André João de Lemos Miguéis Salvador Efeito do substituinte “

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André João de Lemos Miguéis Salvador
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e
estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª gerações.
Faculdade de Ciências da Saúde
Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas
Porto, 2012
André João de Lemos Miguéis Salvador
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e
estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª gerações.
Faculdade de Ciências da Saúde
Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas
Porto, 2012
André João de Lemos Miguéis Salvador
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e
estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª gerações.
Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas
Trabalho apresentado à Universidade Fernando Pessoa como parte
dos requisitos para a obtenção do grau de Mestre em Ciências
Farmacêuticas
________________________________________
Porto, 2012
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Sumário
O estudo da interacção fármaco-receptor baseia-se no conceito supramolecular “guesthost”, em que a tipologia dos receptores (host) assim como o fármaco (guest) devem ser
analisadas. Recorrendo-se a técnicas de caracterização química computacional é possível
caracterizar electrónica e estruturalmente (3D) os intervenientes na acção farmacológica,
em complemento aos métodos semi-empíricos inicialmente utilizados. As técnicas citadas,
consistem na análise supra-molecular e de distribuição de densidade de cargas, os quais são
factores cruciais na pesquisa de novas substâncias.
No campo farmacológico, a especificidade para a estrutura alvo é um aspecto essencial em
ter em conta no desenvolvimento e compreensão na acção de um fármaco. Na última
década, tem vindo a ser desenvolvida a química de compostos orgânicos fluorados, bem
como, as características particulares que este elemento promove na ligação ao átomo de
carbono.
O aumento da existência de fármacos com susbstituintes fluorados deve-se ao crescente
interesse e exploração por parte da indústria farmacêutica. Exemplos recentes são as
fluoroquinolonas, compostos antimicrobianos sintéticos com grande potencial terapêutico.
Estes
são
facilmente
manipuláveis
no
sentido
de
melhorar
a
sua
relação
estrutura/actividade, resultando num aumento da potência nesta classe de antibióticos.
As fluoroquinolonas apresentam um espectro de acção mais amplo e uma maior potência
bacteriana do que os compostos que lhes deram origem (quinolonas), devido à introdução
de um átomo de flúor na sua estrutura molecular. Como principais vantagens, estes
compostos possuem uma melhor eficácia na penetração em células bacterianas, devido à
posição do átomo de flúor em C6, assim como, são o único grupo que actua ao nível das
topoisomerases sem apresentar grandes limitações na actividade antibacteriana ou na
toxicidade.
Neste trabalho, desenvolveu-se um estudo da influência do ião flúor nas propriedades
electrónicas e estruturais em fluoroquinolonas de 3ª e 4ª gerações. Para tal, substituiu-se o
i
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
ião flúor pelo átomo de hidrogénio em cinco moléculas, de forma a compreender e avaliar a
importância deste ião, com recurso a programas informáticos de mecânica quântica e
molecular.
Palavras-Chave: fluoroquinolnas, antimicrobianos, quinolonas, flúor, química
computacional, mecânica quântica, mecânica molecular, gatifloxacina, sarafloxacina,
sparfloxacina, sitafloxacina.
ii
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Abstract
The study of drug-receptor interaction is based on the supramolecular concept "guest-host",
where the receptor type (host) and the drug (guest) must be analyzed. Resorting to
characterization techniques of computational chemistry, it is possible to characterize
structurally and electronically (3D) the intervenients in the pharmacological action.
In the pharmacological field, specification for the target structure is an essential aspect to
take into account in developing and understanding the action of a drug. In the last decade, it
has been developed the chemistry of fluorinated organic compounds, as well as the
particular characteristics, that this element promotes in the C-F bond.
The uprising existence of drugs with fluorinated substituents is due to the increasing
interest and use by the pharmaceutical industry. Recent examples are the fluoroquinolones,
synthetic antimicrobial compounds with high therapeutic potential. These are easily
manipulated in order to improve its structure / activity relation, resulting in increased
potency in this class of antibiotics.
The fluoroquinolones exhibit a broader spectrum of activity and a greater bacterial potency
than the compounds from which they originated (quinolones), due to the introduction of a
fluorine atom in its molecular structure. The main advantages of these compounds are a
superior effectiveness in penetration of bacterial cells, due to the position of the fluorine
atom at C6, as they are the only group that acts at the level of topoisomerases without
severe limitations on the toxicity.
In this work, it was made a study of the influence of fluoride ion in the electronic and
structural properties of fluoroquinolones in 3rd and 4th generations. A comparative study
was made between the fluorinated substituent and the hydrogen substituent in five
molecules, in order to understand and evaluate the importance of the fluorine on the
electronic properties of the quinolones, using computer programs of molecular and
quantum mechanics.
iii
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Keywords: fluoroquinolones, antibiotics, quinolones, fluorine, computational chemistry,
quantum mechanics, molecular mechanics, gatifloxacin, sarafloxacin, sparfloxacin,
sitafloxacin.
iv
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Agradecimentos
Á Universidade Fernando Pessoa e docentes pela oportunidade e ensinamentos.
À minha família e amigos por todo o apoio e amizade prestados.
À Ana Isabel por toda a paciência, ajuda e apoio incondicional.
À Professora Doutora Lígia Rebelo Gomes pela atenção, preocupação, apoio,
ensinamentos, paciência e ajuda disponibilizada.
v
Efeito do substituinte “-F” nas propriedades electrónicas e estruturais das fluoroquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Glossário
Siglas
AINE’s - Anti-inflamatórios não esteróides
ESP - Potencial electroestático
FDA - Food and Drug Administration
FQ’s - Fluoroquinolonas
SCF - Self Consisting Field – Superfície de densidade electrónica
SNC - Sistema Nervoso Central
vi
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Índice
Índice de figuras
ix
Índice de Tabelas
xi
I. Introdução
1
II. Características farmacológicas das fluoroquinolonas
11
2.1. Relação estrutura actividade das fluoroquinolonas
12
2.2. Farmacocinética: aspectos gerais
14
2.2.1. Absorção
15
2.2.2. Distribuição
15
2.2.3. Metabolização e Eliminação
16
2.3. Acção Farmacológica
16
2.4. Mecanismo de acção
17
2.5. Efeitos Secundários
19
III. Objectivos e métodos
22
3.1. Considerações gerais
23
3.2. Métodos computacionais
25
3.2.1. Calculo da energia molecular por ab-initio
25
3.2.2. O método SCF
26
3.2.3. As energias obtidas
27
3.2.4. As bases para as funcionais
28
3.2.5. Teoria de DFT (Density Functional Theory)
28
3.2.6. Superficies de energia
29
3.2.7. Metodologia adoptada
30
IV. Resultados e discussão
31
4.1. Considerações gerais
32
4.2. Optimizações geométricas
32
4.3. Aspectos conformacionais
38
4.4. Polaridades e distribuição de cargas
42
4.5. Superfícies de isopotencial electrónico
43
vii
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
4.6. Considerações Finais
47
Bibliografia
48
viii
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Índice de Figuras
Figura 1 - Farmacóforo da Fluoroquinolona
2
Figura 2 - Ácido Nalidíxico
2
Figura 3 - A molécula da norfloxacina apresenta substituintes –F e piperazilo nas
posições 6 e 7 respectivamente.
3
Figura 4 - Levofloxacina e Sparfloxacina
6
Figura 5 - Fluoroquinolonas com grupo ciclopropil substituído na posição 1
9
Figura 6 – Trovafloxacina
10
Figura 7 Relação estrutura-actividade dos diferentes substituintes no farmacóforo
da quinolona.
12
Figura 8 - Mecanismo de acção das fluorquinolonas.
19
Figura 9.1 – Representação esquemática das fluoroquinolonas usadas no estudo.
No início da tabela encontra-se esquematizado o farmacóforo.
33
Figura 9.2 – Representação esquemática das fluoroquinolonas usadas no estudo.
No início da tabela encontra-se esquematizado o farmacóforo.
34
Figura 10.1 – Geometria molecular da sparfloxaxina neutra (em cima à esquerda) e
para a Cicloheptanogemifloxaxina (em baixo, à esquerda) obtidas por optimização
para uma energia mínima com o nível de teoria B3LYP/6-311G++(d,p). A
sparfloxaxina é uma fluorquinolona de 3ª geração com actividade contra Gramigual à 2ª geração, exceptuando contra P. Aeruginosa. Boa actividade contra
Gram+. A cicloheptilgemifloxaxiona (em baixo, à esquerda) é derivada da
genifloxaxina que também é uma fluorquinilona de 3ª geração. As estruturas à
direita referem-se às estruturas onde o átomo de fluor na posição 6 foi substituido
por um átomo de hidrogénio.
35
Figura 10.2 - Geometrias optimizadas para os compostos estudados obtidas por
cálculos ab initio no nível de teoria B3LYP/6-311G++(d,p), para a gatifloxaxina
(em cima à esquerda) para a sarafloxaxina (no meio, à esquerda) e para a
sitafloxacina (em baixo, à esquerda). À direita encontram-se as conformações
moleculares substituidas em C6 por hidrogénio.Estas quinolonas pertencem à 4ª
ix
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
geração e apresentam o mesmo espectro de acção das anteriores gerações com
alargamento para bacterias anaeróbias, melhor e maior actividade contra Gram+ e
espécies resistentes.
