recorrência familial de comunicação interatrial e de estenose

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COMUNICAÇÃO INTERATRIAL E ESTENOSE PULMONAR. RECORRÊNCIA FAMILIAL
C. Ferreira *
H. Korkes **
J. Laredo ***
N. Murad ****
A. Pfeferman *****
A. A. V. de Paola ******
L. Borrotchin **
N. Kasinsky **
E. Buffolo *******
A. Barcellini ********
429
RECORRÊNCIA FAMILIAL DE COMUNICAÇÃO
INTERATRIAL E DE ESTENOSE PULMONAR
Os autores apresentam heredograma, onde constataram a presença de 4 portadores de
comunicação interatrial e portadores de estenose pulmonar.
Após a exclusão de teratógenos externos, admitiram a implicação genética na etiologia
dessas anomalias, discutindo os mecanismos de transmissão tanto para a comunicação interatrial quanto para a estenose pulmonar.
Para a comunicação interatrial acreditaram nos mecanismos de transmissão autossômico
ou ligados ao X, dominantes em ambas as situações, com penetrância incompleta.
Os trabalhos que demonstraram a recorrência familiar da
comunicação interatrial (CIA), são relativamente recentes e
pouco numerosos, a tal ponto que Courter, Felson e McGuire
1
admitiram ser a sua publicação a primeira a mencionar a
repetição de CIA sem associação de outra anomalia cardíaca
congênita. Embora o fato identifique a época como o início
de tais relatos, essa primazia não pode ser confirmada porque
foram encontrados registros anteriores. Posteriormente,
outros autores descreveram a incidência de CIA em
elementos da mesma família, aventando diversas hipóteses
quanto ao mecanismo de transmissão genética 2. Devido à
diversidade de opiniões a respeito do mecanismo de
transmissão genética da CIA, e interessados no
esclarecimento desse problema da Cardiologia Preventiva,
os autores do presente trabalho realizaram o levantamento
de uma genealogia, a partir de 3 irmãos comprovadamente
portadores de cardiopatia congênita e filhos de mãe portadora
de CIA operada. Parecendo claro o mecanismo de
transmissão dessa cardiopatia na referida família, resolveuse apresentar este relato.
MATERIAL E MÉTODOS
O material consta de uma genealogia com-
posta por vinte e três elementos. Foram estudados no
Departamento de Clínica Médica, Disciplina de Cardiologia,
da Escola Paulista de Medicina e constou de anamnese
clínica incluindo a história pregressa da moléstia atual, e
condições pré-natais dando especial ênfase à ocorrência de
hemorragias, infecções, exposição à irradiação por raios X,
terapêutica incluindo antipiréticos, tentativas de
abortamento, enfim, de fatores no período gestacional, aos
quais se pudesse imputar possível responsabilidade na
gênese de malformações. Foram também questionados a
respeito de todo o desenvolvimento somato-psíquico, sendo
feito interrogatório complementar detalhado em especial no
que tange à sintomatologia cardiovascular. Posteriormente,
realizou-se exame clínico minucioso.
Finda a avaliação clínica, efetuaram-se exames subsidiários
em todos os pacientes, incluindo eletrocardiograma,
vetocardiograma, radiografias de tórax, de punhos e de mãos.
Um dos pacientes necessitou complementar a
investigação utilizando a ecocardiografia, para afastar a
presença de CIA.
Apesar da inexistência de ausculta cardíaca de CIA, os
pacientes que apresentaram alterações da condução do
estimulo elétrico detectadas no eletrocardiograma foram
investigados laboratorialmente (reação de Machado
Trabalho desenvolvido nas Disciplinas de Cirurgia Torácica e de Cardiologia da Escola Paulista de Medicina da E.P.M.
* Prof. Assistente-Docente Livre de Cardiologia da Disciplina de Cardiologia do Departamento de Medicina da E.P.M.
** Pós-Graduados da Disciplina de Cardiologia do Departamento de Medicina da E.P.M.
*** Prof. Titular de Genética Médica da Faculdade de Medicina de Santo André.
**** Estagiário da Disciplina de Cardiologia do Departamento de Medicina da E.P.M.
***** Prof.-Assistente, Doutor da Disciplina de Cardiologia do Departamento de Medicina da E.P.M.
****** Residente do 2.º ano de Cardiologia da Disciplina de Cardiologia do Departamento de Medicina da E.P.M.
******* Prof.-Adjunto de Cirurgia de Tórax do Departamento de Cirurgia da E.P.M.
******** Prof.-Adjunto, Chefe da Disciplina de Cardiologia do Departamento de Medicina da E.P.M.
Recebido em 18/5/77
Arq. Bras. Cardiol. 30/6 429-431 - Dezembro 1977
ARQUIVOS BRASILEIROS DE CARDIOLOGIA
430
Guerreiro, hemaglutinação indireta e reação de
imunofluorescência indireta para Chagas), para afastar a
possibilidade do bloqueio de ramo ser concomitante a uma
CIA mínima.
