DOENÇA BIPOLAR Do Diagnóstico ao Tratamento Evidência Científica/Aspectos Actuais MÓDULO 1 - GENÉTICA DA DOENÇA BIPOLAR Formador: Prof. Doutor António Ferreira de Macedo Professor da Faculdade de Medicina de Coimbra - Instituto de Psicologia Médica - [email protected]) UT3. GENÉTICA MOLECULAR António Ferreira de Macedo 2 Nas duas últimas décadas, os estudos de ligação génica (linkage) e de associação génica, têm sido os métodos mais usados na investigação da genética molecular das doenças psiquiátricas. Os estudos de linkage usam famílias multiplex (i.e. com vários membros afectados), enquanto os estudos de associação usam amostras de afectados não relacionados que são emparelhados e comparados com indivíduos de controlo. Conceptualmente, os estudos de genética molecular podem ser divididos em 2 abordagens: - Posicional – assim designada, porque é determinada a posição (localização cromossómica) dos genes de vulnerabilidade – habitualmente por meio de estudos de linkage. Isto significa que não é necessária nenhuma hipótese ou modelo a priori, em termos da fisiopatologia da doença. Esta abordagem é particularmente atractiva para a investigação de doenças em que o conhecimento fisiopatológico é muito limitado, como é o caso das doenças psiquiátricas. - Gene candidato – nesta abordagem, pelo contrário, o investigador tem que formular hipóteses sobre a fisiopatologia da doença, no sentido de investigar genes específicos (candidatos). Um gene “candidato” é aquele cuja localização cromossómica já foi determinada, cujo produto proteíco é conhecido, que hipoteticamente pode estar envolvido na causalidade da doença e que são investigados por meio de estudos de linkage e associação. Na prática, é frequente que ambas as abordagens sejam combinadas de forma complementar. 1. ESTUDOS DE LIGAÇÃO GÉNICA (LINKAGE) Num dado locus, cada pessoa possui duas cópias (alelos) da seqência de ADN que define esse mesmo locus. Um desses alelos é transmitido pela mãe e outro pelo pai. Para cada um deles a probabilidade de ser transmitido à descendência é igual (i.e. 50%). Agora imaginemos outro par de alelos, noutro locus diferente. Segundo as leis de Mendel, os alelos deste segundo locus são transmitidos de forma independente do primeiro locus. No entanto, no início do século XX, ao mesmo tempo que era “re-descoberta” a genética mendeliana, alguns autores salientavam algumas excepções às leis de Mendel, nomeadamente da segregação independente dos alelos (Bateson e Punnett, 1906). Morgan (1911) © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 3 propôs que durante o processo de crossing-over (ou recombinação) da meiose alguns genes tinham tendência a permanecer juntos, isto é, eram transmitidos conjuntamente e que a frequência de recombinação1 entre dois loci era proporcional à distância física entre eles. Dito de outro forma, quanto mais próximo estiverem dois loci , maior a probabilidade de serem transmitidos em conjunto. A fracção de recombinação - representada pela letra grega Theta (Θ) – traduz a probabilidade de dois loci no mesmo cromossoma serem separados durante a meiose (o que depende da distância física entre eles ). Quando o valor de Θ é pequeno, isso quer dizer que os dois loci estão fisicamente muito próximos e, por isso, a probabilidade de ocorrer recombinação é também pequena. Por exemplo quando Θ = 0.01 (fracção de recombinação de 1%), isso quer dizer que ocorre apenas uma recombinação em cada cem meioses. Se a probabilidade dos loci serem separados por um cross-over é Θ, então (1Θ) representa a fracção segundo a qual não ocorrerá nenhum cross-over e os loci não serão separados (estão ligados – linkage). O limite superior do valor de Θ ocorre quando dois loci recombinam livremente e segregam de forma independente, como se estivessem em dois cromossomas diferentes, o que acontece quando Θ = 0.5. Assim, o valor de Θ varia entre 0 (os loci estão completamente ligados) e 0.5 (os loci estão completamente desligados). A análise de linkage tem como objectivo determinar se dois loci estão ou não ligados e estando - estimar a fracção de recombinação Θ. O princípio de linkage baseia-se na excepção a uma das leis de Mendel, que é a da segregação independente dos genes. Isto é, os alelos, que estão em estreita proximidade física, tendem a permanecer juntos durante a meiose (devido à menor probabilidade de recombinação) e, portanto, serão transmitidos conjuntamente à descendência em sucessivas gerações. O objectivo é investigar a co-segregação, do traço (doença) e de marcadores genéticos específicos, no seio das famílias. Assim, se se verificar a co-segregação de um marcador (cuja localização genómica é por nós conhecida) com a doença, existe uma probabilidade de existir um gene alterado próximo do marcador . 