- Projeto Andar de Novo

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Ciência
06 de Novembro de 2013
Neurociência
Laboratório de Nicolelis faz macacos controlarem o movimento
de dois braços virtuais só com o pensamento
Capacidade de mover dois membros virtuais ao mesmo tempo deve ajudar no desenvolvimento
de novas interfaces cérebro-máquina, como o exoesqueleto que o neurocientista pretende
demonstrar na abertura da Copa do Mundo
Por Guilherme Rosa
A pesquisa de Miguel Nicolelis mostrou que os movimentos do corpo são criados a partir da
atividade de um grande conjunto de neurônios. Nesse estudo, foi necessário o registro de
mais de 500 — o maior número analisado até hoje (Gilberto Tadday)
Em um novo estudo divulgado nesta quarta-feira, pesquisadores descrevem como conseguiram fazer com que
macacos aprendessem a usar apenas a mente para controlar o movimento de duas mãos virtuais, exibidas na tela de
um computador. O feito foi atingido por uma equipe de cientistas liderada pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis,
na Universidade Duke, nos Estados Unidos. Eles conseguiram, pela primeira vez, registrar a atividade cerebral dos
animais de forma tão detalhada que eles foram capazes de controlar, não apenas um, mas dois braços.
CONHEÇA A PESQUISA
Título original: A Brain-Machine Interface
Enables Bimanual Arm Movements in
Monkeys
Onde foi divulgada: periódico Science
Translational Medicine
Quem fez: Miguel Nicolelis, entre outros
pesquisadores
Instituição: Universidade Duke, nos Estados
Unidos, entre outras
Dados de amostragem: Dois macacos rhesus,
que tiveram quase 500 neurônios analisados
pelos cientistas
Os movimentos bimanuais, como o ato de digitar em um teclado ou
abrir uma lata, são fundamentais na rotina humana, mas, até agora,
os cientistas não haviam conseguido registrar a atividade cerebral
responsável por eles. Em pesquisas anteriores, Nicolelis já havia
criado interfaces cérebro-máquina-cérebro que permitiram a um
macaco mover e sentir uma mão na tela de um computador.
Mas o procedimento para fazer com que o animal mova dois
membros ao mesmo tempo é mais complicado.
Segundo o cientista, a atividade cerebral responsável pelo
movimento bimanual não corresponde à simples soma do
movimento de ambas as mãos — ela é muito mais complexa. "Em
nossa pesquisa, descobrimos que o cérebro faz a computação
desse movimento de uma maneira não linear. Ou seja, não bastava
somar os sinais das duas mãos", diz o Miguel Nicolelis, em
entrevista ao site de VEJA. "Para desenvolver um modelo que
levasse em consideração o movimento simultâneo dos dois braços,
http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/laboratorio-de-nicolelis-faz-macacos-coordenar... 14/11/2013
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Resultado: Os macacos aprenderam a
controlar o movimento de dois braços virtuais
apenas com seu pensamento
tivemos que registrar a atividade de quase 500 neurônios — o
maior número analisado em qualquer estudo publicado até agora."
Leia também:
Pesquisa de Miguel Nicolelis dá a largada para criar 'internet
cerebral'
"Uma rede de cérebros seria capaz de realizar tarefas que um computador normal não faria"
Exoesqueleto — A pesquisa, publicada na revista Science Translational Medicine, é parte importante do Projeto
Andar de Novo, no qual Nicolelis pretende construir um exoesqueleto que poderá ser operado por tetraplégicos apenas
com seu pensamento. O cientista quer fazer a primeira demonstração do equipamento durante a cerimônia de
abertura da Copa do Mundo, no ano que vem. Para o exoesqueleto funcionar, no entanto, é necessário que os
voluntários sejam capazes de controlar o movimento de vários membros ao mesmo tempo.
Saiba mais
INTERFACE CÉREBRO-MÁQUINA-CÉREBRO
São sensores capazes de captar a atividade elétrica
dos neurônios, decodificá-la, remetê-la a artefatos
robóticos e depois de volta para o cérebro por meio
de sinais visuais, táteis ou elétricos. Na prática, as
ICMCs transformam os pensamentos em comandos
digitais que as máquinas podem entender.
No novo experimento, os pesquisadores analisaram a atividade de
quase 500 neurônios espalhados por diferentes áreas dos dois
hemisférios cerebrais de uma dupla de macacos rhesus. Os
animais foram colocados de frente a uma tela de computador, na
qual podiam enxergar os braços e mãos de um avatar de macaco.
A partir de um algoritmo, os cientistas transformaram a atividade
elétrica captada em seus cérebros em comandos para controlar os
membros virtuais.
Durante o período de treinamento, os animais foram encorajados a
colocar essas mãos virtuais dentro de alvos quadrados que
apareciam na tela. Depois de alguns instantes em contato com os
quadrados, estes desapareciam, e surgiam dois círculos, para os quais os macacos deveriam mover novamente suas
mãos. A cada vez que realizavam o movimento de maneira correta, ganhavam um gole de suco como prêmio.
Conforme o tempo passava — e os macacos aprendiam a controlar as mãos virtuais —, os cientistas observaram que
o próprio cérebro dos animais estava se alterando. Segundo Nicolelis, isso confirma os resultados de um experimento
anterior de sua equipe, que havia mostrado que o cérebro é capaz de integrar objetos externos à imagem que tem
de seu próprio corpo. "Nesse caso, o avatar passou a fazer parte da representação de corpo criada pelo cérebro do
animal. O macaco literalmente assimilou os braços artificiais como se fossem seus", diz Nicolelis.
