Caso Clínico Tratamento ortodôntico com aparelho autoligado passivo – SmartClip™ Autor: Prof. Reginaldo César Trevisi Zanelato Especialista e Mestre em Ortodontia Coordenador do Curso de Especialização de Ortodontia do Inapós em Presidente Prudente ‑­ Brasil Coordenador do Curso Clínico de Ortodontia MBT no Porto ­‑ Consolidar e Validar Professor do Curso Clínico de Ortodontia MBT em Lisboa ­‑ WM Cursos 1. Introdução. Várias inovações tecnológicas são introdu‑ zidas com freqüência no mercado ortodônti‑ co, dentre elas podemos destacar os aparelhos autoligados que prometem encurtar o tempo de tratamento, pois têm como característica a baixa fricção, que facilita o início do movimento dentário pela diminuição da resistência inicial a movimentação. Essa característica de autoliga‑ ção comum o todos os braquetes desperta bas‑ tante interesse entre os ortodontistas, que acre‑ ditam tornar­‑se mais fácil e rápido o tratamento. O atrito durante a movimentação dentária pode ser estático ou dinâmico e está intimamen‑ te relacionado com o material do braquete, ao contato do arco com o braquete e principalmen‑ te ao sistema de amarração. Como é possível ter controle sobre estas variáveis que influenciam na movimentação ortodôntica, a escolha do sis‑ tema de braquetes deverá estar relacionada a má oclusão, ou seja, casos com grandes movimen‑ tações por meio do deslizamento, os braquetes autoligados terão melhor desempenho que os convencionais. 2. Atrito durante o movimento ortodôntico. Com a evolução das mecânicas de tratamento e a popularização da técnica do deslizamento, é importante conhecer os fatores que dificultam a movimentação dentária. O atrito, que é definido como a resistência oferecida pelos dentes duran‑ te o deslizamento pode ser estático ou dinâmico. O atrito estático é a resistência inicial a movimentação, ou seja, a força aplicada 48 – www.saudeoral.pt deverá suplantar a inércia (estado de equilí‑ brio). A musculatura, a intercuspidação, o ma‑ terial do braquete, o contato do fio com o bra‑ quete e principalmente o sistema de amarração interferem no início da movimentação. Os braquetes metálicos fabricados com aço inoxidável possuem excelentes propriedades mecânicas e a escolha das ligaduras metálicas ou elásticas deve ser considerada, pois vários estudos apontam que as ligaduras elásticas au‑ mentam o atrito estático, dificultando o início da movimentação. Quanto maior o atrito, maior deverá ser a força e isso aumentará os efeitos colaterais, repercutindo no tempo do tratamen‑ to e nos danos teciduais. Com a possibilidade de se aplicar a magnitude de força adequada aumenta­‑se a chance de respostas adequadas nos tecidos periodontais, causando movimen‑ tações mais eficientes e rápidas que repercutem nos efeitos colaterais e no tempo de tratamento3. O atrito dinâmico ocorre durante o desliza‑ mento dentário, em que o fio se desloca dentro das canaletas dos braquetes e tubos. As variáveis que interferem neste tipo de atrito estão rela‑ cionadas com o material dos braquetes e dos fios ortodônticos e pelo sistema de amarração. Assim, a escolha do braquete e do sistema de amarração é imprescindível nos casos de ne‑ cessidade de extensos movimentos dentários, como nos casos com extrações de pré­‑molares. Cabe salientar que o controle do atrito deve ser levado em consideração durante o desliza‑ mento dentário, pois em outras situações clíni‑ cas, como na fase de nivelamento e alinhamen‑ to, controle de ancoragem e controle de torque, necessita­‑se de atrito. Caso Clínico 2. Braquete Autoligado SmartClipTM. Os braquetes autoligados são diferenciados em passivos e ativos. Os passivos são aqueles que o sistema de fechamento da canaleta não faz pressão sobre o arco, funcionando como tubos, tendo melhor desempenho no deslizamento e pior no controle de rotação e inclinação. Os bra‑ quetes autoligados ativos são aqueles cujas presi‑ lhas flexíveis que fecham a canaleta pressionam o arco a partir do arco. 018”, produzindo assim, baixo atrito nos arcos redondos iniciais, aumen‑ tando o atrito e o controle de torque nos arcos retangulares. O sistema de braquetes autoligado Smar‑ tClipTM da empresa 3M Unitek, baseia­‑se na filosofia de tratamento MBT, sendo classificado como um sistema passivo de braquetes, em que o fio trabalha com liberdade na canaleta e com pressão reduzida no arco ortodôntico. O meca‑ nismo de trabalho dos braquetes consiste em dois clipes laterais de nitinol que abrem e fecham por deformação elástica quando pressionados. Este sistema de braquetes é composto de três partes que são fabricadas