O IMPACTO DA CONSCIENTIZAÇÃO DOS DIREITOS NO TRATAMENTO E NA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES ONCOLÓGICOS. Fernanda Fagundes Veloso Lana1 RESUMO O câncer consiste em uma doença complexa que exige equilíbrio físico e mental. Ao receber o diagnóstico, poucos correm atrás de uma série de direitos assegurados pelas leis brasileiras para ajudar os pacientes a enfrentar esta batalha. Tal fato se dá justamente pelo fato de o Estado não se promover o conhecimento desses direitos aos pacientes. Muitos enfrentam a doença sacrificando a própria subsistência e a da família sem estarem cientes de que há um aparato público que o permite ter acesso a uma série de bens, como benefícios previdenciários, assistenciais, isenções tributárias, no enfrentamento da doença de maneira menos onerosa. Uma vez trabalhada essa conscientização, os reflexos são extremamente positivos, influenciando, inclusive, na sobrevida dos pacientes e êxito nos tratamentos. Palabras-chave: Câncer. Conscietização. Direitos.Tratamento. Vida. 1.INTRODUÇÃO O câncer é de uma doença multifatorial, que pode resultar da combinação de fatores endógenos e exógenos, como genes, estilo de vida e meio ambiente, a qual induz a uma maior probabilidade de desenvolvimento da doença (TEMPORÃO, 2004). Trata-se de uma das doenças de maior complexidade com as quais a ciência já se deparou, principalmente diante da pluralidade de situações que se formam com o seu diagnóstico, como o tempo e condições de sobrevida, as complicações futuras, evolução e cura da doença, que muitas vezes quando se referem a uma mesma neoplasia maligna, podem variar de paciente para paciente com perfis semelhantes. (BARBOSA, 2007). 1 Mestre em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-MINAS, Professora de Direito Constitucional das Faculdades Integradas do Norte de Minas – Funorte, Professora de Direito Tributário e Direito Previdenciário da Universidade Estadual de Minas Gerais – Unimontes. Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 Estudos atuais indicam que a freqüente exposição involuntária de indivíduos a diversas fontes de carcinógenos está contribuindo para o desenvolvimento e aumento dos índices da doença. (TEMPORÃO, 2004). O Instituto Nacional do Câncer destacou que a difusão de informações acerca de tais fontes e fatores já determinados pela ciência, aliada a estudos realizados junto a população de pacientes oncológicos tendem a contribuir de forma considerável para o controle e prevenção da doença. (INCA, 2009). O mesmo instituto também apontou que na atualidade são bastante difundidos os crescentes índices de cura do câncer, principalmente quando diagnosticado e tratado em estágio inicial, demonstrando-se a importância do diagnóstico precoce. (INCA, 2009). A melhora na qualidade de vida dos pacientes acometidos de agravos diversos, como o câncer, tem sido estudada e considerada como indicadora para avaliação da eficácia, eficiência e impacto de determinados tratamentos e procedimentos para o controle de problemas de saúde. (SEIDL e ZANNON, 2007). Segundo SEIDL e ZANNON (2007), qualidade de vida na área de saúde conta com determinantes e condicionantes multifatoriais e complexas, relacionadas a aspectos econômicos, socioculturais, à experiência pessoal e estilo de vida, sendo resultado tanto de práticas assistenciais quanto de políticas públicas, nos campos da promoção da saúde e da prevenção de doenças. A propósito disso, FLECK et al (1999) assinalaram que: a oncologia foi a especialidade que, por excelência, se viu confrontada com a necessidade de avaliar as condições de vida dos pacientes que tinham sua sobrevida aumentada devido aos tratamentos realizados, já que, muitas vezes, na busca de acrescentar anos à vida, era deixada de lado a necessidade de acrescentar vida aos ano. Atualmente no Brasil, segundo dados do INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER - INCA, para os anos de 2014 e 2015 a previsão é de que surjam aproximadamente quinhentos e setenta e seis mil casos novos de câncer por ano, situação que exige uma maior atenção do Estado.(INCA, 2015). O ordenamento jurídico brasileiro vigente está recheado de diplomas legais que contemplam portadores de câncer, desde vastos sistemas, como o de seguridade social, o qual abrange a previdência social, assistência social e saúde Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 (BRASIL, 1988), até uma simples determinação de prioridade no andamento processual. (BRASIL, 2003). A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, já previu como fundamento do Estado Democrático de Direito a cidadania e a dignidade da pessoa humana, bem como o direito à saúde, dedicando inteiro título à matéria denominado “da ordem social”. (BRASIL, 1988). Apesar de todo o esforço governamental, sua máquina ainda não está suficientemente equipada e capacitada para amparar