ocupação de conchas de gastrópodes pelo ermitão

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OCUPAÇÃO DE CONCHAS DE GASTRÓPODES PELO ERMITÃO CLIBANARIUS
SCLOPETARIUS (DECAPODA, ANOMURA) NO PLATÔ RECIFAL DO RECIFE DE
COROA VERMELHA (BA)
Alisson Sousa Matos¹, Erminda da Conceição Guerreiro Couto²
¹ Pós Graduando em Sistemas Aquáticos Tropicais, Universidade Estadual de Santa
Cruz – Ilhéus, Bahia, Brasil. ([email protected])
² Professora Doutora do Departamento de Ciências Biológicas, Universidade
Estadual de Santa Cruz – Ilhéus, Bahia, Brasil.
Recebido em: 30/09/2014 – Aprovado em: 15/11/2014 – Publicado em: 01/12/2014
RESUMO
Os ermitões, crustáceos decápodes, ocorrem em substratos lodosos, arenosos e
rochosos em todo o mundo e as conchas de gastrópodes constituem um recurso
limitante e necessário para sua sobrevivência. O presente estudo teve por objetivo
caracterizar a ocupação de conchas, a estrutura de tamanho e a proporção sexual
do ermitão Clibanarius sclopetarius no platô do recife de Coroa Vermelha, Bahia. Os
espécimes foram coletados durante todo período de maré baixa de sizígia, quando a
área fica emersa. Em laboratório mediu-se o comprimento do escudo cefalotorácico
com paquímetro (precisão 0,01mm) e estabelecida a amplitude das classes de
tamanho. Para identificação do sexo considerou-se a posição dos gonóporos e a
proporção sexual total foi verificada pelo teste estatístico do qui-quadrado. Foram
coletados 74 indivíduos distribuídos em 12 classes de tamanho. Foram identificadas
três espécies de gastrópodos: Cerithium atratum, Pisania pusio e Tegula viridula,
cujas conchas foram utilizadas pelo ermitão. Foram identificados 50 machos e 24
fêmeas (χ² = 19,24; p<0,05). O comprimento médio do escudo cefalotorácico foi de
2,90±0,59 mm em Cerithium atratum, 3,53±1,08 mm em Tegula viridula e 4,38±0,89
mm em Pisania pusio. Os indivíduos de menor porte, pertencentes às classes de
ponto médio 0,37 mm e 1,12 mm, foram encontrados nas conchas de Tegula viridula
e Cerithium atratum enquanto indivíduos de maior porte, pertencentes às classes de
4,87 e 5,62 mm foram mais comuns em Pisania pusio.
PALAVRAS-CHAVE: relação de tamanho, seleção de recurso, sul da Bahia.
OCCUPATION OF SHELLS OF THE HERMIT GASTROPODS CLIBANARIUS
ANOMURA) PLATEAU IN REEF COROA VERMELHA
(BA)
SCLOPETARIUS (DECAPODA,
ABSTRACT
Hermit crabs, decapod crustaceans occur in muddy, sandy and rocky substrates
around the world and the shells of gastropods constitute a limiting resource and
necessary for survival. The present study aimed to characterize the shell occupation,
size structure and sex ratio of the hermit Clibanarius sclopetarius the plateau Reef
Coroa Vermelha, Bahia. The specimens were collected during the entire period of
low spring tide, when the area is immersed. Laboratory-measured if the shield length
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with a caliper (0.01 mm precision) and established the range of size classes. For
identification of sex was considered the position of gonopores and the overall sex
ratio was verified by the statistical chi-square. 74 individuals distributed in twelve size
classes were collected. Three species of gastropods were identified: Cerithium
atratum, Pisania pusio and Tegula viridula, whose shells were used by hermit. 50
males and 24 females were identified (x² = 19.24, p <0.05). The mean shield length
was 2.90 ± 0.59 mm in Cerithium atratum, 3.53 ± 1.08 mm in Tegula viridula and 4.38
± 0.89 mm in Pisania pusio. Individuals smaller, Classes midpoint of 0.37 mm and
1.12 mm, were found in the shells of Tegula viridula and Cerithium atratum while
larger individuals, belonging to the classes of 4.87 and 5.62 mm were more common
in Pisania pusio.