36
Figura 11 - Estrutura molecular da sparfloxacina, da gatifloxacina e da
sarafloxacina mostrando a conformação quando as moléculas se encontram com a
anel da quinolona prependicular ao plano da folha, de modo a evidenciar a posição
relativa dos substituintes em N1 e C8.
41
Figura 12 - Potencial electrostático representado em superfícies de densidade
electronica para as moléculas em estudo. As regiões c azul e verde são carregadas
positivamente e as regiões com maior densidade electrónica são de cor vermelha e
amarela. As superficies foram todas mapeadas com ESP e a densidade electrónica
tirada da densidade SCF, com um isovalor de 0.04.
46
x
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Índice de tabelas
Tabela I – Comparação e espectro de actividade das diferentes gerações das
fluoroquinolonas.
5
Tabela II - Energias mínimas e momentos dipolares para os compostos em
estudo, obtidos pela teoria B3LYP/6-311G++(d,p).
37
Tabela III – Valores para alguns ângulos de torção das quinilonas estudadas. O
ângulo Ψ1º refere-se à distorção na ligação C8’-N1 do anel da quinolona; Ψ2º referese à distorção do substituinte em N1; Ψ3º refere-se à distorção do grupo carboxílico
em C3; Ψ4º refere-se à distorção en torno da ligação C6-C7 do anel da quinolona
devido aos substituintes presentes nesses átomos e Ψ5º refere-se à distorção do
substituinte em C7 relativamente ao anel da quinolona, como mostra a figura
abaixo.
40
Tabela IV - Distribuição de cargas para os fluoroquinolonas utilizadas,
calculadas pela teoria B3LYP/6-311++G(d,p).
44
xi
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
I. INTRODUÇÃO
1
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
1. Introdução
As fluoroquinolonas, FQ’s, são quinolonas sintéticas que possuem um átomo de fluor na
posição 6 do anel quinolona tal como mostra o esquema da Figura 1. Farmacologicamente
estes compostos são considerados como pertencentes à classe dos antimicrobianos e têm
vindo a ser amplamente usados no combate de infecções bacterianas (Walker, 1999). O seu
sucesso deve-se essencialmente ao facto de serem o único antibacteriano sintético, capaz de
rivalizar com os β-lactâmicos no que toca ao impacto do uso clínico na terapêutica
antibacteriana.
Figura 1: Farmacóforo da Fluoroquinolona
As quinolonas são uma descoberta relativamente recente. O seu desenvolvimento começou
com a descoberta de ácido nalidíxico (Figura 2), no início dos anos 60, durante a síntese de
um agente antimalárico, a cloroquina. O ácido nalidíxico mostrou possuir um espectro de
actividade bastante restrito sendo apenas utilizado para infecções causadas por
Enterobacteriaceae. Além disso, e devido a limitações na absorção e distribuição, o
composto destinava-se exclusivamente ao uso no tratamento de infecções no sistema
urinário.
Figura 2: Ácido Nalidíxico
2
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Investigações posteriores, feitas nos anos 70 e 80, provaram que a substituição de um
átomo de hidrogénio por um de flúor na posição 6 e a introdução de um grupo piperazilo na
posição 7 (figura 3) provocava um melhoramento na actividade antibacteriana deste tipo de
compostos, nomeadamente no respeitante ao aumento da sua eficácia contra organismos
como a Pseudomonas aeruginosa e Coccus Gram+. O referido aumento de eficácia foi
acompanhado com uma melhoria da absorção por via oral e distribuição pelos tecidos
(Martinez et al., 2006). Estas quinolonas passaram a ter a designação de fluoroquinolonas
por possuírem o átomo de flúor substituído na posição 6 (Cross, 2001). Concretamente,
constatou-se que a introdução do grupo piperazilo na posição 7 melhorava a capacidade de
penetração da molécula nas células, aumentando assim a sua actividade, e que a introdução
do susbstituinte flúor na posição 6 aumentava o espectro de acção, o que representou um
importante avanço nesta área. A combinação destas duas mudanças na molécula básica da
quinolona originou a norfloxacina, a primeira fluoroquinolona de 2ª geração, Tabela 1 e
Figura 3, patenteada em 1978, que apresentava uma notória melhoria na sua actividade e
espectro de acção, não sendo ainda no entanto, recomendável para uso sistémico.
Figura 3: A molécula da norfloxacina apresenta substituintes –F e piperazilo nas posições 6
e 7 respectivamente.
Rapidamente a pesquisa e desenvolvimento da investigação farmacêutica permitiram a
execução de sérias melhorias a partir da molécula da norfloxacina, com descobertas de
novos compostos resultantes de modificações na fluoroquinolona, aumentando o número
das fluoroquinolonas de 2ª geração. As descobertas levaram à criação de moléculas que
ainda hoje se encontram em uso, tais como a pefloxacina (1979), enoxacina (1980),
3
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
ciprofloxacina (1981) e ofloxacina (1982), Tabela 1. Estes compostos apresentavam
características que permitiam o seu uso contra Gram+ e Gram-, bem como uma maior
absorção pelo sistema gastro-intestinal, levando a níveis seguros de concentrações
plasmáticas e permitindo o seu uso sistémico no combate a infecções. No entanto, alguns
microorganismos, como por exemplo Staphylococcus aureus e Pseudomonas aeruginosa,
desenvolveram resistências a estes compostos (Applebaum e Hunter, 2000).
4
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Tabela I – Comparação e espectro de actividade das diferentes gerações das
fluoroquinolonas (Walker, 1999), (Van Bambeke et al., 2005), (Lee e Kanatani, 1999),
(Oliphant e Green, 2002).
Geração
Fluoroquinolonas
Espectro de actividade
Ácido Nalixídico
1ª
Cinoxacina
Alguma actividade contra Gram-.
Ácido Oxolínico
Sistema urinário como alvo predominante.
Ácido
Pipemídico
2ª
Norfloxacina
Boa actividade contra Gram- com actividade moderada contra
Staphylococcus.
Enoxacina
Actividade limitada contra Gram+.
Ciprofloxacina
Ciprofloxacina e Ofloxacina apresentam boa penetração em tecidos e
células.
Ofloxacina
3ª
Lomefloxacina
Sistema urinário, respiratório, gastrointestinal e reprodutor, e
infecçoes de pele e ossos como alvos predominantes.
Levofloxacina
Actividade contra Gram- igual à 2ª geração, exceptuando contra P.
aeruginosa, que é inferior.
Sparfloxacina
Boa actividade contra Gram+.
Grepafloxacina
Geração de eleição quando há suspeita de resistência à penicilina na
infecção por S. pneumoniae.
Gemifloxacina
Sistemas alvo iguais aos da 2ª geração com especial destaque para o
aparelho respiratório.
Trovafloxacina
Sitafloxacina
4ª
Sarafloxacina
Gatifloxacina
Moxifloxacina
Mesmo espectro de acção das anteriores gerações com alargamento
para bacterias anaeróbias.
Melhor e maior actividade contra Gram+ e espécies resistentes.
Excelentes resultados no tratamento de infecções do sistema
respiratório.
Clinafloxacina
5
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Desde então, novas gerações de quinolonas e fluoroquinolonas foram surgindo.
Sucessivamente, foram conseguidos diversos melhoramentos estruturais, feitos não só, com
o intuito de aumentar a eficácia das quinolonas a nível farmacocinético, como também a
adesão terapêutica por parte do doente permitindo, por exemplo, uma posologia de toma
única diária versus várias tomas diárias (nas gerações inaugurais (Applebaum e Hunter,
2000)).
As quinolonas de 3ª geração apresentam actividade significativamente maior
contra
microorganismos Gram+, microorganismos anaeróbios e ainda estirpes resistentes às
fluoroquinolonas relativamente às quinolonas da geração anterior. Estes compostos
apresentam excelente absorção oral e tempos de semi-vida, que permitem uma
administração menos frequente por parte dos doentes. Como exemplos de principais
quinolonas desta geração podem-se destacar a sparfloxacina e a levofloxacina (Applebaum
e Hunter, 2000), (Martinez et al., 2006), (Van Bambeke et al., 2005), representadas
esquematicamente na Figura 4.
