Indecisos que não sabem que já decidiram

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Eleições: Indecisos que não sabem que já decidiram
Imagine que você tenha que tomar uma decisão no futuro próximo como votar em um candidato a
prefeito. Será que é possível que seu cérebro já tenha decidido qual será seu voto apesar de você
ainda estar indeciso? Em outras palavras, é possível que você não tenha consciência de uma
decisão que seu cérebro já tomou? É exatamente isto que foi demonstrado recentemente.
Você acabou de ler a palavra “Porco” e a imagem do animal “apareceu” na sua consciência. Mas
nos milissegundos que separam o instante em que a imagem das letras atingiu sua retina e o
instante em que a imagem do animal apareceu na sua consciência muita coisa aconteceu no seu
cérebro: a retina processou a imagem e a transferiu para o córtex visual. Este identificou a palavra
e chamou de sua memória a imagem do animal, seu cheiro ou mesmo o seu gosto. Estes
processos ocorreram sem que você tivesse consciência deles. Após alguns milissegundos o
resultado destes processos fez com que você tivesse consciência do que havia lido. Imagine um
observador capaz de observar as atividades que ocorrem em seu cérebro em tempo real. Ele seria
capaz de prever que um “porco” iria aparecer na sua consciência antes de você ter consciência do
que havia lido. Isto permitiria a ele prever, com alguns milissegundos de antecedência, o seu
pensamento. Neste novo experimento os cientistas foram capazes de fazer exatamente este tipo de
predição, mas com uma antecedência de alguns dias.
No final de 2007 a polêmica em Vicenza (Itália), era o plebiscito que decidiria sobre o aumento
de uma base militar dos EUA na cidade. Cientistas estudaram 129 pessoas. Elas foram
questionadas se eram a favor ou contra, depois submetidas a uma entrevista detalhada sobre os
motivos de sua decisão ou indecisão. Os indecisos foram submetidos a um teste no qual são
mostradas, por um curto espaço de tempo, e em rápida sucessão, centenas de imagens em uma
tela de computados. Ao ver cada imagem a pessoa deve apertar o botão de bom/positivo ou
ruim/negativo. Neste teste as imagens são mostradas tão rapidamente que é impossível fazer
decisões conscientes e a pessoa é forçada a responder automaticamente (é o que ocorre quando
saltamos de susto ao ver uma cobra; a reação não passa pela consciência). Apesar das pessoas não
perceberem conscientemente, entre as centenas de imagens estavam imagens relacionadas ao
aumento das bases militares. Analisando os resultados os pesquisadores classificaram as pessoas
que se declaravam indecisas em dois grupos, os que associavam instintivamente as imagens
militares ao ruim/negativo e os que associavam estas imagens ao bom/positivo. Algumas semanas
depois, logo após o plebiscito, cada pessoa foi entrevistada para se determinar como havia
votado. O resultado é impressionante. Entre as pessoas que se declararam indecisas, os testes de
associação automática de imagens foi capaz de prever com mais de 99% de certeza como eles
votaram dias depois. Isto sugere que no cérebro destas pessoas, apesar delas conscientemente se
acharem indecisas, já estava determinado de que maneira elas iriam votar. Elas não sabiam que
seu inconsciente já havia decidido porque a decisão não havia se cristalizado na consciência. O
interessante é que entre as pessoas que se declararam decididas os testes de associação foram
pouco informativos, como se o cérebro já tivesse terminado o processo de decisão, entregado o
resultado à consciência, e apagado os rastros de sua atividade.
Esta pesquisa, além de exemplificar o pouco acesso de nossa consciência aos processos cerebrais
que “criam” os pensamentos conscientes, abre uma série de possibilidades práticas com
implicações morais complexas. Será que deve ser permitido aos órgãos de pesquisa de opinião
“medir” o que ocorre no inconsciente de eleitores que se declaram indecisos?
Mais informações em: Automatic mental associations predict future choices of undecided
decision-makers. Science vol. 321 pag. 1100 2008
Fernando Reinach ([email protected])
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