O IMPACTO DA CONSCIENTIZAÇÃO DOS DIREITOS NO

O IMPACTO DA CONSCIENTIZAÇÃO DOS DIREITOS NO TRATAMENTO E
NA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES
ONCOLÓGICOS.
Fernanda Fagundes Veloso Lana1
RESUMO
O câncer consiste em uma doença complexa que exige equilíbrio físico e mental. Ao
receber o diagnóstico, poucos correm atrás de uma série de direitos assegurados
pelas leis brasileiras para ajudar os pacientes a enfrentar esta batalha. Tal fato se dá
justamente pelo fato de o Estado não se promover o conhecimento desses direitos
aos pacientes. Muitos enfrentam a doença sacrificando a própria subsistência e a da
família sem estarem cientes de que há um aparato público que o permite ter acesso
a uma série de bens, como benefícios previdenciários, assistenciais, isenções
tributárias, no enfrentamento da doença de maneira menos onerosa. Uma vez
trabalhada essa conscientização, os reflexos são extremamente positivos,
influenciando, inclusive, na sobrevida dos pacientes e êxito nos
tratamentos.
Palabras-chave: Câncer. Conscietização. Direitos.Tratamento. Vida.
1.INTRODUÇÃO
O câncer é de uma doença multifatorial, que pode resultar da combinação
de fatores endógenos e exógenos, como genes, estilo de vida e meio ambiente, a
qual induz a uma maior probabilidade de desenvolvimento da doença (TEMPORÃO,
2004).
Trata-se de uma das doenças de maior complexidade com as quais a
ciência já se deparou, principalmente diante da pluralidade de situações que se
formam com o seu diagnóstico, como o tempo e condições de sobrevida, as
complicações futuras, evolução e cura da doença, que muitas vezes quando se
referem a uma mesma neoplasia maligna, podem variar de paciente para paciente
com perfis semelhantes. (BARBOSA, 2007).
1
Mestre em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-MINAS, Professora
de Direito Constitucional das Faculdades Integradas do Norte de Minas – Funorte, Professora de Direito
Tributário e Direito Previdenciário da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unimontes.
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Estudos atuais indicam que a freqüente exposição involuntária de
indivíduos a
diversas
fontes de
carcinógenos
está
contribuindo
para
o
desenvolvimento e aumento dos índices da doença. (TEMPORÃO, 2004).
O Instituto Nacional do Câncer destacou que a difusão de informações
acerca de tais fontes e fatores já determinados pela ciência, aliada a estudos
realizados junto a população de pacientes oncológicos tendem a contribuir de forma
considerável para o controle e prevenção da doença. (INCA, 2009).
O mesmo instituto também apontou que na atualidade são bastante
difundidos os crescentes índices de cura do câncer, principalmente quando
diagnosticado e tratado em estágio inicial, demonstrando-se a importância do
diagnóstico precoce. (INCA, 2009).
A melhora na qualidade de vida dos pacientes acometidos de agravos
diversos, como o câncer, tem sido estudada e considerada como indicadora para
avaliação da eficácia, eficiência e impacto de determinados tratamentos
e
procedimentos para o controle de problemas de saúde. (SEIDL e ZANNON, 2007).
Segundo SEIDL e ZANNON (2007), qualidade de vida na área de saúde
conta com determinantes e condicionantes multifatoriais e complexas, relacionadas
a aspectos econômicos, socioculturais, à experiência pessoal e estilo de vida, sendo
resultado tanto de práticas assistenciais quanto de políticas públicas, nos campos da
promoção da saúde e da prevenção de doenças.
A propósito disso, FLECK et al (1999) assinalaram que:
a oncologia foi a especialidade que, por excelência, se viu confrontada com
a necessidade de avaliar as condições de vida dos pacientes que tinham
sua sobrevida aumentada devido aos tratamentos realizados, já que, muitas
vezes, na busca de acrescentar anos à vida, era deixada de lado a
necessidade de acrescentar vida aos ano.