As fichas clínicas dos pacientes submetidos à cirurgia
cardíaca no passado, foram levantadas nos centros médicos
onde haviam sido efetuadas.
DISCUSSÃO
A análise do heredograma apresentado na
figura 1 permitiu constatar a recorrência de
Fig. 1
- Heredrograma
obtido
a
partir
de
mãe
Verificou-se também que a transmissão da CIA ocorre na
linha vertical, como se pode constatar pela representação
da fig. 1, nos elementos das gerações II e III. Por outro lado,
a incidência de cardiopatia não teve preferência pelo sexo,
podendo-se assim aventar o mecanismo de transmissão
autossômico dominante, com penetrância incompleta.
É interessante a apreciação dos descendentes dos dois
casamentos do elemento dois da geração I, pois, em ambas
oportunidades surgiu CIA nas gerações II e III, apesar de
que os casamentos se realizaram com elementos nãoconsangüíneos, fato que apoia a hipótese de herança
dominante.
Orientados por esses dados, os autores pesquisaram
exaustivamente a existência de cardiopatia congênita no
elemento 2 da primeira geração, afastando essa possibilidade
em nível clínico e laboratorial não-invasivo. Assim, além da
anamnese, exame físico, eletrocardiograma, vetocardiograma,
raios X de tórax e dos ossos das mãos, realizaram o
ecocardiograma e pesquisaram, “shunt” cardíaco utilizando
substâncias radioativas. Pelo conjunto negativo de
evidências da presença de anomalias congênitas, não se
realizou o estudo hemodimâmico. Esses dados descartaram
a possibilidade de um defeito cardíaco congênito de magnitude clínica apreciável, mas não
cardiopatias congênitas em seis elementos. Quatro deles
tinham comunicação interatrial (2 comprovados por cirurgia
e os outros por evidências clínicas) e os 2 restante eram
portadores de estenose infundibular, comprovados
cirurgicamente.
A constatação da recorrência dessas anomalias, pelo
levantamento dos diferentes grupamentos familiar sugere o
mecanismo de transmissão genética, fato corroborado pela
exclusão de fatores teratogênicos ambientes, pesquisados
por um exaustivo interrogatório.
e
3
filhos
com
cardiopatias
congênitas.
excluem a possibilidade de uma pequena anomalia, como
por exemplo, uma CIA mínima, ou que esse defeito tenha
desaparecido com o progredir dos anos 9. De qualquer forma,
para o mecanismo dominante de transmissão, é atraente que
o elemento 2 da primeira geração possa ser um portador da
anomalia onde a expressividade seja mínima e não detectável
pela propedêutica utilizada.
Admitindo-se o mecanismo de transmissão genética
autossômica dominante, os autores investigaram a existência
da síndrome de Holt-Oran 10, na genealogia considerada.
Para tanto, pesquisaram defeitos ósseos de membros
superiores por exames clínicos e radiológicos em todos os
elementos. Não sendo constatados, excluiu-se essa
possibilidade, já que para uma herança dominante, essas
alterações deveriam ter sido encontradas mesmo em
pacientes sem cardiopatia (50% dos 17 elementos
consangüíneos da genealogia). Procurou-se investigar a
presença de mínimo orifício no septo atrial em pacientes
com bloqueio do ramo direito, levando em conta que
praticamente a totalidade dos pacientes portadores de CIA
apresentam bloqueio do ramo direito. Evidências clínicas e
laboratoriais nesses casos foram concordantes para o
diagnóstico etiológico de cardiopatia chagásica, sendo,
portanto, adquirido o transtorno de condução.
