(Catapora) na gestaçao

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Varicella (Chickenpox) in pregnancy
Resumo
Infecção primária por varicela durante o primeiro e segundo trimestre de gravidez pode
aumentar o risco de síndrome de varicela congênita em 0,5-1,5% sobre o risco basal
de malformações congênitas severas. A infecção no terceiro trimestre pode conduzir a
pneumonia materna, que pode ser letal se não tratada adequadamente. Ao contrário da
infecção primária na gravidez, não estão descritas complicações fetais pelo herpes zoster,
exceto na sua forma disseminada. Imunoglobulina para varicela-zoster (IGVZ) deve ser
administrada o mais breve possível, preferencialmente dentro de 96 h de exposição, para
prevenir infecção materna ou complicações subseqüentes. Depois de 96 h, a efetividade da
IGVZ não foi avaliada. Varicela neonatal é mais severa se a erupção cutânea materna aparecer
entre 5 dias antes ou 2 dias após o parto; ao recém-nascido deve ser administrado IGVZ
imediatamente. Aciclovir intravenoso é recomendado para pneumonia materna e neonatal
severas. Nenhum estudo controlado ainda avaliou a efetividade de aciclovir ou valaciclovir
para profilaxia pós-exposição de gestantes ou neonatos. O advento de técnicas de imagem
avançadas e a biologia molecular melhoram o diagnóstico pré-natal. Com o aumento da
vacinação, é esperado que a incidência de catapora na gravidez diminua no futuro.
At u a l i z a ç ã o
Varicela (Catapora) na gestação
Wellington de Paula Martins
Carolina Oliveira Nastri
Cláudia Oliveira Baraldi
Geraldo Duarte
Francisco Mauad-Filho
Palavras-chave
Gestação
Varicela
Catapora
Transmissão vertical
Keywords
Pregnancy
Varicella
Chickenpox
Vertical infection
Abstract
Varicella infection during the first and second trimester of pregnancy may increase the risk
for congenital varicella syndrome 0.5-1.5% above the baseline risk for major malformation.
Third trimester infection may lead to maternal pneumonia which can be life threatening if not
treated appropriately. Unlike primary varicella infection in pregnancy, herpes zoster has not
been documented to cause fetal complications except in the disseminated form. Varicellazoster immune globulin (IGVZ) should be administered as soon as possible, preferably
within 96 h from exposure to prevent maternal infection or subsequent complications. The
effectiveness of IGVZ has not been evaluated after 96 h. Neonatal varicella is more severe if
maternal rash appears 5 days prior to or 2 days after delivery, the newborn should receive
IGVZ immediately. Intravenous acyclovir is recommended for maternal pneumonia and
severely affected neonate. No controlled trial has evaluated the effectiveness of acyclovir or
valacyclovir for postexposure prophylaxis to pregnant women or neonates yet. The advent
of advanced imaging techniques and molecular biology has improved prenatal diagnosis.
With increase use of vaccination, the incidence of chickenpox in pregnancy is expected to
decline in the future.
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia
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Varicela (Catapora) na gestação
Introdução
Em 1947, dois estudantes de Medicina do 4º ano, LaForet
e Lynch, informaram um caso de defeitos congênitos múltiplos, secundário a um caso de varicela durante a 8ª semana
de gestação. Naquele tempo, era ainda duvidoso se o vírus
da varicela era a causa etiológica das anomalias congênitas.
Este relatório inicial incitou mais médicos e investigadores a
informar achados semelhantes que conduziram à confirmação
da síndrome da varicela congênita (SVC). De 1947 a 2000,
houve mais de 110 casos de SVC relatados na literatura
(Sauerbrei & Wutzler, 2003). Apesar de incomum, quando
a infecção por varicela ocorre durante o período gestacional,
ela pode acarretar efeitos teratogênicos ao feto.
