cosmonautas escolares: o ensino de história através da astronomia

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COSMONAUTAS ESCOLARES: O ENSINO DE HISTÓRIA ATRAVÉS
DA ASTRONOMIA
Camila Alves Corrêa1
Gilvan Moraes2
RESUMO
O artigo apresenta o relato de experiência de uma proposta de oficina realizada a partir do
subprojeto “História e Educação: os meandros do ensino formal” do Programa Institucional
de Bolsas de Iniciação a Docência- PIBID. O projeto tem como objetivos a aproximação dos
acadêmicos de História a realidade das escolas e utilização de oficinas como estratégia para
instigar o interesse pela disciplina, assim como incitar a percepção dos participantes como
sujeitos históricos. As temáticas das oficinas partem do cotidiano/identificação dos
participantes e vêm sendo desenvolvidas pelos bolsistas do curso de História em conjunto
com a Escola Estadual Edna May Cardoso, na cidade de Santa Maria no Rio Grande do Sul. O
objetivo das oficinas realizadas foi de estabelecer um diálogo entre o estudo da História
articulada com aspectos da Astronomia, através de uma atividade lúdica, como a construção
de móbiles do sistema solar. Esta atividade foi uma estratégia de sensibilização para a História
almejou possibilitar a curiosidade e o diálogo sobre Mitologia a partir dos astros que compõe
o sistema solar. A escolha da temática que orienta as oficinas, o estudo da História através da
Astronomia, se deu devido às diversas formas possíveis de percepção do desenvolvimento e
organização histórica de diversas sociedades guiada pela ciência astronômica.
Palavras-chave: PIBID, oficinas, mitologia, educação.
ABSTRACT
This article presents the experience report of one workshop propose, realized through the
project “History and Education: The Meanders of the Formal Teaching” of the Institutional
Program of the Scholarships of Teaching Starting – PIBID. The project have the objectives to
close the reality of the History students with school reality and to use the workshops how the
strategy to instigate the interesting to the History, like to develop the perception of the
participants like they are history subjects.
The workshop themes start to the
daily/identification of the participants and are been to develop to the scholar of the History
Class together with the Edna May Cardoso High School, in the Santa Maria city at the Rio
Grande do Sul. The workshop objectives were to construct some dialogue between the
History study and the Astronomy, through activities like the construction of Solar System
Mobiles. This activity were an strategy to sensibly the students to the History and planned to
1
Autora: Acadêmica do Curso de História da Universidade Federal de Santa Maria e bolsista do Subprojeto
“História & Educação: os meandros do ensino formal, do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
Docência PIBID/ UFSM, email: [email protected]
2
Co autor: Acadêmico do Curso de História da Universidade Federal de Santa Maria e bolsista do Subprojeto
“História & Educação: os meandros do ensino formal, do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
Docência PIBID/ UFSM, email: [email protected]
261
develop curiosity to the Mythology and the stars the compose the solar system. The chosen of
the theme from the workshops, History through the Astronomy, because a lot of societies
percept their development through the Astronomy.
Key words: PIBID, workshop, mythology, education.
INTRODUÇÃO
No dicionário o termo cosmonauta designa aquele que é “piloto ou passageiro de um
engenho espacial” seu objetivo é desvendar o cosmos que segundo palavras de Carl Sagan
pode ser definido como “ tudo o que já foi, tudo que é e tudo que será”.
E se a escola pudesse ser vista como um meio, um instrumento onde seus tripulantes,
os alunos, tem como meta a busca autônoma e criativa pelo conhecimento? Um local em que
fosse proporcionada uma visão de nossa participação como unidades do universo. Como parte
da natureza que adquiriu consciência, e que percebendo seu poder de ação no mundo, passa a
organizar-se na construção de um mundo diferente, um mundo melhor. Desta forma as escolas
deveriam ser repensadas, para tornarem-se um ambiente que possibilite/incentive algo novo,
um homem novo.
Para isso, pensamos que seja necessária uma revisão no conjunto de práticas
educacionais vigentes nas diversas escolas em território nacional. Práticas cotidianas
insuficientes e às vezes equivocadas muitas vezes imperceptíveis, pois se „camuflam‟ pela
ideia de que construirão indivíduos humanos, criativos, ideais, não corrompidos, aptos a fazer
parte e a construir algo melhor do que temos hoje. Porem, a partir do momento em que, como
nas palavras de Oscar Wilde, existem posturas “bem ou mal intencionadas, quando procuram
controlar a ação, controlar o pensamento” e usam da censura seja qual for esse imaginário é
auto boicotado e o plano está fadado ao fracasso.