todos aqueles portadores da doença, e proporcionar-lhes, com suas políticas e ações, melhores condições de vida. Com o diagnóstico definitivo da doença, o paciente sofre significativas alterações em sua vida, nos aspectos emocional, social e financeiro. E, além de muito sofrimento e das adversidades inerentes à neoplasia maligna, o paciente e sua família ainda se deparam com a difícil realidade do custo da doença, que se agrava com a escassez de recursos financeiros comum em grande parte da população doente. (BARBOSA, 2007). Para muitos pacientes não basta apenas se concentrar em encarar o tratamento, mas, principalmente, em ter acesso a tal tratamento, a medicamentos, em enfrentar as dificuldades como a falta de trabalho, falta dinheiro, de transporte, de vagas nos hospitais para ter a chance de lutar contra a doença, fatores que por si podem dar a sentença de morte a inúmeros pacientes. Neste contexto, não bastam previsões legais de direitos dirigidos aos pacientes oncológicos, se estes não têm acesso e nem consciência da existência de tais benefícios. É necessária ação de toda sociedade para se aproximar os pacientes de seus direitos, através da informação ou de medidas concretas e efetivas para o alcance dos mesmos, com conseqüente balanço do impacto do movimento na qualidade de vida dos portadores de câncer. O saldo positivo de um trabalho de conscientização e viabilização dos direitos aos pacientes oncológicos, poderá influenciar nas iniciativas governamentais, visto que, conforme a autora e ex-paciente, Antonieta Barbosa (BARBOSA, 2007), uma população conhecedora dos fatores influentes no Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 desenvolvimento do câncer, convencida da importância da prevenção que diminui o risco da doença, bem como as chances de recuperação se houver diagnóstico precoce da doença, e ainda acesso a direitos como escolha do tratamento, suporte financeiro público, alívio de encargos com a liberação de pagamento de diversos tributos, induzirá o Estado, tanto no âmbito nacional, como no estadual e no municipal, a cumprir com seus deveres de prestar a população os direitos que ela foram destinados, levando a população portadora da doença a ter uma melhor qualidade de vida. 2. DIREITOS DOS PACIENTES EM TRATAMENTO ONCOLÓGICO Apesar da existência de vasta legislação que visa atender os interesses dos pacientes portadores de doenças graves como o câncer, é certo que para se conhecer todos os direitos previstos, o paciente tem-se de prestar a um verdadeiro garimpo jurídico para conhecer todas as leis, visto não haver um compêndio específico com todos os dispositivos legais que tratam da matéria. Um fator importante, aliado à pouca divulgação desta legislação, consiste no fato de que a maioria dos textos legislativos, bem como das decisões administrativas e judiciais, são ininteligíveis ao público que não faz parte do grupo de profissionais que lidam com interpretação e aplicação das leis. Ou seja, este público, mesmo que tenha acesso aos textos legais terá dificuldade no seu entendimento, em compreender o direito que lhe está sendo deferido através daquele diploma. Dessa forma, todos os meios que contribuem para a informação e conscientização de tais direitos são de inestimado valor tanto para os pacientes portadores de câncer, quanto para a sociedade. No Brasil a população conta com o Sistema Único de Saúde – SUS, que é formado pelo conjunto de todas as ações e serviços de saúde prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta, das fundações mantidas pelo Poder Público. À iniciativa privada é permitido participar desse Sistema de maneira complementar. (BRASIL, 2000). O SUS tem como principais objetivos, conforme artigo 5º da Lei 8.080/90: I - a identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 da saúde; II - a formulação de política de saúde destinada a promover, nos campos econômico e social, a observância do disposto no parágrafo 1º do artigo 2º desta lei; III - a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas, inclusive aos casos de manutenção da saúde com serviços de alta complexidade, como de paciente oncológico, de forma universal, integral e gratuita. (BRASIL, 1990). Do Sistema Único de Saúde fazem parte os centros e postos de saúde, hospitais - incluindo os universitários, laboratórios, hemocentros (bancos de sangue), os serviços de Vigilância Sanitária, Vigilância Epidemiológica, Vigilância Ambiental, além de fundações e institutos de pesquisa. (BRASIL, 1990). Ao ser criado, o SUS foi desenvolvido sobre princípios e diretrizes que determinam sua base de atuação, cujo destaque torna-se imprescindível para o presente trabalho: I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie; II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema; III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral; IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie, com