ESTUDO RETROSPECTIVO DE PACIENTES EM TRATAMENTO CRÔNICO COM WARFARINA Daiana Lindolpho de Almeida Rio de janeiro 2011 ii DAIANA LINDOLPHO DE ALMEIDA Aluna do Curso de Tecnologia em Biotecnologia Matrícula 0613800201 ESTUDO RETROSPECTIVO DE PACIENTES EM TRATAMENTO CRÔNICO COM WARFARINA Trabalho de conclusão de curso, TCC, apresentado ao curso de graduação em Biotecnologia, da UEZO como parte dos requisitos para a obtenção de grau de Tecnólogo em Biotecnologia, sob a orientação da Professora Doutora Jamila Alessandra Perini. Rio de Janeiro Junho 2011 iii ESTUDO RETROSPECTIVO DE PACIENTES EM TRATAMENTO CRÔNICO COM WARFARINA Elaborado Por Daiana Lindolpho de Almeida Aluna do curso de Tecnólogo em Biotecnologia da UEZO Este trabalho de Graduação foi analisado e aprovado com Grau: .................................... Rio de Janeiro, 07 de julho de 2011. _______________________________________________ Drª Jamila Alessandra Perini, Presidente da Banca ________________________________________________ Drª Alessandra Micherla Rodrigues do Nascimento, Membro ________________________________________________ Dr Leandro Medeiros Motta, Membro Rio de Janeiro, RJ – Brasil Julho de 2011 iv Dedico este trabalho aos meus pais, por por todo amor e dedicação para comigo, por terem sido a peça fundamental para que eu tenha me tornado a pessoa que hoje sou. A minha irmã Isabele e ao meu noivo pelo apoio dispensados em todos os momentos que precisei. v Agradecimentos A Deus por ter me dado força e iluminado meu caminho para que pudesse concluir mais uma etapa da minha vida; Aos meus pais Mainarde e Nilza, por todo amor e carinho e dedicação que sempre tiveram comigo. Meus eternos agradecimentos pelos momentos em que e meio a tantas dificuldades, vocês sempre estiveram ao meu lado me apoiando e fazendo acreditar que nada é impossível. Sou muito orgulhosa de ter os senhores como meus pais, pois, vocês abriram mão de muitas coisas para me proporcionar a realização deste trabalho, por terem acreditado na minha capacidade e a todo momento estiveram ao meu lado não me deixando desistir e me mostrando que eu sou capaz. A minha irmã Isabele pelo carinho e atenção que sempre teve comigo, me apoiando em todos os momentos. Ao meu amor Carlos Augusto, eu te amo! Você foi uma pessoa fundamental para que eu prosseguisse. Obrigada por todos os momentos (inclusive vários finais de semanas) em que você soube esperar e aguentar o meu mau humor, por ter sempre ter me apoiado, estando ao meu lado mesmo diante de todas as dificuldades que enfrentei. Meu amor sou eternamente grata por todo o seu esforço para me poupar a todo tempo para que eu pudesse alcançar o meu objetivo. Aos amigos que fiz durante o curso, pela verdadeira amizade que construirmos e por todos os momentos que passamos durante esses anos. Meu especial agradecimentos à todos pois sem vocês essa trajetória não seria tão prazerosa. A minha orientadora, doutora Jamila Perini, pelos ensinamentos, profissionalismo, dedicação, apoio e encorajamento dispensada no auxílio á concretização deste projeto. O meu eterno agradecimento por ter acreditado em mim! Obrigada por todas as noites mal dormidas na qual você teve para que este trabalho pudesse ser concluído. Por fim, gostaria de agradecer aos meus amigos e familiares, pelo carinho e pela compreensão nos momentos em que a dedicação aos estudos foi exclusiva, a vi todos que contribuíram direta ou indiretamente para que esse trabalho fosse realizado, meu eterno AGRADECIMENTO. vii RESUMO A warfarina é o anticoagulante oral mais utilizado no mundo. O ajuste da dose é baseado no monitoramento do tempo de coagulação da protombina, expresso pela Razão Normalizada Internacional (INR). O estabelecimento adequado da dose de warfarina é dificultado devido à estreita janela terapêutica dos anticoagulantes orais, e à ampla variabilidade inter e intra-individual dos pacientes. A administração da dose incorreta aumenta o risco do paciente apresentar hemorragias ou falhas no tratamento anticoagulante. Fatores genéticos, clínicos e demográficos têm sido associados com a resposta terapêutica da warfarina. Assim, é de suma importância descrever o perfil dos pacientes brasileiros em tratamento crônico com o anticoagulante oral warfarina no Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras INCL, e correlacionar as variações inter e intraindividuais desses pacientes com as doses requeridas de warfarina, com o valor de INR e com a incidência de hemorragia. É necessário certificar quais são fatores demográficos e clínicos que podem influenciar na dose requerida de warfarina. Avaliar as interações medicamentosas que predispões o pacientes a hemorragias graves. Avaliar as Influências dos polimorfismos dos genes CYP2C9 e VKORC1 na dose requerida de warfarina, com o valor de INR e com a incidência de hemorragia. Por sua vez, o conhecimento de todos os fatores que influenciam na dose requerida de warfarina, pode resultar em diminuição do tempo de uso de anticoagulantes injetáveis concomitantemente, evitar que ocorram eventos hemorrágicos e internações, o que poderia em última análise, diminuir os custos da terapia. Palavras Chaves: Anticoagulante oral, warfarina, INR e hemorragias. vii viii ABSTRACT Warfarin is the most widely used oral anticoagulant in the world.Dose adjustment is based on monitoring of prothrombin clotting time, expressed by the International Normalized Ratio (INR).Establishing appropriate dose of warfarin is complicated due to the narrow therapeutic window of oral anticoagulants, and the wide variability within and between individual patients. The dosing increases the risk of incorrect patient experiences bleeding or anticoagulant treatment failures. Genetic, clinical and demographic factors have been associated with therapeutic response to warfarin. Thus, it is very important to describe the profile of Brazilian patients on chronic oral anticoagulation with warfarin at the National Institute of Cardiology Laranjeiras INCL, and correlate the variations within and between these individual patients required doses of warfarin, with the value INR and the incidence of bleeding. You need to ensure what demographic and clinical factors that may influence the required dose of warfarin. Evaluate the drug interactions that predispose patients to serious bleeding.Assessing the Influence of polymorphisms of CYP2C9 and VKORC1 genes on the required dose of warfarin, the INR value and the incidence of bleeding. In turn, the knowledge of all factors that influence the required dose of warfarin may result in decreased duration of use of injectable anticoagulants concomitantly prevent bleeding events occur in hospitals, which could ultimately reduce the cost of therapy. Keywords: Oral anticoagulant, warfarin, INR, bleeding. ix SUMÁRIO RESUMO.....................................................................................................................vii ABSTRATC................................................................................................................ vii Keywords: Oral anticoagulant, warfarin, INR, bleeding. .....................................viii SUMÁRIO ..................................................................................................................ix 1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................10 2. Objetivo .................................................................................................................38 2. Verificar quais fatores demográficos e clínicos podem influenciar na dose requerida de warfarina; ............................................................................................38 3. Avaliar as interações medicamentosas que predispões o pacientes a hemorragias graves; ................................................................................................38 4. Avaliar as Influências dos polimorfismos dos genes CYP2C9 e VKORC1 na dose requerida de warfarina, com o valor de INR e com a incidência de hemorragia. ...............................................................................................................38 3. MÉTODOS .............................................................................................................39 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO .............................................................................41 4. CONCLUSÃO ........................................................................................................65 5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................67 Howes, CJ. e cols. Exercise tolerance and quality of life in elderly patients with chronic atrial fibrillation. J Cardiovasc Pharmacol Therapeut, v.6, n.1, p.23-29, 2001. .........................................................................................................................69 Takahashi H.; Echizen H Pharmacogenetics of Warfarin Elimination and its Clinical Implications Clinical Pharmacokinetics, Volume 40, Number 8,p. 587603(17), 2001. ............................................................................................................74 Tang, E.O.Y.L. e cols. Relationship between patients’ warfarin knowledge and anticoagulation control. The annals of pharmacotherapy. v.37, p. 34-39, Jan.,2003. ..................................................................................................................74 6. 