FILOSOFIA E ECOLOGIA: OPÇÃO PELA VIDA!1 A discussão que

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ISSN 18094589
ANO VII – Nº 13 - DEZEMBRO DE 2011
P. 87 – 90
FILOSOFIA E ECOLOGIA: OPÇÃO PELA VIDA!1
Gilnei da Rosa2
A discussão que relaciona/aproxima (no sentido de transdisciplinariedade) esses dois campos do
saber - da Filosofia e da Ecologia- é extremamente necessária e fundamental no atual contexto da sociedade
planetária. Pois sem levarmos em conta esses dois campos do saber, esses dois campos da reflexão se torna
hoje impossível pensarmos o mundo, a vida, a humanidade e todos os processos neles circunscritos. Se por
ecologia “Entendemos [...] a ciência global das relações do organismo com o mundo exterior circuncidante,
onde podemos incluir em sentido amplo todas ‘as condições da existência’” (GAFO, 2000, p. 307),
complementamos/acordamos com a Filosofia que se apresenta como atividade imprescindível e necessária
para qualificação por excelência da vida, também em seu sentido amplo.
Penso ser necessário primeiramente esclarecer nosso ponto de partida, em cima do qual
construímos nossa reflexão. E o ponto de partida, é necessariamente a vida como condição primeira. A vida é
sem dúvida, como expressaram diversos filósofos e pensadores, a condição de possibilidade de todas as
possibilidades. Sem a vida, esta existência concreta de cada indivíduo, o mundo seria inacessível, e nenhuma
experiência existiria. A própria vida anseia pela vida. Nenhum vivente deseja a morte, mas se agarra
incondicionalmente à vida. Os instintos são uma prova disso. Toda forma de vida, é mantida pelo desejo de
viv er, sendo a morte uma complementação do processo de vida.
Sendo a vida a condição primeira de todas as possibilidades, deve ser assegurada e promovida
enquanto tal. Entretanto, a vida não foi tratada historicamente com a devida centralidade pela sociedade
humana, dita civilizada. Estruturas necrófilas, de exploração e degeneração da vida, latentes no processo
histórico, culminam na contemporaneidade em uma grave crise ecológica que põe em risco não somente a
vida humana, mas a de todo o meio ambiente.
O atual estágio de desenvolvimento da sociedade humana encontra-se em crise, transpassada por
profundos paradoxos. O homem, não obstante o grande acúmulo de conhecimento e domínio tecnológico,
parece caminhar para seu fim, o fim de sua vida, sua autodestruição. O Planeta Terra, espoliado
historicamente de seus recursos naturais dá sinais visíveis de esgotamento, perdendo o equilíbrio necessário
para a manutenção da vida. Desde os tempos mais remotos o homem arrogou para si o direito à vida, o
1
O presente artigo é proveniente de uma fala proferid a pelo autor na mesa redonda “ Filosofia e Ecologia: opção pela Vida!” ,
organizada pelo curso de Filosofia da URI, no dia 16 de Novembro de 2011, em come moração ao dia mundia l da Filo sofia .
2 Graduado em Filosofia pela URI- campus de Frederico Westphalen. Pesquisador do Núcle o de Estudos em Filosofia da URI. Autor
do Livro: “ Pecado Origin ado: as orig ens da atual crise ecoló gica”
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direito à dominação das demais espécies e sobre a natureza, construindo uma visão antropocêntrica e
unilateral, perdendo uma visão de conjuntura que contemplasse e promovesse a vida como um todo.
Segundo o filósofo latino-americano Enrique Dussel, o final do presente estágio civilizatório se deixa
ver no presente em dois limites absolutos do “sistema dos 500 anos”, esse sistema inaugurado pela
modernidade renascentista, uma contradição essencial que o mundo moderno não soube superar: este duplo
limite se evidencia na destruição ecológica da vida no planeta e a extinção da própria vida humana na miséria
e na fome da maioria da humanidade. Diante destes dois fenômenos coimplicantes de magnitude planetária
pareceria ingênuo e até ridículo, irresponsável e cúmplice, irrelevante e cínico o projeto de tantas escolas
filosóficas, (tanto no centro, mas pior ainda na periferia, na América Latina, África e Ásia) encerradas na “torre
de marfim” do acadecismo estéril eurocêntrico (DUSSEL, 1977), e não pensam nem articulam a sua
realidade, os problemas concretos que nos afligem enquanto humanidade situada no mundo.
Por isso, Dussel vai propor um pensar filosófico, uma filosofia que tenha como referência concreta,
a vida, a sua produção, reprodução e desenvolvimento. E essa reflexão, esse pensar filosófico e ecológico,
deve partir da nossa realidade compreendida como periferia na América Latina. Pois é na periferia que a
filosofia tem maiores condições de se construir ética e crítica, pois é aí que “[...] A morte das maiorias exige
uma ética da vida, e seus sofrimentos nos levam a pensar e a justificar a sua necessária libertação das
cadeias que as prendem. (DUSSEL, 2007, p. 17).
Por isso se faz necessário refletirmos a partir da nossa América latina a realidade que nos oprime, e
a partir dela alavancar um ethos do cuidado com a vida em todas as suas dimensões. A atitude do Cuidado,
para Boff (2004) representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento
afetivo com o outro e consigo mesmo. A falta de “Cuidado”, a que muitos se referem como uma cultura de
morte, se mostra na contemporaneidade numa grave crise ecológica e social.