Epidemiologia
A epidemiologia da infecção pelo vírus da varicela-zoster
(VZV) difere entre climas temperados e tropicais. Na região
temperada, os picos de infecção de varicela ocorrem no inverno e começo da primavera. Em países como EUA, Japão e
Europa, mais de 90% da população têm a infecção primária
antes de 15 anos de idade (Enders & Miller, 2000), enquanto
que nos países tropicais a incidência varia entre 25 e 85%
para esta faixa etária (Lolekha et al., 2001).
A verdadeira incidência de infecção de varicela na gravidez não é conhecida. As estimativas atuais são baseadas na
proporção de mulheres em idade fértil que são suscetíveis a
infecção e ao risco de exposição durante gravidez. No Reino
Unido, o risco de infecção entre 15-44 anos é de 2-3 por
1.000 enquanto nos EUA, estima-se uma taxa anual entre
1,6 e 4,6 por 1.000.
Em um recente estudo publicado no Brasil (Reis et al.,
2003), a prevalência de adultos jovens (975 pessoas de
diversas regiões do Brasil com idade entre 20 e 29 anos)
com anticorpos contra o VZV foi de 94,2%. Esta taxa, mais
elevada que a esperada, sugere que no Brasil o risco de infecção durante a gestação seja mais baixo do que em outros
países tropicais, devendo ter valores próximos ao dos EUA
e Reino Unido.
Patogênese
VZV é um agente infeccioso altamente contagioso. O
homem é o único hospedeiro conhecido. O vírus é facilmente
cultivado de lesões de pele de pacientes. Porém, foi bastante
difícil isolar o vírus de secreções da nasofaringe, lançando
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dúvida se a transmissão poderia acontecer por secreções
respiratórias. Porém, com o advento da reação de cadeia
de polimerase (PCR), o DNA do VZV foi documentado na
nasofaringe. Conseqüentemente, é agora evidente que a
doença pode ser transmitida através de contato direto com
o fluido vesicular de lesões de pele ou através de secreções
respiratórias (Kido et al., 1991). O vírus entra no hospedeiro
pela mucosa ou conjuntiva do nariz ou boca através da mão
contaminada ou por partículas dispersas no ar. O período de
incubação habitual é 13-17 dias. O mecanismo de infecção
do VZV ao feto não é conhecido. Durante as duas primeiras
semanas do período de incubação, dois períodos de viremia:
dias 4-6 e 10-14. Durante esses períodos, pode haver transmissão transplacentária do vírus.
A profilaxia com IGVZ só é efetiva quando utilizada
antes do primeiro período de viremia, entretanto o aciclovir
é utilizado para prevenção ou melhora da segunda viremia,
sem evidências se isto pode prevenir a transmissão vertical
do VZV. Ao término da segunda viremia, inicia-se a erupção cutânea maculopapular com prurido. O período mais
infeccioso normalmente inicia-se 2 dias antes do início da
erupção cutânea e o contágio acontece até que se formem
as crostas, normalmente 5 dias depois do início da erupção
cutânea. Embora seja aceito que a infecção por varicela primária confere imunidade por toda a vida, relatórios mostram
entre os casos de varicela sintomática entre 4,5 a 13% dos
pacientes apresentavam antecedentes da infecção (Hall et
al., 2002). Possíveis fatores de risco para a ocorrência de
reinfecções por varicela são: primeira infecção em idade jovem (especialmente < 12 meses), primeira infecção branda,
fator genético (irmão com reinfecção) e se o contato durante
a segunda exposição mora na mesma casa ou é um amigo
íntimo (Hall et al., 2002). Sugere-se que a reinfecção possa
ocorrer devido a um fracasso para desenvolver ou manter
células de memória imune depois da infecção inicial, fracasso
para ativar células de memória ou carga viral muito alta que
poderia vencer as defesas do hospedeiro.
Vacinação
A vacina para varicela foi autorizada nos EUA em 1995 e
introduzida no Canadá em 1999. A incidência da infecção e
hospitalizações recuou 70-80% nos EUA entre 1995 a 2000.