ações e serviços priorizados em função de situações de risco e condições de vida e saúde de determinados indivíduos e grupos de população; V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde; VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a sua utilização pelo usuário; VII - utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação programática; VIII - participação da comunidade; IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo, a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios, b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde; X - integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico; XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação de serviços de assistência à saúde da população; XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins idênticos. (BRASIL, 1990). Os Planos de Saúde também se tornaram instrumentos hábeis de acesso Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 à saúde, principalmente face à ineficiência do serviço público. Oferecem prestação de serviços de saúde de forma particular, a que apenas uma parcela da população tem acesso. As instituições que os representam devem observar as cláusulas firmadas, as quais sofrem limitações legais, estando impedidas de reduzir a cobertura do contrato firmado com o cliente em casos de diagnóstico de câncer, sendo o prestador obrigado a oferecer todo o tratamento, exames, internações, consultas necessários ao paciente conforme contratado. (BRASIL, 1998). O Poder Judiciário tem garantido tais direitos, muitas vezes anulando cláusulas expressas em contratos de prestação de serviços por planos de saúde, que excluem da cobertura de tratamento de doenças como neoplasia maligna. AÇÃO DE COBRANÇA • RECUSA DE REEMBOLSO POR DESPESAS COM SESSÕES DE RADIOTERAPIA • CLÁUSULA CONTRATUAL DE LIMITAÇÃO DO NÚMERO DE SESSÕES COBERTAS PELO PLANO DE SAÚDE • CLÁUSULA ABUSIVA • CUSTEAMENTO COM O NÚMERO TOTAL DE SESSÕES NECESSÁRIAS AO TRATAMENTO MÉDICO CONFORME ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL, O PLANO DE SAÚDE PODE ESTABELECER QUAIS DOENÇAS ESTÃO SENDO COBERTAS, MAS NÃO QUE TIPO DE TRATAMENTO ESTÁ ALCANÇADO PARA A RESPECTIVA CURA • ENTENDIMENTO PACÍFICO DO STJ • REEMBOLSO DEVIDO • SENTENÇA MANTIDA. Recurso conhecido e improvido. DECISÃO : Diante do exposto, resolve esta Turma Recursal, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e, no mérito, negar provimento, nos exatos termos do voto. (TJPR - 2ª Turma Recursal - 20130000788-0 - Curitiba - Rel.: Sigurd Roberto Bengtsson - - J. 10.06.2013) APELAÇÃO CÍVEL - PLANO DE SAÚDE - NEGATIVA DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PARA TRATAMENTO DE QUIMIOTERAPIA - ALEGAÇÃO DE PREVISÃO CONTRATUAL DA EXCLUSÃO DE TRATAMENTO CONSIDERADO EXPERIMENTAL AFASTAMENTO - ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA CONTRATUAL INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR - INCIDÊNCIA DO ARTIGO 47 DO CDC - ABALO MORAL CARACTERIZADO PELA RECUSA DA COBERTURA DO PROCEDIMENTO EM FASE DELICADA DE SAÚDE - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DEVIDA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO POR UNANIMIDADE."I - As cláusulas de contrato de plano de saúde devem ser interpretadas à luz do Código de Defesa do Consumidor, de forma que lhe seja mais favorável, visando o equilíbrio na relação negocial. Inteligência do art. 47, do CDC. II Na referida modalidade contratual, essencialmente, de adesão, a negativa de cobertura de procedimento, que comprometa o próprio objeto do contrato, é inaceitável, porque coloca o aderente, já fragilizado, pela doença, em nítida desvantagem, sendo, portanto, plausível a condenação da prestadora de serviços de saúde, nos dos danos experimentados pelo consumidor. III - Destarte, na espécie, a ausência de cobertura do procedimento cirúrgico neurológico para retirada de tumor da hipófise, Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 configura-se cláusula leonina, por comprometer o objeto da avença e própria vida do paciente. IV - Para que haja dano moral, necessário que o ato ofenda a dignidade da pessoa humana.No caso em tela, a negativa de cobertura de procedimento prescrito por médico, em desfavor de pessoa que já se encontrava em estado aflitivo, se constitui em ato ilícito, implicando em ofensa à moral e à dignidade do autor." (TJPR - Ac. 26236, 9ª Câmara Cível, Rel. Juiz Subst. Antonio Ivair Reinaldin, DJ 31/03/2011) (TJPR - 8ª C.Cível - AC - 1012924-7 - Curitiba - Rel.: José Laurindo de Souza Netto - Unânime - - J. 09.05.2013) São conhecidas as dificuldades enfrentadas pelo Sistema Único de Saúde, o que não exime o governo de prestar toda a assistência àqueles que desenvolveram doenças graves como o câncer. Mas o desenvolvimento do câncer causa diversas mudanças na vida do paciente, que não raras vezes passam adotar hábitos