separadamente: base do braquete, clipe e corpo do braquete. O corpo é manufaturado por injeção de metal e o clipe é recortado a laser e depois polido, sendo fixado mecanicamente a base e ao corpo do braquete com solda a laser6. A mecânica de tratamento com o aparelho au‑ toligado segue os mesmo passos sugeridos na téc‑ nica MBT: controle da ancoragem, alinhamento e nivelamento, fechamento de espaços, detalhes e acabamento, remoção e contenção. Um dos pontos críticos para quem inicia o uso dos aparelhos autoligados passivos é a fase de alinhamento e nivelamento, em razão da falta de pressão da amarração sobre o arco. Como o SmartClip é um braquete comum, apresentando o mesmo desenho do braquete convencional de aletas duplas, possibilita­‑se o uso de ligaduras, transformando­‑o em braquete ativo. Outra recomendação é preencher a canaleta o mais rápido possível com arco retangular ou utilizar ao mesmo tempo dentro da canaleta o arco duplo composto por um arco .014” e .016” nitinol, cujo o diâmetro total se aproxima do arco .021”. Cabe lembrar, que nesta fase de ali‑ nhamento e nivelamento necessita­‑se de atrito. A mecânica de fechamento de espaço com aparelho SmartClipTM deve ser realizada 50 – www.saudeoral.pt O objetivo deste terceiro tópico é mostrar algu‑ mas vantagens do aparelho autoligado compa‑ rado com o aparelho convencional. 3.1 – Diminuição do atrito. FIGURA 1 – Partes do braquete autoligado SmartClip que são fabricadas independentemente e fixadas com solda a laser FIGURA 2 E 3 – Na fase de alinhamento e nivelamento recomenda­‑se inserir o arco retangular nitinol o mais rápido possível ou usar o arco duplo (.014” e .016”) com o arco de aço inoxidável .019”x.025” ou .018”x.025”, tomando o cuidado de não colocar muita força no sistema de retração e aumentar o intervalo entre as ativações, em virtude de ser um braquete passivo. O excesso de força resul‑ tará em perda de inclinação dos incisivos. 3. As vantagens do aparelho autoligado Quando se inicia a utilização do aparelho autoligado a expectativa é alta e os resultados clínicos são frustrantes, em razão da falta de experiência e do desconhecimento de alguns conceitos que regem o uso da autoligação. Como é um aparelho novo, que foi introduzido no mercado recentemente, necessita­‑se de trei‑ namento apropriado para ser utilizado e aos poucos os resultados estarão de acordo com a nossa expectativa, justificando o investimento. A diminuição do atrito é a principal carac‑ terística do aparelho autoligado, facilitando o início da movimentação dentária e diminuin‑ do o tempo de tratamento. O atrito está dire‑ tamente relacionado com o sistema de amar‑ ração, como neste aparelho as presilhas ou os clipes não apertam o arco, a resistência a movi‑ mentação é diminuída. Cada vez mais, os braquetes autoligados têm despertado o interesse dos ortodontistas, uma vez que neste sistema a atividade friccio‑ nal é consideravelmente reduzida e a liberação de forças mais leves é possibilitada, facilitan‑ do o movimento dentário, reduzindo o tem‑ po de tratamento e o conforto ao paciente é otimizado5. Os principais fatores envolvidos na deter‑ minação do nível de fricção são o material de composição dos braquetes e dos fios; as condi‑ ções de superfície dos fios e das canaletas dos braquetes; o calibre do fio; o torque na interfa‑ ce fio­‑braquete; a distância inter­‑braquetes; o tipo e a força da amarração; a saliva e a influ‑ ência das funções bucais. Além disso, quanto mais mal posicionado estiver o dente, maior a deflexão do fio e, portanto, o contato deste com o braquete faz aumentar o atrito estático e a força necessária a movimentação. Quanto maior a área de contato e dependendo do ma‑ terial para amarrar o arco o atrito ainda pode ser maior. Nos casos de amarrilhos metálicos, sabe­‑se que o atrito estático é significativamen‑ te menor, quando comparado as ligaduras elás‑ ticas e se as ligaduras elásticas forem utilizadas em forma de “8” o atrito aumenta ainda mais (de 70% a 220%)4. Em algumas situações clínicas nós dificul‑ tamos o deslizamento dentário, com a utili‑ zação de ligaduras elásticas sobre o arco no qual os dentes estão sendo movimentados. A figura abaixo mostra os caninos sendo distalizados com lacebacks e os braquetes amarrados com ligaduras elásticas dificul‑ tando o movimento dentário pelo aumento do atrito estático. Nesta situação é necessário aumentar a força aplicada sobre os caninos Caso Clínico repercutindo nos efeitos colaterais e no tem‑ po de tratamento. FIGURA 4 – Ligadura elástica sobre os lacebacks dificultando a retração dos caninos