77 10 1. INTRODUÇÃO 1.1. ANTICOAGULANTE ORAL WARFARINA Anticoagulantes orais são fármacos que retardam a coagulação sanguínea. São aplicados no tratamento das patologias do sistema circulatórios e distúrbios da coagulação prevenindo fenômenos tromboembólicos (RANG E DALE, 2006). Apesar de estarem associados a um alto risco de hemorragias fatais, são os mais utilizados devido a sua excelente biodisponibilidade (BATLOUNI, 1999). Dentre os anticoagulantes orais, a warfarina é a mais utilizada por ser considerada a mais confiável pela classe farmacêutica (KATZUNG, 2004), e por apresentar início e duração de ações previsíveis. A warfarina é o anticoagulante oral mais amplamente utilizado no tratamento em longo prazo de tromboembolismo, na profilaxia e/ou tratamento da trombose venosa e sua extensão, na embolia pulmonar e na fibrilação atrial. Também é usado na profilaxia da embolia sistêmica após infarto do miocárdio e na sua prevenção (GAGE e cols., 2006). A warfarina é derivada da bis-hidroxicumariana (figura 1) que foi descoberta no século XX por agricultores do norte dos Estados Unidos e do Canadá que começaram a cultivar Trevo-de-Cheiro (Melilotus officinalis) importado da Europa. Apesar dessa planta ser rica nutricionalmente, quando usada como ração, provocava uma doença fatal que dizimou manada de gado e assustou os criadores. O gado afetado por esta doença apresentava rigidez, e hemorragias espontâneas (REMIÃO, 2004). Em 1921, Schofield, veterinário, associou a doença ao consumo de forragem de Trevo-de-Cheiro estragado. Karl Paul Link e seus colaboradores em 1940 descobriram que a cumarina é oxidada a 4-hidroxicumarina, reagindo com o formaldeído formando o dicumarol, um anticoagulante, sendo este o responsável pela presença da doença. O dicumarol foi patenteado e usado terapeuticamente como anticoagulante em 1941 (REMIÃO, 2004). O seu uso primeiramente foi como rodenticida potente sendo comercializado, a partir de 1948, como veneno para ratos. Em 1950, Link propôs que a warfarina fosse considerada como um antitrombótico 11 uma vez que ela apresentava eficácia bastante semelhante como rodonticida. Foi relutante inicialmente a sua prescrição pela classe médica, pois a warfarina era considerado um rodonticida bem estabelecido. No entanto, em 1951, um recruta do exército americano sobreviveu após uma tentativa de suicídio após a ingestão de veneno para rato que continha mais de 500mg de warfarina. Em 1954, foi aprovada e reconhecida a importância clinicada warfarina para uso médico no tratamento de trombose em humanos. Seu nome deriva da sigla para a organização que financiou a pesquisa fundamental, WARF, para Wisconsin Alumni Research Foundation acrescido a desinência - arin indicando a sua relação com a cumarina. Em 1955, a reputação do fármaco foi estabelecida nos EUA após ser prescrita ao presidente Eisenhower quando ele sofreu um enfarto do miocárdio. Desde então é considerada o anticoagulante de escolha em hospitais nos EUA e Brasil (REMIÃO, 2004). Figura 1: Estruturas químicas da cumarina e seus derivados. Fonte: Care Group Health Care System, 2008. Apesar do uso comum da warfarina, sua terapia está associada a complicações hemorrágicas (WADELIUS e cols., 2005). O mecanismo exato da sua ação 12 permaneceu desconhecido até que foi demonstrado, em 1978, que a warfarina inibe a enzima epóxiredutase e, conseqüentemente, interfere com o metabolismo da vitamina K, conforme mostrado na figura 2. A vitamina K em sua forma reduzida (KH2) juntamente com o dióxido de carbono e oxigênio molecular atua como co-fator essencial para a γ-carboxilação dos radicais do ácido glutâmico realizado pela enzima gama-glutamil carbolixilase (GGCX). Essa enzima é responsável por tornar ativos os fatores de coagulação (II, VII, IX e X) dependentes de vitamina K que são necessários para a coagulação sanguínea. Neste processo, a KH2 é oxidada a epóxi-vitamina K e a seguir retorna a KH2 pela ação de duas redutases, completando o ciclo da vitamina K. A warfarina inibe a ação das duas redutases e consequentemente, reduzindo a quantidade de vitamina KH2 disponível, limitando o processo de carboxilação (KLACK e cols., 2006). Figura 2: Ciclo da vitamina K. A warfarina inibe a ação das redutases, inibindo a síntese de vitamina K1 e vitamina KH2 (KLACK e cols., 2006) 13 A vitamina K também é necessária para a ativação de três proteínas anticoagulantes (C, S e Z) que combatem a coagulação do sangue. Apesar da deficiência de vitamina K ser prejudicial para a função destas enzimas, o efeito de maior importância é nos fatores de coagulação II, VII, IX e X, pois reduz a capacidade do sangue de formar coágulo. A vitamina K e as proteínas Kdependentes estão também envolvidas, por exemplo, na minerilização óssea, no apoptose, e no controle do crescimento (KLACK e cols., 2006). A quantidade corporal de vitamina K é limitada e para poder manter a carboxilação da GGCX e os fatores de coagulação, a vitamina K é convertida da sua forma reduzida hidroquinona a forma oxidada vitamina K epóxido redutase, sendo assim funciona como uma bateria recarregável que após ser carregada (isto é reduzida a forma hidroquinona) está pronta para o processo de carboxilação da enzima GGCX. Apesar do ciclo de vitamina K ser repetitivo, uma molécula de vitamina K fica disponível no organismo durante um dia e meio antes de ser eliminada pela urina ou pela bílis, sendo necessário o consumo para que mantenha uma coagulação sanguínea adequada (OLSON e cols., 2002). A warfarina é um derivado sintético da 4-hidroxicumarina uma substância química relacionada com o dicumarol e consiste de uma mistura racêmica de dois isômeros ópticos ativos (R) - e (S) – isoformas (figura 3), e suas propriedades farmacocinéticas e farmacodinâmicas diferem consideravelmente, porque o (S)enantiômero é três a cinco vezes mais potente como anticoagulante do que (R)enantiômero. O clearence da (s)-warfarina é maior e sua meia-vida é mais curta do que o (R)-warfarina respectivamente). (0,31 versus 0,51 L/h/70kg Essas diferenças na e 24 farmacocinética versus das 40 duas horas formas enantiomérica resulta em níveis mais elevados de estado estácionários de (R)warfarina em comparação com o isômero mais ativo (S)-warfarina (LAL e cols.,2006). Uma vez que a warfarina é administrada como um composto rancêmico, ou seja, uma mistura 1:1 de S-warfarina e R-warfarina, pode-se dizer que a warfarina não é um fármaco, mas dois fármacos usados em conjunto, aumentando a sua complexidade farmacológica (HOLBROOK e cols., 2005). 14 Figura 3: Warfarina: enantiômeros (R) - e (S). Os asteriscos denotam o centro quiral de cada molécula (DOLLERY, 1999) A warfarina é quase completamente absorvida por via oral atingindo sua concentração máxima sanguínea em 2 a 8 horas após a administração (D’ANDREA e cols.,2008). A meia vida plasmática é de 36 a 72 horas, exceto por cerca de 27 horas em alcoólicos, e em pessoas que estejam utilizando fenobarbitol ou outro indutores das enzimas microssômicas hepáticas (Ufer , 2005 ). O seu efeito máximo ocorre em até 48 horas e perdura por até 5 dias (D´ANDREA e cols.,2008). Apesar do seu uso comum, a warfarina pode ser associada a complicações hemorrágicas significativas, e conseguir uma dose terapêutica com resposta segura pode ser difícil devido à sua estreita janela terapêutica e de sua grande variabilidade na dose necessária, que é, sobretudo, uma conseqüência de variações individuais já conhecidas (PIATKOV e cols.,2010). Assim, a variabilidade interindividual da dose requerida de até 10 vezes faz com que o paciente tenha um acompanhamento freqüente para que a sua dose seja ajustada (PIATKOV e cols., 2010). O monitoramento do anticoagulante oral warfarina é feito diariamente pelo teste que dosa o tempo de coagulação da protrombina (TP), expresso pela Relação Normalizada Internacional (INR), que demonstra a eficácia do tratamento. Apesar do tempo de protombina ter sido descrito desde 1935, por Armand Quick, para monitoração do efeito da cumarina, posteriormente o método sofreu modificações, 15 mas manteve o mesmo princípio (POLLER, 2004). Na década de 80, visando diminuir os problemas causados pela variabilidade na sensibilidade dos reagentes e visando estabelecer uma padronização do TP no controle do uso de anticoagulante oral, os fabricantes de reagentes foram então orientados a comparar as tromboplastinas produzidas com a tromboplastina de referência mundial da OMS e calcular o Índice de Sensibilidade Internacional (ISI) para cada lote de reagente produzido (ANSELL e cols., 2004). O valor do ISI é usado para calcular o INR (Internacional Normalized Ratio), que nada mais é que o TP "corrigido ou normatizado", conforme equação mostrada na figura 4, o INR padroniza o tempo de protombina, de modo que não varie independente do tipo de tromboplastinas utilizado (GOODMAN e GILMAN, 2003). Figura 4: Equação para o cálculo do INR Na maioria das situações o intervalo terapêutico indicado é de 2,0 a 3,0, conforme tabela 1, sendo o mais seguro, pois a recorrência de eventos tromboembólicos é mais freqüente quando o INR é mantido abaixo de 2,0. Pacientes que utilizam válvulas cardíacas ou pacientes com embolia sistêmicas recorrentes recomenda-se que o INR seja entre 2,5 e 3,5 (tabela 1). Quando o INR está acima do limite superior da faixa terapêutica há um grande risco do paciente ter um evento hemorrágico. A freqüência de eventos hemorrágicos associados à warfarina varia de 1,3% a 4,7% anualmente (SCONCE e cols., 2005). A restauração do INR para o intervalo terapêutico revertendo a hemorragia é possível administrando 1ou 2 mg de vitamina K (REYNOLDS e cols., 2007). 16 Tabela 1 - Intervalos terapêuticos recomendados para a anticoagulação oral Indicações INR Profilaxia da trombose venosa 2,0 - 3,0 Tratamento da trobose venosa 2,0 - 3,0 Tratamento da embolia pulmonar 2,0 - 3,0 Prevenção de embolia sistêmica 2,0 - 3,0 Valvulas cardíacas biológicas 2,0 - 3,0 Infarto agudo do miocárdio (para prevenir embolia sistêmica)* 2,0 - 3,0 Doença valvar cardíaca 2,0 - 3,0 Fibrilação atrial 2,0 - 3,0 Prótese valvar mecânica (alto risco) 2,5 - 3,5 Valva mecânica duplo folheto em posição aórtica 2,0 - 3,0 Dispositivos de assistência ventricular 2,5 - 3,0 * o INR de 2,5 e 3,0 é proposto de acordo com as recomendações do FDA para prevenir infarto do miocárdio recorrente. No início do tratamento com a warfarina, o ajuste da dose é realizado de forma empírica para evitar a ocorrência de anticoagulação excessiva. Dada a falta de previsibilidade do INR de um individuo em resposta a warfarina, recomenda-se que o INR seja monitorado diariamente durante a fase de iniciação. Após o paciente alcançar o INR-alvo terapêutico, a frequência de monitoramento pode ser reduzida para dias alternados por uma semana. Uma vez que o INR está estabilizado em uma determinada dose de warfarina, o monitoramento do INR pode ser feito mensalmente. A dosagem inicial da terapia com a warfarina é de 5 miligramas durante 3 ou 4 dias até o paciente alcance o INR terapêutico. Entretanto, já é sabido que a dose de warfarina varia de acordo com variáveis clínicas, fatores demográficos e até mesmo em função de polimorfismos genéticos (WADELIUS e cols., 2005). 