Durante este período, a administração da vacina de varicela
para crianças entre 19-35 meses atingiu 74-84% (Seward et al.,
2002). No Brasil, a vacina ainda não faz parte do Calendário
Básico definido pelo Programa Nacional de Imunizações, não
Varicela (Catapora) na gestação
estando disponível nos Centros Municipais de Saúde para
uso geral, mas pode ser encontrada na rede privada.
Na rede pública está disponível apenas nos Centros de
Referência para Imunobiológicos Especiais, para vacinação de
susceptíveis (sem referência de ter tido a doença ou ter sido
vacinado) nas seguintes situações: imunocomprometidos,
nas indicações da literatura: leucemia linfocítica aguda e
tumores sólidos em remissão (pelo menos 12 meses), desde
que apresentem 1.200 linfócitos/mm3, sem radioterapia;
caso estejam em quimioterapia, suspendê-la 7 dias antes e
7 dias depois da vacinação; profissionais de saúde, pessoas
e familiares suscetíveis à doença e imunocompetentes que
estejam em convívio domiciliar ou hospitalar com pacientes
imunocomprometidos; pessoas suscetíveis à doença que
serão submetidas a transplante de órgãos (fígado, rins,
coração, pulmão e outros órgãos sólidos), pelo menos 3
semanas antes do ato cirúrgico; pessoas suscetíveis à doença e imunocompetentes, no momento da internação em
enfermaria onde haja caso de varicela; vacinação antes da
quimioterapia, em protocolos de pesquisa (Ministério da
Saúde do Brasil, 2006).
O rastreamento verbal de mulheres susceptíveis à infecção
por varicela e as estratégias de vacinação ajudam a prevenir
casos de infecção neonatal. O rastreamento verbal (histórico
de antecedente de varicela) seguido pela vacinação parece
apresentar o melhor custo-benefício (Pinot de Moira et al.,
2006), apesar de a vacinação universal ser mais efetiva que
o rastreamento verbal. Em um recente estudo realizado nos
EUA, de 1.085 pacientes rastreadas verbalmente sobre antecedentes de varicela, 940 mulheres apresentavam antecedentes
positivos e destas 904 (96,2%) eram sorologicamente imunes,
mostrando uma forte correlação entre a história relatada e a
imunidade sérica, sugerindo que a vacinação universal não
pareça necessária (Plourd & Austin, 2005).
Após a vacinação, é aconselhado evitar engravidar durante pelo menos um mês (vacina de vírus vivo). Entretanto,
em 498 casos informados de exposição à vacina durante a
gravidez, nenhuma anomalia congênita compatível com SVC
foi documentado (Merck Pregnancy Registry Program, 2003) e
a taxa de defeito congênito não foi mais alta que a esperada
para a população geral. A vacinação não é recomendada como
profilaxia pós-exposição para mulheres grávidas. Foi relatado
um caso de transmissão do vírus da vacina de varicela de uma
criança de 1 ano de idade, recentemente imunizada, para sua
mãe que estava grávida e era susceptível ao VZV (Salzman et
al., 1997). A transmissão foi confirmada por PCR específico.
Esta gestante desenvolveu catapora durante a 5ª-6ª semana de
gestação e optou por aborto, mas nenhum vírus foi notado em
tecido fetal. Já as mulheres são vacinadas durante o puerpério
podem amamentar normalmente. Um estudo que envolveu
12 mulheres que receberam a vacina não mostrou evidências
do DNA do VZV nas amostras de leite em um total de 217
espécimes de leite colecionados (Bohlke et al., 2003).
Imunoglobulina para Varicela-Zoster (IGVZ)
Gestantes suscetíveis, com exposição significativa ao VZV,
são candidatas para terapia com IGVZ. Exposição significativa
é definida como contato em casa, contato face a face por pelo
menos 5 min, compartilhar o mesmo ambiente por mais de 1 h
ou permanecer com um paciente contagioso no mesmo quarto
de hospital (Royal College of Obstetricians and Gynecologists,
2001). A IGVZ deve ser administrada dentro de 72 a 96 h
após a exposição ao VZV. Usada desta forma, pode prevenir ou
modificar significativamente o curso da doença. A efetividade
de IGVZ, quando usada após 96 h da exposição inicial, não foi
avaliada (Center for Disease Control Prevention, 1996).