Atualmente no Brasil, segundo dados do INSTITUTO NACIONAL DO
CÂNCER - INCA, para os anos de 2014 e 2015 a previsão é de que surjam
aproximadamente quinhentos e setenta e seis mil casos novos de câncer por ano,
situação que exige uma maior atenção do Estado.(INCA, 2015).
O ordenamento jurídico brasileiro vigente está recheado de diplomas
legais que contemplam portadores de câncer, desde vastos sistemas, como o de
seguridade social, o qual abrange a previdência social, assistência social e saúde
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(BRASIL, 1988), até uma simples determinação de prioridade no andamento
processual. (BRASIL, 2003).
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, já previu como
fundamento do Estado Democrático de Direito a cidadania e a dignidade da pessoa
humana, bem como o direito à saúde, dedicando inteiro título à matéria denominado
“da ordem social”. (BRASIL, 1988).
Apesar de todo o esforço governamental, sua máquina ainda não está
suficientemente equipada e capacitada para amparar todos aqueles portadores da
doença, e proporcionar-lhes, com suas políticas e ações, melhores condições de
vida.
Com o diagnóstico definitivo da doença, o paciente sofre significativas
alterações em sua vida, nos aspectos emocional, social e financeiro. E, além de
muito sofrimento e das adversidades inerentes à neoplasia maligna, o paciente e
sua família ainda se deparam com a difícil realidade do custo da doença, que se
agrava com a escassez de recursos financeiros comum em grande parte da
população doente. (BARBOSA, 2007).
Para muitos pacientes não basta apenas se concentrar em encarar o
tratamento, mas, principalmente, em ter acesso a tal tratamento, a medicamentos,
em enfrentar as dificuldades como a falta de trabalho, falta dinheiro, de transporte,
de vagas nos hospitais para ter a chance de lutar contra a doença, fatores que por si
podem dar a sentença de morte a inúmeros pacientes.
Neste contexto, não bastam previsões legais de direitos dirigidos aos
pacientes oncológicos, se estes não têm acesso e nem consciência da existência de
tais benefícios. É necessária ação de toda sociedade para se aproximar os
pacientes de seus direitos, através da informação ou de medidas concretas e
efetivas para o alcance dos mesmos, com conseqüente balanço do impacto do
movimento na qualidade de vida dos portadores de câncer.
O saldo positivo de um trabalho de conscientização e viabilização dos
direitos
aos
pacientes
oncológicos,
poderá
influenciar
nas
iniciativas
governamentais, visto que, conforme a autora e ex-paciente, Antonieta Barbosa
(BARBOSA, 2007), uma população conhecedora dos fatores influentes no
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desenvolvimento do câncer, convencida da importância da prevenção que diminui o
risco da doença, bem como as chances de recuperação se houver diagnóstico
precoce da doença, e ainda acesso a direitos como escolha do tratamento, suporte
financeiro público, alívio de encargos com a liberação de pagamento de diversos
tributos, induzirá o Estado, tanto no âmbito nacional, como no estadual e no
municipal, a cumprir com seus deveres de prestar a população os direitos que ela
foram destinados, levando a população portadora da doença a ter uma melhor
qualidade de vida.
2. DIREITOS DOS PACIENTES EM TRATAMENTO ONCOLÓGICO
Apesar da existência de vasta legislação que visa atender os interesses
dos pacientes portadores de doenças graves como o câncer, é certo que para se
conhecer todos os direitos previstos, o paciente tem-se de prestar a um verdadeiro
garimpo jurídico para conhecer todas as leis, visto não haver um compêndio
específico com todos os dispositivos legais que tratam da matéria.
Um fator importante, aliado à pouca divulgação desta legislação, consiste
no fato de que a maioria dos textos legislativos, bem como das decisões
administrativas e judiciais, são ininteligíveis ao público que não faz parte do grupo de
profissionais que lidam com interpretação e aplicação das leis.
Ou seja, este público, mesmo que tenha acesso aos textos legais terá
dificuldade no seu entendimento, em compreender o direito que lhe está sendo
deferido através daquele diploma.