17 Durante os primeiros dias de tratamento com a warfarina, ainda há fatores de coagulação previamente sintetizados, ativos na circulação sanguínea, mantendo a capacidade de coagulação do sangue. O tempo de diminuição da concentração destes fatores pode levar de 3 – 7 dias mantendo o risco de trombose. Para atenuar esse risco, é comum a administração inicial combinada com heparina que é um anticoagulante intravenoso. Apesar do acompanhamento criterioso no início do tratamento, não há uma minimização dos riscos de respostas variáveis entre os pacientes e torna-se um desafio manter um intervalo terapêutico ideal (REYNOLDS e cols., 2007). A influência de fatores clínicos, demográficos e genéticos na resposta individual da warfarina, bem como a tendência desse medicamento em provocar hemorragias graves e fatais torna o tratamento com esse anticoagulante difícil, sendo necessário um acompanhamento criterioso monitorado pelo INR. Dessa forma, é importante identificar quais fatores podem identificar na dose terapêutica da warfarina minimizando assim a necessidade do ajuste de dose, e consequentemente a exposição do paciente a eventos hemorrágicos ou quadros de trombose. 1.2. FATORES QUE INFLUÊNCIAM NA TERAPIA ANTICOAGULANTE COM A WARFARINA Variações no nível da anticoagulação causadas por fatores clínicos demográficos e genéticos, conforme mostrado na figura 5 limita o uso da warfarina e estão relacionados ao risco de desenvolver hemorragias, pois, dificultam o controle da ação da warfarina baseada no INR. Esses fatores podem ser extrínsecos como as interações medicamentosas, interações alimentares, ou fatores intrínsecos como sexo, função hepática, comorbidades e polimorfismos em genes envolvidos na farmacocinética e farmacodinâmica da warfarina, como por exemplo, CYP2C9 e VKORC1 (KLACK e cols., 2006 ). Dentre os fatores não genéticos, a idade é uma das principais variáveis que contribui na dosagem da warfarina. 18 Genótipo CYP2C9 10% Figura 5: Fatores que contribuem para a variabilidade interindividual na resposta à Warfarina. Os fatores não genéticos incluem a idade, sexo e interações medicamentosas (LIMA e cols., 2010) 1.2.1. FATORES DEMOGRÁFICOS E O TRATAMENTO COM A WARFARINA A idade não constitui contra indicação para a terapia com warfarina, porém a indicação da warfarina deve ser avaliada e monitorada rigorosamente devido às possibilidades de patologias associadas ao idoso que predispõe o sangramento. Pacientes com idade acima de 60 anos necessitam de doses iniciais mais baixas devido à disfunção hepática, mas em caso de disfunção renal, não há alterações significativas, e possível redução do clearence da warfarina. É recomendado dose 19 com menos de 5 mg por dia e acompanhamento rigoroso aos pacientes com mais de 60 anos ( ANSELL e cols.,2008). Goldenberg e colaboradores, em 2010, identificaram a idade como um fator até mais importante do que genótipos os VKORC1 e CYP2C9 para determinar a dose terapêutica da warfarina. Esse estudo citou que a idade representa 28% na variação da dose terapêutica de warfarina em crianças e 17% em adultos. Além da idade, o desequilíbrio na ingestão de vitamina K pode interferir no tratamento com warfarina, pois, a vitamina K atua como cofator para a carboxilação de resíduos de ácido gama carboxiglutâmico que está envolvido na ativação dos fatores de coagulação II, VII, IX e X. Duas formas naturais de vitamina K existem: a filoquinona, que é referida como K1, e as menaquinonas, referidas como K2. A vitamina K1 é encontrada principalmente em folhas verdes de vegetais, como espinafre, salsa, brócolis e couve (BOOTH e cols., 2006). O fígado, a carne de porco e vaca também contém altas quantidades de vitamina K, devido ao fato desses animais se alimentarem de uma dieta rica em folhas verdes. A produção da vitamina K2 é feita internamente e envolve a população bacteriana da flora no intestino grosso, e é uma fonte importante, mais não em quantidades significativas, de vitamina K (ANSELL e cols., 2004). A tabela 2 traz uma lista com o teor de vitamina K de alguns alimentos ou preparações. A relevância clínica da interação da vitamina K tem sido discutida e demonstrado em diversos estudos que verificaram que pacientes com uma deficiência de vitamina K podem ter um efeito na anticoagulaçao potencializado com o controle menos instável (SCONCE e cols., 2005) especialmente quando submetidos à terapêutica com antibióticos, estados hipermetabólicos, insuficiência hepática e insuficiência renal (BATLOUNI, 1999). Em casos graves de hemorragias ou em pacientes com instabilidade na anticoagulação é administrado suplementação oral de vitamina K, mas não há evidências de que a vitamina K leve à resistência à terapia com warfarina. Indivíduos com idade acima de 60 anos apresentam concentrações de K1 significativamente maiores em relação a adultos jovens (abaixo de 40 anos), independentemente da ingestão dietética (DORES e cols., 2001). 20 Já é comprovado que o sexo é um dos fatores que influência na terapia com a warfarina. Alguns estudos mostram que a dose de manutenção da warfarina é significativamente maior para os homens em comparação com as mulheres. Essa tendência pode ser influenciada pelo uso crônico do álcool, que é mais comum nos homens (RANG e DALE, 2006). Um estudo destacou que a diferença entre a superfície corporal média dos homens por comumente ser maior do que as mulheres pode ser um dos fatores que explicam a necessidade de doses menores em mulheres (NIEMELA e cols.,1999). Estudos relatam que as diferenças entre os sexos pode ser relacionada ao clearence pelo citocromo P450, mas necessitam ser estudos mais profundos, apesar de um estudo experimental com modelo animal sugerir que a expressão de algumas enzimas do citoromo P450 pode ser modulada pelos hormônios esteróides sexual (NIEMELA e cols.,1999). Mulheres em período reprodutivo que fazem uso de anticoncepcionais podem ter a dose de warfarina aumentada devido os contraceptivos orais diminuir o seu efeito, porém em alguns estudos já foi verificado que as doses semanais para as mulheres em qualquer idade é em torno de 4,5 mg menor em comparação com a dose administrada aos homens (Garcia e cols., 2006). 21 Tabela 2: Teor de vitamina K em alguns alimentos ou preparações (Klack e cols., 2006) 22 1.2.2. INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS COM O USO DA WARFARINA Cerca de 500 medicamentos (BAXTER, 2008) que, ao interagirem com os anticoagulantes orais, potencializam sua ação, inibem sua ação ou reduzem sua absorção, interferindo substancialmente na eficácia e segurança da terapêutica ou por inibição ou aceleração do seu clearence causando um aumento do INR. Na tabela 3 está listado alguns medicamentos que podem reduzir ou aumentar o efeito dos anticoagulantes orais (KLACK e cols., 2006). Interações medicamentosas podem ser divididas em interações na farmacocinética ou na farmacodinâmica. Interações na farmacocinética são responsáveis por modificar a absorção, distribuição e eliminação de um fármaco alterando a sua concentração no local de ação farmacológica. A interação mais importante para a farmacocinética da warfarina é no mecanismo do metabolismo hepático da warfarina devido à inibição ou indução do citocromo P450, CYP2C9, em particular. A eliminação do enântiomero S- warfarina, que é cinco vezes mais potente que o enâtiômero R-warfarina, é feito exclusivamente pela enzima CYP2C9 tornando as interações deste enântiomeros mais importante clinicamente e mais vulnerável a interações medicamentosas que alvejam esta enzima (GREENBLATT e cols., 2005). Antinflamatório não-estereoidais (AINEs) administrado com warfarina pode resultar em hemorragias graves causada, em parte, por seu efeito na síntese de tramboxana plaquetária e agravada pelo seu poder de causar úlceras criando assim, um substrato para hemorragias. Além disso, os AINES competem pela mesma enzima de metabolização já que também são substratos da CYP2C9 (RANG e DALE, 2006). Nas interações que envolvem a farmacodinâmica, há uma alteração na sensibilidade a uma determinada concentração do fármaco (efeito-concentração) pelo efeito no alvo do fármaco. No caso da warfarina, um paciente pode sofrer de sangramento, sem alteração significativa do INR. Neste caso, a monitorização do INR não é um bom preditor de sangramento e é necessário, portanto, antecipar qual interação pode ocorrer com base no conhecimento da farmacologia. Esses efeitos são causados por deslocamentos da ligação dos anticoagulantes com a albumina, 23 pois a warfarina encontra-se ligada as proteínas plasmáticas em 97% a 99% (RANG E DALE). Tabela 3: Interações Medicamentosas com anticoagulantes orais (Couma Care) 24 25 Interações na farmacodinâmica incluem alimentos ou medicamentos contendo vitamina K e fármacos antiplaquetários. A aspirina é um antiplaquetário que inibe a biossíntese do tramboxane A2 das plaquetas podendo causar aumento no risco de sangramento, principalmente no estômago, se administrada durante o tratamento com a warfarina. Apesar de oferecer risco, a combinação da administração desses dois fármacos pode ser utilizada desde que haja um monitoramento cuidadoso (RANG E DALE, 2006). O conhecimento das interações com a warfarina é amplamente baseada em relatos de casos e em estudos experimentais, enquanto que a sua importância clínica no tratamento de pacientes ainda é menos compreendida. Um estudo realizado por pesquisadores do General Practice Research Database no Reino Unido indicou que há um maior risco de 4 vezes de ocorrências hemorragias em indivíduos tratados concomitantemente com fármacos antiplaquetários e warfarina do que os tratados com warfarina isoladamente. Neste mesmo estudo, o uso de outros fármacos, como por exemplo, a amiodarona, potencializou o efeito da warfarina, aumentando o risco de hemorragias graves em mais de 3 vezes (GASSE e cols., 2005). Alguns tipos de antifúngicos, azol, são importantes inibidores da warfarina. Indutores como a rifampicina e vários medicamentos antiepiléticos causam uma redução do INR contribuindo para o aumento considerável para a dose necessária adequada para o efeito coagulante da warfarina. Antiarrítmicos como amiodarona interferem no clearence de ambos os isômeros da warfarina podendo aumentar o INR (MIMS Austrália, 2010). Alguns antibióticos podem interferir na administração da dose da warfarina. Antibióticos de amplo espectro e algumas sulfonamidas diminuem a flora bacteriana do intestino causando a diminuição da produção de vitamina K2 pelas bactérias intestinais e consequentemente o aumento do INR pela ação antioagulante da warfarina potencializada (RANG E DALE, 2006). Esse efeito só é agravado se houver uma mudança alimentar que resultam na redução da quantidade de ingestão de vitamina K (KLACK e cols., 2006). A prescrição de fármacos que interagem potencialmente com a warfarina é comum durante a sua terapia e apesar das interações contribuírem significativamente para o risco de sangramentos e hemorragias, o conhecimento dos 26 precursores dessas interações ainda é limitada em pacientes tratados com warfarina na população brasileira. 