Foi relatado que de 108 mulheres grávidas que receberam
profilaxia de IGVZ depois de exposição e antes do início da
erupção cutânea, nenhum dos seus 108 neonatos apresentaram a síndrome de varicela congênita, nem zoster no
pós-parto (Enders & Miller, 2000). Pastuszak et al., em 1994,
relataram um caso de SVC apesar da mãe ter recebido IGVZ
quatro dias após a exposição. Não é conhecido se a IGVZ
previne a viremia fetal ou somente a SVC.
Devido à raridade da SVC, é improvável que um estudo
controlado randomizado conseguirá um número suficiente
de casos para mostrar um efeito favorável da IGVZ. Além
disso, como está rotulado que a IGVZ previne a infecção
pela varicela na gravidez, é improvável que algum comitê
de ética aprovasse tal estudo. No momento, IGVZ é usado
para prevenir complicações maternas severas na gestação. A
duração de ação de IGVZ não é conhecida, mas a proteção
deve durar pelo menos uma meia-vida da globulina imune,
que é aproximadamente de 3 semanas. Exposições, 3 semanas após a dose da IGVZ, podem requerer doses adicionais
(Center for Disease Control Prevention, 1996). IGVZ também é
recomendada para neonatos cujas mães apresentaram erupção
cutânea pela catapora entre 5 dias antes e até 2 dias após o
parto. A IGVZ deve ser administrada a neonatos expostos à
varicela nas seguintes situações: nascidos de mães suscetíveis;
com menos de 28 semanas de idade gestacional; ou pesando
menos de 1.000 g. Nestas situações há grande probabilidade
de não terem adquirido anticorpos passivamente. A dosagem
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Varicela (Catapora) na gestação
indicada é de 125 U/10 kg (ou 0,5 mL/kg) intramuscular ou
intravenoso até um máximo de 625 U.
A IGVZ pode prolongar o período de incubação do vírus
até 28 dias. Assim, neonatos expostos, que foram submetidos
à IGVZ, podem precisar ser isolados por um período mais
longo. No Brasil, a IGVZ está disponível para uso no SUS nos
seguintes grupos de pessoas suscetíveis que tiveram contato
significativo: Crianças ou adultos imunocomprometidos; grávidas; recém-nascidos de mães nas quais a varicela apareceu
nos 5 últimos dias de gestação ou até 48 h depois do parto;
recém-nascidos prematuros, com menos de 28 semanas de
gestação (ou com menos de 1.000 g ao nascimento), independente de história materna de varicela; e recém-nascidos,
independente da idade gestacional, cuja mãe nunca teve
varicela (Ministério da Saúde do Brasil, 2006).
Terapia anti-viral
Aciclovir é um nucleosídeo sintético análogo da guanina.
Quando fosforilado por enzimas produzidas pelas células infetadas com VZV, inibe a polimerase do DNA viral, bloqueando
a replicação do vírus. Quando administrado dentro de 24 h
do início da erupção cutânea, foi demonstrado efetivo em
reduzir a morbidade e mortalidade associada à varicela (Center
for Disease Control Prevention, 1996). Aciclovir endovenoso é
melhor para tratamento inicial, pois a via oral apresenta baixa
biodisponibilidade. É utilizado principalmente nos casos de
pneumonia por varicela durante a segunda metade gestação
(Mohsen & Mckendrick, 2003).
A dose normalmente é de 10-15 mg/kg ou 500 mg/m2
endovenoso a cada 8 h durante 5-10 dias para pneumonia por
varicela e deve ser iniciado dentro de 24-72 h após o início da
erupção cutânea. Embora não haja evidência na diminuição
da SVC, o aciclovir cruza a placenta prontamente e pode ser
achado em tecidos fetais, sangue de cordão e também no
líquido amniótico (Birthistle & Carrington, 1998), podendo
inibir a replicação viral intra-uterina.
