— janeiro 2013 QUALIDADE DO LEITE marcos veiga dos Santos Professor Associado Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP www.marcosveiga.net A CCS individuAl dAS vACAS, quAndo reAlizAdA menSAlmente, é umA ferrAmentA eSSenCiAl pArA um progrAmA de Controle CONTAGEM DE CÉLULAS SOMÁTICAS O que pode afetar? de mAStite A ocorrência de mastite é o principal fator que afeta a CCS. Além da infecção intramamária, outros fatores podem ter efeito indireto sobre a CCS, como a época do ano, o estágio de lactação, a idade da vaca, entre outros. Assim, o entendimento dos fatores que afetam a CCS é fundamental para a correta interpretação dos resultados obtidos A saúde da glândula mamária está diretamente relacionada com o bem estar das vacas leiteiras e lucratividade de fazendas leiteiras, visto que a ocorrência de mastite pode causar dor e desconforto, além de redução da produção de leite. A contagem de células somáticas (CCS) é um dos principais critérios para o monitoramento de mastite em nível individual e de rebanhos, assim como para a » 36 avaliação da qualidade do leite. Adicionalmente, a CCS também está relacionada com o aumento do risco da ocorrência de resíduos de antibióticos em rebanhos leiteiros, em razão da maior utilização de tratamentos intramamários. Finalmente, rebanhos com alta CCS, além de apresentar maior nível de infecções intramamárias, podem apresentar maior contagem bacteriana total e deficiências na higiene de produção de leite. Variações na CCS As células somáticas do leite são compostas basicamente por leucócitos originários do sangue e por células epiteliais de descamação da glândula mamária. Os leucócitos fazem parte do sistema imune, cujos componentes principais são: neutrófilos, linfócitos e macrófagos. Em — janeiro 2013 QUADRO 1. CCS MÉDIA, PRODUÇÃO DE LEITE E PORCENTAGENS DE PROTEÍNA E GORDURA EM VACAS DA RAÇA HOLANDESA, SEGUNDO A ORDEM DE LACTAÇÃO. (ADAPTADO DE CUNHA ET AL. 2008) CCS (x100 cel/ml) FIGURA1. MÉDIA GEOMÉTRICA DE CCS DE VACAS SEM ISOLAMENTO BACTERIANO NA PRIMEIRA () SEGUNDA (∆) E TERCEIRA () LACTAÇÃO, EM DIVERSOS ESTÁGIOS DE LACTAÇÃO. FONTE: ADAPTADO DE (LAEVENS ET AL., 1997). Dias em lactação quartos mamários sadios, os macrófagos predominam (66-88%) e os neutrófilos representam até 11%. No entanto, durante uma infecção intramamária, os neutrófilos podem compor até 90% das células somáticas presentes no leite. Após o início de um novo caso de mastite, ocorre rápido aumento da CCS do quarto infectado. O objetivo destas células é eliminar as bactérias existentes, sendo que quando ocorre a resolução do caso de mastite, a CCS do leite retorna aos limites considerados normais dentro de algumas semanas. Contudo, quando o sistema imune não elimina o agente causador, a CCS permanece acima do limite normal por longo período, ainda que possa sofrer variação ao longo do tempo. A ocorrência de mastite é o principal fa- tor que afeta a CCS. Além da infecção intramamária, outros fatores podem ter efeito indireto sobre a CCS, como a época do ano, o estágio de lactação e a idade da vaca (Figura 1). Pode-se observar aumento de CCS à medida que a idade da vaca e o estágio de lactação avançam, em razão da maior resposta celular de vacas adultas, aumento da prevalência de infecções e lesões residuais de infecções anteriores. Observa-se grande elevação da CCS após o parto, sendo que ocorre retorno para níveis normais após cerca 8 a 14 dias. Pode ser observado também aumento da CCS antes da secagem, quando a produção de leite por vaca fica reduzida. Entretanto, tanto a idade como o estágio de lactação não alteram a CCS em vacas não-infectadas, uma vez que o aumento — janeiro 2013 QUALIDADE DO LEITE Atualmente, o limite de CCS de 200.000 cél/ml pode ser utilizado em condições de campo para distinguir entre quartos infectados ou não, visando minimizar os erros de diagnóstico da CCS observado no final da lactação está associado à maior probabilidade do animal ter se infectado ao