inteiramente distintos daqueles adotados antes do diagnóstico. (BARBOSA, 2007). Mas, não só apenas direitos relativos ao tratamento cabem aos pacientes oncológicos, estes também contam com direitos diversos, que segundo o site MAMAINFO são auxílio doença, aposentadoria por invalidez, cirurgia de reconstrução mamária, compra de carro com isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, Imposto sobre Circulação de Mercadorias e sobre a Prestação de Serviços Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS e Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores - IPVA, benefícios no Sistema Financeiro de Habitação, isenção de Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza, Benefício de Prestação Continuada - LOAS, atendidos os requisitos, medicamentos gratuitos, transporte coletivo interestadual, prioridade no crédito oriundo de precatório, prioridade no andamento de processos, saque do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, saque do saldo existente de Plano de Integração Social – PIS e do Plano de Formação de Patrimônio do Servidor Público PASEP, indenização de seguro de vida contratado em caso de invalidez, financiamento para aquisição de equipamentos para suprir necessidades especiais impostas por doenças graves. Ocorre que tais direitos estão distantes da população pelo completo desconhecimento, como também, pela ignorância quanto aos meios de acesso a tais direitos. Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 É neste contexto, que se faz necessária a intervenção de um trabalho de conscientização da população e familiares dos portadores de câncer, para que adotem todas as medidas cabíveis, inclusive com a assistência de profissionais especializados, quanto a concretização dos direitos previstos para os pacientes com câncer. Essa conscientização e alcance dos direitos supramencionados não se fazem urgentes apenas para provocar a máquina estatal a cumprir um dever legalmente determinado, mas, principalmente, para fazer com que os portadores na neoplasia maligna, atinjam uma melhora na qualidade de vida, e, consequentemente, no próprio tratamento. Desta forma, indubitável a necessidade de conscientização da população portadora de câncer e seus familiares quanto aos direitos que lhe cabem enquanto paciente, na capacitação de profissionais a acompanhá-los, bem como orientá-los a tomar todas as medidas necessárias, como propositura de demandas e recursos, a fim de se viabilizar, atingir e concretizar os direitos de paciente, ressaltando o impacto que poderá ser acarretado em sua qualidade de vida. 3. PROJETO VIDA PRESENTE E A ANALISE DA CONSCIENTIZAÇÃO DOS DIREITOS DOS PACIENTES Em pesquisa realizada na Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, por meio de projeto institucionalizado denominado “Direito e Cidadania: o impacto da conscientização e da orientação de medidas para alcance de direitos,na qualidade de vida de pacientes oncológicos – estudo multidisciplinar”, cujo objetivo geral foi avaliar o impacto na qualidade de vida de mulheres diagnosticadas com câncer a partir da viabilização do exercício da cidadania por meio da conscientização dos direitos que lhes são conferidos pela legislação vigente, houve uma confirmação real da falta de conhecimento dos pacientes e familiares quanto a seus direitos. Foi analisado o grau de conhecimento dos direitos conferidos às portadoras de câncer, e, consequentemente foram apresentados aos mesmos os direitos que lhes cabem enquanto estiverem em tratamento, e informados os meios disponíveis para o exercício de tais direitos. Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 As pacientes, também participantes do projeto de Extensão do curso de Educação Física da Unimontes, “Vida Presente”, foram encaminhadas aos órgãos de assistência jurídica gratuita da cidade, já que se tratava de grupo de pacientes carentes, em tratamento oncológico, e, após orientação quanto as medidas cabíveis que podem ser tomadas para o alcance dos direitos, foi analisado o impacto da conscientização desses direitos e das medidas tomadas para concretizar o exercício dos mesmos na qualidade de vida das pacientes em tratamento oncológico. Todas as pacientes apresentaram dúvidas quanto a seus direitos, principalmente no que concerne aos direitos relacionados a benefícios previdenciários, de prestação continuada e assistência médica e medicamentosa do Sistema Único de Saúde. Muito recorrentes também foram as dúvidas quanto à possibilidade de saque do FGTS e isenção de tributos como IPTU municipal. Constatou-se que o Município de Montes Claros oferece, desde que atendidos alguns requisitos, a possibilidade de transporte gratuito para pacientes em tratamento oncológico, entretanto, no entender das pacientes as exigências são severas, as quais, muitas vezes, pela fragilidade da saúde, não há como comprovar tudo o que é