Estudos observacionais não demonstraram aumento de
malformações associadas ao uso de aciclovir durante a gestação
(Ratanajamit et al., 2003). Aciclovir intravenoso é usado em
neonatos com sinais de infecção para evitar seqüelas severas.
Não há estudo bem controlado mostrando eficácia do aciclovir
profilático (na exposição materna à varicela próxima ao termo,
ou em neonatos expostos) para prevenir varicela neonatal. Por
apresentar melhor absorção oral que o aciclovir, o valaciclovir
seria uma melhor escolha para uso oral. Estudos sobre a segurança desta droga durante a gestação ainda são limitados.
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Diagnóstico da Síndrome
da Varicela congênita
O diagnóstico pré-natal é freqüentemente realizado por
ultra-sonografia detalhada, que procura por deformidade de
membro, microcefalia, hidrocefalia, polihidramnia, calcificação
de tecidos moles e restrição de crescimento intra-útero (Enders
& Miller, 2000). Deve-se lembrar que defeitos menos severos
podem passar despercebidos pela ultra-sonografia, a qual deve
ser realizada após 5 semanas do início da erupção cutânea materna. O diagnóstico pré-natal a partir da ultra-sonografia e PCR
do líquido amniótico foi avaliado por Enders & Miller (2000).
Entre 17-21 semanas de gestação, quando a ultra-sonografia
é normal e o PCR é positivo, o risco é questionável. Entre 2324 semanas de gestação, quando a ultra-sonografia é normal
e o PCR é positivo, o risco é muito baixo. O PCR positivo de
líquido amniótico não apresenta bom valor preditivo positivo
para a SVC, indicando apenas infecção intra-uterina. Já o risco
para SVC é alto se a ultra-sonografia mostrar anormalidades e
o PCR for positivo. Se o PCR for negativo entre 19-22 semanas
de gestação o risco de SVC é muito baixo. Entretanto ainda
não há consenso de como utilizar estes recursos diagnósticos
no período pré-natal, sendo que em países onde o aborto é
legalizado, o PCR é mais difundido, pois faz o diagnóstico
mais precocemente.
Varicela no primeiro e
segundo trimestres da gestação
A varicela em gestantes durante o primeiro e segundo
trimestres desperta preocupação devido ao risco, embora
pequeno, de desenvolvimento da SVC. A SVC normalmente é
caracterizada por cicatrizes com distribuição em dermátomos,
defeitos neurológicos, defeitos de encurtamento unilateral de
membros associado à hipoplasia muscular, doenças oculares,
anormalidades gastro-intestinais e gênito-urinárias (Sauerbrei
& Wutzler, 2003; Enders & Miller, 2000). Vários estudos de
coorte são concordantes em relação ao risco de SVC. A taxa
foi 4/725 (0,55%) para infecção no primeiro trimestre, 8/642
(1,4%) para infecção no segundo trimestre e 0/385 (0%)
para infecção no terceiro trimestre (Pastuszak et al., 1994).
A infecção materna ocorreu antes de 20ª semana de gestação
em 11 dos 12 casos de SVC. Através do PCR de líquido amniótico,
a transmissão vertical do vírus pode ser demonstrada em 8% dos
casos das gestantes infectadas (Enders & Miller, 2000). Quase
30% de crianças nascidas com SVC severa morrem durante os
primeiros meses de vida. Recentemente, Schulze-Oechtering
Varicela (Catapora) na gestação
et al., em 2004, demonstraram o DNA do VZV tanto no fluido
cérebro-espinal, como também em amostras de fluido de lesões
de pele de um recém-nascido com SVC típica. Isto conduziu a
suspeita de que o recém-nascido com SVC possa ser infeccioso
e o seu isolamento seja adequado.