1.2.3. DOENÇAS ASSOCIADAS E O TRATAMENTO COM WARFARINA A terapia com warfarina é amplamente comum no tratamento a logo prazo em pacientes portadores de complicações cardiovasculares devido a doença tromboembólica ter como consequências graves o infarto do miocárdio, trombose venosa profunda e doença nas válvulas cardíacas, além do acidente vascular cerebral, fibrilação atrial, embolia pulmonar (RANG E DALE, 2006). A excelente biodisponibilidade e ótimo custo-benefício fazem com que a warfarina seja o principal anticoagulante oral na área cardiológica (LEITE e cols., 2005) e a duração desse tratamento depende da localização e extensão da doença, da existência de outros fatores e condições associadas (BARBOSA, 2004). A insuficiência cardíaca representa um dos maiores problemas de saúde pública enfrentado pelos sistemas de saúde nos países industrializado (Brown e cols.,1997). No Brasil cerca de 6,5 milhões de pessoas tem insuficiência cardíaca; onde 30% são internados anualmente representando 4% de todas as internações. Com cerca de 31% das internações cardiovasculares que representa 380 000 hospitalizações/ano; com a média de 5,8 a cada dia gerando um custo de R$ 200 milhões anuais e com 5,6 a 6,0% de mortalidade hospitalar (Ministério da Saúde). A hospitalização de pacientes com insuficiência cardíaca é além de um alto custo também têm um índice considerável de morbidades, pois a maioria dos pacientes são idosos e, portanto, são mais susceptíveis a ter outras comorbidades (BROWN e cols.,1997). Pacientes com histórico de insuficiência cardíaca congestiva devem receber doses menores warfarina durante o início da terapia. Devem ser monitorados para os sinais e sintomas de agravamento da insuficiência cardíaca congestiva e ter o seu INR monitorado durante as exacerbações. Existem poucos dados para 27 estabelecer a relação entre insuficiência cardíaca e o tratamento com a warfarina, mas evidência de um estudo prospectivo recente sugere que pacientes com insuficiência cardíaca congestiva são mais propensos a hemorragias quando fazem uso de warfarina (VISSER e cols., 2005). O fígado desempenha um papel crítico na produção de fatores de coagulação do sangue e ao metabolismo da warfarina pelo do sistema enzimático citocromo P450. Doenças hepáticas estão associadas a uma redução na síntese de fatores de coagulação V, VII, X e protombina (GALLUS e cols., 1972). Essa redução na síntese dos fatores de coagulação reflete na elevação do INR, mesmo na ausência de warfarina e essa associação tem sido utilizada para prognósticos, pois a redução é associada com incidências de hemorragias (KUJOVICH, 2005). Por tem seu metabolismo quase que inteiramente realizado pelo sistema enzimático P450, pacientes com doenças hepáticas tem uma menor atividade da enzima e uma quantidade de metabólicos reduzida e isso corresponde a um aumento do INR (RANG E DALE, 2006). A presença de doença renal também tem uma consideração importante, pois está associado ao risco de sangramentos. O uso associado de fármacos urêmico e warfarina predispõe o paciente com isuficiência renal ao risco de eventos hemorrágicos no início do tratamento (White, 2010). A warfarina liga-se, na faixa de 99%, com limitada distrubuição nos líquidos corporais. Sua ligação protéica é reduzida nos estados urêmicos, o que resulta em aumento do clearence corporal e menor meia-vida (RANG E DALE, 2006). Os metabólicos hepáticos da warfarina são excretados na urina, com uma pequena quantidade eliminada de forma inalterada. Embora a insuficiência renal parece ter um efeito negligenciável sobre os efeitos anticoagulantes da warfarina, de modo que é desnecessário a restrição e ajuste de dose, a insuficiência hepática pode aumentar os efeitos da warfarina devido a uma deterioração na síntese de fatores de coagulação e metabolismo reduzido da droga. Um estudo prospectivo recente descreveu que há uma maior incidência de sangramentos com o valor do INR supraterapêutico em pacientes com deficiência renal grave sugerindo uma dose média diária menor (LIMDI e cols., 2008). 28 A tabela 4 lista algumas doenças que interferem com o valor do INR. Diversas comorbidades podem influênciar no INR reduzindo a concentração dos fatores de coagulação, como por exemplo, os estados hipermetabólicos. Existem algumas doenças e condições associadas que aumentam o tempo de protombina, como por exmplo, como as doenças do colágeno, câncer, caquexia, febre, tireotoxicose, diarréia, desnutrição, distúbios pancreáticos, radioterapia, e outras que diminuem, pois ocorre o aumento da síntese de fatores de coagulação como diabetes melito, edema, carcinoma visceral e hipotireoidismo, que se associa à menor degradação dos fatores de coagulação (BARBOSA e cols., 2004, RANG E DALE, 2006). Tabela 4: Doenças que interferem no valor do tempo de protombina e do INR 29 1.2.4. FATORES GENÉTICOS E O TRATAMENTO COM A WARFARINA A relação entre variações genéticas e o efeito farmacológico tem sido observado em um número crescente de medicamentos comumente utilizados. Em 1953, Voguel introduziu o termo farmacogenética na medicina descrevendo como a ciência que estuda as influências genéticas na resposta aos fármacos (ELIANE e cols., 2004). Dentre os medicamentos em que a farmacogenética pode ser aplicada na prática clínica está incluída a warfarina (tabela 5), que segundo o FDA (Food And Administration) está entre os dez medicamentos que mais causam efeitos adversos graves. Tabela 5: Biomarcadores farmacogenéticos (INGELMAN-SUNDBERG, 2008) Gene ou Alelo Medicamento Especificidade Biomarcador do % de pacientes com reação adversa ao medicamento TPMT 6-Mercaptopurina Muito bom 1-10 UGT1A1*28 Irinotecan Bom 30-40 Bom 5-40 CYP2C9 e VKORC1 Warfarina CYP2D6 Antidepressivos triciclicos Relativamente bom 5-7 HLA-B*5701 Abacavir Muito bom 5-8 HLA-B*1502 Carbamazepina Muito bom 10 Ximelagatran Bom 5-7 HLA-DRB1*07 e DQA1*02 30 O significativo interesse da farmacogenética da warfarina foi desencadeado com a recente atualização da bula do medicamento feito pelo FDA em agosto de 2007, em que se destaca o potencial da farmacogenética na segurança e eficácia do tratamento com esse anticoagulante oral (LIMDI e cols., 2008). O FDA encoraja a “medicina personalizada” ao recomendar que seja incluída identificação de polimorfismos nos genes CYP2C9 e VKORC1 antes da administração de warfarina, pois, o conhecimento de determinadas variações genéticas individuais de pacientes, junto com fatores intrínsecos e extrínsecos, pode melhorar os resultados da terapia com o anticoagulante oral. A administração orientada pelos fatores genéticos oferece aos pacientes um tratamento individual promovendo a melhor adesão do paciente ao tratamento, bem como evitando a ocorrência de efeitos colaterais. Diversos estudos em varias populações, inclusive na população brasileira, buscam prever a melhor dose para indivíduos portadores das variações genéticas em CYP2C9 e VKORC1 (BECQUEMON, 2008; PERINI e cols., 2008; IWPC., 2009) 1.2.4.1. ENZIMA CYP2C9 E WARFARINA O citocromo P450 é constituído por uma super família de enzimas de fase I contendo um grupo heme que se localiza na parede do sistema reticular endoplásmico, responsável pela fase final da oxidação, transferindo elétrons de oxigênio molecular para os compostos oxidados. São responsáveis pelas biotransformações de vários compostos de origem endógena e exógena como, por exemplo, reações no metabolismo de fármacos, prostaciclinas, tromboxanos A2, síntese do colesterol, esteróides e outros lipídios (LYNCH e cols.;2007). Biologicamente estas enzimas promovem a modificação química de várias moléculas exógenas lipofílicas, que após isso se tornam mais solúveis e de fácil excreção pelo organismo (THOMAS e cols., 1982). 31 A enzima P450 2C9 (CYP2C9) é responsável pelo metabolismo de diversos medicamentos clinicamente relevantes, incluindo a warfarina (HOLBROOK e cols., 2005). Essa enzima é responsável pela eliminação desse composto e conseqüentemente, o término da sua atividade biológica. A CYP2C9 metaboliza preferencialmente moléculas de ácidos fracos como os antiinflamatórios nãoesteioidais (AINEs), antidiabéticos orais e, conforme mostrado na figura 6 o isômero mais potente S-warfarina. A forma R- warfarina é metabolizada pelas enzimas CYP3A4, CYP1A2 que o isômero R- (TAKAHASHi e cols., 2001). Figura 6: Metabolismo da Warfarina (PIATKOV e cols., 2010) 32 A enzima CYP2C9 (figura 7) é codificada pelo gene de mesmo nome localizado no cromossomo 10q24. CYP2C9 é um gene polimórfico, já tendo sido descritos até o momento 34 alelos variantes, sendo que boa parte deles codifica uma enzima com atividade reduzida (Human Cytochrome P450 Allele Nomenclature Committee - www.imm.ki.se/CYPalleles). O alelo com maior freqüência é considerado a forma selvagem do gene e designado CYP2C9*1 (LIMDI e cols., 2008). As substituições que ocorrem nas posições Arg144Cys e Ile359Leu são denominadas como alelos variantes CYP2C9*2 (RETTIE e cols., 1994) e CYP2C9*3 (SULLIVAN-KLOSE e cols., 1996), respectivamente. Figura 7: Mutações com efeitos funcionais mapeados na estrutura da proteína CYP2C9. O sítio de ligação com S-warfarina e heme são apresentados no modelo de esqueleto com rosa e vermelho, respectivamente (YIN T., 2006) 33 Em 1999, Aithal e colaboradores mostraram a primeira evidência de que polimorfismos do gene CYP2C estão associados às necessidades na redução das doses de warfarina em pacientes tratados que apresentavam um fator de risco para sangramentos (AITHAL e cols.,1999). A contribuição de polimorfismos CYP2C9 sobre o requisito dose de warfarina ou a suscetibilidade a complicações hemorrágicas tem sido extensivamente estudada. Atualmente, vários estudos fornecem evidências de que estes polimorfismos têm um impacto na resposta da warfarina (GAGE e cols., 2005). Taube e colaboradores, em 2000, descreveram uma manutenção com doses muito menores em pacientes com um alelo variante versus o genótipo selvagem, mas, não encontrou evidências de associação entre o genótipo e hemorragias (avaliada pelo INR). Loebstein e colaboradores, em 