1 A frequência de recombinação de 1% é equivalente a uma unidade de “distância” no genoma (actualmente designada por centimorgan - cM), que corresponde a um milhão de pares de bases nucleotídeas © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 4 Na análise de linkage, estima-se a probabilidade da segregação entre dois loci ter surgido por estes estarem ligados (Θ <0.5) versus a probabilidade da segregação observada ter sido apenas devido ao acaso, isto é, não haver linkage entre os dois loci (Θ = 0.5). Calcula-se um odds ratio 1 das verosimilhanças (likelihoods) destas duas hipóteses, linkage (com um Θ específico) vs não-linkage (Θ = 0.5): Pelas regras das probabilidades, os valores dos odd ratios, obtidos em diferentes heredogramas, poderiam ser multiplicados em conjunto para obter um odds ratio global, baseado em toda a informação disponível. No entanto, é habitual utilizar o logaritmo (de base 10) do odds ratio de cada família, sendo depois os valores das diferentes famílias adicionados, em vez de multiplicados. Este logaritmo do odds ratio, contitui o designado LOD score (Θ)2 - valor que suporta a nossa estimativa de Θ, pelo método das verosimilhanças (likelihoods). O maior valor de Θ obtido corresponderá ao valor mais provável de Θ. Classicamente, convencionou-se que um valor de LOD score superior a 3 (i.e., uma odds de 1000:1 em favor da hipótese de linkage vs. não-linkage) era o critério da existência de linkage entre dois loci, valores de LOD score <-2, constituíam prova da inexistência de linkage e valores entre os dois extremos eram considerados como inconclusivos. Actualmente, para efectuar estes cálculos existem numerosos pacotes de softaware, como por exemplo o GeneHunter. Mais recentemente, Lander e Kruglyak (1995) propuseram novas directrizes para a interpretação dos resultados dos estudos de linkage de rastreio do genoma, com três níveis de confiança: (1) Linkage sugestivo – refere-se à evidência estatística de encontrar um resultado positivo, por acaso, num rastreio do genoma (para o método sib-pair, existe sugestão de linkage para p< 0.0007; para o método de LOD score, o valor é de p<0.017). (2) Linkage significativo – refere-se à evidência de encontrar 0.05 vezes um resultado positivo devido ao acaso, num rastreio do genoma (para o método sib-pair, existe sugestão de linkage para p< 0.00002; para o método de LOD score, o valor é de p<0.000049). 2 O LOD score é um método estatístico para verificar se dois loci estão ou não em ligação. Consiste no logaritmo de base 10 da probabilidade de existir ligação, sobre a probabilidade de não existir. Tradicionalmente, considera-se que um LOD score > 3 é significativamente sugestivo de existir ligação e < -2 é indicativo de exclusão de ligação © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 5 (3) Linkage confirmado – requer um valor de linkage significativo num rastreio do genoma, depois confirmado numa amostra independente. Na metodologia dos estudos de linkage podem ser adoptadas duas grandes estratégias: (1) Abordagem do gene candidato - tem por objectivo estudar a ligação de marcadores conhecidos em regiões cromossómicas, que contenham genes putativamente relacionados com a possível fisiopatologia do distúrbio em estudo; por exemplo, os genes para vários receptores dos neurotransmissores como os dopaminérgicos, serotoninérgicos, GABAérgicos, do glutamérgicos, etc. (2) Rastreio do genoma - é testado um grande número de marcadores, espaçados ao longo de todo o genoma, colocados a uma distância tão próxima quanto possível (por exemplo,1-2 cM). Os enormes avanços das técnicas de mapeamento do genoma, tais como um número sempre crescente de milhares de marcadores disponíveis, que podem "saturar" o genoma a pequenas distâncias, determinaram nos últimos anos, a preferência por esta abordagem. RESULTADOS DOS ESTUDOS DE LINKAGE RECEPTORES DOPAMINÉRGICOS CATECOLAMINÉRGICOS E OUTROS GENES Apesar de também ter sido sugerida uma disfunção dopaminérgica, no distúrbio bipolar, os estudos de linkage com genes candidatos deste sistema, não evidenciaram resultados relativamente ao receptor D1 (Mitchell et al., 1992), D2 (Byerley et al., 1990; Holmes et al., 1991; Mitchell et al., 1992; Ewald et al., 1994), D3 (Mitchell et al., 1993) e D4 (Sidenberg et al.,1994). Outro gene candidato, é o da dopamina beta-hidroxilase (DBH), enzima necessária à conversão de dopamina em noradrenalina e localizado no cromossoma 9 (9q34), que também não mostrou evidência de linkage com a doença bipolar (Ewald et al., 1994b). SISTEMA GABA As alterações na neurotransmissão GABAérgica, têm sido implicadas na patogénese da doença bipolar. Os doentes bipolares, em estado de eutimia e sem medicação, apresentam níveis de GABA plasmáticos, e no liquído cefaloraquídeo, diminuídos em relação aos controlos normais (Berrettini et al., 1982), sugerindo que os níveis diminuídos de transmissão GABAérgica possam © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 6 precipitar episódios de doença bipolar. Por outro lado, visto que o GABA constitui o neurotransmissor inibitório mais importante, é possível que alterações da transmissão GABAérgica, possam causar perturbações noutras vias neurotransmissoras (por exemplo, as moduladas pela serotonina, dopamina e noradrenalina) que têm sido implicadas na patogénese da doença bipolar. Coon et al. (1994) investigaram a hipótese de linkage com vários dos genes dos receptores GABA, com resultados negativos CROMOSSOMA 1 Detera-Waldeigh et al. (1999) e Gurling et al. (2001) relataram resultados de linkage com a doença BP, no braço longo do cromossoma 1 (1q32). CROMOSSOMA 3 Kelsoe et al.(2001) reportaram um resultado sugestivo de linkage da doença BP com o marcador D3S2398 na região 3q27. Entretanto, veio a verificar-se que esse marcador não está localizado em 3q27, mas sim 3q29. Um aspecto interessante que é saliente, nas revisões recentes de epidemiologia/genética molecular é o grau de sobreposição nos achados da genética da esquizofrenia e da doença BP. O estudo de Schosser et al. (2004), é disso exemplo ao evidenciar um resultado de linkage desta zona (3q29), quer com a esquizofrenia, quer com a doença BP. CROMOSSOMA 4 Na região 4p16, vários autores relataram valores de linkage sugestivos ou significativos (Blackwood et al.,1996; Detera-Wadleigh et al., 1999). A análise do braço longo (4q) revelou algum evidência de linkage, embora mais fraca que na região 4p. O estudo de Adams et al. (1998), reportou na região 4q35, um lod score máximo de 3.19, numa única família. No entanto, ao serem incluídas mais 10 famílias o lod score caiu para 2.03. Dois outros estudos (Friddle et al., 2000; Willour et al., 2001) forneceram algum suporte para o envolvimento desta região, com valores de lod score de 2.11 e 2.7, respectivamente. CROMOSSOMA 5 O cromossoma 5q foi durante vários anos, uma área de interesse para a esquizofrenia e mais recentemente mostrou igualmente poder estar ligada à doença BP (Paunio et al., 2001; Gurling et al., 2001). Associações ou linkage © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 7 com a doença BP, foram reportados na região5q31-33 em populações geneticamente isoladas, nomeadamente da Costa Rica, Quebeque e Japão (Hong et al., 2003; Shink et al., 2002; Ohtsuki et al., 2002) CROMOSSOMA 6 Um primeiro estudo de Ewald et al. (2002), identificou um sinal de linkage em 6q, com um LOD score máximo 2.59. Posteriormente, Dick et al. (2003), num estudo com 250 famílias com doença BP, reportaram um LOD score máximo de 3.61 no cromossoma 6q. A análise combinada do estudo colaborativo de genética da doença BP do NIMH relata um LOD score de 3.8, o que atinge a significância estatística. Na nossa investigação, um estudo com 16 famílias bipolares, revelou igualmente um linkage em 6q, com um valor de NPL de 3.06, no marcador D6S1639 (Pato et al., 2004). CROMOSSOMA 8 O interesse no cromossoma 8 resultou dos achados de dois rastreios do genoma (Cichon et al., 2001; Ophoff et al., 2002). No estudo de Cichon et al. (2001) , foram identificados duas regiões, uma em 8q e outra em 8p, sendo a primeira a que apresentava o maior valor de lod score (3.62), embora dois marcadores em 8p também mostrassem valões de lod score interessantes (2.3 e 1.67). Uma evidência de linkage na região 8q, embora menos forte, surgiu no estudo de Friddle et al (2000), com um lod score máximo de 2.39. O cromossoma 8p também foi associado à esquizofrenia, em vários estudos, nomeadamente um estudo da Islândia que é um isolado genético, à semelhança do vale centra da Costa Rica. Este facto sugere que esta região 8p, possa constituir outra zona cromossómica, na qual se localiza um gene de vulnerabilidade para a psicose em geral, mais do que especificamente ligado à doença BP. CROMOSSOMA 10 Foroud et al. (1998) reportaram um resultado positivo no cromossoma 10p, com um LOD score máximo de 2.5 no locus D10S1423. Nessa zona, vários outros autores encontraram resultados positivos, na esquizofrenia (Faraone et al., 1998; Straub et al., 1998; Schwab, et al., 1998). O estudo de Cichon et al. (2001) chamou a atenção para outra zona do comossoma 10, esta outra localizada no braço longo (10q25-q26), onde obtiveram um LOD score de 2.86. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 8 CROMOSSOMA 11 Um dos estudos que, na altura da sua publicação, gerou grande expectativa, foi o de Egeland et al. (1987) realizado na população Amish, no sul da Pennsylvania. Os autores relataram a existência de linkage (LOD score de 4.9) entre o distúrbio BP e dois marcadores na região 11p15 (oncogene Harvey-ras1-HRAS e o gene para a insulina). Estudos subsequentes efectuados em várias regiões do globo, com marcadores na mesma região, foram incapazes de replicar os resultados obtidos por Egeland e colaboradores (Hodgkinson et al., 1987; Gill et al., 1988; Detera-Wadleigh et al., 1987;). No cromossoma 11 (11p15.5) também se encontra um locus de potencial interesse para os distúrbios psiquiátricos: o da Tirosina Hidroxilase (TH), importante enzima da via metabólica da dopamina. No entanto, vários estudos de linkage efectuados entre a doença afectiva bipolar e este locus, com famílias europeias (Mendlewicz et al., 1991; Ewald et al., 1994a), australianas (Mitchell et al., 1991) e americanas (Pauls et al., 1991), não revelaram evidência de linkage. CROMOSSOMA 12 Craddock et al. (1994) relataram a co-ocorrência de doença bipolar com uma doença dermatológica rara, a doença de Darier, cujo locus foi mapeado no cromossoma 12 (12q23-q24.1) e que tem um padrão de transmissão dominante de penetrância completa e dependente da idade. Nessa mesma região, usando famílias de um isolado genético∗ do Quebeque, Shink et al. (2005) reportaram um lod score máximo de 3.35. CROMOSSOMA 13 No cromossoma 13, região 13q32, foram encontrados resultados significativos (Detera-Wadleigh et al., 1999), que sugerem mais um locus de susceptibilidade para a doença BP, numa zona sobreponível à relatada para a esquizofrenia (Blouin et al., 1998; Brzustowicz et al., 1999). ∗ A utilização de populações de isolados genéticos, visa reduzir o problema da heterogeneidade genética, concentrando a investigação em famílias/populações que são mais homgéneas do ponto de vista genético. Habitualmente são populações resultantes de um pequeno número de fundadores e que por razões geográficas ou outras – por exemplo, religiosas no caso da população Amish – ficam relativamente isoladas durante várias gerações não se “misturando” com outras populações. Essa é a principal razão pela qual grande parte da amostra dos nossos estudos provem da região autónoma dos Açores e também Madeira. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 9 CROMOSSOMA 18 O cromossoma 18 é porventura, aquele em que se tem acumulado evidência mais consistente de existir um ou mesmo 2 loci de vulnerabilidade, para a doença BP. O primeiro relato de linkage partiu do estudo de Berrettini et al. (1994) que identificaram uma região de interesse perto da zona centromérica do cromossoma 18, resultados replicados pelo mesmo grupo em 1997 numa extensão das mesmas famílias (Berrettini et al., 1997) e que foram confirmados por outros (Craddock et al., 1995; Foroud et al., 1995). Stine et al. (1995) não só replicou este resultado, na região 18p11, como também identificou linkage em outra área do cromossoma 18 (18q21), o que veio a ser confirmado por outros (Bruyn et al., 1995; Freimer et al. , 1996). Vários genes nessas regiões candidatas foram examinados, tais como os genes da proteína G golf alfa e mioinositol monofosfatase, mas sem resultados conclusivos. CROMOSSOMA 21 O primeiro relato de linkage com a doença BP, no cromossoma 21 resultou de um rastreio parcial do genoma efectuado em 47 famílias, por Straub et al. (1994). O LOD score máximo reportado foi de 3.41, na região 21q22.3 no locus PFKL, achado confirmado por outros autores (Detera-Wadleigh et al., 1999). CROMOSSOMA 22 Vários autores (Lachman et al., 1996; Kelsoe et al., 1998), relataram um resultado positivo na região do síndrome velo-cardio-facial; um distúrbio congénito caracterizado por fenda palatina, malformações cardíacas, dificuldades de aprendizagem e uma aparência facial típica, bem como psicose de tipo esquizofrénico. Esta é a zona onde também se localiza o gene da catechol-omethyltransferase (COMT) e onde foram reportados resultados de linkage , na esquizofrenia. CROMOSSOMA X A hipótese da transmissão da psicose maníaco-depressiva (PMD) através de um gene no cromossoma X já tinha sido levantada, há numerosas décadas, por Rosanoff et al. (1934). Num dos primeiros estudos a relatar a existência de linkage com a doença BP (Mendlewicz e Fleiss, 1974), os autores também notaram que, em algumas famílias, a transmissão da doença BP parecia obedecer a um padrão ligado ao cromossoma X. Adicionalmente, a doença BP © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 10 parecia segregar com a cegueira para cores e o défice de glicose 6 fosfatodesidrogenase (G6PD). Os dados existentes relativamente ao cromossoma X são contraditórios, na medida em que alguns estudos revelaram um linkage positivo entre o distúrbio BP e marcadores na região Xq27-28 e outros não. No entanto, o interesse no cromossoma X como potencial região de linkage com a doença BP. Pelo menos dois grupos reportaram linkage com a região Xq24-27, com um lod score máximo de 3.9 (Mendlewicz et al., 1987; Pekkarinen et al., 1995). Como se pode ver no quadro seguinte, outras regiões cromossómicas, para além das atrás referidas, têm sido ligadas à doença BP, embora algumas de forma menos