Essas práticas escolares se articulam a partir do momento que obedecem a métodos
que tem como objetivo regular o comportamento de docentes e estudantes, regulamentando
horários, freqüências, avaliações e conteúdos arbitrariamente selecionados, sendo
orquestrados por uma quase instransponível hierarquia. As escolas nos moldes em que são
concebidas não proporcionam um ambiente de educação e sim de reprodução, fazendo com
que o aluno seja “castrado” e impossibilitando suas potencialidades/interesses de se
desenvolverem plenamente. Com isso, o ensino de História sente os reflexos desta postura
262
através do pouco interesse demonstrado pela disciplina, da qual ao longo de alguns anos os
alunos vêm sendo submetidos a treinamentos para a memorização estéril de fatos, datas e
personagens. O que concebemos como educação não passa de imposição, como bem expressa
Paulo Freire:
Como aprender a debater e discutir com uma educação que impõe? Ditamos
ideias. Não trocamos ideias. Discursamos aulas. Não debatemos ou
discutimos temas. Trabalhamos sobre o educando. Não trabalhamos com ele.
Impomos-lhe uma ordem a que ele não adere, mas se acomoda. Não lhe
proporcionamos meios para um pensar autêntico, porque recebendo as
fórmulas que lhe damos simplesmente as guarda. Não as incorpora porque a
incorporação é o resultado de busca de algo que exige de quem o tenta,
esforço de recriação e de procura. Exige reinvenção. (FREIRE, 1975)
As oficinas que se utilizam do eixo da Astronomia pela perspectiva histórica ocorrem
a partir do subprojeto “História e Educação: os meandros do ensino formal” do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência- PIBID. O projeto tem como objetivos a
aproximação dos acadêmicos de História a realidade das escolas e utilização de oficinas como
estratégia para instigar o interesse pela disciplina, assim como incitar a percepção dos
participantes
como
sujeitos
históricos.
As
temáticas
das
oficinas
partem
do
cotidiano/identificação dos participantes e vêm sendo desenvolvidas pelos bolsistas do curso
de História em conjunto com a Escola Estadual Edna May Cardoso, na cidade de Santa Maria
no Rio Grande do Sul.
OBJETIVOS
O objetivo das oficinas realizadas foi de estabelecer um diálogo entre o estudo da
História articulada com aspectos da Astronomia, através de uma atividade lúdica, como a
construção de móbiles do sistema solar. Esta atividade como estratégia de “ensino de
História” almeja possibilitar a curiosidade e o diálogo sobre Mitologia a partir dos astros que
compõe o sistema solar. A escolha da temática que orienta as oficinas se deu devido a
possibilidade de percepção do desenvolvimento e organização histórica de diversas
sociedades guiada pela ciência astronômica. A oficina de confecção de móbiles do sistema
solar visa o ensino de História, através da provocação para temas presentes em nosso dia a dia
por meio de estratégias diferenciadas das utilizadas cotidianamente em ambiente escolar.
263
A provocação é realizada a partir de algumas problematizações que são feitas aos
participantes, sendo assim as atividades são construídas “com” os participantes e não “para”
eles. Desta forma visa-se sua participação como sujeitos agentes da sua própria história. Estas
ações vão ao encontro do seguinte pensamento de Freire:
As atividades do projeto são realizadas também para instigar os participantes
para seu papel como sujeitos históricos ativos “ao invés de ser simples
espectador, acomodado, as prescrições alheias que, dolorosamente ainda
julga serem opções suas [...]”. (FREIRE, 1975)
Os temas abordados nas oficinas não cumprem necessariamente a grade curricular
imposta às escolas, abordando muitas vezes temas transversais que podem perpassar outras
disciplinas, mas que muitas vezes são negligenciados por não fazerem parte das temáticas
cobradas para o ingresso no ensino superior. Como já foi dito, os temas e as práticas são
abordados a partir do interesse/cotidiano dos participantes, através de um levantamento de
temas por meio da análise dos livros didáticos da escola, projeto político pedagógico, diários
de classe e discurso oral. Nas atividades desenvolvidas não há um script gessado a ser
cumprido, pelo contrário, o objetivo é através do diálogo/discurso que se estabelece com os
participantes, que a atividade possa tomar rumos inesperados, possibilitando evidenciar novos
temas a serem discutidos. Como Pey nos fala “tudo pode acontecer”:
É exatamente este “tudo pode acontecer” que potencia a romper as regras do
jogo da produção de conhecimento, ou seja, olhar por onde não se viu, trazer
a luz pontos de vista considerados insignificantes, indesejáveis, tortos,
pequenos, mesquinhos, perguntar aquilo para o qual não se tem resposta nem
provisória, especular como as coisas chegam a ser como são e por quê.