Dessa forma, todos os meios que contribuem para a informação e
conscientização de tais direitos são de inestimado valor tanto para os pacientes
portadores de câncer, quanto para a sociedade.
No Brasil a população conta com o Sistema Único de Saúde – SUS, que é
formado pelo conjunto de todas as ações e serviços de saúde prestados por órgãos
e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da administração direta e
indireta, das fundações mantidas pelo Poder Público. À iniciativa privada é permitido
participar desse Sistema de maneira complementar. (BRASIL, 2000).
O SUS tem como principais objetivos, conforme artigo 5º da Lei 8.080/90:
I - a identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes
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da saúde;
II - a formulação de política de saúde destinada a promover, nos campos
econômico e social, a observância do disposto no parágrafo 1º do artigo 2º
desta lei;
III - a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção,
proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada das ações
assistenciais e das atividades preventivas, inclusive aos casos de
manutenção da saúde com serviços de alta complexidade, como de
paciente oncológico, de forma universal, integral e gratuita. (BRASIL, 1990).
Do Sistema Único de Saúde fazem parte os centros e postos de saúde,
hospitais - incluindo os universitários, laboratórios, hemocentros (bancos de
sangue), os serviços de Vigilância Sanitária, Vigilância Epidemiológica, Vigilância
Ambiental, além de fundações e institutos de pesquisa. (BRASIL, 1990).
Ao ser criado, o SUS foi desenvolvido sobre princípios e diretrizes que
determinam sua base de atuação, cujo destaque torna-se imprescindível para o
presente trabalho:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de
assistência, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;
II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e
contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e
coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do
sistema;
III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade
física e moral;
IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de
qualquer espécie, com ações e serviços priorizados em função de situações
de risco e condições de vida e saúde de determinados indivíduos e grupos
de população;
V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;
VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e
a sua utilização pelo usuário;
VII - utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a
alocação de recursos e a orientação programática;
VIII - participação da comunidade;
IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada
esfera de governo, a) ênfase na descentralização dos serviços para os
municípios, b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de
saúde;
X - integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e
saneamento básico;
XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e
humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na
prestação de serviços de assistência à saúde da população;
XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de
assistência; e XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar
duplicidade de meios para fins idênticos. (BRASIL, 1990).
Os Planos de Saúde também se tornaram instrumentos hábeis de acesso
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à saúde, principalmente face à ineficiência do serviço público. Oferecem prestação
de serviços de saúde de forma particular, a que apenas uma parcela da população
tem acesso.
As instituições que os representam devem observar as cláusulas
firmadas, as quais sofrem limitações legais, estando impedidas de reduzir a
cobertura do contrato firmado com o cliente em casos de diagnóstico de câncer,
sendo o prestador obrigado a oferecer todo o tratamento, exames, internações,
consultas necessários ao paciente conforme contratado. (BRASIL, 1998).
O Poder Judiciário tem garantido tais direitos, muitas vezes anulando
cláusulas expressas em contratos de prestação de serviços por planos de saúde,
que excluem da cobertura de tratamento de doenças como neoplasia maligna.
AÇÃO DE COBRANÇA • RECUSA DE REEMBOLSO POR DESPESAS
COM SESSÕES DE RADIOTERAPIA • CLÁUSULA CONTRATUAL DE
LIMITAÇÃO DO NÚMERO DE SESSÕES COBERTAS PELO PLANO DE
SAÚDE • CLÁUSULA ABUSIVA • CUSTEAMENTO COM O NÚMERO
TOTAL DE SESSÕES NECESSÁRIAS AO TRATAMENTO MÉDICO CONFORME ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL, O PLANO DE
SAÚDE
PODE ESTABELECER QUAIS DOENÇAS ESTÃO SENDO
COBERTAS, MAS NÃO QUE TIPO DE TRATAMENTO ESTÁ ALCANÇADO
PARA A RESPECTIVA CURA • ENTENDIMENTO PACÍFICO DO STJ •
REEMBOLSO DEVIDO • SENTENÇA MANTIDA. Recurso conhecido e
improvido. DECISÃO : Diante do exposto, resolve esta Turma Recursal, por
unanimidade de votos, conhecer do recurso e, no mérito, negar provimento,
nos exatos termos do voto.