Figura 4: Levofloxacina e Sparfloxacina, respectivamente
Contrariamente ao sucedido na geração anterior, onde a maioria das quinolonas não
apresentavam substituinte -F na posição 6, na 4ª geração retomou-se o desenvolvimento de
novas fluoroquinolonas. As modificações estruturais operadas permitiram obter agentes
antimicrobianos com maior espectro de acção alargando-se este a microorganismos
anaeróbios. A título de exemplo destaca-se a trovafloxacina (figura 6), que chegou a estar
aprovada pela FDA (Food and Drug Administration), tendo sido retirada devido a altas
6
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
taxas de hepatotoxicidade associadas (Bertino e Fish, 2000), (Van Bambeke et al., 2005),
(Lee e Kanatani, 1999), (FDA, 2012 a). Não obstante, outras fluoroquinolonas de 4ª
geração foram sintetizadas, cujas eficácias contra microorganismos Gram + e anaeróbios e
contra Gram-, comparativamente à ciprofloxacina, foram comprovadas. Neste conjunto
surgem a clinafloxacina (a), gatifloxacina (b), gemifloxacina (c), moxifloxacina (d) e a
sitafloxacina (e), Tabela 1, Figura 5 (Applebaum e Hunter, 2000). Estes compostos
possuem o maior espectro de acção de todas as gerações, com tempos de semi-vida
elevados, apresentando reais vantagens e melhoramentos comparativamente às gerações
anteriores. De facto, as FQ’s mais recentes têm um espectro de actividade bastante
alargado, sendo eficazes contra bactérias Gram- e Gram+ (enterococcus, streptococcus e
staphilococcus), têm um tempo de semi-vida bastante elevado, possuem baixa incidência no
aparecimento de resistências, apresentam boa penetração na maioria dos tecidos e uma
grande biodisponibilidade oral (Bertino e Fish, 2000). De momento apenas a gemifloxacina
está aprovada para uso, na Coreia, USA, Canadá e Nova Zelândia (Van Bambeke et al.,
2005).
A permanência de um átomo de flúor na posição 6 do anel da quinolona é essencial para
uma marcada actividade anti-bacteriana. Esta parte da molécula intervém na inibição da
enzima girase após a ligação fármaco-receptor e também na penetração bacteriana. Assim
sendo, este trabalho propõe-se avaliar o efeito electrónico e estrutural do substituinte –F no
anel da quinolona. Esta avaliação será executada de forma comparativa com compostos
homólogos cuja posição 6 estará ocupada por um átomo de hidrogénio.
Este estudo incidirá sobre 4 fluoroquinolonas de 4ª geração e uma de 3ª geração,
nomeadamente a sarafloxacina, a sitafloxacina, um derivado da gemifloxacina, a
gatifloxacina e a sparfloxacina.
Neste trabalho procedeu-se à utilização de ferramentas baseadas em mecânica quântica a
nível molecular para efectuar a análise diferencial entre as estruturas fluoro-substituídas e
hidrogeno-substituídas, em estado gasoso, de modo a e avaliar o efeito do substituinte “–F”
na posição 6 do anel quinolínico, tanto a nível electrónico (distribuição da densidade de
carga, momentos dipolares) como estrutural (mudança de conformação da quinolona).
7
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Pretende-se, fundamentalmente, analisar os efeitos do ião flúor nas propriedades
electrónicas das fluoroquinolonas, pois a alteração de polaridade que este confere à
molécula, conjuntamente com a mudança de lipofilia, contribuem para melhorar as
propriedades farmacocinéticas desta classe de antimicrobianos. Assim efecturam-se
optimização geométricas das estruturas em fase gasosa, procedeu-se à análise e
identificação de diferenças conformacionais entre as as quinolonas e fluoroquinolonas.
Executou-se ainda uma comparação das superficies de potencial isoelectrónicas com base
nas estruturas optimizadas.
8
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
a) Clinafloxacina
b) Gatifloxacina
c) Gemifloxacina
d) Moxifloxacina
e) Sitafloxacina
f) Ciprofloxacina
Figura 5 – Fluoroquinolonas com grupo ciclopropil substituído na posição 1.
9
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Figura 6: Trovafloxacina
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Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
II. CARACTERÍSTICAS FARMACOLÓGICAS DAS
FLUOROQUINOLONAS
11
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Figura 7 – Relação estrutura-actividade dos diferentes substituintes no farmacóforo da
quinolona.
2. Características farmacológicas das quinolonas
Com mais de 800 milhões de pacientes tratados em todo o mundo, as quinolonas são hoje
em dia um dos mais importantes agentes antimicrobianos. Têm vindo a evoluir, desde das
décadas 60 e 70, de simples agentes usados no tratamento de infecções do tracto urinário
até agentes utilizados no tratamento de infecções em praticamente todos os compartimentos
do corpo humano. Esta evolução permitiu também compreender com algum rigor a relação
estrutura-actividade para esta classe de moléculas (Van Bambeke et al., 2005).
2.1. Relação estrutura actividade das fluoroquinolonas
Tendo como estrutura genérica das fluoroquinolonas a Figura 1, que aqui se reproduz
complementada com a informação relativa à estrutura-actividade (Figura 7), pode-se
12
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
relacionar o tipo de substituinte e a posição que cada um destes ocupa na estrutura com o
efeito na actividade das mesmas.
O substituinte R1 que liga ao átomo de azoto influencia marcadamente a potência do
composto. Os primeiros compostos (ácido nalidíxico, pipemídico, norfloxacina,
enofloxacina...) tinham nesta posição um grupo etilíco, mas mais tarde verificou-se que um
grupo mais volumoso em R1 potenciava a actividade contra bactérias Gram+ e Gram-. Um
grupo ciclopropilo implica uma boa actividade contra Gram- e tem vindo a ser usado nesta
posição em compostos comercializados, como por exemplo na ciprofloxacina (fig. 5, f) e
em moléculas que ainda se encontram em desenvolvimento, como a sparfloxacina (fig. 4), a
moxifloxacina (fig. 5, d) e a gemifloxacina (fig. 5, c). Um substituinte 2,4-difluorofenilo na
posição 1 mostrou ter um efeito de aumento de actividade contra Gram+ como na molécula
da trovafloxacina (fig. 6) (Applebaum e Hunter, 2000).
Verificou-se que, na posição 5, grupos volumosos baixam a actividade do fármaco e assim,
normalmente, este grupo é constituído por grupos pequenos como um átomo de hidrogénio,
um grupo metilo, ou um grupo amina. Estes grupos substituintes estão essencialmente
relacionados com a actividade contra Gram+ (Domagala, 1994).
A substituição de uma átomo de fluor na posição 6 origina o grupo das fluoriquinolonas,
mas esta posição poderá também ser ocupada por outros substituintes, nomeadamente com
um grupo -NO2 (sendo nestes casos os fármacos designados por nitroquinolonas). O grupo
–NO2 aumenta a potência das quinolonas em relação às fluoroquinolonas (Artico et al.,
1999).
Outros grupos substituintes nesta posição mostraram ser menos activos que os fluorinados e
nitrados em C6. A influência do átomo de flúor nesta posição é essencial para uma marcada
actividade na inibição da enzima girase e ligação fármaco-receptor e também na penetração
celular da bactéria nociva, que é o mecanismo básico de acção de qualquer
fluoroquinolona, (vide 2.3) (Emami et al., 2005). Esta ligação fármaco-receptor e
penetração celular são igualmente influenciadas pela natureza do substituinte em C7,
havendo um sinergismo óptimo quando este é composto por um grupo piperazinilo
(Domagala et al., 1996).
13
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Na posição 7, o substituinte R7 tem, como referido anteriormente, um relevante efeito na
potência, na farmacocinética e no espectro de actividade. Um anel heterocíclico de azoto,
de cinco ou seis lados, contribuem para um aumento de actividade farmacológica e efeitos
desejáveis na farmacocinética. Os anéis substituintes mais usados são os derivados das
piperazinas, que conferem actividade contra Gram-, como é o caso da ciprofloxacina (fig.
6), da norfloxacina (fig. 3) e da gatifloxacina. Por sua vez, os grupos amino-pirrolicos
apresentam uma maior eficácia contra Gram+. O azoto presente nestes anéis é a
imperscindível para que estes fármacos apresentem uma boa absorção oral (Applebaum e
Hunter, 2000) (Domagala, 1994).
Na posição 8, os substituintes afectam as propriedades in vivo e a actividade antibacteriana,
mais propriamente nas espécies anaeróbias (Applebaum e Hunter, 2000) (Domagala, 1994).
Vários estudos demonstraram que os substituintes mais favoráveis à actividade
antibacteriana são os halogénios (Cl ou F), apesar do aumento da fototoxicidade e
instabilidade à luz UV. A sparfloxacina tem um uso limitado precisamente por ter um
átomo de F como substituinte em C8, o que está ligado a ocorrências de fototoxicidade. A
substituição deste átomo por um grupo metoxilo confere, no entanto, uma boa actividade
contra anaeróbios sem o risco elevado de fototoxicidade, como é o exemplo da
moxifloxacina e da gatifloxacina (fig. 6 (b) e (d)) (Applebaum e Hunter, 2000).
2.2. Farmacocinética: aspectos gerais
As quinolonas apresentam óptimas propriedades farmacocinéticas, que fazem com que
estes compostos sejam amplamente utilizados na prática médica. De uma forma geral,
encontram-se biodisponíveis quase imediatamente após a toma oral e possuem eficácia no
tratamento de infecções em diversos compartimentos do corpo humano. Têm uma razoável
distribuição, com excepção para o SNC. Geralmente são metabolizados a nível hepático,
sendo esta via, conjuntamente com a renal, a via de eliminação (Van Bambeke et al., 2005),
(Bakken, 2004).