longo da lactação e na medida em que fica mais velho. A frequência de ordenha também pode afetar a CCS. A mudança de 2 para 3 ordenhas/dia pode reduzir a CCS do tanque e a porcentagem de vacas infectadas no rebanho, enquanto que o aumento da frequência de ordenhas pode causar aumento da CCS. O aumento do número de lactações causa progressivo aumento da CCS (Quadro 1). A CCS em novilhas sadias tende a variar entre 20.000 e 100.000 céls/mL. Em contrapartida, a elevação da CCS no leite em função do aumento do número de lactações se explica parcialmente, pelo aumento de células epiteliais no leite, provenientes da descamação da glândula de vacas mais velhas, e pela maior susceptibilidade desses animais às infecções intramamárias. Como avaliar O diagnóstico indireto de mastite pode ser feito pelo uso da CCS e/ou da realização de culturas microbiológicas a partir de amostras do quarto mamário. Entretanto, o uso de culturas microbiológicas requer mais tempo, mão-de-obra e podem representar custos elevados em situações de campo, além disso, nem sempre estão disponíveis aos produtores. Ainda que possa apresentar erros de identificação, como em qualquer método diagnóstico, pode-se estabelecer um limite máximo de CCS como indicativo para diferenciar entre um quarto infectado ou não. Com base em estudos realizados, a média geométrica da CCS de quartos não-infectados é de aproximadamente 70.000 cél/ml, enquanto a média aritmética é de 187.000 cél/ml. » 38 Atualmente, o limite de CCS de 200.000 cél/ml pode ser utilizado em condições de campo para distinguir entre quartos infectados ou não, visando minimizar os erros de diagnóstico. Dessa forma, a variação da CCS de uma vaca entre dois meses consecutivos pode ser usada como indicativo da ocorrência de uma nova infecção. Contudo, deve-se destacar que a escolha de um único limite de CCS não é adequada para todas as situações nas quais se deseja tomar decisões baseadas na CCS de uma vaca. Resultados da CCS individual A CCS individual das vacas, quando realizada mensalmente, é uma ferramenta essencial para um programa de controle de mastite e pode ser utilizada nos seguintes casos: a) Avaliação da prevalência de mastite subclínica; b) Identificação de vacas com mastite crônica; c) Estimativa da contribuição relativa de vacas com alta CCS para a CCS do tanque; d) Estimativa das perdas de produção de leite; e) Avaliação da qualidade do leite produzido na fazenda. Os resultados da CCS individual das vacas podem ser utilizados para avaliar a sanidade da glândula mamária por meio da estimativa do número de animais com mastite subclínica (p. ex., vacas com CCS acima de 200.000 cél/mL de leite). Pode-se utilizar a CCS para monitorar o programa de controle de mastite adotado, bem como para identificar animais infectados cronicamente que apresentam CCS alta por vários meses e a taxa de novas infecções. As vacas com mastite crônica podem ser identificadas e posteriormente selecionadas para descarte ou para secagem antecipada, uma vez que a terapia da vaca seca apresenta taxa de cura superior ao tratamento durante a lactação. Para uma correta interpretação da CCS individual de vacas, recomenda-se que esses resultados sejam distribuídos em função dos dias em lactação e número de lactação dos animais, o que permite identificar a provável origem da mastite, as medidas de controle que devem ser empregadas e a eficácia geral do programa de controle. Os dados da CCS devem ser organizados de forma a possibilitar a identificação de variações sazonais e definir estratégias de controle para os períodos mais críticos do ano. O entendimento dos fatores que afetam a CCS é fundamental para a correta interpretação dos resultados obtidos. O fator que tem maior efeito sobre a CCS é o nível de infecção da glândula mamária. Vacas sadias apresentam CCS significativamente menor que as vacas infectadas, ainda que exista grande variação em função dos demais fatores, como por exemplo, a idade dos animais.