(TJPR - 2ª Turma Recursal - 20130000788-0 - Curitiba - Rel.: Sigurd
Roberto Bengtsson - - J. 10.06.2013)
APELAÇÃO CÍVEL - PLANO DE SAÚDE - NEGATIVA DE
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PARA TRATAMENTO DE
QUIMIOTERAPIA - ALEGAÇÃO DE PREVISÃO CONTRATUAL DA
EXCLUSÃO DE TRATAMENTO CONSIDERADO EXPERIMENTAL AFASTAMENTO - ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA CONTRATUAL INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR - INCIDÊNCIA
DO ARTIGO 47 DO CDC - ABALO MORAL CARACTERIZADO PELA
RECUSA DA COBERTURA DO PROCEDIMENTO EM FASE DELICADA
DE SAÚDE - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DEVIDA - SENTENÇA
MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO POR UNANIMIDADE."I - As
cláusulas de contrato de plano de saúde devem ser interpretadas à luz do
Código de Defesa do Consumidor, de forma que lhe seja mais favorável,
visando o equilíbrio na relação negocial. Inteligência do art. 47, do CDC. II Na referida modalidade contratual, essencialmente, de adesão, a negativa
de cobertura de procedimento, que comprometa o próprio objeto do
contrato, é inaceitável, porque coloca o aderente, já fragilizado, pela
doença, em nítida desvantagem, sendo, portanto, plausível a condenação
da prestadora de serviços de saúde, nos dos danos experimentados pelo
consumidor. III - Destarte, na espécie, a ausência de cobertura do
procedimento cirúrgico neurológico para retirada de tumor da hipófise,
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configura-se cláusula leonina, por comprometer o objeto da avença e
própria vida do paciente. IV - Para que haja dano moral, necessário que o
ato ofenda a dignidade da pessoa humana.No caso em tela, a negativa de
cobertura de procedimento prescrito por médico, em desfavor de pessoa
que já se encontrava em estado aflitivo, se constitui em ato ilícito,
implicando em ofensa à moral e à dignidade do autor." (TJPR - Ac. 26236,
9ª Câmara Cível, Rel. Juiz Subst. Antonio Ivair Reinaldin, DJ 31/03/2011)
(TJPR - 8ª C.Cível - AC - 1012924-7 - Curitiba - Rel.: José Laurindo de
Souza Netto - Unânime - - J. 09.05.2013)
São conhecidas as dificuldades enfrentadas pelo Sistema Único de
Saúde, o que não exime o governo de prestar toda a assistência àqueles que
desenvolveram doenças graves como o câncer.
Mas o desenvolvimento do câncer causa diversas mudanças na vida do
paciente, que não raras vezes passam adotar hábitos inteiramente distintos
daqueles adotados antes do diagnóstico. (BARBOSA, 2007).
Mas, não só apenas direitos relativos ao tratamento cabem aos pacientes
oncológicos, estes também contam com direitos diversos, que segundo o site
MAMAINFO são
auxílio doença,
aposentadoria por invalidez,
cirurgia
de
reconstrução mamária, compra de carro com isenção de Imposto sobre Produtos
Industrializados - IPI, Imposto sobre Circulação de Mercadorias e sobre a Prestação
de Serviços Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS e
Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores - IPVA, benefícios no Sistema
Financeiro de Habitação, isenção de Imposto sobre a Renda e proventos de
qualquer natureza, Benefício de Prestação Continuada - LOAS, atendidos os
requisitos, medicamentos gratuitos, transporte coletivo interestadual, prioridade no
crédito oriundo de precatório, prioridade no andamento de processos, saque do
Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, saque do saldo existente de Plano de
Integração Social – PIS e do Plano de Formação de Patrimônio do Servidor Público PASEP, indenização de seguro de vida contratado em caso de invalidez,
financiamento para aquisição de equipamentos para suprir necessidades especiais
impostas por doenças graves.