Para Boff (1996), essa crise ecológica e social que hoje a humanidade atravessa demanda
explicações pertinentes, radicais e convincentes. “[...] Como numa doença deve-se identificar as causas. Pois
é somente atacando as causas e não os sintomas que se pode curar o doente.” (BOFF, 1996, p. 101). Por
isso, é preciso identificar na construção da sociedade humana, os fatores, as ideologias e estruturas que
fizeram com o que o homem chegasse à atual situação de uma manifesta “guerra” contra a vida, uma
situação em que sua própria humanidade passa a ser colocada em jogo.
Para isso, é preciso identificar na construção da cultura ocidental, como o homem foi concebendose como um ser distinto da natureza e superior as demais formas de vida, arrogando para si direitos
fundamentais em detrimento dos outros seres vivos. Assim, será possível a reflexão sobre as conseqüências
impostas por essa postura de ser no mundo, sobre a natureza e sobre a própria sociedade, analisando até
que ponto esses paradigmas ainda procedem, ou precisam ser repensados e/ ou substituídos por um novo
modo de repensar a relação do humano com o meio ambiente. E esse é o principal tema que abordo no meu
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livro, lançado pela Editora da URI, com o título: “Pecado Originado: as origens da atual crise ecológica”. Um
livro que discutirá a luz da filosofia, da ética e da bioética a atual crise ecológica, buscando responder a duas
perguntas fundamentais. Onde estamos e como chegamos até aqui? E Para onde devemos ir?
A questão ambiental é um problema que carece de uma resposta rápida e concisa da sociedade
humana atual. Entretanto, é necessário aliar esta necessidade com a práxis, o que se torna complexo ao se
colocar em xeque valores mercadológicos capitalistas e tecnológicos, tornando-se necessária uma profunda
mudança de compreensão da vida; do lugar do ser humano no sistema da vida, e das demais formas de vida,
através de um paradigma sistêmico, ecocêntrico, biocêntrico e profundo.
As mudanças são difíceis, pois envolvem uma complexidade de relações e demandam ações que
estão para além do nível da ação individual. Mas como nos lembra Freire (1996), as mudanças embora
difíceis, são altamente necessárias, e o caminho ético se impõe. Boff aponta a necessidade de uma ética da
vida, de uma ética implicada em produzir, reproduzir e desenvolver a vida (DUSSEL, 2007). E se a vida é o
princípio de tudo, ela deve ser ao mesmo tempo a finalidade (telos) das ações humanas. Se a vida é o maior
bem ela deve ser preservada e assegurada enquanto tal. Essa constatação surge carregada de um sentido
epistemológico bastante complexo e abrangente. Cuidar da vida, promover, conservar, são alguns
imperativos que precisam ser compreendidos para além da dimensão concreta do existir humano. Significa
situar o humano no seu ambiente ecológico, social, espiritual, cultural e econômico, pensar as relações que
possibilitam ao indivíduo a realização da vida plena, as condições determinantes da dignidade do existir e do
habitar sobre o planeta (ROSA, 2011).
Nesse sentido, retomo o anunciado no início dessa fala. A ecologia e a Filosofia se tornam
imprescindíveis para a qualificação da vida não somente a vida humana, mas a de todos os seres. Ilustro
essa necessidade trazendo presente uma alusão ao astrônomo Carl Sagan.
Escreve ele, em suas reflexões sobre a presença do ser humano na Terra, que na hipótese da
existência (imaginária) de um Ser extraterrestre, e que esse Ser examinasse o planeta Terra, a partir de uma
órbita não muito distante, se daria conta que existe uma civilização, vida inteligente na Terra. As luzes
emitidas pelos conglomerados urbanos, as emissões de ondas de rádio de televisão, os sinais de satélite,
bem como o padrão regular das plantações sobre a superfície do planeta emitem sinais claros de que o
planeta é povoado por seres racionais.
Mas se, entretanto, esse Ser aprofundasse suas observações, logo perceberia que alguma coisa
errada está ocorrendo na superfície do planeta. Aqueles organismos dominantes estão destruindo suas
principais fontes de vida. Os recursos naturais estão sob constante ataque. E as reservas se esgotam. O solo
se extenua, o ar está poluído, sujo, a camada de ozônio está sendo destruída, a água está imprópria para
consumo... A esta altura, escreve Sagan, o visitante espacial faria uma revisão de sua análise inicial, e
concluiria que não há vida inteligente na Terra.
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Precisamos provar o contrário!
BIBLIOGRAFIA:
BOFF, Leonardo. Saber Cuidar: Ética do humano - compaixão pela terra. 11ed. Petrópolis: Vozes, 2004.
BOFF, Leonardo. Ecologia: grito da terra, grito dos pobres. 2 ed. São Paulo: Ática, 1996.
DUSSEL, Enrique. Éti ca da Libertação: na idade da globalização e da exclusão. Trad Ephraim Ferrreira
Alves, Jaime A. Clasen, Lúcia M. E. Orth. 3 ed. Petrópolis – RJ: Vozes, 2007.
DUSSEL, Enrique. Filosofia da Libertação. São Paulo: Edições Loyola, 1977.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. 33 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
GAFO, Javier Fenández. 10 palavras-chave em bioética. São Paulo, Paulinas, 2000.
ROSA, Gilnei da. Pecado Originado: as origens da atual crise ecológica. Frederico Westphalen – RS: Editora
da URI, 2011.
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