2005, utilizando a análise de regressão múltipla, informaram que o genótipo CYP2C9 foi independentemente associado com a manutenção da dose de warfarina (LOEBSTEIN e cols., 2005). Vianna-Jorge e colaboradores, em 2008, analisaram a influência de cada alelo variante de CYP2C9 na população brasileira a fim de verificar a influência de cada genótipo na incidência de hemorragias durante as 4 primeiras semanas da terapia com a warfarina. Foi verificado que o risco de sangramentos e hemorragias é abruptamente maior em pacientes que apresentam alelos variantes. A incidência de hemorragias no primeiro mês da terapia foi 4,9 vezes maior em pacientes portadores de alelo variante. Esse dado confirma que polimorfismos o gene CYP2C9 estão associados ao risco de sangramento no início da terapia com a warfarina em pacientes brasileiros (VIANNA-JORGE e cols., 2008). Em 2008, Perini e colaboradores realizaram um estudo durante as consultas de rotina do Sistema Único de Saúde – SUS do Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras e observaram que pacientes brasileiros que apresentam pelo menos um dos alelos variantes para CYP2C9 requerem doses significantemente menores quando comparados com pacientes com genótipo selvagem. A distribuição da dose 34 (mg/semana) nos diferentes grupos de genótipos CYP2C9 em brasileiros são informados na tabela 6 ( PERINI e cols., 2008). Figura 8: Dados correspondem à incidência dos primeiros episódios hemorrágicos e são apresentados como a percentagem de novos eventos em cada grupo de genótipo em 4 semanas ( VIANNA-JORGE e cols., 2008) Diversos estudos relatam a associações entre os alelos variantes CYP2C9 e a necessidade de doses menores de warfarina, bem como associações entre baixas doses de warfarina e acontecimentos hemorrágicos (PERINI e cols., 2008; VIANNAJORGE e cols., 2004; AITHAL e cols., 1999, TAUBE e cols., 2000, LOEBSTEIN e cols., 2005). A contribuição de polimorfismo CYP2C9 sobre os requisitos dose de warfarina ou a susceptibilidade a complicações hemorrágicas tem sido extensivamente estudada, e por isso se faz necessário caracterizar o perfil genético do paciente em tratamento crônico com o anticoagulante oral warfarina. 35 Tabela 6: Distribuição da dose de warfarina (mg / semana) no grupo de polimorfismos genéticos de CYP2C9 em pacientes brasileiros. (Adaptado de PERINI e cols., 2008). Grupos Brancos Intermediários Negros n 196 118 76 CYP2C9 ALELOS VARIANTES 0 1 2 32.4±12.4 24.5±9.8 16.3±5.7 34.6±12.3 29.1±11.7 24.2±11. 37.4±14.5 28.0±11.4 11.3 Anova Valor P <0.0001 0.05 0.005 1.2.4.2 ENZIMA VITAMINA K EPÓXIDO REDUTASE A enzima vitamina K epóxido redutase (VKOR), responsável por reduzir a vitamina K, que serve como um cofator para a ativação dos fatores de coagulação dependentes de vitamina K (BUITENHUIS e cols., 1990), é o alvo de inibição da warfarina. A enzima foi identificada em 1997, e uma subunidade da VKOR é codificada pelo gene VKORC1 que está localizado no cromossomo 16p11.2 (LI e cols., 2004, e ROST e cols., 2004) ( figura 9A). O gene VKORC1 é polimórfico (figura 9B) e foram descritos SPNs em regiões codificantes, promotora, nos íntrons e na região 3´ UTR (WADELIUS e cols.,2005). Rost e colaboradores, em 2004 identificaram que polimorfismos no gene VKORC1 (Arg98Trp,Val98Ala, Arg58Gly e Leu128Arg) codificam quatro famílias independentes de enzimas que foram associadas à resistência na terapia com a warfarina. Dez polimorfismo de nucleotídeo único (SNPs) (381, 861, 2653, 3673, 5808, 6009, 6484, 6853, 7566 e 9041) mais comuns são utilizados para construir 5 grandes haplótipos que são associados à hipersensibilidade, que necessita de baixas dose (haplótipo A), ou a resistência, que necessitam de altas dose (haplótipo B) (RIEDER e cols., 2005). Dois destes polimorfismos (3673 G>A, rs9934438 e 1173C>T, 36 rs17878363) são normalmente utilizados para identificar o haplótipo A que está associado com a baixa de expressão do mRNA de VKORC1 e consequentemente com a diminuição da quantidade total dos fatores de coagulação (YIN e cols.,2007). Figura 9 A: Cromossomo 16 (http://ghr.nlm.nih.gov/gene/VKORC1). Figura 9B: Enzima vitamina K epóxido redutase (TI e cols., 2005) O polimorfismo 3673G>A é considerado o alelo com maior poder preditivo da dose de warfarina por estar localizado na região promotora do gene VKORC1 e por alterar a sequência consenso E-box provocando a diminuição de expressão do mRNA (RIEDER e cols., 2005). Esse dado pode ser confirmado no trabalho realizado em pacientes brasileiros em que 3673G>A está em forte desequilíbrio de ligação com outros alelos VKORC1 influenciando na dose requerida de warfarina, conforme mostrado na tabela 7 (PERINI e cols., 2008). 37 Tabela 7: Distribuição dos genótipos 3673G>A VKORC1 e a dose requerida de warfarina em pacientes brasileiros (Adaptado de PERINI e cols., 2008). Grupos Brancos Intermediários Negros n 196 118 76 Genótipo VKORC1 GG GA AA 34.7±13.5 37.8±11.6 41.1±15.0 27.3±9.6 31.5±11.2 27.7±9.6 18.5±6.8 16.8±5.4 23.8±8.8 Anova Valor P <0.0001 <0.0001 <0.0001 Limdi e colaboradores recentemente descreveram a distribuição das freqüências de VKORC1 na população mundial (figura 10). Figura 10: Distribuição mundial de haplótipos (Adaptado de LIMDI e cols., 2010). A freqüência mundial dos haplótipos foram constituídos baseados em 6 SNPS de VKORC1 que são representados por gráficos pizzas sobre o país de origem. Os SNPs são listados na ordem que ocorrem ao logo do gene VKORC1: 1639G, 497T G, 1173C T, 1542G C, T 2255C, 3730G A. Todos os haplótipos que ocorrem com freqüências menor de 2,5% em todas as amostras populacionais testadas são agrupadas na categoria outros. Para os EUA, as amostras populacionais são divididas em subgrupos: brancas (W), pretas (B), e do México Americana (MA). 38 2. Objetivo 2.1. Objetivo Geral Descrever o perfil dos pacientes brasileiros em tratamento crônico com o anticoagulante oral warfarina no Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras INCL, e correlacionar as variações interindividuais desses pacientes com as doses requeridas de warfarina, com o valor de INR e com a incidência de hemorragia. 2.2. Objetivos Específicos 2. Verificar quais fatores demográficos e clínicos podem influenciar na dose requerida de warfarina; 3. Avaliar as interações medicamentosas que predispões o pacientes a hemorragias graves; 4. Avaliar as Influências dos polimorfismos dos genes CYP2C9 e VKORC1 na dose requerida de warfarina, com o valor de INR e com a incidência de hemorragia. 39 3. MÉTODOS 3.1. AMOSTRAGEM POPULACIONAL ESTUDADA Este estudo descritivo foi realizado em 149 pacientes que estavam em tratamento crônico com o anticoagulante oral warfarina, no ambulatório de coagulação do INCL, entre 2002 a 2007. Os dados demográficos (idade, sexo, superfície corpórea) e clínicos (INR, indicação ao tratamento, interações medicamentosas, doenças concomitantes, sangramentos e hemorragias) dos 149 participantes foram coletados do prontuário dos pacientes do INCL e os dados de genotipagem de CYP2C9*2, CYP2C9*3 e VKORC1 3673G>A dos 149 pacientes foram obtidos do trabalho realizado por Perini e colaboradores, em 2008. Para cada paciente, a dose de warfarina administrada foi ajustada pelo médico responsável, baseada na medida de INR, realizada no dia da consulta. A informação completa da dose semanal de warfarina requerida por cada paciente foi obtida do prontuário e definida como a primeira dose prescrita durante três consultas consecutivas em que o paciente apresentou o INR terapêutico (2,5 a 3,5 para pacientes com prótese cardíaca, e 2 a 3 para o restante das indicações terapêuticas). 3.6. ANÁLISE ESTATÍSTICA A freqüência alélica e genotípica dos genes investigados foi determinada por contagem direta dos alelos. As doses requeridas de warfarina pelos diferentes grupos genotípicos foram analisadas utilizando-se o teste de ANOVA (one way analysis of variance) e o teste de Student-Newman-Keuls para comparações par a par. 40 O programa estatístico primer 6.0 (Clarke e Gorley 2006) foi utilizado para a realização de todas as análises estatísticas e o nível de significância foi fixado em P menor ou igual 0,05. Os dados foram inseridos em uma planilha do programa Excel for Windows 2003, com dupla digitação. Posteriormente os dados foram transportados para o programa estatístico OriginPro 7.0. Foi realizada a confecção dos gráficos que avaliaram a associação dos genótipos com o INR. 41 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1. DADOS DEMOGRÁFICOS E CLÍNICOS Este estudo descreve o perfil de pacientes em tratamento crônico com o anticoagulante oral warfarina. Os dados dos 149 pacientes participantes foram coletados, entre 2002 e 2007, e reflete o cotidiano e a realidade da terapia com a warfarina em um hospital público brasileiro. A tabela 8 mostra os dados demográficos e clínicos dos pacientes incluídos no estudo. Tabela 8: Dados demográficos e clínicos dos 149 pacientes incluídos no estudo Variável Dose de warfarina (mg/semana) Idade Superfície Corporal (m2) Homens Mulheres Sexo Homens Mulheres Indicação do tratamento com warfarina Prótese de válvula cardíaca artificial Prótese de válvula biológica Fibrilação Atrial Trombose venosa Outros Comorbidades Hipertensão Arterial Febre Reumática Diabetes Mielittus Outros Pacientes que tiveram algum tipo de hemorragias Hemorragias Sangramentos (boca, gengiva, fezes, nariz e olhos) Comedicação com outros fármacos a Média ± desvio padrão (mínimo e máximo). b número de indivíduos (%). n = 149 34,2±14,34 (10,0 – 72,5)a 53±14,5(19-83)a 1,82 ± 0,17(1,47 – 2,34)a 1,70 ± 0,16 (1,31 – 2,12)a n (%) 63 (42%) 86 (58%) n (%)b 95 (64%) 6 (4%) 38 (25%) 3 (2%) 7 (5%) n (%)b 90 (60%) 47 (31,5%) 14 (9,4%) n (%)b 15 (23%) 50 (77%) 53 (81,5%) 42 Com relação às características demográficas, os 149 pacientes tinham idade entre 19 e 83 anos. Os pacientes com mais de 65 anos representam 18,8% da cohort indicando que prevaleceu a presença de indivíduos mais jovens. Esse dado pode ser justificado pelo fato de haver maior quantidade de mulheres jovens e de meia-idade iniciando a terapia com warfarina no INCL, entretanto são necessários estudos mais abrangentes para esclarecer qual o principal fator que está provocando esse resultado. Dados semelhantes também foram descritos por Huang e colaboradores, em 2005, no estudo prospectivo na população chinesa. Além disso, Lourenço e colaboradores, em 1997, investigaram pacientes acompanhados no ambulatório