Ocorre que tais direitos estão distantes da população pelo completo
desconhecimento, como também, pela ignorância quanto aos meios de acesso a tais
direitos.
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É neste contexto, que se faz necessária a intervenção de um trabalho de
conscientização da população e familiares dos portadores de câncer, para que
adotem todas as medidas cabíveis, inclusive com a assistência de profissionais
especializados, quanto a concretização dos direitos previstos para os pacientes com
câncer.
Essa conscientização e alcance dos direitos supramencionados não se
fazem urgentes apenas para provocar a máquina estatal a cumprir um dever
legalmente determinado, mas, principalmente, para fazer com que os portadores na
neoplasia
maligna,
atinjam
uma
melhora
na
qualidade
de
vida,
e,
consequentemente, no próprio tratamento.
Desta forma, indubitável a necessidade de conscientização da população
portadora de câncer e seus familiares quanto aos direitos que lhe cabem enquanto
paciente, na capacitação de profissionais a acompanhá-los, bem como orientá-los a
tomar todas as medidas necessárias, como propositura de demandas e recursos, a
fim de se viabilizar, atingir e concretizar os direitos de paciente, ressaltando o
impacto que poderá ser acarretado em sua qualidade de vida.
3. PROJETO VIDA PRESENTE E A ANALISE DA CONSCIENTIZAÇÃO DOS
DIREITOS DOS PACIENTES
Em pesquisa realizada na Universidade Estadual de Montes Claros –
UNIMONTES, por meio de projeto institucionalizado denominado “Direito e
Cidadania: o impacto da conscientização e da orientação de medidas para alcance
de direitos,na qualidade de vida de pacientes oncológicos – estudo multidisciplinar”,
cujo objetivo geral foi avaliar o impacto na qualidade de vida de mulheres
diagnosticadas com câncer a partir da viabilização do exercício da cidadania por
meio da conscientização dos direitos que lhes são conferidos pela legislação
vigente, houve uma confirmação real da falta de conhecimento dos pacientes e
familiares quanto a seus direitos.
Foi analisado o grau de conhecimento dos direitos conferidos às
portadoras de câncer, e, consequentemente foram apresentados aos mesmos os
direitos que lhes cabem enquanto estiverem em tratamento, e informados os meios
disponíveis para o exercício de tais direitos.
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As pacientes, também participantes do projeto de Extensão do curso de
Educação Física da Unimontes, “Vida Presente”, foram encaminhadas aos órgãos de
assistência jurídica gratuita da cidade, já que se tratava de grupo de pacientes
carentes, em tratamento oncológico, e, após orientação quanto as medidas cabíveis
que podem ser tomadas para o alcance dos direitos, foi analisado o impacto da
conscientização desses direitos e das medidas tomadas para concretizar o exercício
dos mesmos na qualidade de vida das pacientes em tratamento oncológico.
Todas as pacientes apresentaram dúvidas quanto a seus direitos,
principalmente
no
que
concerne
aos
direitos
relacionados
a
benefícios
previdenciários, de prestação continuada e assistência médica e medicamentosa do
Sistema Único de Saúde.
Muito recorrentes também foram as dúvidas quanto à possibilidade de
saque do FGTS e isenção de tributos como IPTU municipal.
Constatou-se que o Município de Montes Claros oferece, desde que
atendidos alguns requisitos, a possibilidade de transporte gratuito para pacientes em
tratamento oncológico, entretanto, no entender das pacientes as exigências são
severas, as quais, muitas vezes, pela fragilidade da saúde, não há como comprovar
tudo o que é exigido, inviabilizando, o acesso ao transporte gratuito.
E, por diversas vezes, sem esse transporte gratuito, muitas pacientes
deixam até mesmo de comparecer às sessões de tratamentos, consultas, exames, o
que acaba por contribuir para o agravamento do seu estado de saúde.