nos casos de extração de pré­‑molar 3.2 – Intensidades da força de movimentação Como a característica principal do aparelho autoligado é a diminuição da fricção durante o movimento dentário, a força aplicada para iniciar a movimentação é menor, repercutin‑ do positivamente nos efeitos colaterais, danos teciduais e tempo de tratamento. O excesso de força normalmente se traduz em perda de ancoragem molar e perda de inclinação dos incisivos, efeitos indesejáveis durante a fase inicial do tratamento. Os braquetes autoliga‑ dos passivos como o SmartClipTM não aceitam excesso de força, pois acarretaria consideráveis perda de inclinação anterior, então cabe aos ortodontistas entender este conceito e aplicá­ ‑lo clinicamente, diminuindo a força aplicada na movimentação e aumentando os intervalos entre as consultas. Com a possibilidade de se usar braquetes autoligados e fios de alta flexibilidade, redu‑ zindo o nível de força, diminuem­‑se os danos teciduais no ligamento periodontal, com a di‑ minuição de áreas hialinas e de lesões na ca‑ mada cementoblástica que recobre a raiz, que poderiam induzir a perda óssea e reabsorções radiculares. 3.3 ­‑ Redução do tempo de tratamento e maior intervalo entre as consultas O uso de braquetes autoligados pode di‑ minuir o tempo de tratamento de 4 a 6 meses em relação ao aparelho convencional ligado, e 52 – www.saudeoral.pt economizar o tempo de cadeira para as trocas de arcos2. Esta diminuição no tempo total de trata‑ mento se expressará mais nas fases iniciais, principalmente durante o alinhamento e nive‑ lamento, em que o atrito estático estará redu‑ zido, facilitando o movimento dentário. Já na fase de arcos retangulares, o atrito é signi‑ ficativamente aumentado em razão do aumen‑ to do calibre do arco. A incapacidade de alguns ortodontistas em verificar o desempenho do fio níquel­‑titânio ativos sobre os demais é a razão de o fio não ser mantido por tempo suficiente. É recomen‑ dado que estes fios de liga termo­‑ativa sejam mantidos na boca por 10 a 12 semanas, pois a liberação da força após a deformação é suave e gradual. Este maior intervalo entre as ativações intrigam vários profissionais e pesquisadores, porque a manutenção destes fios por mais tem‑ po permite a verticalização dos dentes e a ex‑ pansão lenta dos arcos dentários, sem provocar os efeitos colaterais deste tipo de movimento, como a fenestração óssea e o aumento exagera‑ do da inclinação vestibular dos incisivos o que causa instabilidade1. FIGURA 5 e 6 – Utilização de braquetes autoligado passivo e fio de alta flexibilidade com inserção total do arco na canaleta, notando­‑se também, a expansão do arco inferior. Assim, quando se usa braquete autoligado e fios de alta flexibilidade, há uma inserção total do fio dentro da canaleta, sendo recomenda‑ do que este fio permaneça por mais tempo, o que evita as trocas mensais de fios, realizadas durante o tratamento com aparelho conven‑ cional. A manutenção destes fios por mais tempo permite que os dentes se movimentem para áreas de menor resistência, causando ex‑ pansões lentas dos arcos dentários sem forçar o nivelamento. 4 – Caso clínico 1 FIGURAS 7, 8 e 9 – Modelos iniciais em norma frontal e lateral Caso Clínico 4.1 – Caso clínico 2 FIGURAS 10, 11 e 12 ­– Fase alinhamento e nivelamento com arco .014” nitinol super elástico e lacebacks para retrair caninos FIGURA 16,17 e 18 – Modelos iniciais em norma frontal e lateral FIGURAS 22,23 e 24– Fotografias intrabucais finais Referências bibliográficas FIGURAS 13, 14 e 15 – Fotografias intrabucais finais 54 – www.saudeoral.pt FIGURA 19,20 e 21 – Fase de alinhamento e nivelamento, utilizando aparelho autoligado SmartClip e arco nitinol .014” super­‑elástico 1. BAGDEN, A. The Damon system: questions and answers. Clinical Impressions, Glendo‑ ra, v.14, n.1, p. 4­‑13, 2005 2. BERGER, J. Self ligation in the year 2000. J. Clin. Orthod, Boulder, v.34, n.2, p.74­‑81, feb. 2000 3. DAMON, D. The rationale, evolution and clinical application of the self­‑ligating bra‑ cket. Clin. Orthod. Res., Copenhagen, v.1, no.1, p. 52­‑61, 1998. 4. MALTAGLIATI, L.A. Braquetes autoliga‑ dos – no que diferem? Qual a vantagem em utilizá­‑los na prática clinica? Rev. Clin. Or‑ todon. Dental Press, Maringá, v.6, n.5, p. 15­ ‑30 ­‑ out./nov. 2007 5. RAVELI, D.B. et al. Sistema de braquetes autoligáveis: a grande tendência na Orto‑ dontia moderna. Rev. Clin. Ortodon. Dental Press, Maringá, v.6, n.6, p. 68­‑76 – dez.2007/ jan.2008 6. T REVISI, H.J. O sistema de aparelho autoli‑ gado SmartClip. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007