de Hematologia e Hemoterapia da UNIFESP, entre março de 1995 e maio de 1997, e constataram a idade média de 50 anos, variando de 16 a 81 anos, sendo que apenas 2% dos pacientes tinham menos de 20 anos e 33% com 60 anos ou mais. Alguns estudos apresentavam resultados semelhantes ao nosso, com maior percentagem de mulheres (HUANG e cols., 2009; BARCELONA e cols., 2000; BARREIRA e cols., 2003; TANG, 2003; CASSIS e cols., 2005; RIEDER e cols., 2009), entretanto, a maior parte dos estudos descritos na literatura abordam, predominantemente, pacientes do sexo masculino fazendo uso de warfarina (GARCIA e cols., 2006; WYNNER e cols.,1995; LANCASTER e cols., 1991; LOURENÇO e cols., 1997; VOLLER e cols., 2004; WANDELIUS e cols., 2009). Houve associação significativa entre o uso de warfarina e o aumento da idade (P = 0,009), pois, há um aumento da sensibilidade aos anticoagulantes na mesma proporção do avanço da idade fazendo com que os pacientes mais idosos necessitem de doses menores quando comparados aos mais jovens (gráfico 1). Foi observada diferença significativa (P < 0,05) entre o grupo de pacientes com idade entre 36 e 50 anos quando comparados com pacientes maiores de 65 anos. A diminuição da dose (mg/semanal) com o avanço da idade está consistente com que já foi observado anteriormente em outros estudos (HUANG e cols., 2009; WYNNE e cols., 1995; REDWOOD e cols., 1991; GARCIA e cols., 2006; LIMDI e cols., 2010.; LAURIE e cols., 2009; KLACK e cols., 2006). Já se sabe que a partir dos 50 anos, o tamanho do fígado reduz em aproximadamente 28% quando comparado com uma pessoa de 40 anos (WYNNE e cols., 1995). Além disso, o fluxo sangüíneo diminui 43 alterando o metabolismo hepático de muitas substâncias, entre elas, os medicamentos, podendo provocar aumento dos seus níveis, e do tempo de permanência no organismo e consequentemente um aumento da sensibilidade à warfarina. Gráfico 1: Distribuição da dose (mg/semana) por faixa etária de idade. * * P< 0,005 entre 36-50 e <66 Em relação ao sexo, 58% (n = 86) dos 149 pacientes eram do sexo feminino. Apesar de possuírem a maior média de idade, as mulheres necessitaram de doses semanais de warfarina de 34,1mg/semana e os homens de 34,3 mg/semana para manter o INR terapêutico (gráfico 2). A variável sexo não influência de forma significativa nas doses semanais de warfarina (P = 0,933), apesar dos homens possuírem maior superfície corporal (P < 0,001), conforme mostrado na tabela 8. Combinando as características demográficas de idade e sexo com a dose requerida de warfarina, conforme gráfico 3, apesar de observamos no gráfico uma diminuição na dose requerida de warfarina para os homens com 71 anos ou mais (25,2 mg/semana) em comparação com as doses requeridas (38,8 mg/semana) por 44 homens mais jovens, não há diferença significativa (P = 0,116) na dose requerida de warfarina entre as faixas etária de idade quando analisamos o sexo masculino. Além disso, no gráfico 3, um resultado inesperado foi observado nas mulheres que tinham idade acima de 71 anos, já que a dose média requerida de warfarina foi de 33,2 mg/semanal, sendo maior que a dose necessária para manter a anticoagulação estável nas mulheres com idade entre 51 e 70 anos (31,5 mg/semanal). Também não houve diferença significativa (P = 0,159) na dose requerida de warfarina entre as faixas etária de idade quando analisamos as pacientes do sexo feminino. Em mulheres, esse dado discrepante pode ser explicado pela dose requerida de warfarina de duas pacientes com idade 74 e 83 anos que necessitam de doses mais altas (62,5 mg/semana e 55 mg/semana, respectivamente) que as demais mulheres. Ambas as pacientes também faziam uso de medicações concomitantes (Furosemida, Digoxina, Losartam, Espironolactona, Amlodipina, Captopril, Isossorbida) que diminuem o efeito da warfarina resultando em doses terapêuticas mais altas de warfarina. Gráfico 2 : Dose requerida de warfarina (mg/semana) em função do sexo dos 149 pacientes participantes do estudo 45 Gráfico 3: Dose requerida de warfarina (mg/semana) estratificado de acordo com a idade e sexo dos 149 pacientes incluídos no estudo 46 As doses de warfarina necessárias para manter o INR terapêutico, dos 149 pacientes, variaram entre 10 a 72,5 mg por semana (tabela 8). Neste estudo, não houve restrição quanto à indicação da terapia com a warfarina e as principais indicações para o tratamento com warfarina foram prótese cardíaca artificial (n = 95, 64%) e fibrilação atrial (n = 38, 25%) (tabela 8). Esses resultados são consistentes com o que já foi descrito anteriormente para outras populações investigadas (GARCIA e cols., 2005; WADELIUS e cols., 2009; LAURIE e cols., 2009; KULLINNA e cols., 1999; GASISSEUR e cols., 2004; TANG e cols., 2003; VOLLER e cols., 2004; CASAIS e cols., 2005; WHITLEY e cols., 2007) e em estudos na população brasileira (CORBI, 2009, VIANNA-JORGE e cols., 2007 e PERINI e cols., 2008). No que se refere à presença de comorbidades associadas às indicações clínicas para o uso de warfarina, e descritas nos prontuários dos participantes, constatamos que as mais prevalentes foram hipertensão arterial (n = 90, 60%), febre reumática (n = 47, 31,5%), e diabetes mielittus (n = 14, 9,4%). A hipertensão também foi a mais frequente em pacientes dos estudos (CARACO e cols., 2008; LANCASTER e cols.,1991; SAMSA e cols.,2004; CORBI, 2009), enquanto a diabetes mellitus foi a mais encontrada nas investigações (VIANNA-JORGE e cols., 2007; CARACO e cols., 2008; HOWER e cols., 2001; VOLLER e cols., 2004; LAURIE e cols., 2009). Não encontramos estudos em que a febre reumática tenha sido descrita como uma doença concomitante. As comorbidades denominadas como “outros” na tabela 8 incluem câncer de próstata, câncer de mama, gastrite, úlcera, tireóide, hepatite c, labirintite, asma, bronquite, reumatismo e HIV. Na tabela 8 também está descrito o número de pacientes que tiveram algum tipo de hemorragias, sendo que 15 tiveram hemorragias e 50 relataram incidência de sangramentos. A incidência de hemorragia na população brasileira estudada está de acordo com o que já foi descrito anteriormente para a população dos Estados Unidos (WYSOWSKI e cols., 2007). A dosagem média semanal da warfarina segundo as indicações clínicas é apresentada na tabela 9. O grupo de pacientes que tinha prótese cardíaca mecânica 47 como primeira indicação para a terapia com a warfarina iniciava o tratamento com a dosagem média de 37,7 mg/semana, enquanto que para fibrilação atrial, segunda profilaxia mais indicada, a média da dosagem semanal foi de 24,3 mg/semana, sendo menor do que a dose (33,3 mg/semana) para as indicações menos freqüentes (trombo no ventrículo esquerdo, grande átrio esquerdo, acidente vascular encefálico tardio, cirurgia de fouta in, miocardiopatia dilatada) que estão denominadas como “outros” na tabela 8 e 9. A monitoração da coagulação sanguínea é de extrema importância para controlar a eficácia e a adesão do paciente ao tratamento com o anticoagulante. O INR é dividido em faixas terapêuticas que variam e o estabelecimento de valores aceitáveis leva em conta a indicação clínica, a fim de reduzir a morbidade por doença tromboembólica. Para a maioria das indicações, o INR terapêutico é de 2 a 3, conforme o indicado para 104 (70%) dos pacientes deste estudo. Para pacientes portadores de próteses mecânicas de válvulas cardíacas recomenda-se um INR mais alto de 2,5 a 3,5. Apesar de neste estudo 101 pacientes estarem tomando warfarina em função de apresentar algum tipo de prótese cardíaca, na prática apenas 45 (30%) tinham indicação de INR terapêutico dentro da faixa terapêutica entre 2,5 a 3,5. Para os 149 pacientes participantes deste estudo o tempo médio geral para atingir o INR terapêutico foi de aproximadamente 14 meses (tabela 10). Avaliando o tempo em que os pacientes ainda não estavam com o INR terapêutico e com a dose de warfarina estabilizada observamos a ocorrência de INR subterapêutico (abaixo de 1,5) em 101 pacientes (68%), sendo que 25 pacientes (17%) tiveram mais de 6 medidas de INR subterapêutico. Esses resultados mostram a dificuldade de adesão ao tratamento com warfarina, bem como o risco de eventos troboembólicos, conforme já descrito anteriormente (JOHNSON e cols., 2002). Tabela 9: Análise descritiva da dosagem de warfarina (mg/semana) segundo as indicações clínicas na cohort 48 Indicação da warfarina Prótese cardíaca metálica Fibrilação atrial Outras indicações a Média ± desvio padrão (mínimo e máximo). n Dose de warfarina (mg/semana) 95 37 14 37,7 ± 13,3 (12,5 – 72,5)a 24,3 ± 11,3 (10 - 60)a 33,3 ± 17 (11,3 – 62,5)a O sangramento e a hemorragia constituem a principal toxicidade dos anticoagulantes orais (SCHULMAN e cols., 2008). O controle do INR na faixa terapêutica é o principal fator para evitar que esses episódios, especialmente em locais onde a ocorrência de lesão irreversível, possa resultar na compressão de estruturas vitais. Avaliando ainda o tempo em que os pacientes não estavam com o INR terapêutico e com a dose de warfarina estabilizada observamos a ocorrência de INR supraterapêutico (acima de 5) em 72 pacientes (48%), sendo que 3 pacientes (2%) tiveram mais de 6 medidas de INR acima de 5. As medidas de INR acima de 3,5 já são indicativos de uma super anticoagulação expondo o paciente a um evento de hemorragia (Johnson e cols., 2011). Segundo Wysowski e colaboradores (2007), a incidência de hemorragia na população americana é de 86%. Em 2007, Kimmel e colaboradores avaliaram a influência da adesão dos pacientes em relação à monitorização da anticoagulação e verificaram que a principal causa de um controle inadequado era idade, sexo, função hepática e renal, severidade do tipo da doença, usos concomitantes de medicações e polimorfismos genéticos. Tabela 10: Caracterização dos 149 pacientes segundo o INR INR Terapêutico 2-3 2,5 - 3,5 Tempo para atingir o INR terapêutico (meses) Ocorrência de INR abaixo de 1,5 (subterapêutico) Nenhuma ocorrência 1 a 5 ocorrências acima de 6 ocorrências n (%) 104 (70%) 45 (30%) 14,1 ± 13,3 (0 – 46) a n 48 76 25 49 Ocorrência de INR acima de 5,0 (supraterapêutico) Nenhuma ocorrência 1 a 5 ocorrências acima de 6 ocorrências a Média ± desvio padrão (mínimo e máximo). 