Pneumonia materna por Varicela
A pneumonia por VZV é a complicação mais comum
em adultos com varicela (Harger et al., 2002). A incidência
de pneumonia por varicela não parece ser aumentada na
gravidez, 10-14%, entretanto é bem estabelecido que a
morbidade e mortalidade desta infecção em gestantes são
mais altas (Sauerbrei & Wutzler, 2001). Os sintomas iniciais
são febre, tosse seca, dispnéia e hipoxemia moderada, que
normalmente aparecem durante a primeira semana após o
início da erupção cutânea. Em condições severas, nas quais
o apoio mecânico é necessário, a mortalidade era de 20-45%
antes da terapia de anti-viral (Sauerbrei & Wutzler, 2001) e
de 3-14% após a terapia anti-viral (Harger et al., 2002). A
mortalidade é mais alta se a patologia acontecer no terceiro
trimestre, provavelmente devido ao efeito mecânico do aumento uterino, que pode dificultar ainda mais a respiração.
O tabagismo é um fator de risco para o desenvolvimento
desta patologia (Mohsen et al., 2003).
Varicela neonatal
A varicela neonatal severa é a principal complicação da
infecção materna ocorrida próxima ao termo. Infecção pode
acontecer através de viremia transplacentária, durante a
passagem pelo canal de parto, ou contato com o vírus após
o parto (através de lesões ou partículas aéreas). Miller et al.,
em 1989, demonstraram que se a infecção materna ocorre de
1 a 4 semanas antes do parto, até 50% dos neonatos podem
estar infectados. Aproximadamente 23% destes desenvolvem
varicela clínica. Anticorpos estavam presentes em todos os
66 neonatos quando a erupção cutânea da mãe ocorreu com
mais de 7 dias antes do parto. Quando a erupção cutânea
materna ocorreu entre 7 até 3 dias antes do parto, um número
progressivamente menor de neonatos apresentava anticorpos;
quando a erupção ocorreu com menos de 3 dias antes do parto,
nenhum dos 60 neonatos apresentava anticorpos.
A taxa de manifestação clínica foi mais alta (62%) em
crianças nascidas dentro de 7 dias após o início da erupção
cutânea. Entre as 19 crianças que apresentaram sintomas
severos, 16 estavam entre as 118 cujas mães tiveram erupção
cutânea entre 4 dias antes e 2 dias após o parto. Estas crianças
não tiveram tempo para receber anticorpos varicela-específicos
maternos. Não houve morte entre as pacientes que utilizaram
IGVZ, entretanto estudos realizados previamente ao uso da
IGVZ (associado a piores condições das CTIs neonatais na
época) mostram taxa de letalidade em torno de 30% (Schutte
et al., 1996). Sauerbrei & Wutzler, em 2001, relataram um
caso de fatalidade apesar do uso da IGVZ.
Herpes-Zoster
O VZV permanece em estado latente em tecidos nervosos
e pode reativar em aproximadamente 15% dos infectados.
O herpes-zoster manifesta-se como uma erupção cutânea
vesicular com dor e prurido na distribuição de um dermátomo.
A prevalência de herpes zoster durante a gravidez é estimada
em 1,5/10.000 (Brazin et al., 1979) nos EUA e 2 em 1.000
no Reino Unido (Enders & Miller, 2000). Em dois relatórios
envolvendo 480 mulheres com herpes-zoster durante gravidez,
incluindo 301 no primeiro e segundo trimestre, não foram
documentados casos de SVC (Paryani & Arvin 1986; Enders
& Miller, 2000). Teoricamente, a infecção intra-uterina poderia
ocorrer se a infecção envolvesse a inervação de T10-L1, que
inerva o útero. Porém, nenhum caso de SVC, após herpeszoster, foi descrito. Devido à ausência de casos de infecção
pelo VZV em neonatos cujas mães desenvolveram herpeszoster perinatal, a IGVZ não é indicada nestes casos.
Leituras suplementares
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