(PEY, 2000)
Ou, trazer para discussão aquilo considerado como verdade inquestionável, porém,
parece que a escola infelizmente, não está preparada para a dúvida, e se mantêm
hipocritamente como a grande portadora da “verdade”, protagonizada pela figura do
professor, como o grande sábio, distribuindo sua “luz”. A escola que temos hoje não está para
incitar o questionamento e a autonomia e sim para repassar respostas prontas, para nos tornar
arremedos daquilo do que nos é imposto como verdades.
METODOLOGIA
O projeto “História e Educação: os meandros do ensino formal” tem como estratégia o
uso de oficinas que devem ocorrer em turno inverso, como isso se faz necessária divulgação
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intensa para a mobilização. Porém, as atividades que usam como tema Astronomia, até então
foram planejadas para crianças, isto é, séries iniciais. Sendo assim, existe uma grande
dificuldade para que as crianças sejam liberadas para deslocar-se em turno inverso para a
participação das atividades, ficando acordado entre bolsistas e escola que as atividades para as
series iniciais deveriam ocorrer em turno de aula.
As oficinas de construções de móbiles do sistema realizaram-se em salas de aula com
a presença do professor em quatro dias diferentes, sendo duas turmas do terceiro ano, uma do
quarto ano e também em uma turma de EJA. A atividade foi realizada em três momentos,
onde inicialmente foi entregue a cada participante uma embalagem contendo nove bolas de
isopor de tamanhos variados para que examinassem o que mais lhes chamava atenção.A
presença de uma bola de isopor maior e texturizada dava a deixa para um segundo momento,
o diálogo, inicialmente sobre o sol, conduzido através de indagações como: Qual a
importância do sol para nós? O que é o sol? O que é uma estrela? Do que são formados? A
observação do céu pode ajudar as pessoas em alguma coisa? Alguém conhece alguma história
sobre o sol?
Ao mesmo tempo em que as perguntas eram realizadas e ocorria o tumulto de quem
responderia primeiro, foram sendo apresentadas imagens do sistema solar e outras formas de
representações dos astros e também de construções vinculadas a observações destes. A
intenção destas imagens foi de mostrar que os astros ao longo da história foram representados
de diferentes formas, e que devido a sua importância eram quase sempre vistos como deuses e
a partir desta ideia muitos povos organizaram-se de formas diferenciadas.
Após o sol, partimos para os planetas onde lhes foi perguntado: Vocês conhecem
algum nome de algum outro planeta? O que eles significam? Conhecem alguma história que
envolva a lua e estrelas? O que é mitologia? Por que diferentes povos criavam histórias
relacionadas ao sol e aos planetas?
Partindo dos nomes dos planetas, em que, diga-se de passagem, o planeta dos anéis e
o planeta dos extraterrestres, (Saturno e Marte) são sempre os mais lembrados, foi possível
iniciar um diálogo sobre Mitologia. Também foi possível fazer “links” com outras disciplinas
como Geografia, já que será do movimento e composição dos planetas que se fará a
assimilação com deuses gregos, assim como a marcação de fenômenos sazonais fundamentais
para a agricultura. Apesar do desenvolvimento da atividade não mencionar em nenhum
momento a cultura cristã e cultura africana o debate surgiu, com crianças de oito anos,
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indagando-se sobre a existência de Jesus e sua ressurreição assim como questionamento sobre
a morte, origem da vida e significado dos orixás.
Após o diálogo desenvolvido a partir das problematizações e também da exposição das
imagens os participantes dedicaram-se para a parte prática, a pintura dos astros e colocação
dos fios de naylon, para que finalmente o móbile pudesse ser montado. O processo de
colocação do sol na haste em que os astros ficariam pendurados possibilitou uma nova
problematização. Qual o local correto para se pendurar o sol? A partir deste ponto foi
possível explorarmos sobre a forma de organização do universo a partir do modelo
geocêntrico e seu processo de mudança para o heliocentrismo.
RESULTADOS
Partindo de uma das propostas do projeto PIBID, que objetiva proporcionar aos
acadêmicos de licenciatura a inserção nas realidades das escolas, num período anterior ao
estágio final, sem dúvida alguma, é exitoso, porque lançar os acadêmicos tão precocemente a
esta realidade que na maioria das vezes não foi bem pensada, podendo às vezes ser fruto de
um impulso, de uma exigência, de uma pressa de escolhas limitadas. O projeto impõe a
reflexão dessa escolha muitas vezes feita de forma imatura.