77 69 3 4.2. INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS E O USO DA WARFARINA Foram administrados nesta cohort, 62 tipos de fármacos diferentes dentre os quais o mais receitado foi o captopril (n = 46), furosemida (n = 56) e digoxina (n = 52) (tabela 11). Dos 149 pacientes incluídos no estudo, 32,8% faziam uso de 4 ou mais medicamentos concomitantemente com a warfarina. Existem aproximadamente 250 medicamentos que interferem no resultado do efeito anticoagulante da warfarina (MIMS Austrália; 2010) e a associação de medicamentos concomitantes com a terapia da warfarina pode levar ao controle ineficaz do INR refletindo em complicações hemorrágicas. Esse fato foi constatado neste estudo, sendo que 81,5% dos pacientes que sofreram eventos de sangramentos faziam uso de warfarina juntamente com outros fármacos. Resultados semelhantes foram observados por Corbi, 2009, em um hospital público de Ribeirão Preto. Os três medicamentos mais utilizados neste estudo (captopril, furosemida e digoxina), que são indicados para o tratamento de doenças de origem cardíaca, também foram os mais prescritos conforme descrito por Howes e colaboradores, em 2001, Yin e colaboradores, em 2003 e Corbi, em 2009. As interações medicamentosas envolvendo os medicamentos captopril, furosemida e digoxina foram descritas entre as 10 mais freqüentes em pacientes geriátricos e em pacientes que fazem uso da warfarina (OSCANOA, 2004). Tabela 11: Caracterização dos medicamentos administrados concomitantemente com a warfarina 50 Medicamentos administrados concomitantemente com a warfarina Amiodaroma Atenolol Bezetacil Digoxina Captopril Enalapril Espirolactona Furosemida Losartan Propanolol Sinvastatina Uso de medicação concomitante (n=133) 1 medicamento 2 medicamentos 3 medicamentos 4 medicamentos ou < n 22 14 15 52 46 14 15 56 15 12 12 n (%) 27 (18,5%) 27 (18,5%) 28 (19%) 64 (44%) O medicamento captopril foi o primeiro inibidor da enzima conversora da angiotensina (ECA). É prescrito para as doenças cardiovasculares com hipertensão arterial sistêmica e tem como efeitos colaterais hipotensão arterial, tosse e hiperpotassemia (MARCONLI e cols.,2004). Esse medicamento é metabolizado pela enzima CYP2D6 e interage fortemente com a digoxina, que é um diurético, e juntos podem causar hiponatremia nos pacientes que fazem uso desses dois fármacos concomitantemente com a warfarina. A furosemida é um diurético utilizado no tratamento de patologias como hipertensão arterial sistêmica, insuficiência cardíaca congestiva, edema e ascite proveniente da cirrose hepática, entre outras. Esse medicamento bloqueia o transporte de Na+ K+ 2Cl- no ramo ascendente da alça de Henle (HARDMAN, 1996). Os diuréticos que agem na alça de Henle podem deslocar a warfarina, e outros anticoagulantes orais dos sítios de ligação das proteínas plasmáticas, aumentando a concentração plasmática da warfarina e potencializando o seu efeito. A interação entre a furosemida e a warfarina parece ter uma menor importância 51 clínica, já que, a monitorização do INR, principalmente quando a dose do diurético for elevada, garante a eficácia da terapia. É indicado que, os pacientes sejam aconselhados a relatar imediatamente qualquer sinal de sangramento ao seu médico, incluindo dor, inchaço, dor de cabeça, tontura, fraqueza, sangramento prolongado de cortes, aumento do fluxo menstrual, sangramento vaginal, sangramento nasal, sangramento da gengiva de escovação, sangramento anormal ou nódoas negras, vermelho ou marron; urina, e fezes vermelha ou preto A digoxina, um diurético muito prescrito em pacientes que fazem terapia com a warfarina, tem a depuração diminuía pela amiodarona que é um fármaco antiarrítmico, indicado para tratar arritmias e fibrilação ventricular em pacientes com problemas cardíacos. O uso concomitante warfarina com a digoxina, sinvastatina e amiodarona podem causar efeitos tóxicos. Dentre os medicamentos listados na tabela 11, em estudo mais abrangentes os que já demonstraram influenciar de forma significativa na dose requerida de warfarina foram a amiodarona e sinvastatina (PERINI e cols., 2008, GAGE e cols.,2008, WHITLEY e cols., 2008). Embora não tenha sido o fármaco mais prescrito, o antiarrítmico amiodarona é um inibidor da warfarina, causando sensibilidade porque é um potente inibidor do citocromo P-450, incluindo a enzima CYP2C9 que é responsável pelo metabolismo do S-warfarina. A amiodarona é um antiarrítimico bastante efetivo utilizado em diversas arritmias cardíacas, tanto ventriculares quanto supraventriculares. A amiodarona reduz o metabolismo e aumenta o efeito da warfarina. Além disso, o tempo médio de protombina pode duplicar ou triplicar com o uso concomitante desses medicamentos (PEDERSEN e cols., 2007). A sinvastatina é uma pró-droga, utilizada na deslipidemia ligando-se fortemente às proteínas plasmáticas, reduzindo a agregação plaquetária e promovendo aformação de trombos, pois afeta os níveis de fibrinogênios. O seu uso, quando concomitante, potencializa o efeito da warfarina. Além disso, a warfarina aumenta chances de efeitos colaterais da sinvastatina, como dor muscular, e a combinação pode piorar problemas com úlceras e outros tipos de sangramentos. Perini e colaboradores, em 2008, descreveram um modelo de 52 regressão para estimar a dose requerida de warfarina e observaram um coeficiente de correlação de 5,6% para a amiodarona e 1% para a sinvastatina. A questão das interações medicamentosas é um tema tão amplo que já existem programas de informática desenvolvidos exclusivamente para investigar uma possível interação entre fármacos. Em pacientes em tratamento com a warfarina interações medicamentosas representam sérios riscos para o paciente. Dessa forma, é necessário programar estratégias para a prevenção de reações adversas, como por exemplo, identificação dos pacientes de risco, principalmente usuários de digoxina, captopril, amiodarona, sinvastatina e furosemida. Além disso, deve-se acompanhar atentamente o INR dos pacientes em tratamento com a warfarina fazendo ajustes necessários, adicionando ou suspendendo medicações concomitantes. 4.3. FATORES GENÉTICOS E O TRATAMENTO COM WARFARINA EM PACIENTES BRASILEIROS Os dados de frequências alélicas e genotípicas de CYP2C9 e VKORC1 estão mostrados nas tabelas 12 e 13, respectivamente. Considerando a população geral estudada, as frequências dos alelos variantes CYP2C9*2 e *3 foram 8,6% e 6,5%, respectivamente. Em relação ao gene VKORC1, a freqüência do alelo variante A foi de 8,1%. Comparando com os dados já descritos em brasileiros por Perini e colaboradores, em 2008, não existe diferença significativa nos valores de freqüência alélica e genotípica para todos os polimorfismos investigados. Os polimorfismos CYP2C9*2 e CYP2C9*3 são bem descritos na literatura por serem os mais freqüentes nas diferentes populações (VIANNA-JORGE e cols., 2004, PERINI e cols., 2008; KAMALI e cols., 2009, PERINI e cols, 2010. Desde a descrição do gene VKORC1, em 2004 (LI e cols., 2004, e ROST e cols., 2004), diversos estudos já mostraram a freqüência do principal polimorfismo (3673G>A) 53 envolvido no tratamento com a warfarina (PERINI e cols., 2008; PERINI e cols., 2008, LIMDIH e cols., 2010). Com o desenvolvimento da farmacogenética, que estuda a variação da resposta aos fármacos devido a fatores genéticos ou hereditários (KALOW e cols., 1962), houve um grande crescimento no número de estudos na literatura que correlacionam genótipo e dose requerida de diferentes medicamentos (GOLDSTEIN e cols., 2003; ROSES e cols., 2004; BROCKMÖLLER e cols., 2008), inclusive do anticoagulante oral warfarina (PERINI e cols., 2008; GAGE e cols., 2007; RYAN e cols., 2008). Em relação aos genótipos CYP2C9 observamos que 107 pacientes (72%) portadores do genótipo selvagem, faziam uso da warfarina com a dose média de 36,4 mg/semana, variando entre 11,3 e 72,5 mg/semana. Entre os 24 (16%) pacientes portadores do genótipo variante CYP2C9*1/*2 que faziam uso da warfarina, a dosagem semanal foi de 26,6 mg/semana, variando entre 10 e 60 mg/semana. Comparando os diferentes genótipos de CYP2C9 em relação a dose requerida de warfarina (tabela 15) observamos, neste estudo, diferença significativa quando comparado os três grupos genotípicos (P= 0,004). Esse resultado está de acordo com o que já foi descrito para brasileiros em ViannaJorge e colaboradores, em 2007, e em Perini e colaboradores, em 2008. Entretanto, não observamos diferença significativa (P = 0,174) no tempo em meses para alcançar o INR terapêutico quando comparamos os diferentes genótipos de CYP2C9 (tabela 15). Em relação ao gene de VKORC1 observamos que os pacientes com genótipo GG, que está associado à resistência na terapia com a warfarina (D’ ANDREA e cols., 2008), requerem maiores doses (41,5 mg/semanal) do que pacientes com genótipo AA (20,2 mg/semana) ou GA (29,2 mg/semana), conforme mostrado na tabela 16. Essa diferença significativa (P = 0,0001) na dose requerida de warfarina entre os diferentes genótipos de VKORC1 é semelhante ao que já foi descritos por Perini e colaboradores., 2008; Aquilante e colaboradores., 2006; Rieder e colaboradores., 2006; Wadelius e colaboradores, 2005; dentre outros. 