KEYWORDS: feature selection, size relationship, South of Bahia,
INTRODUÇÃO
Os ermitões são crustáceos decápodes que apresentam uma distribuição
cosmopolita. Ocorre em substratos arenosos, lodosos e rochosos, distribuídos desde
a região entremarés até grandes profundidades (MCLAUGHLIN & MURRAY, 1990).
Ermitões que vivem na região entremarés enfrentam condições extremas de
exposição ao ar e sol. Para se proteger, retraem-se na concha e mantêm um
microclima úmido que possibilita a manutenção da temperatura corporal e o controle
das taxas de evaporação e dessecação (REESE, 1969).
As conchas de gastrópodes constituem um recurso limitante e necessário
para a sobrevivência dos ermitões, que vivem competindo em busca das mais
adequadas (VANCE, 1972). A mobilidade e a proteção proporcionadas por elas
devem contribuir para o fato desses crustáceos serem encontrados em quase todos
os ambientes marinhos (HAZLETT, 1981). No caso de espécies que utilizam o
mesolitoral, conchas que minimizem os custos energéticos de transporte contribuem
para o sucesso no ambiente (OBA et al., 2008). A disponibilidade de conchas na
natureza é determinada pela abundância relativa de gastrópodes vivos e pelas suas
taxas de mortalidade (MEIRELES et al., 2003). Estudos sobre a disponibilidade de
conchas no ambiente são importantes para entender o padrão de ocupação por
ermitões.
A forte associação entre estes caranguejos e o seu abrigo é, em parte,
favorecida pela torção do abdome associada à presença dos urópodos modificados,
possibilitando ao animal prender-se à columela das conchas (DOMINCIANO, 2001).
A adequação dos ermitões às conchas disponíveis no ambiente em que vivem
envolve vários fatores, entre eles as suas características morfométricas.
Os ermitões exibem um comportamento exploratório de análise do estado de
conservação, tamanho, forma, peso, dimensão da abertura, coloração e até mesmo
do volume interno da concha (MITCHELL, 1976). Outros fatores como resistência à
predação e à dessecação são relevantes (HAZLETT, 1981).
O padrão de utilização de conchas varia entre populações de ermitões sendo
influenciado principalmente pelo tamanho e pela forma das conchas disponíveis
durante a inspeção; pela sua localização (área intertidal ou sublitoral) e pela
preferência dos ermitões (MANTELATTO & GARCIA, 2000; MANTELATTO &
DOMINCIANO, 2001). A ocupação de conchas por esses crustáceos no ambiente
depende da abundância de moluscos vivos no local.
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Poucos estudos, enfocando espécies de ermitões, foram realizados no litoral
Sul da Bahia. Neste estudo foram identificadas as conchas ocupadas por ermitões,
bem como apresentou algumas características das relações morfométricas entre os
ermitões e as conchas por eles ocupadas e, observou a proporção sexual dos
ermitões.
MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo
O estudo foi realizado no platô do recife de Coroa Vermelha, Santa Cruz
Cabrália litoral sul da Bahia, Brasil. O clima do município é classificado como
pseudo-equatorial sem estação seca, com chuvas bem distribuídas durante todo o
ano (SILVA et al., 2001). Este ecossistema está conectado ao litoral por um tômbolo
que separa a costa em duas enseadas, norte e sul. O platô recifal, quando exposto
na baixamar, forma poças rasas com fundo consolidado ou arenoso. O recife é
relativamente plano, sendo as maiores altitudes (0,8 m) registradas em maré baixa
de sizígia (CERQUEIRA, 2012).
Desenho da amostragem
Os espécimes foram coletados durante todo período de maré baixa de sizígia,
acondicionados em sacos plásticos durante a coleta e transportados para análise em
laboratório.
Em laboratório os ermitões foram retirados da concha aquecendo-se o ápice
das mesmas. Os indivíduos foram identificados conforme MELO (1999). O sexo foi
identificado considerando-se a posição dos gonóporos (fêmeas, na base do 3º par
de pereiópodos; machos, na base do 5º par de pereiópodos). Utilizando um
paquímetro de precisão (0,01mm) foi obtido o comprimento do escudo cefalotorácico
(CEC - medido entre a extremidade do rostro e a região mediana da sutura cervical),
tendo sido estabelecidas 12 classes de tamanho.