14
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
2.2.1. Absorção
As fluoroquinolonas são bem absorvidas por administração oral (Almeida e Machado,
1994). As concentrações plasmáticas assim obtidas são comparáveis às obtidas por via
intra-venosa, o que permite uma opção de escolha entre as duas vias no tratamento,
possibilitando uma potencial redução nos custos do mesmo (Oliphant e Green, 2002). A sua
absorção é rápida e, geralmente, a administração pós-pandrial não resulta numa diminuição
significativa da biodisponibilidade nem das concentrações plasmáticas, a não ser um ligeiro
atraso do pico das concentrações plasmáticas, resultantes do maior tempo de esvaziamento
gástrico necessário (Martinez, McDermott e Walker, 2006). Há, contudo a referir que
alimentos ricos em catiões divalentes, por exemplo com alto teor em magnésio, alumínio,
cálcio, ferro e zinco, devem ser evitados aquando da administração de fluoroquinolonas
pois existe a possibilidade destas quelatarem com esses iões, diminuindo a sua
biodisponobilidade e concentrações plasmáticas (Oliphant e Green, 2002). A estrutura
molecular da quinolona, especialmente a presença de um grupo piperazinilo na posição 7,
influencia a sua absorção, aumentado-a. O mesmo efeito é observado para a taxa de
metabolização e excreção (FDA, 2012 a).
2.2.2. Distribuição
As fluoroquinolonas têm uma boa penetração tecidular em quase todos os tipos de tecido,
sendo o seu alcance a nível do SNC mais difícil (Aradottir e Yogev, 1999). Quando as
meninges estão inflamadas a penetração teciduar é maior, no entanto as concentrações
tecidulares são sempre inferiores às concentrações séricas correspondentes (Almeida e
Machado, 1994). O mesmo se verifica com as concentrações tecidulares no tecido
prostático e ósseo e fluidos salivares e biliares. Por estas razões, estes agentes
antibacterianos são inadequados como fármacos de primeira linha no tratamento de
infecções nestes tecidos alvo (Oliphant e Green, 2002).
15
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
2.2.3. Metabolização e Eliminação
As fluoroquinolonas sofrem, como principal mecanismo metabólico, glucuronidação (caso
da moxifloxacina, sparfloxacina e grepafloxacina), N-oxidação e desmetilação (caso da
levofloxacina e sparfloxacina). O citocromo P450 está geralmente envolvido e é o
responsável por todos estes processos.
As fluoroquinolonas podem ser metabolizadas e eliminadas tanto por via hepática como por
via renal. Como exemplo, a ciprofloxacina e a norfloxacina são eliminadas pelas duas vias,
o ácido nalidíxico, a difloxacina e a perfloxacina são metabolizadas pelo fígado e a
ofloxacina, lomefloxacina e a temafloxacina são eliminadas exclusivamente por via renal.
A eliminação da sparfloxacina, moxifloxacina e trovafloxacina é efectuada pelo fígado
(Martinez et al., 2006), (Oliphant e Green, 2002), (Aradottir e Yogev, 1999).
Os tempos de semi-vida de eliminação variam entre as 1,5 e as 16 horas, o que permite uma
administração para alguns deles entre 12 a 24 horas entre doses. Para evitar quaisquer tipos
de problemas e efeitos secundários indesejáveis, estas dosagens devem ser cuidadosamente
ajustadas e analisadas em doentes cujas funções hepáticas e renais estejam comprometidas
(Oliphant e Green, 2002).
2.3. Acção Farmacológica
As fluoroquinolonas são amplamente usadas em infecções do aparelho genitourinário,
infecções do aparelho respiratório, no tratamento de DST’s e infecções gastro-intestinais.
Nas infecções do aparelho urinário, as quinolonas são o antibacteriano de eleição quando
estas são de natureza complicada, como infecções nosocomiais por patogénicos resistentes
a outros antibióticos. Como a ciprofloxacina, levofloxacina, gatifloxacina, ofloxacina,
lomefloxacina e enofloxacina têm taxas de clearance renal e concentrações ao nível renal
elevadas, são as escolhas ideais para o tratamento deste tipo de infecção.
16
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
No que se refere a tratamento de infecções respiratórias, as fluoroquinolonas mostraram ter
uma boa eficácia quando comparadas com o fármaco de associação de amoxicilina com
ácido clavulânico, com claritromicina e com cefuroxima. No entanto, o seu uso como
fármaco de primeira linha deve ser limitado e até mesmo evitado, devido à elevada taxa de
aparecimento de resistências ao longo destes últimos anos. O seu uso deve ser pois só
considerado nos casos onde outros tratamentos prévios com antibióticos falharam, nos
casos de alergias a β-lactâmicos ou quando os pacientes estão infectados por bactérias
altamente resistentes, como por exemplo S. Aureus, S. Pneumoniae ou H. Influenzae
(Oliphant e Green, 2002), (Bakken, 2004).
Nas doenças sexualmente transmissíveis, este tipo de fármacos é usado essencialmente no
tratamento da gonorreia provocada pela Neisseria gonorrhoeae. Caso o paciente seja
alérgico à penicilina, uma única administração de ciprofloxacina, gatifloxacina ou
ofloxacina é sufiente para a eliminação da bactéria. No caso de infecções por C.
Trachomatis deve ser aplicado um plano de tratamento de 7 dias com sparfloxacina ou
ofloxacina. O cancro de tecidos moles, ou cancróide, provocado pela Haemophilus ducreyi
é tratado com ciprofloxacina.
Nas infecções gastrointestinais, como por exemplo febre tifóide entérica, diarreias ou
cólera, pode ser usada a ciprofloxacina/ofloxacina, norfloxacina/ciprofloxacina e
norfloxacina, respectivamente.
O seu uso em infecções de pele e de tecidos moles ainda não está vulgarizado pois existem
poucos estudos e certezas quanto à sua eficácia em relação ao custo/benefício respeitante a
este local de acção terapêutica (Oliphant e Green, 2002).
2.4. Mecanismo de acção
A replicação de DNA bacteriano é um processo altamente regulado que está intimamente
relacionado com a taxa de crescimento da célula bacteriana. Esta replicação é regulada por
um grupo de enzimas designadas por topoisomerases, que asseguram que o DNA
bacteriano se mantém no seu estado condensado. O comprimento da molécula de DNA
17
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
desenrolada excede em larga escala o espaço ao qual tem de estar confinado, sendo o papel
das topoisomerases crucial na manutenção do super-enrolamento do DNA nas regiões
replicativas e não replicativas do cromossoma (Bakken, 2004).
As fluoroquinolonas inibem a síntese de DNA bacteriano por se ligarem às enzimas
topoisomerases II e IV. De um modo geral, as fluoroquinolonas ligam-se à topoisomerase II
nas espécies Gram- e à topoisomerase IV nas espécies Gram+ (Van Bambeke et al., 2005),
(Bakken, 2004). A topoisomerase II (ou DNA girase) foi a enzima alvo das primeiras
quinolonas, como é o caso do ácido nalidíxico. A topoisomerase IV foi descoberta como
alvo destes fármacos quando as primeiras resistências às quinolonas de primeira geração
começaram a aparecer em Staphylococcus aureus (Hooper, 2001). As fluoroquinolonas
formam um complexo ternário [fármaco-enzima-DNA] com as topoisomerases IV, inibindo
a replicação do DNA (Van Bambeke et al., 2005), (Bakken, 2004).
As fluoroquinolonas têm um importante papel de “fármaco bi-valente” desde que tenham
uma boa eficácia para a inibição da topoisomerase II ou IV, no que toca ao combate de
aparecimento de resistências. Quando a bactéria desenvolve determinado mecanismo de
resistência através de mutações numa das enzimas alvo, o fármaco pode ser direccionado
como inibidor enzimático da outra enzima, mais sensível ou mais exposta das bactérias, já
que estas dependem das duas enzimas para garantir a sua viabilidade. Isto implica que para
uma bactéria ser totalmente resistente a qualquer quinolona, terá que sofrer mutações em
simultâneo em ambas as enzimas (Hooper, 2001).
Assim, e de uma forma sintética, pode-se afirmar que as quinolonas expressam a sua
actividade bactericida interferindo com o enrolamento do DNA, impedindo a sua replicação
e transcrição. Este processo acontece devido à sua actuação contra as topoisomerases
(figura 7): as topoisomerases afectadas pelas quinolonas não conseguem promover o
desdobramento do DNA pelo que o superenrolamento do DNA passa a ser definitivo
(Sousa, 2006).
18
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Figura 8 - Mecanismo de acção das fluoroquinolonas (Hooper, 2002)
2.5. Efeitos secundários
As fluoroquinolonas são, como classe, consideradas seguras e bem toleradas. A incidência
dos efeitos secundários varia significativamente consoante a estrutura química de cada
molécula, sendo normalmente pouco frequentes e suaves ou então raros. Os compostos que
provocam efeitos mais graves, têm a recomendação de limitação do uso e algumas
moléculas já foram retiradas do mercado.
No que concerne ao tipo de efeitos secundários, verificou-se que não estão associados
particularmente a determinada estrutura química das moléculas, mas são comuns a todas
elas. Os de maior relevância são o desconforto gastrointestinal, diarreia, nauseas, vómitos e
perturbações do sistema nervoso central. A fototoxicidade é igualmente uma preocupação
19
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
com as quinolonas em geral (Bertino e Fish, 2000), (Van Bambeke et al., 2005), (Lee e
Kanatani, 1999), (Oliphant e Green, 2002), (Aradottir e Yogev, 1999), (Stahlmann, 2002).