exigido, inviabilizando, o acesso ao transporte gratuito. E, por diversas vezes, sem esse transporte gratuito, muitas pacientes deixam até mesmo de comparecer às sessões de tratamentos, consultas, exames, o que acaba por contribuir para o agravamento do seu estado de saúde. Após vinte e quatro meses de acompanhamento, verificou-se que todas as pacientes com casa própria, dentro das especificações legais, que ainda não haviam conseguido a isenção do IPTU, alcançaram o gozo do benefício. Todas as pacientes que ainda não recebiam benefícios previdenciários (principalmente recebimento de auxílio doença e aposentadoria por invalidez) ou de prestação continuada, conseguiram concretizar o processo de requerimento, concessão e recebimento dos benefícios. O resultado também foi positivo quanto a realização de cirurgias para reconstrução mamária, e, de forma bastante interessante, quanto a tramitação prioritária de processos judiciais. Neste último caso mais de oitenta por cento das Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 pacientes que tinham processo em tramitação não só reclamavam da demora em ser proferida uma decisão, como também, do fato de que desconheciam inteiramente o fato de terem direito a tramitação prioritária dos feitos. Fato não informado pelos procuradores. Ou seja, a pesquisa feita por amostragem denunciou que não há um trabalho eficaz do governo quanto à conscientização dos direitos dos pacientes oncológicos. Muitas vezes leis são criadas para beneficiar e desonerar esses pacientes em tratamento oncológico, mas não são levados ao conhecimento da maioria deles. Assim, apenas uma pequena parcela alcança a realização desses direitos. E essa ignorância favorece o Estado, visto que quanto menos pacientes procurarem esses direitos, menos ônus recairão sobre os cofres públicos. Assim não parece soar muito interessante para o Estado a divulgação ampla desses direitos. Como consequência, muitas vidas vem sendo perdidas por falta de acesso a direitos como tratamento e medicamentos gratuitos, isenção de tributos, benefícios previdenciários e assistenciais, o que contribui para a manutenção de melhor renda familiar. 4. REFLEXOS DA EDUCAÇÃO E ORIENTAÇÃO JURÍDICA NA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES ONCOLÓGICOS As pacientes da pesquisa retrataram a realidade do cenário nacional, qual seja, de que são criados direitos, sem que os mesmos sejam levados ao conhecimento dos pacientes oncológicos de forma eficaz. Como consequência permite-se uma realidade desfavorável e onerosa para esses pacientes e seus familiares, com privação de bens básicos para seu sustento e tratamento, levando inclusive à redução da sobrevida de alguns deles. Quando levado ao conhecimento dos pacientes informações que permitem acessos a bens e direitos imprescindíveis para sua sobrevivência, desperta-se um imediato interesse pela procura dos mesmos. Uma vez apresentados os meios que viabilizam acesso a esses benefícios, inclusive meios gratuitos, a amostra da pesquisa demonstrou que os pacientes e aqueles que os acompanham não poupam esforços para providenciar o Edição Especial Revista Pensar Direito, v.7, n. 1, Jul./2015 que for necessário concretizar o gozo dos direitos legalmente previstos. E, como consequência: sem o pagamento de impostos, e com o recebimento de benefícios, previdenciários ou prestação continuada, vários pacientes conseguem aumentar sua renda familiar, já tão sacrificada pelo tratamento; sem o pagamento de IPTU, da mesma forma conseguem incrementar significativamente o rendimento do lar, aplicando essa economia em insumos básicos para a sobrevivência; com a reconstrução mamária, recuperam o brio, e elevam a auto estima; como o acesso a transporte gratuito, fazem questão não perderem qualquer momento importante do tratamento, recuperando a força de vontade para lutar contra a doença; com a tramitação mais rápida do processo recuperam a confiança. Sem sombra de dúvidas, há uma impacto positivo e determinante da conscientização dos direitos e meios de acesso aos mesmos dos pacientes oncológicos, de modo a elevar, de maneira considerável, a esperança e efetivo êxito no tratamento, e a uma consequentemente melhora na qualidade e aumento na expectativa de vida deles. REFERÊNCIAS 1. ARANTES, Sandra Lúcia; MAMEDE, Marli Villela. Lá participación de las mujeres com cáncer de mama em el momente de escojer el tratamiento : un derecho a ser conquistado. Ver. Latino-Am. Envermagem, Ribeiro Preto, v. 11, n.1, 2003. (Disponível em <http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?script=sci_arttex&pid=S010411692003000100008&Ing=es%nrrm-iso. Acesso em 02 Mar 2009. 2. BARBOSA, Antonieta. Câncer, Direito e Cidadania.12ª edição ampliada e atualizada; São Paulo: Arx, 2007. 3. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Revista de Câncer. 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