54 Assim como para o gene CYP2C9 também não observamos diferença significativa (P = 0,466) no tempo em meses para alcançar o INR terapêutico quando comparamos os diferentes genótipos de VKORC1 (tabela 16), mostrando que os genótipos CYP2C9 e VKORC1, neste estudo, não influenciam no tempo de adesão do paciente ao tratamento com warfarina. Esses resultados estão discrepantes do que já foi descrito anteriormente por Caraco e colaboradores, em 2008, que descreveram que portadores de alelo variantes CYP2C9 requerem um longo período de tempo até que a anticoagulação estável seja alcançada. Perini e cols., 2008, descreveram que o genótipo 3673G>A de VKORC1 é o que mais contribui na determinação da dose requerida de warfarina em pacientes brasileiros (R2 = 23,8%). O SNP 3673G>A, ocorre na região promotora do gene VKORC1 e altera a sequência consenso E-box, provocando a diminuição de expressão do mRNA (YUAN e cols., 2005 e WANG e cols., 2008). Tabela 12: Freqüência (%) dos alelos e genótipos CYP2C9 nos 149 pacientes incluídos no estudo e em outras populações étnicas. Alelos CYP2C9 *1/*2 *1/*3 149 17 11,4 Brasileiros 390 11,8 5,4 Caucasianos 1485 20,3 11,8 Afro-Americanos 100 2,0 1,0 Africanos 150 8,7 4,3 População Nº Presente Estudo *2 *3 Genótipos CYP2C9 Outras Populações Tabela 13: Freqüência (%) dos alelos e genótipos VKORC1 nos 149 pacientes incluídos no estudo e em outras populações étnicas. Alelos VKORC1 Genótipos VKORC1 GG GA AA 149 45,6 46,3 8,1 390 37,9 28,9 19,7 População Nº Presente Estudo G A Outras Populações Brasileiros Tabela 15: Dose requerida de warfarina (mg/semana) e o tempo em meses para alcançar o INR terapêutico (três medidas consecutivas) em função dos diferentes genótipos de CYP2C9. Variável Dose warfarina Todos *1/*1 *1/*2 *1/*3 P (n = 149) (n = 105) (n = 24) (n = 17) (ANOVA) 30,8 ± 5 36,4 ± 14,5 26,6 ± 13,4 29,4 ± 12,3 P= 0,004 a (10- 72,5) (11,3 - 72,5) (10 - 60) Tempo para alcançar o 16 ± 2,4 13 ± 11,6 18,3 ± 15,3 16,4 ± 20,4 INR terapêutico (meses) (0 - 66) (0 – 56) (0 – 56) (0 – 66) (mg/semana) a P < 0,05, versus CYP2C9*1/*1 (Teste Student-Newman-Keuls). (10 – 50) P= 0,174 Tabela 16: Dose requerida de warfarina (mg/semana) e o tempo em meses para alcançar o INR terapêutico (três medidas consecutivas) em função dos diferentes genótipos de VKORC1 Variável Todos GG GA AA P (n = 149) (n = 68) (n = 69) (n = 12) (ANOVA) Dose warfarina 36,7 ± 5,2 41,5 ± 14 29,2 ± 12 20,2 ± 7,3 P= 0,0001 (mg/semana) (10 - 72,5) (15 – 72,5) (10 – 57,5 ) (10 – 35) Tempo para alcançar o INR 13,2 ± 2,2 13,5 ± 13 15,2 ± 13,9 10,9 ± 10,2 (0 – 66) (0 – 66) (0 – 56) (1 – 29) terapêutico (meses) P= 0,466 59 Considerando a combinação de genótipos CYP2C9 e VKORC1 dos 149 pacientes, conforme gráfico 4, observamos uma redução na dose requerida de warfarina com o aumento no número de alelos variantes para ambos os genes. Dentre esses pacientes, os portadores da combinação do genótipo CYP2C9 *1/*2 / VKORC1 GA (n=16) tiveram a menor dose requerida de warfarina (24,3 mg/semana). O conhecimento do genótipo CYP2C9 e VKORC1 dos indivíduos que necessitam da terapia anticoagulante com warfarina são cruciais, visto que, pacientes que apresentam pelo menos um alelo variante para os genes envolvidos na farmacocinética (CYP2C9) e/ou farmacodinâmica (VKORC1) da warfarina requerem doses significativamente menores (Gage e cols., 2007 e Perini e cols., 2008). Pacientes com o genótipo CYP2C9 *1/*2 / VKORC1 GA, por exemplo, podem estar expostos a eventos hemorrágicos graves, principalmente no início da terapia com warfarina, podendo até mesmo vir a óbito, caso não haja uma monitoração frequente do INR. Gráfico 4: Caracterização das combinações de frequências dos genótipos e alélicas para CYP2C9 e VKORC1 60 Neste estudo, também correlacionamos a distribuições das doses requeridas de warfarina com a frequência dos polimorfismos genéticos em ambos os sexos (gráfico 5 e 6). Não houve diferença significativa (P= 0, 741) nas doses requeridas semanalmente para os portadores do alelo CYP2C9*1 entre homens e mulheres. As pacientes portadoras dos alelos CYP2C9*2 e CYP2C9*3 necessitaram de doses semanais de 24,2 mg/semana e 28,8 mg/semana, respectivamente, enquanto que os pacientes homens requerem 26,5 mg/semana e 29,7 mg/semana, respectivamente. Não houve diferença estatística (P= 0,0683) nas doses requeridas entre os sexos quando comparados os diferentes genótipos de CYP2C9 (gráfico 5). Gráfico 5: Caracterização das doses (mg/semana) de acordo com o sexo e o genótipo CYP2C9 Considerando o genótipo VKORC1, houve diferença significativa (P< 0,001) entre todos os genótipos quando comparado, par a par, por sexo. As mulheres necessitaram de doses menores quando comparadas aos pacientes do sexo masculino (gráfico 6). As mulheres portadoras do genótipo GG, necessitaram de 61 doses significativamente (P < 0,05) maiores (41,7 mg/semana) quando comparadas com as doses requeridas por mulheres com o genótipo GA (27,3 mg/semana) e quando comparada com mulheres com o genótipo AA (18 mg/semana. Entre os pacientes homens houve diferença significativa (P= 0,0001) entre as doses requeridas quando comparado os três genótipos. Os pacientes com genótipo AA necessitaram de doses 48% menor (21,1 mg/semana) quando comparados aos pacientes com genótipo GG (41,1 mg/semana), e os portadores do genótipo heterozigoto GA (31,6 mg/semana). A influência dos genótipos CYP2C9 e VKORC1 na redução da dose requerida de warfarina estão consistentes com os resultados de outros estudos (LIMA e cols., 2008), inclusive em brasileiros (PERINI e cols., 2008). A combinação dos dois genótipos, CYP2C9 e VKORC1, mostram que ambos influenciam na dose requerida de warfarina (gráfico 4). Gráfico 6: Caracterização das doses (mg/semana) de acordo com o sexo e o genótipo VKORC1 62 Diversos estudos têm demonstrado que os portadores de pelo menos um alelo variante do CYP2C9 têm maiores ricos de hemorragias durante a indução com warfarina necessitando de menores doses para manter níveis adequados do INR (VIANNA-JORGE e cols., 2007). Perini e colaboradores, em 2004, descreveram que no Brasil aproximadamente um terço da população jovem e saudável são portadores de pelo ao menos um alelo variante para CYP2C9. Avaliando a associação do genótipo CYP2C9 com o INR, verificamos que os portadores das variantes alélicas *1/*2 e *1/*3 apresentaram valores instável para o INR, permanecendo fora da faixa terapêutica indicada para a terapia (gráfico 7). Portadores do alelo CYP2C9*3 permaneceram mais tempo fora da faixa terapêutica. Mesmo estando sob forte risco de hemorragias, não houve eventos hemorrágicos no período avaliado em pacientes portadores do alelo variante (CYP2C9*1/*3). Apenas sangramentos e manchas no corpo foram relatados. Ocorrências semelhantes foram relatadas por WADELIUS e colaboradores, em 2009, quando analisaram o tempo médio do INR na faixa terapêutica em pacientes em tratamento com warfarina descreveram que a anticoagulação é mais instável em portadores de CYP2C9*3, pois esse alelo está fortemente associado com o risco de anticoagulação supraterapêutica. Aithal e colaboradores , em 1999 , foram os primeiros a detectar que pacientes portadores de uma variante alélica de CYP2C9 necessitavam de baixas doses durante a terapia com a warfarina em virtude da maior dificuldade em manter a anticoagulação estável. Para o gene VKORC1, a maior média de tempo do INR fora da faixa terapêutica está associada ao genótipo VKORC1 AA, sendo que na média de 25 consultas apresentou pico de INR acima de 3 requerendo doses reduzidas, em até 50%, quando comparadas com o genótipo VKORC1 GG (gráfico 8). O tempo do INR fora da faixa terapêutica está consistente com o que foi observado anteriormente por Wandelius e colaboradores em 2009. 63 Gráfico 7: Genótipos CYP2C9 e o tempo, em número de consultas, para atingir o INR terapêutico (considerando 2,0 a 3,0) Gráfico 8: Genótipos VKORC1 e o tempo, em número de consultas, para atingir o INR terapêutico (considerando 2,0 a 3,0). 64 A warfarina está altamente associada a um alto risco de ocorrência de hemorragias fatais (BATLOUNI, 1999). Neste estudo, observamos que sangramentos e hemorragias estiveram presentes em 45% dos pacientes portadores do alelo CYP2C9*2 e 27% dos portadores do alelo CYP2C9*3. O índice de hemorragias em indivíduos que apresentam pelo menos um alelo variante para CYP2C9 também foi relatado por Caraco e colaboradores, em 2008. Em 2009, Gage e colaboradores descreveram que, SNPs em CYP2C9 estão associados de 2 a 3 vezes mais em provocar eventos de sangramentos durante a indução da warfarina, mas não a longo prazo durante o tratamento com warfarina. Como não foi informado no prontuário dos pacientes em que período do tratamento que ocorreram os sangramentos e as hemorragias não poderemos traçar o perfil do pacientes deste estudo quanto às ocorrências desses eventos de toxicidade. Os dados descritos neste estudo refletem o cotidiano e a realidade da terapia anticoagulante com warfarina em pacientes brasileiros atendidos durante as consultas de rotina do SUS do INCL. É de suma importância o conhecimento do perfil geral dos pacientes que necessitem de tratamento com o anticoagulante oral warfarina, visto que, conforme já descrito acima, existem diversas variáveis 65 que podem influenciar na dose requerida de warfarina. Há limitações inerentes a este estudo, já que todas as informações foram coletadas no prontuário dos pacientes, o que muitas vezes não corresponde a realidade. Na prática clínica o tempo e o número de pacientes para serem atendidos, especialmente, no SUS é um dificultador, assim alguns dados relevantes podem não terem sido registrados no prontuário dos pacientes. Além disso, será necessário repetir essa descrição visto que o tamanho da cohort é relativamente pequeno. O número da pacientes descritos neste estudo pode ter influenciado na falta de diferenças estatística na dose requerida de warfarina entre os sexos, entre os indivíduos com genéotipo CYP2C9*1/*3 e selvagens, entre outras análises. Contudo, as associações observadas neste estudo, bem como os dados descritos dos pacientes brasileiros em tratamento crônico com o anticoagulante oral warfarina poderão ser utilizadas como um substrato inicial para outros estudos que visem avaliar os benefícios da individualização da terapêutica, baseado em fatores genéticos e não genéticos, a fim de evitar os efeitos colaterais provocados pela warfarina, além da rápida adesão do paciente ao tratamento anticoagulante, bem como os custos atrelados à implantação da farmacogenética. 4. CONCLUSÃO A partir de uma revisão de prontuários de 149 pacientes do INCL com INRs terapêuticos, encontramos fatores que têm uma maior influência na dose requerida de warfarina. Os fatores que mais influenciaram, estabelecendo relações foram: o uso concomitante de medicamentos que induzem a CYP e diuréticos, a idade, polimorfismos nos genes CYP2C9 e VKORC1. Embora parecesse que as mulheres necessitariam de doses menores que os homens, descobrimos que o gênero pouco contribuiu. Serão necessários mais estudos com um tamanho maior de amostra, para que se possam prever precisamente os 66 efeitos de cada fator, de cada paciente especificamente, na dose requerida de warfarina. O conhecimento destas informações visa diminuir as consequências dos INRs supraterapêutico, facilitando simultaneamente o ajuste para níveis terapêuticos. Por sua vez, isso pode resultar em diminuição do tempo de uso de anticoagulantes injetáveis concomitantemente, evitar que ocorram eventos hemorrágicos e internações, o que poderia em última análise, diminuir os custos da terapia. 67 5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS AITHAL, G.P.; DAY, C.P.; KESTEVEN, P.J.; DALY, A.K. Association of polymorphisms in the cytochrome P450 CYP2C9 with warfarin dose requirement and risk of bleeding complications. Lancet, n. 353, p. 717 - 719, 1999. 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