A ciprofloxacina e a ofloxacina têm como efeito secundário mais frequente os distúrbios
gastrointestinais, mais concretamente a diarreia e a náusea. Reacções da pele e do sistema
nervoso central são também frequentemente reportados, como tremores, tonturas e dores de
cabeça.
A sparfloxacina também tem sido associada a problemas GI e a problemas no SNC, no
entanto, a sua fotoxicidade e capacidade de alterar o intervalo QTc do batimento cardíaco
são os efeitos secundários mais graves associados a esta molécula. A fotosensibilidade
também foi constatada em diversos estudos, sendo os pacientes aconselhados a não
contactar com a luz solar, mesmo usando um protector solar com SPF elevado. O
prolongamento do intervalo QTc faz com este tipo de antibacteriano seja severamente
desaconselhado a pessoas com problemas cardíacos.
A levofloxacina tem efeitos secundários equivalentes aos da ciprofloxacina, mas com uma
significativa diminuição de gravidade dos mesmos.
A grepafloxacina foi retirada do mercado mundial em 1999 devido a problemas
relacionados com o aparelho cardiovascular, à semelhança do que ocorreu para a
sparfloxacina, devido a alterações no intervalo QTc. Embora estes casos tenham sido raros,
a Glaxo® optou por retirar definitivamente a molécula de circulação por achar que os
benefícios não eram suficientes em relação aos efeitos secundários potencialmente
perigosos para os doentes, tendo em conta a disponibilidade de outros antibióticos no
mercado.
A lomefloxacina apresenta efeitos indesejáveis fortes ao nível do SNC, com relatos de
tonturas, tremores e ataques epilépticos. Os ataques epilépticos estão fortemente associados
com interacções medicamentosas, principalmente com AINE’s. A fototoxicidade é também
ou efeito secundário presente na lomefloxacina que requer alguns cuidados.
A trovafloxacina, até à pouco tempo, era considerada uma fluoroquinolona relativamente
segura, com efeitos secundários pouco frequentes e leves, ao nível do aparelho GI, SNC e
com um baixo potencial de provocar fototoxicidade. Também não havia registo de
alterações a nível cardiovascular nem de interacções medicamentosas. No entanto, em
20
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
1998, vários casos foram registados de doentes com problemas hepáticos associados à
terapêutica com trovafloxacina, tendo havido inclusivamente a necessidade de execução de
transplante hepático em 4 pacientes. Outros 5 pacientes faleceram com doença relacionada
com falha hepática. Este número foi considerado significativamente mais altos do que seria
expectável (Bertino e Fish, 2000). O uso de trovafloxacina por períodos superiores a 14
dias aumenta, aparentemente, o risco de falha hepática aguda, sendo no entanto a
ocorrência desta condição imprevisível. Perante isto, a FDA em Junho de 1999 lançou um
aviso de saúde pública para os médicos a informar do risco hepático associado à
trovafloxacina e a aconselhar o uso da trovafloxacina apenas em casos em que os doentes
cumprissem determinados critérios específicos. O tratamento deve ser descontinuado caso
apareçam sintomas de disfunção hepática, como por exemplo fadiga, anorexia, icterícia,
dores abdominais fortes com náuseas e vómitos e urina escura (FDA, 2012 b).
A moxifloxacina tem como efeitos secundários, distúrbios gastrointestinais. Apresenta
poucas alterações do SNC e baixa taxa de fototoxicidade. No entanto, em Outubro de 1999,
a FDA alertou para os riscos da utilização da moxifloxcina, pois havia registos de que esta
diminuiria o intervalo QTc nos electrocardiogramas em cerca de 60 milisegundos. Assim, a
partir dessa data a moxifloxacina ficou desaconselhada a doentes com hipercalémia não
tratada ou sob terapêutica antiarrítmica.
A gatifloxacina apresenta efeitos secundários pouco relevantes e de gravidade moderada,
como náuseas, dores de cabeça, tonturas e diarreia. Não apresenta sintomas de
fototoxicidade nem de alteração do intervalo QTc do batimento cardíaco. É recomendado
no entanto, algum cuidado na administração de gatifloxacina a pacientes que estejam
medicados com antiarrítmicos ou com antidepressivos.
Concluindo, as fluoroquinolonas são antibacterianos com largo espectro de acção e muito
similar entre elas, logo é necessário uma avaliação cuidada na decisão da sua dispensa, pois
é fundamental avaliar a relação benefício/segurança e analisar bem os seus perfis de
segurança e tolerabilidade. Os efeitos secundários, na sua maioria, são reversíveis parando
de imediato o tratamento (Bertino e Fish, 2000).
21
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
III. OBJECTIVOS E MÉTODOS
22
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
3.1 Considerações gerais
Na realização deste trabalho avalia-se os efeitos electrónicos e estruturais da substituição de
um ião de hidrogénio por um ião de flúor na posição 6 em cinco moléculas de
fluoroquinolonas: a gatifloxacina, a sitafloxacina, a sarafloxacina, a sparfloxacina e um
derivado da gemifloxacina.
O flúor é um átomo muito electronegativo, que ocupa um volume menor que um grupo
metilo, hidroxilo ou amina, mas maior do que um átomo de hidrogénio (Almeida e
Machado, 1994). Um dos primeiros fármacos organofluorados a ser sintetizado foi o 5fluoruracilo um agente anti-neoplásico, em 1957. A partir daí, o flúor começou a ser alvo
de atenção na química medicinal, por melhorar a estabilidade metabólica, a
biodisponibilidade e as ligações fármaco-proteína alvo. Um dos fármacos sobejamente
conhecido hoje em dia que assenta no uso de flúor é a fluoxetina (Prozac®), um
antidepressivo aprovado pela FDA em Dezembro de 1987. Outro fármaco, análogo da
eritromicina é a fluritromicina, usada para o tratamento de infecções provocadas pela
bactéria Helicobacter pylori, fármaco lançado no mercado em 1997.
O átomo de flúor pode apresentar um rol de vantagens ao ser incluído nas moléculas
farmacologicamente activas, como por exemplo a modelação do pKa, que pode ter um
impacto significativo na alteração da biodisponibilidade do fármaco. Por ser extremamente
electronegativo pode condicionar a distribuição de cargas na molécula e portanto o
equilíbrio de ácido-base da molécula. Todavia a correspondente alteração do pKa deve ser
olhada com algum cuidado pois poderá ter um efeito significativo tanto nas propriedades
farmacocinéticas (por variação do valor do equilibrio hidrófilo-lipófilo) como na sua
capacidade de ligação ao receptor. Sendo o átomo de fluor muito electronegativo vai,
obviamente, retirar densidade electrónica aos átomos adjacentes, colocando-os com maior
acidez. A acidez acrescida poderá, eventualmente, aumentar a acção in vitro por facilitar a
ligação a um receptor. Todavia, a sua acção farmacológica in vivo poderá diminuir devido à
diminuição, por exemplo, da sua biodisponibilidade. De facto, uma molécula mais ácida
pode apresentar mais dificuldade em atravessar as membranas e, portanto, atingir o local de
23
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
acção. Assim é crucial que se tenha em conta a existência de um equilíbrio óptimo entre
estes parâmetros (pKa, polaridade, natureza e conformação da molécula, interacções
fármaco-receptor, entre outros) (Böhm et al., 2004). Outra característica inerente à
existência de flúor na molécula é a capacidade de alteração da lipofilia da molécula,
definida pelo coeficiente de partição de uma substância entre a fase aquosa e a fase
orgânica. Esta característica associada à alta polaridade que o átomo de flúor confere,
promovem um equilíbrio entre a lipofilia pretendida e a polaridade da molécula, de modo a
que a afinidade para com os receptores não seja comprometida por excesso de lipofilia e a
biodisponibilidade também não por baixa de solubilidade (Böhm et al., 2004). Existe, no
entanto, a ideia errada que a fluorinação aumenta sempre a lipofilia das moléculas. O que
faz com que haja um aumento da lipofilia nas moléculas aromáticas é a excelente
sobroposição entre as orbitais 2s ou 2p do flúor com as orbitais correspondentes do
carbono, fazendo com que a ligação C-F não seja facilmente polarizável (Purser et al.,
2008).
Este estudo foi efectuado seleccionando cinco compostos que foram estudados de acordo
com os seguintes processos:
i) Optimização geométrica das moléculas (em estado gasoso) utilizando o programa
Gaussian 03 que executa a optimização da geometria da molécula por métodos da
teoria DFT (Density Functional Theory). A geometria optimizada tem como critério
a minimização da energia da molécula, calculada por métodos ab-initio. A
optimização geométrica permite inferir sobre aspectos estruturais, nomeadamente os
conformacionais.
ii) Cálculos das cargas atómicas das moléculas optimizadas por análise NPA
(Natural Population Analysis). A análise das variações das cargas atómicas permite
discutir a polaridade relativa dos locais identificados como os responsáveis pelas
relações estrutura-actividade.
iii) Cálculos das superfícies de potencial isoelectrónicas que permitem estabelecer
quais as diferenças de polaridade na superfície das moléculas, para o mesmo
afastamento do núcleo atómico. Assim pode-se avaliar, para a mesma distância dos
24
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
núcleos atómicos (mesmo volume), as diferenças entre as polaridades.