Cada concha ocupada foi identificada até o menor nível taxonômico possível
(RIOS, 1994) e mensurada com paquímetro de precisão (0,01mm). Foram obtidas as
seguintes medidas: comprimento da abertura da concha (CAC - medida da distância
entre o ângulo posterior da abertura, em mm), largura da abertura (LAC - maior
distância compreendida entre a margem interior da borda exterior da abertura da
concha e a parede da borda interior da abertura, em mm) e comprimento total (Ht). O
volume interno (VI em mL) da concha e o peso seco (PS em g) também foram
mensurados.
Tratamento de dados
Para avaliar as relações entre as variáveis das conchas ocupadas (CAC,
LAC, Lt, VI e PS) e o tamanho do ermitão (CEC), foi utilizada uma correlação linear
simples (ZAR, 1996). A proporção sexual total foi verificada pelo teste do Quiquadrado (χ²), onde: χ² > 3,84 e α= 0,05. Um teste t simples foi aplicado para
comparar as médias do CEC entre machos e fêmeas com α= 0,05. Utilizou-se para
todos estes cálculos o programa Past (versão 2.17c).
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RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram coletados 74 indivíduos de Clibanarius sclopetarius. Além desta
espécie foram também obtidos, nas mesmas piscinas, 18 exemplares de Calcinus
tibicen. A espécie Clibanarius sclopetarius foi encontrada ocupando as conchas de
Cerithium atratum (45), Pisania pusio (16) e Tegula viridula (13) (Figura 1). O ermitão
Calcinus tibicen foi encontrado nas conchas de Astraea tecta olfersii, Leucozonia
nassa e Vasula deltoidea.
Foi observada ocupação diferenciada das conchas em função do tamanho do
ermitão. Indivíduos de menor porte, pertencentes às classes de tamanho de 0,37
mm e 1,12 mm, ocuparam as conchas de Tegula viridula e Cerithium atratum, sendo
que a maior parte dos indivíduos de tamanho intermediário ocupou, com maior
freqüência, Cerithium atratum. Os indivíduos pertencentes às classes de tamanho de
maior, 4,87 mm e 5,62 mm, apresentaram tendência a ocupar conchas de Pisania
pusio (Figura 2). A maioria dos indivíduos apresentou tamanho entre 3,37 mm a 4,87
mm.
FIGURA 1 Espécies de conchas ocupadas por Clibanarius sclopetarius.
(A) Cerithium atratum, (B) Pisania pusio e (C) Tegula viridula (Arquivo
pessoal).
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FFIGURA 2 Distribuição de frequências de tamanho do ermitão
Clibanarius
sclopetarius por conchas ocupadas.
As relações entre o CEC do ermitão e as mensurações realizadas para as
conchas das três espécies de gastrópodos estudadas mostraram diferenças entre
elas. Para Cerithium atratum a maior correlação linear foi obtida entre o CEC do
ermitão e a Ht da concha (r = 81), enquanto para Tegula viridula as relações de Ht e
VI foram igualmente positivas e fortes (r = 90). Pisania pusio não apresentou
correlação linear significativa com C. sclopetarius. Para DOMINCIANO (2001), em
estudo com ermitão Paguristes tortugae, a ocupação pode estar relacionada com o
peso, pois este fator oferece maior proteção em relação à predação e pode diminuir
o transporte pela ação das correntes locais.
O peso também apresentou correlação significativa e a ocupação de C.
atratum e T. viridula podem indicar essa preferência em uma determinada etapa de
seu ciclo. CARUSO & CHEMELLO (2009), no estudo da espécie Clibanarius
erythropus, sugeriram que o tamanho da concha é mais importante do que a sua
forma para a seleção da mesma e que, geralmente, é o primeiro atributo avaliado
pelo ermitão. A relação encontrada entre o tamanho das conchas fortalece a
evidência de que estas variáveis estão altamente correlacionadas (Tabela 1).
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TABELA 1 Correlações lineares entre o CEC (comprimento do escudo
cefalotorácico) de Clibanarius sclopetarius e as dimensões das
conchas ocupadas (Ht: altura total; CAC: comprimento de
abertura; LAC: largura da abertura; Vi: Volume interno e; PSC:
Peso seco da concha).