COMUNICAÇÃO INTERATRIAL E ESTENOSE PULMONAR. RECORRÊNCIA FAMILIAL
Despertou atenção neste estudo genealógico a presença
de dois elementos portadores de estenose pulmonar (EP),
em uma mesma irmandade, o outro apresentava CIA. Esse
fato, também encontrado na literatura, apresenta justificativa
muito controvertida. Alguns autores, como Nora e cols. 11,
documentam a hipótese de uma tendência familial para
cardiopatias que não seriam necessariamente idênticas. Para
outros, esse evento só poderia ocorrer em função da
interferência de um outro gene diferente daquele que
produziu a CIA. Concordes com esses últimos, opinam os
autores desta publicação, baseando-se no desenvolvimento
embriológico onde a septação atrial e a formação do
infundíbulo do ventrículo direito ocorrem em épocas
diferentes e, assim, seria difícil que o efeito genético
perdurasse em ambas as oportunidades.
Nesse agrupamento familial, não parece também ser viável
a hipótese de teratógenos externos para a produção de EP,
isso porque seria necessário admitir sua presença em ambas
as gestações e na mesma época do desenvolvimento
embrionário, ocasionando o mesmo efeito. Parece justo
admitir uma causa genética também na produção dessa
anomalia.
A reunião de todas as informações obtidas da genealogia
permitiu que se aventassem duas hipóteses etiológicas para
transmissão dessa cardiopatia congênita. A primeira delas,
defendida entre os outros por Nora e cols. 11, que advogavam
a predisposição de algumas famílias para o aparecimento de
cardiopatias congênitas; a segunda hipótese defendida por
Zuckerman e cols. 12, que preferem o mecanismo dominante
de transmissão genética. Essas duas hipóteses se antepõem
à de Ferreira 5, que encontra mecanismo autossômico
recessivo para a etiologia das comunicações interatriais
isoladas, do tipo defeito da fossa oval. Nesse contexto, a
opinião dos autores deste trabalho não é favorável à
tendência familial para cardiopatias, desde que a mesma
anomalia se repete tanto nos descendentes do primeiro, como
nos do segundo casamento do elemento da primeira
gestação, fato que teria pouca possibilidade estatística de
ocorrer casualmente. Assim sendo, admitem ainda os autores
que a hipótese de herança autossômica recessiva não seja
suficiente para justificar todos os casos de CIA com
transmissão por mecanismo genético, o que se denomina
comumente de variabilidade genética. Além disso, parece
pouco provável que o presente heredograma possa ser
catalogado como síndrome de Holt-Oran 10. Acredita-se que
possa existir gemes diversos, agindo isoladamente para
produzir CIA por mecanismos de transmissão diferentes
(Genecópias).
É oportuna a menção da possibilidade da transmissão
ligada ao cromossomo X para as anomalias da genealogia
apresentada. Talvez a observação futura dos descendentes
dos elementos do sexo masculino possa esclarecer essa
possibilidade, pouco freqüente em genética clínica.
CONCLUSÕES
1.
No heredograma apresentado constatou-se transmissão
genética para recorrência da comunicação interatrial e
estenose pulmonar.
2.
3.
4.
431
O mecanismo de transmissão genética é provavelmente
autossômico dominante com penetrância incompleta,
não podendo ser excluído que o mesmo seja ligado ao
X com dominância incompleta.
Excluída a síndrome de Holt-Oran para a transmissão
no heredograma do presente relato, bem como a
transmissão por mecanismo autossômico recessivo,
demonstra-se a variabilidade genética para a etiologia
da comunicação interatrial.
Pela demonstração do mecanismo de transmissão
autossômico dominante, para a etiologia da
comunicação interatrial isolada, conclui-se que o risco
de recorrência em uma irmandade seja de 25% ou 50%
dependendo do tipo de transmissão e sua penetrância,
sendo algumas vezes impossível a decisão.
AGRADECIMENTOS
Ao Dr. Renato Pinheiro Machado, diretor-superintendente
do Hospital São Paulo, pelas facilidades técnicas
proporcionadas, que permitiram a presente investigação.
SUMMARY
A pedigree chart was drawn in which there are four
subjects with atrial septal defects and two patients with
pulmonary stenosis.
External teratogens could not be implicated. Hence, a
genetic basis was postulated in the etiology of these
abnormalities; the possible mechanisms of transmission for
the atrial septal defect and the pulmonary stenosis are
discussed.
For the atrial septal defect, there appears to be autossomal
or X-linked transmission mechanisms, dominant in both
situation, with incomplete penetration.
REFERÊNCIAS
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septal defect with mitral stenosis (Lutembacher’s syndrome)e
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an atrial septal defect. J. Am. Med. Ass. 196: 17, 1968.
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M. - Atrial septal defect. Familial occurrence in four generations
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