A proposta de aplicação de oficinas necessita impreterivelmente de uma
problematização, e para que ela se efetive necessita do envolvimento do aluno para seu
desenvolvimento, sendo que para isso se faz necessário que a temática atraia a
atenção/curiosidade dos participantes. As quatro oficinas de confecção de móbiles do sistema
solar contaram com a presença de setenta e dois participantes ativos que após a finalização da
atividade deram seu relato sobre o que acharam da atividade. Segue alguns deles:
“Eu gostei que a gente fizemos o planeta Terra e de pintar com tintas e de olhar as figuras que
estavam no telão e gostei do planeta terra e as atividades, eu adorei, não eu amei" Walison
“Eu adorei essa tarde foi muito legal e eu adorei fazer o trabalho. Vocês são muito legais,
beijo.” “Isaura” Hoje foi bem legal eu gostei muito, a atividade foi uma obra prima, eu adorei,
também aprendi a fazer planeta de pendurar. Eu gostei muito da parte que a gente pintou foi
muito legal, foi um dia muito bom" Rafaela Silva
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"Eu gostei da atividade do espaço, eu aprendi a fazer o sistema solar, eu gostei da parte de
pintar" Luiz Eduardo.
“Eu achei legal adorei fazer estas coisas pintar d+. Volte sempre, sempre que vocês vir
vamos receber de braços abertos muito bom o que vocês fizeram”.
“O sol é muito grande, marte não é muito legal não. Urano tem um nome estranho. Netuno
mais ou menos. Mercúrio, bom, é esquisito. A rainha da beleza é tão linda. O júpiter é muito
mais legal. E o planeta terra é muito mais legal e é o nosso lar" " Os planetas são umas bolas
que rebolam lá no céu. o sol aquece todos os outros planetas, eles são de várias cores, tem
azul, marrom, cinza e várias cores." Gabriel Sarturi.
Figura 1- Primeira oficina de móbiles
Figura 2- Segunda oficina de móbiles
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Figura 3- Oficina com turma do EJA
A participação dos alunos nas atividades foi intensa, e às vezes bastante tumultuada já
que as séries iniciais possuem sempre mais de vinte alunos por turma, tornando em certos
momentos difícil atender a todos os chamados. Mas apesar deste empecilho que poderia ser
solucionado com uma simples reorganização de número de alunos por sala, o
interesse/curiosidade demonstrado pelas crianças foi evidente, e demonstrado principalmente
por trazerem a tona temática além daquelas propostas, assim como também pela vontade de
contar aquilo que eles já tinham visto em algum momento de suas vidas.
Outro aspecto importante foi a satisfação demonstrada pelos alunos em saber que cada
um receberia um material individual podendo pintá-los livremente e que no final poderiam
levar para suas casas. As oficinas de móbiles foram realizadas nos meses de Abril e Junho de
2011, passaram-se dois meses e ainda hoje eu escuto: O meu móbile ainda está pendurado.
CONCLUSÃO
A proposta das oficinas não é a de dar respostas prontas como formulas e sim incitar a
reflexão partindo da implantação da dúvida, para que os participantes cheguem a novas
respostas ou a novas desconfianças que os movimentarão a novas reflexões e que assim o
pensamento permaneça vivo, em movimento para novas descobertas.
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A temática pessoal que cada bolsista do projeto escolheu vai do gosto individual,
porém, ele é apenas um norteador, um incentivo para que cada bolsista não se sinta oprimido
para a execução de algo externo que não tenha a ver com suas particularidades/gostos. Não
fossem assim, as discussões mais intensas, como é o caso, sobre como a educação hoje está
posta, o projeto não seria coerente.
Para que as oficinas, assim como para que o ensino de História em qualquer ambiente
tenha algum êxito, isto é o envolvimento almejado, é necessário à identificação dos
participantes, só assim a História fará sentido, pois se não, ficaremos no repasse de
curiosidades e informações estéreis.
REFERÊNCIAS
BULFINCH, Thomas. O livro de Ouro da Mitologia. 27. ed. (trad. David Jardim Junior).
Rio de Janeiro, 2002.
CANIATO, Rodolpho. O que é Astronomia. Coleção Primeiros Passo. São Paulo:
Brasiliense, 1994.
CORRÊA, Guilherme. Oficinas: Novos Territórios em Educação. In: Pey, M. O. (org.).
Pedagogia Libertária – Experiência Hoje. São Paulo, Imaginário. 2000.
FREIRE, Paulo. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975.
GALLO, S. Educação Libertária. Conhecimento, transversalidade e educação: para além da
interdisciplinaridade. Disponível em:
http://www.nodo50.org/insurgentes/biblioteca/educacao_libertaria_varios.pdf Acesso em: 10
de Julho de 2011.
PEY, Maria Oly. Esboço para uma história da escola do Brasil: algumas reflexões
libertárias. Rio de Janeiro: Achime, 2000.
SAUNDERS, Nicholas. Américas Antigas, as grandes civilizações. São Paulo: Madras,
2005.
WILDE, Oscar. A alma do homem sob o socialismo. Porto Alegre: L PM, 2003.
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