CEC x
CEC x
CEC x
CEC x
CEC x
Lt
CAC
LAC
Vol
PSC
Conchas
N
Cerithium atratum
Pisania pusio
Tegula viridula
45
0,81
0,76
0,72
0,7
0,72
16
-0,07
-0,17
0,004
-0,19
-0,14
13
0,9
0,78
0,86
0,9
0,95
Foram identificados, no total de 74 indivíduos, 50 machos e 24 fêmeas (2:1).
A análise do teste χ² para comparação da proporção sexual dos indivíduos coletados
indicou predomínio nas proporções dos machos sobre as fêmeas (χ² = 19,24;
p<0,05), diferindo significantemente da taxa esperada de 1:1. Não houve diferença
estatística entre o tamanho do CEC dos machos em relação ao das fêmeas (t =
0,22; g.l = 73; p>0,05). SAMPAIO et al., (2009), observaram, em uma população de
Clibanarius vittatus no litoral do Paraná, que os machos foram mais abundantes em
todos os meses do período de estudo e que fêmeas ovígeras foram raras. Entre os
crustáceos, proporções sexuais maiores ou menores que 1:1 estão largamente
difundidas, podendo ser resultado de diferenças no ciclo de vida, na taxa de
mortalidade diferencial entre machos e fêmeas, na maior mobilidade dos machos
causando uma maior dispersão ou na migração (GHERARDI, 1991). O fato de os
machos e as fêmeas não diferirem em relação ao tamanho pode estar relacionado à
ausência de dimorfismo sexual visível nessa espécie.
As fêmeas ovígeras ocuparam conchas com maior volume interno em todas
as espécies registradas neste trabalho, sendo mais comuns em conchas de Tegula
viridula, as quais apresentam, proporcionalmente, maior volume interno (Figura 3),
sugerindo que esta seleção responda à necessidade de abrigar os ovos. Estudos
realizados por MARTINELLI & MANTELATTO (1999) com Loxopagurus loxochelis,
por FLOETER et al., (2000), com Calcinus tibicen e por CARUSO & CHEMELLO
(2009) com Clibanarius erythropus, também evidenciaram seleção de espécies de
conchas mais leves e com maior volume interno pelas fêmeas ovígeras.
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FIGURA 3 Gráfico de dispersão do tamanho do escudo cefalotorácico
(CEC) de Clibanarius sclopetarius em relação ao volume
interno das conchas ocupadas.
Conchas pequenas são tipicamente mais abundantes que conchas maiores
(HAZLETT, 1981). No presente estudo as conchas de Cerithium atratum e Tegula
viridula foram mais ocupadas por indivíduos menores, de ambos os sexos, o que
sugere que estas podem estar em maior disponibilidade no ambiente. Observações
pessoais permitem afirmar que a primeira espécie era realmente muito comum na
área. Esse padrão foi também encontrado por DOMINCIANO (2004) que observou
que os indivíduos machos e menores de P. tortugae preferiram a concha de C.
atratum.
Os indivíduos maiores, de ambos os sexos, foram encontrados ocupando
conchas de Pisania pusio que apresentaram maior volume interno (Figura 3) e maior
peso seco (Figura 4), porém os machos ocuparam conchas mais pesadas.
DOMINCIANO (2001) sugeriu que indivíduos maiores apresentam busca ativa por
conchas adequadas ao seu tamanho. Considerando este aspecto, os machos são
favorecidos em relação às fêmeas. Segundo GHERARDI (1991), em estudo com
uma espécie de Clibanarius, os machos estariam mais expostos à predação durante
a competição por fêmeas, e conchas mais pesadas serviriam como proteção
adicional.
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FIGURA 4 Gráfico de dispersão do tamanho do escudo cefalotorácico
(CEC) de Clibanarius sclopetarius em relação ao peso seco das
conchas ocupadas.
CONCLUSÃO
Clibanarius sclopetarius ocupa conchas em resposta a diferentes
características das mesmas, destacando-se o volume interno e o peso. Foi possível
verificar uma preferência, quando considerado o sexo, com as fêmeas em conchas
mais leves e com maior volume interno e os machos em conchas mais pesadas, o
que parece estar relacionado às suas necessidades específicas – acomodação da
massa de ovos nas fêmeas e proteção contra a predação nos machos.
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