro se encontre. Como resultado de todos os elementos que comp~oem o sistema, a equac~ao de movimento vertical para o centro de massa do carro (onde subtraimos da coordenada vertical do centro de massa do carro (y), a altura da lombada y ). 0 0 (1) M ddty2 = ;K (y ; y ) ; dy dt ou substituindo y : 2 x M ddt2y = ;Ky ; dy (2) dt + Ky0 sen2 L Como o carro desloca-se na direc~ao x com velocidade v, x = vt e a equac~ao (2) pode ser reescrita na forma: 2 0 0 2y d dy 2 vt M dt2 + Ky + dt = Ky0 sen L (3) Assim, o carro passando pela lombada e exatamente um oscilador harm^onico amortecido e forcado e, desta maneira, o carro comporta-se segundo este bem conhecido sistema fsico. A grandeza ! = 2 Lv representa a frequ^encia oscilatoria que a lombada procura imprimir ao carro quando este tem a velocidade v. A soluc~ao para a equac~ao (3) pode ser encontrada nos livros textos convencionais de mec^anica para o curso basico 1,2], sendo escrita como y(t) = Asen(!t + '), que substituda na equac~ao (3) permite obter A. A posic~ao inicial do centro de massa do carro, ao iniciar Vanderlei S. Bagnato a lombada, permite determinar a fase '. Como a fase ' n~ao e importante para nossa analise, n~ao nos preocuparemos com ela. Apos estas considerac~oes, o deslocamento do centro de massa, enquanto viajando pela lombada, tem a forma: Ky 2 t 0 =M Y = rh; i2 ; 2 2 sen L + ' 2 2 ; K L M + M L (4) 423 Vemos facilmente que a amplitude com que o centro de massa do carro ira oscilar depende das caractersticas do molejo e do amortecedor do carro, das caractersticas geometricas da lombada, mas principalmente da velocidade do veculo. Figura 1. Fotograa mostrando uma lombada convencional encontrada nas vias p ublicas. A lombada e normalmente suave, procurando forcas a reduc~ao da velocidade dos ve culos. Figura 2. Modelo onde o ve culo e visto como um sistema massa mola amortecido e a lombada como a porc~ao positiva de uma func~ao seno. 424 Revista Brasileira de Ensino de Fsica vol. 20, no. 4, Dezembro, 1998 Quando o veculo passa pela lombada em baixa velocidade, a amplitude de oscilac~ao ou do deslocamento do seu centro de massa ca reduzida a y0 , pois os termos dependentes da velocidade no denominador s~ao desprezados. Neste caso, o carro acompanha suavemente a lombada, subindo e descendo em sincronismo com a mesma. Quando o veculo tem velocidade ao redor de: 2v = K ; 2 1=2 (5) L M M a amplitude de oscilac~ao atinge seu maior valor (caso ressonante) causando consideravel desconforto aos passageiros, que se n~ao estiverem atentos, correm o risco de baterem suas cabecas no teto. Para evitar esta situac~ao e importante que a velocidade esteja fora do regime de resson^ancia, ou seja, fora dos pontos onde a amplitude do deslocamento supere 50% de seu valor maximo. Assim, da express~ao (4) podemos tirar que para a passagem pela lombada n~ao ser traumatica para os passageiros, devemos ter velocidade tal que: " #1=2 r 2v < K ; 2 ; 4 + 12 2 K L M M M M M (6) Por outro lado, quando a velocidade supera muito o valor acima mencionados em (5), a amplitude tambem comeca a cair consideravelmente , mesmo que o ponto de apoio tenha que superar a lombada. Nesta situac~ao o sistema de molejo sofre todo deslocamento, enquanto o centro de massa do veculo n~ao se desloca. A compress~ao sofrida no sistema de molejo pode ser demasiadamente rapida, causando danos permanentes ao sistema (molas s~ao \quebradas"). Para velocidades no intervalo tal que " #1=2 r 2 > K ; 2 + 4 + 12 2 K L M M M M M (7) a passagem pela lombada n~ao sera muito desconfortavel para os passageiros, mas podera ser dramatica para o carro. Apos termos entendido como funciona o quebramolas, ca como exerccio para o leitor considerar os valores numericos de K , M e , bem como a geometria das lombadas obtendo-se os varios limites de velocidade mencionados neste trabalho Refer^encias 1. Cole Publish. Co, California - USA, 1994. 2. \Fsica" por D. Halliday e R. Resnick, Livros Tecnicos e Cientcos, Ed., Rio de Janeiro, 1976. \Physics" por Eugene Hecht,