3.2. Métodos computacionais: breve descrição
3.2.1. Calculo da energia molecular por ab-initio
Num sistema multi-partícula utiliza-se a equação de Schroedinger independente do tempo
para executar o cálculo da enegia, E, do sistema em determinado instante:
ĤΨ ( x1 , y1 , z1....., xn , yn , zn )  EΨ ( x1 , y1 , z1....., xn , yn , z n )
3.1
onde a função de onda molecular Ψ é dada pelo produto das funções de onda atómicas e o
hamiltoniano molecular Ĥ é tomado como a soma dos hamiltonianos atómicos dos átomos
constituintes das molécula. Na aproximação de Born-Oppenheimer consideram-se os
movimentos electrónicos separados dos nucleares de modo a simplificar o hamiltoniano,
que passa a ser composto pelo hamiltoniano electrónico e nuclear:
ĤTotal  Ĥ electrónico  Ĥ nuclear
3.2
procedendo-se, com base nestes e nas funções de onda electrónicas, ao cálculo das energias
electrónicas, energias nucleares e funções de onda que descrevem a translacção, rotação e
vibração das moléculas:
ETotal  E electrónico  E nuclear
3.3
Ĥ electrónicoelectronico  Eelectronico electronico
3.4
onde
e
25
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
E
electronica

(r1 , r2 ...rn )  Kˆ n nuclear  Enuclearnuclear  Enuclear (rotação  translaão vibração)
3.5
3.2.2. O método SCF
O método SCF (Self-Consistent-Field) é um método que utiliza fundamentalmente 3 etapas
para realizar o cálculo das energias moleculares:
- A definição do hamiltoniano molecular pelo método de Born-Oppenheimer;
- A definição das funções de onda do sistema com base numa selecção prévia de
funções ou funcionais com o objectivo de ser aplicada numa solução de triagem.
Estas funções de onda que permitem descrever o estado fundamental das moléculas
são representadas por determinantes (por exemplo os determinantes de Slater).
- O estabelecimento de uma equação de onda de triagem semelhante à equação de
Schroedinger, denominada equação de Hartree-Fock, HF:
F̂i  Ei i
3.6
que é resolvida iterativamente para se efectuar o cálculo dos valores próprios.
Na equação 3.6 , F̂i refere-se ao operador de Fock e i às funcionais de onda moleculares.
O operador de Fock integra o operador para cálculo da energia cinética, o operador para
cálculo de energia potencial de repulsão intranuclear, o operador para a energia potencial de
atração nuclear-electrónica e de repulsão electrónica e o operador da energia de intercâmbio
inter-electrónica. Para escrever o operador de Fock é necessário fazer um processo iterativo
denominado “self-consistent-field” acrónimo de SCF, pois F̂i é também função das
funcionais i que definem as orbitais moleculares, ou seja, para definir F̂i deve-se
conhecer i e para se definir i deve-se conhecer F̂i de acordo com 3.6.
26
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Assim sendo, faz-se uma triagem com umas funcionais de onda moleculares obtidas por um
método semi-empírico que serão utilizadas para a construção do operador. Este,
posteriormente, será utilizado para efectuar o cálculo de novas funcionais, e assim
sucessivamente até que não se encontrem diferenças significativas entre os resulatdos
actuais e os prévios.
3.2.3. As energias obtidas
Os valores das energias obtidas após a resolução da equação de HF , Ei correspondem à
energia de orbital ou energia uni-electrónica que se poderá interpretar como sendo a energia
que um electrão possuirá na orfital molecular i e que resulta da sua energia cinética e
potencial (de atracção nuclear, de repulsão electrónica e de intercâmbio) devida a todos os
outros electrões presentes nas orbitas  j
2
.
A energia total HF é dada pela soma da energia dos electrões Ei que, após alguns factores
correctivos dá a energia electrónica, Eele , e a energia potencial de repulsão intra-nuclear
Vnn .
E ( HF )  Eele  Vnn
3.7
A conformação nuclear que fornecer a E (HF ) miníma é tomada como sendo a geometria
molecular de equilíbrio e portanto as energias electrónicas e as funções de ondas
descriptoras das orbitais aí obtidas são as tomadas como as correspondentes ao estado
estacionário de energia mínima.
Para que haja garantia de que a conformação obtida corresponde a um mínimo pelo menos
local, executa-se um cálculo posterior das frequência de vibração nucleares (definidoras da
função de onda de vibração nuclear) de modo a verificar a ausência de valores negativos
correspondentes a frequências imaginárias.
27
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
3.2.4. As bases para as funcionais.
Como foi referido em 3.2.2. para executar os cálculos HF há que definir as funções de onda
do sistema com base numa selecção prévia de funções ou funcionais com o objectivo de ser
aplicada numa solução de triagem. No programa de cálculo que foi utilizado para executar
este trabalho essas funções são do tipo gaussianas onde, a densidade electrónica em função
da distância nuclear (r) é dada por uma exponencial:
R(r )  Ae r
2
3.8
Estas funções definem funcionais que descrevem orbitais atómicas. A base de funcionais
definidas para executar o cálculo das geometrias de equilíbrio e das respectivas energias foi
a 6-311G(d,p) que refere que cada orbital interna foi descrita pela soma de 6 gaussianas
sendo cada orbital de valência dividida em parte externa e interna e descrita por 3 e 1
gaussianas, respectivamente.
3.2.5. Teoria de DFT (Density Functional Theory)
Na teoria de Hartree-Fock a energia, E(HF), é calculada pela seguinte expressão:
E ( HF )  Eele  Vnn
n
n


E ( HF )   2 Ei   J ij  K ij   Vnn
i 1 
j 1

3.9
3.10
Onde V se refere à energia de repulsão nuclear, Ei à energia uni-electrónica que engloba a
componente cinética e a potencial, J ij à energia de repulsão de Coulomb clássica entre
28
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
electrões e o termo K ij refere-se à energia de permuta resultante da natureza quântica dos
electrões.
Na teoria de densidade funcional o determinante correspondente à permuta energética K ij ,
é substituído por uma funcional de permuta correlacional que inclui os termos para a
energia de permuta EX (funcional de permuta) e para a correlação electrónica EC
(funcional de correlação electrónica) originando E(KS),
n
n


E ( KS )   2 Ei   J ij  ( EX  EC )   Vnn
i 1 
j 1

3.11
As funcionais utilizadas na teoria DFT são integrais de funções de densidade ou de
gradientes de densidade.
3.2.6. Superficies de energia
Para as estruturas optimizadas pode-se executar o cálculo de superficies de energia
potencial que é a representação multidimensional da densidade electrónica retirada da
densidade do SCF onde o potencial electrónico (ESP) é mapeado nessa superficie.
As superfícies mapeadas são as superfícies onde uma propriedade é mapeada para uma
superfície criada por outra propriedade. Neste exemplo é mapeado o potencial eletrostático
(ESP) sobre uma superfície de densidade electrónica dada pelo cálculo de SCF (Self
Consisting Field). Numa superfície de densidade ESP-mapeada, a superfície de densidade
eletrónica dá a forma da superfície, enquanto o valor do potencial electrostático nesse ponto
superficial (ESP) é dado por cores.
O potencial eletrostático (ESP) corresponde à energia potencial teoricamente “sentida” por
uma “carga teste positiva” num determinado ponto no espaço. Se o ESP é negativo então a
região é estável ou favorável à aproximação de uma carga teste positiva. Inversamente, se o
29
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
ESP é positivo em determinada região é porque existe relativa instabilidade da região ao
teste “positivo”. Assim, uma superfície de densidade mapeada por ESP pode ser usada para
mostrar as regiões de uma molécula que podem ser mais favoráveis ao ataque nucleofílico
ou eletrofílico, fazendo com que tais superfícies sejam úteis para interpretações qualitativas
da ligação fármaco-receptor. Outra maneira de interpretar as superfícies de densidade ESP
mapeadas é inferir que elas mostram, “onde" é que a densidade electrónica para a
“molécula fronteira” (construída pelo valor de distância radial aos seus núcleos) é maior
(ou menor) em relação ao núcleo.
3.2.7 Metodologia adoptada
Os cálculos ab initio foram executados com o programa Gaussian 03 (2007) utilizando o
nível de teoria B3LYP/6-311G++(d,p). B3LYP refere-se à combinação das funcionais
híbridas de permuta de Becke (Becke, 1997) com as funcionais de correlação de gradiente
de Lee & Yang (1998), 6-311G++(d,p) refere-se a um conjunto de bases de cisão de
valência polarizadas.
Foram também calculadas as orbitais moleculares, assim como, as cargas atribuídas a cada
átomo por uma análise de NPA (Natural Population Analysis Phase) das NBO (Natural
Bond Orbital Analysis) de acordo com Carpenter & Weinhold (1998). Para o mesmo nível
de teoria foram feitos os cálculos das frequências de vibração dos compostos de modo a se
poder verificar que a estrutura convergiu para um mínimo, pelo critério de obtenção de zero
frequências imaginárias.