consistente. Quadro III.1 - . Principais regiões de linkage para a doença bipolar Região Cromossómica Autores 1q Detera-Waldeigh et al., 1999; Gurling et al., 2001 4p Blackwood et al., 1996; Ewald et al., 1998; Nothen et al., 1997 4q Adams et al 1998., Friddle et al, 2000, Willour et al., 2001 5q Hong et al.2003, ; Shink et al., 2002; Ohtsuki et al., 2002 6p Ginns et al, 1996; Maziade et al., 2001 6q Middleton et al., 2004; Pato et al., 2005 8p Cichon et al., 2001; Ophoff et al., 2002; Friddle et al., 2000 8q Cichon et al., 2001; Ophoff et al., 2002; Friddle et al., 2000 13q Detera-Waldeigh et al., 1999 18p Berretini et al.1994; Stine et al., 1995; Freimer et al., 1996; Coon et al., 1996 18q Stine et al., 1995; Freimer et al., 1996 21q Straub et al., 1994; Smyth et al., 1997 22q Carlson et al., 1997; Kelsoe et al., 2001 Xq Mendlewicz et al., 1987; Pekkarinen et al., 1995 © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 11 2. ESTUDOS DE ASSOCIAÇÃO GÉNICA Embora os estudos de linkage tenham tido bastante sucesso em identificar os genes implicados em doenças monogénicas, a sua eficácia na identificação de genes de pequeno efeito, como os que estão envolvidos na vulnerabilidade para as doenças psiquiátricas, é mais limitada - a hipótese de mapear com êxito os loci responsáveis é inversamente proporcional ao número de genes envolvidos na vulnerabilidade para a doença. Esse facto deve-se a vários factores, nomeadamente à possibilidade de heterogeneidade genética, isto é, em diversas populações a doença poder resultar de diferentes constelações de genes e à própria natureza poligénica da doença, isto é, estarem envolvidos vários genes (cada um apenas contribui com um pequeno efeito). Assim, para o estudo de traços complexos, uma estratégia complementar aos estudos de linkage tem sido a utilização dos estudos de associação génica. Enquanto os estudos de linkage procuram padrões de co-segregação entre um marcador e uma doença, em famílias, nos estudos de associação, o que se procura é uma associação estatisticamente significativa entre um alelo marcador e a doença, a nível populacional (Jones e Craddock, 2001). Os estudos de associação têm, relativamente aos métodos de linkage, a vantagem de constituir um método mais adequado para descobrir genes de efeito cumulativo, isto é, genes que contribuem aditivamente, mas em que nenhum, individualmente, é suficiente para a sua expressão ("genes de pequeno efeito"). Tipos de métodos de associação: Método “clássico” – estudo casos vs. controlos. A vantagem é que a as amostras são relativamente fáceis de conseguir.Uma das desvantagens deste método é a sua elevada sensibilidade ao efeito de "estratificação da população - EP". A EP ocorre quando uma população consiste em 2 ou mais estratos, misturados, tais como grupos étnicos distintos. Se os estratos diferirem na frequência de determinado alelo (ou na prevalência da doença em estudo) podem ocorrer associações espúrias. Métodos family-based – dado que os métodos clássicos de associação são sensíveis ao efeito de "estratificação da população", foram criadas novas metodologias de associação, como por exemplo o método HRR (Haplotype Relative Risk) e o TDT (Transmission Disequilibrium Test). No HRR a © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 12 associação é testada em famílias nucleares, i.e. os pais e um descendente afectado (trios), "construindo-se" um genótipo artificial com os alelos parentais não transmitidos, o qual é usado como controlo, para comparação com os genótipos dos descendentes afectados. O TDT, utiliza famílias nucleares com um descendente afectado e pelo menos um progenitor heterozigótico para o alelo marcador. Esta estratégia avalia a transmissão do alelo marcador do progenitor para o descendente afectado, comparando o número de vezes que os progenitores transmitem o alelo associado vs. o alelo alternativo. O que é que quer dizer uma associação positiva?: Assumindo que o efeito de estratificação da população não está a causar uma falsa associação, existem 2 causas para uma verdadeira associação positiva: (1) Envolvimento directo do polimorfismo na fisiopatologia da doença (2) Existência de Desiquilíbrio de Ligação (linkage disequilibrium) – quando uma mutação causadora de uma doença, surge num membro de determinada população, ocorre no contexto de um conjunto específico de outros alelos, noutros loci do mesmo cromossoma. À medida que essa mutação vai sendo transmitida às gerações subsequentes, o fenómeno de recombinação meiótica determina uma “mistura” dos vários alelos até ocorrer um linkage equilibrium. Isto ocorre quando o conjunto de alelos noutros loci perto da mutação, não diferir dos cromossomas que não possuem a mutação. A taxa a que o equilíbrio é alcançado depende da distância entre o marcador e o locus da doença, requerendo um grande número de