Centro de Neuroenenharia de Duke
Sem as mãos — Ao fim do estudo, os dois macacos tinham se
tornado capazes de controlar de forma satisfatória o movimento
conjunto das duas mãos virtuais. E eles podiam fazer isso enquanto
estavam parados, sem que os movimentos na tela do computador
fossem acompanhados por movimentos de suas mãos reais — usando
apenas seu cérebro.
Leia também:
Equipe de Nicolelis cria "sexto sentido" em ratos
Segundo os pesquisadores, isso é importante porque um dos
principais objetivos das interfaces cérebro-máquina é criar próteses ou
exoesqueletos que possam restabelecer o movimento de pacientes
amputados ou paralisados. Se movimentos reais fossem necessários
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Após o treinamento, o cérebro dos macacos
assimilou os braços do avatar virtual como se
fizessem parte de seu corpo real
para a operação desses equipamentos, seu próprio objetivo estaria
comprometido. "Isso é muito importante para nossa pesquisa, pois
essa é exatamente a estratégia de treinamento que iremos usar nas
salas virtuais que construímos em Natal e em São Paulo, para o Projeto Andar de Novo", diz Nicolelis.
“Estamos dentro do prazo para o exoesqueleto ser
apresentado na abertura da Copa”
Miguel Nicolelis
Chefe do laboratório de neuroengenharia da Universidade de Duke, EUA, e diretor
científico do Instituto Internacional de Neurociências de Natal
Em uma pesquisa anterior, seu grupo de pesquisa havia
conseguido fazer com que um macaco controlasse o movimento
de uma mão virtual usando seu pensamento. Qual a diferença para a pesquisa atual, na
qual os macacos moveram duas mãos? Desta vez foi muito mais complicado. Muita gente
pensava que só precisávamos saber como os neurônios se comportam quando o braço direito e
o esquerdo se movem de forma independente, e somar o resultado. Mas mostramos que não é
assim. O cérebro faz a computação desse movimento de maneira não-linear — a atividade dos
neurônios responsáveis pelo ação bimanual não é uma simples soma das atividade das duas
mãos.
E como vocês superaram essa dificuldade? Nós tivemos que descobrir outra maneira de
usar os neurônios para prever o movimento conjunto das duas mãos — essa é a grande sacada
deste trabalho. Medimos quase 500 neurônios, distribuídos em várias áreas do lóbulo frontal e
parietal. Em nosso artigo, publicamos um gráfico que compara o número de neurônios que
conseguíamos registrar com a acurácia dos movimentos das mãos virtuais. Ela é uma escala
logarítmica: ao analisar menos neurônios, reduzíamos em muito a performance da interface.
Como foi o processo de aprendizado desses macacos? Outra novidade desse trabalho é
que, pela primeira vez, nós treinamos um animal que não precisou se mexer para aprender a
controlar a interface. O primeiro macaco usado no estudo começou usando suas mãos, e
depois só o pensamento. Mas o segundo nem precisou usar as mãos. Ele só observou a
trajetória das mãos virtuais na tela do computador e aprendeu o que era necessário fazer para
controlar os braços do avatar só com o cérebro. Isso é muito importante para nossa pesquisa,
pois essa é exatamente a estratégia de treinamento que iremos usar nas salas virtuais que
construímos em Natal e em São Paulo, para o Projeto Andar de Novo. Nós usamos toda a
informação que aprendemos durante esse estudo para construir os equipamentos que já estão
operando no Brasil.
Como essa pesquisa se insere no processo de construção do exoesqueleto do Projeto
Andar de Novo? Ela foi muito importante, pois o regime de treinamento do segundo macaco,
que só observa seus movimento pela tela do computador até aprender a controlá-los, é a
estratégia que decidimos usar para treinar os nossos pacientes. Antes de vestir o
exoesqueleto, os voluntários vão interagir com avatares deles próprios, para treinarem como
usar a atividade de seu cérebro de modo a controlar o equipamento. A pesquisa também será
importante para uma segunda fase do desenvolvimento do exoesqueleto, onde iremos colocar
braços no equipamento. Depois da Copa, devemos começar a trabalhar nisso.
Os testes no Brasil já começaram? Nossos cientistas já testaram o aparelho neles mesmos.
Usaram o eletroencefalograma para controlar o avatar em uma sala virtual que simula um
ambiente de estádio de futebol, com barulho de torcida, flashes de câmera fotográfica. O
equipamento funcionou: eles conseguiram controlar o avatar. Nesse momento nós já
terminamos a construção do laboratório na AACD, em São Paulo, e estamos começando a
testar os voluntários. Estamos dentro do prazo para que o exoesqueleto seja apresentado
durante a abertura da Copa.
O senhor costuma utilizar animais em suas pesquisas, desde ratos até macacos. Aqui no
Brasil, essa questão voltou à tona depois da invasão do Instituto Royal. Qual a sua
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opinião sobre essa discussão? Evidentemente, esse é um assunto que, para mim, não tem
nem discussão. O mundo inteiro reconhece a relevância de pesquisas com animais. Todo o
nosso trabalho é feito com o intuito de beneficiar milhões de pessoas em todo o planeta, e os
cientistas brasileiros seguem normas muito estritas. A pesquisa com animais no Brasil é
regulamentada por leis nacionais e internacionais. Eu faço pesquisas nos Estados Unidos, e
posso dizer que a legislação americana e a brasileira são muito semelhantes. Quem quebrou a
lei foi quem fez a invasão.
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