Após vinte e quatro meses de acompanhamento, verificou-se que todas
as pacientes com casa própria, dentro das especificações legais, que ainda não
haviam conseguido a isenção do IPTU, alcançaram o gozo do benefício.
Todas as pacientes que ainda não recebiam benefícios previdenciários
(principalmente recebimento de auxílio doença e aposentadoria por invalidez) ou de
prestação continuada, conseguiram concretizar o processo de requerimento,
concessão e recebimento dos benefícios.
O resultado também foi positivo quanto a realização de cirurgias para
reconstrução mamária, e, de forma bastante interessante, quanto a tramitação
prioritária de processos judiciais. Neste último caso mais de oitenta por cento das
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pacientes que tinham processo em tramitação não só reclamavam da demora em
ser proferida uma decisão, como também, do fato de que desconheciam
inteiramente o fato de terem direito a tramitação prioritária dos feitos. Fato não
informado pelos procuradores.
Ou seja, a pesquisa feita por amostragem denunciou que não há um
trabalho eficaz do governo quanto à conscientização dos direitos dos pacientes
oncológicos.
Muitas vezes leis são criadas para beneficiar e desonerar esses pacientes
em tratamento oncológico, mas não são levados ao conhecimento da maioria deles.
Assim, apenas uma pequena parcela alcança a realização desses direitos.
E essa ignorância favorece o Estado, visto que quanto menos pacientes
procurarem esses direitos, menos ônus recairão sobre os cofres públicos. Assim não
parece soar muito interessante para o Estado a divulgação ampla desses direitos.
Como consequência, muitas vidas vem sendo perdidas por falta de
acesso a direitos como tratamento e medicamentos gratuitos, isenção de tributos,
benefícios previdenciários e assistenciais, o que contribui para a manutenção de
melhor renda familiar.
4. REFLEXOS DA EDUCAÇÃO E ORIENTAÇÃO JURÍDICA NA QUALIDADE DE
VIDA DOS PACIENTES ONCOLÓGICOS
As pacientes da pesquisa retrataram a realidade do cenário nacional, qual
seja, de que são criados direitos, sem que os mesmos sejam levados ao
conhecimento dos pacientes oncológicos de forma eficaz. Como consequência
permite-se uma realidade desfavorável e onerosa para esses pacientes e seus
familiares, com privação de bens básicos para seu sustento e tratamento, levando
inclusive à redução da sobrevida de alguns deles.
Quando levado ao conhecimento dos pacientes informações que
permitem acessos a bens e direitos imprescindíveis para sua sobrevivência,
desperta-se um imediato interesse pela procura dos mesmos.
Uma vez apresentados os meios que viabilizam acesso a esses
benefícios, inclusive meios gratuitos, a amostra da pesquisa demonstrou que os
pacientes e aqueles que os acompanham não poupam esforços para providenciar o
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que for necessário concretizar o gozo dos direitos legalmente previstos.
E, como consequência: sem o pagamento de impostos, e com o
recebimento de benefícios, previdenciários ou prestação continuada, vários
pacientes conseguem aumentar sua renda familiar, já tão sacrificada pelo
tratamento; sem o pagamento de IPTU, da mesma forma conseguem incrementar
significativamente o rendimento do lar, aplicando essa economia em insumos
básicos para a sobrevivência; com a reconstrução mamária, recuperam o brio, e
elevam a auto estima; como o acesso a transporte gratuito, fazem questão não
perderem qualquer momento importante do tratamento, recuperando a força de
vontade para lutar contra a doença; com a tramitação mais rápida do processo
recuperam a confiança.
Sem sombra de dúvidas, há uma impacto positivo e determinante da
conscientização dos direitos e meios de acesso aos mesmos dos pacientes
oncológicos, de modo a elevar, de maneira considerável, a esperança e efetivo êxito
no tratamento, e a uma consequentemente melhora na qualidade e aumento na
expectativa de vida deles.
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Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015