O programa GaussView 3.0 (2007), foi utilizado para a visualização gráfica dos resultados
e para executar as imagens apresentadas para a optimização geométrica, as superfícies de
potencial e a distribuição de cargas.
30
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
IV. RESULTADOS E DISCUSSÃO
31
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
4.1. Considerações gerais
Neste capítulo é feita uma apresentação e interpretação dos resultados obtidos. Na Figura 8
encontra-se um resumo condensado das estruturas químicas das moléculas que foram
estudadas. Iniciam-se estas considerações por uma análise comparativa dos aspectos
conformacionais das moléculas e apresentam-se os valores das energias mínimas obtidas
para cada uma delas, bem como os seus momentos dipolares, em resultado das
optimizações geométricas feitas fazendo uma comparação visual entre as principais
diferenças entre elas. Finalmente faz-se uma análise das superfícies de densidade
electrónicas que foram mapeadas tendo em conta o seu potencial electrostático para
determinada distância nuclear.
4.2. Optimizações geométricas
Para cada uma das moleculas em estudo, foram efectuadas várias optimizações geométricas
e o cálculo das respectivas frequências de vibração, para garantir que a energia obtida
correspondia a um mínimo devido à inexistência de frequências imaginárias. Na figura 9
encontram-se
as
estruturas
optimizadas
para
a
sparfloxaxina
e
para
a
cicloheptagemifloxacina que são quinolonas de 3ª geração. Estas quinolonas apresentam
actividade contra agentres Gram- e Gram + sendo os medicamentos de eleição no
tratamente de doenças respiratórias quando há resistência aos beta-lactâmicos. A
conformação obtida quando um átomo de fluor é substituído por um átomo de hidrogénio
está no lado direito. A figura 9.2 mostra as estruturas optimizadas para as restantes
fluorquinolonas utilizadas neste estudo, a gatifloxacina, a sarafloxacina e a sitafloxacina
que são fluorquinolonas de 4ª geração. Estas ainda não se encontram no mercado mas os
dados até agora existentes sugeram que apresentam o mesmo espectro de acção das
anteriores gerações com alargamento para bacterias anaeróbias, melhor e maior actividade
contra Gram+ e espécies resistentes e com excelentes resultados no tratamento de infecções
do sistema respiratório.
32
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
O
5
4
6
7
2
8
N1
COOH
3
N1
C5
C6
—NH2
—F
—NH2
—H
—F
Cicloheptilgemifloxacina
(F)
—H
—F
—Cl
Cicloheptilgemifloxacina
(H)
—H
—H
—Cl
Sparfloxacina (F)
C7
C8
—F
Sparfloxacina (H)
Figura 9.1 – Representação esquemática das fluoroquinolonas usadas no estudo. No início
da tabela encontra-se esquematizado o farmacóforo.
33
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
O
5
4
6
7
2
8
N1
Gatifloxacina (F)
COOH
3
N1
C5
C6
C7
C8
—H
—F
—OH
—H
—H
—OH
Gatifloxacina (H)
—H
—F
—H
Sarafloxacina (F)
Sarafloxacina (H)
—H
—H
—H
—H
—F
—Cl
—H
—H
—Cl
Sitafloxacina (F)
Sitafloxacina (H)
Figura 9.2 (continuação) - Representação esquemática das fluoroquinolonas usadas no
estudo. No início da tabela encontra-se esquematizado o farmacóforo.
34
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Os valores obtidos para as energias electrónicas de cada molecula e para os momentos
dipolares encontram-se na Tabela II. Os valores das energias representam a estabilidade de
cada molécula, embora não se possa fazer uma comparação directa entre diferentes
moléculas devido à composição atómica diferente entre cada uma.
Figura 10.1 – Geometria molecular da sparfloxaxina neutra (em cima à esquerda) e para a
Cicloheptanogemifloxaxina (em baixo, à esquerda) obtidas por optimização para uma
energia mínima com o nível de teoria B3LYP/6-311G++(d,p). A sparfloxaxina é uma
fluorquinolona de 3ª geração com actividade contra Gram- igual à 2ª geração, exceptuando
contra P. Aeruginosa. Boa actividade contra Gram+. A cicloheptilgemifloxaxiona (em
baixo, à esquerda) é derivada da genifloxaxina que também é uma fluorquinilona de 3ª
geração. As estruturas à direita referem-se às estruturas onde o átomo de fluor na posição 6
foi substituido por um átomo de hidrogénio.
35
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
.
Figura 10.2 - Geometrias optimizadas para os compostos estudados obtidas por cálculos ab
initio no nível de teoria B3LYP/6-311G++(d,p), para a gatifloxaxina (em cima à esquerda)
para a sarafloxaxina (no meio, à esquerda) e para a sitafloxacina (em baixo, à esquerda). À
direita encontram-se as conformações moleculares substituidas em C6 por hidrogénio.Estas
quinolonas pertencem à 4ª geração e apresentam o mesmo espectro de acção das anteriores
gerações com alargamento para bacterias anaeróbias, melhor e maior actividade contra
Gram+ e espécies resistentes.
36
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Tabela II - Energias mínimas e momentos dipolares para os compostos em estudo, obtidos
pela teoria B3LYP/6-311G++(d,p).
Composto
Nome Sistemático
(internacional)
E1/Harttres
Momento
Dipolar /D
Sparfloxacina (F)
Ácido 5-amino-1-ciclopropil7-[(3R,5S)3,5dimetilpiperazina-
-1381,98609196
7,1082
1-il]-6,8-difluoro-4-oxoquinolona-3-carboxílico
-1282,72525357
7,3794
Ácido 7-cicloheptil-8-cloro1-ciclopropil- 6-fluoro- 4oxo- 1,4- dihidroquinolona3-carboxílico
-1615,54976287
7,7722
-1516,28762502
7,3088
Ácido 1-ciclopropyl-6-fluoro8-metoxi-7-(3metilpiperazina-1-il)- 4-oxoquinolina-3-carboxílico
-1302,58758929
11,3760
-1203,32386852
11,6417
Ácido 6-fluoro-1-(4fluorofenil)-4-oxo-7piperazina-1-ilquinolona-3carboxílico
-1362,35705102
7,3520
-1263,09092475
7,5587
-1784,97685654
5,9785
-1685,71299472
6,9219
Sparfloxacina (H)
Cicloheptilgemifloxaxina
(F)
Cicloheptilgemifloxacina
(H)
Gatifloxacina (F)
Gatifloxacina (H)
Sarafloxacina (F)
Sarafloxacina (H)
Sitafloxacina (F)
Sitafloxacina (H)
Ácido 7- [(4S)- 4-amino- 6azaspiro [2.4] heptan- 6-il]- 8cloro- 6-fluoro- 1- [(2S)- 2fluorociclopropil]- 4oxoquinolona- 3-carboxílico
1
(RB+HF+LYP)
37
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
4.3. Aspectos conformacionais
As conformações apresentadas por cada molécula são importantes pois estas são decisivas
na ligação ao receptor. Para avaliar de forma sistematizada as principais diferenças
conformacionais existentes entre as fluorquinolonas optou-se por fazer uma análise com
base em cinco ângulos de torção, os especificados na figura da tabela III. O ângulo Ψ1º
refere-se à distorção na ligação C8’-N1 do anel da quinolona; Ψ2º refere-se à distorção do
substituinte em N1; Ψ3º refere-se à distorção do grupo carboxílico em C3; Ψ4º refere-se à
distorção em torno da ligação C6-C7 do anel da quinolona devido aos substituintes
presentes nesses átomos e Ψ5º refere-se à distorção do substituinte em C7 relativamente ao
anel da quinolona.
Pela análise dos valores obtidos para 1 verifica-se que a presença do substituinte
ciclopropilo impõe um ligeira distorção do anel da quinolona em relação à planariedade
quando comparada com a presença de um substituite fenilo em N1. Esta torção é superior
para os compostos com um átomo de cloro substituído em C8, provavelmente devido à
tensão estéria que o átomo de cloro, volumoso, promove em relação ao ciclopropilo. No
entanto para a mesma molécula a susbtituição de –F por –H em C7 não altera a
conformação nesta parte da molécula.
Relativamente ao ângulo que define a torção do substituinte em N1 em relação ao anel da
quinolona, verifica-se que na sarafloxacina, a única que possui um substituinte
parafluorfenilo (quando nas restantes este é um ciclopropilo ou derivado), o anel fenílico
encontra-se praticamente prependicular ao da quinilona. Relativamente às restantes
quinolonas há a salientar o caso da gatifloxacina, cujo o anel cíclico alifático se encontra
posicionada para baixo do plano da quinolona, provavelmente devido a efeitos
esterioquímicos proporcionados pela proximidade de grupo hidroxilo. Estas diferenças
encontram-se ilustradas na figura 10 para melhor visualização. A substituição do átomo de
fluor por um de hidrogénio na posição 6 parece ter mais efeito no ângulo de torção 2 no
caso da cicloheptogemifloxacina e da sitafloxacina sugerindo qhe o efeito de retirada de
densidade electrónica por parte do fluor se faz sentir, devido à aromaticidade do anel, até ao
átomo de cloro. Esta redução da densidade electrónica em torno do átomo de cloro diminui
38
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
o impedimento esterioquímico do cloro relativamente ao anel ciclo-alifático, diminuindo a
torção en torno da ligação N1-C1’.