gerações quando essa distância é pequena (i.e. marcador e locus da doença estão muito próximos). ESTUDOS DE ASSOCIAÇÃO COM GENES CANDIDATOS Nesta abordagem, opta-se por investigar determinados genes que são seleccionados a priori baseados na hipótese de poderem estar envolvidos na fisiopatologia para a doença BP. Naturalmente, o sucesso desta abordagem depende da escolha de “bons candidatos”, o que por sua vez depende do nível de conhecimento da fisiopatologia da doença. No caso da doença BP, como a fisiopatologia é em grande parte desconhecida, os genes candidatos têm sido escolhidos focando a atenção nos sistemas neurotransmissores influenciados pelas medicações empregues no controlo da doença, isto é os sistemas dopaminérgico, serotoninérgico, noradrenérgico ou ainda genes enzimáticos ou metabólicos. Outro modo pelo qual têm sido seleccionados genes candidatos é usando a informação citogenética, isto é, genes localizados em zonas de delecções ou translocações cromossómicas que segregam com a doença BP. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 13 Relativamente aos resultados dos estudos de associação, respeito os aos principais genes do resultados dizem Transportador da Serotonina (5-HTT), COMT e MAO A. Transportador da Serotonina: O gene do Transportador da Serotonina (5-HTT), localizado no cromossoma 17 (17q), despertou especial interesse como candidato na doença afectiva, na medida em que diz respeito ao local de ligação dos anti-depressivos inibidores da recaptação da serotonina, os quais são eficazes no tratamento da depressão bipolar, mas também susceptíveis de precipitar episódios maníacos. Dois estudos iniciais, reportaram uma associação positiva entre um polimorfismo do 5-HTT, quer com a doença UP, quer com a doença BP (Ogilvie et al., 1996; Battersby et al., 1996). No entanto o polimorfismo mais estudado é o de inserção/delecção da região promotora do gene (i.e. uma versão longa/curta do gene). O alelo curto do gene 5-HTT resulta numa reduzida transcrição do transportador da serotonina e diminuída recaptação da serotonina, nos linfoblastos, em comparação com a versão longa. Estas diferenças funcionais levaram à hipótese que este gene possa estar envolvido na vulnerabilidade para a doença afectiva, nomeadamente BP. De facto, vários estudos relataram uma associação positiva entre a doença BP e o polimorfismo da região promotora do gene (Collier et al., 1996; Rees et al., 1997; Kirov et al., 1999). No entanto, também há vários estudos que não replicaram esta associação (Stober et al., 1996; Esterling et al., 1998). Esse facto significa uma de duas hipóteses: (1) o gene 5-HTT está implicado na vulnerabilidade de alguns indivíduos, mas não noutros, (i.e. a variação dos resultados entre estudos é devida a heterogeneidade genética) ou (2) os achados positivos são espúrios. Sistema Dopaminérgico Relativamente à associação entre a doença BP e os receptores da dopamina, os resultados foram negativos com os genes dos receptores D1 e D2 (Nöthen et al., 1992), com o receptor da dopamina D4 (Oruc et al., 1997), o gene do receptor D3 e o gene do Transportador da Dopamina (Gómez-Casero et al. , 1996). Parsian et al. (1995) num estudo com o método de HRR, apresentaram uma associação positiva entre o D3 e a doença BP, o qual não foi replicado. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar 14 António Ferreira de Macedo Assim, não existe nenhunma evidência significativa para o envolvimento dos genes dos receptores dopaminérgicos na doença BP. Catechol-O-methyl transferase (COMT) A COMT está envolvida no metabolismo das monoaminas (degradação das catecolaminas, com um papel particular no metabolismo cortical da dopamina ). O gene está localizado na região 22q11, implicada em vários estudos de linkage e associada ao síndrome velocardiofacial. Uma meta-análise de 13 estudos de associação com a COMT, na doença BP, fornece algum suporte para a hipótese do alelo de baixa actividade estar associado a um aumento de vulnerabilidade para a doença BP (Craddock et al., 2001) MAO A A monoaminoxidase A (MAO-A) catalisa a degradação oxidativa das aminas, incluindo noradrenalina, dopamina e serotonina, sendo por isso, mais um gene candidato plausível na doença BP. Duas meta-análises (Furlong et al., 1999; Preisig et al., 2000) forneceram algum suporte para a associação de polimorfismos da MAO-A, com a doença BP. Como se pode ver no Quadro III.2, têm sido usados muitos outros genes candidatos para estudos de associação com a doença BP, na maioria dos quais não há evidência significativa de associação. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar 15 António Ferreira de Macedo Quadro III.2 – Genes candidatos investigados em estudos de associação da doença BP (adapt de Jones e Craddock, 2001) ESTUDOS DE ASSOCIAÇÃO COM CANDIDATOS POSICIONAIS Ao contrário da abordagem “clássica” do gene candidato, no caso dos candidatos ditos posicionais não é colocada qualquer hipótese teórica a priori. Aqui, a “candidatura” resulta do facto de, nos estudos de linkage, surgirem resultados sugestivos ou significativos em determinados áreas. Posteriormente são identificados os genes presentes nessas regiões genómicas, os quais são usados em estudos de associação. Esta abordagem tem sido bastante profícua no caso da esquizofrenia e nos últimos 2 -3 anos foram identificados vários genes que mostraram uma associação positiva à esquizofrenia. Dado o facto dos resultados de linkage terem sugerido várias áreas de sobreposição na esquizofrenia e doença BP (Quadro III.3), o que levanta a hipótese de uma vulnerabilidade genética comum, pelo menos em parte, para a psicose, surgiu o interesse de estudar os genes candidatos posicionais localizados nessas zonas, quer na esquizofrenia, quer na doença BP. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 16 Quadro III.3 - . Estudos de linkage na esquizofrenia e distúrbio afectivo bipolar – regiões comuns Loci Estudos 3q29 Kelsoe et al, 2001; Schosser et al., 2004 10p14 Foroud et al, 2000; Faraone et al, 1998; Straub et al., 1998 Schwab et al, 1999 13q32 Kelsoe et al, 1998; Detera-Waldeigh et al, 1999; Lin et al, 1997 Blouin et al, 1998; Brzustowicz et al, 1999 10p14 Foroud et al, 2000; Faraone et al, 1998; Straub et al., 1998 Schwab et al, 1999 18p11 Berrettini et al, 1994; Stine et al, 1995; McKinnon et al, 1998 Nothen et al, 1999; Turecki et al, 1999; Lin e Bale, 1997 Schwab et al, 1998 22q11-13 Lachman et al, 1996; Edenberg et al, 1997; Kelsoe et al, 1998 Gill et al, 1996; Levison et al., 1996; Moldin, 1997 BRAIN DERIVED NEUROTROPHIC FACTOR - BDNF O BDNF é um gene, localizado em 11p13, que tem suscitado algum interesse, na medida em que é um factor de crescimento neuronal relativamente ao qual existe alguma evidência de que desempenha um papel importante nos mecanismos de adaptação neuronal ao stresse e na resposta aos antidepressivos (Smith et al., 1995). Os tratamentos anti-depressivos (incluindo a electroconvulsivoterapia) induzem a produção de neurotrofinas (particularmente BDNF), o que sugere que a produção desses factores possa estar deficiente, durante a depressão. Os modelos animais sugerem que o BDNF promove, em ratos, a função e crescimento de neurónios serotoninérgicos (Mamounas et al., 1995). Em rigor, este não é um gene candidato posicional, no sentido atrás referido. Isto é, não resultou de se ter verificado uma sobreposição de achados de linkage na esqizofrenia e doença BP. No entanto, existem resultados positivos de associação com as duas doenças (BP - Neves-Pereira et al., 2002; Esquizofrenia – Muglia et al., 2003), o que faz dele um possível gene comum da psicose. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 17 G72 (e DAAO) O gene G72, localizado em 13q22-34, foi incialmente associado à esquizofrenia (Chumakov et al., 2002), achado que depois foi replicado noutros estudos (Schumacher et al., 2004; Zou et al., 2004). O produto deste gene, interage com uma proteína (D-aminoacid oxidase – DAAO), codificada por um gene localizado no cromossoma 12 (12q24). Por sua vez, a DAAO está envolvida no metabolismo da D-serina, que é uma agonista do sítio modulador da glicina, no receptor glutamatérgico NMDA (Mohet et al., 2000). Na doença BP, foi igualmente reportada uma associação positiva com o gene G72 (Chen et al., 2004), o que faz deste gene mais um candidato possível da vulnerabilidade comum para a psicose. NEUROREGULINA 1 – NRG1 O grupo islandês deCODE Genetics relatou uma associação significativa entre a esquizofrenia e um gene localizado na região 8p21-22 (NRG1), onde já tinham sido obtidos resultados positivos de linkage (Stefansson et al., 2002). Essa associação foi posteriormente confirmada numa população escocesa (Stefansson et al., 2003) e por outros grupos (Williams et al., 2003; Yang et al., 2003; Tang et al., 2004; Corvin et al., 2004; Li et al., 2004; Zhao et al., 2004). A NRG1 faz parte de uma família de genes (NRG1-4) que a nível do SNC desempenham diversas funções. A NRG1 interage com os receptores membranares de tipo ErbB, nos neurónios pós-sinápticos pou células gliais. Essa interacção NRG1-ErbB leva a uma dimerização do receptor, fosforilação da tirosina e activação de vias de sinalização a jusante. Os efeitos funcionais da NRG1 incluem funções neuronais e gliais que estão implicadas na esquizofrenia, desde o neurodesenvolvimento (eg migração neuronal, direccionamento do axónio, sinaptogéne, diferenciação glial, mielinização), à neurotransmissão e plasticidade sináptica (eg recrutamento de receptores NMDA 2c, subunidade b2 GABA e receptores colinérgicos 5 e 7). O risco genético para a esquizofrenia associado à NRG1, é provavelmente mediado por alterações que têm consequências no neurodesenvolvimento e plasticidade neuronal. Mais recentemente, o estudo de Green et al. (2005) também estabeleceu uma associação positiva entre a doença BP e o gene NRG-1, o que faz deste último, mais um candidato possível para a vulnerabilidade comum entre a esquizofrenia e doença BP. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 18 3. ESTUDOS DE EXPRESSÃO GÉNICA Os estudos de expressão génica constituem o nec plus ultra da tecnologia de ponta da genética molecular, combinando os desenvolvimentos da informática com a biologia molecular. Estas novas tecnologias, tais como os DNA microarrays1 têm suscitado um grande interesse, na medida em que um simples chip de ADN pode medir a actividade (expressão) de vários milhares de genes, em simultâneo. Isto constitui um passo de gigante que nos permite passar dos estudos “um gene de cada vez,” para estudos em que a actividade de vários milhares de polimorfismos pode ser monitorizada. O DNA microarray é constituído por uma colecção de manchas (spots) numa superfície sólida (frequentemente uma lâmina de vidro) distribuídas em filas e linhas de modo a que a localização (e identificação) individual de cada spot seja fácil.. Dependendo do tipo, os spots podem conter sequências de ADN (microarrays génicos), fragmentos de tecidos (microarrays de tecidos) ou proteinas (microarrays de proteínas). O princípio subjacente ao DNA microarray é o princípio básico do próprio ADN a complementaridade dos nucleótidos – i.e. a hibridização ou emparelhamento de bases (A-T e G-C para o ADN; A-U e G-C para o ARN). O dogma central da genética postula que o ADN genómico é transcrito em ARNm, o qual é depois traduzido em proteína. Os microarrays monitorizam o transcriptoma, isto é, o conjunto de ARNm de uma célula (a quantidade de ARNm na célula representa a transcrição do gene, isto é a expressão do gene – só os genes activos são transcritos). O fundamento do método é que a partir da quantidade de ARN mensageiro que é transcrito do ADN (i.e. dos genes), em determinado tecido ou partes dele (e.g. sistema nervoso central) pode inferir-se a actividade (expressão) de muitos genes (até vários milhares) e caracterizar os perfis de expressão génica desses mesmos tecidos/órgãos. No caso que nos interessa, isto é a identificação de genes de vulnerabilidade para as doenças mentais, o que se pretende é comparar a expressão de determinados genes em amostras de tecidos de doentes vs. Controlos e verificar se determinados genes têm maior ou menor expressão nos doentes em comparação com os controlos. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar António Ferreira de Macedo 19 Os estudos de expressão génica, podem vir a assumir um papel relevante em diversas vertentes: 1. Identificação de genes de vulnerabilidade para a doença (neste caso da doença BP) 2. Diagnóstico (quando os genes de vulnerabilidade forem descobertos, pode ser desenhado um chip diagnóstico) 3. Terapêutica (quer no desenho de novos fármacos; quer na farmacogenética – predição da resposta e tolerabilidade a determinado fármaco) Na investigação da esquizofrenia e doença bipolar são ainda relativamente poucos, os estudos de expressão génica. A comparação entre o tecido cerebral de doentes esquizofrénicos e/ou bipolares e controlos tem revelado algumas diferenças, nomeadamente na expressão de genes relacionados com os oligodendrocitos, uma diminuição da expressão de vários genes responsáveis pela mielinização, havendo alguma sobreposição de achados para o que acontece nos doentes esquizofrénicos (Hakak et al., 2001; Sugai et al., 2004). No estudo de Tkachev et al. (2003), os autores analisaram a expressão genica no córtex pré-frontal de doentes com esquizofrenia, doença BP e controlos, tendo encontrado uma diminuição da expressão de genes relacionados com os oligodendrócitos e a mielina, tais como o myelin-associated glycoprotein (MAG), myelin oligodendrocyte glycoprotein (MOG), oligodendrocyte-specific protein (CLDN11). Estes dados sugerem que, tanto na esquizofrenia, como na doença BP, pode existir uma disfunção dos oligodendrócitos e, consequentemente dos processos de mielinização. A síntese de mielina é a base para a rápida condução de impulsos nervosos no SNC, havendo uma evidência crescente que os oligodendrócitos também desempenham um importante papel trófico. O significado destes achados aguarda outras confirmações, sendo ainda pouco claro como se “encaixam” na fisiopatologia das psicoses. O que é interessante verificar é que a maior parte dos achados destes estudos de expressão génica, têm-se mostrado sobreponíveis na esquizofrenia e doença BP. Isso também acontece no estudo de Iwamoto et al. (2005), que reporta uma diminuição da expressão de genes relacionados com as mitocôndrias, em ambas as doenças. © 2006 Vale & Vale Eds, Lda. Doença Bipolar