Relativamente à torção a nível do grupo carboxílico verifica-se que esta é menor na
gatifloxaxina e na sarafloxaxina. A substituição do átomo de flúor por um átomo de
hidrogénio não induz grande distorção a nível da ligação adjacente à posição 7 com
excepção para a gatifloxacina.
39
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Tabela III – Valores para alguns ângulos de torção das quinilonas estudadas. O ângulo Ψ1º
refere-se à distorção na ligação C8’-N1 do anel da quinolona; Ψ2º refere-se à distorção do
substituinte em N1; Ψ3º refere-se à distorção do grupo carboxílico em C3; Ψ4º refere-se à
distorção em torno da ligação C6-C7 do anel da quinolona devido aos substituintes
presentes nesses átomos e Ψ5º refere-se à distorção do substituinte em C7 relativamente ao
anel da quinolona, como mostra a figura abaixo.
O
H'/F'
5



4
6
C 3'
3
7
N 7'
O3 '
C8'
8

C 7'

OH
2
N1
C 1'
R'
Ψ1/º
Ψ2/º
Ψ3/º
Ψ4/º
Ψ5/º
Sparfloxacina (F)
-16,3
42,6
-15,0
5,7
-138,4
Sparfloxacina (H)
-16,3
42,6
-15,0
5,3
-138,4
Cicloheptilgemifloxacina (F)
-28,3
-45,7
-12,1
2,5
-92,3
Cicloheptilgemifloxacina (H)
-26,2
-53,3
-14,0
2,4
-92,3
Gatifloxacina (F)
18,6
-40,6
0,1
-0,9
144,3
Gatifloxacina (H)
18,8
-40,1
-0,2
-3,6
144,1
Sarafloxacina (F)
0,3
90,5
-0,2
-0,4
-163,8
Sarafloxacina (H)
0,2
90,1
-0,2
-0,4
-163,7
Sitafloxacina (F)
-25,9
45,2
-9,4
3,6
-121,9
Sitafloxacina (H)
-25,9
58,1
-9,4
3,6
-121,6
40
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Valores
para
ângulos Ψ5
os
Ψ2 da
e
sparfloxacina.
Valores
para
ângulos Ψ5
e
os
Ψ2 da
gatifloxacina.
Conformação
da
sarafloxacina com
os valores para os
ângulos Ψ5 e Ψ2.
Figura 11 – Estrutura molecular da sparfloxacina, da gatifloxacina e da sarafloxacina
mostrando a conformação quando as moléculas se encontram com a anel da quinolona
prependicular ao plano da folha, de modo a evidenciar a posição relativa dos substituintes
em N1 e C8.
41
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Finalmente há a referir que as quinolonas estudadas apresentam também uma elevada
torção do anel susbtituído em C7 em relação ao núcleo da quinolona. Esta torção é mais
elevada para a sarafloxaxina, provavelmente devido às características desse substituinte. A
gatifloxaxina também tem um anel derivado da piperazina nessa posição mas devido à
proximidade do grupo hidroxilo, este anel poderá ser forçado a afastar-se e não torcer
livremente.
4.4. Polaridades e distribuição de cargas
As cargas dos átomos constiutintes de cada molécula e a polaridade a estas associada têm
grande importância na ligação fármaco-receptor, o que torna importante a comparação dos
momentos dipolares de cada molecula (Tabela II). O momento dipolar de uma molécula
representa uma medida quantitativa da polaridade de cada molécula, consequência da
desigual distribuição de cargas em torno das mesmas.
Verifica-se que, regra geral, a substituição do átomo de flúor por um átomo de hidrogénio
diminui
o
momento
dipolar
da
molécula,
com
excepção
feita
para
a
cicloheptilgemifloxacina que teve um resultado oposto.
Esta molécula é a única que não possui um anel heterocíclico na posição 7, pelo que as
observações sugerem que o efeito de diminuição do momento dipolar, por acção do átomo
de flúor, se prende com a capacidade que este poderá exibir de retirar a densidade
electrónica do anel cíclico em C7. Quando o anel é heterocíclico, a retirada de densidade
electrónica pelo átomo de flúor contribui para uma distribuiçãoo mais equitativa de carga,
por equilíbrio com os efeitos indutivos dos átomos de azoto.
Para além do momento dipolar, interessa igualmente saber quais as cargas associadas a
cada átomo, pois desta forma poder-se-ão apontar locais de ligação preferencial a regiões
hidrófilas ou lipófilas do receptor ou verificar quais os locais que poderão mais facilmente
induzir polaridade nessas regiões receptoras. Estes valores foram obtidos tendo em conta o
facto de as optimizações moleculares terem sido feitas com base num modelo teórico de
distribuição no estado gasoso, logo há que ter este factor em conta na análise dos valores
42
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
em termos absolutos. No entanto, como os erros que possam estar associados são
sistemáticos e horizontais, é perfeitamente legítimo proceder a uma análise relativa dos
resultados.
Na Tabela IV encotram-se os valores das cargas para os diferentes átomos de cada uma das
moléculas, tanto na sua constituição original como com a substituição por hidrogénio em
C6 .
Através dos dados da Tabela IV é possível verificar que, a influência da troca do átomo de
flúor por um de hidrogénio em C6 tem repercurssões nos valores das cargas
maioritariamente dos átomos vizinhos (de C4’ a C8’), sendo as alterações provocadas nos
restantes átomos pouco relevantes ou praticamente inexistentes.
Na gatifloxacina verifica-se um menor alcance da imposição de distribuiçãoo de carga por
parte do flúor.
4.5. Superfícies de isopotencial electrónico
No que toca à ligação fármaco-receptor não só as cargas do átomos e a polaridade da
molecula interessam. A forma como a molécula se aproxima do seu receptor implica que
haja um processo dinâmico de re-distribuição de carga à sua superfície, o que faz com que
haja uma interacção das diferentes distribuições de carga electrónica molecular, para a
mesma distância (raio) ao núcleo dos átomos. Isto acontece pois aquando da aproximação
do fármaco ao respectivo receptor, um grupo de moléculas formam um “espaço” para
permitir a ligação, o que vai então obrigar a haver um re-arranjo desse mesmo local para
dar lugar ao estabelecimento de ligações intramoleculares electroestáticas, hidrofóbicas ou
hidrofílicas (consoante a natureza da molécula).
43
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
44
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Assim, deve ser feita uma análise da distribuição de carga superficial da molécula para a
mesma distância ao núcleo dos átomos que a constituem, ou seja, o seu potencial
electroestático (ESP) sobre a superfície de densidade electrónica (SCF). Através das
superficies de densidade ESP, é possível visualizar a forma da superfície de densidade
electrónica, enquanto que o valor do potencial elctroestático num determinado ponto
superficial (ESP) é-nos dado por cores. Se o ESP nesse ponto for negativo então essa
mesma região é estável e favorável à aproximação de uma carga positiva, enquanto que se
nesse ponto a carga for positiva é relativamente instável. Assim, a partir da análise da
superfície de densidade de cada molécula é possível interpretar qualitativamente as ligações
fármaco-receptor. Também é possível visualizar as distâncias (raio) de cada molécula ao
seu núcleo.
As cores de cada “nuvem” correspondem aos valores da ESP na superfície da densidade
electrónica. Assim, as regiões vermelhas com uma “base” amarelada correspondem às
regiões mais electronegativas, ou seja, como supracitado, de interacção favorável perante a
aproximação de cargas positivas. As regiões azuis e verdes são carregadas positivamente,
logo menos estáveis à aproximação de cargas positivas.
Sparfloxaxina
45
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
Gatifloxacina
Sitafloxacina
Cicloheptilgemifloxacina
Figura 12 - Potencial electrostático representado em superfícies de densidade electronica
para as moléculas em estudo. As regiões c azul e verde são carregadas positivamente e as
regiões com maior densidade electrónica são de cor vermelha e amarela. As superficies
foram todas mapeadas com ESP e a densidade electrónica tirada da densidade SCF, com
um isovalor de 0.04.
46
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
gerações.
4.6. Considerações finais
Através deste estudo foi possível estudar o efeito do substituinte “-F” nas propriedades
electrónicas e estruturais de algumas fluoroquinolonas de 3ª e 4ª gerações.
É possível concluir que, de um modo geral, a presença de um átomo de flúor ou de
hidrogénio em C6 não tem grande influência na conformação espacial da molécula mas sim
na sua distribuição de cargas, nos valores dos momentos dipolares e das respectivas cargas
associadas a cada átomo.
A presença de um átomo de flúor em C6 aumenta a potência de acção das quinolonas. Esta
variação pode estar ligada ao facto do flúor aumentar a estabilidade de ligação ao receptor
por tornar a quinolona mais electronegativa nesta zona. Conclui-se também que o efeito de
re-distribuição
de
densidade
electrónica
promovido
pelo
flúor
se
fez
sentir
preferencialmente ao nível do anel da quinolona tendo sido a gatifloxacina o exemplo mais
notório.
47
Efeito do substituinte “–F” nas propriedades electrónicas e estruturais das Fluorquinolonas de 3ª e 4ª
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